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Historia_Militar_2016

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HISTÓRIA MILITAR
CAS
201
Cruz Alta - RS
201
Exército Brasileiro - EB
Escola de Aperfeiçoamento de Sargentos das Armas - EASA
Seção de Educação a Distância - SEAD
Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos - CAS 1ª Fase
6
4
Copyright © 2013 Escola de Aperfeiçoamento de Sargentos das Armas
Todos os direitos reservados à Escola de Aperfeiçoamento de Sargentos
das Armas.
Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, armazenada ou
transmitida de qualquer forma ou por quaisquer meios – eletrônico, mecânico,
fotocópia ou gravação, sem autorização da Escola de Aperfeiçoamento de
Sargentos das Armas.
Créditos
Capa: Rafael Fontenele
Projeto gráfico e diagramação: Guido da Silva Godinho
Revisão: Ana Maria Andrade Araujo
Heloisa Cardoso de Castro
Escola de Aperfeiçoamento de Sargentos das Armas (EASA)
Rua Benjamin Constant 1217, Centro - Cruz Alta - RS
CEP 98025-110
Tel (55) 3322 7824
História Militar. EDUARDO HENRIQUE DE
SOUZA MARTINS ALVES - Cel R/1.
Revisado por AIRTON 
201 .
248p. – (Curso de Aperfeiçoamento de
Sargentos).
ZENKNER
PETERSEN - 1º Ten QAO – Cruz Alta: EASA,
4
3
APROVAÇÃOAPROVAÇÃO
O Comandante da Escola de Aperfeiçoamento de Sargentos das Armas,
com base no Inciso III do Art 7° do Regulamento da EASA (R-64), de 19 Ago
2010, resolve:
- Aprovar para fins escolares, complementando as necessidades de
ensino da escola, a publicação "História Militar" - edição 201 .
Cruz Alta, RS, 29 de abril de 201 .
4
4
5
SUMÁRIOSUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................. 9
1. A ARTE DA GUERRA E O PENSAMENTO MILITAR ..................................................9
2. A DOUTRINA MILITAR BRASILEIRA ..................................................................13
CAPÍTULO I – COLONIZAÇÃO: A PARTILHA DAS AMÉRICAS ..................................... 15
1. ESTRUTURAS DO SISTEMA COLONIAL ................................................................15
2. A COLONIZAÇÃO DA AMÉRICA DO NORTE ..........................................................20
3. A FRANÇA NAS AMÉRICAS ..........................................................................22
CAPÍTULO II – BRASIL COLÔNIA (1530-1808) .............................................. 25
1. A OCUPAÇÃO EFETIVA DA COLÔNIA E O EMPREENDIMENTO CANAVIEIRO ..........................25
2. O TRABALHO COMPULSÓRIO: A ESCRAVIDÃO INDÍGENA E O TRÁFICO NEGREIRO ...................27
3. O BRASIL SUBMISSO À UNIÃO IBÉRICA (1580-1640) ...........................................29
4. A EXPANSÃO DA OCUPAÇÃO PORTUGUESA PARA ALÉM DO TRATADO DE TORDESILHAS ........31
5. A DESCOBERTA DO OURO: UM NOVO CICLO ECONÔMICO ...........................................33
6. REVOLTAS NATIVISTAS ...............................................................................34
7. REVOLTAS COLONIAIS ................................................................................36
8. OS TRATADOS DE LIMITES: A NOVA FIXAÇÃO DE FRONTEIRAS .....................................37
CAPÍTULO III – O SÉCULO XIX NAS AMÉRICAS............................................... 41
1. O PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA NAS AMÉRICAS ...................................................41
2. TEORIAS DE PAN-AMERICANISMO E COOPERAÇÃO HEMISFÉRICA ...................................48
3. CONSTRUÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS ...............................................................49
4. A FORMAÇÃO DO ESTADO NORTE-AMERICANO E SUA CRISE: A GUERRA CIVIL ...................51
CAPÍTULO IV – BRASIL IMPÉRIO: FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (1808-1889) ........ 57
1. A CRISE DO COLONIALISMO PORTUGUÊS E O PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA ......................57
2. CONSTRUÇÃO DA NOVA ORDEM NO IMPÉRIO .......................................................62
3. A POLÍTICA ADMINISTRATIVA DO IMPÉRIO ...........................................................65
4. CRISE E CONSOLIDAÇÃO DO IMPÉRIO ................................................................66
5. A POLÍTICA EXTERNA DO IMPÉRIO DO BRASIL ......................................................70
6. ECONOMIA E TRABALHO EM TRANSIÇÃO ............................................................75
7. O FIM DO IMPÉRIO ....................................................................................76
CAPÍTULO V – A PRIMEIRA REPÚBLICA NO BRASIL (1889-1930) ......................... 79
1. REPÚBLICA DA ESPADA ...............................................................................79
2. REPÚBLICA DAS OLIGARQUIAS ........................................................................84
CAPÍTULO VI – SEGUNDA GUERRA MUNDIAL: DO CONFLITO TRADICIONAL À ERA NUCLEAR . 101
1. ITÁLIA SOB FASCISMO ................................................................................101
2. NAZISMO NA ALEMANHA .............................................................................104
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
6
3. AVANÇO DOS REGIMES TOTALITÁRIOS NA PENÍNSULA IBÉRICA ....................................109
4. MILITARISMO JAPONÊS ...............................................................................113
5. PRIMEIRA FASE DA GUERRA: O AVANÇO DO EIXO ROMA-BERLIM (1939-1942) ...............114
6. SEGUNDA FASE DA GUERRA: VITÓRIA DOS ALIADOS (1942-1945) .............................117
7. A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU) E A DIVISÃO DA ALEMANHA ...................122
CAPÍTULO VII – BRASIL: DA REVOLUÇÃO DE 1930 AO FIM DO ESTADO NOVO (1930-
1945) .......................................................................... 125
1. REVOLUÇÃO DE 1930 ...............................................................................125
2. O PROCESSO CONSTITUINTE (1933/1934) E AS OPÇÕES POLÍTICAS ...........................128
3. CONTESTAÇÃO AO REGIME: REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA DE 1932........................129
4. FECHAMENTO DO REGIME .............................................................................130
5. O ESTADO NA ECONOMIA ............................................................................133
6. MILITARES E GOVERNO ...............................................................................134
7. SOCIEDADE E CULTURA ...............................................................................136
8. O BRASIL NA II GUERRA MUNDIAL .................................................................136
9. A CRISE DO ESTADO NOVO E A QUEDA DE VARGAS (1945) ....................................139
CAPÍTULO VIII – BRASIL: A SEGUNDA REPÚBLICA (1945-1964) .......................... 141
1. A REDEMOCRATIZAÇÃO E O GOVERNO DUTRA (1946-1951) ...................................141
2. OS PARTIDOS POLÍTICOS .............................................................................143
3. O SEGUNDO GOVERNO VARGAS ....................................................................143
4. A CRISE DE 1954 E AS INSTITUIÇÕES REPUBLICANAS .............................................145
5. JUSCELINO KUBITSCHEK - JK ........................................................................146
6. O GOVERNO JÂNIO QUADROS E A CRISE DA COALIZÃO CONSERVADORA ........................148
7. SINDICALISMOS URBANO E RURAL ...................................................................149
8. JOÃO GOULART ......................................................................................150
9. A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE FACE À GUERRA FRIA .......................................151
CAPÍTULO IX – BRASIL: OS GOVERNOS MILITARES (1964-1985) ........................... 155
1. A CRISE DO TRABALHISMO, A RADICALIZAÇÃO DA ESQUERDA E O MOVIMENTO CIVIL MILITAR DE
1964 ...............................................................................................155
2. AS RELAÇÕES ENTRE OS GOVERNOS MILITARES E OS PARTIDOS POLÍTICOS .....................156
3. O PAPEL DA ESG E OS PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO ........................................157
4. CASTELLO BRANCO E COSTA E SILVA ..............................................................158
5. O AI-2 E O BIPARTIDARISMO: ARENA E MDB ..................................................1596. A JUNTA MILITAR E O GOVERNO MÉDICI - A ESQUERDA REVOLUCIONÁRIA, A LUTA ARMADA E O
ENDURECIMENTO DO REGIME .........................................................................162
7. O MILAGRE ECONÔMICO .............................................................................163
8. CLASSE MÉDIA, CONSUMO E TELEVISÃO ...........................................................164
9. GOVERNO GEISEL - PROJETO DE MODERNIZAÇÃO: AVANÇO TECNOLÓGICO E OPÇÃO NUCLEAR .....165
10. GOVERNO FIGUEIREDO - ABERTURA DEMOCRÁTICA, CRISE E ESTAGNAÇÃO .......................167
11. POLÍTICA EXTERNA - DO ALINHAMENTO AUTOMÁTICO AO PRAGMATISMO RESPONSÁVEL ........168
12. NOVOS ATORES SOCIAIS E POLÍTICOS ............................................................170
CAPÍTULO X – A NOVA REPÚBLICA NO BRASIL: DE 1985 AOS DIAS ATUAIS............... 173
1. A MOBILIZAÇÃO PELAS ELEIÇÕES DIRETAS E A ELEIÇÃO DE TANCREDO NEVES ...................173
7
2. JOSÉ SARNEY (1985-1989) ......................................................................174
3. FERNANDO COLLOR DE MELLO (1990-1992) ....................................................175
4. ITAMAR FRANCO (1992-1994) E A INTERINIDADE DA NOVA REPÚBLICA ........................177
5. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO (1995-2002) ...................................................178
6. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA E A ASCENSÃO DA ESQUERDA (2003-2010) .....................180
7. O PAPEL DO BRASIL PERANTE A INTEGRAÇÃO SUL- AMERICANA ..................................182
8. ATUAÇÃO BRASILEIRA COMO FORÇA DE PAZ .......................................................184
9. RELAÇÕES INTERNACIONAIS: OS NOVOS DESAFIOS ..................................................188
CAPÍTULO XI – A NOVA ORDEM MUNDIAL E O SÉCULO XXI .............................. 193
1. O MUNDO PÓS-GUERRA FRIA .......................................................................193
2. GRANDES BLOCOS REGIONAIS .......................................................................195
3. HEGEMONIA DOS ESTADOS UNIDOS ..................................................................197
4. CRIMES ORGANIZADOS TRANSNACIONAIS ...........................................................198
5. TERRORISMO INTERNACIONAL ........................................................................120
6. AMÉRICA DO SUL .....................................................................................202
7. DIREITOS HUMANOS COMO FATOR DE POLÍTICA INTERNACIONAL ..................................205
8. RELAÇÕES INTERNACIONAIS: SURGIMENTO DA MULTIPOLAR IDADE E EQUILÍBRIO DE PODER PÓS-GUERRA
FRIA ..................................................................................................206
CAPÍTULO XII – A PARTICIPAÇÃO DA FORÇA TERRESTRE NA HISTÓRIA NACIONAL ......... 209
1. DURANTE A COLÔNIA .................................................................................209
2. DURANTE A MONARQUIA .............................................................................218
3. DURANTE A REPÚBLICA ...............................................................................229
4. CAMPANHAS MILITARES EM CONFLITOS EXTERNOS ................................................234
9
1. A Arte da Guerra e o Pensamento Militar
História Militar é o campo da História que permite a reconstituição da Doutrina
Militar, desde a Antiguidade até nossos dias. Ela absorve, também, o
conhecimento sobre a ciência e a arte da guerra utilizada pelos exércitos.
Por esse motivo, a pesquisa e o estudo da evolução da arte da guerra, tanto
em nível mundial como nacional, assumem especial relevância.
O Exército Brasileiro possui, no estudo da História Militar própria e dos
demais exércitos, um manancial de ensinamentos provados, que é a base
do espírito crítico e criador para a promoção do progressivo desenvolvimento
de sua Doutrina Militar.
Clausewitz assim definiu a guerra: [...] nada mais é que um duelo em grande
escala. [...] Um ato de violência que visa a compelir o adversário a submeter-
se a nossa vontade. Preconiza o uso ilimitado da força física, não excluindo
de modo algum a colaboração da inteligência, para atingir o objetivo final
da guerra em si, desarmar o inimigo, submetendo-o à nossa vontade e
destruí-lo (CLAUSEWITZ, 1998, p. 29).
Maquiavel, no cap. XIV, de sua obra O Príncipe (1532), maximizou a
importância do poder militar como instrumento de garantia do poder político
e aconselhava aos governantes:
[...] deve, pois, um príncipe não ter outro objetivo nem outro
pensamento, nem tomar qualquer outra coisa por fazer, senão a
guerra e a sua organização e disciplina, pois que é essa a única
arte que compete a quem comanda. E é ela de tanta virtude, que
não só mantém aqueles que nasceram príncipes, como também
muitas vezes faz os homens de condição privada subirem àquele
posto; ao contrário, vê-se que, quando os príncipes pensam mais
nas delicadezas do que nas armas, perdem o seu Estado.
Acompanhando a história, verificamos que as soluções dos conflitos podem
ocorrer por meio da persuasão, mediante processos diplomáticos; ou pela
coerção, utilizando a capacidade de coagir o poder nacional, o que abrange
desde o emprego dos meios diplomáticos até a guerra declarada.
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
10
1.1 Evolução da Arte da Guerra
Na revolução agrária de 10 mil anos atrás, durante a Pré-história no período
do neolítico ou período da pedra polida, indivíduos de povos caçadores-
coletores notaram que alguns grãos que eram coletados da natureza para a
sua alimentação poderiam ser enterrados, isto é, “semeados” a fim de
produzir novas plantas iguais às que os originaram. A escassez da caça
também contribuiu para que as tribos nômades se fixassem na terra,
gradativamente se tornando camponeses. Tudo isso marca o surgimento da
primeira onda de transformações econômicas e sociais da história humana.
A partir daí têm origem outros aspectos dessas transformações. Vamos
analisá-los, especificamente focalizando a evolução da arte da guerra, no
texto a seguir. (Disponível em: <http://www.professorinterativo.com.br/
cam/historia/tadeu/3onda.htm>.)
A Guerra da Terceira Onda
Alvin e Heidi Tofler
As mídias do mundo estão repletas de descrições de como a
campanha contra o terrorismo afetará a economia global.
Contudo, pouco se diz de como a economia global influenciará
o futuro da guerra.
Em nosso livro War and Antiwar (1993), escrevemos que, quando
surge novo tipo de economia, com todas as circunstâncias
concomitantes, sociais e culturais, muda também a natureza da
guerra. Assim a revolução agrária de 10.000 anos atrás, que
lançou a Primeira Onda de transformações econômicas e sociais
da história humana, introduziu a guerra da Primeira Onda.
A guerra da Primeira Onda foi caracterizada por ataques “hit-
and-run”, com ações visando a resultados específicos, seguidos
de recuo rápido – pequenos ataques – e violência cara-a-cara, o
confronto direto. Os camponeses, tipicamente, não lutavam por
uma nação, mas por um líder militar supremo que os remunerava,
geralmente, apenas com alimentação. Os soldados travavam a
maioria dos combates durante o inverno, quando não eram
necessários na lavoura. As campanhas eram de curta duração. A
organização era imprecisa, nivelada e com características de rede.
A coesão das unidades era sólida, com membros da família
frequentemente lutando lado a lado. A comunicação entre si era
principalmente por contato pessoal. Os homens lutavam pela
“honra” do macho, para mostrar coragem. A guerra era pessoal.
11
Mesmo quando compartilhavam uma religião ou ideologia
fanática, muitas unidades militares eram subornáveis e podiam
mudar de lado.
A história apresenta numerosas exceções ao padrão genérico,
mas essa foi de fato, por milhares de anos, a forma predominante
de guerra em todo o mundo. Essa guerra da Primeira Onda é hoje
o que os afegãos melhor sabem fazer.
A revolução industrial, segunda grande onda de mudanças sociais
e econômicas da história, trouxe consigo uma forma de guerratotalmente nova: a guerra da Segunda Onda. A era da máquina
criou a metralhadora. A produção em massa tornou possível a
destruição em massa. O recrutamento criou exércitos
massificados. A tecnologia padronizou o armamento. Soldados
e oficiais receberam treinamento. A organização tornou-se
burocrática. O controle passou a ser feito de alto a baixo, por
graduações sucessivas de oficiais. Os sistemas de armas ficaram
cada vez maiores e mais letais – porta-aviões, formações blindadas,
frotas de bombardeios, mísseis nucleares.
Depois de sua derrota no Vietnã, contudo, as forças militares
dos EUA, paralelamente à economia, afastam-se da fabricação
em massa, começam a desenvolver a nova forma de guerra da
Terceira Onda, que se afastou das antigas concepções industriais
sobre a guerra em massa. Tanto a economia quanto as forças
militares necessitaram de uma vasta infraestrutura eletrônica.
A guerra da Terceira Onda, como escrevemos em War and Anti-
War, depende menos de ocupação territorial e mais da “supremacia
da informação”. Esta supremacia pode significar a destruição do
sistema de comando e controle do inimigo ou seus equipamentos
de radar e vigilância. Mas requer também conhecermos mais sobre
o adversário do que ele sabe sobre nós. Significa privá-lo de
“olhos e ouvidos” – tecnológicos e humanos – e significa supri-
lo de informações que enganem seus planejadores e modelem
suas suposições estratégicas, para tirar proveito dos erros deles.
Significa também, como prevíamos então, dar mais destaque à
“guerra de nichos” – operações especiais, aviões robôs, armas
inteligentes, miras de precisão, forças de reação rápida e “coalizões
profundas” que vão além de um conjunto de nações, incluindo
corporações, organizações religiosas, ONGs e outros parceiros,
visíveis ou encobertos.
Acima de tudo a guerra da Terceira Onda, segundo escrevemos,
exigiria uma profunda reestruturação dos serviços de inteligência,
distanciando-se do destaque dado pela Segunda Onda ao caráter
de massas, salientando a captação de dados por meios técnicos,
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
12
maior dependência de espiões humanos, captação de dados com
metas prédeterminadas, análises muito melhores, maior contato
com “clientes” e maior participação deles, disseminação mais
rápida das “ramificações” existentes e um uso muito mais
sofisticado das informações não confidenciais de “fonte aberta”
disponíveis na Internet, imprensa, televisão e outros veículos de
comunicação.
As agências de captação de informações, escrevemos, precisariam
também fazer uso dos sistemas de software que pudessem
“concentrar a atenção em grupos terroristas, buscando relações
ocultas em múltiplas bases de dados ... Presumivelmente,
combinando tais dados com informações extraídas de contas
bancárias, cartões de crédito, listas de assinantes e outras fontes,
esses softwares podem ajudar a apontar com precisão grupos –
ou indivíduos – que se encaixem num perfil terrorista”.
Evidentemente, a forma de guerra da Terceira Onda se equipara
melhor ao desafio do Afeganistão, seus terroristas e seus fascistas
religiosos do que com a antiga forma de guerra da Segunda
Onda que ajudou os EUA a ganhar a guerra fria.
O Taleban controla (parcialmente) um país que nem sequer
completou a transição da Primeira Onda, da existência nômade
para uma economia agrária. Contudo, ironicamente, os terroristas
que ele apoia se estendem pelo mundo e fazem uso oportunista
de tecnologias da Terceira Onda – cartões de crédito, Internet,
sistemas de viagem integrados, simuladores de vôo sofisticados
e muito mais – na esperança de finalmente restaurar o mundo
islâmico do século VII.
A coalizão mundial antiterror organizada pelos Estados Unidos e
as Nações Unidas contêm países com economias de todos os
diferentes níveis de desenvolvimento, Primeira Onda, Segunda
Onda e Terceira Onda.
O que vemos hoje, entretanto, no absoluto contraste entre o
Afeganistão e a América, não é o choque de religiões, mas um
conflito de “ondas” – a primeira guerra da Primeira Onda contra
a Terceira Onda, claramente definida.
Mídias do mundo estão repletas de descrições de como a
campanha contra o terrorismo afetará a economia global.
Contudo, pouco se diz de como a economia global influenciará
o futuro da guerra.
Em nosso livro War and Antiwar (1993), escrevemos que, quando
surge novo tipo de economia, com todas as circunstâncias
concomitantes, sociais e culturais, muda também a natureza da
13
guerra. Assim a revolução agrária de 10.000 anos atrás, que
lançou a Primeira Onda de transformações econômicas e sociais
da história humana, introduziu a guerra da Primeira Onda.
Como se observa, modifica-se o conceito de guerra conforme evoluem os
Estados e suas instituições. Assim, se, por um lado, o pensamento liberal
predominante e a disseminação da democracia no mundo, no início do
século XXI, subordinaram a guerra aos interesses políticos, pressionados
estes pela força da opinião pública, da mídia e de órgãos não-governamentais,
em oposição, a subordinação da guerra à religião mesclada aos interesses
políticos - já verificados em outras épocas - renasce sob forma muito
perigosa, aliando-se a regimes teocráticos, sob a égide do fundamentalismo
de qualquer matiz, para promover a guerra santa, a guerra de quarta geração.
2. A Doutrina Militar Brasileira
Para efeito didático incluímos como Exército Brasileiro todas as Forças
Terrestres Brasileiras (FTB), do descobrimento à independência, das quais
ele é o herdeiro e o repositório, seja das tradições, seja do patrimônio
histórico-cultural acumulado por aquelas Forças.
A História do Exército Brasileiro encerra o conceito de história da arte e
ciência da guerra do Exército Brasileiro. E mais, o de história da doutrina do
Exército Brasileiro, aqui entendida como o princípio pelo qual o Exército,
desde o descobrimento até o presente, vem sendo organizado, equipado,
instruído, desenvolvidas suas forças morais e empregado em lutas internas
e externas. A História do preparo do Exército ou das FTB (organização,
equipamento, instrução e desenvolvimento das forças morais), sem muito
rigor, seria a História da Ciência da Guerra do Exército Brasileiro.
Referências
BRASIL. Exército Brasileiro. Academia Militar das Agulhas Negras. Estudo
de História Militar. v. 1. 2003.
________. História do Exército Brasileiro. Bibliex, 1974.
CLAUSEWITZ, Carl Von. Da guerra. Tradução de Inês Busse. [S.L.]:
Publicações Europa-América, 1988.
MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. Disponível em: <http://
www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000052.pdf >.
15
CAPÍTULO 1CAPÍTULO 1
Colonização:
a partilha das Américas
1. Estruturas do Sistema Colonial
As estruturas colonialistas e as relações estabelecidas entre as metrópoles
europeias e suas colônias americanas modificaram-se com o passar do tempo e
de acordo com os acontecimentos vividos nas diferentes nações colonizadoras.
As relações metrópole-colônia também foram influenciadas pelas relações
desenvolvidas entre as potências (sejam coloniais ou não). A distinção dos projetos
coloniais de cada potência definia de que forma as metrópoles iriam se relacionar
com suas colônias e seus habitantes locais (nesse caso, os indígenas).
 As regras vigentes para o mercantilismo foram norteadoras para as atividades
coloniais. A busca era por metais preciosos. O metalismo constituía fator
determinante para a consolidação do Estado-nação nascente. O monopólio
comercial ou, no caso específico, colonial, era chamado de “exclusivo
comercial”. Este adotou formas diversas de acordo com o período e consistia
na seguinte lógica: para enriquecer o país era necessário não permitir que
os demais também o fizessem, garantindo o maior número de moedas em
circulação dentro da nação.
Na maior parte dos casos a colonização se deu por intermédio das grandes
propriedades, utilizando-se de mão de obra escrava. A estrutura do sistema
colonialista buscava uma relação bastante clara: a colônia deveria fornecer
matéria-prima à metrópole e, ainda, gerar um mercadoconsumidor,
colaborando assim para uma balança comercial favorável.
Por sua vez, os povos colonizados tiveram que aceitar a autoridade do
Estado colonizador, pacificamente ou não. Nesse sentido, os países católicos
possuíam uma forte aliada: a Igreja, que tratava de impor efetivamente
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
16
preceitos e sucessivamente os do Estado. Porém, até mesmo a relação
Estado–Igreja foi abalada em determinado momento.
1.1 A América Portuguesa
Foram os portugueses os pioneiros nas grandes navegações e sucessivamente
na colonização da América. Foram, ainda, os primeiros a transferir recursos
humanos e financeiros da Europa para uma colônia, com o intuito de torná-la
rentável. Inicialmente, o atrativo encontrado pelos lusos foi a comercialização
do pau-brasil, que utilizou o escambo (troca sem uso de dinheiro) e a mão de
obra indígena. Para isso foram instaladas na costa brasileira as feitorias, lugares
que funcionavam como depósito da madeira que seria enviada parte para
Portugal e parte negociada pelos participantes do consórcio de exploração.
A madeira não despertou o interesse somente de portugueses. Franceses
também vieram atrás do pau-brasil, pois toda a Europa importava esta matéria-
prima do Oriente. Portugueses e franceses se associaram às diferentes tribos
indígenas, que já possuíam relações conflituosas entre si. Os franceses se
valeram desses conflitos para estabelecer concorrência com Portugal. Em
função do novo cenário, Portugal sentiu a necessidade de povoar as terras
brasileiras, para que fosse garantida sua posse:
[...] O Brasil foi arrendado por três anos a um consórcio de
comerciantes de Lisboa, liderado pelo cristão-novo Fernão de
Noronha ou Noronha, que recebeu o monopólio comercial, obrigando-
se em troca, ao que parece, a enviar seis navios a cada ano para
explorar trezentas léguas (cerca de 2 mil quilômetros) da costa e
construir uma feitoria [...]. (FAUSTO, 2003).
Foi no ano de 1530 que se deu a efetiva ocupação da colônia, por meio da
implantação do sistema de capitanias hereditárias, já utilizado pelos
portugueses, com êxito, nas ilhas da Madeira e dos Açores (costa africana).
Nesse momento, o Brasil foi dividido em quatorze ou quinze capitanias
hereditárias (a própria historiografia é divergente quanto ao número exato).
Essas faixas de terras foram concedidas a donatários, que, por sua vez,
poderiam distribuir terras aos colonos – as chamadas sesmarias1. Primeiramente
foram doadas as terras e tudo que nelas contivesse; em um segundo momento
os donatários foram obrigados a pagar em impostos. Era dever dos donatários
povoar e desenvolver o território, o que necessitava de investimento. Alguns
1 Por meio da Carta de Doação, o Donatário tinha o direito de distribuir terras para a produção
agrícola, aos colonos que viessem a se estabelecer na sua Capitania. (ARRUDA; PILETTI, 2007).
Capítulo 1 – Colonização: a partilha das Américas
17
donatários sequer chegaram ao Brasil para tomar posse da terra, outros tantos
não tiveram sucesso. O destaque ficou por conta da capitania de Pernambuco
- uma das poucas que obteve sucesso e desenvolvimento econômico.
Já na terceira fase da colonização, foi criado o Governo-Geral2. As pretensões da
Coroa portuguesa pouco tinham mudado: o povoamento era ainda seu objetivo
principal, porém, centralizando a política e a administração das capitanias que
agora passavam para as mãos reais3. Foram criados cargos administrativos nos
setores: jurídico, de defesa e de finanças, superiores aos donatários. A capitania
da Bahia foi a primeira capitania real escolhida para ser a sede do Governo-Geral.
Mapa das Capitanias Hereditárias
Fonte: ARRUDA; PILETTI, 2007.
2 Diante do fracasso do sistema de capitanias, foi criado em 1548 o Governo-Geral no Brasil. O
Governo-Geral tinha como objetivo a centralização política e administrativa, sem abolir o sistema
de capitanias. (ARRUDA; PILETTI, 2007).
3 Haveria, por certo, um novo incentivo para o desenvolvimento da atividade econômica e um
controle maior sobre o território colonial português no Brasil. (ARRUDA; PILETTI, 2007).
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
18
Tomé de Souza tornou-se o primeiro governador-geral. Esse foi o momento
da chegada dos jesuítas ao território brasileiro e o início da catequização do
indígena, projeto que teve continuidade nos outros governos. Jesuítas e o
próprio Governo-Geral entraram em conflito direto com os donatários, em
função da mão de obra indígena utilizada no período. A aceitação do governo
não foi total. Alguns donatários questionaram as modificações, alegando
que vinham de encontro aos acordos anteriormente firmados (capitanias
hereditárias).
Uma colônia de exploração, sem comercialização interna, nem comunicação
eficaz entre as capitanias. Este é o retrato do Brasil no século XVI, o que
dificultou a efetiva centralização de poder, que na prática estava nas mãos
dos componentes das Câmaras Municipais (em torno de três cargos de
vereador ocupados pela elite local). Na tentativa de sanar as dificuldades
encontradas para centralizar o poder nas mãos da Coroa, o poder da
metrópole dividiu o território brasileiro em dois Governos-Gerais: o do Norte
e o do Sul, o que também não deu certo, havendo o retorno ao modelo
anterior.
1.2 A América Espanhola
Foi com a exploração colonial que os espanhóis se tornaram uma potência
europeia no século XVI. A mineração foi a principal fonte de rentabilidade
das colônias espanholas, que praticaram fortemente o “exclusivo comercial”,
obrigando os colonos a negociarem somente com a metrópole.
A organização político-administrativa e territorial da América espanhola deu-
se com a divisão de suas terras em vice-reinos e capitanias-gerais. Foram os
Vice-Reinos do Rio da Prata, Nova Granada, Peru e Nova Espanha, e as
capitanias do Chile, Cuba, Flórida, Guatemala e Venezuela.
No caso espanhol, a Igreja Católica também procedeu à catequização do
indígena em dois vice-reinos, o que não aconteceu com colônias portuguesas.
Podemos entender a Igreja Católica como legitimadora do poder do Estado,
atribuindo a ele, inclusive, o poder divino (não podemos esquecer que
estávamos vivendo o absolutismo na Europa). As ações dos reis católicos
Isabel I de Castela e Fernando II de Aragão, fossem quais fossem, foram
justificadas pela Igreja. Porém, a busca de enriquecimento rápido do Estado
espanhol se contrapunha ao discurso católico, o que posteriormente provocou
desacordo entre ambos.
Capítulo 1 – Colonização: a partilha das Américas
19
Mapa da América Espanhola
Fonte: ARRUDA; PILETTI, 2007.
As primeiras tentativas de explorar as colônias foram por meio de troca com
os habitantes locais. Em um segundo momento a escravidão chegou a ser
praticada, porém não teve boa aceitação por parte dos espanhóis. Outras
motivações políticas, religiosas e principalmente administrativas da colônia
fizeram os reis logo tratarem de suspender o tráfico de escravos e declarar
que colonos americanos eram livres. Visualizamos no mapa anterior a
composição da América espanhola (ARRUDA; PILETTI, 2007). O intuito da
Coroa era não permitir que colonos aqui instalados construíssem um grande
poder local.
Os regimes de trabalho aplicados a partir de então assumiram diversas formas
e nomes, porém ficaram evidentes as semelhanças com o escravismo, que
minimamente podemos chamar de trabalho compulsório. Como o objetivo
espanhol era extrair o máximo de riqueza das terras americanas no menor
tempo possível, continuava a valer-se da escravidão agora indígena como
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
20
fonte de mão de obra, muito parecida com a escravidão africana. Porém,
aqui, esta forma de trabalho recebeu o nome de encomienda (que poderia
ser de trabalho ou de tributos). Os colonos podiam explorar os indígenas
(certo número por colono) e tinham por obrigação convertê-los ao
cristianismo.
Outra forma de trabalho foi o repartimiento, no qual determinado número
de nativos era distribuído para os funcionários reais, com o intuito de aumentar
seusrendimentos. Posteriormente surgiu a mita, que consistia em uma
rotatividade de trabalhadores, surgida quando foram descobertas as minas
de metais preciosos em colônias espanholas (nas regiões atuais do México
e do Peru). Nesse novo regime de trabalho, os nativos trabalhavam - ou
pelo menos deveriam trabalhar - uma semana e descansar duas. Na prática
não era exatamente o que ocorria. Esse regime levou à morte grande número
de indígenas. Ainda em função da descoberta de minas, surgiria outra forma
de trabalho: o cuatequil, em princípio muito semelhante à mita.
Decorrente da falta de atenção ao setor, a América espanhola sofreu
diretamente com a crise de abastecimento de alimentos, fato que também
ocorria na Europa. Os colonizadores preocupavam-se apenas com metais e
deixaram o campo abandonado à própria sorte. O indígena era retirado da
terra produtiva para trabalhar nos regimes forçados destinados ao
enriquecimento do Estado, o que colaborou para o agravamento do problema,
associado ao crescente número de espanhóis que migravam para região.
Posteriormente, os mineradores visualizaram na agricultura um negócio
rentável e a ela se voltaram.
2. A Colonização da América do Norte
A colonização inglesa, parte da “colonização tardia”, como são conhecidas
aquelas que se deram depois da portuguesa e da espanhola, teve início em
meados do século XVII. Os ingleses detiveram-se na América do Norte, que,
por sua vez, foi dividida em três regiões: as colônias inglesas do Sul, as do
Centro e as do Norte.
Os colonos ingleses que povoaram a região não vieram em missão de
converter ou catequizar como portugueses e espanhóis. A tolerância religiosa
(quando a religião era cristã) era preceito na Nova Inglaterra. Não poderia
ser diferente, visto a perseguição praticada por adeptos da Igreja Anglicana
às demais religiões. Este foi um dos fatores que determinou a transferência
de parte da população inglesa para a América do Norte.
Capítulo 1 – Colonização: a partilha das Américas
21
Aqueles que se estabeleceram na região pretendiam permanecer e não apenas
lucrar com as atividades que a colônia pudesse desenvolver. Desenvolveram
uma colônia de povoamento. A Inglaterra não praticava o “exclusivo
comercial”, o que já a diferençava dos demais modelos colonizadores. Os
colonos que se instalaram na região podiam comercializar com outros países.
De grande relevância no que diz respeito à população que se estabeleceu
nas colônias do norte foi o perfil e a motivação dos colonos. Além dos
conflitos religiosos, questões políticas e econômicas, vividas durante o
período na Europa, contribuíram para a vinda de ingleses. Aqueles que
quisessem vir para a América e não dispusessem de condições poderiam
receber passagens e o que fosse necessário, mediante trabalho por
determinado período de tempo. Na época a “Nova Inglaterra”, como era
conhecida a região, estava dividida em treze colônias.
As colônias enfrentaram grandes conflitos. As diferentes tribos indígenas
(que se apresentavam em grande número) se uniram para resistir à dominação
inglesa. Porém, quando houve interesses ingleses em jogo, a união com as
tribos indígenas chegou a ocorrer: como foi o caso da Guerra dos Sete
Anos (1756-1763)4, em que os indígenas defenderam o território inglês dos
ataques franceses.
Às colônias do sul foram aplicadas medidas semelhantes àquelas das colônias
portuguesas. Dedicaram-se à monocultura, destinada à exportação, valendo-
se do trabalho escravo africano. Nesse momento, a compra de africanos
para trabalhar em lavoura já estava consolidada pelos demais impérios
coloniais: Espanha e Portugal.
Já nas colônias do norte, onde o solo não era apropriado para o mesmo tipo
de cultivo, a colônia não poderia atender aos interesses da metrópole e do
sistema mercantilista. Nesse caso, a produtividade ficou por conta do
“trabalho livre” familiar, ou, no máximo, uma servidão temporária. Os colonos
desenvolveram a policultura, o comércio e a atividade pesqueira. Aqueles
que pagavam impostos tinham direito ao voto, e a decisões eram tomadas
de acordo com os interesses da maioria.
4 A mais importante das Guerras dos Déspotas no século XVIII, na Europa, antepondo, de um
lado, França, Espanha, Áustria e Rússia e do outro, Inglaterra e Prússia. (BURNS, Edward
Macnall. História da civilização ocidental. Porto Alegre: Globo, 1970. p. 540).
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22
3. A França nas Américas
O Tratado de Tordesilhas5, assinado entre Portugal e Espanha, foi de
encontro aos interesses das demais nações europeias que se lançaram ao
expansionismo tardiamente. O primeiro país a ignorar a divisão do mundo
entre portugueses e espanhóis foi a França.
Uma das primeiras investidas francesas se deu com o intuito de fundar a
Nova França, no território do atual Canadá. Para a região foram enviados
trabalhadores do campo, que terminou por tornar-se a principal atividade
comercial lucrativa desenvolvida na região. A política do novo império
colonial não divergiu muito das adotadas pelas principais potências.
Buscaram povoar a colônia, enviaram católicos e desenvolveram aquilo que
seria mais lucrativo à metrópole.
A grande diferença da política adotada para com a colônia ficou por conta
de quem era enviado para povoar a Nova França: somente nobres franceses.
A ideia era construir uma sociedade colonial igual à da metrópole. O sucesso
de povoamento permitiu aos franceses ampliar seu território na América do
Norte, anexando a região chamada de Luisiana. A ampliação do território
francês foi contida pelos ingleses também presentes na região. O próprio
modelo de colonização no qual somente os nobres tinham seus interesses
atendidos propiciou as condições para que não perdurasse o sucesso colonial
francês.
Os olhos franceses também se voltaram para o território brasileiro. Foi durante
o Governo-Geral de Duarte da Costa que os franceses tentaram estabelecer
a “França Antártica” no Rio de Janeiro. Até então as ações francesas na
região ficavam por conta da pirataria. Em decorrência dos conflitos religiosos
(católicos x protestantes) que ocorreram na França, no século XVI, houve a
invasão efetiva dos franceses às terras portuguesas. O interesse francês
pelas terras brasileiras já havia sido evidenciado em relação à extração de
produtos, porém a tentativa de tomada de terras ocorreu no atual estado
do Rio de Janeiro, onde fundaram a França Antártica, com apoio de grupos
indígenas. Porém, o sucesso da empreitada francesa não durou muito. Os
5 Os países ibéricos entraram em confronto por causa das fronteiras ultramarinas, cada qual
defendendo a porção do globo conquistada. Para resolver a contenda, apelaram ao papa. Em
1494, logo após a viagem de Colombo (1492) e, portanto, antes da chegada dos portugueses
ao Brasil, D. João II (rei de Portugal) e Fernando e Isabel (soberanos espanhóis) assinaram o
Tratado de Tordesilhas. Tomando por base o meridiano que passava a 370 léguas a Oeste das
ilhas de Cabo verde, ficou estabelecido que os domínios por tugueses eram aqueles situados
a Leste dessa linha, cabendo aos espanhóis as áreas situadas a Oeste. (KOSHIBA, Luiz; PEREIRA,
Denise Manzi Frayze. História do Brasil no contexto da história ocidental. 8. ed. São Paulo:
Atual, 2003. 602p.).
Capítulo 1 – Colonização: a partilha das Américas
23
portugueses conseguiram definitivamente expulsá-los da região no Governo-
Geral seguinte, o de Mem de Sá.
À outra tentativa de fundar uma colônia em terras portuguesas foi dado o
nome de “França Equinocial”. Os franceses fundaram um forte com o nome
de São Luís, no atual estado do Maranhão, faixa de terra brasileira sem
efetiva ocupação portuguesa. A região era habitada pelos Tupinambás que
tiveram sua simpatia conquistada pelos franceses. O local era estratégico.
Os franceses foram combatidos por portugueses e espanhóis, que se uniram
para impedir a quebra de Tordesilhas.
Referências
ARRUDA, José Jobson de A.; PILETTI, Nelson. Toda a História: História
Geral e História do Brasil. 13. ed. São Paulo: Ática, 2007.
BURNS, EdwardMacnall. História da civilização ocidental. Porto Alegre:
Globo, 1970.
CROUZET, Maurice. A América portuguesa. In:____________. História Geral
das civilizações: o século XVIII – o último século do antigo regime. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 1995. v. 11.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. 11. ed. São Paulo: EDUSP, 2003.
KOSHIBA, Luiz; PEREIRA, Denise Manzi Frayze. Américas: uma introdução
histórica. 2. ed. São Paulo: Atual, 1992.
_______. História do Brasil no contexto da história ocidental. 8. ed. São
Paulo: Atual, 2003.
25
CAPÍTULO 2CAPÍTULO 2
Brasil Colônia (1530-1808)
1. A Ocupação Efetiva da Colônia e o Empreendimento
Canavieiro
A primeira região brasileira a ser efetivamente colonizada e,
consequentemente, urbanizada, foi o litoral do Nordeste. No princípio, a
região Sul era uma área mais periférica, por não participar ativamente da
economia agroexportadora. A cidade de Salvador foi capital da colônia e
sua principal metrópole até 1763.
A principal atividade econômica foi o empreendimento canavieiro. No século
XV o açúcar era uma especiaria muito utilizada na Europa como remédio ou
condimento exótico. Ao longo do século XVI foi se tornando um produto
bastante consumido e apreciado pela aristocracia, mas acabou por se
transformar em um artigo de consumo de massa.
O açúcar já era produzido nas ilhas portuguesas do Atlântico (Açores e
Madeira). Tendo em vista a alta lucratividade dos negócios, juntando-se às
intenções da Coroa de colonizar efetivamente suas terras no novo continente,
resolveu Portugal incentivar a produção do açúcar, especialmente na capitania
da Bahia, que andava até então abandonada. O Governo Geral concedeu,
inclusive, isenção de impostos para os produtores.
Em 1532 Martim Afonso de Souza trouxe em sua expedição mudas de cana
e, a partir daí, foram constituídos engenhos produtores de açúcar em todas
as capitanias, de São Vicente a Pernambuco. No entanto, os principais
engenhos de açúcar situavam-se nas capitanias da Bahia e de Pernambuco,
devido às condições naturais favoráveis (solo e regime de chuvas adequado),
mas também por fatores políticos e econômicos. Salvador e Recife tornaram-
se importantes portos, na medida em que havia certa facilidade no
escoamento da produção (FAUSTO, 2003, p. 78).
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
26
Os engenhos eram formados pela plantação da cana e pelo equipamento
necessário para sua transformação e beneficiamento do açúcar, além da
casa-grande e da senzala. O processamento da cana era um procedimento
complexo que contava com várias etapas. Começava pela moenda da cana,
até chegar à produção do açúcar propriamente dito.
A instalação e o funcionamento de um engenho eram custosos e dependiam
da obtenção de créditos. No princípio do século XVI os financiadores eram
basicamente investidores estrangeiros ou da própria metrópole.
Posteriormente, instituições religiosas e beneficentes, além de comerciantes,
começaram a investir no empreendimento, oferecendo empréstimos a juros
aos produtores.
No que tange à estrutura social, os engenhos eram constituídos basicamente
pelos senhores e seus escravos – oposição essa representada pela “casa-
grande” e pela “senzala”. No entanto, é necessário lembrar que até 1560 a
mão de obra utilizada era a indígena. A transição para a africana ocorreu a
partir do aumento da produção canavieira e do recrudescimento do tráfico
escravo. Os escravos, independentemente da época, sempre tiveram péssimas
condições de trabalho.
Já os senhores de engenho normalmente provinham de famílias de origem
nobre, imigrantes com posses, comerciantes ou funcionários de altos cargos
da administração portuguesa. Com o tempo, os donos de engenhos foram
formando uma classe homogênea e promovendo, inclusive, casamentos
entre famílias.
Entre estes dois polos, senhores e escravos, havia os homens livres,
trabalhadores brancos (por exemplo, plantadores de cana independentes,
sem recursos para estabelecer um engenho, e também artesãos, ferreiros,
serralheiros etc.) e ex-escravos libertos.
O açúcar foi o principal produto da economia agroexportadora da colônia
portuguesa na América até os anos de 1620. Durante esse período, o negócio
se expandiu devido ao crescimento da demanda pelo produto na Europa e a
ausência de concorrência. Com as invasões holandesas no Nordeste e a
Guerra dos Trinta Anos na Europa, a produção açucareira foi prejudicada.
Além disso, a partir da década de 1630, o açúcar da América portuguesa
teve de enfrentar a concorrência da produção nas Antilhas.
Apesar do declínio da importância do açúcar ser comumente associado
com a descoberta do ouro, é preciso fazer a ressalva de que a exploração
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
27
das minas no século XVIII não significou o fim da produção de açúcar, que
continuou a ser um produto relevante para a economia exportadora.
Por fim, cabe ressaltar que a economia da colônia – e mesmo da região
Nordeste – não se resumia apenas à produção do açúcar. Segundo Fausto
(2003, p. 83):
Do ponto de vista econômico e social, o Nordeste colonial não foi
só açúcar, até porque o próprio açúcar gerou uma diversificação
de atividades, dentro de certos limites. A tendência à
especialização no cultivo da cana trouxe como consequência uma
contínua escassez de alimentos, incentivando a produção de
gêneros alimentícios, especialmente da mandioca. A criação de
gado esteve também em parte vinculada às necessidades da
economia açucareira. Houve ainda outras atividades, como a
extração da madeira e o cultivo do fumo.
2. O Trabalho Compulsório: a escravidão indígena e o tráfico
negreiro
Em toda a América colonial, o trabalho compulsório foi utilizado em larga
escala. No entanto, enquanto na espanhola diferentes formas foram
utilizadas, na portuguesa predominou a mão de obra escrava.
Conforme foi mencionado anteriormente, houve uma passagem da escravidão
indígena para a africana.
Essa passagem foi menos demorada no núcleo central e mais
rentável da empresa mercantil, ou seja, na economia açucareira,
em condições de absorver o preço da compra do escravo negro,
bem mais elevado do que o do índio. Custou a ser feita nas regiões
periféricas, como é o caso de São Paulo, que só no início do
século XVIII, com a descoberta das minas de ouro, passou a
receber escravos negros em número regular e considerável.
(FAUSTO, 2003, p. 49).
Desde o início da colonização, os indígenas foram submetidos à escravização
e à catequese, por meio das ordens missionárias – dentre as quais se destacou
a ordem jesuítica. Os indígenas resistiram à sujeição por meio da guerra, da
fuga ou mesmo pela simples recusa ao trabalho compulsório. Tinham
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
28
melhores condições de resistir do que os africanos, por conhecerem bem o
território, de modo a facilitar fugas. Outro fator que contribuiu para o
abandono da escravidão indígena foi o genocídio. Milhares de índios
morreram vítimas de doenças trazidas pelos brancos ou em conflitos, dada
a superioridade bélica dos europeus.
Não por acaso, a partir da década de 1570 incentivou-se a
importação de africanos, e a Coroa começou a tomar medidas
através de várias leis, para tentar impedir o morticínio e a
escravização desenfreada dos índios. As leis continham ressalvas
e eram burladas com facilidade. Escravizavam-se índios em
decorrência de ‘guerras justas’, isto é, guerras consideradas
defensivas, ou como punição pela prática da antropofagia. Só
em 1758 a Coroa determinou a libertação definitiva dos indígenas
[...]. (FAUSTO, 2003, p. 50).
Os portugueses já praticavam o tráfico de escravos africanos desde o século
XV e utilizavam sua mão de obra na produção açucareira das possessões
insulares portuguesas no Atlântico. Sabiam, portanto, que se tratava de
um negócio rentável. Os africanos que foram trazidos para o Brasil como
escravos vieram de lugares variados da África, dependendo da organização
do esquema do tráfico. Durante o século XVI vieram africanos primordialmente
da Guiné (Bissau e Cacheu) e da Costa da Mina. Já aolongo do século
XVII, foram trazidos negros bantos, das regiões do Congo e de Angola.
Na América portuguesa, os principais centros importadores foram as cidades
de Salvador e do Rio de Janeiro:
Os traficantes baianos utilizaram-se de uma valiosa moeda de
troca no litoral africano, o fumo produzido no Recôncavo.
Estiveram sempre mais ligados à Costa da Mina, à Guiné e ao
Golfo do Benin, neste último caso após meados de 1770, quando
o tráfico da Mina declinou. O Rio de Janeiro recebeu sobretudo
escravos de Angola, superando a Bahia com a descoberta das
minas de ouro, o avanço da economia açucareira e o grande
crescimento urbano da capital, sobretudo a partir do início do
século XIX. (FAUSTO, 2003, p. 51-52).
É importante ressaltar que os negros apresentaram uma resistência cotidiana
à escravidão, além das constantes fugas e, algumas vezes, até mesmo
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
29
agressões contra os senhores. A existência dos quilombos - “[...]
aglomerações de escravos fugidos, uma verdadeira reação cultural contra o
tipo de vida que o português lhes impunha no Brasil” (FROTA, 2000, p. 80)
- é a prova disso, sendo o mais importante e conhecido deles o quilombo
dos Palmares, formado no início do século XVII. Os quilombolas de Palmares
resistiram por quase um século aos ataques dos portugueses, mas acabaram
por sucumbir em 1695, em vista das ações perpetradas pelo bandeirante
Domingos Jorge Velho.
Apesar das inúmeras tentativas, com certeza os africanos tinham
possibilidades mais limitadas de resistência do que os indígenas, considerando
que eram “desenraizados de seu meio, separados arbitrariamente, lançados
em levas sucessivas em território estranho” (FAUSTO, 2003, p. 52). Além
disso, nem a Igreja Católica, nem a Coroa portuguesa se opuseram à
escravidão africana. A legislação então vigente também não oferecia a
proteção necessária aos escravos.
3. O Brasil Submisso à União Ibérica (1580-1640)
 O fim da dinastia de Avis em Portugal iniciou uma crise sucessória que
resultou na transferência do trono português à Coroa espanhola. Em virtude
do domínio espanhol, houve uma série de consequências para a colônia
portuguesa na América. Devido ao conflito entre Espanha e os Países Baixos
(especificamente a Holanda), o relacionamento desses Países Baixos com
Portugal ficou comprometido.
Entre os anos de 1609 e 1621, por causa da Trégua dos Doze Anos entre
Espanha e Holanda, não houve conflitos. Contudo, no período em que
terminou a trégua, foi criada a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais.
Tal empresa, que contava com capital do Estado e de particulares, teve
como objetivo ocupar as regiões de produção açucareira na América
portuguesa e controlar o comércio de escravos no Atlântico. Como afirma
Boris Fausto (2003, p. 84):
As invasões holandesas que ocorreram no século XVII foram o
maior conflito político-militar da Colônia. Embora concentradas
no Nordeste, elas não se resumiram a um simples episódio
regional. Ao contrário, fizeram parte do quadro das relações
internacionais entre os países europeus, revelando a dimensão
da luta pelo controle do açúcar e das fontes de suprimento de
escravos.
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
30
Contra as invasões holandesas resistiram não apenas os portugueses, mas
também a gente da colônia (ainda que não tivessem uma identidade
autônoma em relação à metrópole). Representou grande esforço militar e
financeiro por parte da Coroa e dos colonos envolvidos.
A história da ocupação holandesa no Brasil começou com a invasão de
Salvador, capitania da Bahia, em 1624, onde os holandeses permaneceram
por um ano, rendendo-se após grandes enfrentamentos locais, e posterior
cerco realizado por mar, com uma esquadra luso-espanhola, em 1625.
Em 1630 houve nova invasão, desta vez em Pernambuco, com a conquista
das cidades de Olinda e Recife. Por sete anos holandeses e pernambucanos
se enfrentaram e a predominância militar holandesa confirmou a conquista.
De 1637 a 1644 Pernambuco foi governada pelo príncipe holandês Maurício
de Nassau, que estabeleceu importantes iniciativas políticas e administrativas.
Nassau favoreceu a vinda de artistas e naturalistas para Pernambuco e
conseguiu manter durante seu governo um período de relativa paz. No
entanto, em 1644 foi obrigado a retornar à Europa, por causa de desavenças
com a Companhia das Índias Ocidentais.
Com a volta de Nassau à Europa, Pernambuco viveu novo período de guerra, no
qual se destacaram as Batalhas de Guararapes (1648 e 1649), campanha militar
que teve como consequência a derrota holandesa. Diversos fatores contribuíram
para a derrota holandesa: a Companhia das Índias Ocidentais entrou em crise,
cresceram entre os holandeses os partidários da paz com Portugal, e a guerra
entre Holanda e Inglaterra (1652) tornou escassos os recursos para investidas
militares no Brasil. No entanto, os conflitos em Pernambuco só cessaram em
1654, com a reconquista da região por parte dos portugueses.
Os recursos levantados localmente para a guerra no Nordeste
representaram dois terços dos gastos, na fase de resistência, e a
quase totalidade, na luta de reconquista. Da mesma forma,
enquanto na primeira fase da guerra, tropas formadas por
portugueses, castelhanos e mercenários napolitanos foram
amplamente majoritárias, na segunda fase, soldados da terra e,
mais ainda, gente de Pernambuco tiveram superioridade numérica.
A mesma coisa ocorreu com relação ao comando militar. Foram
esses homens os principais responsáveis pela tática de guerra
volante, a “guerra do Brasil”, de que resultaram vitórias decisivas
sobre os holandeses, em oposição à “guerra da Europa” do tipo
tradicional. (FAUSTO, 2003 p. 88).
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
31
A luta contra os holandeses incentivou o nativismo pernambucano e a
região assistiu a inúmeras revoltas e manifestações de autonomia em relação
à metrópole portuguesa. “O nativismo de Pernambuco teve conteúdos
variados, ao longo dos anos, de acordo com as situações históricas específicas
e os grupos sociais envolvidos, mas manteve-se como referência básica no
imaginário pernambucano”. (FAUSTO, 2003, p. 89).
As invasões holandesas demonstraram bem a relação entre a produção
açucareira e o tráfico de escravos. Afinal, enquanto controlaram a indústria
açucareira no Nordeste, os holandeses tiveram também o controle do tráfico
de escravos na África. Houve, inclusive, frentes de combate também nas
colônias portuguesas na África, com a ocupação de São Paulo de Luanda e
Benguela, em Angola (1641). Os portugueses retomaram a região em 1648,
com uma expedição saída do Brasil, comandada por Salvador Correia de Sá.
O fim da União Ibérica, a partir da ascensão de D. João IV ao trono português
em 1680, não significou o fim do conflito entre Portugal e Holanda, pois
durante aqueles anos as relações entre os dois países haviam se transformado,
tendo em vista a ocupação holandesa em uma parte do território português
na América.
4. A Expansão da Ocupação Portuguesa para além do Tratado
de Tordesilhas
Se no início da colonização os portugueses se limitaram a ocupar apenas o
espaço litorâneo do território e defendê-lo da ocupação estrangeira,
posteriormente, ainda no século XVI, com o intuito de buscar metais
preciosos, organizaram “entradas” para o interior. Muitas vezes, no entanto,
não encontravam as riquezas que buscavam, mas aproveitavam a empreitada
para aprisionar indígenas que eram vendidos como escravos. Estas entradas
ficaram conhecidas como “Tropas de Resgate”. (FROTA, 2000, p. 64).
A partir de 1580 (início da União Ibérica), as entradas se tornaram mais
intensas e despreocupadas com os limites definidos pelo Tratado de
Tordesilhas. Desta forma, os portugueses chegaram até a região do
Amazonas, ao norte, e do Rio da Prata, ao sul. Além disso, os portugueses
aumentaram o território por eles conquistado com a expulsão dos franceses,
ampliando as terras utilizadas pelos engenhos de açúcar e para a criação de
gado.
As “bandeiras” eram expedições organizadas por colonos e formadas tambémpor indígenas e mestiços com o objetivo de encontrar na porção de terras da
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
32
América portuguesa metais preciosos, considerando que os espanhóis haviam
encontrado ouro e prata em suas terras. As bandeiras foram organizadas
fundamentalmente por paulistas. Organizaram-se segundo o modelo de disciplina
militar e não costumavam respeitar a fronteira imposta por Tordesilhas.
Também as bandeiras paulistas não tiveram o resultado esperado em um
primeiro momento e dedicaram-se a aprisionar indígenas para serem vendidos
como escravos. Essas expedições ficaram conhecidas como “bandeirantismo
de apresamento” e tiveram seu apogeu no século XVII, no período em que
os holandeses controlavam o fornecimento de escravos na costa africana e
ocupavam o nordeste brasileiro, tendo em vista que as outras regiões da
colônia portuguesa, não dominadas pelos flamengos, ficaram carentes de
mão de obra.
Apesar de ter sido o bandeirismo destrutivo em seu início, agindo
mais em extensão do que em profundidade, ele permitiu a
descoberta do ouro, o que ocasionou uma corrida para o interior.
Este, antes despovoado, coloriu-se de uma multidão que se
despencou da costa e de além-mar na ânsia de enriquecimento
fácil, provocando o alargamento político do território, mas também
o abandono das fazendas de açúcar, atingindo especialmente o
Nordeste. (FROTA, 2000, p. 76).
O avanço das fronteiras no sul da colônia esbarrou em uma série de conflitos
com os espanhóis, principalmente com o movimento paraguaio, que avançava
em direção ao mar. A região do Rio da Prata foi o alvo principal das disputas
(vista como possibilidade de fronteira natural da colonização portuguesa),
palco de um embate bélico sangrento e origem de uma série de atos e
documentos que tentaram garantir o domínio português sobre o território.
Um último aspecto do bandeirantismo, ocorrido principalmente na segunda
metade do século XVII (FROTA, 2000, p. 79-80), foi o “sertanismo de
contrato” 6. Alguns dos bandeirantes que não conseguiram encontrar grandes
riquezas, mas eram hábeis na prática de palmilhar o interior, foram
contratados pela administração para realizar buscas a escravos fugidos,
destruir quilombos, e combater indígenas.
6 Um dos aspectos do bandeirantismo ganhou o nome de sertanismo de contrato, em razão de
diversos bandeirantes, não muito felizes no encontro de riquezas, mas adestrados na prática
de palmilhar o interior, se colocavam a serviço da administração, quer para combater indígenas,
quer para desfazer quilombos de escravos fugidos. Ocorreu, principalmente, na segunda metade
do século XVII. (FROTA, 2000).
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
33
5. A Descoberta do Ouro: um novo ciclo econômico
Desde o início da ocupação portuguesa nas Américas, a busca por ouro foi
constante na América portuguesa, já que metais preciosos foram encontrados
em abundância na América espanhola. Os paulistas, em suas andanças pelo
sertão, finalmente encontraram ouro em fins do século XVII. Também foram
descobertos diamantes, mas sua importância econômica foi menor.
A exploração de metais representou uma grande mudança, tanto na colônia
quanto na metrópole. A corrida pelo ouro provocou a primeira grande corrente
migratória para o Brasil, durante os primeiros sessenta anos do século XVIII.
Pessoas das mais diversas origens vieram para o Brasil em busca do circuito
do ouro. Comerciantes, pequenos proprietários, padres, prostitutas e
aventureiros, todos buscaram enriquecer com o metal aqui descoberto. De
Portugal e das ilhas do Atlântico chegaram, por ano, cerca de dez mil pessoas.
A descoberta do metal precioso aliviou momentaneamente os problemas
financeiros de Portugal. Na virada do século XVIII, a dependência lusa com
relação à Inglaterra era um fato consumado. Para ficar em um exemplo
apenas, o Tratado de Methuen, firmado pelos dois países em 1703, indicava
a diferença entre um Portugal agrícola, de um lado, e uma Inglaterra em
pleno processo de industrialização, de outro. Portugal obrigou-se a permitir
a livre entrada de tecidos ingleses de lã e algodão em seu território, enquanto
a Inglaterra comprometeu-se a tributar os vinhos portugueses importados
com redução de um terço do imposto pago por vinhos de outras procedências.
É bom lembrar que a comercialização do vinho do Porto estava nas mãos
dos próprios ingleses.
Durante muitos anos, o desequilíbrio da balança comercial entre Portugal e
Espanha, causado por essa política, foi compensado com o ouro vindo do
Brasil (FROTA, 2000, p. 98-99).
O ouro também trouxe mudanças na colônia. Aos poucos, o eixo do Nordeste
foi perdendo importância, e a proximidade das minas fez com que o Centro-
Sul se tornasse o local privilegiado do comércio com a metrópole. O porto
do Rio de Janeiro, de onde vinham escravos e suprimentos e escoava o
ouro, cresceu e a cidade tornou-se a capital da colônia, em 1763.
Com a exploração de ouro e diamantes, aumentou a necessidade da metrópole
de controlar o ouro que era comercializado fora de seus domínios. Foram criados
os impostos do quinto – a quinta parte de todos os metais extraídos pertencia
ao rei – e a capitação – imposto cobrado dos mineradores por cabeça de escravo.
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
34
O grande desequilíbrio criado pelo protagonismo da região Centro-Sul
preocupou as autoridades que tomaram algumas providências no sentido
de diminuir o desequilíbrio entre a região das minas e o resto da colônia.
Arrecadar impostos e organizar a sociedade das minas foram os
dois objetivos básicos da administração portuguesa, relacionados
aliás entre si. Para isso, era necessário estabelecer normas,
transformar acampamentos de garimpeiros em núcleos urbanos,
criar um aparelho burocrático com diferentes funções. (FROTA,
2000, p. 101).
O processo migratório causado pela busca do ouro foi responsável por mais
do que o simples aumento de número de portugueses e pessoas de diferentes
classes no Brasil. Foi criada uma máquina burocrática em torno desse
comércio que constituiu uma sociedade diferenciada organizada e formada
não só de mineradores, mas de negociantes, advogados, padres, fazendeiros,
artesãos, burocratas e militares. “Muitas dessas figuras tinham seus interesses
estreitamente vinculados à Colônia e não por acaso ocorreu em Minas uma
série de revoltas e conspirações contra as autoridades coloniais.” (FROTA,
2000, p. 102).
Apesar da intensidade do comércio e da importância que teve na construção
da sociedade da América portuguesa, o ciclo do ouro já não tinha muita
força no início do século XIX. O período do apogeu, entre os anos de 1733
e 1748, foi encerrado devido, principalmente, à queda na produção e à
dificuldade de alcançar novas grandes jazidas.
6. Revoltas Nativistas
No final do século XVII, o Brasil começou a entrar numa fase de
profundas transformações. Reinóis, nativos e escravos (habitantes
da colônia, sob a administração da coroa portuguesa)
amalgamavam-se nas duras tarefas de conquistar a terra, de
domesticar o gentio (índios) e, sobretudo, expulsar invasores.
Formava-se lentamente a argamassa do povo brasileiro,
provocando movimentos sediciosos ainda inconsistentes e de fundo
nitidamente econômico, uma reação contra o fiscalismo
exagerado. A amplitude territorial e a heterogeneidade da
população não permitiram a presença de movimentos amplos e
sim regionais. (FROTA, 2000, p. 205).
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
35
6.1 Revolta de Beckman (1684)
O Estado do Maranhão foi criado em 1621, englobando as capitanias do
Ceará, do Maranhão e do Grão-Pará. Existia nessa região uma constante
perseguição aos índios para o trabalho na lavoura açucareira, já que os
senhores encontravam dificuldades para conseguir escravos negros, desde
a expulsão dos holandeses de Pernambuco. Os jesuítas, liderados pelo padre
Antônio Vieira, reagiram em defesa dos índios que trabalhavam na colheita
dominada pela ordem religiosa.
Como a exploração de escravos indígenas não trazia lucro para Portugal,
que se beneficiava muitodo tráfico negreiro, a metrópole acabou apoiando
a reação dos jesuítas que despertaram ódio nos senhores, exasperados pela
falta de escravos em suas lavouras.
Liderados pelos irmãos Beckman, senhores de engenho da área organizaram-
se numa revolta contra a companhia de comércio da região (responsável
pelo comércio de escravos negros) e contra os jesuítas, que acabaram
expulsos. Mas, mesmo assim, a escravização indígena acabou proibida.
6.2 Guerra dos Emboabas (1708-1709)
A grande migração de pessoas para as áreas de garimpo era uma
preocupação constante da Coroa. Logo no início da atividade em Minas, a
Câmara de São Paulo reivindicou, junto ao rei de Portugal, que somente os
moradores da Vila de São Paulo (responsáveis pela descoberta das jazidas)
tivessem permissão para procurar ouro. Tratava-se, no entanto, de um pedido
impossível, já que muitos se dirigiam à região, não só brasileiros
(principalmente baianos) e portugueses, mas também estrangeiros.
Tal disputa se configurou num conflito civil localizado, que ficou conhecido
como a Guerra dos Emboabas (1708-1709). De um lado, paulistas; do outro,
estrangeiros e baianos. Os paulistas não obtiveram a exclusividade pretendida,
mas conseguiram a criação da capitania de São Paulo e das Minas do Ouro,
separada do Rio de Janeiro (1709), e a elevação da Vila de São Paulo à
categoria de cidade (1711). Minas Gerais se tornou uma capitania separada
somente no ano de 1720.
6.3 Guerra dos Mascates (1710-1711)
Em Pernambuco, a rivalidade entre os decadentes agricultores da vila de
Olinda e os progressistas comerciantes de Recife acabou explodindo em
1710. A dominação holandesa foi responsável por um grande
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
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desenvolvimento em Recife, que se tornou um movimentado porto. “Mascate”
era como os ricos comerciantes portugueses de Recife eram denominados
pela aristocracia de Olinda. Por solicitação popular, D. João V elevou Recife
à categoria de vila em 19 de novembro de 1709. A partir daí uma discordância
a respeito da delimitação territorial entre as duas vilas acirrou a disputa.
A tranquilidade na região só durou cerca de sete meses. O conflito acabou
retornando quando Olinda foi cercada pelos comerciantes. Os Mascates, antes
expulsos, se vingaram dos olindenses e retomaram o controle da região.
7. Revoltas Coloniais
7.1 Revolta de Vila Rica (1720) e Inconfidência Mineira (1789)
“Aplacados os excessos das desavenças entre paulistas e emboabas, a região
das minas passou pela administração eficiente de D. Braz Baltazar da Silveira;
fundou vilas e ajustou uma fórmula de cobrança dos ‘quintos’”. (FROTA,
2000, p. 211).
A cobrança dos quintos garantia à Coroa uma grande parte da produção de
ouro da Colônia. Entretanto, existia uma altíssima taxa de sonegação do
imposto. Circulava ouro em pó e em pepitas, que eram usados como moeda,
facilitando a fuga da fiscalização.
Por isso, a metrópole resolveu criar, nas áreas das Minas, quatro casas de
fundição (por meio da carta-régia de 19 de fevereiro de 1719), e proibir
qualquer ouro não quintado de circular. Os habitantes, principalmente de
Vila Rica (atual Ouro Preto, MG), não aceitaram as novas regras.
A revolta, fundamentalmente um movimento econômico, no fim não
conseguiu alcançar seu objetivo. A resistência contra a medida reguladora
não se sustentou, mas conseguiu que fosse criada a Capitania Geral de
Minas Gerais, separada da de São Paulo, em dezembro de 1720.
As ideias que então sacudiram a França, produto de filósofos
racionalistas, penetraram o Brasil, trazidas por clérigos
esclarecidos e por estudantes que haviam cursado as universidades
europeias. [...] A independência das Colônias Inglesas da América
(1776) servia de exemplo pelo êxito alcançado [...] Formara-se
em Vila Rica, sede da capitania, uma elite cultural [...]. Estes
intelectuais se reuniam e discutiam a situação política. (FROTA,
p. 213-215).
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
37
Dentre essa elite cultural, referida por Frota, encontrava-se o alferes Joaquim
José da Silva Xavier, alcunhado de “o Tiradentes”. Ele participou do
movimento que ficou conhecido como a Conjuração Mineira. Suas principais
reivindicações foram: a separação política de Portugal; a instauração da
república; a transferência da capital para o interior; a libertação dos escravos
que aderissem ao movimento e a criação de uma universidade. A conspiração
contra a administração colonial acabou revelada por intermédio de cartas-
denúncias enviadas ao Visconde de Barbacena.
Vários revoltosos foram presos, mas foi Tiradentes, após sete meses de
prisão, que confessou ser o mentor do movimento. Cumpriu a sentença de
pena de morte na forca em 21 de abril de 1789 e teve seu corpo esquartejado
e exposto como exemplo, para desestimular novas insurgências.
A conspiração não saiu do apertado círculo dos que a tramaram.
Malograda, traduzia, contudo, uma atitude mental que principiava
a amadurecer, de rebeldia nascente frente ao despotismo. [A
derrama]7 influiu no espírito político da época [...]. (FROTA, 2000,
p. 218).
8. Os Tratados de Limites: a nova fixação de fronteiras
Muitos foram os conflitos que contribuíram para a definição do território
brasileiro. As investidas francesas ao norte e as constantes vitórias de
Portugal acabaram por “empurrar” o domínio português além do Amapá,
chamado de Guiana brasileira. As tensões nessa área só foram solucionadas
pelos Tratados de Utrecht de 1713 e de 1715.
No tratado assinado, em 11 de abril de 1713, a França renunciava ao território
do Cabo do Norte, entre os rios Amazonas e Oiapoque.
No segundo Tratado de Utrecht, em 6 de fevereiro de 1715, a Espanha
devolveu a Colônia do Sacramento a Portugal, mas diferentemente do
primeiro, sua assinatura não deu um fim às tensões na região.
Os conflitos nessa área foram importantes para o avanço do domínio
português pelo planalto central e pela planície amazônica. Tantas foram as
tensões no Sul que a Espanha não percebeu o avanço nas outras áreas.
7 O dia da derrama, instituído pelo Marquês do Pombal, em 1785, visava à cobrança atrasada
dos impostos pela administração portuguesa. Foi o dia escolhido para a Inconfidência Mineira.
(FROTA, Guilherme Andrea. 500 anos de História do Brasil. Rio de Janeiro: BIBLIEx, 2000).
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
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Somente em 1750, com o casamento de D. Maria Bárbara, princesa de
Portugal, com Fernando VI, príncipe da Espanha, foi possível negociar o
tratado de Madri. Nele, o tratado de Tordesilhas foi finalmente abolido,
Portugal abriu mão da Colônia de Sacramento, recebendo em troca as terras
das Sete Missões, as terras do Centro e Norte do Brasil, consideradas de
pouco valor. Com o Tratado de Madri, as guerras europeias ficaram
definitivamente fora de território brasileiro.
Apesar de ter sido de extrema importância para a definição do território
brasileiro, o Tratado de Madri encontrou resistência tanto entre espanhóis
quanto entre portugueses. Tanto que em 1761, um novo tratado, em El
Pardo, tornou nulas as disposições daquele tratado.
Mapa das fronteiras do Tratado de Madri (1750)
Fonte: <http://www.diario-universal.com/2007/10/aconteceu/tratado-de-santo-
ildefonso/>. Acesso em: 20 mar. 2010.
Em 1777, sob direção de D. Maria I, com a queda de Marquês de Pombal,
foi assinado o Tratado de Santo Ildefonso. Ele definia que a Colônia do
Sacramento e os Sete Povos das Missões ficariam em poder da Espanha.
Capítulo 2 – Brasil Colônia (1530-1808)
39
Mas mesmo assim os desentendimentos persistiram. Somente em 1801 foi
firmada a paz de Badajós, que deu um fim aos movimentos armados nas
áreas das colônias e restabeleceu as relações entre Portugal e Espanha. Os
Sete Povos ficaram finalmente em poder de Portugal.
Referências
FAUSTO, Boris. História do Brasil. 11. ed. São Paulo: EDUSP, 2003.
FROTA, Guilherme Andrea. 500 anos de História do Brasil. Rio de Janeiro:
BIBLIEx, 2000.
LACOMBE, Américo Jacobina. A Conjuração do Rio de Janeiro. In: HOLANDA,
Sergio Buarque. História Geral da civilização brasileira.Tomo I – A época
colonial – v. 2 – Administração, economia e sociedade. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil. Livro 5, Capítulo IV. p. 451-455.
LUZ, Nícia Vilela. Inquietação revolucionária no sul: Conjuração Mineira. In:
HOLANDA, Sergio Buarque. História Geral da civilização brasileira. Tomo I –
A época colonial – v. 2 – Administração, economia e sociedade. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil. Livro 5, Capítulo III. p. 438-450.
MATTOS, Odilon Nogueira de. A Guerra dos Emboabas. In: HOLANDA,
Sergio Buarque. História Geral da civilização brasileira. Tomo I – A época
colonial – v. 1 – Do descobrimento à expansão territorial. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil. Livro 5, Capítulo III. p. 324-334.
MELLO, Astrogildo Rodrigues de; WRIGHT, Antônia Fernanda P. A. O Brasil
no período dos Filipes. In: HOLANDA, Sergio Buarque. História Geral da
civilização brasileira. Tomo I – A época colonial – v. 1 – Do descobrimento
à expansão territorial. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. Livro 4, Capítulo II. p.
197-212.
REIS, Arthur Cézar Ferreira. A Inconfidência Baiana. In: HOLANDA, Sergio
Buarque. História Geral da civilização brasileira. Tomo I – A época colonial –
v. 2 – Administração, economia e sociedade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
Livro 5, Capítulo V. p. 456-462.
41
CAPÍTULO 3CAPÍTULO 3
O Século XIX nas Américas
1. O Processo de Independência nas Américas
O processo de independência das colônias da América Latina pode ser melhor
compreendido se abordado como parte da crise do Antigo Regime e do
sistema colonial europeu. Alguns eventos históricos que vinham ocorrendo
na Europa tiveram papel fundamental para a sucessão de fatos ocorridos
nas colônias do Novo Mundo. Dentre eles podemos destacar: a Revolução
Industrial8 inglesa, o rompimento do equilíbrio político do velho continente
devido às Guerras Napoleônicas, o próprio desenvolvimento interno das
colônias e a difusão dos ideais iluministas, associados aos acontecimentos
da Revolução Francesa9 de 1789.
Os interesses econômicos ingleses na emancipação das colônias ibéricas
nas Américas relacionavam-se, primeiramente, com o desenvolvimento da
Revolução Industrial, tendo em vista que representou o início de uma
profunda transformação no sistema político e econômico daquele país (o
surgimento do capitalismo como sistema, o que se ampliaria mais tarde
para o resto do mundo), que passou a enxergar as colônias da América
hispânica e portuguesa como potenciais mercados consumidores para seus
produtos industrializados. Para tanto, deveria apoiar o fim do sistema colonial
ibérico e o exclusivismo comercial que impunham aos territórios dominados.
Além desses fatores econômicos, a Inglaterra tinha também interesses
políticos no apoio às emancipações, devido aos acontecimentos relacionados
com as Guerras Napoleônicas.
8 A Revolução Industrial representou o processo de mecanização das indústrias, ocorrido
inicialmente na Inglaterra em fins do século XVIII e, posteriormente, em outros países, como a
França, os Estados Unidos da América, a Alemanha e outros. De acordo com esse conceito, a
partir da máquina a vapor, houve uma revolução industrial. (FRANCO et al., 1995, p. 126).
9 A Revolução Francesa representou a crise final do Antigo Regime, cujas estruturas foram
abolidas e substituídas por outras apropriadas ao novo Estado burguês (capitalista). (FRANCO
et al., 1995, p. 143).
EASA/SEAD/CAS – HISTÓRIA MILITAR
42
No curso de sua guerra contra Napoleão, a Grã-Bretanha, perante
a necessidade de responder ao Bloqueio Continental10, desenvolveu
uma política de expansão comercial dirigida para os mercados do
Novo Mundo. Após 1815, ela avalia a estreiteza dos escoadouros
europeus e choca-se com o protecionismo. Assim, a ilha mercantil
sofre uma crise interna que a impele a arrancar ao Pacto Colonial
ibérico a clientela de um imenso continente. Ao mesmo tempo, a
marinha de Sua Majestade aproveita para exercer no Atlântico o
combate ao tráfico escravo. (CROUZET, 1996, p. 140).
Além disso, com as Guerras Napoleônicas, o rei da Espanha, Fernando VII,
foi destronado e substituído por José Bonaparte, irmão mais velho de
Napoleão Bonaparte, o que levou a um enfraquecimento do controle da
metrópole sobre suas colônias. Em Portugal as Guerras Napoleônicas e a
Revolução Liberal do Porto levaram a família real portuguesa a se transferir
para o Rio de Janeiro, sendo um dos fatores que culminariam no processo
de independência política das colônias da América portuguesa.
No entanto, é preciso lembrar que, mesmo antes de ter início o processo
emancipatório das colônias, surgiram várias revoltas nas Américas hispânica
e portuguesa. Eram lideradas por grupos de colonos que, ensejando obter
vantagens comerciais e maior liberdade, passaram a questionar os princípios
mercantilistas que norteavam as relações entre metrópole e colônia. Os
interesses dos colonos começaram, então, a entrar em choque com os da
metrópole. Ainda assim, de início, as revoltas coloniais não assumiram um
caráter separatista, mas desnudavam apenas uma crescente insatisfação
dos colonos com a política metropolitana, na medida em que as próprias
colônias alcançavam algum grau de desenvolvimento.
Por fim, devemos destacar também a influência dos ideais iluministas11 na
formação dos projetos de independência. É preciso lembrar que na maioria
dos casos tais projetos foram formulados e encampados pelas elites locais,
os criollos (denominação dada aos descendentes de espanhóis nascidos na
América) que, muitas vezes, tinham em sua formação uma passagem pela
Europa ou, ao menos, contatos com os ideais que lá eram gestados.
10 Pelo Bloqueio Continental (1806) as nações europeias continentais ficavam proibidas de
comerciar com a Inglaterra e de permitir que navios ingleses atracassem em seus portos.
(SILVA, 1992, p.112).
11 O Iluminismo, cujo palco principal foi a França, é representado por figuras exponenciais do
pensamento ilustrado europeu da época, como Voltaire, Montesquieu e Rousseau. Esses
filósofos, assim com todos aqueles que adotavam o pensamento liberal, questionaram o
despotismo monárquico e os privilégios da nobreza e do clero e defenderam os princípios da
liberdade, da igualdade e da fraternidade. (SILVA, 1992, p. 103).
Capítulo 3 – O Século XIX nas Américas
43
Relacionado com este aspecto, podemos destacar o peso da emancipação
das treze colônias da América do Norte, ocorrida em 1776, e fortemente
influenciada pelo Iluminismo. A independência dos Estados Unidos da
América, o primeiro país do continente a se emancipar, teve marcante
influência sobre o processo de independência política das demais colônias,
pois representava uma nova possibilidade de estruturação política e
administrativa independente das metrópoles europeias.
Por outro lado, os próprios Estados Unidos, por sua vez, passaram a ter interesse
na emancipação política do restante do continente, pois, entendiam que, com o
fim da colonização europeia, a América Latina poderia passar a ser uma privilegiada
área de influência. Desta maneira, o presidente norte-americano James Monroe
decretou em 1823 a famosa “Doutrina Monroe”, que tinha como máxima a
defesa da “América para os americanos”. Segundo Alves (2004, p. 88):
Em princípio, a Doutrina Monroe teria resultados poucos práticos,
representando, isto sim, um efeito simbólico, porque nem a Europa
modificou seu rumo, nem as repúblicas hispânicas ou o Brasil
deram muito peso à proclamação, como um fator de garantia da
independência conseguida e ameaçada, já que todos acreditavam
mais na esquadra britânica. [...] Foi somente com o crescimento
do poderio econômico dos Estados Unidos que a doutrina foi sendo
posta em prática, mudando seu conteúdo à medida que se
concretizava, ou seja, de inspiração progressista, passou a ser
utilizada como justificativa intervencionista – como um disfarce
para a recolonização da América Latina.
A Doutrina Monroe surgiu em reação à Santa Aliança e à Restauração na
Europa, que defendia a volta dos princípios do absolutismo e,
consequentemente, dos domínios coloniais.

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