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Ribeiro, Arenilson Costa. Língua Brasileira de Sinais - Libras [e-Book]. / Arenilson Costa Ribeiro, Ricardo Oliveira Barros. – São Luís: UEMA; UEMAnet, 2018. 55 p. ISBN: 1. Educação de surdos. 2. Linguística. 3. Libras. 4. Fonologia. 5. Morfologia. I. Título. CDU: 81`221.24:37 Os matérias produzidos para os cursos ofertados pelo UEMAnet/UEMA para o Sistema Universidade Aberta do Brasil - UAB são licenciadas nos termos da Licença Creative Commons – Atribuição – Não Comercial – Compartilhada, podendo a obra ser remixada, adaptada e servir para criação de obras derivadas, desde que com fins não comerciais, que seja atribuído crédito ao autor e que as obras derivadas sejam licenciadas sob a mesma licença. Reitor Gustavo Pereira da Costa Vice-Reitor Walter Canales Sant´ana Pró-Reitora de Graduação Andrea de Araújo Núcleo de Tecnologias para Educação Ilka Márcia Ribeiro S. Serra - Coordenadora Geral Sistema Universidade Aberta do Brasil Ilka Marcia R. S. Serra - Coord. Geral Lourdes Maria P. Mota - Coord. Adjunta | Coord. de Curso Coordenação Designer Educacional Cristiane Peixoto - Coord. Administrativa Maria das Graças Neri Ferreira - Coord. Pedagógica Professores Conteudistas Arenilson Costa Ribeiro Ricardo Oliveira Barros Revisão de Linguagem Lucirene Ferreira Lopes Designer de Linguagem Lucirene Ferreira Lopes Designer Pedagógica Janaina Cunha Borges Projeto Gráfico e Diagramação Tonho Lemos Martins Capa Rômulo Coelho UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO Caro (a) estudante, Este e-Book foi formulado para ajudar você nos seus estudos sobre a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Está organizado em quatro Unidades. Na primeira Unidade, você conhecerá questões éticas, políticas e educacionais a respeito da educação de surdos; você verá um pouco da história dos surdos como povo e como sua educação se deu ao longo dos anos. Na segunda, você será apresentado à língua dos surdos no Brasil, a Libras; e terá alguns esclarecimentos sobre ela. Na terceira, apresentamos os aspectos gramaticais dessa língua, uma análise rápida sobre os seus níveis de análise: fonologia, morfologia, sintaxe e semântica. E finalmente na quarta Unidade, o foco está nas questões socioantropológicas da surdez, bem como no ensino da língua portuguesa escrita para surdos. Como a Libras é visual e gestual, imagens estáticas nem sempre conseguem representar bem um sinal. Por isso, neste e-Book, os sinais estão representados também por meio da escrita da língua de sinais pelo sistema SignWriting, a terceira Unidade vai ajudar você a entender esse sistema. Além disso, tivemos o cuidado de selecionar links para ajudá-lo a ver a Libras acontecendo. Toda língua está cercada por uma cultura, então é importante que você tenha contato com falantes nativos da Libras para efetivar seu aprendizado linguístico cultural. É verdade que às vezes pode surgir algum receio de conversar com um surdo, mas dê o primeiro passo, e você verá que é mais fácil do que parece. Bons estudos!A PR ES EN TA Ç Ã O SU M Á R IO UNIDADE 1 QUESTÕES ÉTICO-POLÍTICO-EDUCACIONAIS ACERCA DA EDUCAÇÃO BILÍNGUE PARA SURDOS CARACTERÍSTICAS E CONCEITOS LINGUÍSTICOS RELATIVOS A LIBRAS COMPONENTES LINGUÍSTICOS E GRAMATICAIS DA LIBRAS ENSINO, APRENDIZAGEM E INTERAÇÃO 1.1 A educação de surdos e a língua de sinais no Mundo, no Brasil e no Maranhão 1.2 A educação de surdos no Mundo 1.3 A Educação de surdos no Brasil 1.4 A Educação de surdos no Maranhão 2.1 Caracterizando a Libras 2.2 Conceitos linguísticos: linguagem, língua e língua de sinais 2.3 Numerais: cardinais, ordinais e quantitativos 2.4 Advérbio de tempo 3.1 Fonologia: unidades mínimas (parâmetros), par mínimo e alofonia 3.2 Morfologia: verbos e substantivos 3.3 Semântica e Pragmática: pronomes pessoais 4.1 Português como segunda língua na modalidade escrita no ensino e aprendizagem de estudantes surdos bilíngues 4.2 Cultura, comunidade e identidade surda 5 6 9 11 15 16 19 20 23 32 46 49 51 UNIDADE 2 UNIDADE 3 UNIDADE 4 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 5 1.1 A educação de surdos e a língua de sinais no Mundo, no Brasil e no Maranhão Os surdos, como povo existem desde o começo da humanidade em vários lugares. A forma como foram tratados variou dependendo do lugar e da época em que estavam. Nesta Unidade estudaremos a história da educação desse povo. Além de nos propiciar a aquisição do conhecimento sobre essa temática, esse estudo nos permitirá refletir sobre as políticas educacionais aplicadas aos surdos, desde o passado até os nossos dias. Você notou que no parágrafo anterior nos referimos aos surdos como “povo”? Por que os mencionamos dessa forma? Bem, os surdos podem ser chamados de povo porque compartilham costumes, tradições e história. As experiências de vida do povo surdo são diferentes das experiências da maioria ouvinte, pois a concepção que eles têm de mundo é construída através da visão. Por esse motivo, eles sempre empreenderam ações no sentido de se afirmarem como grupo diferente e que merece respeito. Muitas ações dos surdos por reconhecimento da sua diferença têm a ver com o passado. Por vários momentos na história, esse povo sofreu a negação dos seus direitos e uma pressão para se tornar igual a todos na sociedade. Isso levou ao surgimento dos diversos grupos onde estes se reuniam com seus iguais, o que nos leva ao conceito de “comunidade surda”. Objetivos: Compreender os aspectos históricos e legais da língua de sinais, bem como sua relação com a educação de surdos; Conhecer as questões éticas, políticas e educacionais que envolvem a educação bilíngue para surdos. UNIDADE QUESTÕES ÉTICO-POLÍTICO- EDUCACIONAIS ACERCA DA EDUCAÇÃO BILÍNGUE PARA SURDOS1 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 6 Uma “comunidade surda” não é composta somente por surdo, mas há também a presença de ouvintes. Esses são a família, os intérpretes, os professores, os amigos e outros que participam desse grupo em determinado lugar e têm interesses em comum. Sobre essas comunidades nós estudaremos de forma mais aprofundada na quarta Unidade. Por enquanto, o que importa é definir os momentos marcantes da história do povo surdo. Você notará que por vezes a história dos surdos se confunde com a história da educação oferecida a eles. Comecemos retornando na linha do tempo para ver um pouco do povo surdo na antiguidade. Uma importante menção aos surdos está na bíblia. O livro bíblico de Levítico, no capítulo 19 e versículo 14 lemos: “Não amaldiçõe um surdo [...]”. Além disso, os evangelhos mencionam um surdo que foi curado por Jesus. Em Roma, os surdos eram mortos assim que identificados, ainda bebês, os que escapavam eram forçados a trabalhar como escravos. A morte também era o destino desses na Grécia Antiga. Porém, no Egito e na Pérsia, eram considerados como enviados dos deuses, criaturas privilegiadas que conseguiam se comunicar com as divindades, porém não havia esforços voltados para educá-los. Até aqui, percebe-se que havia vários conceitos sobre os surdos em diferentes sociedades. Porém, mesmo naquelas em que os surdos eram melhor vistos, não aconteciam ações que visassem a educação deles. Esses esforços só surgiram a partir da idade moderna, como veremos adiante. Daqui em diante, faremos um panorama geral em forma de linha do tempo, mostrando a educação dos surdos no mundo, depois focaremos no Brasil, e por fim no estado do Maranhão. 1.2 A educação de surdos no Mundo Em 1570, um monge beneditino espanhol Pedro Ponce de Leon (1510-1584), tutor de muitos surdos, tinha o mérito de provar que seus alunos eram capazes. Ele os educava utilizando sinais rudimentares, o que levou à criação da língua de sinais. Os surdos que estudavam com ele dominavam História, Matemática, Filosofia e outras ciências. Figura 1 - Pedro Ponce de Leon (1510-1584) Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 7 Figura 3 - Charles-Michel de L’Epée (1712-1789) Figura 2 – Juan Pablo Bonet(1579-1633)1620 – Juan Pablo Bonet (1579-1633), espanhol, criou e publicou o primeiro tratado sobre educação de surdos intitulado Redação das Letras e a Arte de Ensinar os Mudos a Falar. Na publicação havia desenhos do alfabeto manual. 16[...] – Van Helmont (1614-1699), holandês que primeiro descreveu a leitura labial e o uso do espelho, esse método foi posteriormente aperfeiçoado e aplicado à educação de surdos por muitos anos. 1760 – Thomas Braidwood (1715-1806), educador de surdos inglês, desenvolveu um método de educação que incluía o uso de um alfabeto manual que utilizava as duas mãos (esse alfabeto é utilizado na Inglaterra até hoje), o ensino de palavras escritas, seu significado e pronúncia e a leitura orofacial. 1760 – Charles-Michel de L’Epée (1712-1789), abade francês, criou a primeira escola pública para surdos em Paris, chamado de Instituto Nacional para Surdos-Mudos. A educação oferecida pelo instituto privilegiava a língua de sinais; esse era o meio para ensinar as mais diversas ciências aos alunos. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 8 Figura 4 - Samuel Heinicke (1729-1790) Figura 5 - Thomas Gallaudet(1787-1851) 1778 – Samuel Heinicke (1729-1790), alemão, fundou em Leipzig a primeira escola para surdos que seguia o método do oralismo. Nessa abordagem, um grande valor era atribuído à fala, e a língua de sinais era proibida. 1817 – Thomas Gallaudet, um reverendo americano, juntamente com Laurent Clerc, um professor surdo francês, fundaram a escola pública para surdos Hartford School, a primeira nos Estado Unidos. A língua de sinais francesa era utilizada ali, e com o tempo se modificou, gerando a língua de sinais americana. 1864 – Edward Gallaudet, fundou a primeira faculdade para surdos em Washington, a Universidade Gallaudet, que até hoje é a única universidade para surdos no mundo. 1880 – Em Milão, Itália, aconteceu o II Congresso Mundial de Surdos-Mudos, no qual houve uma votação que elegeu o método oralista como a melhor forma de educar surdos, passando esse a ser adotado em vários países. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 9 Figura 7 - E.Huet Figura 6 – Willian Stokoe (1919-2000) 1960 - Willian Stokoe, um linguista americano, publicou o livro “Linguage Structure: na Outline of the Visual Communication System of the American Deaf” no qual prova que a língua de sinais americana é uma língua de fato, como todas as outras. Essa pesquisa gerou várias outras em todo o mundo. 1.3 A Educação de surdos no Brasil 1855 – E. Huet, professor surdo francês, é convidado pelo imperador D. Pedro II para vir ao Brasil para abrir uma escola para surdos. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 10 1857 - No dia 26 de setembro foi fundado no Rio de Janeiro, o “Imperial Instituto dos Surdos-Mudos”, atual “Instituto Nacional de Educação de Surdos” – INES. Primeiramente, utilizando a língua de sinais francesa que com o tempo modificou- se gerando a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). 1875 - Flausino José da Gama, estudante do INES, aos 18 anos publicou “Iconografia dos Signaes dos Surdos-Mudos”, a primeira publicação sobre língua de sinais do Brasil. 1977 - Criada a Federação Nacional de Educação e Integração dos Deficientes Auditivos - FENEIDA. Mais tarde, em 1987, esta seria reestruturada sob a nomenclatura Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos - FENEIS. 1994 - Criada a Confederação Brasileira de Desportos de Surdos - CBDS. 2002 - A Libras é legalmente reconhecida como língua dos surdos brasileiros por meio da Lei n0 10.436, de 24 de abril. 2005 - A lei é regulamentada pelo Decreto n0 5.626, do dia 22 de dezembro, que explana acerca das ações que devem ser tomadas para a educação dos surdos. O que inclui a inserção da disciplina Libras no currículo dos cursos de nível superior com habilitação em licenciatura, bem como no curso de fonoaudiologia. 2006 - A Universidade Federal de Santa Catarina passa a oferecer o curso de Letras - Libras. 2010 - A profissão de Tradutor Intérprete de Libras é reconhecida por meio da Lei federal n0 12.319. Assista uma videoaula sobre Huet: http://tvines.ines.gov.br/?p=17135 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 11 4.1 A Educação de surdos no Maranhão 1966 - A Escola Modelo Benedito Leite atende alunos surdos em classes especiais. 1971 - As classes são transferidas da Escola Modelo Benedito Leite para a Unidade Integrada Raimundo Correa, onde permaneceram por mais de 20 anos. 1993 - Ministração de cursos de na Igreja Batista Getsêmani “Mímica” – Valéria Cardoso Ewerton. 1998 - Quatro alunos surdos foram inclusos na sala regular de ensino no Complexo Educacional de Ensino Fundamental e Médio Governador Edison Lobão - CEGEL, e foi providenciado o acompanhamento de duas professoras com conhecimento em língua de sinais, as primeiras intérpretes em sala regular. 2004 - Primeiro Encontro Maranhense de Intérpretes do Maranhão promovido pelo Centro de Ensino de Apoio à Pessoa com Surdez - CAS. 2014 - Início das aulas das primeiras turmas de Letras Libras no Estado, o curso foi oferecido na modalidade a distância pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, com um Polo funcionando na Universidade Federal do Maranhão - UFMA, com duas turmas, uma com habilitação em licenciatura, e a outra em bacharelado. 2014 - A Universidade Federal do Maranhão cria o curso de Licenciatura em Letras Libras. Aprenda mais sobre a história da educação de surdos no vídeo: http://tvines.ines.gov.br/?p=18034 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 12 Filosofias Educacionais destinada à Educação de surdos: Oralismo, Comunicação Total e Bilinguismo Nesse percurso pela história de educação dos surdos, pode-se perceber que prevaleceram três filosofias educacionais que moldaram os métodos de ensino aplicados a esse público, são eles: o oralismo, a comunicação total e o bilinguismo. Agora, vamos estudar melhor cada um deles. O Oralismo O precursor dessa abordagem foi o alemão Samuel Heinick. No oralismo, a preocupação central é a fala, ou seja, fazer com que o surdo produza sons entendíveis e que ele desenvolva a capacidade de leitura orofacial. O objetivo é que a pessoa com surdez se comunique, utilizando a língua oral do lugar onde vive, sem precisar da língua de sinais. O oralismo contava com muitas técnicas, que incluíam desde o uso de espelhos para observar o movimento dos órgãos da fala e a colocação da mão sobre a garganta para sentir a vibração provocada pelas cordas vocais na produção de sons, até a amarração das mãos para que o aluno não utilizasse a língua de sinais. Esse método ganhou força depois do Congresso de Milão em 1880, no qual foi considerado o melhor método para a educação dos surdos. E tinha defensores fervorosos como Alexander Graham Bell. Até mesmo o fundador da Universidade Gallaudet considerou esse como a melhor forma de educação, e aquela instituição - a exemplo de muitas outras no mundo, incluindo o INES - adotou o oralismo forma de educação. Essa preferência durou até a década de 70. A Comunicação Total Na década de 70, o método da comunicação total surgiu em oposição ao oralismo. Nesse método, todo tipo de artifício que facilitasse a comunicação era aceito, o que gerou várias técnicas. A característica mais destacada dessa filosofia era a língua falada sinalizada, isto é, os sinais serviam somente como demonstração Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 13 visual da língua oral. Com o tempo surgiram sistemas de sinais para partes de palavras, numa tentativa de facilitar o aprendizado da língua oral pelos surdos. O problema dessa filosofia está no fato de que as línguas sinalizadas e oralizadas são de estruturas diferentes, e por isso nem sempre se sinaliza na mesma ordem em que se fala (oralmente). Assim, a língua de sinais não era concretizada de fato, gerando a língua falada sinalizada que era incompreensível para os surdos. Depois de alguns testes, as técnicas da comunicação total caíram em desuso. OBilinguismo O bilinguismo tem sido a filosofia educacional mais aceita para a educação de surdos, e pela qual a comunidade surda luta pela efetivação. Essa abordagem prevê que o surdo tenha acesso à duas línguas: a língua de sinais como sua primeira língua, e a Língua Portuguesa na forma escrita como sua segunda língua. A aquisição das duas se dá de forma separada, respeitando as peculiaridades de cada uma delas. Aqui no Brasil, portanto, o surdo deve adquirir a Libras como primeira língua e o Português escrito como segunda língua. No próximo tópico, abordaremos os aspectos legais que contribuem para a aplicação do bilinguismo à educação de surdos. Aprenda mais sobre essas filosofias educacionais no vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=hFhOVTQvwaE Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 14 Resumo Estudamos nesta Unidade que, os surdos tiveram a sua história marcada pela marginalização em vários tempos e lugares. Também vimos que os surdos, como povo, tiveram sua educação pautada hora pelo oralismo, hora pela comunicação total e finalmente pelo bilinguismo. Também pudemos ver marcos na história deles como a Fundação do INES em 1855, o Congresso de Milão em 1880, e o início da educação de surdos no Maranhão em 1966. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 15 Objetivos: Reconhecer a Libras como língua natural humana de modalidade visuoespacial; Ampliar o vocabulário de sinais, a fim de possibilitar uma conversação básica em Libras. 2.1 Caracterizando a Libras Libras é uma sigla para a língua brasileira de sinais, que é uma língua utilizada pelos surdos do Brasil para se comunicarem entre si e com pessoas que também utilizam essa forma de comunicação. É uma língua diferente das que a maioria das pessoas está acostumada a falar. Enquanto línguas como o Português são orais auditivas, ou seja, são articuladas pela boca e recebidas pela audição. A Libras é uma língua visual motora, isso quer dizer que ela é percebida pela visão e articulada pelas mãos. A Libras possui estrutura e gramática própria, e todos os níveis de análise que a tornam língua de fato para a ciência: a fonologia, a morfologia, a sintaxe, a semântica e a pragmática. Na Libras há um alfabeto manual, mas só esse abecedário não é a totalidade da língua. Aliás, ela não é dependente do Português e nem é a sinalização das palavras da Língua Portuguesa. Assim como temos palavras nas línguas orais auditivas, temos sinais nas línguas visuais motoras. É comum alguns pensarem que a língua de sinais é uma só no mundo todo, mas isso não é verdade. Cada país desenvolveu sua própria língua de sinais, e mesmo em países que falam a mesma língua oral, a sinalizada é diferente. Por UNIDADE CARACTERÍSTICAS E CONCEITOS LINGUÍSTICOS RELATIVOS A LIBRAS2 exemplo, no Brasil e em Portugal, as pessoas falam português, mas os surdos brasileiros usam libras enquanto que os surdos portugueses utilizam a Língua Gestual Portuguesa, que é bem diferente da brasileira. 2.2 Conceitos linguísticos: linguagem, língua e língua de sinais Linguagem: é a capacidade natural de se comunicar, por qualquer meio. Pode se apresentar de forma verbal (com o uso de palavras) ou não verbal (sem o uso de palavras). A linguagem é universal e abstrata. Exemplos de linguagem: dança e pintura. Língua: é o conjunto de símbolos que seguem uma regra e são utilizados por uma comunidade para se comunicar. A língua sempre se apresenta de forma verbal. É local e concreta. Exemplos de língua: Português, Inglês e Libras. Língua de sinais: língua que utiliza o corpo e o espaço em volta dele para expressar ideias e transmitir mensagens. São verbais, pois utilizam sinais que são relativos a palavras. Seguem uma gramática própria. Exemplos de línguas de sinais: Libras, Língua de Sinais Americana (ASL), Língua Gestual Portuguesa (LGP). Assista uma vodeoaula sobre a Libras: https://www.youtube.com/watch?v=pR2ZmsViyGk Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 17 Alfabeto Datilológico ou Alfabeto Manual Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 18 Sinais Relativos a Saudação ou Cumprimento BO@ DIA BO@ TARDE BO@ NOITE BEM NOME CONHEC ER TAMBÉ M FELIZ OI Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 19 2.3 Numerais: cardinais, ordinais e quantitativos Os numerais são sinalizados de forma diferente a depender se são cardinais ou ordinais. Os numerais cardinais representam uma quantidade absoluta. São sinalizados nas formas abaixo. Os numerais ordinais representam ordem. São sinalizados na forma dos cardinais com o acréscimo do movimento retilíneo repetido para cima e para baixo até do primeiro ao quarto, e para o lado do quinto ao nono. A partir do décimo, não há diferença entre os cardinais e ordinais. Veja esses sinais sendo utilizados em uma conversa: https://www.youtube.com/watch?v=ivnPNodCtu4 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 20 2.4 Advérbio de tempo O objetivo desse tópico é aprender sinais que são utilizados para expressar ideias relacionadas ao tempo. Aprenda mais sobre como os numerais são utilizados em Libras: https://www.youtube.com/watch?v=-0DAwHz6OeE HOJEONTEM AMANHÃ HÁ 2 DIASHÁ 3 DIASHÁ 4 DIAS MANHÃ TARDE NOITE MADRUGAD A SEMPRE ÀS-VEZES MÊS 2-MESES 3-MESES Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 21 MANHÃ TARDE NOITE MADRUGAD A SEMPRE ÀS-VEZES MÊS 2-MESES 3-MESES 4-MESES ANO 2-ANOS 3-ANOS 4-ANOS Assista uma videoaula sobre o tempo em Libras: http://tvines.ines.gov.br/?p=10332 Vocabulário dos dias da semana em Libras: https://www.youtube.com/watch?v=0TL1lc7ZXa4 Vocabulário dos meses do ano em Libras: https://www.youtube.com/watch?v=xKmOMOxXM1Y Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 22 Resumo Nesta Unidade vimos que, a LIBRAS é a sigla para a Língua Brasileira de Sinais, a língua visual motora utilizada pela comunidade surda do Brasil. Cada país desenvolveu sua própria língua de sinais, ou seja, a Libras não é universal. Aprendemos a nos apresentar em Libras, bem como a sinalizar os números e sinais que envolvem tempo. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 23 Objetivos: Conhecer os componentes linguísticos e gramaticais da Libras; Identificar os elementos estruturais da gramática da língua de sinais. 3.1 Fonologia: unidades mínimas (parâmetros), par mínimo e alofonia A fonologia estuda as unidades mínimas sem significado que compõem as palavras. No caso das línguas de sinais, estudaremos as menores unidades sem significado que constituem um sinal. Isso quer dizer que o sinal não é um todo indissociável, ele é formado por partes menores que são conhecidas como parâmetros. Veja na imagem ao lado os parâmetros do sinal FRIO. UNIDADE COMPONENTES LINGUÍSTICOS E GRAMATICAIS DA LIBRAS3 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 24 Há três parâmetros considerados principais: a configuração de mão, o ponto de articulação e o movimento. A configuração de mão é a forma que a mão assume durante a realização de um sinal. Essa forma pode ser a de uma letra do alfabeto que você já estudou, mas existem outras configurações. Como a língua é viva, e a cada dia surgem novos sinais, é natural que surjam novas configurações de mãos; por isso não temos um número exato de configurações de mão, vários estudiosos apresentaram tabelas de configurações de mãos com diferentes quantidades de itens nelas. A seguir apresentamos uma tabela de configurações de mãos que está dividida em 10 grupos de configurações. Essa divisão levou em conta os dedos que são utilizados em cada forma. Configurações de mãos 1 3 2 4 Grupo 02 Grupo 03 Grupo 04 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 25 5 7 9 6 8 10 Grupo 05 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 26 O ponto de articulação é o local onde incidem as mãos ao realizar um sinal. Alguns sinais não apresentam nenhum tipo de toque das mãos em outra parte do corpo, nesses casos consideramos o ponto de articulação como um “espaço neutro”. No quadro abaixo, relacionamos os possíveis pontos de articulação de um sinal. Testa Ombro BochechaBraço Queixo Olhos Pescoço Nariz Boca Cintura Orelhas Antebraço O movimento envolve o deslocamento das mãos no espaço e alterações na configuração de mãos, isto é, no posicionamento dos dedos. É importante saber que o movimento pode acontecer em três planos: horizontal, frontal e lateral. Esse parâmetro pode ser classificado de diferentes formas. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 27 Tipos de movimento Contorno ou forma geométrica: retilíneo, helicoidal, circular, semicircular, sinuoso, angular. Horizontal Frontal Lateral Retilíneo Helicoidal Circular Semicircular Sinuoso Angular Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 28 Tipos de Contato: agarrar, deslizar ou escovar, toque, esfregar, bater. Agarrar Esfregar Deslizar Bater Tocar Interno das mãos: abertura, fechamento, curvamento, dobramento. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 29 Unidirecional: para cima, para baixo, para a direita, para a esquerda, para dentro, para fora, para o centro, para a lateral inferior/ superior esquerda/ direita, para um ponto específico referencial. Bidirecional: (quando envolve duas das direções acima) Exemplos de descrição fonológica de sinais: Configuração de mão: B Ponto de articulação: Peito Movimento: tocar Existem ainda dois parâmetros secundários: a orientação da palma da mão e as expressões não manuais. A orientação da palma da mão se refere à direção para onde a palma está virada no momento da realização do sinal. Dessa forma, temos seis possíveis direções: para cima, para baixo, para frente, para trás, para o centro e para fora. Configuração de mão: O Ponto de articulação: Espaço neutro Movimento: Abrir e fechar da mão ; Deslocamento da mão retilíneo em diagonal para lateral superior direita . VIAJAR Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 30 As expressões não manuais envolvem as expressões realizadas pelo rosto e os movimentos de corpo que atrelados aos sinais os intensificam, ou expressam as emoções relacionadas a um determinado sinal ou contexto. Assim as expressões faciais podem ter um caráter afetivo ou gramatical. As afetivas estão ligadas a emoções, as gramaticais possibilitam, entre outras coisas diferenciar os tipos de frases. Figura 8 – Expressões faciais Fonte: http://tertuliasdelibras.blogspot.com/2016/01/como-melhorar-expressao-facial-e.html Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 31 É importante notar que a alteração de um dos parâmetros principais de um sinal podem provocar uma mudança de significado. Vejamos um exemplo disso: No exemplo acima, podemos ver dois sinais parecidos, comparando seus parâmetros notamos que a única diferença entre os dois está no ponto de articulação. A mudança desse único parâmetro resultou na ressignificação do sinal. Assim podemos afirmar que SÁBADO e APRENDER são um par mínimo. A comparação de sinais que formam pares mínimos é o que torna possível identificar as unidades mínimas que os compõem. Mas em alguns casos a alteração de um parâmetro pode não resultar na mudança de significado, permanecendo o sentido. Vejamos um exemplo: SÁBADOAPRENDER ENTENDER ENTENDER Saiba mais sobre os parâmetros dos sinais da Libras. Disponível em: <http://tvines.ines.gov.br/?p=707> Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 32 No exemplo acima, o sinal ENTENDER é executado de duas maneiras. A diferença entre elas está na no ponto de articulação, mas essa alteração não criou um novo sinal. Nesse caso, esse fenômeno é chamado de alofonia. Mas atenção, isso não significa que você pode sinalizar como bem entender, a alofonia é convencionada, ou seja, as duas formas do sinal já são conhecidas e difundidas na comunidade. 3.2 Morfologia: verbos e substantivos A morfologia estuda as unidades mínimas que são carregadas de significado e que compõem as palavras (sinais). Nesse tópico estudaremos como os mesmos, parâmetros que você já estudou podem carregar significados e assim derivar ou compor novos sinais. Derivações devido à mudança da configuração de mão Primeiramente, vejamos como a configuração de mão pode influenciar na derivação de um sinal, para isso vamos relembrar um vocabulário que já aprendemos: o do sinal de mês. MÊS 2-MESES 3-MESES 4-MESES Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 33 Nos exemplos acima vemos que a derivação serviu para incorporar o numeral ao sinal, para tanto somente foi necessária a mudança da configuração de mão. Nesse exemplo, o processo de derivação é chamado de incorporação de número. Agora vejamos um outro exemplo, o do sinal BEBER. Neste outro caso, vemos novamente a alteração da configuração de mão. Aqui essa mudança se fez necessária para fazer o verbo BEBER concordar com o objeto (aquilo que estava sofrendo a ação de ser bebido); afinal, a forma da nossa mão não é a mesma quando bebemos em uma xícara ou em um copo. Esse fenômeno é chamado de incorporação do argumento. Derivações devido à mudança do movimento O movimento também pode provocar mudança de significado dos sinais, a principal dessas mudanças está na alteração da classe gramatical de alguns sinais, que variam de substantivo para verbo e vice-versa. Vejamos um exemplo para tornar clara essa ideia. Neste exemplo, percebemos que a mudança entre o substantivo TELEFONE e o verbo LIGAR está somente no movimento. O substantivo produz uma forma parada, com a mão tocando o rosto, enquanto o verbo tem um movimento semcircular para frente. BEBERxícara BEBERcopo TELEFONE TELEFONAR Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 34 O movimento também pode influenciar o entendimento sobre a forma como as ações expressas pelos verbos acontecem, isto é, sua frequência ou intensidade. Tomemos como exemplo novamente o verbo LIGAR. Já vimos como diferenciá- lo do substantivo TELEFONE, agora vejamos como atribuir frequência. Podemos perceber que quando o movimento é repetido muitas vezes, transmitimos a ideia de que aquela ação foi realizada várias vezes. Agora vejamos um exemplo de como um verbo pode ser intensificado. Considere os verbos ESTUDAR e FALAR. Aqui é possível perceber que além do movimento se repetir, há maior tensão nesse, e ainda o acompanhamento das expressões faciais e corporais para dar a ideia de maior intensidade. No segundo exemplo há a adição da segunda mão. LIGAR +TELEFONAR ESTUDAR ESTUDARmui to FALAR FALARmuito Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 35 Dessa forma, é possível perceber que os sinais podem derivar seus significados de várias formas. Processos de composição Os sinais também podem se juntar para formar novos significados em processos de composição. As composições podem ser por justaposição ou por aglutinação, vejamos como ocorre cada um deles. No processo de justaposição, os sinais são agrupados um após o outro criando assim um novo sinal. A exemplo disso, o sinal ESCOLA é formado pelos sinais CASA e ESTUDAR. Esse procedimento é muito comum na indicação do gênero masculino e feminino para seres vivos. O masculino é indicado com a junção do sinal HOMEM, e o feminino com o sinal MULHER. CASA ESCOLAESTUDAR BOI VACA Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 36 No processo de aglutinação, os sinais não se juntam um após o outro para formar um novo sinal; nesse caso, os sinais que compõem o novo sinal perdem parte das suas características e se unem em um sinal único e novo. Veja o exemplo do sinal HIPERTEXTO. Nesse sinal percebemos a aglutinação dos sinais TELEVISÃO e LIVRO. Esses dois sinais são feitos com as duas mãos, mas perdem uma das mãos quando se juntam. Dessa forma, cada mão carrega um significado, e se unem formando um novo que deriva dessa união. Então percebemos que os parâmetros podem carregar consigo significados diversos, que envolvem intensidade, frequência ou mesmo conceitos. Por esse motivo, eles podem ser considerados morfemas, e a sua união gera novos significados expressos por meio de novos sinais. Até aqui estudamos a estrutura dos sinais, agora vejamos como esses itens lexicais da língua de sinais se juntamem frases. Sintaxe: tipos de frases. A sintaxe estuda a organização das palavras em frases, e as relações que estas estabelecem entre si. Na língua de sinais, a sintaxe está diretamente ligada ao espaço, pois é no espaço em volta do emissor que são estabelecidos pontos representativos de elementos da narrativa. A articulação dos sinais entre esses pontos transmite a mensagem pretendida. Para entender a sintaxe da língua de sinais precisamos primeiramente compreender que os verbos na Libras podem ter concordância ou não. Os verbos TELEVISÃO LIVRO HIPERTEXTO Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 37 sem concordância são sempre executados da mesma forma, veja abaixo alguns exemplos: Os verbos com concordância podem variar a forma de sua execução a fim de concordar com as pessoas do discurso. Veja por exemplo o verbo DAR. GOSTAR COMERAMAR 1SDAR2S 2SDAR1S 1SDAR3S 3SDAR1S 3SDAR2S Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 38 A diferença entre essas formas está na orientação da palma da mão e na direcionalidade do movimento. É interessante notar que geralmente a palma da mão está voltada para quem sofre a ação, enquanto que o dorso da mão está voltado para quem a executa. Ao mesmo tempo, o sinal se movimenta partindo de um ponto no espaço próximo de quem executa a ação e findando próximo de quem sofre a ação. Um outro tipo de concordância possível na língua de sinais é a que concorda com uma localização específica que representa um objeto ou entidade. Nesses casos, esse local é sinalizado antes e depois o verbo é pronunciado levando em conta essa marcação prévia. Veja no exemplo a seguir. PRATELEIRA LIVRO PEGARlivro COLOCAR Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 39 O sinal PRATELEIRA marca um local específico, sinal copo é pronunciado e após há a pronúncia do verbo COLOCAR, que nesse caso incorpora o argumento “livro” representado pela forma arredondada da mão - como se estivesse segurando um livro. O sinal colocar finda no mesmo local onde antes foi sinalizado PRATELEIRA, fazendo assim com que aconteça a chamada concordância espacial. Passemos então agora para o estudo das várias formas que as frases podem assumir na língua brasileira de sinais. Sentenças afirmativas - são aquelas que expressam ideias afirmativas. Saiba mais sobre os verbos na Libras nos links: Disponível em: Aula 01: <http://tvines.ines.gov.br/?p=3304> Aula 02: <http://tvines.ines.gov.br/?p=3848> EU ESTUDAR UEMA Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 40 Sentenças negativas - expressam uma negação. Geralmente tem o sinal NÃO ou NADA presente, mas a negação pode se dar por meio do uso da expressão facial de negação associada ao sinal a ser negado; e em alguns casos pode haver um movimento diferente do sinal, com o objetivo de negar. VOCÊ COMER NÃO EU NÃO-GOSTAR CHOCOLATE ATIVIDADE EU RESPONDERnão Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 41 Sentenças interrogativas - expressam uma pergunta, e são acompanhadas de expressão facial condizente com questionamentos. Perguntas cujas respostas costumam ser “sim” ou “não” são feitas com o queixo para baixo; já perguntas cujas respostas contenham algum conteúdo a mais, são feitas com o queixo para cima. SÃO-LUÍS VOCÊ CONHECER ? VOCÊ CASA ONDE ? Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 42 Sentenças condicionais - estabelecem uma condição para que algo aconteça. Em Libras sempre terão a presença do sinal S-I (se) acompanhado de expressão corporal e facial. SE EU APROVAD@ VIAJAR Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 43 Sentenças relativas - são frases onde há uma inserção de informações adicionais. Nesse tipo de frase ocorre uma quebra da expressão facial, com o levantamento das sobrancelhas. EU IR RESTAURANTE LEMBRAR PASSADO NÓS-2 JUNT@ LÁ EU COMER LÁ Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 44 Sentenças com tópico - São frases em que há uma reorganização dos componentes, gerando uma estrutura em que primeiro se apresenta um tópico, e logo após um comentário sobre ele. CINEMA EU NÃO-GOSTAR Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 45 Sentença com foco - são estruturas que visam dar ênfase a algum ponto da frase, nesses casos há duas possibilidades para enfatizar um ponto: (1) repete- se o termo que se deseja destacar e (2) a expressão de afirmação balançando a cabeça para cima e para baixo acompanha tal termo. EU JÁ RESPONDER EU RESPONDER JÁ JÁ Veja exemplos dos tipos de frases em Libras. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=61iZvkZQAVc> Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 46 3.3 Semântica e Pragmática: pronomes pessoais A semântica estuda os significados das palavras ou expressões em um determinado contexto, bem como as variações que podem aparecer quando essas são utilizadas em um determinado tempo ou espaço. Na Libras, essa variação de significado pode ser bem percebida no uso dos pronomes. Neste tópico estudaremos como os pronomes se apresentam na língua brasileira de sinais. Pronomes pessoais - são aqueles que designam as três pessoas do discurso: quem fala, com quem se fala, e de quem se fala. Na Libras, os pronomes pessoais utilizam a mesma configuração de mão, e podem ser entendidos como a apontação para a pessoa a quem se quer referir. Assim temos: O plural se apresenta incorporando o numeral até o quatro. Depois disso é feito pela incorporação de um movimento circular. Dessa forma, podemos separar em: Dual EU VOCÊ EL@ NÓS-2 VOCÊS-2 EL@-2 Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 47 Trial Quatrial Plural É importante notar que a direção do olhar influencia o significado do pronome, o emissor (primeira pessoa) sempre estará olhando para o receptor (3 pessoas). NÓS-3 VOCÊS-3 EL@-3 NÓS-4 VOCÊS-4 EL@-4 NÓS VOCÊS EL@ Aprenda novos vocabulários nos links. Disponíveis em: Sinais de família <https://www.youtube.com/watch?v=IyP5owQsxS0> Sinais diversos <https://www.youtube.com/watch?v=TqAztLNn7GE> Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 48 Resumo Nesta Unidade, aprendemos sobre vários aspectos gramaticais da Libras. Vimos que os sinais são formados por parâmetros (configuração de mãos, ponto de articulação, movimento, orientação da palma da mão e expressões não manuais). Aprendemos que eles podem derivar pela mudança do movimento e das expressões faciais; e que podem se juntar para compor novos sinais por meio dos processos de justaposição ou aglutinação. Vimos ainda que, as expressões faciais são importantes na percepção dos diferentes tipos de frases. E que os pronomes na libras estão divididos em singular, dual, trial, quatrial e plural. Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 49 UNIDADE ENSINO, APRENDIZAGEM E INTERAÇÃO Objetivos: Reconhecer a Libras como língua de comunicação e expressão da comunidade surda brasileira; Entender que a comunidade surda possui peculiaridades culturais e identitárias. 4 4.1 Português como segunda língua na modalidade escrita no ensino e aprendizagem de estudantes surdos bilíngues Como você viu na Unidade 1, os surdos vivenciaram várias formas de ensino, e por muito tempo foram educados na perspectiva da filosofia de educação oralista. Nessa abordagem, os surdos aprendiam com base na língua oral, aqui no Brasil, o Português falado. Os surdos chegam à escola com somente fragmentos da Língua Portuguesa (visto que não a ouvem, ou tem pouquíssimo resquício auditivo), e a forma como o Português é ensinado na escola beneficia aqueles alunos que já falam a língua e somente recebem instrução sobre suas regras. Assim, era muito difícil para os surdos entenderem essa língua. A nova perspectiva de educação bilíngue prevê a instrução dos surdos baseada na Libras como primeira língua e no Português escrito como segunda língua. Desde a publicação da Lei no 10.436 de 2002, e do Decreto no 5.626 de 2005, muito se discute sobre o ensino de Português como segunda língua para surdos. A língua de sinais, por ser visual-espacial, tem ajudado os surdos a compreender vários assuntos e assim ampliar seu conhecimento demundo. Com isso, já se entende plenamente a importância do ensino da Libras como primeira língua Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 50 para os surdos. Com respeito a ensinar o Português escrito, ainda se encontram algumas dificuldades Ao adentrar a escola, a criança surda, que geralmente é filha de pais ouvintes que não sabem a língua de sinais, não raro chega sem uma língua. Claro que possui uma forma de comunicação criada em casa, mas não é a Libras (pois os pais não conhecem) e nem é a Língua Portuguesa (pois ele não consegue acessar essa língua sem a audição). A proposta de educação bilíngue visa elucidar essa problemática apresentando a Libras aos surdos como sua primeira língua, de forma que através dessa ele possa adquirir a segunda, o Português escrito. Pois, na escola, esse aluno vivenciará práticas de escrita que envolvem a Língua Portuguesa. É importante também entender que ler não é somente decodificar letras, evolve a interpretação das ideias expressas por escrito. O texto é uma ferramenta de interação, e para que ela aconteça é importante se certificar que os interlocutores estejam entendendo o que é falado. Portanto, o ensino de Português para surdos deve ser voltado para o uso da língua, e não para a simples instrução das regras da língua, como diz Pereira (2014, p. 147): Com base na concepção discursiva de língua, o objetivo no ensino da Língua Portuguesa para os alunos surdos, como para os alunos ouvintes, deve ser a habilidade de produzir textos e não palavras e frases, daí a importância de se trabalhar muito bem o texto, inicialmente na Língua Brasileira de Sinais. Para isso cabe ao professor traduzir os textos ou partes deles para a língua de sinais e vice-versa, bem como explicar e esclarecer aspectos sobre a construção dos textos. As explicações devem ser dadas numa perspectiva contrastiva, na qual as diferenças e as semelhanças entre a Língua Brasileira de Sinais e a Língua Portuguesa sejam elucidadas. Desta forma, os alunos vão observar como uma mesma ideia é expressa nas duas línguas. Esta prática serve de base para os alunos formularem suas hipóteses sobre o funcionamento das duas línguas. Essa operação mental para entender um texto exigirá do aluno surdo que ele relacione a informação à qual está sendo apresentado com a que ele já retém na mente. Assim quanto mais amplo seu conhecimento de mundo, melhor será seu entendimento da língua escrita, e assim ele poderá levantar hipóteses mais sólidas sobre seu funcionamento. Daí nota-se como a Libras é importante no aprendizado da Língua Portuguesa. É importante que desde bem cedo os professores proporcionem às crianças Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 51 surdas o acesso à Língua Portuguesa escrita, contando histórias mesmo em língua de sinais, e depois mostrando o mesmo conto em português, relacionando as palavras e sinais às imagens que são comuns em livros infantis. Os surdos se baseiam na visão para apreender informações, seja por meio das imagens, da língua de sinais ou da língua escrita. 4.2 Cultura, comunidade e identidade surda Há muitos conceitos sobre cultura, e isso torna a discussão sobre cultura surda ainda mais acirrada. Nesta Unidade, adotaremos o conceito de cultura como conjunto de significados e práticas simbólicas partilhado por um determinado grupo, transmitido e refeito entre diferentes gerações. Mas ressaltamos que não vemos a cultura como um estado pronto, estagnado e imutável; mas sim como um processo dinâmico que muda a partir das relações da comunidade que compartilha esse conjunto de práticas. Assim é cumulativa, pois novas práticas e valores são atrelados à medida que as interações desse grupo acontecem. A noção de uma cultura dos surdos parte de uma visão socioantropológica desse grupo minoritário. Essa visão é um tanto incomum visto que historicamente os surdos forram vistos e classificados de por conta da sua diferença física – a ausência da audição – e não por sua diferença social, como preferem ser vistos. Nesse novo prisma, entende-se que os surdos são uma minoria linguística que tem uma percepção do mundo diferenciada. Sua forma de compreender e expressar a realidade se dá pela sua experiência visual e pelo uso da língua de Leia mais sobre o ensino de Português para surdos em: PEREIRA, M. C. C. O ensino de português como segunda língua para surdos: princípios teóricos e metodológicos. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, Edição Especial n. 2/2014, p. 143-157. Editora UFPR. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/er/nspe-2/11.pdf> Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 52 sinais, que é de modalidade visual-gestual. Além disso, os surdos possuem a comunidade surda como espaço que privilegia essas experiências. Assim, a cultura surda é um conjunto de práticas e produções específicas que determinam um espaço de reafirmação linguística, política e histórica. Esse conceito é uma forma de resistência à visão patológica sobre a surdez, e também um posicionamento político dos surdos que valoriza sua língua e seu potencial pautado na diferença. O meio no qual esses valores são propagados é chamado de comunidade surda. Essa comunidade é o espaço (não somente físico) em que se partilham a experiência visual e a língua de sinais, e é frequentado por surdos e ouvintes que utilizam a essa língua. Normalmente, se realiza em locais como: associações de surdos, instituições de ensino e religiosas, festas, pontos de encontro e ambientes virtuais. Nessa comunidade encontram-se surdos em suas diferentes identidades. De acordo com Gadis Perlin, pesquisadora surda brasileira, há uma diversidade complexa de identidades surdas. Por conta de suas diferentes vivências, os surdos não são homogêneos, assim como os ouvintes. A autora lista sete identidades observadas dentre os surdos. Observe: 1 Identidade Surda (política) – surdos com experiência visual que determinam formas de comportamento; se expressam sempre usando a língua de sinais; se aceitam como surdos; lutam politicamente pela aceitação da sua diferença, pela necessidade de interpretes e de educação diferenciada; utilizam tecnologias adaptadas aos surdos; assumem posição de resistência; utilizam pouco a língua oral, por não a compreenderem muito bem; 2 Identidade Surda Híbrida – aqueles que nascem ouvintes e por alguma causa perdem a audição; dependendo da idade em que ficaram surdos, conhecem bem a língua oral e utilizam as duas línguas na comunicação; se aceitam como surdos e lutam pelas mesmas causas dos surdos políticos; 3 Identidade Surda Flutuante – são sujeitos que apesar de serem surdos não tem contato com a comunidade surda; seguem a representação da identidade ouvinte; falam Português e orgulham-se disso; têm resistência à língua de sinais e à presença de interpretes; buscam igualdade com os ouvintes; 4 Identidade Surda Embaraçada – indivíduos que não conseguem captar a representação da identidade surda, nem tampouco da ouvinte; se comunicam Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 53 por gestos, as vezes incompreensíveis; não usam a língua de sinais; estão em uma situação de incapacidade; muitas vezes são aprisionados pelas famílias; 5 Identidade Surda de Transição – surdos que devido à sua condição social tem um contato tardio com a comunidade surda e antes disso viviam como ouvintes; estão transitando entre as identidades, passando da comunicação oral/auditiva para a comunicação visual/gestual, da identidade ouvinte para a surda, por isso ainda carregam traços visíveis da identidade ouvinte; 6 Identidade Surda de Diáspora – surdos que se mudam de um país para outro, ou mesmo de uma região ou estado para outro; também estão em transição, se adaptando à cultura surda local, à língua de sinais diferente ou às variações da mesma língua; e 7 Identidades Surdas Intermediárias – pessoas com uma característica particular que as impede de assumir uma identidade surda, a sua percepção não é somente visual; assume a importânciado uso de aparelho de audição e de amplificação sonora, e do treinamento oral; usa a língua de sinais esporadicamente, sua comunicação se dá principalmente por meio da língua oral. Resumo Nesta Unidade, vimos que a política de educação bilíngue para surdos prevê que eles aprendam primeiro a língua de sinais, e por meio dessa ampliem seu conhecimento de mundo, o que vai auxiliar no aprendizado da Língua Portuguesa escrita. Também aprendemos que eles possuem uma forma diferente de perceber e expressar a realidade, e por isso possuem uma cultura diferenciada. Os surdos e os ouvinte que usam a Libras se reúnem na comunidade surda. Mesmo entre eles há diferenças de identidades. Saiba mais sobre a cultura surda no site. Disponível em: <www.culturasurda.net> Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS 54 Referências BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 2005. BRITO, Lucinda Ferreira. Por uma gramática de línguas de sinais. 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