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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13
th
 Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), 
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X 
 
O SERVIÇO SOCIAL NA DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO – 
PERMANÊNCIAS E CONDICIONALIDADES PARA AS MULHERES 
 
 
Soraia Veloso Cintra1 
 
Resumo: Na divisão sócio-técnica do trabalho, o Serviço Social está inserido desde a década de 
1930 e regulamentado como profissão desde a década de 1950 no Brasil. Trata-se de profissão que 
desde a sua ‘criação’ foi feminina por excelência – de e para mulheres. Mas quais seriam as 
condicionalidades para as mulheres permanecerem na profissão ao longo de suas oito décadas de 
existência? Na divisão sexual do trabalho qual o impacto desta realidade para as mulheres? 
 
Palavras-chave: Mulheres. Trabalho. Serviço Social. 
 
 
Introdução 
O Serviço Social aparece como profissão no final do século XIX na Europa e tem suas bases 
na Sociedade de Organização da Caridade, órgão responsável pela racionalização da caridade em 
países como Bélgica, Inglaterra, França entre outros, que reúne ações da igreja católica financiadas 
pela burguesia. No Continente Americano, a profissão terá destaque a partir de 1899 quando o 
primeiro curso é organizado nos Estados Unidos. Posteriormente em 1925 e 1929, o Chile organiza 
suas primeiras escolas, sendo que a segunda tem influência também da igreja católica. 
A nova profissão começa a aportar no Brasil na década de 1930, em um país marcado pelas 
expressões da Questão Social ao final da 1ª República e, posteriormente, no período da ‘ditadura’ 
de Getúlio Vargas (1882-1954) que ficou no poder por 15 anos, entre 1930 e 1945. Inicialmente 
foram realizados encontros de curta duração até a organização do primeiro curso em São Paulo em 
1936 e o segundo no ano seguinte no Rio de Janeiro, ambos com duração inicial de dois anos e, 
posteriormente de três. O que marca profundamente a profissão é a presença exclusiva das mulheres 
desde a formação da primeira turma de São Paulo, todas oriundas da igreja católica e da burguesia 
paulistana. 
São as mulheres que até hoje formam o grande contingente de mão de obra na profissão 
assistente social, com presença majoritária nos curso de graduação e, consequentemente no 
exercício profissional. 
Este artigo apresenta reflexões oriundas do exercício profissional docente da autora como 
titular da cadeira de Fundamentos Teóricos e Éticos do Serviço Social e de estudos realizados no 
 
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 Soraia Veloso Cintra é doutora em Serviço Social; docente da Universidade Federal de Uberlândia (MG), Ituiutaba 
(MG), Brasil. 
 
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pós-doutorado que demostram que a presença feminina é constante e marcante. O artigo traz, 
portanto, duas questões para reflexão: quais seriam as condicionalidades para as mulheres 
permancerem na profissão ao longo de suas oito décadas de existência? E na divisão sexual do 
trabalho qual o impacto desta realidade para as mulheres? 
 
Mulheres, igreja e serviço social 
 
Em 1932, o Brasil recebeu a visita de M.lle Adéle de Loneux, senhora belga que, por meio 
de conferências e palestras, em São Paulo e no Rio de Janeiro, lançou a ideia do Serviço 
Social, como era visto na Europa naquela época. Ao regressar à Bélgica, levou duas 
brasileiras, Maria Kiehl e A lbertina Ramos, que se formaram na Escola de Serviço Social 
de Bruxelas. Ao voltar, em 1936, essas duas assistentes sociais fundaram a Escola de 
Serviço Social de São Paulo, cu ja primeira diretora foi Odila Cintra Ferreira. No ano 
seguinte, dona Stella de Faro, com o apoio do Cardeal Dom Sebastião Leme, organizou no 
Rio de Janeiro, o Instituto Social, tendo sido nomeada diretora Mlle. Germaine Marsaud. 
(VIEIRA, 1978, p. 141). 
 
 
No século XX, o movimento econômico impulsionou a mulher ao mercado de trabalho 
e à escolarização. Elas passaram a frequentar em maior número as escolas primárias; aos poucos, 
conquistaram espaços nas secundárias e abriram caminho rumo aos cursos superiores. Segundo 
Saffioti (1976), antes de 1930, porém, foram poucas as mulheres que conseguiram ingressar e 
diplomar-se no ensino de segundo grau e no superior. Neste último, em particular, as mulheres 
conseguiram entrar em carreiras que os homens não se sentiam compelidos a exercer ou que foram 
desvalorizadas com o tempo, como o magistério e o farmacêutico que, ao transformar-se num 
vendedor de remédios (e não mais o responsável pela fabricação dos mesmos), registrou uma 
redução acentuada da presença masculina e a mulher conquistou espaço nesta área. 
Em abril de 1931 foi promulgado o decreto 19.980 que remodelou o ensino secundário 
brasileiro. A partir desse ano, o período escolar aumentou para sete anos, sendo cinco de educação 
fundamental e dois de especialização profissionalizante. “Tal reforma beneficiou muito a população 
feminina, pois promoveu a penetração do elemento feminino no ensino secundário, através do qual, 
anos mais tarde, ela poderia ter acesso ao ensino superior”. (Lima, 1991, p. 43). Até 1930, as 
mulheres brasileiras continuavam fora das carreiras universitárias. Houve algumas exceções nas 
Faculdades de Medicina e de Direito, mas com grande protesto por parte de uma sociedade que 
acreditava que a mulher deveria exercer apenas o papel de esposa, mãe e dona de casa. 
 
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Alguns anos antes, a Igreja Católica havia percebido a necessidade de participação mais 
ativa da sociedade e baseada nas encíclicas papais Rerum Novarum (1891) e Quadragésimo Anno 
(1931) passou a incentivar a participação dos fiéis em movimentos leigos, trabalhando pelos menos 
favorecidos. Esse incentivo facilitou a participação das mulheres brasileiras no movimento católico 
leigo. Diante desse novo quadro, surge no Brasil uma nova profissão, o Serviço Social, cuja 
presença feminina é majoritária desde os primeiros anos. 
As primeiras escolas de Serviço Social datam do final do século XIX na Europa e nos 
Estados Unidos. Na Bélgica, país com o qual o Brasil mais se aproximou na formação so cial, a 
primeira escola foi organizada em 1920. Na América Latina, o primeiro curso de Serviço Social foi 
implantado no Chile, em 1925, mesmo país que registrou a segunda em 1929, e no Brasil em 1936, 
na cidade de São Paulo, e, em 1937, no Rio de Janeiro. 
Desde sua origem nos Estados Unidos, Europa e América Latina, mais precisamente no 
Brasil, a presença de mulheres nos cursos de Serviço Social foi incentivada, ainda que a sociedade 
resistisse ao trabalho feminino. Um bom exemplo é o título do folheto que divulgava o curso em 
1940: Uma profissão feminina... já pensou no Serviço Social? 
A entrada do Serviço Social no Brasil tem um direcionamento da Igreja Católica aliada à 
burguesia e ao Estado (como ocorreu na Europa) e somente moças católica s, indicadas por suas 
paróquias, poderiam fazer o curso. A primeira escola organizada em 1936 recebeu apenas mulheres, 
algumas que haviam feito magistério como Helena Iracy Junqueira (1913-1997) e Nadir Gouvêa 
Kfouri (1913-2011). Seus depoimentos registrados em teses e outros documentos demonstram que o 
trabalho da mulher não era realmente bem visto. “Nessa época o trabalho da mulher era encarado 
pela sociedade com certos preconceitos: trabalhar só quando houvesse muita necessidade, mesmo 
porque se considerava que o trabalho da mulher tirava o emprego dos chefes de família, afirmou 
Junqueira”. (MARQUES, 1994, p. 164). 
A história de implantação e desenvolvimento do Serviço Social caminham juntas com a 
história das próprias mulheres que organizaram o curso e também foram suas primeiras alunas. É o 
caso de Odila Cintra Ferreira (1899-1982),filha de fazendeiro de café da região de Bragança 
Paulista, interior de São Paulo, que foi estudar na Europa. Em 1926, matriculou-se na Escola 
Normal Social de Paris, que em suas palavras “preparava pessoas para trabalhar com operários” 
(Roy, 1983, p. 33) e, três anos depois, entrou para a Escola de Estudos Sociais do Instituto Católico 
de Paris. 
 
 
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Conheci um padre jesuíta em Paris, e, conversando com ele, contei o meu interesse em ir 
para Sorbonne. Ele me disse: ‘a senhora se interessa pela parte social?’ Respondi que me 
interessava. Então ele me disse: [...] ‘Entre para a Escola Normal Social’. Eu disse que não 
gostava de escolas de mulheres, porque sempre fu i aluna de mulheres. Ele me disse: ‘Mas 
essas são extremamente inteligentes e cultas!’. Foi aí que entrei no social. (Depoimento de 
Odila Ferreira, Roy, 1983, p. 34) 
 
Na França, intensificou seus estudos, mas não chegou a se formar assistente social, tendo 
voltado ao Brasil devido à morte da irmã. Nesta época, já participa do movimento católico, e 
participou do curso que as freiras de Santo Agostinho (Des Oiseaux) ofereceram às suas ex-alunas 
para que desenvolvessem trabalhos sociais. Participou tão ativamente que desse curso culminou a 
fundação do Centro de Estudos e Ação Social (CEAS) em 1932. “As freiras a contrataram para um 
período de três meses para ministrar um curso intensivo de formação social” (Roy, 1983, p. 37). A 
pessoa que veio para desenvolver o curso foi Mlle. Adèle de Loneaux, professora na Escola Social e 
na Escola Normal Social, ambas em Bruxelas (Bélgica). Cerca de 50 mulheres, entre ex-alunas do 
Santo Agostinho, do colégio Sion e demais interessadas fizeram o curso. A partir desse primeiro 
contato, Albertina Ramos, conhecida como Baby Ramos2 (1905-1992) e Maria Kiehl3, ambas 
descendentes de alemães receberam bolsas de estudo para fazer o curso de Serviço Social na 
Bélgica e ajudar, posteriormente, sua implantação no Brasil. 
 
Maria Kiehl e Baby Ramos fo ram estudar na Es cola de Bruxelas. Baby porque gostava 
muito de trabalho social e queria realizar um trabalho na fazenda dela, e Maria com a bolsa 
de estudos para a formação de assistência social. Além d isso, antes das duas terem partido 
para lá, o grupo de alunas do curso resolveu fundar uma entidade que continuasse 
despertando interesse pelo trabalho social. Então fundamos o Centro de Estudos e Ação 
Social, que era uma entidade de pouca repercussão, mas que teve uma ação muito grande, 
aqui no Brasil. (Depoimento de Odila a Roy, 1983, p. 39). 
 
A partir da experiência vivenciada por Odila na Europa e dos trabalhos realizados pelo 
CEAS em vários bairros de São Paulo principalmente com mulheres operárias, o Serviço Social 
começou a ganhar forma no Brasil. Odila foi a primeira presidente do CEAS e teve ao seu lado mais 
cinco mulheres que ajudaram a constituir o que viria a ser a primeira Escola de Serviço Social do 
Brasil: Eugênia da Gama Cerqueira (secretária), Albertina Ambrust (tesoureira), Alice Meireles 
 
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 Assistente social formada na École Catholique de Service Social de Bruxelas (1932). Participou da fundação do CEAS (Centro de Estudos e Ação 
Social). Baby, como era conhecida, trabalhou com serviço social voltado à infância e educação popular. Trabalhou no Instituto de Biologia Infantil no 
Rio de Janeiro e, em São Paulo, no Instituto de Menores e no Serviço Social do Estado. Era neta do “Rei do Café”, de Ribeirão Preto. O pai era 
engenheiro e a mãe dona de casa. Morreu em 13 de outubro de 1992. Sua vida foi marcada pela simplicidade e pela dedicação ao Serviço Social. “Em 
1910, seu avô (que veio da Alemanha) tinha 33 fazendas em Ribeirão Preto e Sertãozinho. Tais fazendas tinham 8 mil colonos” (Lima, 1991, p. 51) 
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 Assistente social formada na École Catholique de Service Social de Bruxelas (1932). Dedicou-se a Escola de Serviço Social de São Paulo ajudando 
a implantar o Serviço Social no Estado e foi a primeira diretora técnica da Divisão de Assistência Social, vinculada a Secretaria de Justiça do Estado. 
Era de uma família onde todos trabalhavam inclusive as mulheres. Maria Kiehl foi homenageada em 1959 pelo Diretório Acadêmico da Escola de 
Serviço Social de Niterói por ter ajudado no planejamento e organização da escola. 
 
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Reis (auxiliar da presidente), Mary Quirino dos Santos (auxiliar da secretária) e Nair de Oliveira 
Pirajá (auxiliar da tesoureira). As integrantes do CEAS trabalharam nos quatro anos que se 
seguiram até a fundação da Escola de Serviço Social em São Paulo em 1936 e Odila foi sua 
diretora. Na sua gestão se formaram as primeiras assistentes sociais brasileiras: Heloísa Tapajóz de 
Morais, Anna Rosa Camargo Moura, Dina Bartolomeu, Yolanda Maciel, Lucy Pestana Silva, 
Guiomar Urbina Telles, Haütil Prado, Maria José da Silveira, Nair de Oliveira Coelho, Nadir 
Gouvêa Kfouri, Helena Iracy Junqueira, Fátima Vasta de Souza, Maria Ignez de Barros Penteado e 
Maria Amélia de Andrade Reis. 
 
Serviço Social: profissão ou vocação? 
 
Na divisão social do trabalho, é importante pensar como se deu o desenvolvimento do 
Serviço Social no Brasil para entender a permanência das mulheres nesta profissão. 
Com forte apelo da igreja católica, as mulheres se dedicaram aos trabalhos sociais e, muitas 
vezes, o incentivo ao curso de Serviço Social ocorria pela valorização da vocação e, não 
necessariamente, por uma profissão. Diversos estudos apontam que as mulheres burguesas 
poderiam trabalhar até o casamento e, posteriormente, se dedicariam aos trabalhos sociais, estes 
voluntários, sem ganhos. Vieira (1973, p.335) levantava esta questão: “Algumas ocupações 
humanas são resultantes de uma ‘vocação’ outras são consideradas como ‘profissão’. Ainda podem 
ser uma e outra: uma vocação e ao mesmo tempo uma profissão”. 
 
O Serv iço Social parece ter sido considerado desde o início como uma vocação, e isto 
porque era uma atividade voluntária exercida por pessoas que ‘desejavam se dedicar ao 
serviço do próximo, principalmente dos pobres e dos destituídos de sorte’. O Serviço Social 
exige do assistente social uma disposição especial de amor ao próximo; como o médico, o 
enfermeiro, o educador, o assistente social se debruça sobre as misérias se as dificuldades 
humanas; é preciso coragem para não desanimar diante da amplidão ou gravidade dos 
problemas; paciência para escutar o cliente e esperar pelos resultados; amor para aceita-lo 
como é, por mais miserável que seja; ideal para ver em cada atividade, por mais humilde 
que seja, um meio para o reerguimento do cliente; fé na natureza humana redimida pelo 
Salvador. Mais do que qualquer outro trabalho, com os seres humanos, o Serviço Social 
não pode dispensar uma vocação, um ‘chamado’, um ‘convite’. É seguramente seu aspecto 
mais belo, pois idealiza, eleva e transforma as ativ idades técnicas, despindo -as do 
materialis mo e dando-lhes um significado humano. (VIEIRA, 1973, p. 336). 
 
Por valorizar a vocação em detrimento da profissão, o Serviço Social registrou ao longo de 
sua trajetória, remuneração inferior ao de outras profissões, desvalorização dentro de organizações 
sociais (governamentais e não governamentais) e uma luta constante para se fazer presente no 
 
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mercado de trabalho. As próprias assistentes sociais pioneiras foram em busca de atualização, 
saindo do Brasil rumo aos Estados Unidos para conhecer o Serviço Social de lá. Ao voltarem, 
traziam na bagagem novos olhares, novas técnicasque foram aplicadas e replicadas. Também foram 
responsáveis pelo desenvolvimento da graduação em nível universitário (1953) e, pela pós-
graduação ainda na década de 1970. 
 
No in ício, ministrando um curso de dois anos, logo ampliado para três, as escolas de 
Serviço Social aceitavam alunos com certificado do curso ginasial ou equivalente e, apesar 
de existir em São Paulo e no Rio de Janeiro duas escolas para o sexo masculino, o 
recrutamento era quase que integralmente feito entre o sexo feminino. (VIEIRA, 1973, p. 
338). 
 
 
O “recrutamento” feminino citado por Vieira (1973) permanece até os dias atuais. O Serviço 
Social como a Psicologia e a Pedagogia atraem um número expressivo de mulheres. Na divisão 
social do trabalho, essas profissões são rotuladas como profissões femininas, o que ainda em pleno 
Século XXI pode ter a distinção de desvalorização. Desvalorização esta que se reflete nas 
contratações, no exercício de cargos em gestão e na própria remuneração. Ainda assim, o número de 
profissionais assistentes sociais do sexo feminino tende a crescer. “A mulher era vista como quem 
possuía uma vocação natural para as tarefas educativas e caridosas. Por ser o Serviço Social uma 
profissão destinada em sua origem às mulheres, as características da profissão nesse período se 
aproximavam das atribuições destinadas às mulheres” (CRAVEIRO, MACHADO, 2011, s/p). A 
vocação, portanto estaria destinada às mulheres (que poderiam conciliar afazeres voluntários e 
família), enquanto os homens se encarregariam das profissões mais sérias, àquelas que realmente 
trariam um ganho financeiro. O medo do desconhecido, ou das chamadas profissões femininas 
poderia afastar os homens do Serviço Social. 
Mas o que explicaria a presença permanente de mulheres nesta profissão? 
Nos primeiros anos do século XXI, houve uma expansão considerável de cursos de 
graduação em Serviço Social nas universidades federais e também nas privadas. No caso destas 
últimas, isso ocorreu principalmente na modalidade à distância, o que tem “jogado” no mercado de 
trabalho um número ainda maior de profissionais. Mesmo nesta modalidade, percebe-se a presença 
feminina em maior número do que a masculina. 
No Estado de Minas Gerais, na região conhecida como Triângulo Mineiro, a Universidade 
Federal de Uberlândia (MG), implantou o curso de Serviço Social no município de Ituiutaba em 
2010, com 50 vagas para entrada anual. A cidade foi escolhida para abrigar as expansões 
 
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universitárias do governo federal (junto com Monte Carmelo e Patos de Minas) e desde 2006, 
recebeu 09 cursos, chegando a 11 em 2010, incluindo-se o curso de Serviço Social. Este curso tem 
entrada anual por meio do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), com 50 vagas disponíveis 
para formação de bacharéis em Serviço Social. Analisando a entrada e saída dos/as discentes desde 
2010, pode-se ter uma visão, de como a presença feminina é constante no curso. 
De 2010 a 2017, o curso de Serviço Social da Universidade Federal de Uberlândia, registrou 
a entrada de 359 pessoas, sendo 318 mulheres e 41 homens, conforme pode ser observado na tabela 
a seguir: 
 
Tabela 1 – Entrada de mulheres e homens no curso de Serviço Social 
Ano Total de discentes Mulheres Homens 
2010 30 26 04 
2011 48 47 01 
2012 46 40 06 
2013 43 36 06 
2014 50 46 04 
2015 46 40 06 
2016 53 46 07 
2017 44 37 07 
TOTAL 359 318 41 
Fonte: Universidade Federal de Uberlândia 
 
 
Como é possível perceber na tabela, o número de mulheres é sempre superior ao dos homens 
em todos os anos e a permanência até a formatura delas também. Entre 2010 e 2013, o curso 
recebeu 149 mulheres e 17 homens. Esse recorte é necessário para percebermos a presença 
feminina. A primeira formatura da Universidade Federal de Uberlândia aconteceu em 2014 e 
sucessivamente em 2015, 2016 e 2017, totalizando 91 mulheres formadas. Neste mesmo período, 
oito homens se formaram. E, em 2017, uma mulher e um homem da primeira turma concluíram 
pós-graduação – ela se tornou mestre em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista, ele, 
mestre em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia. 
 
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O olhar ainda pode ser voltado para o perfil desse grupo de mulheres que não é homogêneo. 
O curso tem atraído desde as jovens que concluíram o Ensino Médio há pouco tempo, quanto 
mulheres mais velhas que voltam a estudar para realizar o desejo de ter curso superior. Atualmente, 
a mulher mais velha do curso tem 65 anos. São histórias e mais histórias, como irmãs que 
estudaram ou ainda estudam juntas; mães e filhas que também estudaram na mesma sala (há um 
caso da mãe que vai se formar antes da filha); jovens que veem na universidade a possibilidade de 
mudança de vida. Mulheres ‘donas de casa’, faxineiras, diaristas, professoras, vendedoras, 
atendentes de telemarketing, cantoras, representantes de produtos de beleza, entre outras. 
Naturalmente, a presença feminina também é registrada na pós-graduação. Entre 1995 e 
2014, 285 dissertações e 135 teses foram defendidas no Programa de Pós-graduação em Serviço 
Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista Júlio de 
Mesquita Filho, campus de Franca (SP)4. As/os egressos do referido programa estão trabalhando em 
diversas partes do país, principalmente na docência (com predominância na região Sudeste e 
destaque para os Estados de São Paulo e Minas Gerais). As mulheres são a maioria no programa, 
sejam assistentes sociais ou não. 
Do total de 135 teses defendidas no período estudado, foram identificadas 102 mulheres e 22 
homens entre assistentes sociais e outros profissionais. Como a pesquisa fora realizada somente 
com assistentes sociais, identificou-se 77 assistentes sociais, sendo 72 mulheres e 05 homens. 
É notória a maior presença feminina quando comparada com a masculina. É uma 
característica da profissão desde seu primeiro curso de graduação. A maior presença nos cursos de 
pós-graduação, portanto é um reflexo da formação universitária. As assistentes sociais que passaram 
pelo programa de pós-graduação da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Unesp / Franca – 
nível doutorado, representam 93,50%, enquanto os homens, 6,50%. E das 72 mulheres que fizeram 
o doutorado, 59 estão na docência, acumulando ou não outros cargos e/ou funções. 
 
Conclusão 
É na divisão social do trabalho, sexualizada pelo sistema capitalista que as mulheres estão 
inseridas. O curso de Serviço Social não é um curso que garante status ou acumulação de riquezas. 
Ainda sim, mulheres são atraídas para ele e tem exercido a profissão. 
A formação acadêmica e profissional é pautada pelas demandas próprias do sistema 
capitalista e por isso mesmo, profissionais formados/as em Serviço Social atuarão na garantia dos 
 
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 A autora do presente artigo realizou estágio pós -doutoral na referida universidade e os dados apresentados são da 
pesquisa realizada no período. 
 
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direitos necessários por causa das demandas oriundas das expressões da questão social. Não é um 
trabalho fácil, pois fatores externos podem muitas vezes impedir que a atuação profissional garanta 
o direito daqueles que dela necessitam. E a busca pela qualificação torna-se constante. 
O curso continua majoritamente feminino. Desde sua origem até os dias atuais o perfil 
profissional não mudou e os homens, apesar de se fazerem presentes, são sempre em número 
reduzido. É da própria história e origem da profissão– portanto, é movimento que se repete. 
É interessante destacar a presença feminina desde a origem do primeiro curso no Brasil na 
década de 1930, período em que muito se afirma que o trabalho da mulher não era aceitável. Mas 
algumas mulheres encontraram no curso de Serviço Social justamente o caminho para o trabalho 
remunerado, para o alcance da autonomia feminina, ainda que existam críticas à atuação 
profissional nas primeiras décadas do desenvolvimento do Serviço Social no Brasil. Mas esta 
estratégia, que pode ser notada em outras profissões, é um caminho que se observado atentamente 
está sempre se repetindo. 
Esta permanência pode ser ao mesmo tempo boa e ruim; faz parte das contradições próprias 
do sistema capitalista. O mesmo sistema que chamou às mulheres ao trabalho ao longo de oito 
décadas, mas que não garante remuneração adequada. É o mesmo sistema que mantém uma 
profissão que trabalha com problemas sociais oriundos da desigualdade acirrada. Sistema este que 
ajudou a gestar a profissão e que lhe atribui uma identidade, ainda que a própria profissão lute 
contra ela. 
Referências 
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do trabalho. Campinas: Cortez/Editora da Unicamp, 1997. 
 
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Instituto de Serviço Social, hoje Faculdades Paulista de Serviço Social São Paulo e de São Caetano 
do Sul. In: Revista Serviço Social e Sociedade., São Paulo, n. 103, p. 591-595, jul./set. 2010. 
 
BLAY, Eva Alterman. Mulher, escola e profissão: um estudo do ginásio industrial feminino na 
cidade de São Paulo. São Paulo: CERU e FFLCH/USP, 1981. (Coleção Textos 1). 
 
CRAVEIRO, A. V., MACHADO, J.G.V. A predominância do sexo feminino na profissão do 
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http://www.uel.br/eventos/gpp/pages/arquivos/jessica.pdf. 
 
LIMA, V.L.A.F.M. O início do Serviço Social no Brasil: um feminismo cristão. Dissertação de 
mestrado apresentada a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1991. 
 
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MARTINELLI, Maria Lúcia. Serviço Social, identidade e alienação. São Paulo: Cortez, 2006. 
 
MARQUES, A. Helena Iracy Junqueira: a construção de uma mentalidade em Serviço Social. Tese 
de Doutorado apresentada a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1994. 
NEVES, N.P. Nadir Gouvêa Kfouri: o saber e a prática do Serviço Social no Brasil (1940-1960). 
Tese de Doutorado apresentada a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1991. 
ROY, M.T. Entrevista com Odila Cintra Ferreira. In: Revista Serviço Social e Sociedade nº 12 
(Número especial em comemoração aos 50 anos do Serviço Social no Brasil). Editora Cortez: São 
Paulo, 1983. 
SAFFIOTI, H.I.B. A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. Petrópolis: Vozes, 1976. 
YASBEK, M. C. Estudo da evolução histórica da Escola de Serviço Social de São Paulo o período 
de 1936 a 1945. Dissertação de Mestrado apresentada a Pontifícia Universidade Católica de São 
Paulo. São Paulo, 1977. 
 
Social work in the social division of labor - permanence and conditionality for women 
 
Abstract: In the socio-technical division of labor, Social Service has been inserted since the 1930s 
and regulated as a profession since the 1950s in Brazil. It is a profession that from its 'creation' was 
feminine par excellence - to and for women. But what are the conditionalities for women to remain 
in the profession over their eight decades of existence? In the sexual division of labor, what is the 
impact of this reality on women? 
 
Keywords : Women. Job. Social Service.

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