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pós-operatório pé torto congênito

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Avaliação pós-operatória do pé torto
congênito pelo método de Lehman*
ALEXANDRE FRANCISCO DE LOURENÇO1, HENRIQUE SODRÉ2
RESUMO
Os autores apresentam os resultados cirúrgicos de
70 pés tortos eqüinovaros congênitos operados pela via
de acesso de Cincinnati e avaliados pelo método de Leh-
man.
SUMMARY
Postoperative evaluation of congenital clubfoot accor-
ding to Lehman’s method
The authors present the surgical results of 70 club-
feet operated on using the Cincinnati incision and eva-
luated according to Lehman’s method.
INTRODUÇÃO
A avaliação dos resultados cirúrgicos do pé torto
eqüinovaro congênito é difícil, tanto no aspecto funcio-
nal como no cosmético. Essa dificuldade deriva do fato
de a própria deformidade variar num grande espectro
de gravidade (1,2,11) . Em nosso meio, o fator socioeconô-
mico também colabora de forma acentuada na avaliação
pré-operatória, uma vez que raramente temos a oportu-
nidade de avaliar o paciente no berçário e as crianças
são encaminhadas nas mais variadas faixas etárias.
As classificações pós-operatórias existentes na litera-
ture têm pouca aceitação, por serem muito complicadas
ou incompletas, levando-se mesmo a questionar se um
método de avaliação universal é factível (4).
Neste trabalho, os autores apresentam o uso do mé-
todo de avaliação pós-operatória do pé torto congênito
1 .
2 .
 * Trab. realiz. no Dep. de Ortop. e Traumatol. da Esc. Paul. de Med.
(Serv. do Prof. Dr. José Laredo Filho).
Alumo do Curso de Pós-Grad. do Dep. de Ortop. e Traumatol. da
EPM.
Doutor, Prof. Adjunto e Chefe do Setor de Ortop. Pediátr. da
descrito por Lehman (9,10) . Este método é bastante sim-
ples e permite uma avaliação completa, dos pontos de
vista clínico, radiológico e funcional.
MATERIAL E MÉTODOS
Desde 1985, 127 pacientes portadores de pé torto
eqüinovaro congênito foram submetidos a correção cirúr-
gica pela incisão de Cincinnati no Departamento de Orto-
pedia e Traumatologia da Escola Paulista de Medici-
nal. Para este estudo, incluímos 45 pacientes envolven-
do 70 pés, com tempo de seguimento mínimo de dois
anos. Trinta e dois pacientes eram do sexo masculino e
13, do feminino. O pé direito estava acometido em sete
pacientes, o esquerdo, em 13 e, em 25 pacientes, a defor-
midade era bilateral.
Todos os pacientes foram submetidos à mesma téc-
nica cirúrgica pela incisão de Cincinnati. Os tendões de
Aquiles, tibial posterior, flexor longo do hálux e flexor
longo dos dedos foram alongados em “Z”. A articula-
ção subtalar foi totalmente liberada medial, posterior e
lateralmente. A articulação tibiotalar foi liberada poste-
rior e lateralmente, sendo que na face medial a porção
profunda do ligamento deltóide foi mantida intacta. O
músculo abdutor do hálux foi sempre ressecado. O liga-
mento interósseo só foi seccionado nos casos em que o
varismo do calcâneo era irredutível. Os ligamentos fibu-
localcâneo e bifurcado eram seccionados.
Na face medial, fizemos as capsulotomias das articu-
lações entre o I metatarsiano e a cunha medial, a cunha
medial e o navicular e talonavicular. Na face lateral, libe-
ramos a articulação calcâneo-cubóidea. A redução da
articulação talonavicular era mantida com um fio de
Kirschner. A articulação subtalar era reduzida e fixada
com dois fios de Kirschner paralelos, sem atingir a articu-
lação tibiotársica. A incisão era fechada em discreta fle-
xão plantar e uma tala gessada mantida por três sema-
nas. Após esse período, os fios e os pontos eram retira-
EPM. dos e confeccionado gesso inguinopodálico com flexão
458 Rev Bras Ortop - Vol. 28, N° 7 - Julho, 1993
AVALIAÇÃO PÓS-OPERATÓRIA DO PÉ TORTO CONGÊNITO PELO MÉTODO DE LEHMAN
TABELA 1
1 .
2 .
3 .
4 .
5 .
Dorsiflexão tornozelo
(pass iva)
> 9 0 15
9 0 5
< 9 0 0
Subtalar (passiva)
> 1 5 10
< 1 5 5
rigidez 0
Posição tornozelo (estática)
O – 5 valgo 10
> 5 vago 0
varo 0
Antepé (aspecto c/ carga)
neutro 10
< 5 adução 5
> 5 adução 0
Martha
normal 10
incapaz andar
em calcâneo –4
incapaz andar
em eqüimo –4
pés planos –5
6 .
7 .
8 .
9 .
10.
Radiologia
Índice T-C* > 40 5
< 40 0
Âng. T-I** < 10 5
> 10 0
Sapatos
regular — sem queixas 5
regular — com queixas 2
órteses
Função
(atividades diárias)
sem limitação
limitação ocasional
limitação freqüente
Dor
nunca
ocasional
freqüente
Tendões flexores
boa função
função parcial
sem função
0
15
8
0
10
5
0
5
3
0
* Índice T-C: soma do ângulo talocalcanea em AP + P
* * Ângulo T-1: talo-I metatarsiano em perfil
CLASSIFICAÇÃO
EXCELENTE 85 A 100 PONTOS
BOM 70 A 84 PONTOS
REGULAR 60 A 69 PONTOS
RUIM < DE 59 PONTOS
do joelho em 90 graus e mantido por seis semanas.
Após a retirada do gesso, uma órtese de polipropileno
era confeccionada e a fisioterapia iniciada.
O método de avaliação pós-operatória de Lehman
pode ser aplicado em qualquer criança que já esteja deam-
bulando. Por esse motivo, escolhemos apenas crianças
que tinham tempo de seguimento maior de dois anos e
que estivessem na idade de marcha. O método consiste
de dez parâmetros aos quais são atribuídas notas. De
acordo com a soma das notas, os resultados são classifi-
cados em excelente, bom, regular ou ruim (tabela 1).
RESULTADOS
De acordo com a classificação de Lehman, obtive-
mos 26 pés (37,1%) excelentes, 21 pés (30%) bons, 11
pés (15,7%) regulares e 12 pés (17,1%) ruins.
Rev Bras Ortop — Vol. 28, Nº 7 - — Julho, 1993
DISCUSSÃO
A necessidade de avaliarmos os resultados pós-ope-
ratórios de nossos pacientes nos levou a uma pesquisa
sobre os métodos empregados em outros centros de estu-
do. Entretanto, esta pesquisa revelou que os métodos
já existentes eram subjetivos, complicados ou omissos
em detalhes que julgamos importantes para a análise
dos resultados (5-8,12) .
Em 1990, no International Congress on Clubfoot,
realizado em Milwaukee, tivemos a oportunidade de co-
nhecer o método descrito por Lehman. Considerando
que abrange parâmetros clínicos, radiológicos e funcio-
nais, sem dúvida podemos ter uma avaliação bastante
acurada dos nossos resultados cirúrgicos.
Em nosso serviço, indicamos o tratamento cirúrgi-
co aos seis meses de idade para todas as crianças que ain-
da apresentam deformidade nessa idade. Entretanto, e
grande o número de pacientes que chegam ao nosso am-
bulatório em idade bastante avançada ou até deambulan-
do com os pés deformados, sem qualquer tipo de trata-
mento. De acordo com nossos resultados, a idade pare-
ceu estar relacionada com o resultado final. Os melhores
resultados foram obtidos nos pacientes com menor ida-
de na época da cirurgia. Ainda precisamos de mais estu-
dos para confirmar se esse dado e estatisticamente signi-
ficante.
Por outro lado, seria obviamente errado supor que
a idade seja a única variável a influenciar o resultado.
Tivemos crianças com seis meses de idade na época da
cirurgia cujos resultados foram classificados como ruins
e também crianças com quase dois anos de idade cujos
resultados finais foram excelentes. Como sabemos, vá-
rios são os fatores envolvidos na deformidade do pé tor-
to congênito. Ao avaliarmos o resultado final sem consi-
derar o grau de deformidade inicial, podemos estar des-
cartando um fator importante.
Para nós, o método de Lehman é uma contribuição
para avaliação funcional do pé torto operado que mere-
ce divulgação, pois pode servir como uma forma confiá-
vel de comparação de resultados cirúrgicos. Talvez não
devêssemos usar a classificação excelente, uma vez que
um pé excelente e o normal e, sabidamente, um pé tor-
to, por melhor que seja seu resultado, jamais sera um
pé normal. Dessa forma, sugerimos que os resultados
excelentes e bons sejam classificados como satisfatórios
e os resultados ruins e regulares, como insatisfatórios.
REFERÊNCIAS
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matol Protez 5: 32, 1983.
459
A.F. LOURENÇO & H. SODRÉ
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waukee, Wisconsin, 1990.
5. Green, A.D. & Lloyd-Roberts, G.C.: The results of early poste-
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6. Handelsman, J.E. & Solomon, L.: The assessment of correction
in clubfoot. S Afr Med J 47: 1909, 1973.
460 Rev Bras Ortop - Vol. 28, N° 7 - Julho, 1993
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