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Em torno da mesa

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EM TORNO DA MESA 
 
1. O ambiente 
 O ingresso no século XXI apresentou-nos um ambiente de mudanças e 
turbulência, em que a incerteza é presença constante para todas as organizações 
em seus processos de tomada de decisão, gerando uma interdependência jamais 
vista entre as áreas e as pessoas que nelas atuam. Essa interdependência objetiva 
favorecer a interação entre organizações, indivíduos e grupos, em um contexto 
cada vez mais diversificado de relações de trabalho. 
 Espera-se do executivo que deverá conduzir as organizações do futuro, as 
seguintes qualidades: 
 
 ter uma visão estratégica; 
b) preocupar-se com a administração dos Recursos Humanos; 
c) ser um permanente Negociador na resolução de conflitos.
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Nesses ambientes de elevada interdependência, a colaboração e a construção de 
processos participativos são características básicas necessárias à execução de tarefas e 
obtenção de resultados, uma vez que é grande a possibilidade de ocorrerem conflitos. 
Os conflitos podem ter uma carga desmotivadora e destrutiva dentro das 
organizações e nas relações com os agentes do ambiente externo. Abordagens 
inadequadas no trato desses conflitos podem agravá-los, da mesma forma que podem se 
tornar fatores de inovação e criatividade se adequadamente tratados. 
Perceber os sintomas nas situações de conflito, conhecer as bases do poder 
existente e encaminhar negociações são habilidades necessárias aos profissionais que 
querem se harmonizar com esses tempos de incerteza e descontinuidade. 
Assim, enquanto os conflitos ocorrem naturalmente, por força de divergências 
naturais entre as pessoas, a negociação resulta de uma ação deliberada, em que se busca 
uma posição de equilíbrio. O grande desafio é conviver construtivamente com as 
energias das partes envolvidas e buscar encontrar acordos. 
 
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2. Histórico 
Sete marcos históricos podem ser considerados como fundamentais para o 
desenvolvimento de novos ciclos relacionados à forma de se negociar: 
 
a) Pré-história 
b) Antigüidade oriental 
c) Antigüidade ocidental 
d) Idade média 
e) Revolução industrial 
f) Mundo polarizado 
g) Interdependência global 
 
O período da pré-história se localiza no tempo entre o aparecimento do homem e o 
surgimento da escrita. Naquela época o homem aprendeu a usar o fogo, a domesticar os 
animais e a produzir seus próprios alimentos. Aprendeu a utilizar a linguagem como 
meio de comunicação, a manifestar seus sentimentos e emoções através da pintura e da 
cerâmica e a organizar-se em grupos. 
Transformações geológicas e climáticas levaram os rios a transbordar e fertilizando 
suas margens e permitindo o cultivo. Ao semear e colher, o homem realizava uma das 
mais importantes revoluções: a revolução agrícola. Através da agricultura e da criação 
de gado, o homem tornou-se sedentário, fixando-se em um território. Gerou excedentes 
alimentares que precisavam ser armazenados. 
Surgiram os clãs – grupos de famílias de mesma descendência. Os grupos 
organizaram-se em aldeias, através de alianças, em um sistema comunitário primitivo. 
O poder individual, a princípio, e o poder grupal, posteriormente, eram fontes de 
manutenção da sobrevivência. 
Devido ao crescimento populacional e meios de produção insuficientes para 
sustentar o surto demográfico, assim como a limitação de territórios férteis, alteraram-se 
 
1 Estudo da Columbia University Graduate School of Business e Korn/Ferry 
International. 
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as relações sociais. Surge a escassez como um fator de desintegração e uma das causas 
básicas de competição e de ocorrência de conflitos. 
A divisão de terras trouxe a propriedade privada, território conquistado na maioria 
das vezes pelo uso da força, cujo controle assegurava aos seus detentores o poder. Para 
mantê-lo, os indivíduos faziam uso de diversos tipos de dissuasão. Por meio do poder, 
os mais fortes ficavam com as melhores partes da terra. Surgem as disparidades sociais, 
e os clãs, unidos por necessidades compartilhadas de sobrevivência, faziam alianças, 
com o objetivo tanto de preservar os territórios ameaçados quanto de empreender novas 
conquistas. As alianças mais duradouras tornaram-se tribos; destas formaram-se 
“cidades” e, finalmente, estados. Alguns destes estados tornaram-se potências. 
Os grandes guerreiros, os chefes, os reis fortalecem seu poder e de seu poder pessoal 
surge a autoridade para estabelecer suas próprias regras. Foram concedidos diferentes 
tipos de autonomia, utilizando-se argumentos para obter-se o consentimento da outra 
parte, sendo os mais freqüentes, o uso de ameaças, sanções, retaliação e destruição. 
Ao final do período Neolítico, entre os anos 5.000 e 4.000 a.C., o homem começou a 
fundir metais, nascendo a metalurgia, terminando a Idade da Pedra. Com a invenção da 
escrita iniciou-se o período da história chamada Idade Antiga ou Período das 
Civilizações: as antigas civilizações orientais e ocidentais, que formaram a base do 
pensamento e da cultura dos países da atualidade, influenciando a forma como hoje, 
povos, raças e também organizações e indivíduos diferentes negociam. 
 
3. Fatores condicionantes 
Diversos fatores condicionantes, como os culturais, geoeconômicos, ideológicos, 
lingüísticos e religiosos influenciam o modo de pensar e agir dos indivíduos. Estes 
fatores condicionantes podem ser percebidos na maneira como os povos de cada 
cultura: 
 
a) Abordam os conflitos e negociam, e os processos baseados nos quais 
raciocinam – alguns mais metodicamente, outros mais emocionalmente; 
b) A forma como percebem os fatos – alguns com uma ótica mais material e 
utilitarista, outros mais espiritual e humanista; 
c) A forma como utilizam o tempo – alguns mais impulsivos, outros mais reflexivos 
e ponderados; 
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d) A forma como manifestam suas posições – alguns mais radicais e polarizadores, 
outros conciliadores, transigentes e pragmáticos; alguns objetivos e diretos, 
outros evasivos ou dispersivos; 
e) A forma como abordam e o tempo dedicado a cada etapa do processo – alguns 
de forma mais ritualística e estruturada, outros de forma mais informal e até 
aleatória. 
É preciso aprender a perceber, sempre. Diferenças de percepção estão entre as 
causas primárias de conflitos. As percepções são sempre objeto de negociação. 
4. Conceito de negociação 
A palavra NEGOCIAÇÃO, que significa a ação de realizar negócios, vem do 
latim negotio, a negação do ócio. Significa uma atividade deliberadamente produtiva, é 
o ócio fecundo, e que deve produzir, além de bons resultados, também satisfação. 
Como conceito de negociação, e segundo David Berlew
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, adotamos que: 
 
Negociação é um PROCESSO em que duas ou mais PARTES, com 
INTERESSES comuns e antagônicos, se reúnem para CONFRONTAR E 
DISCUTIR propostas explícitas com o objetivo de alcançarem um 
ACORDO. 
 
Negociação é um processo, pois ocorre no tempo, estando associado ao passado 
(planejamento), presente (execução) e futuro (controle); é um processo que se origina 
de uma situação anterior de divergência e espera posicionar-se no futuro em uma 
situação de convergência, representando, portanto, movimento. O processo de 
negociação começa com o reconhecimento das partes, de uma situação futura da qual 
elas poderão se beneficiar se chegarem a um acordo (tendo ganhos e 
evitando/minimizando perdas). 
A palavra partes relaciona-se a indivíduos ou grupos com suficiente autonomia e 
delegação para fazer concessões, mover-se em suas posições, para fazer e implementar 
acordos. 
Com interesses comuns e antagônicos significa que as partes estão em 
antagonismo por terem interesses divergentes em seus objetivos e suas prioridades, e 
que por isso, são levadas a adotar movimentos de afastamentoou a exercer pressão. Da 
mesma forma, também significa que, por terem identidade de interesses em comum, 
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serão mobilizadas a motivadas por seus pontos comuns a adotar movimentos de 
aproximação, tentando chagar a um acordo. 
A frase se reúnem para confrontar e discutir propostas explícitas,caracteriza a 
negociação como um processo de comunicação, onde as partes estarão interligadas face 
a face ou indiretamente, sempre interagindo; e que através desse processo estarão 
fazendo e recebendo propostas que serão discutidas. 
Por fim, a palavra acordo implica fazer concessões e sugere a idéia de 
movimento das partes em direção a um ponto diferente das posições originais. 
5. Ética em negociação 
O que é honesto e justo nas negociações é influenciado pelos hábitos culturais e 
está subordinado aos valores da sociedade onde a busca de acordos ocorre. Existem, 
entretanto, padrões de comportamento de negociação que permitem aos negociadores 
utilizarem-se de estratégias e práticas que em outros contextos sociais, outras culturas, 
seriam consideradas fraude. Em tais casos, as partes não estão enganando a outra, cada 
qual reconhece que a outra está desempenhando uma função. 
Em um contexto de negociação não é requerido, por exemplo, que as partes 
façam uma revelação prematura do que estão dispostas a ceder. Entretanto, as pesquisas 
sobre comportamentos éticos em negociação afirmam que um negociador não tem o 
direito de mentir sobre um fato objetivo, de acordo com a maioria dos padrões culturais. 
Alguns negociadores têm a fama de não serem confiáveis, de serem ardilosos e 
manipuladores, o que destrói sua eficácia. Por outro lado, existem negociadores que 
conduzem com sucesso suas negociações durante anos e consolidam uma reputação de 
honestidade e coerência. O aspecto fundamental é saber perceber as fronteiras entre o 
que é eticamente aceitável em negociação e o que não é admissível. 
Nas relações individuais, entre grupos e entre empresas, em que as atitudes são 
pautadas pela busca da eficácia e coerência, o que se procura são relações de longo 
prazo. E nas relações de longo prazo a credibilidade é o que conta. Aos negociadores, 
cabe avaliar os riscos de seu comportamento no que diz respeito aos impactos que 
poderão ter suas atitudes sobre o seu maior patrimônio: a credibilidade. Quanto mais 
estáveis as redes e conexões das quais o indivíduo toma parte, maiores serão os 
 
2 BERLEW, David et al. The Positive Negotiation Program. MA, USA. Situation, 
Management Systems. 
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cuidados para a construção de relações positivas, comportamentos que deverão reforçar 
os valores éticos absolutos e universais. 
A ética em negociações é caracterizada pelo conjunto de valores construtivos 
que levam o negociador a se comportar de modo a valorizar as suas credenciais e 
fortalecer a sua credibilidade. 
 
6. Aprendendo a negociar 
Todas as situações existenciais importam negociação, pois envolvem 
relacionamento humano, compromisso e objetivos comuns, tendo por base o processo 
de conversação. Dessa forma, buscar o acordo, trabalhar o consenso e conquistar a 
cooperação são condições para a convivência e a efetiva vida social. 
Embora a negociação seja um campo atitudinal, apoiando-se nos valores, 
princípios e crenças dos negociadores, compreende uma tecnologia específica, envolve 
estratégias e táticas que dão expressão a esses valores e crenças. 
Assim, temos como pressupostos básicos de uma negociação: 
 
O acordo surge pela via do conflito. 
Todo relacionamento humano envolve certa intensidade tensional que o torna 
potencialmente conflitivo. Assim, prevenir, minimizar e solucionar conflitos é saber 
administrar tensões. 
O bom acordo é aquele em que cada um perde um pouco e todos ganham. 
Quando uma das partes já chega com um “pacote”, isto é, com a “sua verdade”, 
quando caracteriza-se pela intransigência e disposição de não ceder nada e quando não 
se dispõe a dispensar o acidental em favor do essencial, há incitamento ao conflito. 
Espírito de tolerância e saber renunciar significam reconhecer as desigualdades, ou seja, 
o fato de que todos são diferentes, assim como diferentes são as experiências de vida e 
as situações e, como tal, diferentes as motivações e interesses. 
 
Cenários para negociação 
A eficácia do processo de negociação pede que se considere alguns aspectos 
conforme os cenários apresentados a seguir: 
 
Primeiro cenário: 
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a) Clima social para a negociação 
1) Espírito aberto, receptivo e integrador; 
2) A negociação como atitude permanente; uma postura essencialmente 
proativa (e não a atitude habitualmente reativa, motivadora de tensão e 
conflito). 
 
b) Cultura das organizações 
1) Definição clara da filosofia empresarial; 
2) Explicitação das políticas que conduzam à democracia no trabalho. 
 
c) Qualidade de vida nas organizações 
1) Qualidade do trabalho; 
2) Valorização humana do trabalhador; 
3) Estabelecimento de políticas sociais e de práticas de conversação e 
convivência no trabalho. 
 
d) Relação de poder 
1) Gerência participativa; 
2) Descentralização e delegação de autoridade. 
 
Segundo cenário: 
a) Definir e trabalhar na melhoria do perfil de negociador 
1) o gerente (todos os gerentes): o gerente negociador, como função educativa 
de qualquer gerente; 
2) A alta gerência: o sistema de liderança integrada nas organizações; 
3) O gerente de relações humanas: é, por função específica, um negociador; 
4) O mediador: alguém com habilidade política e senso educativo, atuando 
como facilitador do processo; 
5) O árbitro: função de magistrado, amenizando situações agudas e prevenindo 
agravamentos, com vistas a abrir perspectivas que extrapolem a crise 
imediata em favor de um bom relacionamento permanente. 
 
b) Considerar como pré-requisitos 
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1) Lealdade (boa-fé); 
2) Integridade (autenticidade); 
3) Tolerância (espírito conciliador); 
4) Renúncia (disposição para perder alguma coisa); 
5) Disponibilidade para o diálogo (conversar até a exaustão). 
 
Terceiro cenário: 
a) Observar a dinâmica da organização 
1) Seguir uma metodologia, visando desenvolver uma filosofia e postura 
de negociação permanente; 
2) Evitar o casuísmo imediatista e improvisações que gerem a cronificação das 
situações de conflito; 
3) Abordar o conflito sob três vertentes: comportamental (atitudes e 
comportamentos), técnico (o conhecimento especializado e a tecnologia de 
comunicação) e organizacional (visão global e sistêmica da organização) 
 
Resultados possíveis para uma negociação 
Uma negociação termina com um destes cinco resultados possíveis: perde/perde, 
perde/ganha, ganha/perde, ganha/ganha ou nada acontece (não há conseqüências 
positivas nem negativas). O bom negociador deve se empenhar para alcançar um 
resultado ganha/ganha. 
Perde/perde 
Este resultado acontece quando nenhuma das partes supre suas necessidades ou 
desejos e, então, ambas relutam em negociar novamente com a contraparte. 
Perde/ganha e ganha/perde 
Estes são o segundo e o terceiro resultados possíveis em uma negociação. A 
diferença entre os dois é o lado em que você está. O principal problema no caso de 
ocorrência desses resultados é que uma parte sai da negociação sem que suas 
necessidades ou desejos tenham sido atendidos. E o mais importante é que o perdedor se 
recusará a negociar novamente com o vencedor. 
Ganha/ganha 
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Neste resultado, as necessidades de ambas as partes são atendidas. Os dois lados 
sairão da negociação com um sentimento positivo e desejarão negociar novamente entre 
si. 
 
Pontos-chave para alcançar um resultado ganha/ganha 
1. Não restrinja sua negociação a um único ponto - se focalizar somente um assunto, 
você automaticamentecriará uma situação com um ganhador e um perdedor; 
2. Conscientize-se de que sua contraparte não tem as mesmas necessidades e desejos 
que você – se não levar este fator em consideração, você negociará tendo a impressão de 
que sua perda é o ganho de sua contraparte. E com esta atitude, é virtualmente 
impossível alcançar um resultado ganha/ganha; 
3. Não pressuponha que você conhece as necessidades da contraparte – é comum que 
os negociadores demonstrem saber exatamente o que a contraparte deseja. Com isso, 
deixam de procurar saber outras necessidades que podem influenciar a decisão da 
contraparte; 
4. Você precisa realmente acreditar no segundo ponto – é comum negociadores 
inexperientes esquecerem este ponto quando entram em uma negociação. 
Nenhum resultado 
O quinto resultado possível é nenhum resultado: nenhuma das partes ganha ou 
perde.

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