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1 CEDERJ – CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CURSO: GEOGRAFIA DISCIPLINA: GEOGRAFIA ECONÔMICA CONTEUDISTA: CIRO MARQUES REIS. Aula 9 – BRASIL: DIVISÕES REGIONAIS E ECONOMIA. Meta Apresentar ao aluno um breve histórico do processo de construção teórico das Divisões Regionais do Brasil, das “Regiões Naturais” até a utilização de parâmetros socioeconômicos e históricos na formulação de divisões regionais feitas pelo IBGE, e pelas ricas propostas de divisões regionais de geógrafos Pedro Pinchas Geiger e Milton Santos. Objetivos Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: 1. Compreender o processo evolutivo que levou ao atual quadro das Divisões Regionais do Brasil, e o peso dos fatores socioeconômicos e históricos nesse processo. 2. Reconhecer as contribuições dos geógrafos Pedro Pinchas Geiger e Milton Santos com suas propostas de Divisão Regional do Brasil, com, respectivamente, a formulação dos Complexos Regionais e da Difusão Diferencial do meio técnico- científico-informacional no território nacional. 2 Introdução Região é um dos principais conceitos da ciência geográfica, e é empregado largamente no nosso cotidiano, como referência de localização, e de extensão de determinadas áreas e seus limites. Você pode ser um morador da região metropolitana do Rio de Janeiro, ou ter nascido na região do ABC em São Paulo, ter preferências por regiões de climas mais amenos ou montanhosas, ou por regiões de clima tropical em planícies. Certamente você já sabe que no desenvolvimento econômico da maioria dos países, surgem regiões diferenciadas, como as industriais, as agrícolas, as mais densamente povoadas, ou as menos povoadas, as mais urbanizadas e as menos urbanizadas. Fica de certa maneira implícito que o conceito de região, independente da variável a ser escolhida (população, economia, recursos naturais, cultural, climática, religiosa, grau de urbanização,...), está ligada a noção de diferenciação, ou seja, uma região é caracterizada por um conjunto de elementos que a torna específica e que a diferencia de outras realidades espaciais. Figura 9.1. Esquemas de divisões regionais (IBGE, Pedro Geiger, e Milton Santos). Fonte: Ciro Reis (Autoria Própria). 3 A Figura 9.1 traz três diferentes Divisões Regionais do Brasil. Cada uma delas segue uma diretriz ou utiliza variáveis diferenciadas, embora possam apresentar aproximações em suas propostas de regionalização. As macrorregiões (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste, e Sul), como as conhecemos atualmente, foram estabelecidas pelo IBGE em 1970, e seu formato atual é a foto final de uma série de modificações de divisões anteriores estabelecidas pelo IBGE no processo de organização e classificação de dados estatísticos sobre o Brasil para fins de planejamento. Veja que esta divisão respeita os limites políticos-administrativos, diferentemente dos Complexos Regionais, divisão proposta pelo geógrafo Pedro Pinchas Geiger, que, pensou o Brasil em 3 (três) grandes regiões geoeconômicas. Perceba que nesta, os limites político-administrativos não são respeitados. E por fim, a contribuição do geógrafo Milton Santos, que elaborou a teoria dos “Quatro Brasis”. Sua especificidade teórica está na compreensão de regiões brasileiras diferenciadas dentro daquilo que ele denominou de meio técnico-científico- informacional. Início do Box Explicativo As divisões regionais servem mais para organização e planejamento territorial, elas não são propriamente unidades político-administrativas, como são os Estados e os Municípios. Para ver a evolução das divisões regionais no Brasil acessar: http://teen.ibge.gov.br/mao-na-roda/divisao-politico-administrativa-e-regional Fim do Box Explicativo Sob o ponto de vista da geografia econômica, o que investigaremos nessa presente aula é o peso das questões econômicas nas propostas de divisão regional apresentadas: pelas versões oficiais do IBGE, pela proposta de Complexos Regionais de Pedro Geiger, e dos “Quatro Brasis” de Milton Santos. 4 Embora as características físicas e naturais possuam um peso histórico na formatação da divisão regional brasileira, atualizações oficiais do IBGE e propostas como a de Pedro Geiger e Milton Santos trouxeram à tona a importância das atividades socioeconômicas associadas ao processo histórico de formação do território brasileiro, nesse processo de diferenciação regional. Nada mais pertinente à geografia econômica, que já sabemos, procura compreender como se dá a organização das atividades econômicas no espaço. 1. Regiões e Regionalização no Brasil. Em 1941, o professor Fábio Macedo Soares Guimarães coordenou, no IBGE, os estudos com o objetivo de sistematizar uma única Divisão Regional para o território nacional. Esta serviria para organização de informações estatísticas sobre o território nacional. Em 1942 surge a primeira: Figura 9.2. Primeira Divisão Regional Oficial do Brasil aprovada pelo Conselho Nacional de Geografia (1942) Fonte: Ciro Reis (Autoria Própria). 5 Esta primeira divisão ficou assim constituída (Figura 9.2): Região Norte: Território do Acre e Estados do Amazonas e Pará; Região Nordeste: dividida em duas sub-regiões, o Nordeste Ocidental (Maranhão e Piauí) e o Nordeste Oriental (Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas); Região Leste: também dividida em duas sub-regiões, Leste Setentrional (Sergipe e Bahia), e Leste Meridional (Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Distrito Federal); Região Sul: São Paulo, Paraná, Santa Catarina, e Rio Grande do Sul; Região Centro-Oeste: (Goiás e Mato Grosso). Ela teve como base, a divisão elaborada pelo geógrafo Delgado de Carvalho que à época era adotada no ensino secundário de Geografia, que também apresentava 5 grandes regiões: Figura 9.3. Divisão Regional de Delgado de Carvalho. Fonte: Ciro Reis (Autoria Própria). Esta divisão ficou assim constituída (Figura 9.3): 6 Brasil Setentrional ou Amazônico: Território do Acre e Estados do Amazonas e Pará; Brasil Norte-Oriental: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas; Brasil Oriental: Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Distrito Federal; Brasil Meridional: São Paulo, Paraná, Santa Catarina, e Rio Grande do Sul; Brasil Central: (Goiás e Mato Grosso). Perceba quão influente foi a divisão formatada por Delgado de Carvalho, pois, tirante a troca de denominações, e a criação de algumas subdivisões, a quadro das divisões regionais oficializado pelo Conselho Nacional de Geografia era praticamente o mesmo. Havia, no entanto, uma discussão metodológica particularmente importante para a nossa aula. O que deveria nortear ou balizar, as divisões regionais? As características físicas, naturais das regiões (“Regiões Naturais”), ou os fatores da geografia humana, como os fatos econômicos (“Regiões Humanas”)? Este debate existiu, e o que prevaleceu foram as características naturais das regiões, suas afinidades e suas diferenciações. Em 1939 o Conselho Técnico de Economia e Finanças havia elaborado uma divisão regional baseada em “Zonas Geoeconômicas”: Esta divisão ficara assim constituída (Ver Figura 9.4): Norte: Acre, Amazonas, Pará, Maranhão e Piauí; Nordeste: Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, Sergipe e Bahia; Sudeste: São Paulo, Minas Gerais, EspíritoSanto, Rio de Janeiro e Distrito Federal; Sul: Paraná, Santa Catarina, e Rio Grande do Sul; 7 Centro: (Goiás e Mato Grosso). Figura 9.4. Divisão Regional do Conselho Técnico de Economia e Finanças (1939). Fonte: Ciro Reis (Autoria Própria). Início do Box Explicativo Conselho Técnico de Economia e Finanças: Órgão técnico e consultivo do Ministério da Fazenda criado em 25 de novembro de 1937. A excessiva autonomia estadual que prevaleceu durante a Primeira República levou o governo a elaborar um projeto de centralização político-administrativa que teve início logo após a Revolução de 1930 e se estendeu até 1945. O CTEF teve sua origem na Comissão de Estudos Financeiros e Econômicos dos Estados e Municípios, de 1931, criada com o objetivo de levantar e reunir informações sobre a situação econômica e financeira das diferentes unidades da federação. O CTEF foi perdendo o seu prestígio após a queda do Estado Novo, mas sobreviveu até 1971, quando foi extinto. Fonte: http://cpdoc.fgv.br Fim do Box Explicativo 8 O trabalho do Conselho Técnico de Economia e Finanças já demonstrava, em 1939, características do desenvolvimento regional desigual que se aprofundariam com passar do tempo, no que tange à distribuição das atividades econômicas no território nacional. O Sudeste, por exemplo, já surge como região de forte concentração do ponto de vista demográfico, político-administrativo e econômico (ver Tabela 9.1). Variável Percentual em Relação ao Brasil População 45% Municípios 41% Produção vegetal 59% Produção Industrial 79% Rede Ferroviária 57% Rodovias 47% Tabela 9.1 – Indicadores de concentração na Região Sudeste (1942) Autoria: Própria Fonte: GUIMARÃES (1942). Sob o ponto de vista econômico (culturas), as diferenciações entre as regiões do CTEF apontavam: Região Características da produção por item em relação ao Brasil Sudeste Além das indústrias, Café (94%), Algodão (69%), Laranja (79%), Banana (70%), Arroz (64%), Milho (56%), Açúcar (52%). Nordeste Cacau (95%), Coco (99%), Mamona (71%), Farinha de Mandioca (56%), Açúcar (44%), e Algodão (26%). Pecuária (caprinocultura). Sul Trigo, Aveia, Cevada, Centeio (produtos de climas temperados). Alfafa (90%), Vinho (78%). Também Madeiras, Mate, e 100% do Carvão Mineral produzido no Brasil. Norte Borracha, Castanha, Madeiras, Centro Predominantemente pecuária. 9 Tabela 9.2 – Especificidades econômicas (culturas) das regiões anos 40 (CTEF) Autoria: Própria Fonte: GUIMARÃES (1942). A opção pela divisão regional baseada em “Regiões Naturais”, estabelecida em 1942, baseava-se no pressuposto da estabilidade das características físicas do território em detrimento do aspecto dinâmico da economia. Como havia uma questão de ordem prática, concluiu-se por quadros regionais mais fixos. Desta forma a organização de dados estatísticos e políticas e de planejamento no Brasil teriam como base divisões regionais estabelecidas, de forma importante, pelas características naturais do território nacional, em “Regiões Naturais” (Figura 9.2). Figura 9.5 – Diversidade natural no território brasileiro. Autoria: Adaptado Fontes: http://pixabay.com/en/brazil-amazon-equatorial-forest-400278/; http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3APaisagem-acari-currais-novos.JPG; http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AVis3.jpg;http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AMalecho_049.JPG; http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Pantanal,_south-central_South_America_5170.jpg#mediaviewer/File:Pantanal,_south-central_South_America_5170.jpg 10 Aos poucos, apesar da influência das “Regiões Naturais” e das divisões político administrativas, a Divisão Regional do Brasil passou por modificações que procuravam ajustá-la aos fatores econômicos, sociais e políticos do território nacional. Uma passo nesta direção foi dado em 1945, quando o IBGE implementa as Zonas Fisiográficas, que dividiam o território nacional em mais unidades a partir de características naturais, mas também econômicas e sociais. Era preciso incorporar a evolução da dinâmica econômica para melhor compreender a totalidade brasileira em toda sua diversidade. Desta forma o Estado poderia elaborar políticas públicas a fim de direcionar processos de desenvolvimento econômico e social, e planejar a estruturação territorial visando diminuir as desigualdades inerentes ao processo de acumulação de capital. As transformações advindas do crescimento econômico, do adensamento do processo de urbanização-industrialização, e das redes de fluxos entre cidades, que caracterizariam o contexto brasileiro nas décadas seguintes (1950, 1960), não seriam contempladas em uma estrutura rígida baseada somente nas características naturais do território. Tal esforço no sentido de analisar diferentes escalas, serve bem aos órgãos de planejamento estatal. O rápido desenvolvimento industrial e o rápido processo de urbanização brasileiro, principalmente no Sul e Sudeste aprofundaram as desigualdades regionais entre o “sul maravilha” e as regiões Norte, Nordeste, e Centro-Oeste. A criação de superintendências de desenvolvimento regional, como a SUDENE, a SUDAM, e a SUDECO exemplifica a atuação do Estado na mitigação dos efeitos do desenvolvimento regional desigual. 11 Início do Box Explicativo SUDENE, SUDAM, e SUDECO: Em 1959 foi criada a SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) ainda no Governo Juscelino. Posteriormente, já no Regime Militar, são criadas a SUDAM (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia) e, 1966, e finalmente a SUDECO (Superintendência do Centro- Oeste). O projeto principal era a incentivar o desenvolvimento econômico mais equilibrado nacionalmente. Fim do Box Explicativo No final dos anos 60 implementa-se a Divisão Regional por Microrregiões Homogêneas - eram 360 unidades homogêneas compondo a totalidade do território nacional - e a atual composição das macrorregiões: Norte, Nordeste, Sudeste, Centro-Oeste, e Sul. Em 1976 o IBGE adiciona 86 mesorregiões. Apenas em 1989 foi adotado uma nova Divisão Regional do Brasil, agora com 137 Mesorregiões Geográficas, e 558 Microrregiões Geográficas. Figura 9.6 – Mesorregiões e Microrregiões, Brasil: Influência da rede de comunicação entre lugares como elemento da articulação espacial. Autoria: Autor, adaptado de IBGE. Fonte: http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/default_div_int.shtm 12 Início do Box Curiosidade Figura 9.6 – Mesorregiões do Rio de Janeiro. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_mesorregi%C3%B5es_do_Rio_de_Janeiro Vejamos o exemplo do Estado do Rio de Janeiro: dividido em 6 mesorregiões geográficas (Figura 9.6): 1) Baixada Litorânea, 2) Centro Fluminense, 3) Metropolitana, 4) Noroeste Fluminense, 5) Norte-Fluminense, e 6) Sul-Fluminense. O Rio de Janeiro possui ainda 18 microrregiões. Fim do Box Curiosidade Além da herança das características naturais, expressa nos marcos divisórios das Macrorregiões brasileiras, o processo de industrialização, e posteriormente a ascensão do setor terciário (serviços) passaram a fomentar novas formas de diferenciação regional do território nacional. O papel das metrópoles e dos grandes centros, e a consequente hierarquia existente entre as cidades com suas áreas de influência, foram a base da Divisão Regional do Brasil em mesorregiões, onde a rede de comunicação entre os lugares desempenha importante papel na articulação espacial. 13 A Figura 9.7demonstra a centralidade das metrópoles na articulação espacial do território brasileiro. São Paulo em primeiro nível, seguido de Rio de Janeiro e Brasília exercem influência e orientam fluxos de todas as ordens, inclusive e principalmente fluxos comerciais e econômicos. Figura 9.7 – Mapa da centralidade da gestão do território brasileiro, 2013. Fonte: IBGE, Diretoria de Geociências, Coordenação de Geografia, 2013. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/apps/redes_e_fluxos/2014/ Desta forma, vimos que com a complexificação da realidade social e econômica brasileira, o processo de construção de modelos de divisão regional do território 14 nacional passou de uma escala inicial de macrorregiões, baseadas em regiões naturais, para um detalhamento na escala das meso e microrregiões, onde as redes urbanas e a centralidade das metrópoles possuem importante papel explicativo para compreensão do dinamismo econômico brasileiro. Atividade 1 (atende ao objetivo 1) Questão 1 – Compare da Divisão Regional de Delgado de Carvalho com a Divisão Regional do Conselho Técnico de Economia e Finanças de 1939, identificando as principais diferenças entre elas em relação à composição da atual Região Sudeste. Diagramação, por favor, incluir 10 linhas. Resposta Comentada Atualmente a Região Sudeste é composta pelos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo. A Divisão Regional de Delgado de Carvalho denominava esta região como Brasil Oriental, e incluía nesta Bahia e Sergipe, excluindo São Paulo, que fazia parte da Região Brasil Meridional. A Divisão do Conselho Técnico de Economia e Finanças (1939) apresenta composição e denominação idêntica à utilizada hoje, Região Sudeste, e já apresentava São Paulo integrante nesta região (não no Sul ou Brasil Meridional como a divisão de Delgado de Carvalho), além de não considerar Bahia e Sergipe como integrantes da Região Sudeste. Estes Estados passariam à Região Nordeste. Fim da Atividade 1 (atende ao objetivo 1) 15 2. As contribuições de Pedro Pinchas Geiger e Milton Santos. Figura 9.8 – Propostas de Divisões Regionais do Brasil. Autor: Ciro Marques Reis Fonte: GeoBrasil, UERJ (Pedro Geiger) (Autora: Mônica Sampaio Machado); http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AMilton_Santos_(TV_Brasil).jpg (Milton Santos), autor: By TV Brasil [CC-BY-3.0-br (http://creativecommons.org/licenses/by/3.0/br/deed.en)], via Wikimedia Commons Vimos na primeira parte desta aula o processo de construção da atual Divisão Regional do Brasil. Vimos que esse processo é, sobretudo, resultado de escolhas, de referências e de parâmetros diversos, que auxiliam na diferenciação ou aproximação na definição de grandes, meso e microrregiões, ou seja, é uma construção teórica, uma maneira de interpretar o Brasil. O IBGE nos apresenta a versão oficial, mas outras maneiras de traduzir foram propostas, e nesta secunda parte desta aula, falaremos sobre duas que merecem destaque: a elaborada pelo geógrafo Pedro Pinchas Geiger em 1967, conhecida como Complexos Regionais, 16 e aquela proposta pelo geógrafo Milton Santos, conhecida pelo termo “Os Quatro Brasis”. Como já citamos, o Brasil, no final dos anos 60 sofria os efeitos de um rápido processo de industrialização que transformava rapidamente a realidade territorial nacional, e foi basicamente sob a ótica da dinâmica industrial brasileira e o desenvolvimento regional desigual que ela apresentava, que Pedro Geiger construiu a ideia dos Complexos Regionais ou Regiões Geoeconômicas. Geiger dividiu o Brasil em três grandes regiões: Centro-Sul, Amazônia, e Nordeste (Figura 9.8). Para tal, Geiger utilizou como parâmetros o processo histórico de formação do território, as potencialidade econômicas e culturais e as especificidade sociais de cada região: A principal característica da Divisão Regional proposta por Geiger foi o fato desta não respeitar as divisões oficiais político-administrativas dos Estados. Figura 9.9 – Propostas de Divisões Regionais do Brasil – Complexos Regionais. Autor: Ciro Marques Reis 17 Regiões Principais Características Metrópoles Atividades Econômicas Centro-Sul Região mais desenvolvida, industrializada e urbanizada do país, onde estão localizadas as maiores metrópoles, possui capital financeira, cultural e política no Brasil. São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte. Indústrias, agronegócio, agropecuária, instituições financeiras, empresas transnacionais, centros de ciência e tecnologia, comércios, serviços, ampliação da fronteira agrícola. Nordeste Região pobre, com baixos indicadores sociais, predominância da ocupação litorânea, região historicamente importante, por onde foi iniciado o processo de ocupação do território nacional. Recife, Salvador, Fortaleza Extrativismo vegetal, agricultura (cana-de-açúcar, algodão), pecuária, cacau, fumo, agricultura de subsistência, e petróleo. Amazônia Economia basicamente extrativista, grandes vazios demográficos, poucas cidades centrais. Manaus, Belém. Atividades extrativistas, agropecuária, e mineração. *Destacar: polo siderúrgico de Carajás (Pará), Zona Franca de Manaus (Área de Livre comércio e Indústrias montadoras) Tabela 9.3 – Características gerais dos Complexos Regionais Autoria: Própria Milton Santos divide a história do meio geográfico em 3 (três) etapas, ou meios: o meio natural, o meio técnico, e o meio técnico-científico-informacional. Ao elaborar uma proposta de Divisão Regional do Brasil em quatro regiões, ao final dos anos 18 1970, Milton Santos o faz baseado na difusão diferencial do meio técnico- científico-informacional no território brasileiro. Início do Boxe Explicativo Meio Natural Homem condicionado pela natureza, condições naturais constituíam a base material da existência humana. Pouco poder de transformação da natureza pelo homem. Meio Técnico Através dos objetos técnicos (maquinização), o homem passa a transformar a natureza, e livrar- se da dos condicionantes naturais. Máquinas, cidades industriais, uma nova lógica temporal diferente do tempo natural. Meio Técnico-científico-informacional Ligado as novas tecnologias de informação características da 3ª revolução industrial, a partir dos anos 1970. Ciência e tecnologia unidades sob uma lógica global. A era da informação, com um novo modo de produção, reestruturado e flexível, ligado ao mercado internacional. Tabela 9.4 – Sucessão dos meios geográficos, a história do território brasileiro. Autoria: Própria Fim do Boxe Explicativo Para Milton Santos a difusão desse meio técnico-científico-informacional se dá de maneira diferenciada no território nacional, criando realidades regionais distintas. Melhor dizendo, o meio técnico-científico-informacional insere o Brasil na economia de rede globalizada, reestruturando o território a partir das ligações com o mercado global. Milton Santos analisa os sistemas de infraestrutura e os sistemas de rede que conectam o Brasil com as novas formas técnico-científicas que caracterizam o novo sistema produtivo, agora em escala global. 19 Desta forma, Milton Santos chegou a quatro realidades regionais que ele denominou de “Quatro Brasis”: Região Concentrada, Centro Oeste, Nordeste, e Amazônia. Figura 9.10 – Propostas de Divisões Regionais do Brasil – Difusão diferenciaçãodo meio técnico-científico-informacional. Autor: Ciro Marques Reis Perceba, observando a Figura 9.10, que em comparação com a proposta de Divisão Regional de Pedro Geiger, Milton Santos dá destaque à Região Concentrada (Sul e Sudeste atuais), diferenciando-a do Centro-Oeste. Também são respeitos os limites político-administrativos dos estados. Tanto a Região Amazônia, quanto a Região Nordeste, são analisadas de forma semelhante. Geiger, pelo olhar das áreas de influência, e Santos, pelo modo como as regiões se correlacionam com meio técnico-científico-informacional. Para ambos, o processo histórico de formação do território possui importante papel na construção de perfis sociais e culturais que auxiliam no processo de diferenciação das regiões, associado com a especificidade econômica de cada região. 20 Regiões Principais Características Metrópoles Atividades Econômicas Concentrada Formada pelos estados que formas as regiões oficiais Sudeste e Sul. Onde se concentram as atividades produtivas com maior grau de ciência e tecnologia. Com intensa rede de fluxos comerciais. É a região que comanda o território nacional, e de mais conectividade com a esfera global. Altamente urbanizada. São Paulo e Rio de Janeiro (como metrópoles nacionais), Mais Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte como metrópoles importantes, porém de menor centralidade na escala nacional. Atividades ligadas à globalização, serviços terciários altamente especializados ligados à informação, como serviços financeiros, assistência técnica, consultorias, publicidade. Belts modernos ligados ao comércio exterior (agronegócio), aumento da importância dos capitais fixos (portos, estradas, aeroportos) e dos capitais constantes (veículos, sementes, adubos). Descentralização industrial nas metrópoles nacionais, industrialização na direção Sul. Centro-Oeste Área de ocupação periférica recente, instalação do meio técnico-científico- informacional sobre o meio praticamente natural, na implantação da agricultura moderna. Cidades centrais: Cuiabá, Goiânia e Campo Grande. Agronegócio, fazendas modernas e dispersas, grandes. Produção de soja, milho, algodão e arroz, interligados com mercado internacional. Nordeste Área de povoação antiga, mecanização pontual e pouco densa, agricultura pouco intensiva, relativa densidade demográfica, baixa taxa regional de urbanização, o meio técnico-científico-informacional se apresente de forma pontual (manchas), em determinados locais da região. (áreas irrigadas do Vale do São Francisco) Metrópoles: Recife, Salvador, e Fortaleza. Agricultura pouco intensiva, e manchas de atividades industriais na região. Amazônia Baixas densidades demográficas e técnica. Insere-se no meio técnico- científico-informacional através dos meios de telecomunicação, em virtude das grandes distâncias. Hidrovias exercem importante papel na circulação de mercadorias. Cidades centrais: Manaus e Belém Pontuais fazendas modernas, área de escoamento da produção do Centro-Oeste, Polo Industrial como a Zona Franca de Manaus, caracterizam bem a ligação com o mercado global. Tabela 9.5 – “Quatro Brasis” de Milton Santos. Autoria: Própria 21 Atividade 2 (atende ao objetivo 2) Questão 1 – Veja a figura e responda. Figura 9.11 – Agricultura e área irrigada do Vale do São Francisco (Petrolina, Pernambuco), 2012. Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3APetrolina_Vale_do_S%C3%A3o_francisco-PE.JPG Autor: By Mare de Castro (Own work) [CC-BY-SA-3.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0)], via Wikimedia Commons De acordo com a Divisão Regional proposta por Milton Santos, a qual dos “Quatro Brasis”, a Figura 9.11 faz referência? E podemos considerar ser esta uma característica econômica de toda essa região? Explique. Diagramação, por favor, incluir 10 linhas. Resposta Comentada As áreas irrigadas do Vale do São Francisco, que possibilitam a implementação de modernas atividades agrícolas, estão inseridas, na Região Nordeste, de acordo com a Divisão Regional de Milton Santos (de Geiger e do IBGE também). No entanto, está não é uma característica dominante da economia da Região Nordeste. São atividades pontuais, e localizadas nas áreas de irrigação do Vale do São Francisco. A Região Nordeste, de acordo com a classificação de Milton Santos, apesar de ter sido a primeira região econômica do Brasil em seu processo 22 de formação territorial, apresenta manchas de modernidade (industrialização, agricultura), e baixa densidade técnica. Fim da Atividade 2 (atende ao objetivo 2) Conclusão Os estudos de Pedro Pinchas Geiger e de Milton Santos foram desenvolvidos em momentos diferentes da história do território nacional. Geiger estava traduzindo o Brasil que deixava de ser rural para ser urbano, e estava inserido num contexto onde o processo de industrialização nacional e o planejamento regional estava em seu auge. Milton Santos já desenvolve sua teoria a luz do processo que já conhecemos e denominamos de globalização, pensando o Brasil do final do século 20. No que tange ao desenvolvimento das formas de produção no território nacional, podemos verificar, ao observar a contribuição desses dois autores, quão diverso e complexo é a realidade brasileira. Podemos, principalmente, ressaltar o quão desigual tem sido esse processo. O Brasil do século 21 permanece desigual e desequilibrado no que concerne ao desenvolvimento econômico de suas macrorregiões. A Região Concentrada de Milton Santos (Sudeste e Sul) permanecem centralizando e “mandando” nos fluxos econômicos do território nacional. Geiger vislumbrou o crescimento da fronteira agrícola como importante processo de desenvolvimento econômico do Centro-Oeste. As Regiões Nordeste e Norte permanecem, apesar de alguns avanços, emplacando os piores índices de desenvolvimento humano. O processo de acumulação capitalista, centralizador e concentrador, tem sido mais eficiente em promover o desigual desenvolvimento regional do Brasil do que as políticas públicas que procuram atuar no sentido contrário. Atividade Final (atende aos objetivos 1 e 2) 23 Questão 1. A figura representa uma nova dinâmica econômica no território nacional, a expansão da fronteira agrícola. É possível associar tal dinâmica com a Divisão Regional proposta por Pedro Pinchas Geiger? Explique. Figura 9.12 – Nova fronteira agrícola Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AFronteira_agricola_Amazonica_Brazil.svg Author: By Brazil_location_map.svg: NordNordWest derivative work: Hallel [CC-BY-SA-3.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0)], via Wikimedia Commons Diagramação, por favor, inserir 6 linhas. Reposta Comentada Sim. A proposta de Divisão Regional proposta por Pedro Geiger apresente o Centro-Oeste (em suas partes Leste e Norte) como as fronteiras agrícolas em 1967. Os limites apresentados na figura em questão preservam parte da Região Amazônia da Região Nordeste. A figura sugere uma evolução das linhas geoeconômicas, dos complexos regionais sugeridos por Geiger para o sul da Amazônia e para o Leste nordestino. Questão 2. – Quando bem criança aprendi na escola que meu Estado estava na Região do Brasil Oriental. Mais tarde, quando já era um menino um pouco maior, 24 me disseram que ele pertencia à Região Leste, até que, quando mais velho, fui surpreendido quando me informaramque agora meu Estado esta na Região Nordeste! O narrador dessa pequena história, de acordo com a história das Divisões Regionais do Brasil, pode ter nascido em qual(ais) Estado(s) brasileiros? Explique. Diagramação, por favor, inserir 7 linhas. Reposta Comentada O narrador pode ter nascido nos Estados da Bahia ou Sergipe. A Divisão Regional de Delgado de Carvalho apresentava o Brasil oriental, no qual Bahia e Sergipe em conjunto com Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro formavam a região. A Divisão Regional oficializada pelo IBGE em 1942, trocou a denominação da Região para Leste, sendo Bahia e Sergipe pertencentes à subdivisão Leste Setentrional. A atual Divisão Regional deslocou Bahia e Sergipe para Região Nordeste. Sendo assim, o narrador poderia ter nascido na Bahia ou em Sergipe. Fim da atividade Final Resumo Inicialmente vinculado às características naturais, o processo de compreender o território brasileiro através de divisões regionais, evoluiu da observação das características físicas e naturais para a observação das realidades socioeconômicas dos lugares, para a compreensão do processo histórico de formação de cada região, para as áreas de influência das áreas metropolitanas através da articulação do espaço em rede, até a difusão diferencial do meio técnico-científico-informacional no território nacional, interligando a dinâmica econômica do território nacional ao mercado global. O IBGE, e intelectuais como Pedro Pinchas Geiger e Milton Santos, nos apresentam formas de traduzir e interpretar o Brasil. 25 Referências Bibliográficas COSTA, R. H. da. Regional-global: dilemas da região e da regionalização na geografia contemporânea. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. Fabio Betioli Contel, «As divisões regionais do IBGE no século XX (1942, 1970 e 1990)», Terra Brasilis (Nova Série) [Online], 3 | 2014 e 2014. URL: http://terrabrasilis.revues.org/990; DOI: 10.4000/terrabrasilis.990 GUIMARÃES, F. de M. S. Divisão Regional do Brasil. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto de Geografia e Estatística – IBGE, 1942. LEMOS, M. B.; DINIZ, C. C.; GUERRA, L. P. A nova configuração regional brasileira e sua geografia econômica. Est. econ., São Paulo, 33(4): 665-700, out- dez 2003. SANTOS, M. A Natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção - 4. ed. 2. reimpr. - São Paulo: Editorada Universidade de São Paulo, 2006. - (Coleção Milton Santos; 1). SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI – 16 ed. – Rio de Janeiro: Record, 2012.