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15 HISTÓRIA DO BRASIL

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0 
 
 
CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
HISTÓRIA DO BRASIL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
GUARULHOS – SP 
 
1 
 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 4 
2 A EUROPA DURANTE A IDADE MODERNA ............................................................... 5 
2.1 A economia portuguesa.............................................................................................. 8 
2.2 A sociedade portuguesa ........................................................................................... 11 
3 A REVOLUÇÃO DE AVIS ........................................................................................... 13 
4 PORTUGAL E O MAR................................................................................................. 16 
4.1 As navegações portuguesas .................................................................................... 18 
4.1.1 A chegada dos portugueses na América ............................................................... 20 
5 A COLONIZAÇÃO E O MERCANTILISMO ................................................................. 22 
6 A OCUPAÇÃO DA AMÉRICA PORTUGUESA ........................................................... 24 
7 AS INVASÕES DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS NA AMÉRICA ................................ 27 
7.1 Os franceses ............................................................................................................ 28 
7.2 Os holandeses ......................................................................................................... 29 
8 EXPANSÃO TERRITORIAL ........................................................................................ 31 
8.1 A relação metrópole–colônia .................................................................................... 31 
8.2 A estrutura administrativa da América portuguesa ................................................... 34 
9 AS CAPITANIAS HEREDITÁRIAS .............................................................................. 36 
9.1 O Governo Geral ...................................................................................................... 38 
10 A ECONOMIA DA AMÉRICA PORTUGUESA .......................................................... 40 
11 O EXTRATIVISMO .................................................................................................... 41 
12 A AGRICULTURA E A PECUÁRIA NA AMÉRICA PORTUGUESA .......................... 44 
12.1 A cana-de-açúcar ................................................................................................... 44 
12.1.1 Os senhores de engenho .................................................................................... 46 
 
2 
 
 
12.1.2 Extrativismo açucareiro ....................................................................................... 47 
12.2 A pecuária.......... .................................................................................................... 48 
13 A ESCRAVIDÃO INDÍGENA NA AMÉRICA PORTUGUESA .................................... 50 
13.1 Os confrontos culturais entre indígenas e portugueses ......................................... 53 
13.2 As missões jesuíticas na América .......................................................................... 55 
13.2.1 As missões jesuíticas .......................................................................................... 58 
14 OS POVOS ORIGINÁRIOS DA AMÉRICA PORTUGUESA ..................................... 58 
14.1 Diversidade cultural e econômica dos povos indígenas ......................................... 60 
14.2 Assimilações e confrontos culturais ....................................................................... 63 
15 REVOLUÇÃO LIBERAL DO PORTO ........................................................................ 66 
16 A ESCRAVIZAÇÃO DOS POVOS AFRICANOS E O TRÁFICO ............................... 71 
16.1 Portugal, África e o comércio de escravizados ....................................................... 74 
16.2 A economia colonial e a escravidão ....................................................................... 77 
17 O CICLO DO OURO E A BUSCA POR METAIS PRECIOSOS ................................ 81 
17.1 As bandeiras e as entradas .................................................................................... 83 
17.2 Política e sociedade entre o açúcar e o ouro ......................................................... 86 
18 A IGREJA CATÓLICA E A COLONIZAÇÃO DA AMÉRICA PORTUGUESA ............ 88 
18.1 Sincretismos religiosos ........................................................................................... 92 
18.2 Artes e literatura na América portuguesa ............................................................... 94 
18.2.1 As artes ............................................................................................................... 96 
19 A ADMINISTRAÇÃO POMBALINA E AS TRANSFORMAÇÕES NA COLÔNIA ....... 97 
19.1 Portugal e as reformas do marquês ....................................................................... 98 
19.1.1 As reformas pombalinas para as colônias portuguesas .................................... 100 
19.2 As ações do Marquês de Pombal no Brasil Colonial ............................................ 104 
19.2.1 Reformas econômicas ....................................................................................... 104 
 
3 
 
 
19.2.2 Reformas político-administrativas ..................................................................... 107 
19.3 A expulsão dos jesuítas e a reforma educacional ................................................ 109 
20 OS ANTECEDENTES DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA .......................................... 112 
20.1 A influência iluminista e norte-americana ............................................................. 117 
21 A INCONFIDÊNCIA MINEIRA ................................................................................. 120 
21.1 Os inconfidentes ................................................................................................... 120 
21.2 As propostas dos inconfidentes ............................................................................ 126 
22 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 132 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material é 
semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase 
improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer 
uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é 
que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a 
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas 
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo 
hábil. 
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa 
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das 
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que 
lhe convier para isso. 
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida 
e prazos definidos para as atividades. 
 
Bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
 
2 A EUROPA DURANTE A IDADE MODERNA 
O conceito de “modernidade” possui muitas definições, sendo a referência à Idade 
Moderna uma de suas acepções. Em termos gerais, tal período foi inaugurado pelas 
transformações ocorridas na Europa durante os séculos XV e XVI, cujas consequências 
estendem-se até hoje. Examinemos, antes de mais nada, os principais aspectos dessas 
mudanças. Do ponto de vistapolítico, houve uma progressiva centralização do poder e, 
paralelamente, um fortalecimento da figura do rei, o que levou à organização do Estado 
moderno, ou das monarquias nacionais, caracterizadas por práticas políticas 
absolutistas. Contudo, essa transformação não ocorreu da mesma forma, nem no mesmo 
período, em todas nações europeias. Há historiadores, como António Manuel Hespanha, 
que negam o caráter absolutista da monarquia portuguesa, principalmente nos séculos 
XVI e XVII. Para ele, a monarquia portuguesa trazia consigo uma série de características 
herdadas do medievo: o corporativismo, o respeito a certos códigos jurídicos e a 
existência de múltiplos centros de poder, uma herança da escolástica e de práticas de 
autogoverno que eram originárias do cristianismo e sua disciplina social (amorosa, 
consentida e voluntária) (FRAGOSO, 2012, p. 120). 
Nas palavras de Hespanha: 
[...] o poder real partilhava o espaço político com poderes de maior ou menor 
hierarquia; o direito legislativo da Coroa era limitado e enquadrado pela doutrina 
jurídica [...] e pelos usos e práticas jurídicos locais; os deveres políticos cediam 
perante os deveres morais (graça, piedade, misericórdia, gratidão) ou afetivos, 
decorrentes de laços de amizade, institucionalizados em redes de amigos e de 
clientes; os oficiais régios gozavam de uma proteção muito alargada dos seus 
direitos e atribuições, podendo fazê-los valer mesmo em confronto com rei e 
tendendo, por isso, a minar e expropriar o poder real (HESPANHA, 2001, p. 166). 
Essa mudança interpretativa também tingiu a compreensão das relações entre a 
metrópole e a colônia. Para além da visão de uma relação de dependência e 
subordinação, Portugal e suas colônias passaram a ser compreendidas como uma 
monarquia pluricontinental, partes integrantes do Império Português. Imaginando o 
império como um corpo, a monarquia seria a cabeça e as instituições que auxiliavam na 
governança, órgãos indispensáveis a esse corpo (HESPANHA, 2001). Essa mudança de 
perspectiva do ponto de vista político também influenciou as compreensões sobre a 
 
6 
 
 
economia, pois a maior fonte de riqueza para Portugal era proveniente da renda das 
conquistas ultramarinas, e não do comércio de produtos manufaturados. O ouro 
proveniente da América portuguesa, somado ao comércio de africanos escravizados, 
teria sido o responsável, nos séculos seguintes, pela opulência da monarquia lusitana, 
que, nesse aspecto, viria a se assemelhar às demais monarquias absolutas europeias, 
mas ainda com grandes diferenças, como na aliança entre o Estado e a Igreja: 
Ao pensar em Portugal no Antigo Regime, talvez a primeira imagem que nos surja 
seja a de D. João V, cercado por belos palácios, igrejas e conventos ricamente 
adornados. O universo de fausto no qual viveu “o Magnânimo” de Portugal foi 
reflexo da entrada aparentemente infindável de ouro brasileiro. Ao mesmo tempo 
em que Portugal ganhava uma vida de corte que, grosso modo, podemos 
aproximar dos hábitos da corte francesa, eram também reforçados os laços entre 
o Estado e a Igreja. A ligação do monarca com o setor religioso legou a Portugal 
a imagem de atraso — especialmente no que diz respeito ao pensamento — 
quando comparado aos seus vizinhos europeus (CONTI, 2018, p. 405). 
Quanto ao aspecto econômico, importantes modificações na passagem da Idade 
Média para a Idade Moderna estabeleceram a economia do Antigo Regime português. O 
incremento das atividades comerciais, somado às mudanças nas relações de produção 
e de trabalho, configuraram as práticas econômicas mercantilistas. A busca por novos 
mercados incentivou a expansão comercial e marítima europeia. Em relação à sociedade, 
o desenvolvimento do comércio foi acompanhado pelo surgimento e fortalecimento da 
burguesia, que passou a ganhar importância social, gerando conflitos com a nobreza, 
frente a seus privilégios, e aos camponeses, devido à exploração. 
Já quanto à cultura e à religião, o Antigo Regime se caracterizou por uma paulatina 
transformação nas mentalidades, incutindo valores renascentistas e iluministas, que 
transformaram a ciência, a filosofia e a superstição. Não esqueçamos das 
transformações ocorridas na Europa em função dos contatos estabelecidos com outras 
culturas e outros povos, em função das rotas comerciais marítimas e terrestres. Nesses 
contatos, houve muitos intercâmbios de conhecimentos e ideias. Assim, o Renascimento 
e o Iluminismo não são movimentos unicamente europeus, pois foram enriquecidos pela 
interação dos europeus com outros povos. Mas, afinal, de que forma Portugal se insere 
nesse contexto? Aprofundaremos a formação do Estado nacional português e suas 
 
7 
 
 
características nas Unidades de Aprendizagem seguintes, cabendo, apenas uma 
introdução sobre o tema. 
A lógica do Antigo Regime português, que será transferido posteriormente como 
forma de administração do restante do Império ultramarino — as colônias portuguesas 
africanas, americanas e asiáticas eram concebidas como partes do Império Português, 
era a seguinte, de acordo com Navarro (2019, p. 235): 
Trata-se de um sistema corporativo, em que cada membro do corpo social tem 
sua função. Nesse contexto, a monarquia ocuparia o lugar da cabeça, tendo 
funções mais dominantes, mas não sendo capaz de concentrar todo o poder ou 
de por fim aos os demais membros ou polos de poder. A função da monarquia 
seria a de trazer harmonia ao corpo social, respeitando suas inclinações naturais 
e exercendo a justiça. Assim sendo, há uma aproximação evidente do poder com 
o direito [...]. Juntamente com o poder real da monarquia, havia uma variedade 
de poderes locais que também eram exercidos. A mesma lógica vale para o 
direito do período, em que também havia mais de uma fonte de normatividade. 
Além do direito comum, o direito local e costumeiro era sempre privilegiado, 
visando a resolução de problemas de forma casuística. 
Como afirmado anteriormente, e corroborado por Maria Fernanda Bicalho (2005), do 
ponto de vista político, o Antigo Regime português se caracterizaria por uma série de 
instituições e práticas norteadas por um ideário de conquistas, pelo sistema de mercês e 
por poderes municipais descentralizados. Ainda de acordo com a autora, o que vigia 
então na Península Ibérica era: 
[...] uma visão corporativa da sociedade, difundida pelo paradigma 
jurisdicionalista dos séculos XVI e XVII, apontando para uma concepção limitada 
do poder régio, segundo a qual o monarca representava simbolicamente o corpo 
social e político, mantendo seu equilíbrio e harmonia, zelando pela religião, 
preservando a paz e a ordem, garantindo, sobretudo, a justiça. O atributo mais 
importante da realeza, a justiça, correspondia ao princípio de “dar a cada um o 
que é seu”, repartindo prêmio e castigo, respeitando direitos e privilégios, 
cumprindo contratos estabelecidos (BICALHO, 2005, p. 22). 
Essa abordagem, que se coaduna com as investigações mais recentes sobre o 
Antigo Regime em Portugal, nos ajudam a desconstruir certas representações sobre o 
Estado absolutista e generalizações que são feitas a partir de algumas experiências para 
toda a realidade europeia da modernidade. 
 
8 
 
 
2.1 A economia portuguesa 
Nos últimos anos, houve significativas mudanças na forma de compreender a 
economia de Portugal durante o Antigo Regime, principalmente no que diz respeito às 
práticas coloniais. Para tanto, foi necessário que os autores passassem a encarar 
Portugal e suas colônias como partes constitutivas de um mesmo espaço, o Império Luso 
ou Português, organizado segundo uma monarquia pluricontinental. Assim, foi possível 
extrapolar a compreensão da América Portuguesa como uma colônia que exportava 
matérias-primas e importava produtos manufaturados, na lógica do pacto colonial 
mercantilista, e problematizar a noção de capitalismo comercial e de Estado absolutista 
para Portugal (FRAGOSO, 2012). Vejamosalgumas teses, vinculadas a uma 
historiografia marxista ortodoxa, para a economia portuguesa durante a modernidade. 
Nessa concepção, Portugal se encontraria em um estágio econômico chamado de 
capitalismo comercial ou mercantilismo, que seriam os conjuntos de práticas econômicas 
adotadas pelas monarquias absolutistas durante a Idade Moderna, em que o comércio e 
a possessão de metais preciosos (metalismo) eram considerados as fontes de geração 
de riquezas para os Estados europeus. 
De acordo com Magalhães (1964, p. 66): 
[...] foram os descobrimentos marítimos de portugueses e espanhóis que, 
provocando uma transformação profunda nas condições dos países ibéricos, 
fizeram surgir dos espíritos a ideia da supremacia da riqueza monetária, 
sobretudo a partir do século XVI. A constituição do vasto império português, 
absorvido em 1580 no ainda mais vasto império espanhol de Filipe II, e o 
espetáculo de grandeza e opulência nunca vistas que este último ofereceu à 
Europa, em conjunção com o considerável afluxo de metais preciosos provindos 
do continente americano, foram os fatores determinantes da convicção de que a 
riqueza das nações estava diretamente relacionada com as suas reservas de 
metais preciosos, o seu estoque monetário. 
O Estado interviria na economia mediante a cobrança de impostos, de práticas 
protecionistas, do controle da balança comercial e do estabelecimento de monopólios. 
Além disso, o mercantilismo seria indissociável do colonialismo. 
João Fragoso (2012) afirma que Caio Prado Júnior, Celso Furtado e Fernando Novais 
são representantes dessa abordagem, defendendo “que a sociedade da América Lusa 
dos séculos XVII e XVIII fora construída com o propósito de fomentar a transição do 
 
9 
 
 
feudalismo para o capitalismo na Europa, ou ainda com o intuito de viabilizar a revolução 
industrial inglesa do século XIX” (FRAGOSO, 2012, p. 107). Para essa vertente 
historiográfica, a América estaria em uma posição de subordinação em relação a Portugal 
com a três finalidades (FRAGOSO, 2012): 
 
• produzir mercadorias a baixo custo, o que permitiria revendê-las a lucros fabulosos 
para o capital mercantil europeu; 
• gerar um mercado americano ávido por produtos manufaturados, de modo a 
fomentar a produção industrial europeia; 
• atrair mão de obra africana e com isto ampliar o comércio de homens e mulheres 
no Atlântico Sul, atividade controlada pelos negreiros europeus. 
 
Ainda de acordo com Fragoso (2012, p. 107): 
O resultado destas vontades do capitalismo comercial europeu seria a 
constituição, na América lusa da passagem do século XVI para o XVII, grosso 
modo, de um grande canavial gerenciado por senhores de engenhos, porém 
dirigidos por um “capital não residente” (ou seja, vinculado à metrópole). Assim, 
a economia colonial não tinha dinâmica própria, e seu destino dependia dos 
humores do mercado europeu. Outra consequência seria a inexistência de um 
mercado interno ou ainda de produções mercantis in loco voltadas para o 
abastecimento da América. Estas atividades não podiam existir, pois colocariam 
em perigo o sentido da colonização. Quando tais lavouras de abastecimento ou 
currais surgiam, isto se dava em razão dos interesses das atividades 
exportadoras. E, consequentemente, as produções mercantis ligadas ao 
consumo interno estavam também subordinadas à lógica das flutuações do 
sistema econômico maior ao qual pertencia aquele imenso canavial. 
Contudo, a partir do desenvolvimento nas décadas de 1970, 1980 e 1990 de 
pesquisas com a utilização de fontes primárias do período da América Portuguesa, 
descobriu-se outra realidade, que contrastava com o esquematismo e a generalização 
característicos dessa abordagem ortodoxa. Essas novas interpretações questionaram as 
análises desenvolvidas sobre a relação entre a metrópole e a colônia, sobre o tráfico e a 
escravidão e sobre o mercado interno, problematizando a suposta “dependência” da 
América Portuguesa em relação à Portugal e sua função como mera exportadora de 
matérias-primas (FRAGOSO, 2012). Além disso, esses autores chamaram a atenção 
para o possível anacronismo em compreender a economia do período colonial com 
 
10 
 
 
pressupostos do século XIX, quando o Brasil já era um império. Assim, torna-se 
importante compreender de que forma o mercantilismo se materializou nas práticas 
econômicas do Império Português. Dessa forma, podemos elencar a legislação de 
proibição de exportação de metais preciosos, a publicação de doutrinas coibindo o luxo 
e a importação de produtos caros (em ambos os casos, explicita-se o controle da balança 
comercial), o fomento de manufaturas nacionais e a criação de companhias para o 
comércio ultramarino (MAGALHÃES, 1964, p. 77). 
Além disso, é fundamental destacar que a economia de Portugal durante o Antigo 
Regime era totalmente vinculada ao império ultramarino, seja no comércio marítimo ou 
no incremento do mercado interno dele consequente. Segundo Monteiro (2010, p. 254), 
“em 1506 e em 1518–1519, as receitas do ouro da Mina, das especiarias asiáticas, do 
pau-brasil e das ilhas do Atlântico, entre outras, representavam cerca de dois terços das 
receitas régias, superando em muito as rendas fornecidas pelo próprio reino”. Ainda 
assim, isso não significa que, na prática, o Império Português tenha conseguido seguir 
os preceitos da política econômica mercantilista. Em termos dos problemas relativos aos 
monopólios, por exemplo, Ronaldo Vainfas (2000) comenta que a exclusividade mercantil 
nunca foi rigorosamente aplicada. Medidas como a de D. Sebastião, em 1571, 
determinando que apenas navios portugueses poderiam comerciar com o Brasil não 
funcionaram na prática, tendo em vista a frequência com que os navios holandeses 
aportavam no Nordeste, região que distribuía boa parte do açúcar luso-brasileiro na 
Europa. “Durante a União Ibérica, estabeleceu-se um sistema de frota única, proveniente 
de Portugal, mantido após a Restauração em 1640. Muitos mercadores se queixaram 
pela perda de negócios, mas essa estratégia foi mantida até a abertura dos portos no 
Brasil em 1808” (VAINFAS, 2000, p. 392). 
Acredita-se que somente durante o reinado de D. José I (1750–1777), com a 
administração do Marquês de Pombal, é que Portugal teria realizado um esforço para o 
desenvolvimento da metrópole com base no modelo mercantilista, promovido pela 
reestruturação da economia do império ultramarino, principalmente com o fortalecimento 
das companhias comerciais portuguesas. O monarca antecessor, D. João V (1706-1750), 
havia implementado diversos mecanismos para garantir o monopólio português em 
 
11 
 
 
relação às minas de ouro e diamantes, durante o auge do ciclo de ouro. Porém, ainda 
segundo Vainfas (2000, p. 393): 
[...] foram vários, sempre, os obstáculos à adoção de uma política rigorosamente 
mercantilista em Portugal, antes de tudo pelo arcaísmo de sua estrutura social e 
institucional, agrária e patrimonialista. Exemplifica-o o fracasso das companhias 
de comércio pombalinas, que restringiam o monopólio a um estreito círculo de 
acionistas. Isso contrariava o estilo monopolista português que concedia, no 
comércio colonial, a “liberdade total” aos portos lusitanos, mas funcionava à base 
de arrematação de estancos e direitos fiscais por contratadores particulares, 
mecanismo no qual intervinham clientelas e relações pessoais. 
2.2 A sociedade portuguesa 
Durante a Idade Moderna, configurou-se em Portugal uma forma de organização 
social chamada por alguns autores de corporativa. Em outras palavras, criava-se uma 
cadeia de obrigações recíprocas entre o rei e seus súditos, que lhe prestavam serviços 
e, em troca deles, exigiam “mercês”, como explicado anteriormente, o que gerava 
engrandecimento e atribuição de status, honra e posição mais elevada na hierarquia 
social ao súdito, que retribuía ao monarca com agradecimento e profundo 
reconhecimento (BICALHO, 2005). Eis aí uma dasmarcas do feudalismo ainda 
existentes na modernidade: uma relação baseada na submissão e na lealdade, como a 
vassalagem medieval, além da obediência: 
Na verdade, aquela disciplina social católica, na época moderna, conferia certa 
uniformidade à monarquia pluricontinental. E aqui não custa insistir na ideia de 
obediência, pois ela era capaz de exercer o papel dos mecanismos de controle 
visíveis de um Estado absolutista. Aquela disciplina possibilitava que a 
subordinação às autoridades e, especialmente a Sua Majestade, se confundisse 
com o amor a Deus (FRAGOSO, 2012, p. 121). 
Falaremos da mobilidade social mais adiante, mas cabe já destacar que uma das 
poucas possibilidades de mobilidade socialmente reconhecidas no Antigo Regime era a 
graça régia, as benesses recebidas do monarca em razão do desempenho de uma 
função. O enriquecimento, por exemplo, não era visto com bons olhos, e não era forma 
legitimada socialmente de ascensão social, em razão das crenças católicas 
predominantes, que condenavam o lucro e a usura (HESPANHA, 2006). Além dessas 
características da sociedade portuguesa, é importante destacar que tanto a monarquia 
 
12 
 
 
quanto a aristocracia eram dependentes economicamente das possessões portuguesas 
e riquezas ultramarinas. De acordo com Fragoso (2012, p. 118), o rei e a nobreza “viviam 
de recursos oriundos não tanto dos camponeses europeus (agricultura e cobrança de 
impostos), como em outras partes do Velho Mundo, mas do ultramar”. Ou seja, viviam 
sobretudo da produção dos indígenas e depois dos escravos africanos levados às 
plantações americanas. A monarquia e a nobreza tinham, então, “na periferia a sua 
centralidade e o seu sustento, e isto era feito pelo comércio, tendo por base produtiva a 
partir do século XVII principalmente a escravidão africana na América.” Em outras 
palavras, o desenvolvimento de Portugal se deveu ao tráfico, a fonte principal de seu 
sustento. 
De acordo com Raminelli (2013), a sociedade portuguesa estava caracterizada por 
estamentos, organizados da seguinte forma: o primeiro estrato social era formado por 
fidalgos e nobres, que haviam recebido esse título; um segundo estrato era composto por 
juízes, vereadores, oficiais de tropas pagas, milícias e ordenanças, licenciados e 
negociantes de grosso trato (como eram chamados os traficantes de escravizados). Essa 
nobreza podia ser hereditária, originando os fidalgos, ou então civil e/ou política, formada 
por indivíduos tornados nobres pelo soberano em função de méritos ou serviços 
prestados. A primeira era considerada a “alta nobreza” e a segunda, a “baixa nobreza”. 
Nesse sentido, Portugal se assemelhava às demais monarquias da Europa, de 
acordo com a análise de Raminelli (2013, p. 89): 
Desde a Restauração portuguesa, sobretudo no século XVIII, a Coroa promoveu 
a atrofia da alta nobreza, ao mesmo tempo em que distribuía mercês e ampliava 
a baixa nobreza. Assim, a monarquia preservou por muito tempo os privilégios 
dos titulados e grandes e impossibilitou a introdução de plebeus no cume da 
pirâmide social. Para manter a estrutura hierárquica, a doutrina jurídica lusa criou 
o “estado do meio” ou a “nobreza política”, categoria equidistante entre a fidalguia 
e o povo mecânico. No reino português, a alta nobreza era fechada, como na 
Inglaterra, enquanto a baixa nobreza aumentava ao sabor das mercês e alianças 
tramadas pela monarquia. 
Podemos afirmar que essa era uma semelhança de Portugal com os demais Estados 
modernos: a sociedade estamental e a vigência de privilégios, além da dificuldade de 
mobilidade social para as classes menos abastadas. A esse respeito, Hespanha (2006, 
p. 122) é taxativo quanto à mobilidade social da sociedade portuguesa: 
 
13 
 
 
Alguma mobilidade começava, desde logo, por ser impossível. Não se podia 
deixar de ser mulher, por exemplo. Demente era também um estado 
tendencialmente definitivo. Menor, deixava-se naturalmente de se ser, mas pela 
passagem objetiva e natural do tempo, a menos que interviesse algo de 
extraordinário, como a graça real da emancipação. Selvagens e rústicos podiam, 
relativamente, aperfeiçoar-se. Mas os progressos eram problemáticos e lentos, 
ligados a um êxito educativo mais longo e mais incerto do que o das crianças. 
Menos definitivo era o estado de mecânico ou de pobre. Mas, mesmo nestes 
casos, a mudança tinha que respeitar ritmos e passos que não dependiam senão 
em muito pouco da vontade própria. Não quero com isto dizer que a situação 
(econômica, social, cultural) das pessoas não mudasse, para melhor ou para pior. 
Quero antes sugerir que isto: a) quase não se via; b) pouco se esperava; c) e mal 
se desejava. 
O que se tinha, então, era uma sociedade fundada nos privilégios de nascimento ou 
na conquista de títulos de nobreza mediante o sistema de mercês e na preeminência do 
clero, para além da força da Igreja Católica, da Inquisição e da intolerância religiosa 
(VILLALTA, 2016). A Inquisição, nesse sentido, pode nos ensinar muito sobre a 
sociedade portuguesa do Antigo Regime. Conforme Schaub (2000, p. 125), a inquisição 
era “produtora de distinção social e garantidora de pureza de sangue de seus oficiais e 
confidentes” e, portanto, era 
[...] legitimada por famílias que desejavam adquirir uma dignidade social 
definitiva. [...] Em vez do Santo Ofício aparecer como o tribunal onde o conjunto 
da sociedade acorre a prestar contas, [...] a inquisição era uma instituição imersa 
numa complexa dinâmica social e cultural, definida e configurada pelas 
pretensões daqueles que a integram em benefício próprio. 
Assim, a missão dos inquisidores era não somente disciplinar a sociedade, mas 
também marcar distâncias entre os grupos sociais e fortalecer as relações de dominação. 
3 A REVOLUÇÃO DE AVIS 
A história de Portugal como reino independente está diretamente relacionada às 
empreitadas de expulsão dos muçulmanos da Península Ibérica durante as Guerras de 
Reconquista. O primeiro rei português, Afonso I, assume em 1139, inaugurando a 
dinastia do Borgonha, que permanecerá no poder até a Revolução de Avis. Chamamos 
de Revolução de Avis (1383–1385) os confrontos resultantes da crise sucessória ocorrida 
em Portugal a partir de 1383. A morte de D. Fernando I, o último monarca da dinastia dos 
 
14 
 
 
Borgonha, ocasionou um problema na sucessão, porque aquela que deveria assumir o 
cargo, além de não ser bem quista pela população, representava uma ameaça pela 
proximidade com a coroa de Castela. O casamento de Fernando I provocou 
descontentamento de parte do reino, pois escolheu como esposa Leonor Teles, em 
detrimento de vantajosos acordos de casamento com herdeiras dos reinos vizinhos. O 
casal não teve filhos homens; sua única filha, Beatriz, foi entregue em acordo de 
casamento ao rei D. João de Castela. Essa situação criou então a possibilidade do rei de 
Castela vir a se tornar rei de Portugal. Assim, D. Fernando procurou evitar essa 
possibilidade mediante certas determinações no acordo de casamento (COSER, 2015). 
Além disso, seu governo enfrentou grandes pressões, já que a “mudança na 
correlação de forças internas, os anseios dos homens bons das cidades, a insatisfação 
dos filhos segundos da nobreza, o peso das guerras e das pilhagens geravam 
conturbações sociais que se agravaram no reinado de D. Fernando, o último rei da 
dinastia de Borgonha” (COSER, 2015, p. 703). Assim, o problema sucessório da coroa 
transformou-se em uma revolta, que envolveu diferentes estratos da sociedade: 
A oposição à rainha intensificou-se em Portugal, em especial em Lisboa, onde 
iniciou-se o movimento que seria chamado de Revolução de Avis, quando, em 
dezembro de 1383 o conde Andeiro foi assassinado pelo grupo de D. João, o 
Mestre de Avis, filho bastardo do rei D. Pedro e meio-irmão de D. Fernando. O 
movimento iniciado em Lisboa contra a regente alastrou-se por várias regiões do 
reino e o Mestre de Avis assumiu a regênciado reino. Neste meio tempo, o rei 
de Castela marchava para Portugal para reclamar seus direitos sobre o trono, 
que culminaria no cerco da cidade de Lisboa, no ano seguinte. A cidade resistiu 
à invasão e em 1385 D. João, o Mestre de Avis, foi escolhido o novo rei de 
Portugal nas Cortes de Coimbra. No mesmo ano, o rei de Castela invadiu mais 
uma vez Portugal e foi vencido em Aljubarrota, numa batalha que foi tida como 
milagre pelos portugueses (COSER, 2015, p. 705). 
O encerramento da crise se deu com a coroação de João, Mestre de Avis, como rei 
de Portugal, passando a se chamar D. João I, inaugurando a dinastia de Avis. D. João I 
(1357–1433) era filho bastardo do rei D. Pedro I, da dinastia de Borgonha, e sua 
aclamação como rei foi favorecida pelo “medo da ameaça estrangeira do rei D. João de 
Castela, casado com D. Beatriz, filha do rei D. Fernando I e D. Leonor e a antipatia do 
povo português para com a viúva D. Leonor, casada com o rei D. Fernando I, irmão do 
Mestre de Avis” (BLANCO, 2016, p. 18). D. João I possuía apoio popular, suporte de 
grande parte do clero e de alguns nobres que almejavam maior prestígio. A Revolução 
 
15 
 
 
de Avis teve consequências políticas e econômicas. Quanto ao primeiro aspecto, o 
evento marca a efetiva independência de Portugal em relação ao reino de Castela. “O 
discurso desenvolvido pela nova dinastia, para além da afirmação de sua legitimidade, 
objetivava promover o rei a um soberano de fato no reino português. E o rei como 
verdadeiro soberano seria o rei capaz de unir todos os segmentos sociais, justamente 
por sobrepor-se a eles, formando uma unidade reconhecível por todos, que viria a 
constituir a nação portuguesa” (COSER, 2015, p. 708). 
E qual a relação da Revolução de Avis com o mercantilismo português? Antes de 
respondermos essa pergunta, é importante destacarmos que Portugal estava inserida 
em importantes rotas comerciais dos países da Europa setentrional, que faziam escala 
nos portos de Lisboa e do Porto. A inserção desses portos nas rotas de navegação dos 
mercadores flamencos e italianos levou ao desenvolvimento da burguesia marítimo-
comercial portuguesa, que encontrou na Revolução de Avis uma oportunidade de 
associar-se com a coroa para o desenvolvimento das grandes navegações. Parece haver 
um consenso na historiografia de que, com a dinastia dos Avis, temos o início da 
expansão marítima portuguesa (CONFORTO, 2003). Lembremos que esses 
acontecimentos ocorreram em meio às crises que atingiram a Europa no século XIV, 
como a Peste Negra e a Guerra dos Cem Anos, que causaram prejuízos à agricultura em 
função da indisponibilidade de mão de obra. 
Ainda com esses reveses, Portugal foi capaz de desenvolver suas práticas 
comerciais, área com bastante proeminência desde a Idade Média, com o surgimento de 
uma burguesia comercial marítima. Esse estrato social surgiu em função da posição 
geográfica portuguesa, pois seus portos eram utilizados como escala para os mercadores 
do norte da Europa, quando viajavam para comerciar no Mar Mediterrâneo. De acordo 
com Conforto (2003, p. 250), “a entrada dos portos marítimos portugueses nas rotas de 
navegação levou [...] judeus, genoveses, marselheses, flamengos e outros a se 
estabelecerem definitivamente em terras portuguesas”. Esse grupo comercial mercantil 
viu-se ameaçado com a crise sucessória em Portugal e uma possível submissão do reino 
de Portugal a Castela, o que ocorreria caso a herdeira, Beatriz, assumisse a coroa. Essa 
ameaça levou a burguesia mercantil portuguesa a apoiar João, Mestre de Avis. 
Conforme Conforto (2003, p. 250): 
 
16 
 
 
A revolução de Avis entronizou um monarca sensível a interesses da burguesia 
comercial. [...] Foi sob o comando de D. João I que Portugal entrou na fase 
mercantilista e na epopeia das grandes navegações. A insuficiência portuguesa 
em metal circulante, em produtos agrícolas e em mão de obra, sua posição 
geográfica privilegiada, a tradição da escola de Sagres e os desejos de expansão 
da fé cristã são causas apontadas para o expansionismo português. A principal 
causa foi a existência de condições políticas e institucionais favoráveis à 
expansão. 
4 PORTUGAL E O MAR 
Achamento, conquista, descobrimento, colonialismo, evangelização, império... 
Diferentes termos foram utilizados para se referir ao processo de expansão marítimo-
comercial na África e na Ásia e à chegada de Portugal na América, além da exploração 
econômica dessas rotas e regiões. Independentemente das palavras utilizadas, algumas 
com maior precisão conceitual, outras empregadas pelos contemporâneos dos eventos, 
mares e oceanos tiveram fundamental importância na constituição do Império Português. 
Os registros da utilização marítima com finalidade econômica e de subsistência em 
Portugal são muito antigos. Lembremos da localização geográfica de Portugal, com seu 
litoral no Mar Mediterrâneo e no Oceano Atlântico. Os portos portugueses eram utilizados 
como parada para as embarcações provenientes do norte da Europa e que comerciavam 
com as cidades italianas, via Mar Mediterrâneo. Em relação ao contexto que estamos 
estudando, cabe destacar a data de 1340 como um marco, pois foi nesse ano que ocorreu 
a primeira empreitada dos portugueses no Oceano Atlântico. Juntamente com a coroa de 
Castela e principados italianos, aventuraram-se em direção ao sul, encontrando as Ilhas 
Canárias (COELHO, 2000). 
Após a Revolução de Avis, houve um aumento nas expansões marítimas e, 
paralelamente a esse processo, um incremento tecnológico, permitindo a conquista de 
territórios e o estabelecimento de rotas comerciais muito importantes. De acordo com 
Fausto (1995, p. 22), “embora alguns historiadores considerem a revolução de 1383 uma 
revolução burguesa, o fato importante está em que ela reforçou e centralizou o poder 
monárquico, a partir da política posta em prática pelo Mestre de Avis. Em torno dele, 
foram se reagrupando os vários setores sociais influentes da sociedade portuguesa: a 
nobreza, os comerciantes, a burocracia nascente”. Vejamos alguns dos aspectos do 
 
17 
 
 
desenvolvimento tecnológico do período. Primeiramente, é preciso fazer referência ao 
aperfeiçoamento da arte de navegar, por meio da Escola de Sagres. De acordo com João 
(2005, p. 418): 
Apesar de todas as dúvidas dos especialistas, a ideia mais aceita e divulgada 
continua a apontar Sagres e o seu imponente Promontório como um local 
privilegiado para o controle da navegação entre o Mediterrâneo e o Atlântico, cuja 
importância tinha sido claramente percebida pelo Infante D. Henrique. Por isso, 
ali quis edificar a sua Vila para apoiar os navios que cruzavam a região. [...] 
Sagres se foi transformando num lugar mítico da memória. A sua ligação ao 
Infante D. Henrique e ao início dos descobrimentos portugueses tem muito de 
lendário. Mas a sua força impôs-se no imaginário e tornou-se um símbolo de uma 
época e de um povo. 
Sagres seria uma evidência da mudança de mentalidade, com a valorização da 
ciência e da experimentação, sem necessariamente o abandono da religião: “essa paixão 
naturalista da Renascença nos seus primeiros tempos, essa tenaz curiosidade científica, 
diferia essencialmente do misticismo religioso da Idade Média, eivado de fantasias 
cabalísticas e da ingenuidade das mitogenias primitivas. O homem já preferia a ciência à 
imaginação: rejeitava as fábulas, e confiava tudo aos processos e aos meios positivos” 
(BLANCO, 2016, p. 22). Além do revolucionário desenvolvimento da chamada caravela 
latina, em Sagres também foram aperfeiçoados instrumentos de navegação como o 
astrolábio, a balestilha, a bússola, o quadrante e o sextante. Dessa forma, deu-se nessa 
época e local uma série de aprimoramentos na cartografia e nos cálculos de distâncias e 
grandezas, como a medida da circunferência da Terra em léguas. Com a caravela latina 
e com esses melhoramentos tecnológicos, Portugal se transformouno primeiro país 
europeu a maximizar o potencial do sistema de ventos e correntes marítimas equatoriais 
(RUSSEL-WOOD, 2001). 
A partir dessa vocação marítima, Portugal estabeleceu seu Império Atlântico, que 
englobava possessões na África continental e arquipélagos atlânticos. Foram 
desenvolvidas não somente rotas entre Portugal e África e Portugal e América, mas 
também um comércio triangular (Europa–África–América) e, posteriormente, bilateral, 
envolvendo diretamente comerciantes da América Portuguesa com comerciantes de 
Angola, São Tomé, Príncipe, Cabo Verde, Açores e Madeira (RUSSEL-WOOD, 2001). 
Esse fato ocasionou um fortalecimento dos portos de Salvador e do Rio de Janeiro, que, 
 
18 
 
 
segundo Russel-Wood (2001, p. 12), tiveram “uma próspera área portuária, testemunho 
da sua importância como empórios, tanto para a cabotagem como para o comércio 
oceânico, e cada uma podia contar com a presença de fortes fortins, baluartes e redutos 
em volta das respectivas baías e áreas contíguas”. Podemos afirmar, dessa forma, que 
a expansão marítimo-comercial portuguesa correspondia aos vários interesses das 
diferentes classes sociais e instituições. Para os comerciantes, significava uma 
possibilidade de bons negócios; para o rei, novas receitas e aumento dos rendimentos 
da coroa; para os nobres e membros da Igreja, novos convertidos e recompensas com 
cargos mediante a prática das mercês; e para o povo, uma possibilidade de vida nova. 
4.1 As navegações portuguesas 
As navegações portuguesas, portanto, inserem-se em uma conjuntura não somente 
de busca por novas rotas marítimas a novos mercados e busca de solução para os 
problemas enfrentados por Portugal no século XV (crise econômica, declínio 
populacional), mas também de mudança de mentalidade, com maior disposição para a 
aventura e para o novo. Portugal procura, dessa forma, incrementar o comércio com a 
África, fornecedora de escravizados e metais preciosos, e com a Ásia, que fornecia 
especiarias, pedrarias e seda. Para o financiamento da expansão ultramarina, Portugal 
utilizou recursos provenientes da cobrança de impostos, de empréstimos e de fundos 
acumulados pela Ordem de Cristo. “Estado Pobre, desde o início Portugal recorreu a 
investidores estrangeiros, entre os quais estavam incluídos muitos florentinos, e aos 
empréstimos internos obtidos junto a judeus portugueses, que eram pagos pela Coroa 
quase sempre em espécie” (RAMOS, 1997, p. 75). 
Como dito anteriormente, a expansão marítima e comercial portuguesa teve como 
marco inaugural a conquista de Ceuta em 1415. Posteriormente, os principais marcos do 
expansionismo português foram: a chegada à Ilha da Madeira em 1419; o 
reconhecimento do Arquipélago dos Açores em 1427; a ultrapassagem do Cabo Bojador 
por Gil Eanes em 1434; a ultrapassagem do extremo-sul da África, o Cabo das 
Tormentas, chamado posteriormente de Cabo da Boa Esperança, em 1488; a chegada 
 
19 
 
 
em Calicute, nas Índias, por Vasco da Gama em 1498; e a chegada de Pedro Álvares 
Cabral no território americano em 1500. 
A partir desses dados, podemos afirmar que em menos de um século Portugal 
dominou as rotas comerciais do Atlântico Sul, incluindo África, América e Ásia. Na África, 
os portugueses estabeleceram feitorias (postos fortificados de comércio) para 
negociação de escravizados, especiarias, marfim e ouro. Na América Portuguesa, as 
primeiras práticas comerciais foram extrativistas, vinculadas à exploração do pau-brasil. 
Com a chegada de Cristóvão Colombo à América, financiado pelo governo espanhol, as 
disputas entre Portugal e Espanha pelo domínio do Atlântico tornaram-se mais acirradas, 
levando os dois países a assinarem tratados de partilhas. 
 
• Bula Intercoetera: tratado assinado pelo papa Alexandre VI, em 1493, que dividiu o 
Oceano Atlântico entre Espanha e Portugal, privilegiando o primeiro. 
• Tratado de Tordesilhas: assinado em 1494, novamente com o intermédio papal, 
estipulava um novo limite para as possessões espanholas e portuguesas, permitindo que 
Portugal mantivesse suas rotas marítimas no Atlântico Sul. 
 
Os conflitos com a Espanha e com outros países não foram as únicas dificuldades 
enfrentadas por Portugal, já que as navegações de longa distância em si impunham 
árduos desafios de logística. Ramos (1997, p 76) afirma que um dos principais obstáculos 
enfrentados nessas façanhas se relacionava à alimentação. “A escassez de alimentos 
em Portugal terminava refletindo-se a bordo das embarcações portuguesas, geralmente 
abastecidas para enfrentarem cinco meses de viagem em alto mar, quando na verdade 
a viagem levava no mínimo sete meses. Além do que, os alimentos acabavam se 
deteriorando ao longo da viagem devido ao tempo e às condições de armazenamento 
precárias, sendo a fome companheira constante e inseparável dos navegantes 
portugueses. Em casos extremos, muitas embarcações foram obrigadas a recorrerem 
aos muitos ratos que infestavam o navio como única forma de sobreviver”. Além das 
privações alimentares, o autor faz referência às acomodações a bordo, bastante 
insalubres, que geravam constrangimentos e desconforto. Esse ambiente hostil teria feito 
com que Portugal destinasse cada vez mais degradados para participarem dessas 
 
20 
 
 
carreiras, já que os voluntários se direcionaram à carreira do Brasil. Como se não 
bastasse, havia ainda incontáveis doenças, motins e naufrágios (RAMOS, 1997). 
4.1.1 A chegada dos portugueses na América 
Seja chamada de achamento, conquista, descobrimento ou invasão, a chegada dos 
portugueses na América, no território que posteriormente seria chamado de Brasil, 
sempre foi uma polêmica historiográfica, didática e política, tanto na forma de se referir 
ao evento e quanto nas conotações do emprego de diferentes conceitos. Do ponto de 
vista historiográfico, desde a segunda metade do século XIX havia uma discussão sobre 
a intencionalidade dos portugueses quanto à chegada na América (VAINFAS, 2000). 
“Importava saber se foram mesmo os portugueses os primeiros a chegarem ao litoral do 
atual Brasil ou se outros europeus os haviam precedido. Importavam saber, em segundo 
lugar, se teria ocorrido intencionalidade lusitana na descoberta ou se, pelo contrário, 
havia sido ela casual, resultado de um desvio de rota na viagem da armada de Cabral 
para a Índia causado por uma tempestade no Atlântico, na altura da costa ocidental 
africana” (VAINFAS, 2000, p. 182). De acordo com Vainfas (2000), há quatro conjuntos 
documentais sobre a viagem de Cabral e o descobrimento do Brasil: 
 
• os textos oficiais de preparo da viagem à Índia; 
• os textos dos participantes da viagem; 
• os textos enviados pela coroa portuguesa ao exterior, relatando a descoberta; 
• a documentação cartográfica. 
 
A análise desses documentos, juntamente com as interpretações historiográficas, 
permite “ao menos presumir que Portugal suspeitava da existência de terras no Atlântico 
Sul, a oeste da África, muito antes de 1500. Talvez por isso tenha D. João II insistido, 
depois da viagem de Colombo em 1492, para que se estendesse de 100 para 370 léguas 
o meridiano traçado a oeste de Cabo Verde [...] a fim de que parte das terras por descobrir 
no Atlântico fossem portuguesas” (VAINFAS, 2000, p. 183). A expedição de Pedro 
Alvares Cabral foi organizada após o retorno de Vasco da Gama de sua viagem às Índias. 
 
21 
 
 
Nascido entre 1468 e 1469, Cabral era fidalgo da casa real, chegando posteriormente, 
por volta de 1494, a cavaleiro da Ordem de Cristo, a mais importante ordem de cavalaria 
de Portugal, supondo-se que “alguma coisa tivera feito para merecê-la” (MAGALHÃES, 
2013, p. 10). 
Cabral saiu de Lisboa no dia 9 de março de 1500 com destino a Calicute, na Índia, 
com o objetivo de estabelecer uma feitoria e celebrar acordos para garantir o monopólio 
comercial português. Sua armada era composta de dez naus e três caravelas, totalizando1.500 homens, incluindo representantes da nobreza, artesãos, comerciais, religiosos, 
soldados e degredados (MAGALHÃES, 2013). Em 22 de abril de 1500, chegaram na 
América. No dia 26 de abril, frei Henrique de Coimbra, capelão da esquadra, celebrou a 
primeira missa na nova terra, no local hoje conhecido como Coroa Vermelha, na Bahia. 
Cabral tomou posse formal do novo território em nome da casa real portuguesa em 1º de 
maio. No dia seguinte, a esquadra partiu rumo às Índias. Uma nau voltou a Portugal com 
as cartas dos pilotos, inclusive a de Caminha, que relatavam a descoberta ao rei. Ficaram 
em terra dois desertores e dois marinheiros com a missão de aprender a língua dos 
nativos (MAGALHÃES, 2013). 
Os portugueses, ao chegarem na América, não conheciam a dimensão do território, 
e pensaram se tratar de uma ilha que, inicialmente, chamou-se Vera Cruz. Após as 
navegações exploratórias, mudou-se a compreensão sobre o espaço e a territorialidade, 
e as terras conquistadas por Portugal também foram mudando de nome: Terra de Santa 
Cruz, Terra dos Papagaios, Terra dos Brasis. Esses diferentes nomes aparecem nos 
mapas elaborados à época (SOUZA, 2013). Nos anos seguintes, foram enviados ao 
território uma série de expedições de reconhecimento, e nessas viagens, muitos homens 
se estabeleceram na América. Além de degredados expulsos de Portugal, havia aqueles 
que se sentiam atraídos pela possibilidade de enriquecer, comerciantes, nobres 
empobrecidos em busca de ouro, aventureiros, oficiais reais, soldados, náufragos, 
desertores, religiosos e cristão novos (COSTA, 1956). 
 
22 
 
 
5 A COLONIZAÇÃO E O MERCANTILISMO 
Antes de iniciarmos a discussão sobre o que foi o colonialismo e sua relação com as 
práticas mercantilistas, é necessário fazer referência a um intenso debate historiográfico 
desenvolvido no Brasil e em Portugal nas últimas décadas. Essa discussão entre 
historiadores brasileiros e portugueses visava aprimorar as interpretações sobre a 
economia colonial brasileira, a estrutura do Império Português e as teorias que 
preconizavam a relação entre a metrópole portuguesa e suas colônias. Na década de 
1970, predominavam na historiografia brasileira sobre a América portuguesa 
interpretações que se baseavam em visões bastante dogmáticas do marxismo, 
inspiradas em trabalhos elaborados por Caio Prado Jr. e Celso Furtado, respectivamente 
nas décadas de 1940 e 1950 (FRAGOSO, 2012). Para citar apenas um exemplo, vejamos 
como Fernando Novais compreendia a inserção do Brasil no colonialismo e nas práticas 
mercantis: 
A ocupação, povoamento e valorização econômica do Brasil na época moderna, a 
sua colonização enfim, processando-se na etapa da ascensão burguesa vinculada ao 
capitalismo comercial, dá lugar a uma entidade específica (colônia da metrópole-
Portugal): suas estruturas básicas configuram uma colônia de exploração por se 
formarem e se desenvolverem nos quadros e ao ritmo do antigo sistema colonial de 
relações entre as economias centrais e periféricas do capitalismo mercantil (NOVAIS, 
1969, p. 262). 
Essa interpretação passou a ser criticada na década de 1970, com os trabalhos de 
Ciro Flamarion Cardoso e Jacob Gorender, e, nos anos 1990, com os trabalhos de 
Fernando Novais, que reviu várias posições de seu trabalho, e Laura de Mello e Souza. 
Nos anos 1990, também foram defendidas as teses de doutorado de João Fragoso e 
Manolo Florentino, contribuindo com as críticas às visões mecanicistas sobre a economia 
colonial da América Portuguesa. De acordo com Fragoso (2012, p. 110): 
[...] começou-se a demonstrar que a economia era mais do que uma plantation 
exportadora, existia um circuito de mercados internos disseminados pela 
América. Mesmo nas regiões até então vistas como açucareiras, como o 
Recôncavo Baiano, observou-se a existência de áreas dedicadas à lavoura 
mercantil de alimentos. O conjunto desses resultados colocou dúvidas sobre uma 
série de hipóteses a respeito da dependência. 
 
23 
 
 
Isso significava que as teorias sobre o pacto colonial, os monopólios e os exclusivos 
coloniais, a relação entre metrópole e colônia, precisavam ser revistas, porque as fontes 
primárias destoavam de um marxismo maniqueísta. Fragoso (2012, p. 113) cita um 
exemplo para compreendermos como as dinâmicas econômicas da América Portuguesa 
eram mais complexas que a exportação de matérias-primas e a importação de 
manufaturados, como apregoava o “pacto colonial”: 
Quanto à América lusa como mercado de manufaturados europeus, mais uma 
vez os testamentos podem nos ajudar. Na primeira década do século XVIII, 
camisas, vestidos, lençóis e utensílios domésticos eram vistos como bens 
preciosos e doados como tal nos testamentos a entes queridos como filhos, 
irmãos e amigos. [...] Assim, ao que parece, o crescimento mercantil da cidade 
na época, decorrente da descoberta do ouro das Minas e do aumento do tráfico 
de escravos africanos, não implicou na disseminação de bens de consumo 
manufaturados já vulgarizados na Europa e em partes da América inglesa, como 
têxteis. O padrão de consumo e de mercado nesta América era ainda 
protoindustrial e o seria ainda por muito tempo, como mais uma vez os 
testamentos informam. 
Essa historiografia propôs a compreensão territorial dos domínios portugueses como 
um império (o Império Português) e afirmou que, na América portuguesa, havia um 
mercado interno, com acumulação de capitais e lógica independente do mercado 
externo, que também existia, mas com dinâmicas próprias. Contudo, existe outro grupo 
de historiadores que, via conceitos cunhados por vertentes marxistas — porém com 
aportes teóricos mais sofisticados — criticam essa concepção, por acreditarem que ela 
descaracteriza a ideia do colonialismo. Por isso, esses autores recuperam conceitos 
importantes da lógica colonial, como o do exclusivo colonial, que se relaciona à noção de 
monopólio. De acordo com Ricupero (2016), o exclusivo ou monopólio era uma prática 
das metrópoles com suas colônias, proibindo o comércio dessas com nações 
estrangeiras. Contudo, essa prática, um dos pilares do mercantilismo, não foi estática e 
se transformou ao longo do tempo, de acordo com as demandas conjunturais 
apresentadas. Assim, podia haver, por exemplo, restrição de comércio apenas em 
determinados portos e por companhias comerciais privilegiadas; por outro lado, em 
alguns momentos, o exclusivo podia ser atenuado em virtude de situações específicas, 
como guerras que dificultassem ou impedissem o comércio, mediante a concessão de 
 
24 
 
 
licenças especiais para mercadores estrangeiros por motivos econômicos ou 
diplomáticos (RICUPERO, 2016). 
Nesse sentido, esse grupo de historiadores afirma que são insuficientes os dados 
apresentados pelos críticos da acepção do sistema colonial para invalidar os argumentos 
de que o colonialismo teria contribuído para o desenvolvimento industrial europeu. 
Segundo a análise de Arruda (2014, p. 717): 
[...] é inegável que o mundo colonial teve um papel decisivo neste cenário, 
promovendo a transferência de riquezas das colônias para as metrópoles. No 
caso de Portugal, o excedente sob a forma de remessas líquidas ou créditos 
consignados na balança comercial sustentou os tesouros públicos, alimentou a 
formação da dívida pública, abasteceu os cofres dos particulares envolvidos da 
rede mercantil operando nas águas e territórios do império, além de ter se 
transformado num mercado consumidor seguro para as manufaturas 
portuguesas. 
Outro aspecto fundamental para compreendermos o colonialismo e a lógica mercantil 
é a escravidão. Podemos referi-la como um dos pilares das práticas coloniais, 
responsável pelo enriquecimento de elites na metrópole e nas colônias e pela diáspora 
de milhões de seres humanos pela América e Europa. Nesse aspecto, parece haver 
consenso entre os historiadores. Fragoso e Florentino (2001, p. 88) afirmam que: 
A propriedade escrava eraaltamente disseminada pelo tecido social, sinônimo 
aqui de que camadas variadas da população se encontravam comprometidas 
com a escravidão, independentemente da extensão de suas posses. Mas o alto 
grau de concentração da propriedade escrava nos coloca não apenas diante de 
uma sociedade possuidora de escravos, mas sobretudo ante uma sociedade 
escravista, definida como aquela na qual o principal objetivo da renda extraída 
ao escravo é a reiteração da diferença socioeconômica entre a elite escravocrata 
e todos os outros homens livres. 
Alguns autores, como Souza (2008), propõem o conceito de capital escravista-
mercantil para ressaltar a importância da escravidão para a dinâmica da economia 
mercantil-colonial. 
6 A OCUPAÇÃO DA AMÉRICA PORTUGUESA 
Primeiramente, é importante lembrarmos que o território que hoje constitui o Brasil 
não era conhecido integralmente pelos portugueses no momento de sua chegada à 
 
25 
 
 
América. Esse conhecimento foi sendo realizado paulatinamente ao longo dos 30 
primeiros anos após a “descoberta”, mediante expedições de reconhecimento e 
vigilância. Porém, existiam dúvidas sobre a jurisdição e os limites das possessões 
portuguesas na América, já que o único tratado existente nesse sentido até então era o 
Tratado de Tordesilhas, que serviu para que se compreendesse como “natural” que todo 
o território da América abrangido pelo tratado fosse português (SOUZA, 2001). A 
historiador Laura de Mello e Souza comenta sobre a ausência de maiores interesses da 
coroa portuguesa em relação à posse do território americano: 
Esta, de início, não despertou maiores interesses na corte de D. Manuel, que 
pensava acima de tudo no Oriente e nos projetos que melhor viabilizassem sua 
exploração comercial. Antes talvez de ser vista como espaço econômico, e 
deixando-se de lado o interesse logo despertado pelo pau-brasil, a nova terra 
interessou pela sua capacidade de renovar os conhecimentos cartográficos e 
astronômicos: diferentemente da África ou da Ásia, era terra nunca antes descrita 
ou representada (SOUZA, 2001, p. 62). 
Após a chegada dos portugueses na América em 1500, foram enviadas algumas 
expedições de reconhecimento e alguns europeus foram deixados em território 
americano para aprender a língua dos nativos. Destacam-se as expedições de Gaspar 
de Lemos, em 1501, e de Gonçalo Coelho, em 1503, que tinham como objetivo informar 
a coroa portuguesa sobre a existência de metais preciosos na América. Posteriormente, 
em 1516 e depois em 1526, foram enviadas à América portuguesa expedições 
comandadas por Cristóvão Jacques, que ficaram conhecidas como “expedições guarda-
costas”. Elas tinham o objetivo de combater a presença de estrangeiros em território 
português na América, principalmente os franceses. Essas iniciativas não foram 
suficientes para garantir a posse do território e manter afastados os invasores franceses, 
o que levou a coroa a investir na colonização da América portuguesa (VAINFAS, 2000). 
Ainda de acordo com Vainfas (2000, p. 491): 
[...] a maioria dessas expedições fez um pouco de cada coisa: identificação da 
geografia para fins cartográficos e de navegação; escambo do pau-brasil com os 
índios; fundação de feitorias; defesa da costa contra a crescente presença dos 
entrelopos franceses, rivais no escambo do pau-brasil [...] houve, porém, outras 
expedições além dessas, cujas rotas sugerem o projeto português de encontrar 
metais preciosos na América. As notícias sobre as riquezas no interior do 
continente e o rumor sobre a existência de um “rei branco” (depois identificado 
com o imperador inca) estimularam viagens pelo Prata. 
 
26 
 
 
Não houve inicialmente uma ocupação sistemática da América portuguesa, já que a 
carreira para as Índias era mais rentável financeiramente. Nas primeiras décadas após o 
“descobrimento”, a principal atividade econômica desenvolvida foi a extrativista, com a 
exploração do pau-brasil. O pau-brasil é uma árvore da qual se pode extrair um corante 
vermelho para o tingimento de roupas. A exploração desse recurso se dava por sua 
disponibilidade, o que levava a uma constante migração em função de seu esgotamento. 
A extração era feita por meio do escambo (troca) da força de trabalho indígena por 
objetos trazidos pelos portugueses da Europa. 
Para estocar e proteger a madeira, foram construídos ao longo do litoral feitorias, 
entrepostos comerciais fortificados. O pau-brasil foi declarado produto de monopólio da 
coroa portuguesa, o que nos demonstra a adoção de políticas econômicas mercantilistas 
por Portugal. Contudo, posteriormente, a coroa concedeu o direito de extração a 
arrendatários, em função de sua atenção aos investimentos na carreira das Índias. Os 
arrendatários arcavam com as despesas da extração e pagavam impostos à coroa 
portuguesa, mas ficavam com o lucro nas vendas. De acordo com Souza (2001, p. 63): 
[...] nos 20 primeiros anos de vida do futuro Brasil, os portugueses criaram apenas 
duas feitorias: em 1504, em Cabo Frio; em 1516, em Pernambuco. 
Predominaram, portanto, as atividades de cunho privado, e o Estado poupou 
suas energias para a construção de um império no Oriente. Nenhuma 
preocupação com o povoamento surgiu tampouco nessa época, quando os 
habitantes europeus da costa eram apenas os degredados deixados para trás 
desde a viagem de Cabral, um ou outro desertor das naus, como os grumetes a 
que se refere a carta de Caminha, todos eles constituindo o tipo do “lançado”, 
que desde a experiência quatrocentista da África fazia, voluntária ou 
involuntariamente, a intermediação entre os universos culturais distintos. 
Um marco na história da colonização da América portuguesa foi a expedição de 
Martim Afonso de Souza, que, após navegar até o Rio da Prata, em seu retorno fundou 
o primeiro núcleo de colonização em território português, São Vicente, em 1532. De 
acordo com Vainfas (2000, p. 491): 
A expedição de Martim Afonso de Souza é a que melhor sintetiza o caráter 
dessas primeiras expedições e marca a passagem para a efetiva colonização. 
Organizada por D. João III, objetivava explorar o litoral desde o Maranhão até o 
Rio da Prata, dar combate aos entrelopos franceses e fixar núcleos de 
povoamento através da distribuição de sesmarias, sementes, plantas, animais 
domésticos e ferramentas entre os colonos da expedição. E, com efeito, São 
Vicente seria a primeira vila fundada no Brasil. 
 
27 
 
 
Com o início do processo colonial, também houve transformações no âmbito 
econômico, com a introdução do cultivo da cana-de-açúcar, cuja produtividade era 
favorecida pelas condições climáticas da América portuguesa, além de possuir boa 
aceitação no mercado europeu. Antes de desenvolver a cultura da cana na América, 
Portugal já a cultivava nas ilhas atlânticas (Madeira, Açores, Cabo Verde e São Tomé). 
7 AS INVASÕES DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS NA AMÉRICA 
Como dito anteriormente, a ausência de uma ocupação mais sistemática do território 
americano por Portugal nas primeiras décadas após 1500 fez com que navegadores de 
outras nacionalidades se aventurassem pelo litoral português na América, como os 
espanhóis, os franceses e os holandeses. Esses navegadores comerciavam com as 
populações nativas, extraíam o pau-brasil e praticavam pirataria, destacando-se os 
ingleses nesse último caso. Houve um incremento dessas invasões do território 
português na América no período conhecido como União Ibérica (1580–1640). Durante 
esses 60 anos, Espanha e Portugal foram governados pelo mesmo rei, devido a um 
problema sucessório em Portugal. Felipe II, rei da Espanha, assumiu o trono português 
com a promessa de que Portugal seria tratado como reino unido, e não território 
conquistado, o que permitiria a manutenção da estrutura econômico-comercial. 
Contudo, não foi isso o que ocorreu. A guerra de independência das Províncias 
Unidas dos Países Baixos contra a Espanha interferiu no comércio entre os Países 
Baixose Portugal: 
sobretudo na compra de sal para a indústria de pesca holandesa, uma das bases 
da prosperidade batava — além do que, judeus sefarditas de Amsterdam 
participavam há tempos da produção e do comércio de açúcar do Brasil. Ao 
término da trégua hispano-holandesa (1609–1621), esse comércio de sal e 
açúcar estava comprometido (VAINFAS, 2000, p. 314). 
Foi durante a União Ibérica que os franceses e os holandeses invadiram o território 
português na América, e procuraram estabelecer colônias. Vamos estudar um pouco 
mais dos interesses e dos processos da França e da Holanda na América portuguesa. 
 
28 
 
 
7.1 Os franceses 
Existem relatos sobre a presença de navegadores franceses no litoral da América 
portuguesa logo após o “descobrimento”. Havia um interesse muito grande da França em 
explorar o território americano, bem como um descontentamento com a divisão do Novo 
Mundo entre Espanha e Portugal, desde o Tratado de Tordesilhas. Segundo a 
historiadora Laura de Mello e Souza (2001, p. 64): 
talvez não seja exagerado dizer terem sido os franceses que decidiram a sorte 
das terras achadas por Cabral. Não fosse sua presença constante no litoral 
durante todo o primeiro quartel do século, e não fosse, muito depois, em 1555, o 
seu empenho em fundar uma colônia na baía de Guanabara e talvez o interesse 
português pelo Atlântico Sul ficasse adormecido por mais tempo. 
De acordo com Vainfas (2000, p. 312), “os franceses conheciam bem o litoral do 
Brasil desde o início do século XVI: transportavam pau-brasil em grande quantidade, 
aliavam-se a grupos indígenas e percorriam o extenso litoral com a mesma frequência 
dos lusos. Por muito tempo, [...] a posse desse litoral não esteve assegurada aos 
lusitanos”. A primeira invasão francesa ocorreu no Rio de Janeiro, entre 1555 e 1567, e 
levou à fundação da França Antártica. A expedição foi chefiada por Nicolas Durand de 
Villegaignon, apoiado pelo governo francês, trazendo colonos calvinistas e frades 
capuchinos. Segundo Vainfas (2000, p. 312): 
Na baía de Guanabara, havia condições ideais para a nova colônia francesa. 
Desde os anos 1530, os entrelopos ali aportavam, para comercializar com os 
tamoios e fazer aguada, e a terra era de importantes reservas de pau-brasil. 
Somente em 1550, Villegaignon urdiu um plano para estabelecer ali uma colônia, 
com apoio do almirante Coligny e do cardeal de Lorena. Calvinista, Coligny 
vislumbrava fundar uma colônia, a França Antártica, onde os huguenotes 
(calvinistas franceses) estariam livres da perseguição católica que grassava em 
França. 
Construíram e fundaram o forte Coligny, de onde resistiram aos portugueses. Os 
franceses foram expulsos no governo de Mem de Sá por uma armada comandada por 
seu sobrinho, Estácio de Sá. Ao tomar o forte de Coligny, localizado na baía de 
Guanabara, Estácio de Sá fundou a cidade do Rio de Janeiro. Posteriormente, entre 1710 
e 1711, houve novas entradas de franceses na cidade do Rio de Janeiro, que passou a 
ser saqueada por corsários. A segunda invasão francesa ocorreu no Maranhão, entre 
 
29 
 
 
1612 e 1615, e levou à fundação da França Equinocial, com a fundação do forte de São 
Luís, em 6 de setembro de 1612, que daria origem à cidade de São Luís do Maranhão. 
Essa expedição foi comandada por Charles des Vaux e Jacques Riffault. Os franceses 
foram expulsos do local pelos portugueses em 4 de novembro de 1615 (VAINFAS, 2000). 
7.2 Os holandeses 
Os holandeses possuíam acordos econômico-comerciais com Portugal, sendo os 
responsáveis pelo refino do açúcar produzido nas colônias portuguesas e pela 
comercialização do produto na Europa. Além disso, companhias privadas auxiliavam 
luso-brasileiros na instalação de engenhos de açúcar na colônia portuguesa na América 
e participavam do transporte de africanos escravizados para o território português. Essa 
situação perdurou até 1580, e, durante o período da União Ibérica, a coroa espanhola 
dificultou as operações holandesas de refino e comercialização, bloqueando os portos 
portugueses aos holandeses. A Espanha e a Holanda eram rivais em assuntos 
comerciais, diplomáticos e políticos. 
A primeira tentativa de invasão da América portuguesa pelos holandeses ocorreu na 
capitania da Bahia, na cidade de Salvador, capital da colônia, entre os anos de 1624 e 
1625, mas foram derrotados e expulsos. “Escolheu-se a Bahia porque, além da produção 
açucareira, era ponto estratégico para atacar as frotas espanholas de prata, a carreira 
portuguesa da Índia e para a conquista de outras partes da América e da África” 
(VAINFAS, 2000, p. 314). A segunda tentativa pela Companhia das Índias Ocidentais 
ocorreu na capitania de Pernambuco, entre 1630 e 1637. Durante esse período, os 
holandeses enfrentaram a resistência dos pernambucanos, mas também contaram com 
o apoio de parte da população, como de Domingos Calabar. Os conflitos levaram à 
paralisação da atividade açucareira, e, para resolver a situação, foi enviado à capitania 
de Pernambuco João Maurício de Nassau-Siegen, que assumiu o governo. Durante seu 
governo (1637–1644), Maurício de Nassau financiou a recuperação das lavouras e a 
reconstrução dos engenhos, retomando as atividades comerciais, além de promover a 
liberdade religiosa e melhorias de infraestrutura. O governo de Nassau foi abalado pela 
conjuntura europeia com o fim da União Ibérica e as consequências para a Holanda da 
 
30 
 
 
Guerra dos Trinta Anos (1618–1648), com a exigência da Companhia Holandesa da 
cobrança de impostos, aumento da taxa de juros e do preço dos escravizados. Como 
Nassau não aceitou essas medidas econômicas, foi exonerado do cargo e regressou à 
Europa em 1644. Para os proprietários e produtores pernambucanos, houve 
consideráveis prejuízos em função das novas medidas econômicas, o que fez com que 
passassem a apoiar o movimento conhecido como Insurreição Pernambucana (1645–
1654), cujos líderes eram João Fernandes Vieira, Vidal de Negreiros, Felipe Camarão e 
Henrique Dias. Em 1649, o governo português passou a apoiar o movimento e em 1654 
os holandeses foram derrotados (VAINFAS, 2000). 
Assim, podemos dividir o período da história holandesa no Brasil em três momentos 
distintos: um primeiro momento, entre 1630 e 1637, caracterizado pela conquista de 
territórios pelos holandeses e desestabilização econômica, com resistência das forças 
luso-brasileiras. Um segundo momento, entre 1637 e 1645, de trégua e paz precárias, 
em que o governo de Nassau enfrentava ataques organizados por senhores refugiados 
na capitania da Bahia. Nesse segundo período, também houve um aumento das 
conquistas holandesas, tanto na América, alcançando Sergipe, quando em África, com a 
conquista de Luanda e São Tomé. De acordo com Vainfas (2000, p. 316), esse período 
possuiu as seguintes características: 
Engenheiros, naturalistas, matemáticos e artistas, sob o mecenato de Nassau, 
investigaram a natureza e transformavam a paisagem nordestina. Recife tornou- 
-se uma das cidades mais importantes da América, com modernas pontes e 
prédios. Além do incentivo à arte, o governo nassoviano promulgou leis que eram 
iguais para todos, impedindo injustiças contra os antigos habitantes. Ele investiu 
na produção açucareira, confiscou e levou a leilão os engenhos abandonados. 
Conclamou os luso-brasileiros a voltarem para os canaviais, prometendo-lhes 
liberdade. Mas o principal problema de Nassau residia no conturbado convívio 
entre calvinistas, católicos e judeus, sem falar nos cristãos-novos portugueses. 
Ao longo do tempo, tornaram-se claras as divergências entre Nassau e a 
Companhia das Índias Ocidentais. Incentivado pela Companhia, moveu o 
malogrado assalto à Bahia, em 1638. A administração da Companhia, contudo, 
culpou Nassau pelo fracasso e a retirada das tropas do Maranhão. 
O terceiro período corresponderia aos anos de 1645 a 1654, logo após Nassau 
entregar o governo ao Conselho de Recife, regressar à Holandae ser deflagrada a guerra 
de restauração e a derrota dos holandeses. 
 
31 
 
 
De todo modo, o ânimo da resistência se ativou com a reconquista do Maranhão, 
em 1643, e a insurreição de 1645 tomou corpo com o endividamento dos 
plantadores de cana. O declínio dos preços do açúcar foi, assim, grande 
catalisador da crise do Brasil holandês. A Restauração Pernambucana ocorreu 
graças à aliança dos luso-brasileiros, dos moradores de Pernambuco e dos 
exilados na Bahia, todos unidos contra os holandeses na fase derradeira da 
guerra (VAINFAS, 2000, p. 316). 
8 EXPANSÃO TERRITORIAL 
O Brasil esteve sob domínio português durante mais de três séculos. Ainda que a 
cultura brasileira tenha sido composta a partir de influências africanas, europeias e 
indígenas, a estrutura formada para administração colonial reproduzia instituições e 
práticas jurídicas de conhecimento dos portugueses, ou seja, provenientes da Europa e 
do colonialismo. Por isso, ao tratar da estrutura administrativa, institucional e política da 
América portuguesa, o conceito de Antigo Regime nos trópicos é bastante eficaz para 
compreender as relações estabelecidas entre Portugal e sua colônia na América. 
8.1 A relação metrópole–colônia 
Para além das interpretações econômicas das relações estabelecidas entre a 
metrópole portuguesa e suas colônias na Ásia, África e América, existem aqueles 
historiadores que se preocuparam em compreender outras formas de relacionamento e 
reprodução de padrões comportamentais e de relacionamento metropolitano nos 
domínios ultramarinos. Além disso, as críticas contemporâneas à noção de absolutismo 
permitiram uma revisão nas interpretações sobre as relações entre a metrópole e a 
colônia, evidenciando a existência de uma autoridade negociada: “ao invés de 
metrópoles onipotentes e colônias submissas, teríamos contínuas negociações entre 
ambas” (FRAGOSO, 2002, documento on-line). 
Por isso, nosso foco será voltado à relação metrópole–colônia inserida na ideia da 
monarquia pluricontinental, um sistema político baseado em uma concepção corporativa 
e polissinodal da sociedade, ou seja, uma monarquia que se baseava em uma 
constelação de poderes concorrentes. Isso funcionava pelo sistema de mercês, elos de 
dependência e reciprocidade que, transpostos para a América lusa, configuravam o 
 
32 
 
 
Antigo Regime nos trópicos (FRAGOSO; MONTEIRO, 2017). De acordo com Fragoso 
(2002, documento on-line): 
A presença do Antigo Regime não só era percebida nas rotas marítimas ou nos 
negócios cotidianos internos de Angola ou de Portugal, mas também tal presença 
deixou suas marcas em instituições como a Câmara Municipal e a Santa Casa 
de Misericórdia. De origem reinol, elas se espalharam por diferentes espaços 
ultramarinos: de Recife a Macau. Mais do que isto, as Câmaras serviam, à 
semelhança das lusas, como locus de negociação entre a “nobreza da terra” local 
e os poderes do centro. Portanto, em meio àqueles vários vínculos ultramarinos, 
não há por que se espantar com a existência de redes políticas que, partindo de 
Goa ou do Rio de Janeiro, chegavam ao paço lisboeta, sendo base de conflitos 
e negociações nos rumos do Império. 
Em outras palavras, podemos afirmar que as relações entre a metrópole e a colônia 
não se restringiam ao aspecto comercial, notadamente o exclusivo ou monopólio colonial, 
e não se enquadram em aspectos de dominação e subjugação, mas comportam espaços 
de negociação entre os colonos e entre os colonos e a metrópole. Conforme Fragoso, 
Gouvêa e Bicalho (2000, documento on-line), essa abordagem tinha como objetivo 
“analisar o ‘Brasil Colônia’ através das relações econômicas com a Europa do 
mercantilismo [...] centrada na ênfase da oposição metrópole versus colônia e na 
contradição de interesses entre colonizadores e colonos”. 
Para citar apenas um dos autores que se inserem nesse quadro interpretativo, vamos 
analisar brevemente a relação que Caio Prado Júnior, em Formação do Brasil 
contemporâneo, estabelece entre a colônia e a metrópole. De acordo com o autor 
(PRADO JÚNIOR, 1971, p. 31–32): 
[...] se vamos à essência de nossa formação, veremos que na realidade nos 
constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros [...] e em 
seguida café, para o comércio europeu [...]. Foi com tal objetivo, objetivo exterior, 
voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem do 
interesse daquele comércio, que se organizaram a sociedade e a economia 
brasileiras. Tudo se disporá naquele sentido: a estrutura, bem como as atividades 
do país. 
Para o autor, ir à “essência de nossa formação” significa buscar um sentido para a 
colonização do Brasil de determinada forma. Trata-se da busca de um objetivo, que será 
um “objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não 
fossem o interesse daquele comércio [europeu]”, PRADO JÚNIOR, 1971, p. 31, 
acréscimo nosso). Percebe-se por essas afirmações que não haveria uma alternativa à 
 
33 
 
 
colônia brasileira senão se organizar de acordo com os interesses metropolitanos 
portugueses. Portanto, a economia e sociedade brasileiras do século XVI ao século XIX 
organizaram-se a fim de atender a uma demanda externa. Aqui, pode-se perceber uma 
referência aos “ciclos de produção” brasileiros, primeiramente do cultivo do açúcar, em 
seguida do ouro, sucedido pelo café (PRADO JÚNIOR, 1971). A relação metrópole–
colônia foi abordada pelo autor apenas por seu viés mercantil, ignorando as estruturas 
internas de economia e aspectos culturais e políticos na estruturação da sociedade. 
Já para compreender as relações metrópole e colônia a partir do viés proposto por 
Fragoso, Gouvêa e Bicalho (2000), é fundamental entender de que forma os privilégios 
influíam nessa relação e como importantes órgãos locais, como as câmaras e seus 
agentes, os administradores do ultramar, relacionavam-se com a metrópole. 
Quanto aos privilégios, lembremos a existência do sistema de mercês e da “economia 
do dom”, que estabelecia uma série de redes clientelares, bem como a disputa pelos 
cargos concelhios, que permitiam ascender hierarquicamente na colônia e utilizar 
instrumentos de negociação com a metrópole. O sistema de mercês consistia em uma 
rede clientelar de troca, que estabelecia elos de reciprocidade e dependência 
(FRAGOSO; MONTEIRO, 2017) em que a aristocracia, por ocupar certos cargos na 
colônia, recebia do rei novas concessões, em cargos, terras, títulos ou serviços. Esses 
privilégios acabaram formando uma “nobreza da terra”, que, muitas vezes, precisou 
negociar com a metrópole por áreas de atuação ou interesses divergentes. Segundo as 
análises de Fragoso, Gouvêa e Bicalho (2000), com a atribuição de cargos e ofícios civis 
e militares e a concessão de privilégios comerciais a indivíduos e grupos, foi possível 
formar uma cadeia de poder e redes de hierarquias que se formavam na metrópole e se 
estendiam até os colonos, com quem eram estabelecidos vínculos estratégicos. 
Através da distribuição de mercês e privilégios, o monarca não só retribuía o 
serviço dos vassalos ultramarinos na defesa dos interesses da cora e, portanto, 
do bem comum. Ele também reforçava os laços de sujeição e o sentimento de 
pertença dos mesmos vassalos à estrutura política do Império, garantindo a sua 
governabilidade. Materializava-se, assim, forjando a própria dinâmica da relação 
imperial, uma dada noção de pacto e de soberania, caracterizada por valores e 
práticas tipicamente do Antigo Regime, ou, dito de outra forma, por uma 
economia política de privilégios (FRAGOSO, GOUVÊA, BICALHO, 2000, 
documento on-line). 
 
34 
 
 
8.2 A estrutura administrativa da América portuguesa 
A estrutura administrativa da América portuguesa foi forjada nos quadros do sistema 
colonial, porém em uma tentativa explícita de transposição do modelo e dos valores 
portugueses de administração pública para a colônia. Esse modelo

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