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Sumário “O bêbado e o equilibrista” Aline Eugênia Camargo O estatuto do corpo e a anorexia nervosa Ana Paula Gonzaga A relevância da interação da equipe multidisciplinar fora das instituições Ana Tereza Arantes De Almeida Alonso Corpo e virtualidade Camila Deneno Perez Patricia Gipsztejn Jacobsohn Bulimia: o objeto “necessário” Camila Peixoto Farias Marta Rezende Cardoso Notas sobre o abandono do tratamento Flávia Machado Seidinger-Leibovitz Carla Maria Vieira Larissa Rodrigues Relação mãe-filha Christiane Baldin Adami-Lauand Fabiana Elias Goulart de Andrade Moura Rosane Pilot Pessa As marcas no corpo Cybelle Weinberg Cinderelas contemporâneas Fabiana Maria Gama Pereira Elisa Gan Considerações psicanalíticas sobre a compulsão alimentar Fernanda Kalil Revisitando a técnica psicanalítica no atendimento a pacientes com transtornos alimentares Gabriela Malzyner Anorexia Jaqueline Pinto Cardoso Que conversa é essa? Marina Fibe De Cicco A anorexia e a bulimia em Freud Maria Helena Fernandes Dos transtornos alimentares aos transtornos dismórficos corporais Marina Ramalho Miranda Entrelaces psíquicos entre mães e filhas Marina F. R. Ribeiro Sobre o exercício da clínica dos transtornos alimentares Patricia Gipsztejn Jacobsohn A construção simbólica em pacientes com fome de estórias Talita Azambuja Nacif Thais Fonseca de Andrade Autores Apresentação “O método psicanalítico tem sido alvo de questionamentos e discussão no que diz respeito à sua atualidade como prática terapêutica que se mostre eficaz na escuta e contenção das formas de sofrimento e gozo assumidas pelas subjetividades contemporâneas.” Com estas palavras, o saudoso Prof. Homero Vettorazzo Filho iniciou o texto da contracapa do primeiro volume do Psicanálise de Transtornos Alimentares, em 2010, no qual afirmou “que a atualidade e a vitalidade da Psicanálise dependem de que os psicanalistas tenham sua experiência clínica como espaço para levantar interrogantes que lhes permitam questionar e revisar as teorias psicanalíticas, separando elementos fecundos e insaturados de conceitos repetidos como convicções estéreis”. Este segundo volume vem comprovar que a Psicanálise pode ser viva, frutífera e servir de base para novas pesquisas, quando trabalhada em um grupo de estudos e atendimento, nos moldes da CEPPAN. Com muito orgulho, podemos afirmar que um dos nossos objetivos iniciais, a divulgação de conhecimentos adquiridos sobre os transtornos alimentares, tem se mantido e consolidado nos últimos anos, abrindo espaços de interlocução com profissionais envolvidos com essa temática. Agradecemos, aqui, a esses profissionais que aceitaram nosso convite para participar desta publicação, compartilhando conosco sua experiência clínica e suas pesquisas metapsicológicas. Com eles, nós da CEPPAN nos sentimos fortalecidos para continuar no caminho da compreensão e da sustentação da Psicanálise no campo dos transtornos alimentares. – Cybelle Weinberg Coordenadora da CEPPAN “O BÊBADO E O EQUILIBRISTA” Atuações e comportamentos autocalmantes no devir dos quadros de transtornos alimentares Aline Eugênia Camargo Sobre os deslocamentos dos sintomas alimentares No dia a dia da clínica, é comum nos depararmos com os ecos de problemáticas alimentares vividas por nossos pacientes no passado, frequentemente na adolescência, às vezes também na infância. Muitos relatos revelam sintomas de anorexia ou de bulimia propriamente ditas, ou mesmo de outras manifestações sintomáticas ligadas à inibição ou aos excessos no campo alimentar. Tais ecos nos trazem informações de uma época em que corpo, comportamento e relação com o outro faziam parte de uma mesma unidade. Embora superada ao longo da vida, essa sintomática deixa suas marcas em uma história de traumatismos precoces. A presença desses traumatismos e seus efeitos sobre o psiquismo pode ser reconhecida na vida do sujeito muitos anos depois, manifestando-se clinicamente de diferentes formas. Podemos acompanhar no processo analítico o deslocamento dos sintomas quando estes se constituem em expressões simbólicas dos conflitos, que, como nos sonhos, revelam movimentos de elaboração. Quando isso não acontece, observamos na análise uma série infindável de atuações, as quais, no entanto, podem ir adquirindo um aspecto de mudança, construindo uma trilha elaborativa que respeita o caminho, ainda a ser percorrido, da ação ao pensamento. A clínica, tal como se apresenta na atualidade, tem nos ensinado e desafiado a seguir investigando na direção de uma maior compreensão desses processos que remetem à dimensão do arcaico, daquilo que se encontra aquém do universo da representação, bem como o caminho desses processos psíquicos ao longo da análise. A diversidade de manifestações sintomáticas encontrada na clínica atual, em suas muitas possibilidades de composição, nos remete à investigação do campo que se estende para além da neurose, nas patologias ligadas às falhas estruturais na formação do psiquismo. Dessa condição resultam funcionamentos psíquicos, como as neuroses mal focalizadas, funcionamentos nos quais convivem diversos mecanismos psíquicos em arranjos pouco estáveis, que se alteram ao longo da vida em face das experiências e em virtude dos laços afetivos. Entendemos esse funcionamento como o resultado de um equilíbrio que, embora alcançado, constitui um arranjo precário, metaforizado na dupla formada pelo bêbado e o equilibrista. Escutar na clínica esses ecos e acompanhar seu percurso e suas transformações pode ser muito esclarecedor, auxiliando nas difíceis trilhas que o analista tem a percorrer no corpo a corpo de determinados casos. Encontramos, na literatura sobre transtornos alimentares, o tema de que no devir desses casos, ao longo da análise ou pelo conjunto de tratamentos a eles dedicados, os sintomas da problemática alimentar saem de foco. Desse modo, abrem espaço para a estruturação psíquica por trás deles, suas organizações e desorganizações, bem como seus arranjos defensivos com os quais o sujeito agora tem de se deparar. O desenrolar desses elementos revela uma busca do equilíbrio pela ação e pelas sensações vividas no corpo, ou seja, pelo embate em um registro corporal (JEAMMET, 1999). É nesse sentido que apresentamos um caso no qual vemos a possibilidade de relacionar vários aspectos desse vasto campo que envolve a vida contemporânea e seus excessos, em que um sintoma de transtorno alimentar na adolescência repercute no momento atual. No trabalho de análise, consideramos fundamental a compreensão de como a reedição de elementos arcaicos da constituição psíquica em suas reorganizações no momento da puberdade e adolescência influi na formação posterior dos sintomas. Lembramos a importância para a psicanálise da investigação por meio dos casos clínicos e de como o estudo de caso pode ser revelador da subjetividade e das manifestações idiossincráticas do viver e do adoecer […] constituindo um campo de observação particular que permite tanto a construção, verificação e transformação da teoria como o desenvolvimento de dispositivos terapêuticos específicos para o tratamento com cada paciente (SOARES et al., 2015, p. 11). A análise se processa em meio às atuações da paciente com relação a uma busca de mudança, que envolvia trabalho, estilo de vida na direção de maior prazer e de uma rotina mais “saudável”. Acompanhamos as idas e vindas dos excessos, as angústias decorrentes destes, e os deslocamentos de certo comportamento aditivo, bem como a passagem para comportamentos de risco. Maria procura análise por dificuldades no trabalho. Relata que tudo o mais vai bem: casamento, relações familiares, amizades, lazer. Exercendo suas atividades profissionais no mundo corporativo, diz que o emprego “suga” suas energias; conta que perdeu o apetite e emagreceu; nota que seus cabelos começaram a cair em grande quantidade, que ficou irritadiça e dorme mal. Aparece, em primeiro plano, uma problemática muito relevante que remete ao universo das psicopatologias do trabalho. Noâmbito das questões contemporâneas, trata-se de um campo importante de investigação, e a psicanálise tem muito a contribuir na compreensão dos excessos no trabalho. Tal problemática mostra-se especialmente no universo corporativo, em que são frequentes as manipulações das relações de trabalho, com elementos psicológicos envolvidos na exploração do empregado, levando a certos efeitos psicopatológicos hoje bem conhecidos (DEJOURS, 2007) que produzem efeitos de comportamentos aditivos e de somatizações. Mulher jovem, bonita, muito inteligente, chega demonstrando bastante familiaridade com a análise. Se, por um lado, se mostra dona de si e sabedora do que busca, por outro, transmite muita fragilidade, da qual não se dá conta. Apesar de sua postura assertiva, demonstra também uma posição passiva, de impotência, de certo modo vitimizada. Entende que vive uma situação de exploração no trabalho, o que lhe provoca muita raiva. Demonstra clareza em sua compreensão das questões do trabalho, sua sujeição e a dos colegas, algo que, segundo ela, se dá por meio de promoções e ganho monetário cuja contrapartida é de exigências desmedidas de eficiência e dedicação em termos de carga horária. Afirma sentir-se como que capturada e escravizada por forças muito além das suas, as quais a submetem ao fascínio das benesses daquele trabalho em termos de poder aquisitivo e status. Maria declara gostar de seu emprego, mas nunca haver se sentido plenamente realizada, tendo escolhido sua profissão por motivos financeiros. Cumpre suas obrigações profissionais da melhor forma possível, sem conseguir, entretanto, sentir muito prazer ao trabalhar. Conta que trabalha desde os 19 anos, sempre intensamente, e acha que escolheu a profissão errada. Revela gostar mesmo de culinária, e que chegou a fazer cursos mas desistiu da ideia quando percebeu que era uma atividade de muito sacrifício pelos horários e que lhe proporcionava pouco retorno econômico. Teve várias experiências de terapias, a primeira delas na adolescência, época em que apresentava bulimia; segundo ela, melhorou justamente quando passou a ter uma dedicação excessiva aos estudos e ao trabalho e relaciona os dois fatos. Percebe-se, assim, que trazia algumas interpretações prontas e, algumas vezes, fechadas. Acrescenta que gosta muito de agradar aos outros e que tem preocupação em não decepcionar os pais. Maria vai mostrando certa compulsão pelo trabalho, sendo que sua dificuldade reside justamente no fato de procurar atender de pronto às exigências da chefia: no intuito de agradar, mergulhava em atividades sem-fim em horário muito estendido. Como reação, repentinamente surgia uma aversão a tudo, com um colorido persecutório e uma necessidade de rompimento abrupto; com isso, vinham os pensamentos e, depois, a decisão de se demitir. Conteúdo recorrente em suas sessões, a necessidade imperiosa de deixar o emprego decorria do sentimento de sua sobrevivência física se achar em risco. Acompanhavam as queixas com o trabalho fantasias de estar em vias de ser engolida por ele, fantasias estas de forte conteúdo oral que ela mesma relacionava com a experiência anterior com a bulimia, mas tendo muita dificuldade de seguir as associações nesse sentido e de poder receber as intervenções da analista. Teria sido seu modo de chegar à análise trazendo prontas as interpretações e controlando o que desejava “colocar para dentro”? Vários aspectos da problemática de Maria são muitas vezes encontrados nos quadros de transtornos alimentares, polaridades vítimas/algozes, um uso dissociado da inteligência e das capacidades de trabalho em contrapartida com a precária percepção de seu corpo e de seu mundo interno. Os investimentos libidinais apresentam-se ora como investimentos maciços ora como desinvestimento, transitando do passional ao evitamento, “duas modalidades relacionais espelhadas que têm em comum o fato de uma ser a transformação no contrário da outra” (JEAMMET, 1999, p. 32). É importante lembrar que as manifestações da bulimia se caracterizam por acessos de hiperfagia frequentemente seguidos de vômitos, na busca de compensar esse comportamento e de não ganhar peso, tendo como pano de fundo um ideal de magreza, já que tanto na bulimia quanto na anorexia mental há uma distorção da imagem corporal. Sucedem-se episódios de compulsão alimentar da ordem da impulsão, de uma tendência sem freios e sem mediação psíquica. Um dos aspectos que caracteriza a bulimia é a forma como o sujeito se relaciona com o alimento, como este é ingerido (em grande quantidade, de modo voraz e às escondidas). Delineia- se um aspecto anárquico nessa ingestão, pois não há prazer nem fome. Por esse fator e por sua dinâmica, a bulimia é muitas vezes associada às adições. “Os fatores desencadeantes desses acessos são diversos, mas frequentemente relacionam-se com sentimentos de desamparo, fracasso e solidão, ou ao contrário, de excitação e prazer.” (FERNANDES, 2006, p. 76). Isso aparecia no caso de Maria no aspecto aditivo. Outra questão relevante nos casos de bulimia é a supervalorização da aparência quanto à imagem corporal, mas também do lado material da vida, bem como das sensações e dos prazeres imediatos. Esse aspecto associa-se à dimensão do modo de vida contemporâneo, no qual se faz cada vez mais presente o individualismo, dissolvendo as experiências de solidariedade, apoio mútuo e valorização do humano como contrapartida ao universo da materialidade e do consumo. Proponho olhar o caso de Maria a partir da perspectiva de Jeammet (1999), de um funcionamento em patchwork, uma composição, estando ausente uma organização psíquica dominante, com níveis de estruturação sobrepostos, o que faz surgir diferentes faces que se alternam ora em angústias arcaicas ora em rearranjos relacionais de tipo neurótico. Era possível notar na transferência essa marca das polaridades: algumas vezes, mostrava uma excessiva familiaridade, como se acreditasse de fato haver entre nós um vínculo muito sólido, que parecia real, e, outras vezes se comportava de um modo distanciado, como se viesse para a análise só quando tinha problemas a resolver. Podemos pensar aí em uma recusa a estreitar o vínculo? Como que correndo um risco narcísico na dificuldade de administrar a proximidade e a distância do objeto? Para realizar uma relação utilitária, do tipo “usar e jogar fora”, ou comer e vomitar? Era como se para ela bastasse ter uma analista, sendo desnecessário construir uma relação a partir das sessões e de trabalhar sobre seus afetos. Agia como se a análise fosse um prêt-à-porter, comprar e pronto. Casada há pouco tempo, ela e o marido estavam reformando o apartamento recém-adquirido, algo a que se dedicava bastante e que resultava dos ganhos no trabalho. Seus pais se orgulhavam muito de ela, tão jovem, já ter comprado e estar reformando seu imóvel sem a ajuda econômica deles. Para ela e sua família, o fator econômico parecia representar, ou melhor, equivaler, a uma estabilidade emocional, e a sintomatologia por ela apresentada refletia justamente a eventual ameaça a essa condição. Por causa da reforma do apartamento, ela e o marido residiam temporariamente em outro local. Ela falava muito mal dessa moradia provisória, de propriedade de um avô, sobre quem logo comentou tratar-se de um alcoolista que transtornou a vida de toda a família, inclusive de sua mãe. Conta, ainda, que sua mãe enfrentara esse homem e ajudara a avó a separar-se dele. Um forte componente familiar de excesso no uso do álcool marca as sucessivas gerações. Em seu discurso, aparecia um temor de que tudo desse errado, que fosse acontecer algo terrível, ideias que se tornavam insistentes e lhe perturbavam o sono. Inesperadamente, entremeava sua fala com comentários, fantasias sobre situações de muita carência e desamparo, o que contaminava seus sentimentos com relação ao futuro e a tudo que parecia ser tão certo em sua vida. Começava a romper a dissociação e os conteúdos afastados ameaçavam transbordar. Não vivia as situações contendo dois lados, obem e o mal, coisas boas e ruins ou das que gostasse e das que não gostasse. Havia para ela apenas o bom e o “podre” que poderia estragar tudo o mais. Aos poucos Maria vai se queixando de falta de afeto. Havia, na família de Maria, uma dinâmica muito própria, segundo ela, cada um dos familiares tinha o próprio quadro psicopatológico, o que permitia vislumbrar o percurso de terapias anteriores e o uso, muitas vezes estereotipado, que ela fazia delas. Relata a experiência de terapia familiar que fora realizada por causa do irmão que tem sérios comprometimentos psíquicos. E, assim, gradativamente, vai narrando e construindo para si outra versão dessa história familiar, a qual, até então, só vinha à tona em flashes bem-humorados, como se não fosse algo a ser levado a sério. Pai e mãe alcoolistas, ele muito impulsivo e agressivo: quando brigava, deixava todos tremendo de medo. Muito calado, um silêncio regado a boas doses diárias de uísque, até que explodia. A mãe fazia um contraponto na forma de um alcoolismo “festivo”, em um movimento maníaco no qual “tudo é festa, senão, tudo vira drama”. Frente aos problemas, oscilava entre ignorá-los ou dramatizar demais. Maria diz que a incomodava muito nunca saber o que esperar da reação deles quando lhes contava os fatos de sua vida, e que passou a ter mais cuidado com isso para se preservar. Não é incomum nos depararmos com essa modalidade de relação na qual, diante de problemas e conflitos, se estabelece uma defesa cerrada contra a percepção indesejada. É um mecanismo de funcionamento originado quando o comportamento do adulto incita a criança à dissociação psíquica, ao negar a percepção da realidade. O irmão, na adolescência, teria trazido muitas preocupações aos pais com seu comportamento, segundo ela, provocando um grande tumulto na família – novamente aparece a ideia de um membro da família que estraga tudo. Maria nada mais desejou do que silenciar seus problemas e emoções, de modo que viveu a adolescência sem seus pais acompanharem minimamente esse período e suas dificuldades, tal como a experiência bulímica que, por muito tempo, passou despercebida deles. Precisava sentir-se o membro saudável do grupo, queria agradar ou, ao menos, não decepcionar os pais, como o irmão fazia. Os deslocamentos dos sintomas Embora o tema central de suas queixas ainda fosse o das dificuldades nos empregos, sempre geradas porque os excessos a faziam sentir-se adoecendo e esgotada até precisar abandoná-los, outros acontecimentos foram surgindo. Parecia que toda a voracidade contida até então emergia e, com ela, um comportamento de maior atuação, as paixões por trás dos sintomas começando a se revelar, tal como se vê frequentemente nos tratamentos das pacientes com anorexia, que quando evoluem e rompem a dissociação dos afetos passam para um comportamento de bulimia. “As crises bulímicas representarão no curso de uma anorexia uma verdadeira solução de compromisso; […] significam uma perda de controle onipotente dos impulsos e uma ida ao encontro do objeto.” (FUKS, 2006, p. 44). Ainda que algumas dificuldades alimentares sempre aparecessem como pano de fundo, em geral na forma de perda de apetite e temor de retomada de um apetite voraz, não foram as questões alimentares que tomaram o primeiro plano quando ela rompeu com suas defesas mais dissociadas por trás da mulher que gostava de agradar, de trabalhar, de ganhar dinheiro etc. Em certa sessão disse que “parecia um robô trabalhando, feliz e sorridente”. De fato, nesse momento apresentava um sorriso artificial, como que plantado no rosto. Ela partiu para uma busca desenfreada de prazer, que foi procurar no sexo, em drogas, e especialmente na bebida e em uma vida de baladas e excessos. O marido, que até então representava seu porto seguro diante do caos emocional de sua família, principalmente por sua estabilidade afetiva e financeira, passou a ser sentido como frio, distante, alguém com quem não vivia as emoções que desejava. É interessante notar que à medida que a relação do casal esfriava, ambos dedicavam-se cada vez mais às aventuras gastronômicas. O gosto de Maria de frequentar restaurantes caros, no desejo de degustar comidas e vinhos especiais, tinha se tornado frequente no final do casamento. Podemos pensar que esse comportamento respondia a um deslocamento da busca de prazer, retornando a uma dimensão oral? Interessante que, neste caso, o excesso ficava do lado da sofisticação e não da dimensão grosseira e brutal do ataque e da voracidade bulímicas. Podemos pensar em certa solução de compromisso, um modo de preencher um vazio que se fazia presente nessa “comilança de pouca quantidade”?1 A paciente separou-se do marido e passou por uma série de abandonos de empregos sem conseguir se desligar totalmente de um tipo de relação insatisfatória. Ia se delineando cada vez mais como centro da análise sua insatisfação com seus investimentos. Em todo caso, a meu ver, a cada desligamento, a cada emprego que largava, Maria, ao seu modo, ia elaborando seu projeto de mudança de vida e de apropriação de si e de seu corpo, o que passava por um contato maior com sua fragilidade, voracidade e violência. Maria decidiu separar-se, depois de viver um período marcado por paixões desenfreadas. Foi se desligando destas e procurando abster-se de tais comportamentos, na tentativa de afastar-se de paixões e excessos considerados por ela mesma “não saudáveis”. Quando tudo fica controlado “dentro”, o perigo parece retornar de fora. Volta então o tema do risco. Aos poucos, vai sendo capaz de nomear as situações de risco e seu impulso em vivenciá-las. Em certa ocasião, disse que “a vida fica sem sentido sem correr riscos”. Foi um tema importante, que remeteu a questões existenciais, e, com isso, seu modo de pensar em si e na vida se ampliou. Maria interrompe também o processo de análise, em função de sua mudança de vida, muda de cidade e convive com um segundo companheiro. Ela parece não dar importância à interrupção de nosso vínculo. Posteriormente, me procura de novo, vem em algumas sessões espaçadas. Depois de alguns meses, retorna, contando a experiência de um acidente que sofreu praticando um esporte que envolvia equilíbrio. Lembra-se de algumas intervenções minhas, com as quais procurei investigar e questionar uma possível atitude de risco em sua prática esportiva, que, na ocasião, ela negara. Nesse retorno, disse que queria pensar melhor a respeito. Comportamentos autocalmantes e comportamentos de risco Maria frisa ter muito prazer nas atividades esportivas, em especial por sentir-se fazendo algo saudável em um momento que se afastara da convivência com os amigos partidários de álcool, drogas e sexo. Pode-se pensar que a crescente valorização das atividades físicas na vida de Maria, bem como seu comportamento de colocar-se em risco, tenham relação com um movimento de afastamento dos excessos que ressurgem de outro modo? Podemos entender esse acontecimento como uma atuação que se dá como um procedimento autocalmante? Os procedimentos autocalmantes são comportamentos estudados pelos autores da Escola de Psicossomática de Paris, nos quais a atividade motora torna-se necessária para efeito de uma descarga pulsional que se encontra impossibilitada de escoar de outra forma. Eles são encontrados na necessidade, por parte de alguns pacientes, de realizar uma atividade repetitiva. Isso pode acontecer por meio dos esportes, muito comum nas caminhadas, mas também pode estar presente ao se tocar um instrumento ou na atividade da dança, quando segue determinadas características. Cria-se um círculo vicioso em que a necessidade urgente de reduzir o nível de excitação acaba, de certa maneira, promovendo ações que a incrementam, e os procedimentos autocalmantes assemelham-se às condutas aditivas (VOLICH, 2010). A prática esportiva e os comportamentos de risco fizeram-se mais presentes em sua vida e pareceram representar uma nova forma encontrada por Maria na busca de equilíbrio e de prazer. Foi mais um passo no processo de quebra doselementos psíquicos dissociados, embora ainda não integrados completamente em sua vida psíquica, pois os procedimentos autocalmantes são atividades que ficam apartadas da vida subjetiva e da fantasia. Uma distinção importante a ser feita para a compreensão dos procedimentos autocalmantes é que eles representam uma ação estritamente calmante, que remete às experiências da relação com uma mãe que, ao embalar seu bebê, não consegue transmitir afeto, não erotiza. Entendemos que o acidente de Maria foi um modo de viver uma experiência de quebra da casca do ovo narcísico, da onipotência, calcada no corpo e na realidade. Lembremos que as condutas de risco podem ser entendidas como uma busca mais ou menos desesperada de tomar posse de si mesmo, de engendrar-se, recriar- se, renascer após a aproximação com a morte. Algo como uma busca pela vida e pela autonomia psíquica. Um dos modos de se apropriar do corpo é pela “possibilidade de se machucar, como na anorexia, na bulimia, nas automutilações, indo até a tentativa de suicídio, de autoagressão, a qual, nesses casos, mais do que a vontade de morrer, exprime, na maior parte das vezes, um desejo prometeico de se reapropriar do seu destino” (JEAMMET, 2005, p. 140). Ao analisar uma paciente que apresentava hiperatividade de marcha, Brusset (1990, p. 155) diz: “Na bulimia, por exemplo, uma conduta atuada e repetida aparece como formação substitutiva na busca perdida do prazer e do gozo que não pode ser encontrado por outras vias”, tornando-se uma toxicomania sem droga. A hiperatividade, ele continua, é vivida com entusiasmo, e o sujeito usa várias racionalizações para justificar seu uso; no entanto, funciona dentro de uma lógica de coação ou de um conjunto de coações. Algumas vezes, ela surge na passagem da anorexia para a bulimia e cumpre importante função de neorregulação do funcionamento psíquico.2 Esse autor enfatiza o quanto, apesar do automatismo, uma conduta aditiva de marcha pode, por intermédio da análise, alimentar a elaboração psíquica levando a uma redução da clivagem. Desse modo, ele apresenta uma dimensão positiva de ligadura, de objetalização. “Existe no atuar a dimensão de uma evitação, de uma evasão, mas também de uma substituição: do ponto de vista dinâmico, uma modalidade diferente do funcionamento psíquico põe em ação outras defesas e outros gozos […], tem um efeito de ruptura […]” (BRUSSET, 1990, p. 165-166). Retoma a ideia de quão poderosas são a ação e a sensação corporal em termos de ativação fantasmática. No caso de Maria, o uso desse tipo de atividade se fez presente em outra passagem, que foi a do abandono das condutas aditivas. Concordamos com Brusset que, embora seja uma conduta de atuação, pode promover um movimento de erotização importante. Maria foi morar em uma casa que não era nem a do avô alcoolista nem a dela com o ex-marido a exibir seu status econômico. Foi buscar uma vida mais simples, com um vínculo que expressava mais autenticidade e laço afetivo. O esporte no qual se envolveu está relacionado com o novo vínculo e o prazer do contato com a natureza. Após o acidente, Maria pôde viver momentos de maior depressividade3 na análise, nos quais suportava mais o contato com seu mundo interno. O tema do cuidado se pôs em relevo. Em certa sessão, cita um filme que trata da relação mãe/filha, no qual a personagem é fotógrafa de guerra: nele aparece todo o conflito da filha ao ver que a mãe não consegue se afastar do perigo.4 Associa com o que está vivendo em seus impulsos de se arriscar e com a relação de cuidado mãe-filha que, neste caso, se dá invertida. É a filha que tem de cuidar da mãe. Na sequência, fala do temor com relação aos riscos que seu bichinho de estimação corre quando este sai de casa à noite, tal como o irmão saía, envolvendo-se em perigo, o que aterrorizava os pais. Maria acompanhava a cena assustada e sem lugar na atenção deles – ela é que se preocupava com eles. O que aqui emerge é a preocupação com o outro, assim como preocupação e cuidado consigo mesma. É o ponto de ligação do seu retorno para a análise: pela percepção da preocupação da analista com ela. Com o caso de Maria, pudemos pensar e acompanhar as ricas possibilidades de desdobramentos dos sintomas, e como estes vão ganhando sentido em cada contexto em que são vividos. Maria, com seu jeito que lembra o “bêbado e o equilibrista”, vem nos ensinar a sermos os dois, a compreender na carne do corpo a importância do risco em que consiste o viver. Notas: 1. Sobre o tema dos transbordamentos das pulsões e das relações entre genitalidade e oralidade na sexualidade feminina, com referência aos deslocamentos dos “prazeres da cama” aos “prazeres da mesa”, remetemos o leitor a A. Gurfinkel (2001). 2. Sobre o tema dos transtornos alimentares em suas relações com a hiperatividade, indicamos o interessante texto de C. Weinberg e M. Berlinck (2010), que compreende este aspecto, relacionando-o com a defesa maníaca e com a repressão da sexualidade. 3. Sobre o conceito de depressividade, ver A. Gurfinkel (2010). 4.Mil vezes boa noite, Noruega, Irlanda e Suécia, 2014, direção de Erik Poppe Referências BRUSSET, B. La adicción anoréxica a la marcha y el trabajo psicoanalitico. Revista de Psicoanalises de Niños y adolescentes, (10):152-169, 1990. DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 2007. FERNANDES, M. H. Transtornos alimentares: anorexia e bulimia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006. FUKS, M. P. O sintoma na bulimia: psicopatologia e clínica. In: FUKS, L.; FERRAZ, F. M. (orgs.) O sintoma e suas faces. São Paulo: Escuta/Fapesp, 2006. GURFINKEL, A. E. C. Sexualidade feminina e oralidade: comer e ser comida. Percurso, (26):69-78, 2001. GURFINKEL, A. C. Depressividade e manejo clínico no tratamento das problemáticas alimentares. In: WEINBERG, C. & GONZAGA, A. P. (orgs.) Psicanálise de transtornos alimentares. São Paulo: Primavera Editorial, 2010. JEAMMET, P. Adolescência: o espelho da sociedade. Ide. (41) 138- 143, jul., 2005. JEAMMET, P. Abordagem psicanalítica dos transtornos das condutas alimentares. In: URRIBARRI, R. (org.) Anorexia e bulimia. São Paulo: Escuta, 1999. SOARES, A. M.; RUA, C. R.; VOLICH, R. M.; LABAKI, M. E. Apresentação. In: SOARES, A. M.; RUA C. R.; VOLICH, R. M.; LABAKI, M. E. (orgs.) Psicanálise e psicossomática. Casos clínicos, construções. São Paulo: Escuta, 2015. VOLICH, R. M. Psicossomática: de Hipócrates à psicanálise. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010. WEINBERG, C.; BERLINK, M. T. A hiperatividade das anoréxicas: uma defesa maníaca? In: WEINBERG, C. & GONZAGA, A. P. (orgs.) Psicanálise de transtornos alimentares. São Paulo: Primavera Editorial, 2010. O ESTATUTO DO CORPO E A ANOREXIA NERVOSA Um mais aquém da melancolia1 Ana Paula Gonzaga Há alguns anos acompanhando pacientes com transtornos alimentares, sobretudo com anorexia nervosa, venho pesquisando aspectos do funcionamento psicodinâmico que remetem ao trabalho da melancolia. Pretendo discutir, partindo do texto freudiano, o movimento regressivo que se instala em pacientes com anorexia nervosa (que necessariamente não se aplica a todas, mas é expressivo na clínica), que nos permite essa digressão ao que proponho como um funcionamento aquém da melancolia. Luto e melancolia Em seu artigo Luto e Melancolia [2011(1915)], Freud se ocupa em apresentar o processo de luto – “reação à perda de uma pessoa querida ou de uma abstração que esteja no lugar dela, como pátria, liberdade, ideal, etc.” (p. 47) – como um trabalho de desinvestimento realizado pelo psiquismo sobre o objeto perdido. Considera esse processo necessário e normal, especialmente pela retirada da libido que recai sobre o objeto que já não se faz mais presente, deixando- a, assim, livre para novos investimentos. O caráter de realidade é, portanto, inquestionável; bem como o envolvimento dos processos pré-conscientes/conscientes. Há casos, contudo, em que o processo não se dá assim, em que além do desânimo, do desinteresse pelo mundo, da perda da capacidadede amar e da redução da capacidade de trabalhar, há um expressivo “rebaixamento do sentimento de autoestima que se expressa em autorrecriminações e autoinsultos” (op. cit., p. 47). Freud compreende tratar-se de processos melancólicos, em que sublinha a distinção concernente à alteração da autoestima e também ao caráter da perda que não recai, necessariamente, na morte de um ente querido, mas sim na sua natureza ideal, algo que se perdeu como objeto de amor. Relaciona à melancolia um caráter fantasmático e inconsciente e nos aponta, tal qual no luto, em que se faz claro o caráter de trabalho – elaboração psíquica –, o mesmo atributo. É por essa qualidade de trabalho que a melancolia possibilita que, internamente, se busca reparar uma perda no ego. Desse modo, Freud nos ensina que, se soubermos ouvir com paciência as múltiplas autoacusações do melancólico, compreenderemos que seus insultos recaem menos à sua própria pessoa, mas sim a alguém a quem o doente ama, amou ou deveria amar. “Desse modo, tem-se à mão a chave do quadro clínico, na medida em que se reconhecem as autorrecriminações como recriminações contra um objeto de amor, a partir do qual se voltaram sobre o próprio ego” (op. cit., p. 59). O processo, o trabalho, que Freud assinala aqui como próprio à melancolia, tem por base a identificação em que predomina a escolha narcísica de objeto. Enquanto nos processos normais, quando se deixa de amar algo ou alguém, há uma retirada da libido desse objeto e consequente deslocamento para um novo objeto, aqui há uma transferência ao ego. A libido livre não se volta para o objeto externo, mas sim, para o próprio ego. Há uma identificação do ego com o objeto abandonado. Para compreendermos como esse processo se dá, Freud nos propõe reconstruí-lo: considera que, se por um lado houve uma forte fixação no objeto de amor, por outro e, em contradição, pouco investimento objetal; o que pressupõe que essa escolha tenha sido feita em bases narcísicas. “A identificação narcísica com o objeto se torna então um substituto do investimento amoroso e disso resulta que, apesar do conflito, a relação amorosa com a pessoa amada não precisa ser abandonada.” E, enfatiza: “Tal substituição do amor objetal por identificação é um mecanismo importante para as afecções narcísicas” (op. cit., p. 63). Há, assim, uma regressão para o narcisismo originário, que encontrará uma rede de significados, provenientes de investimentos objetais inconscientes, que se prestarão a figurar essa imagem identificada no ego. Mas, o que tem um peso diferencial na melancolia é o conflito de ambivalência. Se, por um lado, há um forte investimento libidinal no objeto perdido pelo ego, por outro, há um ódio imenso pelo prejuízo causado por seu abandono. Assim, o ódio e a raiva sobrepõem os laços amorosos e parte do ego se vê identificado com o objeto que lhe era tão caro, mas que em função da dor sentida por sua perda, dispara uma batalha violenta: “ódio e amor combatem entre si: um para desligar a libido do objeto, outro para defender contra o ataque essa posição da libido” (op. cit., p. 81). Encontramos nesse texto a base para discutir, o que suponho, um mecanismo presente nos quadros dos transtornos alimentares, especialmente na anorexia nervosa. A clínica da anorexia nervosa Não é incomum que esses pacientes, predominantemente mulheres, associem o início da anorexia a uma perda importante: uma decepção amorosa, uma mudança, uma perda financeira, a perda de um lugar ou status, etc. E também, bastante comum, essa perda se sobrepõe à entrada na adolescência, que por si demanda um trabalho de luto. O que presenciamos é o que se aproxima, ou vai além, de um processo melancólico: invariavelmente, essa paciente acredita que há algo que deve ser modificado em si mesma para que não venha a perder novamente. Suas autorrecriminações recaem sobre a forma de seu corpo: crê, por exemplo, que se “não fosse gorda e cheia de deformações” não teria lhe acontecido tal sorte. Trata de maneira acusatória e autodepreciativa o que estiver relacionado à sua imagem, sobretudo sua aparência, e o que possa derivar para aspectos idealizados. Assim, algo deve ser feito em seu corpo que altere esse estado de coisas. Freud (op. cit.) chama a atenção para que “o quadro clínico da melancolia põe em destaque o desagrado moral com o próprio ego, acima de outros defeitos. Defeito físico, feiura, fraqueza e inferioridade social, muito mais raramente são objeto de autoavaliação […]”. Porém, o que escutaremos, repetidamente, exaustivamente e com muita aflição e dor desses pacientes é uma queixa referida à aparência física, destituída de realidade, em que pesam a deformação, a feiura e a gordura. O que nos surpreende é que não estamos diante de alguém que pudesse ser considerada gorda ou deformada por ocasião dessa proposição. Raramente uma paciente com anorexia iniciou uma dieta que pudesse ser prescrita por um profissional especializado. Que representação corporal é essa que se apresenta? Com que imagem/objeto essa paciente está identificada? Primeiros tempos Em trabalho anterior (GONZAGA, 2010), propus uma digressão que nos permitisse compreender como esse corpo imaginado pela anoréxica remeteria à construção narcísica de sua identidade. Nesse sentido, os processos identificatórios se dariam por um superinvestimento narcísico materno, tornando-a assim, refém das imagens projetadas nesse enlace e que causariam tanto estranhamento por ocasião do adoecimento. Um corpo que não reconhece como seu, que não lhe causa admiração ou prazer. Silvia Bleichmar (2005), ao postular a constituição do psiquismo, sublinha a importância de considerarmos o recalque originário como tempo fundante (p. 109) e como dispositivo analítico para operar terapeuticamente. E nos faz compreender que o que funda o aparelho psíquico e fixa o inconsciente (derivando daí o ego e as instâncias ideais) advém de um outro que, além dos cuidados primários, inscreve “restos” recalcados de sua própria conflitiva. Revela, assim, como o agente produtor instaura o psiquismo incipiente e de onde esse último retira sua força, dada pelo duplo caráter do funcionamento psíquico parental, do fato de que os pais produzem inscrições sexualizantes e também inibições regressivas por estarem atravessadas por dois sistemas psíquicos em conflito, atravessados por desejos e proibições. A partir de seus desejos inconscientes, da sua sexualidade recalcada – não só edípica, mas também pulsional –, implantam desejos que a partir de seu próprio narcisismo, desde o ego, desconhecem e recalcam a posteriori (op. cit., p. 118). Encerra essa discussão perguntando o que faz com que a criança não enlouqueça, já que os pais parecem propor aquilo mesmo que proíbem. No caso de nossos pacientes com anorexia nervosa, em especial as meninas, para quem a subjetivação da feminilidade é atravessada por essa identificação primária resultante dos tempos fundantes pelo enlace materno, parece haver aí algo que remete a esse “resto recalcado” que advém do inconsciente parental. Esse sobreinvestimento que não pode ser metabolizado por um aparelho ainda incipiente e não clivado, e que, como nos alerta Bleichmar, em “momentos de regressão tão intensos como são os tempos de maternagem, tempos em que o corpo está implicado de uma maneira direta”, sofrerá por não encontrar outras vias de descarga ou ligação se estiver diante de uma carga excessiva do narcisismo amoroso da mãe. E assim, a menina “enlouquece”. Narcisismo e feminilidade Em Sobre o narcisismo: uma introdução (1914), Freud assinala que a escolha objetal feita pelas mulheres é preferencialmente narcísica: elas tomam por objeto sexual aqueles que as amam ou que as convertem em seu ideal; que restituam sua autoestima. Para ampliar essa compreensão, recorro a Hugo Bleichmar (1989), que aborda o tema do narcisismo considerando duas ordens de problema, o da relação entre o ego e o objeto e o da vivência de perfeição, de autossatisfação, de plenitude. Tomando o narcisismo primário comoobjetal, uma vez que o próprio corpo ou o “si mesmo” se ofereceria como objeto de amor para o sujeito, reitera a importância do outro na construção das representações que serão base das identificações. Assinala ainda que “identificação e narcisismo são incompreensíveis se não forem articulados com a divisão em consciente e inconsciente, essencial para a psicanálise. Com relação à imagem inconsciente, o ego e o outro são o mesmo” (p. 36). H. Bleichmar destaca ainda que o amor do narcisismo se caracteriza pela idealização, o que potencializa os sentimentos de perfeição, beleza, encantamento e inteligência, entre outras qualidades associadas aos ideais. Remete-nos, a partir daí, à constatação de que essas valorizações implicam uma ordem simbólica que é exterior ao sujeito e na qual se inscreve. “É o outro quem converte meros objetos anatômicos em algo digno de ser admirado como belo. Resulta fácil imaginar as múltiplas situações em que uma mãe pode converter em adorados os olhos e os cachos de cabelos de sua filha ou em notáveis as produções intelectuais ou físicas das mesmas” (op. cit., p. 38). E assinala, também, que o narcisismo dos pais estará diretamente referenciado na satisfação de suas próprias necessidades de hiperestima ao valorar seus filhos. Freud (1923), ao apresentar e sintetizar suas concepções sobre o funcionamento mental – trabalhando com o conceito de inconsciente e sua aplicação às instâncias psíquicas –, afirma que o “o ego é acima de tudo, um ego corporal; não é simplesmente uma entidade de superfície, mas é, ele próprio a projeção de uma superfície”, e esclarece em nota de rodapé como se constitui, em última análise, a partir das sensações corporais que ganharão representação mental no aparelho psíquico. Assim, não podemos deixar de considerar que o corpo do bebê nesse primeiríssimo tempo fica à mercê do inconsciente materno e que poderá fixar, por consequência, marcas, no que virá a ser representado como ego corporal. Nos casos de pacientes com anorexia nervosa, podemos levantar a hipótese de que essas marcas resultam de aspectos fusionados ao narcisismo materno, muito provavelmente também produto das representações do seu próprio ego corporal. Não é raro nos depararmos com mães que apresentam insatisfações importantes com sua aparência e que se preocupam excessivamente com seu corpo e sua alimentação. Apresentam ideais e exigências que muitas vezes recaem não somente sobre si, mas sobre toda família. Também não é incomum o caráter transgeracional nessas famílias. Além disso, temos observado que oito em cada dez pacientes do sexo feminino que têm anorexia nervosa são filhas únicas ou primogênitas,2 o que sugere a importância da subjetivação da feminilidade na dupla mãe-filha. Dessa forma, a problemática resultante para essa menina parece ser conseguir superar, separar o que seria um ideal do outro impingido em seu corpo/psiquismo. Quando por ocasião de uma nova convocação, também dada pelo corpo, de diferenciação e consequente independência identificatória, uma falha parece se impor e nos vemos diante um destino dado ao pulsional que causa estranhamento e dor: a libido que deveria se desligar de um objeto e ganhar novos investimentos retorna ao ego, só que, nesse caso, ao ego corporal que encarnaria representações identificatórias primitivas. Em artigo já citado (GONZAGA, 2010), considerei que para poder continuar vivendo, a anoréxica tem a tarefa de desencarnar esse objeto intrusivo, incrustrado no que propus ser seu narcisismo corporal. A anorexia e o trabalho da melancolia O que aconteceria então com nossas pacientes que desenvolvem um quadro de anorexia? Ao considerarmos a maior incidência dessa patologia na adolescência das garotas, inevitavelmente remeteremos aos lutos que demandam elaboração por si nessa fase do desenvolvimento – luto ao próprio corpo, à identidade infantil, aos pais da infância e à bissexualidade. O que parece já ser uma tarefa difícil é potencializada, via de regra, por outras perdas significativas já citadas (decepção amorosa, mudança, separações, viagens, intercâmbio, etc.), e então assistimos a essa jovem atribuir a um suposto “defeito” em seu corpo a causa de seu fracasso. Parece, sobretudo, que diante do fracasso de um processo de luto normal, o que poderia ser um trabalho melancólico que lhe outorgasse a possibilidade de encontrar em representações mentais a identificação narcísica própria a esse processo vai além e transfere para o corpo a tarefa de realizar tal processo. A ambivalência das relações amorosas, que já configura na melancolia o amor e o ódio dirigidos ao objeto, encontra aqui peculiar expressão. A entrada na adolescência da menina lhe impõe a tarefa de desligar as representações próprias ao seu mundo infantil e, nesse caso, nos parece que a força dos investimentos impede que esse desligamento siga um processo de luto próprio a essa etapa evolutiva. Freud (1923, p. 81) enfatiza que, para haver um trabalho de luto, as representações devem encontrar um caminho fluido do sistema inconsciente para o pré- consciente/consciente, e que o mesmo não acontece na melancolia: “esse caminho está bloqueado para o trabalho melancólico, talvez em consequência de inúmeras causas ou de uma ação conjunta de causas”. Reitero, mais do que um bloqueio que impeça a derivação para as representações mentais inconscientes – que, no caso, promoveria um quadro de melancolia –, o que observamos é essa derivação para representações corporais. Parece que nesse trabalho regressivo o ego já encontra o próprio objeto encarnado – e não a “sombra do objeto”, como assinala Freud como característica central do trabalho da melancolia. Seguindo o texto freudiano, ao tratar a tendência ao suicídio na melancolia, teremos que considerar que: […] a análise da melancolia nos ensina que o ego só pode matar a si próprio se puder, por meio do retorno do investimento de objeto, tratar-se como um objeto, se puder dirigir contra si a hostilidade que vale para o objeto e que representa a reação primordial do ego contra os objetos do mundo externo (op. cit., p. 69). A confusão que se estabelece no espelho da anoréxica parece nos contar sobre a falta de discernimento entre ego, objeto e ego corporal. Confusão essa decorrente do superinvestimento do narcisismo materno que potencializa o que lhe foi dado como enunciado inconsciente, e que a impossibilita de realizar um processo melancólico exitoso, que lhe ofereceria representações mentais para elaborar seus lutos e que outorgaria ao ego sua principal atribuição, o discernimento. Ela sucumbe, não percebe que castiga seu corpo; ao contrário, tem plena certeza que não se alimentando está cuidando de um corpo deformado pela gordura. Dito de outra maneira: está tentando pela via motora desinvestir a libido que recai sobre o objeto de amor e ódio. Reage maniacamente: luta com toda energia, resultante da retirada da libido objetal, contra si mesma, mas acreditando que dominou o inimigo. O trabalho clínico Laplanche (2015[2003], p. 194) também enfatiza a importância das relações inter-humanas na gênese do psiquismo do infans,3 sobretudo por seu caráter assimétrico no que diz respeito à sexualidade, e atribui a esse encontro uma peculiaridade na comunicação, comprometida pelo inconsciente, que resultaria em mensagens enigmáticas. A situação antropológica fundamental confronta, num diálogo simétrico/dissimétrico, um adulto que possui um inconsciente sexual (essencialmente pré-genital) e um infans que ainda não constituiu um inconsciente, nem a oposição inconsciente/consciente. O inconsciente sexual do adulto é reativado na relação com a criança pequena, com o infans […] Estas mensagens são, então, enigmáticas, ao mesmo tempo para o emissor adulto e para o receptor, o infans. Recorro a essas considerações de Laplanche, pois a partir daí ele discorrerá sobre o caráter traumático dessa implantação e do que resultará como trabalho de tradução por esse psiquismo incipiente, o que constituirá uma tarefa importantea ser elaborada ao longo da existência. Contudo, nos alerta, essa tarefa pode fracassar, parcial ou integralmente, e essas mensagens podem carecer de tradução. Assinala que “o fracasso da tradução pode ter por resultado especialmente uma transmissão tal qual, intergeracional, sem nenhuma metabolização” (p. 197). Laplanche aponta, a partir daí, para a organização do funcionamento psíquico desde o que consideramos normal ou neurótico até o borderline ou psicótico, ressaltando que “existiria em todo ser humano uma espécie de estoque de mensagens não traduzidas: algumas praticamente impossíveis de traduzir, outras na espera provisória de tradução” (p. 199). No trabalho com pacientes com anorexia nervosa, levar em conta essas considerações me ajudaram a refletir sobre como operar terapeuticamente com os dispositivos analíticos que referenciam a clínica. Via de regra, não há como trabalhar classicamente com a associação livre, interpretações ou análise da transferência. Percebo-me diante de pacientes que não têm “vocabulário” para traduzir suas insatisfações ou queixas, que pudessem minimamente remeter a conflitos com estatuto representacional. O corpo é que confere esse estatuto e que se apresenta marcado por signos que carecem dessa tradução. Acompanhar essas pacientes, desde as queixas corporais, que não têm veracidade ou realidade, me parece uma forma de dar alguma possibilidade de conversa sobre algo que não se sabe falar. Se muito apressadamente tentamos dar um estatuto representacional ao que está sendo apresentado, fracassamos de imediato. Ter a delicadeza de reconhecer a falta de repertório que pudesse atribuir significados ao sofrimento experimentado por esse corpo percebido como deformado é, a meu ver, uma possibilidade de trabalho analítico. Perceber que o corpo é o depositário do que não tem tradução, do que não foi metabolizado, quase sempre por mais de uma geração, é realmente oferecer recursos para alguma elaboração. Sentimentos e sensações ganham equivalências difíceis de serem discernidas, muitas vezes pela paciente e, na melhor das hipóteses, algumas vezes pelo analista. A morte não está em questão como possibilidade real para a anoréxica, ela não tem por intenção morrer. Só poderá viver se puder matar sua imagem especular. E, assim acredito, temos no espelho uma imagem fusionada, herança dos primeiríssimos tempos, em que o ego corporal impede que as representações mentais possam servir ao psiquismo, conferindo um caráter mais regressivo ao trabalho da melancolia, que encontra no corpo sua expressão. A melancolia que não pode ser elaborada confere ao corpo da anoréxica um estandarte que denuncia seu sofrimento, mas não para ela mesma. Estamos quase sempre aquém de algo que possa demandar um movimento terapêutico. Refletir essa queixa, transformar em representações que outorguem trabalho psíquico como nos ensina Freud, requer do analista um passo a mais: construir pontes para que as palavras possam de fato contemplar seu objetivo e dar estatuto representacional ao corpo. Capturar as mensagens em espera de tradução e aí sim poderemos falar sobre as insatisfações – as autorreprovações dadas pelos ideais –, as reais mandatárias desse sofrimento. Aí sim poderemos nos aproximar do objeto que está encarnado ou encravado – na compreensão de Laplanche – e promover sua “fantasmatização”, para que a “sombra do objeto recaia sobre o ego” e um trabalho de luto/melancolia se faça possível. Notas: 1. Este capítulo é uma modificação do artigo publicado: Anorexia: A failure of the work of a melancholia. São Paulo, Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 15(3):649-656, sept 2012 (Suppl.). 2. Dados obtidos na Clínica de Estudos e Pesquisas em Psicanálise da Anorexia e Bulimia – CEPPAN. 3. Criança que não fala. Referências BLEICHMAR, H. Depressão: um estudo psicanalítico. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. BLEICHMAR, S. Clínica psicanalítica e neogênese. São Paulo: São Annablume Editora, 2005. FREUD, S. [1915] Sobre o narcisismo: uma introdução. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago. 1976. v. XIV. _________. [1923] O Ego e o Id. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1976. v. XIX. _________. Luto e melancolia. São Paulo: Cosac Naify, 2011. LAPLANCHE, J. Três acepções da palavra “inconsciente” no âmbito da teoria da sedução generalizada. In: LAPLANCHE, J. Sexual – A sexualidade ampliada no sentido freudiano – 2000 – 2008. Porto Alegre: Dublinense, 2015. GONZAGA, A. P. Se esse corpo fosse meu… – Considerações sobre o estranhamento na anorexia. In: GONZAGA, A. P.; WEINBERG, C. (orgs.). Psicanálise de transtornos alimentares. São Paulo: Primavera, 2010. _____________. Anorexia: A failure of the Work of Melancholia. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, 15(3):649-656, sept. 2012 (Suppl.). A RELEVÂNCIA DA INTERAÇÃO DA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR FORA DAS INSTITUIÇÕES SOB A ÓTICA SIMBÓLICA QUE OPERA NO MANEJO CLÍNICO DOS TRANSTORNOS ALIMENTARES1 Ana Tereza Arantes de Almeida Alonso “Gostaria de ser um crocodilo vivendo no Rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranquilos e escuros como o sofrimento dos homens.” – Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas Introdução Na proposta de falar algo sobre os transtornos alimentares, devemos ter sempre em mente que estamos tocando em patologias complexas que têm etiologia multifatorial e não são circunscritas a fatores socioeconômicos ou culturais. Dentro da tal complexidade, se faz necessária uma intervenção multidisciplinar para o tratamento. Esse consenso compartilhado pelos profissionais que trabalham com transtornos alimentares e suas síndromes parciais é baseado em evidências científicas e trabalhos consistentes realizados, na grande maioria das vezes, em instituições de porte, mantidas com recursos governamentais. Esses redutos institucionais são capazes de oferecer um trabalho simultâneo e integrado da equipe, tendo como tratamento padrão a participação de médicos clínicos, endocrinologistas, psiquiatras e psicólogos (atendimento individual e condução de grupos psicoeducativos com as famílias), nutricionistas e outros profissionais da saúde. É na riqueza dessas diferentes frentes de atuação e na interação constante da equipe que os melhores resultados puderam ser atingidos até hoje. Ocorre que esses redutos de trabalho têm uma possibilidade restrita de recepção de pacientes, muitas vezes com fila de espera e, por serem instituições públicas, precisam se organizar diante da melhora de cada caso para uma “alta institucional”, disponibilizando novas vagas para os pacientes mais graves que aguardam. Porém, a alta institucional não está ligada ao esgotamento da necessidade de continuidade de trabalho, e sim, às condições possíveis para aquele paciente seguir sustentando determinados processos com maior autonomia e fora da instituição. Esses pacientes são, na grande maioria das vezes, encaminhados para processos em consultórios particulares: terapêuticos, acompanhamento nutricional e psiquiátrico. Tal equipe é única, por se configurar em torno daquele paciente. Busco aqui apresentar um panorama de algumas questões psíquicas de complexa densidade e determinantes dos transtornos alimentares, com as quais os profissionais que se propõem a trabalhar no atendimento desses pacientes se deparam. E, conclusivamente, pretendo abordar a potencialidade da riqueza simbólica a ser trabalhada – na terapia – e na transferência – em um processo terapêutico integrado a uma equipe multidisciplinar, constante e atuante. Portanto, o argumento que defendo é a absoluta relevância da interação da equipe multidisciplinar fora das instituições, sob a ótica simbólica que opera no manejo clínico desses casos, articulada com as questõessubjetivas presentes no funcionamento desses pacientes. Questões subjetivas relativas aos transtornos alimentares Os transtornos alimentares apresentam características que se iniciam em idade muito precoce e por anos correm o risco de permanecer sem serem notadas, ainda mais na sociedade atual, que, predominantemente, não oferece um olhar de estranhamento para um corpo muito emagrecido, para restrições alimentares severas e até para a exclusão de certos grupos de alimentos com a intenção de perder peso. É na adolescência, quando a progressão da doença captura a atenção de que algo realmente sério está acontecendo na vida daquela pessoa, que a maioria dos diagnósticos são feitos. Steinhausen (2002) nos diz que os transtornos alimentares “acometem cerca de 1% dos adolescentes, podendo chegar a consequências graves (alta morbidade). Além disso, são responsáveis por 1% a 18% da mortalidade” (apud BILYC, 2008, p. 1284-1293). A adolescência é um período de intensas transformações, uma fase em que o trânsito da dependência para a independência está em curso. As mudanças na dinâmica familiar, dentro de casa, e sociais, no contexto escolar – até então os dois universos mais conhecidos e seguros – estão a todo vapor. Outra “casa” primordial também muda, transformações corporais significativas modificam esse corpo conhecido em suas formas, funcionamentos e reações ante questões internas e externas. Tudo isso é muito assustador na vivência do sujeito, da família nuclear e expandida e professores. A velocidade de processamento com que essas mudanças se darão não é igual interna e externamente, promovendo angústias, medos e apreensões. Pesquisas e testes serão atuados na realidade pelo adolescente, na tentativa de construir e enriquecer o percurso único e autoral da constituição da própria personalidade. As figuras de identificação até então, materna e paterna, são vividas com enorme ambiguidade e a família sente o “curto-circuito” desses novos formatos de relação. Essas primeiras decolagens da vida em voo solo no sentido da individuação exigem a diferenciação e a discriminação do que é sentido como “eu” e como “não eu”. Tratando-se de pessoas com transtorno alimentar, nas quais a problemática orbita justamente pela precária possibilidade que tiveram de se diferenciar do objeto e constituir relação entre eu e outro (ponto que me debruçarei mais adiante), o corpo que se impõe com novas formas e possibilidades é sentido como extremamente ameaçador e já um outro em si. A recusa e/ou a desorganização diante dessa condição do desenvolvimento humano – adolescência – desencadeiam o sentimento de grande descontrole, ainda mais intenso na vivência desses pacientes que têm uma falha na constituição egoica. Com um ego precariamente estabelecido, incapaz de ancorar tal volume de angústia, movimentos na tentativa de interceptar a sensação de desamparo e descontrole são promovidos e abre-se o caminho para que intensas investidas de controle se deem no mundo externo e concreto. Portanto, o que ocorre é uma defesa ante a angústia resultante das intensas modificações supracitadas. Exemplifico aqui com a carta de uma adolescente com transtorno alimentar: Corpo, não tenho muito a dizer, você sabe o quanto te odeio por não ser como eu quero, até aceito não ser alta mas não admito que não possa ser magra, esquelética do jeito que eu gosto principalmente nas coxas que é o que eu mais odeio em você. Não posso ceder às suas vontades porque se eu deixo você seguir o seu percurso biológico naturalmente sei que você será maior me deixando com mais curvas e tornealidade do mesmo jeito que você era quando eu tinha 14 anos (coxas grossas enormes e cheias de celulite) inadmissíveis na sociedade. É obvio que não gosto de me sentir cansada, indisposta às vezes com dores no corpo ou então passar mal, eu sei como é e o quanto é ruim e o quanto você não me ajuda com relação a muitas coisas na alimentação e “não” sinto ao lhe informar que não consigo, não devo, não posso e não vou parar até encontrar o “meu equilíbrio”, o equilíbrio que quero, é claro. Não sei se algum dia vou poder parar, não faço ideia de até quando vou continuar cavando e jogando terra no mesmo buraco. Outra coisa que não te suporto são as vezes em que do nada me faz sentir fome, aquela fome maior do que o “meu normal”, isso me incomoda, me deixa com muita raiva e por isso muitas vezes te burlo e não cumpro os combinados que faço. Não te suporto, não vou ficar do jeito que você quer e não vou permitir essa tragédia na minha vida, vou ser bem sincera com você, a verdade é que por tempo indeterminado não conte comigo pois já estou fazendo demais por você. Muito mal sabe você o inferno interno que eu tenho e muito menos o demônio que comanda isso tudo e fica falando, falando, falando e falando coisas dentro da minha cabeça todos os dias, para que eu nunca me esqueça de que ele está e sempre estará ali me atormentando e me “acompanhando” sempre. Por tanto me sinto com todo o direito de jogar na sua cara que estou pouco me lixando para você. Na busca por uma oportunidade representacional que visa a uma elaboração, funcionamentos obsessivos podem ser atuados em diversas situações: o grama no peso corporal, o milímetro na circunferência da coxa, o ritual da alimentação e distribuição do alimento no prato… Por certo período, uma paciente chegou quase a ficar careca, pois não admitia que seus cabelos não nascessem em uma linha perfeita. Ela arrancou progressivamente cada fio, na esperança de atingir tal linha. Media suas coxas todos os dias com a mesma fita métrica e, como consequência de uma oscilação indesejada de milímetro, se punia fisicamente. Nessa fase, o dano em curso afeta toda a potencialidade de vida desses indivíduos: aspectos do funcionamento físico, mental e social são prejudicados. O desenvolvimento nutricional deficitário muitas vezes compromete o crescimento e a chegada dos caracteres secundários de gênero. Todos os investimentos libidinais são tingidos pela dinâmica de sua vida psíquica. Tal dinâmica detém questões primitivas, datadas do período pré- edípico. Os aspectos de fusionalidade são frequentes, e a rigidez superegoica primitiva também se faz presente. McDougall (2000, p. 158-9) relata que: A doença é uma maneira muda do comunicar pensamentos e sentimentos que nunca tinham podido ser elaborados psiquicamente, é uma expressão de temores libidinais arcaicos e de desejos fusionais acessíveis à consciência, porém acompanhados de fúria narcísica e de pavor primitivo, totalmente inconscientes. Retomo aqui o olhar para as relações primárias do desenvolvimento psíquico. A relação inaugural que temos com o mundo se dá através da mãe. É diante da intenção de despender os cuidados físicos necessários que a experiência de satisfação advirá. Nessa vivência, como diz Freud (1895), determinada parte do corpo será alçada a ser uma zona erógena. Existe aqui a marca da diferença entre uma parte corporal e uma zona erógena, aquela que, para além do estancamento momentâneo da necessidade física, vivencia a sensação de prazer, e recebe para sempre a marca do desejo. Essa primeira relação objetal será de alguma forma balizadora para todas as relações objetais futuras. Transitando também por autores, como Aulagnier, Bleichmar, Laplanche, amplio a importância do primeiro olhar, o materno. Olhar este que carrega as marcas das vivências da mãe e denuncia a forma com que ela lidou e o quanto elaborou as próprias pulsões parciais. Essa relação se dará recoberta pelo próprio narcisismo materno, que tomará o bebê como objeto sexual, e os cuidados serão desempenhados sob a convocação do infantil materno. Laplanche (1999) diz que a sexualidade e a pulsão vêm do outro, defendendo o inconsciente materno como fundante, o qual contamina o biológico e inscreve as vivências de satisfação. Mas aqui, tratando da problemática presente nos transtornos alimentares, direcionarei minha atenção para a questão da intensidade e da qualidade com que tudo isso é vivido. A intensidadee a qualidade de investimento que ele receberá nessa relação primeva serão determinantes para delinear a amplitude que o trânsito da pulsão de morte terá dentro do psiquismo do sujeito, e toda sua possibilidade futura de realizar investimentos libidinais encontrará, nessa vivência, seu alicerce. Pierre Bourdieu (1974) chama a atenção para a violência existente no movimento de introduzir o bebê em uma cultura por meio do contato materno. Aqui nos deparamos com a violência simbólica que ocorre no encontro entre a mãe e seu bebê, e que não é destrutiva, mas importantíssima e constitutiva. A destrutividade aí estaria ligada à intensidade do investimento, em que um não investimento ou um hiperinvestimento, são os grandes perigos. Para McDougall (2000, p. 44): À medida que se dá a lenta introjeção do ambiente maternal, o lactente começará a fazer a diferença entre si mesmo e sua mãe e a recorrer a ela com total confiança, para que ela lhe traga reconforto e alívio de seu sofrimento físico ou mental. Mas quando, por razões inconscientes, uma mãe não consegue proteger o bebê da superestimulação traumática (especialmente quando ele está sofrendo), ou quando o expõe a subestimulação igualmente traumática, isso pode levá-lo a uma incapacidade de distinguir a representação de si mesmo da representação do outro. Consequentemente pode suscitar uma representação arcaica na qual os contornos do corpo, o investimento das zonas erógenas e a distinção entre o corpo materno e o corpo da criança permanece confusa. Nos pacientes com transtornos alimentares, os estudos embasados na experiência clínica apontam para um comprometimento dessa relação, na qual uma vivência de excesso é tão comprometedora como uma aridez afetiva. As primeiras relações vividas por eles – ou de mais, ou de menos – acarretarão uma precariedade no estabelecimento do ego, carregando consigo uma falha na instauração do aparelho psíquico. A falha no funcionamento psíquico dos pacientes com transtornos alimentares reside na precariedade da representação que diferencia sujeito e objeto. Este prejuízo na vivência do narcisismo primário tem como herdeiro um ego fragilizado que fica à mercê do funcionamento de um ideal de ego absolutamente rigoroso e submetido à intensa fúria narcísica. Segundo Brusset (2008, p. 54-55): Esta lógica regressiva tende a se significar aquém da representação que supõe a diferença de um sujeito e de um objeto, a triangulação, o terceiro a partir do qual as relações sujeito-objeto podem ser objetivadas e representadas […] A boa distância não encontrável, entre o abandono e a intrusão privada de si, deixa-se ver tanto nos registros da posição fálica e da castração quanto nos da analidade e oralidade. As relações conflitivas entre objeto total e objeto parcial mostram que os autoerotismos remetem à dependência basal de um objeto, sem poder estabelecer um espaço de investimento próprio e durável. A dinâmica familiar Pessoas que desenvolvem um transtorno alimentar apresentam geralmente uma dinâmica familiar característica. Por isso, cada vez mais, o trabalho não só com o paciente mas também com seus familiares vem tomando lugar de extrema importância no tratamento. Nossos estudos indicam que a indiferenciação e consequente identificação com a figura materna têm como consequência a exclusão da figura paterna. A relação entre mãe e filha no quotidiano denuncia a fusionalidade, operando com frágeis aspectos de diferenciação. As famílias dos pacientes com anorexia tendem a investir muita atenção para não entrarem em conflito e manterem uma “união” como sistemas aglutinados, rígidos e com grande evitamento de mudanças, como falam Turkiewicz et al. (2008, p. 69). As famílias de pacientes bulímicos são mais caóticas, explicitam muitas críticas e emoções de forma acalorada e se depreciam constantemente. Percebemos que os casais estabelecem relações frágeis, sem espaços privados para interações físicas e psíquicas. Existe acentuada dificuldade de conversar, se divertir, ter hábitos e sustentar posicionamentos em comum. Diante disso não conseguem garantir a hierarquia saudável entre pais e filhos para ideais, valores e convicções serem recebidos em alto grau e assim sustentarem uma “voz” ativa, forte, atuante e norteadora. Salvador Minuchin (1995) estuda as famílias e suas estruturas e defende que a família exerce o lugar de “matriz de identidade”. Apresenta a ideia de que a forma como uma pessoa interage, se relaciona e se comporta está intimamente articulada ao modo como a família se estrutura. O benefício transferencial no tratamento dos transtornos alimentares em um processo de análise como parte integrada a uma equipe multidisciplinar Foi em 1905 que Freud se deparou com a potente força da transferência, necessitando pensar sobre a interrupção do processo analítico de Dora. Ele se deu conta de que o paciente irá reviver emoções na intimidade da relação analítica – transferencialmente projetados na relação e na figura do analista –, sem idade, sem lugar e sem tempo. O setting terapêutico, como pensa Balint (2014), tem como função primordial garantir um espaço protegido de urgências de tempo, estímulos e isento de julgamento crítico. “[…] Penso que o analista deve fazer uma aposta no tempo e na relação, e aguentar esperar que o paciente, sustentado por uma relação analítica confiável e não invasiva, encontre uma forma de recolocar-se no caminho do desenvolvimento.” (p. 137). É nessa relação que considera que o tempo interno é diferente do tempo externo, que não atende a uma linearidade, que se estabelece a plenitude da relação entre paciente e analista. Figueiredo (2002) nos diz que “a figura do analista inserida numa das constelações psíquicas que o paciente organizou ao longo de suas experiências emocionais aciona, a um só tempo transferência e resistência, alavancando a dinâmica do tratamento” (p.2). Este lugar da intimidade tem como comandante qualquer pensamento, devaneio ou sonho, porém, na clínica dos transtornos alimentares, essa potencialidade é extremamente precária. O benefício de uma análise como parte integrada a uma equipe multidisciplinar ocorre antes mesmo da chegada em nossos consultórios e ao longo das primeiras entrevistas, em que a equipe será responsável por informar a necessidade indispensável do processo e esclarecer algumas dúvidas tanto do paciente como de seus familiares, fornecendo, desse modo, o amparo necessário para a busca da terapia. Muitas vezes é somente com esse firme sustentar da extrema necessidade do processo psicoterapêutico, encontro após encontro, com o ritmo das idas e vindas, que a relação analítica pode se estabelecer, fortalecer e atingir na transferência todo o potencial do trabalho. O resultante é a construção do setting terapêutico simbólico capaz de oferecer tal espaço de intimidade para que o paciente – dentro de seu percurso autoral da construção de sua própria narrativa – possa vir a ser. Para podermos nos dedicar ao “mergulho simbólico” em direção à construção dos aspectos psíquicos, precisaremos contar com o psiquiatra e o nutricionista atentos ao que é mais concreto, como o peso que a balança marca semanal ou quinzenalmente, o IMC, as taxas sanguíneas (anemia, falta de ferro), o sinal vermelho do ritmo cardíaco, a falta de ar, a necessidade ou não da medicação para lidar com comorbidades, como depressão, ansiedade, falta de sono, impulsividade… Outra questão é a falta do “contorno primordial” e do “tamanho simbólico” daquele sujeito, questões que assolam seu psiquismo. A meu ver, a equipe constituída, constante e atuante promove simbolicamente uma vivência de contorno, uma borda, o traçado que indicará – principalmente em momentos extremos – o limite, o risco, a direção a seguir. Outro dia, em uma reunião com a equipe clínica, uma paciente disse: “Eu não quero, não vai ser fácil, mas, por outro lado, vejo vocês como meu paraquedas reserva, que, quando eu não consigo sozinha, não vão deixar eu me esborrachar”. Assim, a equipe será responsável por acionaralertas vermelhos para a paciente e para a família que, imersos em formas de se relacionar por anos a fio, não conseguem apreender os aspectos de exclusão, controle, onipotência e fusionalidade que operam nas relações. A relação analítica, como sabemos, tem como material de trabalho as resistências, atuações e outros funcionamentos psíquicos, mas, no que tange a dinâmica familiar, será no contato com o psiquiatra e o nutricionista que esta questão será trabalhada. O posicionamento do terapeuta deve salvaguardar a relação do sujeito com o corpo psíquico que, ainda sem a intensidade dos contornos e limites psíquicos necessários para o amparar, escancara a carência nutricional psíquica mediante um intenso vazio ou um esparramar que transborda e conduz aquilo que poderia vir a ser um pensamento, para o ralo. A voz “fraca” ou desorganizada, mas única possível, precisa, de quietude e silêncio de atuações da família para poder ser “ouvida”, fertilizando devaneios, explicitando fantasmas e seguindo na direção de provocar questionamentos no sujeito, para que ele possa se implicar consigo mesmo. O setting terapêutico deve ser resguardado de invasões e transbordamentos concretos dos familiares. Quando estamos diante do convite à fusionalidade, qualquer familiar sendo a voz do paciente é prejudicial para esses “passos” com traços ainda tão primitivos. Gurfinkel (2010, p. 78-79), afirma que Neste ponto passamos a falar da transferência e seu complexo interjogo, pensamos que o contexto clínico do enquadre pode ser entendido como um importante ritual que regula a aproximação entre o sujeito e seu analista. Enquanto a representação dos braços da mãe, ele pode auxiliar na contenção da pulsionalidade e da tendência ao ato ou da impulsividade, por meio de uma presença do outro que possa “cuidar”, regulando o excesso de excitação que assola o sujeito. Essa constância se repete na análise, e estamos diante da possibilidade de reeditar, na transferência, aquelas primeiras vivências que falamos no início, a conquista de reviver essa dependência e esse olhar libidinizador. Nosso manejo clínico deve atentar para a problemática da intensidade de investimento referida anteriormente no texto, nem de mais, nem de menos, a justa medida entre aridez e excesso extremos como destruidores. Ponto que corresponde com nossa postura como analistas, a necessidade de sermos mais ativos, mais tolerantes com o não saber, e jamais atropelando a construção do saber sobre eles mesmos. Esses pacientes nos apresentam um vazio simbólico e, muitas vezes, escassa possibilidade de associação. Outra questão potencial no tratamento multidisciplinar é a vivência do paciente nos diferentes espaços, a experiência emocional de ser “olhado” e “cuidado”, se “olhar”, se “pensar” e se “cuidar” dentro de cada especificidade profissional. Será nessa diversidade de vivências que pode ocorrer uma ampliação de seus investimentos tão restritos. Aqui menciono que a carta da paciente para seu corpo citada neste capítulo “nasceu” de uma reflexão entre ela e a nutricionista e, explicitando a riqueza transferencial e o bom uso desses diferentes espaços, foi trazida pela paciente para seu espaço analítico e alimentou suas associações. Dessa forma, cada profissional em determinado momento do tratamento poderá – como em uma dança das cadeiras – receber diferentes projeções predominantemente. Teremos fúria narcísica, temores, competição, controle, movimentos de reparação, prazer, desprazer, conquista, fracasso, dar-se conta da falta, do desejo (amoroso e destrutivo), de necessidade… transitando por este tripé/equipe, o que traz grande riqueza para a associação, necessária para a elaboração em análise. No tratamento desses pacientes, muitas vezes o investimento se dá na intenção de repetir a relação fusional na terapia e com cada um dos integrantes da equipe, de excluir um ou mais espaços/profissionais, como representantes simbólicos da exclusão do terceiro e da dificuldade diante de tal forma de se relacionar. Uma equipe experiente, com um discurso e uma forma de pensar atentos aos mesmos pontos, que convive com as diferenças de cada área de atuação e que não exclui ninguém, legitima esse formato de triangulação relacional que, em si, marca a falta, a necessidade e explicita a não onipotência, abrindo as portas para maiores possibilidades de maturidade. Jeammet (2008, p. 47) alerta para um “risco” que habita simbolicamente a forma com que esses pacientes se relacionam, em que a instituição teria uma função protetora. A Abordagem institucional oferece mediações que tornam o contato objetal menos perigoso e mais suportável do que uma relação dual na qual ela corre o risco de ser imediatamente captada pelo outro em razão do mesmo sobreinvestimento que fazem desta relação. O analista também cumprirá um papel importante junto à equipe falando sobre as movimentações psíquicas e defesas atuantes, favorecendo o entendimento, para elaboração também dos profissionais. Estes terão que tolerar projeções e atuações defensivas maciças em um constante alternar dos lugares com que cada profissional está indentificado naquele momento nas projeções simbólicas daquele paciente. A transferência é viva e atinge toda a equipe! Notas: 1 .Agradeço à Cybelle Weinberg pela leitura. Referências AULAGNIER, P. A violência da interpretação – do pictograma ao enunciado. São Paulo: Escuta, 1979. ______. Um intérprete em busca de sentido – I e II. São Paulo: Escuta, 1990. BALINT, M. A falha básica: aspectos terapêuticos da regressão. São Paulo: Zagodoni, 2014. BILYC, B. et al. Peculiaridade no tratamento da anorexia e bulimia nervosa na adolescência. A experiência do Protad. São Paulo, Revista Psiquiatria Clínica, 31 (4), 2004. BLEICHMAR, S. A fundação do inconsciente: destinos da pulsão, destinos do sujeito. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. _______. Do motivo de consulta à razão de análise: e outros ensaios psicanalíticos. São Paulo: Zagodoni, 2015. BOURDIEU, P. 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