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Antonio Nóvoa professor se forma na escola

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Antonio Nóvoa: "professor se forma na escola"
Quer aperfeiçoar sua prática pedagógica? O especialista português garante que o 
melhor caminho é debater com os colegas
ANTONIO NÓVOA "O educador que acaba de se formar não pode ficar com as 
piores turmas nem ser alocado nas unidades mais difíceis, sem acompanhamento". 
Manter-se atualizado sobre as novas metodologias de ensino e desenvolver práticas 
pedagógicas mais eficientes são alguns dos principais desafios da profissão de 
educador. Concluir o Magistério ou a licenciatura é apenas uma das etapas do longo 
processo de capacitação que não pode ser interrompido enquanto houver jovens 
querendo aprender. Quem defende isso é um dos maiores especialistas mundiais em 
formação de professores, o português Antonio Nóvoa.
Catedrático da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de 
Lisboa e presidente da Associação Internacional de História da Educação, ele garante 
que o melhor lugar para aprender a lecionar melhor é a própria escola. "A produção de 
práticas educativas eficazes só surge de uma reflexão da experiência pessoal 
partilhada entre os colegas", diz ele. Nesta entrevista, concedida por e-mail da capital 
portuguesa, Nóvoa afirma ainda que a bagagem teórica terá pouca utilidade, se você 
não fizer uma reflexão global sobre sua vida. Como aluno e como profissional. 
 A formação dos professores é apontada por muita gente como uma das 
principais responsáveis pelos problemas da educação. O senhor concorda com 
isso? 
Embora tenha havido uma verdadeira revolução nesse campo nos últimos vinte anos, a 
formação ainda deixa muito a desejar. Existe uma certa incapacidade para colocar em 
prática concepções e modelos inovadores. As instituições ficam fechadas em si 
mesmas, ora por um academicismo excessivo ora por um empirismo tradicional. Ambos 
os desvios são criticáveis.
O difícil acesso às novidades é um dos empecilhos para incorporá-las à dinâmica 
da sala de aula? Ou as práticas de ensino mudam numa velocidade impossível de 
acompanhar?
O equilíbrio entre inovação e tradição é difícil. A mudança na maneira de ensinar tem de 
ser feita com consistência e baseada em práticas de várias gerações. Digo que nesta 
área nada se inventa, tudo se recria. O resgate das experiências pessoais e coletivas é 
a única forma de evitar a tentação das modas pedagógicas. Ao mesmo tempo, é preciso 
combater a mera reprodução de práticas de ensino, sem espírito crítico ou esforço de 
mudança. É preciso estar aberto às novidades e procurar diferentes métodos de 
trabalho, mas sempre partindo de uma análise individual e coletiva das práticas.
Como definir um bom programa de educação continuada?
O aprender contínuo é essencial em nossa profissão. Ele deve se concentrar em dois 
pilares: a própria pessoa do professor, como agente, e a escola, como lugar de 
crescimento profissional permanente. Sem perder de vista que estamos passando de 
uma lógica que separava os diferentes tempos de formação, privilegiando claramente a 
inicial, para outra que percebe esse desenvolvimento como um processo. Aliás, é assim 
que deve ser mesmo. A formação é um ciclo que abrange a experiência do docente 
como aluno (educação de base), como aluno-mestre (graduação), como estagiário 
(práticas de supervisão), como iniciante (nos primeiros anos da profissão) e como titular 
(formação continuada)
. 
4
Antonio Nóvoa: "professor se forma na escola"
Esses momentos só serão formadores se forem objeto de um esforço de reflexão 
permanente.
Todas as fases têm a mesma importância para o educador?
Se tivesse de escolher a mais decisiva, ficaria com a dos anos iniciais da profissão. 
Infelizmente, não se dá a devida atenção a esse período. É ele que define, positiva ou 
negativamente, grande parte da carreira. Para mim é inaceitável que uma pessoa que 
acabou de se formar fique encarregada das piores turmas, muitas vezes sem apoio 
nem acompanhamento. Quem está começando precisa, mais do que ninguém, de 
suporte metodológico, científico e profissional.
Ou seja, apenas ler sobre as novas teorias pedagógicas não é suficiente para se 
manter atualizado?
Há alguns anos surgiu o conceito de profissional reflexivo como uma forma de valorizar 
os saberes experimentais. Ele teve mais influência na pesquisa educacional do que nas 
atividades concretas de formação, mas foi importante na reorganização das práticas de 
ensino e dos modelos de supervisão dos estágios. No entanto, sempre me recordo das 
palavras do educador americano John Dewey: "Quando se diz que um professor tem 
dez anos de experiência, será que tem mesmo? Ou tem um ano de experiência repetido 
dez vezes?" Só uma reflexão sistemática e continuada é capaz de promover a 
dimensão formadora da prática.
Quais critérios o professor deve considerar ao buscar formas de se atualizar?
Como eu já disse, há dois polos essenciais: o professor como agente e a escola como 
organização. A preocupação com a pessoa do professor é central na reflexão 
educacional e pedagógica. Sabemos que a formação depende do trabalho de cada um. 
Sabemos também que mais importante do que formar é formar-se; que todo o 
conhecimento é autoconhecimento e que toda a formação é auto formação. Por isso, a 
prática pedagógica inclui o indivíduo, com suas singularidades e afetos.
E a escola?
Ela precisa mudar institucionalmente. O desenvolvimento pessoal e profissional 
depende muito do contexto em que exercemos nossa atividade. Todo professor deve 
ver a escola não somente como o lugar onde ele ensina, mas onde aprende. A 
atualização e a produção de novas práticas de ensino só surgem de uma reflexão 
partilhada entre os colegas. Essa reflexão tem lugar na escola e nasce do esforço de 
encontrar respostas para problemas educativos. Tudo isso sem cair em meras 
afirmações retóricas. Nada vai acontecer se as condições materiais, salariais e de 
infraestrutura não estiverem devidamente asseguradas. O debate sobre a formação é 
indissociável das políticas de melhoria das escolas e de definição de uma carreira 
docente digna e prestigiada.
De que forma o governo (no caso da rede pública) e a própria escola (no caso da 
particular) podem agir para melhorar a formação dos professores?
Eles devem criar as condições básicas, com infraestrutura e incentivos à carreira. Só o 
profissional, no entanto, pode ser responsável por sua formação. Não acredito nos 
grandes planos das estruturas oficiais. Esse é um processo pessoal incompatível com 
planos gerais centralizadores. É no espaço concreto de cada escola, em torno de 
problemas pedagógicos ou educativos reais, que se desenvolve a verdadeira formação. 
Universidades e especialistas externos são importantes no plano teórico e 
metodológico. Mas todo esse conhecimento só terá eficácia se o professor conseguir 
inseri-lo em sua dinâmica pessoal e articulá-lo com seu processo de desenvolvimento.
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Antonio Nóvoa: "professor se forma na escola“
Não quero tirar a responsabilidade do governo, mas sua intervenção deve se resumir a 
garantir meios e condições.
Qual é a maneira mais eficiente de aprender a ensinar? Voltando a ser aluno? 
Observando? Praticando?
Tudo isso é importante, mas novas práticas de ensino só nascem com a recusa do 
individualismo. Historicamente, os docentes desenvolveram identidades isoladas. Falta 
uma dimensão de grupo, que rejeite o corporativismo e afirme a existência de um 
coletivo profissional. Refiro-me à participação nos planos de regulação do trabalho 
escolar, de pesquisa, de avaliação conjunta e de formação continuada, para permitir a 
partilha de tarefas e de responsabilidades. As equipes de trabalho são fundamentais 
para estimular o debate e a reflexão. É preciso ainda participar de movimentos 
pedagógicos que reúnam profissionais de origens diversas em torno de um mesmo 
programa de renovação do ensino.
Saber trabalhar em grupo, então, é mais uma competência que o professor deve 
ter?
Sim. São as equipes de trabalho que vão consolidar sistemas de ação coletiva no seio 
do professorado.Não se trata de adesões ou ações individuais, mas da construção de 
culturas de cooperação. O esforço de pensar a profissão em grupo implica a existência 
de espaços de partilha além das fronteiras escolares. Trata-se da participação em 
movimentos pedagógicos, da presença em dinâmicas mais amplas de reflexão e da 
intervenção no sistema de ensino. No passado, esses movimentos tiveram um papel 
insubstituível na afirmação social da classe. Hoje, são decisivos para a renovação.
Uma das recomendações da educação moderna é o trabalho interdisciplinar, por 
projetos. Como adquirir prática nessa maneira de ensinar?
O próprio trabalho em equipes pedagógicas pode ser um começo. Se insistirmos na 
produção de um saber profissional, emergente da prática e de uma reflexão sobre ela, 
teremos naturalmente uma produção conjunta. Para isso, a escola tem de organizar 
momentos interdisciplinares de trabalho que não caiam no vazio curricular, mas que 
promovam uma integração dos conteúdos de várias matérias.
Existe algum método na educação continuada que alie todos esses aspectos que 
o senhor preconiza?
Sim, vários programas integram essas preocupações de forma útil e criativa: seminários 
de observação mútua, espaços de prática reflexiva, laboratórios de análise coletiva das 
práticas e os dispositivos de supervisão dialógica, em que os supervisores são 
parceiros e interlocutores. Para além dos aspectos teóricos ou metodológicos, essas 
estratégias sublinham o conceito de deliberação, que por sua vez exige um espaço 
público de discussão. Nele, as práticas e as opiniões singulares adquirem visibilidade e 
são submetidas à opinião dos outros. Ao fazer isso, chama-se a atenção para o 
conjunto de decisões que os professores tomam a cada instante, no plano técnico e 
moral. Em outras palavras, a articulação entre teoria e prática só funciona se não 
houver divisão de tarefas e todos se sentirem responsáveis por facilitar a relação entre 
as aprendizagens teóricas e as vivências e observações práticas
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Antonio Nóvoa: "professor se forma na escola“
Paulo Freire escreveu que a formação é um fazer permanente que se refaz 
constantemente na ação. "Para se ser, tem que se estar sendo", disse ele. O que o 
senhor acha dessa afirmação?
A formação é algo que pertence ao próprio sujeito e se inscreve num processo de ser 
(nossas vidas e experiências, nosso passado etc.) e num processo de ir sendo (nossos 
projetos, nossa ideia de futuro). Paulo Freire explica-nos que ela nunca se dá por mera 
acumulação. É uma conquista feita com muitas ajudas: dos mestres, dos livros, das 
aulas, dos computadores. Mas depende sempre de um trabalho pessoal. Ninguém 
forma ninguém. Cada um forma-se a si próprio.
O estágio deve favorecer a mistura de prática com reflexão?
Sem dúvida. O potencial formador de cada um depende das ponderações feitas com os 
colegas, com quem está sendo observado e com o supervisor. Sem isso, a observação 
transforma-se em exercício mecânico, sem interesse. É essencial estudar os processos 
de organização do trabalho escolar, da gestão das turmas e da sala de aula, bem como 
as formas de utilização dos métodos de ensino e a capacidade de resposta às 
situações inesperadas. As competências para realizar essa análise são individuais e 
coletivas. A pertinência do estágio reside na compreensão da contribuição específica 
dos professores e na identificação da cultura profissional docente.
Como aproveitar melhor a prática de supervisão?
É essencial estimular a produção escrita e divulgá-la. Só a publicação revela o prestígio 
social da profissão e a formalização de um saber profissional docente. Sempre me 
espantei com o fato de haver tantos textos teóricos e metodológicos sobre ensino e 
Pedagogia e tão poucos descrevendo práticas concretas. Se queremos renovar a 
profissão e as estratégias de formação temos de dar visibilidade às práticas. Isso 
começa no período de estágio e continua por toda a vida.
Qual é, na sua opinião, o perfil ideal do professor do século XXI?
Não gosto de fazer futurologia. Acho esse terreno repleto de armadilhas e banalidades. 
A paixão pelo futuro frequentemente significa déficit do presente. Por isso, falo de 
apenas um aspecto: neste século, devido à complexidade do fenômeno educativo, à 
diversidade das crianças que estudam e aos dilemas morais e culturais que seremos 
chamados a enfrentar, teremos de repensar o horizonte ético da profissão. Acredito que 
os próximos anos serão marcados pela instabilidade e pela incerteza. A atitude ética 
não depende só de cada um de nós, mas da possibilidade de uma partilha efetiva com 
os colegas. Precisamos reconhecer, com humildade, que há muitos dilemas para os 
quais as respostas do passado já não servem e as do presente ainda não existem. Para 
mim, ser professor no século XXI é reinventar um sentido para a escola, tanto do ponto 
de vista ético quanto cultural.
Disponível em:
https://novaescola.org.br/conteudo/179/entrevista-formacao-antonio-novoa
Acesso em: 04/11/2019
https://novaescola.org.br/conteudo/179/entrevista-formacao-antonio-novoa