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Temática 1 - Seção 2 DIREITO PENAL

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUÍZ DE DIREITO DA ...ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CONCEIÇÃO DO AGRESTE/CE
José Percival da Silva, também conhecido como Zé da Farmácia, já qualificado na denúncia, vem, por seu advogado, com fundamento no (art. 514, caput, do CPP / art. 55, caput, da Lei 11.343/06), oferecer 
DEFESA PRELIMINAR / DEFESA PRÉVIA
com fundamento no artigo 514 do CPP pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
I. DOS FATOS
No dia 04 de fevereiro de 2018, o denunciado, que é vereador e presidente da câmara de vereadores desta cidade estava assistindo à Sessão da Comissão de Finanças e Contratos da Câmara quando foi preso em flagrante pela prática do delito de corrupção passiva, previsto no artigo 317, do Código Penal.
Em ação autônoma de impugnação o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, de maneira unânime, concedeu a ordem de Habeas Corpus em favor do Zé da Farmácia, relaxando sua prisão, por entender que flagrante foi preparado. 
Entretanto, menos de uma semana após ser libertado, Zé foi surpreendido pela visita de um Oficial de Justiça em sua casa que efetuou a entrega de um documento e o avisou que ele estava sendo notificado a apresentar sua defesa no prazo de 15 (quinze) dias, tendo em vista denúncia do Ministério Público, fundamentada nos artigos 288 e 317, na forma do art. 69, todos do Código Penal.
II. DA INÉPCIA DA DENÚNCIA EM RAZÃO DA FALTA DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA ATRIBUÍDA AO ACUSADO: 
 
Inicialmente verifica-se que a presente denúncia do órgão acusatório é inepta e por consequência deverá ser rejeitada, pois não houve uma individualização de maneira detalhada da conduta de cada agente, fato que torna impossível o exercício constitucional da ampla defesa e do contraditório.
O código de processo Penal é claro em relação ao tema e nos apresenta, em seu artigo art. 573, § 1º, a seguinte redação:
Art. 395.  A denúncia ou queixa será rejeitada quando
I - for manifestamente inepta; 
 II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou      
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal
A caracterização de inépcia se verifica quando a peça acusatória não apresenta os elementos especificados no artigo 41 do Código de Processo Penal. 
Art. 41, Código de Processo Penal: 
A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
Tendo isso em mente o que se percebe é que a deficiência narrativa na peça acusatória inviabiliza por completo o exercício constitucional da ampla defesa e do contraditório. Nesse sentido, seguem esclarecimentos doutrinários sobre a narração dos fatos, pelo órgão acusatório:
 Configura-se a inépcia da peça acusatória quando não se prestar aos fins aos quais se destina, vale dizer, não possuir a menor aptidão para concentrar, concatenadamente, em detalhes, o conteúdo da imputação, permitindo ao réu a exata compreensão da amplitude da acusação, garantindo-lhe, assim, a possibilidade de exercer o contraditório e a ampla defesa. Dentre outros fatores, são geradores de inépcia: a) a descrição de fatos de maneira truncada, lacunosa ou em desacordo com os dados constantes do inquérito. (NUCCI, 2008, p. 706)
Note-se que o IRMP, sem pormenorizar individualmente a conduta do Acusado, atribuiu-lhe responsabilidade criminal por integrar associação criminosa, bem como ser sujeito ativo do delito de corrupção passiva. 
As imputações das práticas criminosas reclamam, evidentemente, que a acusação narre a presença dos elementos objetivos dos aludidos crimes. Depreende-se da denúncia que a Acusação se furtou dessa obrigação. Nela, não restou demonstrado, ao menos minimamente, a presença desses elementos.
 Ou seja, em momento algum a inicial especifica quais teriam sido as condutas praticadas pelo Acusado que se enquadrariam nos supracitados tipos penais. Pelo contrário. Não há qualquer narração fática atribuída ao Acusado.
Portanto, não restam dúvidas de que a presente denúncia é absolutamente genérica.
Conclui-se, ante o déficit narrativo da peça de acusação, que a Acusação apenas presumiu que o Acusado teria participado das citadas práticas criminosas.
 Não se pode admitir imputações desta gravidade, sem um mínimo de lastro de autoria e materialidade. Por isso é necessária a individualização de sua conduta com as suas especificidades. E, desta obrigação, a Acusação não se desincumbiu.
Logo, a denúncia é inepta e, assim, não permite o exercício amplo de defesa, repita-se. Neste sentido, segue entendimento dos Tribunais: 
STF: EMENTA: HABEAS CORPUS. DENÚNCIA. ESTADO DE DIREITO. DIREITOS FUNDAMENTAIS. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP NÃO PREENCHIDOS. 1 - A técnica da denúncia (art. 41 do Código de Processo Penal) tem merecido reflexão no plano da dogmática constitucional, associada especialmente ao direito de defesa. Precedentes. 2 - Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito. 3 - Violação ao princípio da dignidade da pessoa humana. Não é difícil perceber os danos que a mera existência de uma ação penal impõe ao indivíduo. Necessidade de rigor e prudência daqueles que têm o poder de iniciativa nas ações penais e daqueles que podem decidir sobre o seu curso. 4 - Ordem deferida, por maioria, para trancar a ação penal. (HC 84409, Relator (a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Relator (a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 14/12/2004, DJ 19-08-2005 PP-00057 EMENT VOL-02201-2 PP-00290 RTJ VOL-00195-01 PP-00126).
Diante dos argumentos aqui apresentados, repete-se, há um claro vício processual na peça acusatória inicial, passível de nulidade absoluta. 
[...] As exigências relativas à ‘exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias’, atendem à necessidade de se permitir, desde logo, o exercício da ampla defesa. Conhecendo com precisão todos os limites da imputação, poderá o Acusado a ela se contrapor o mais amplamente possível, desde, então, a delimitação temática da peça acusatória, em que se irá fixar o conteúdo da questão penal. Mas, de outro lado, a correta delimitação temática, ou imputação do fato, presta-se, também, a viabilizar a própria aplicação da lei penal, na medida em que permite ao órgão jurisdicional dar ao fato narrado na Acusação a justa e adequada correspondência normativa [...]. (OLIVEIRA, 2008, p. 144/145.)
Por todo o exposto, requer-se a rejeição da denúncia pela violação ao art. 395, I do CPP. A inépcia resta clara ao se ler a denúncia, onde não houve a individualização adequada das condutas atribuídas ao Acusado.
II. DA AUXÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL – AUXÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATEIALIDADE DO FATO:
Como ponto inicial de discussão é importante conceituarmos justa causa como indícios mínimos de autoria e de materialidade do fato criminoso. Posto isso, ao analisarmos a peça acusatória, o que se percebe é que Zé da Farmácia está sendo acusado sem nem ao menos existir indícios mínimos de que ele concorreu para a prática de um crime ou pior de que pelo menos tenha existido um crime. 
Sobre o interesse de agir no processo penal, ensina Norberto Avena (Processo Penal, p. 168. 2017): 
“O interesse de agir concerne à presença dos elementos mínimos que permitam ao juiz, ao refletir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, concluir no sentido de que se trata de acusação factível. Tais elementos consistem nos indícios de autoria de que o imputado realmente é autor ou partícipe do fato descrito, bem como na prova da existência do crime imputado. No âmbito da ação penal, este lastro probatório mínimo constitui o fumus boni iuris – aparência do direito à condenação invocado pelo titular da ação penal ao deduzi-la em juízo com vistas a desencadear o jus puniendi do Estado. Ausente a sua demonstração, não será possível ao magistrado verificar a plausibilidadeda acusação, devendo, também neste caso, rejeitar a inicial acusatória com fundamento no art. 395, III, do CPP (falta de justa causa para a ação penal).” 
Destarte, a denúncia também merece rejeição por ausência de justa causa, desta vez com espeque no art. 395, III, do CPP. 
II. DOS PEDIDOS
Ante o exposto reque que a denúncia do órgão acusatório seja rejeitada, nos termos do artigo 395, I e III do CPP.
Nestes termos em que, 
pede e espera deferimento.
Conceição do Agreste/CE
02 de maio de 2018
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Advogado (a)
OAB-xxxxx

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