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DECLARAÇÃO DE HONRA Eu, Daniel António Inguane, declaro por minha honra que este trabalho de final de Curso de Mestrado em Psicologia Clínica, nunca foi apresentado na sua essência para a obtenção de qualquer nível académico e que constitui o resultado da minha investigação. O seu conteúdo é original e todas fontes consultadas estão devidamente mencionadas no texto e na bibliografia. (Daniel António Inguane) 2019 DEDICATÓRIA Dedico esta Dissertação à minha família que me apoiou em mais uma conquista da minha vida profissional, razão da minha motivação, em especial à minha adorada mãe Rosalina Sabão Maxaieie, que tanto me deu força e esperanças para continuar com os meus estudos, e pelo incentivo nos momentos mais difíceis. Ao meu pai António Inguane (Em memoria), pelo apoio moral para que chegasse onde estou agora. Aos meus quatro amados filhos Luísa, Morgana, Daniel Junior e Sheron que sempre estiveram presentes nos momentos de muito aperto na minha vida estudantil. Aos meus colegas da turma pela força para continuar a lutar. AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus pela oportunidade de vencer mais essa batalha com muita saúde, força, determinação e sem enlouquecer. Aos meus pais, António Inguane (Em memória) e Rosalina Sabão Maxaieie que me educaram com dignidade e amor. Aos meus queridos filhos, Luísa, Morgana, Daniel Júnior e Sheron Daniel, e ao meu neto Valter Norberto, pelo carinho, afecto e incentivo durante todo este processo. Á todos Colegas da turma e, aos Docentes que me enriqueceram com valiosos ensinamentos, os quais pavimentaram a árdua travessia académica, neste nível do Mestrado. Gostaria de prestar especial agradecimento ao meu Supervisor, Dionísio Aníbal Armando, que acolheu o tema proposto com incentivos, me orientando com competência e dedicação até a conclusão desta Dissertação. Muito Obrigado. LISTA DE ABREVIATURAS APA - Associação Americana de Psiquiatria CID - Classificação Internacional de Doenças DSM – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais ISCTAC – Instituto Superior de Ciências e Tecnologias Alberto Chipande HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana OMS - Organização Mundial de Saúde REMAR - Reabilitação de Marginalizados SENAD - Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas SIDA - Síndrome de Imunodeficiência Adquirida LISTA DE QUADROS Quadro - 1: Critérios do CID-10 para uso nocivo (abuso) de substâncias psicoativas ................................................................................................................................ pa. 12 Quadro - 2: Critérios diagnósticos da dependência de substâncias psicoativas...pag.15 Quadro - 3: Comparação entre critérios de abuso e uso nocivo da DSM-IV e CID-10………………………………………………………………………......Pag.18 Quadro - 4: Comparação entre os critérios para dependência da DSM-IV e CID-10 18 Quadro - 5: Factores de Risco e Facores de Protecção para o uso de Álcool e outras Drogas.......................................................................................................................... 21 Quadro - 6: Factores de Risco e Facores de Protecção no Domínio dos Pares.......... 22 Quadro - 7: Factores de Risco e de Proteção no Domínio Familiar……………Pag.24 Quadro – 8: Factores de Risco e de Proteção no Domínio Comunitário....................25 Quadro - 9: Perfil sócio - Profissional dos participantes no estudo………….....Pag.46 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico -1: Iniciação de consumo de drogas pelos pacientes da Remar………..Pag.51 Gráfico -2: Tipos de drogas consumidas pelos pacientes da Remar……………Pag.52 Gráfico -3: Impacto psicossocial do abuso de álcool e outras drogas nos jovens e adolescentes da Remar…………………………………………………………..Pag.56 Gráfico - Prevalência dos tipos de drogas consumida pelos inquiridos…………………………………………………………………….….Pag.62 Gráfico -5: Impacto psicossocial do abuso de álcool e outras drogas nos jovens e adolescentes da Remar…………………………………………………………..…P.64 RESUMO Com a presente Dissertação pretende-se estudar as implicações psicossociais do consumo de substâncias psicoativas nos jovens e adolescentes, especificamente a análise é feita no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, localizado no Bairro da Costa do Sol, na cidade de Maputo. A Remar (Reabilitação de Marginalizados) é uma organização não-governamental que surgiu em 1982, na Espanha. A mesma dedica-se a trabalhos de cariz social. As suas actividades estão ligadas à assistência social a crianças órfãs, abandonadas, mães solteiras, toxicodependentes, doentes de HIV/SIDA, viúvas e idosos, acolhendo-os gratuitamente e ajudando-os na sua reabilitação física e psíquica. O principal objectivo da pesquisa é o de avaliar as implicações Psicológicas e Sociais, associados ao Consumo de Substancias Psicoativas por parte de Adolescentes e Jovens. Para isso utilizou-se uma metodologia de natureza mista (qualitativa e quantitativa), que os autores definem como um procedimento de colecta, análise e combinação de técnicas quantitativas e qualitativas em um mesmo desenho de pesquisa. De acordo com os resultados desta pesquisa, todos os elementos da amostra já consumiram pelo menos uma droga. A droga com prevalência mais elevada são as Bebidas alcoólicas com 32%, Bebidas alcoólicas e Canabis - sativa 24%, Canabis - sativa 16%. A Heroína é apenas consumida por 8% dos elementos da amostra e o Cocaína por 20%. Quanto ao impacto psicossocial do consumo de substâncias psicoativas por parte dos acolhidos da costa do sol, 28% dos inquiridos relatou o desprezo e abandono familiar, Expulsão ou abandona da escola 28%, Perda de emprego (expulsão) 26%, Adquirir doenças como HIV/SIDA, Delírios e Alucinações 20%. Pelo que confirmou - se a hipótese – 1 que diz: O consumo de Substancias psicoativas tem implicações psicológicas e sociais negativas na vida dos Adolescentes e Jovens, residentes no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, cidade de Maputo. Conclui-se que precisamos da colaboração de vários profissionais da área, psicólogos clínicos, psiquiatras e dos assistentes sociais, para que se possam ter estratégias e medidas de intervenção juntamente com os órgãos existentes de apoio aos jovens e adolescentes, através da palestras e educação para a saúde nas comunidades, escolas e nas famílias. Palavras-chave: Adolescentes, Jovens, Substancias Psicoativas, Implicações Psicossociais ABSTRACT This dissertation intends to study the psychosocial implications of the use of psychoactive substances in young people and adolescents, specifically the analysis is done at Remar's Drug Addiction Rehabilitation Center, located in the Costa do Sol – Maputo city. Remar (Rehabilitation of the Marginalized) is a nongovernmental organization which was founded in 1982 in Spain and it is dedicated to social work. Its activities are linked to social assistance to orphans, abandoned children, single mothers, drug addicts, HIV / AIDS patients, widows and the elderly, receiving them free of charge and helping them in their physical and mental rehabilitation. The main objective of the research is to evaluate the Psychological and Social implications associated with the Consumption of Psychoactive Substances by Adolescents and Young People. For the conduction of this research, it has been used a methodology of mixed nature (qualitative and quantitative), which has been defined by the authors as a procedure for collecting, analyzing and combining quantitative and qualitative techniques in the same research design. According to the results of this research, all elements of the sample have already consumed at least one drug. And the drugs with the highest prevalence are Alcoholic beverages with 32%, Alcoholic beverages and Canabis - sativa 24%, Canabis - sativa 16%. Heroin is only consumed by 8% of sample elements and Cocaine by 20%. As for the psycho-social impact of the consumption of psychoactive substances in Costa do Sol, 28% of the respondents reported the contempt and abandonment of the family,Expulsion or abandonment of school 28%, Loss of employment (expulsion) 26%, Acquiring diseases such as HIV/ AIDS, Delusions and Hallucinations 20%. According to hypothesis 1, the Consumption of Psychoactive Substances has negative psychological and social implications in the lives of adolescents and young people, residing in the Remar Drug Addiction Rehabilitation Center, Maputo city. It is concluded that we need the collaboration of several professionals in the field, such as Clinical Psychologists, Psychiatrists and Social Workers, so that strategies and intervention measures can be developed along with the existing support organs for young people and adolescents through lectures and education for the health in communities, schools and families. Key words: Adolescents, Young People, Psychoactive Substances, Psychosocial Implications. Índice Declaração de Honra....................................................................................................... i Dedicatória..................................................................................................................... ii Agradecimentos............................................................................................................ iii Lista de Abreviaturas.................................................................................................... iv Lista de Quadros.............................................................................................................v Lista de Gráficos........................................................................................................... vi Resumo.........................................................................................................................vii Abstract....................................................................................................................... viii CAPITULO - I: INTRODUÇÃO...................................................................................1 1.1. Contexto da Pesquisa...............................................................................................2 1.2. Delimitação do Tema.............................................................................................. 2 1.3. Contextualização..................................................................................................... 3 1.4. Justificativa..............................................................................................................4 1.5. Problematização...................................................................................................... 5 1.6. Hipóteses................................................................................................................. 7 1.7. Objectivos................................................................................................................7 1.7.1. Objectivo Geral.................................................................................................... 7 1.7.2. Objectivos Específicos......................................................................................... 7 CAPITULO - II: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E CONCEPTUAL...................... 8 2.1. Definição de Conceitos........................................................................................... 8 2.1.1. Adolescência........................................................................................................ 8 2.1.2. Drogas.................................................................................................................. 8 2.1.3. Álcool................................................................................................................... 9 2.1.4. O Consumo de Álcool na Adolescência.............................................................10 2.1.5. Definições Sobre Padrões de Consumo do Álcool.............................................11 2.1.6. Uso Moderado de Álcool................................................................................... 11 2.1.7. Critérios Diagnósticos de Uso Nocivo ou Abuso de Drogas............................. 12 2.1.8. Critérios Diagnósticos da Dependência de Substâncias Psicoativas..................13 2.1.9. Diferenças entre os Termos Alcoólatra e Alcoolista..........................................15 2.1.10. Experimentação, Uso, Abuso e Dependência de Drogas................................. 15 2.1.11. Abuso ou Uso Nocivo de Drogas.....................................................................16 2.1.12. Critérios para o Diagnóstico de dependência do Álcool (Alcoolismo)............19 2.1.13. Factores que Levam ao Uso de Drogas............................................................ 20 2.1.15. Factores de Risco e de Proteção no Domínio Familiar.................................... 22 2.1.16. Factores de Risco e de Proteção no Domínio Comunitário..............................25 2.1.17. As Drogas e Seus Efeitos................................................................................. 26 2.1.18. As Drogas e Seus Efeitos no Sistema Nervoso Central................................... 27 2.1.19. Implicações Psicossociais do Abuso de Bebidas Alcoólicas........................... 28 2.1.20. Prevenção do Uso de Drogas............................................................................29 2.1.21. Os Meios de Comunicação, a Prevenção e a Responsabilidade Social............29 CAPITULO - III: METODOLOGIA........................................................................... 31 3.1. Método de Procedimento.......................................................................................32 3.2. Quantos aos Objectivos.........................................................................................33 3.3. Estudo de Caso...................................................................................................... 33 3.4. Pesquisa Bibliográfica...........................................................................................34 3.5. Universo ou População..........................................................................................34 3.6. Amostragem.......................................................................................................... 35 3.7. Técnicas/ Instrumentos de Recolha de dados........................................................36 3.7.1. Entrevista............................................................................................................36 3.7.2. Questionário....................................................................................................... 37 3.7.3. Observação......................................................................................................... 38 3.8. Critérios de Inclusão e Exclusão........................................................................... 38 3.9. Questões Éticas......................................................................................................38 3.10. Principais Constrangimentos na Realização do Trabalho................................... 39 CAPITULO - IV: APRESENTAÇÃO DO LOCAL DE PESQUISA......................... 40 4.1. ASSOCIAÇÃO REMAR...................................................................................... 40 4.2. Objectivos Sociais da REMAR............................................................................. 40 4.3. Visão......................................................................................................................41 4.4. Princípios e Valores...............................................................................................41 4.4.1. Valores últimos (relativo à Visão)......................................................................41 4.4.2. Valores instrumentais (em relação à Missão).....................................................41 4.5. Os princípios que Regem a nossa Gestão são:...................................................... 42 4.6. Missão...................................................................................................................42 4.7. Requisitos Para Ser Admitido ao Centro...............................................................43 CAPITULO - V: APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS............44 5.1. Perfil Sócio - Demográfico dos Participantes no Estudo...................................... 44 5.2. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS........................................................... 46 5.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS............................................... 61 5.4. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO.......................................................................65 6.1. Conclusões.............................................................................................................68 6.2. RECOMENDAÇÕES........................................................................................... 70 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................72 APÊNDICES-1............................................................................................................... I APÊNDICES-2..............................................................................................................II APÊNDICES-3............................................................................................................ III file:///E:/Daniel%20Junior%20-%20Dissetacao%20Final-20/Trabalho%20Final..%20Dissertacao%20de%20%20Mestrado%20-%202019%20Implicações%20Psicossociais%20do%20consumo%20de%20Drogas%20e%20B.docx 1 CAPITULO - I: INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como tema “Implicações Psicossociais do Consumo de Substâncias Psicoativas nos Jovens e Adolescentes: Estudo de Caso no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, entre 2016 -2018”. Esta é uma pesquisa abordado no âmbito de obtenção do grau académico de Mestrado em Psicologia Clínica, que se pretende que venha a ter um contributo na compreensão das implicações psicossociais do consumo de drogas e bebidas alcoólicas nos jovens. O consumo de álcool na sociedade contemporânea é visto predominantemente de forma positiva, o que dificulta o reconhecimento de determinados padrões de consumo como doença e, ao mesmo tempo, a mobilização de profissionais de saúde para diminuir índices de problemas decorrentes do uso do álcool. Existem circunstâncias contextuais que fomentam prática abusiva do consumo e, por outro lado, medidas contrárias que o desaconselham ou proíbem. A disponibilidade de barracas ao lado das escolas Moçambicanas e as publicidades fomentam o aumento da sociedade juvenil de consumo, assim como a globalização que se desenvolveu, conduziu a que as bebidas alcoólicas e drogas disponíveis aumentassem exponencialmente, a par de um discurso anti-álcool por alguns sectores. Este trabalho visa fazer uma reflexão sobre o uso de drogas por adolescentes e jovens, mostrando o conceito de diversos tipos de drogas que podem passar despercebidas pelos jovens e a família dos mesmos. Também é ressaltado neste trabalho as causas e factores que levam os jovens e adolescentes a utilizar-se das drogas, assim como as situações que contribuem para que os mesmos tornem-se pessoas vulneráveis a experimentar drogas. Falar sobre drogas, principalmente na adolescência é fundamental, na actualidade, uma vez que o seu uso se torna cada vez mais precoce e devastador, trazendo consequências para toda a sociedade. Entender as causas e factores que levam ao uso das drogas, entender as consequências para os jovens, família e sociedade é um dos pontos para diminuir a utilização dessas substâncias, como resolução dos problemas de pessoas que estão em uma fase de mudanças e adaptações e precisam de orientações. Sendo que esta análise é abordada numa perpectiva da Psicologia Clínica. Este encontra-se dividida em seis partes distintas. A primeira parte do trabalho trata de apresentar a introdução, onde encontramos a delimitação espaço-temporal, a problematização, os objectivos e a motivação (justificativa) que nos levou a abordar 2 sobre o fenómeno de Consumo de Substancias Psicoativas e Jovens e Adolescentes. Na segunda parte é onde procurou-se apresentar a revisão de literatura existente sobre a temática Consumo de Substancias Psicoativas no mundo e, especialmente em Moçambique. Na terceira parte do trabalho procurou-se apresentar e explicar o procedimento metodológico através do qual norteou-se o trabalho, o assunto a ser estudado e a forma através do qual foi tratado. É nesta parte onde foram apresentados os métodos de abordagem e procedimento, para além das técnicas de recolha de informação, igualmente a delimitação do universo e a amostragem da pesquisa. Na quarta parte do trabalho procurou-se fazer a apresentação do local de pesquisa, destacamento a missão, visão e os objectivos da instituição. Nesta secção fez-se a descrição do nosso campo de pesquisa, no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, localizado no bairro Costa do Sol, na Cidade de Maputo. Ao se fazer a descrição do nosso campo de pesquisa, procurou-se inclusive detalhar o quotidiano do Centro que abriga os Jovens Toxicodependentes acolhidos naquele local em regime aberto, no exercício das suas actividades. A quinta parte consistiu, especialmente, na apresentação resultados do trabalho de campo e procurou-se desenvolver a discussão teórica das informações recolhidas no campo de pesquisa. Já na sexta parte, apresentamos em forma de conclusões e recomendações, as principais ilações da pesquisa. Por último apresentou-se as referências bibliográficas, citadas ao longo do trabalho. 1.1. Contexto da Pesquisa Este trabalho insere-se no contexto de conclusão do curso de Mestrado em Psicologia Clínica no ISCTAC, cuja perspectiva é contribuir para a compreensão das implicações psicológicas e sociais que podem surgir devido ao consumo de drogas por adolescentes e jovens. 1.2. Delimitação do Tema Relativamente à delimitação, destacou-se dois momentos: delimitação espacial e delimitação temporária. Sustentar que, em termos espaciais o estudo realizou-se na cidade de Maputo. Especificamente a análise foi feita no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, localizado numa área verde algures no bairro Costa do 3 Sol, na cidade de Maputo. A escolha deste local deveu-se ao facto de apresentar um público-alvo com características aceitáveis para o estudo deste fenómeno. Já no que se refere a delimitação temporal, é de destacar que definiu - se um limite temporal de três anos (2016 - 2018) compreendidos como suficiente para apresentar resultados que elucidem a real situação sobre o consumo de drogas na adolescência e suas implicações psicossociais. 1.3. Contextualização Os Gregos e Romanos acreditavam que a droga não era um mal ou um bem em si, isso dependia do tipo de uso que se fizesse dela. Era necessário diferenciar entre a dose curativa e a dose fatal (a quantidade definia o uso como remédio ou veneno). As drogas eram bem toleradas pela comunidade, desde que seu uso não trouxesse conflitos sociais e individuais. Para eles, a liberdade andava de mãos dadas com a responsabilidade (para se fazer bom uso das drogas as pessoas deviam conhecer a si mesmas e ter o controlo sobre o uso). Os motivos propostos para explicar esse uso já foram de cunho religioso e místico (LESSA, 1998). As drogas eram utilizadas na antiguidade nas cerimónias e rituais, para obter prazer, diversão e experiências místicas, porém essa utilização não representava, em geral, uma ameaça, pois ainda não se sabia dos efeitos negativos que elas podiam causar. Porém na última década, o aumento siginificativo de consumidores e dos tipos de drogas usadas reflete-se em uma maior demanda para o tratamento de problemas relacionados ao abuso ou dependência de drogas. O consumo de substâncias psicoativas é um fenómeno que sempre existiu em todas as culturas humanas. As características desse consumo vêm se modificando significativamente nas últimas décadas, colocando em risco a vida demuitas pessoas, tornando-se mais um dos fatores do reflexo das transformações das nossas condições sociais e culturais. Na história da humanidade, há inúmeros registos evidenciando o uso de drogas no quotidiano. As drogas, na Antiguidade, já eram utilizadas em cerimónias e rituais para se obter prazer, diversão e experiências místicas (transcendência), (BUCHELE & CRUZ, 2011). Os indígenas utilizavam as bebidas fermentadas – álcool – em rituais sagrados e/ou em festividades sociais. Os egípcios usavam o vinho e a cerveja para o tratamento de 4 uma série de doenças, como meio para amenizar a dor e como abortivo. O ópio era utilizado pelos gregos e árabes para fins medicinais, para alívio da dor e como tranquilizante. O cogumelo era considerado sagrado por certas tribos de índios do México, que o usavam em rituais religiosos, induzindo alucinações. Os gregos e romanos usavam o álcool em festividades sociais e religiosas. Ainda hoje, o vinho é utilizado em cerimónias católicas e protestantes, bem como no judaísmo, no candomblé e em outras práticas espirituais (BUCHER, 1992), citado por (BUCHELE & CRUZ, 2011). De acordo com ESCOHOTADO (1994), citado por BUCHELE & CRUZ (2011), a utilização das drogas não representava, em geral, uma ameaça à sociedade, pois seu uso estava relacionado aos rituais, aos costumes e aos próprios valores coletivos e, de certa forma, não se sabia dos efeitos negativos que elas poderiam causar. Os estudos científicos eram inexistentes e esse uso foi raramente sendo percebido como ameaçadores à ordem social constituída, exceto durante o período da caça aos heréticos e às bruxas. Foi somente no final do século XIX e início do século XX, com a aceleração dos processos de urbanização e industrialização e com a implantação de uma nova ordem médica, que o uso e abuso de vários tipos de drogas passaram a ser problematizados. Assim, seu controle passou da esfera religiosa para a da biomedicina, inicialmente, nos grandes centros urbanos dos países mais desenvolvidos do Ocidente (MACRAE, 2007), citado por (BUCHELE & CRUZ, 2011). 1.4. Justificativa O que motivou o pesquisador a estudar este tema, implicações psicossociais do consumo de drogas e bebidas alcoólicas nos adolescentes e jovens, foi o facto de actualmente assistir-se nas mídias moçambicanas informações acerca de delinquência juvenil devido ao consumo de bebidas alcoólicas e drogas na adolescência. A adolescência se mostra como uma fase crítica na vida dos jovens, uma vez que constitui uma época de exposição e vulnerabilidade às drogas, suscitando grandes preocupações da família e da sociedade. É uma fase importante, pois é neste período em que ocorrem transformações físicas, sociais e psicológicas. Os jovens se sentem 5 independentes, surgindo os primeiros conflitos familiares, sendo este um dos motivos para o ingresso destes no mundo das drogas. O consumo de drogas na adolescência pode causar sérias alterações fisiológicas, pois o organismo é mais vulnerável tanto psíquica quanto fisicamente, sendo que as alterações provocadas podem ser transitórias (efeitos agudos), ou ter seus efeitos prolongados e muitas vezes, irreversíveis (MARQUES & CRUZ, 2000). Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2014), ocorrem cerca de 3,3 milhões de mortes no mundo pelo consumo excessivo, representando 5,9% de um total de mortes mundial. A Organização Mundial de Saúde (OMS), aponta ainda que, as drogas que têm causado maiores distúrbios orgânicos e dependência são justamente aquelas consideradas lícitas, como o álcool e o tabaco, e amplamente difundidas através de propagandas atraentes, sugerindo poder e aceitação por parte dos grupos sociais. Actualidade, sabe-se que o consumo está associado ao alívio de sofrimentos psicológicos, físicos, ou busca pelo prazer. A preocupação por parte da saúde pública está justamente no consumo excessivo e suas consequências psicossociais. (NASCIMENTO, 2014). O DSM - 5 (APA, 2013), define que a característica essencial de um transtorno por uso de substâncias consiste na presença de um agrupamento de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos indicando o uso contínuo pelo indivíduo, apesar de problemas significativos relacionados à substância. O estudo deste tema poderá contribuir no âmbito académico para os pesquisadores da área de psicologia clínica, ajudando a clarificar as implicações psicológicos e sociais do consumo excessivo de bebidas alcoólicas e drogas na adolescência. No aspecto prático pode ainda ser útil para o governo na elaboração de políticas viáveis no combate ao consumo excessivo de drogas nos jovens e adolescentes. 1.5. Problematização O consumo de drogas é um dos maiores desafios da sociedade contemporânea, pois, acaba por acarretar uma série de problemas que envolvem não só o adolescente e jovem, como também todos aqueles que mantêm contacto directo com eles tal como a família, escola e comunidade, pois as drogas interferem na elaboração do juízo de 6 valor, tornando os indivíduos que as consomem mais vulneráveis a situações de risco, como, por exemplo, a violência sexual, gravidez indesejada na adolescência, contaminação por doenças sexualmente transmissíveis, HIV/SIDA, acidentes automobilísticos, entre outros. Essa realidade vem sendo observada tanto em Moçambique, quanto em outros países e se configura como um grave problema de saúde pública. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a cada ano, cerca de dois bilhões de pessoas consomem bebidas alcoólicas, o que cor- responde a 40% da população mundial acima de 15 anos de idade, e cerca de dois milhões de pessoas morrem em decorrência das consequências negativas do uso do álcool (por exemplo, intoxicações agudas, cirrose hepática, violência e acidentes de trânsito). É importante destacar que problemas familiares, desemprego, desavenças e baixo rendimento escolar são possíveis explicações para os jovens iniciarem o uso de drogas e, por conseguinte, evoluírem para o abuso e para a dependência dessas substâncias psicoativas. Neste contexto, vale ressaltar a importância de todos nós nas acções de promoção, prevenção, educação, reabilitação e reinserção social, pois são as medidas essenciais para se trabalhar com as pessoas em risco ou que já fazem o uso de drogas. A escola tem um papel fundamental no desenvolvimento sadio do adolescente e do adulto, pois contribui para a formação global dos mesmos e da sociedade em geral. Daí a importância de se trabalhar na prevenção nesse espaço, lembrando que prevenir consiste em educar adolescentes e jovens capacitando-os para desenvolverem sua identidade, a educação intelectual e emocional, incentivar a cidadania, a responsabilidade social e possibilitar que eles incorporem hábitos saudáveis no seu quotidiano. A educação tem possibilidade de estimular a capacidade de percepção, reflexão e articulação dos jovens frente ao tema, proporcionando, dessa forma, que se tornem sujeitos de acções mais assertivas e cuidadosas com respeito a sua vida, seu corpo e sua saúde física e mental. Para perceber esta problemática, levantamos a seguinte questão de pesquisa: Que Implicações Psicossociais podem surgir nos Jovens e Adolescentes devido ao consumo abusivo de Substancias Psicoativas? 7 1.6. Hipóteses De acordo com Gil (1999), hipótese é uma proposição que pode ser colocada à prova para determinar sua validade. Neste sentido, hipótese é uma suposta resposta ao problema a ser investigado. A origem das hipóteses poderia estar na observação assistemática dos factos, nos resultados de outras pesquisas, nas teorias existentes, ou na simples intuição. H1: O consumo de Substancias psicoativas tem implicações psicológicas e sociais negativas na vida dos Adolescentes e Jovens, acolhidos no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, cidade de Maputo. H2: O consumo de Substancias psicoativas, não tem implicações psicológicas e sociais na vida dos Adolescentes e Jovens, acolhidosno Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, cidade de Maputo. 1.7. Objectivos 1.7.1. Objectivo Geral Avaliar as implicações Psicológicas e Sociais, associados ao Consumo de Substancias psicoativas por parte de Adolescentes e Jovens, especificamente no Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, cidade de Maputo. 1.7.2. Objectivos Específicos Identificar os efeitos psicológicos e sociais do consumo Substancias psicoativas e Jovens e Adolescentes consumidores de drogas na Associação REMAR da cidade de Maputo. Caracterizar as atitudes face ao Substancias psicoativas por parte dos jovens e adolescentes, especificamente na Associação REMAR da cidade de Maputo; Conceder uma proposta de intervenção em educação para a saúde, no âmbito da prevenção ao consumo de substâncias psicoativas nos Jovens e Adolescentes na Associação REMAR da cidade de Maputo 8 CAPITULO - II: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E CONCEPTUAL Esta secção apresenta as definições dos conceitos que consideramos consentâneas para o entendimento das palavras-chave desta pesquisa. A apresentação destas definições visa, essencialmente, clarificar as concepções teóricas fundamentais, que permitam a compreensão das ideias-chave que corporizam este estudo. 2.1. Definição de Conceitos 2.1.1. Adolescência De acordo com Rodrigues e Krindges (2017), a adolescência é considerada um estágio marcado por adaptações psíquicas e orgânicas, com a presença de busca de identidade, instabilidade, independência individual e auto-afirmação. A adolescência é o amadurecimento físico, e as transformações que ocorrem na puberdade, influenciam no amadurecimento emocional. Essas mudanças da puberdade geram enorme conflito, o que contribui para o amadurecimento emocional. É nesse momento que surgem os lutos. Partindo desse pressuposto, percebe-se que todos esses conflitos levam o adolescente ou jovem a buscar algo que ele considere capaz de “resolver” os seus “problemas”, achando, muitas vezes, no álcool e outras drogas o refúgio, sem contar com tantos outros fatores, que os influenciam, a saber: os amigos, curiosidade, diversão, problemas na família, falta de informação, entre outros. Em razão da busca por desafios e novas experiências, os adolescentes podem apresentar comportamentos de risco, ou seja, atitudes que ameaçam a saúde mental ou física, como aquelas que provocam lesões, violência, uso de álcool e outras drogas e comportamento sexuais de risco (ZAPPE, 2014), citado por (RODRIGUES & KRINDGES, 2017). 2.1.2. Drogas Droga - segundo a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2015), é qualquer substância não produzida pelo organismo que tem a propriedade de atuar sobre um ou mais de seus sistemas, produzindo alterações em seu funcionamento. Uma droga não é por si só boa ou má. Existem substâncias que são usadas com a finalidade de produzir efeitos benéficos, como o tratamento de doenças, e são consideradas medicamentos. Mas também existem substâncias que provocam 9 malefícios à saúde, os venenos ou tóxicos. É interessante que a mesma substância pode funcionar como medicamento em algumas situações e como tóxico em outras. A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD, 2006), define como substâncias que produzem mudanças nas sensações, no grau de consciência e no estado emocional das pessoas. A droga psicoativa, é qualquer substância de várias fontes que após sua ingestão, produz alterações no estado de consciência, o humor, a percepção, o desempenho físico ou mental. Seu uso continuado faz com que diferentes graus de dependência e, eventualmente, a deterioração das funções mentais. Consumo se refere ao uso (fumada, inalada, aspirada, injetada, deglutição, mastigação, etc.) que as pessoas fazem de substâncias psicoativas, sejam elas legais ou ilegais, com ou sem receita médica (NAVIA-BEM, et. al, 2011). Sem dúvida a droga é um problema social de grande repercussão local, nacional e porque não dizer internacional. OLIVEIRA (2001, p.12-13), afirma que: "O nosso mundo está uma droga. A nossa sociedade é uma sociedade drogada. Somos todos vítimas dessas drogas. Que droga? Essa substância que nós ingerimos para nos dar prazer, tirar dor, fazer sair do mundo, fazer viajar. Buscamos isto na maconha, álcool, cocaína, crack, heroína, cola de sapateiro, cogumelo, tantas drogas que estão aí, as drogas que compramos na farmácia para ajudar a dormir, para ajudar a não dormir etc. São drogas que estão dentro da nossa sociedade. E a pergunta que nos colocamos, hoje, é como viver numa sociedade que não precise de drogas? Ou como viver numa sociedade onde estas drogas estejam sob controlo, apenas para remediar situações que não têm outro jeito, senão por alguns meios artificiais". 2.1.3. Álcool Para SENAD1 (2008), o álcool etílico é um produto da fermentação de carboidratos (açúcares) presentes em vegetais, como a cana-de-açúcar, a uva e a cevada. Suas propriedades euforizantes e intoxicantes são conhecidas desde tempos pré-históricos e praticamente todas as culturas têm ou tiveram alguma experiência com sua utilização. É seguramente a droga psicotrópica de uso e abuso mais amplamente disseminada em grande número e diversidade de países na atualidade. 1 Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas 10 A fermentação produz bebidas com concentração de álcool de até 10% (proporção do volume de álcool puro no total da bebida). São obtidas concentrações maiores por meio de destilação. Em doses baixas, é utilizado, sobretudo, por causa de sua ação euforizante e da capacidade de diminuir as inibições, o que facilita a interação social. Há uma relação entre os efeitos do álcool e os níveis da substância no sangue, que variam em razão do tipo de bebida utilizada, da velocidade do consumo, da presença de alimentos no estômago e de possíveis alterações no metabolismo da droga por diversas situações – por exemplo, na insuficiência hepática, em que a degradação da substância é mais lenta (SENAD, 2008). 2.1.4. O Consumo de Álcool na Adolescência O álcool é uma das substâncias psicoativas mais precocemente consumidas pelos adolescentes. O seu consumo excessivo está associado a uma série de consequências nocivas na adolescência e tem, também repercussões para o resto da vida. Estão associados ao álcool valores e mitos que são aceites e interiorizados desde a socialização na infância. Para muitos adolescentes o consumo de bebidas alcoólicas, é considerado um ritual de passagem para a vida adulta (CORDEIRO, 2009), citado por (RAMOS, 2012). O mesmo autor refere ainda que, os adolescentes bebem porque é relaxante, porque acham que ficam mais “sexys”, sentem-se mais confiantes, mais sociáveis e porque o consumo ajuda a esquecer as preocupações e aborrecimentos entre outros. Para Ramos (2012), o consumo de álcool em idades precoces é preocupante, poiso sistema biológico ainda não apresenta capacidade para proceder à degradação do álcool, levando a alterações cerebrais e défices neuro -cognitivos com implicações para a aprendizagem e para o seu desenvolvimento. Pode ainda, influenciar de forma directa, a médio e a longo prazos, a saúde física e mental, e relacionar-se, a curto prazo, com a diminuição do rendimento escolar e conduzir ao envolvimento em comportamentos de risco para a saúde, nomeadamente no âmbito de comportamentos sexuais de risco. Ainda segundo Cordeiro (2009, p.408), citado por Ramos (2012), o consumo excessivo de álcool pode contribuir para um menor uso do preservativo, aumentando assim o risco de gravidez indesejada e infecções de transmissão sexual, dado que a 11 vítima fica mais fragilizada após a ingestão e o agressor mais desinibido. O consumo excessivo de álcool é também responsável pelo aumento da agressividade e assédio sexual, afectando ainda a capacidade de auto controlo e a percepção da realidade. A ingestão de bebidas alcoólicas para além de estar associada a comportamentos de risco sexual; ao nível da condução é responsávelpor acidentes de viação e está também associado a outros problemas de saúde. 2.1.5. Definições Sobre Padrões de Consumo do Álcool De acordo com Silveira (2011), a grande maioria das pessoas que bebem o faz de forma moderada. Há, contudo, evidências de que o “beber pesado” tem-se tornado cada vez mais frequente tanto em homens como em mulheres. Dessa forma, o aparecimento de problemas decorrentes desse padrão de beber é cada vez mais comum, mesmo em indivíduos que não apresentam o diagnóstico de dependência alcoólica. Quando os problemas provenientes do uso abusivo do álcool se tornam frequentes em diversas áreas de atuação do indivíduo (por exemplo: família, trabalho, saúde física), então, devemos investigar critérios para abuso e dependência do álcool. Os principais padrões de consumo de álcool mencionados na literatura científica são o uso moderado de álcool e abuso ou dependência de álcool, detalhados a seguir. 2.1.6. Uso Moderado de Álcool O uso moderado de bebidas alcoólicas é um conceito difícil de definir, na medida em que é interpretado de maneira diferente de acordo com a percepção de cada indivíduo. Comumente essa definição é confundida com beber socialmente, que significa o uso de álcool dentro de padrões aceites pela sociedade. Ademais, com frequência, a moderação é vista de maneira errônea como uma forma de uso de álcool que não traz consequências adversas ao consumidor (SILVEIRA, 2011). A Organização Mundial de Saúde (OMS, 2015), estabelece que, para se evitarem problemas com o álcool, o consumo aceitável é de até 15 doses/semana para os homens e 10 doses/semana para as mulheres, sendo que uma dose equivale, aproximadamente, a 350ml de cerveja, 150ml de vinho ou 40ml de uma bebida destilada, e cada uma dessas contém 10 a 15 g de etanol. 12 2.1.7. Critérios Diagnósticos de Uso Nocivo ou Abuso de Drogas A CID-10 da OMS (1993), define uso nocivo como “um padrão de uso de substâncias psicoativas que está causando dano à saúde”, podendo ser esse de natureza física ou mental. A presença da síndrome de abstinência ou de transtornos mentais relacionados ao consumo, como demência alcoólica, exclui esse diagnóstico. Atentos ao quadro a seguir: Quadro - 1: Critérios do CID-10 para uso nocivo (abuso) de substâncias psicoativas O diagnóstico requer que um dano real deva ter sido causado à saúde física e mental do usuário. Padrões nocivos de uso são frequentemente criticados por outras pessoas e estão associados a consequências sociais diversas de vários tipos. O facto de um padrão de uso ou uma substância em particular não ser aprovado por outra pessoa, pela cultura ou por ter levado a consequências socialmente negativas, tais como prisão ou brigas conjugais, não é por si mesmo evidência de uso nocivo. O uso nocivo não deve ser diagnosticado se a síndrome de dependência, um transtorno psicótico ou outra forma específica de transtorno relacionado ao uso de drogas ou álcool está presente. Fonte: CID -10 (1993). Ainda segundo o CID-10, o uso nocivo deve ter três ou mais das seguintes manifestações ocorrendo conjuntamente por pelo menos um mês ou, se persistirem por períodos menores que um mês, devem ter ocorrido juntas de forma repetida em um período de 12 meses: 1. Forte desejo ou compulsão para consumir a substância; 2. Comprometimento da capacidade de controlar o início, término ou níveis de uso, evidenciado pelo consumo frequente em quantidades ou períodos maiores que o planeado ou por desejo persistente ou esforços infrutíferos para reduzir ou controlar o uso; 3. Estado fisiológico de abstinência quando o uso é interrompido ou reduzido, como evidenciado pela síndrome de abstinência característica da substância ou pelo uso desta ou similar para aliviar ou evitar tais sintomas; 13 4. Evidência de tolerância aos efeitos, necessitando de quantidades maiores para obter o efeito desejado ou estado de intoxicação ou redução acentuada desses efeitos com o uso continuado da mesma quantidade; 5. Preocupação com o uso, manifestada pela redução ou abandono das atividades prazerosas ou de interesse significativo por causa do uso ou do tempo gasto em obtenção, consumo e recuperação dos efeitos; 6. Uso persistente, a despeito de evidências claras de consequências nocivas, evidenciadas pelo uso continuado quando o sujeito está efetivamente consciente (ou espera-se que esteja) da natureza e extensão dos efeitos nocivos. 2.1.8. Critérios Diagnósticos da Dependência de Substâncias Psicoativas A dependência é uma relação disfuncional entre um indivíduo e seu modo de consumir uma determinada substância psicotrópica. A avaliação inicial começa pela identificação dos sinais e sintomas que caracterizam tal situação (EDWARDS, 1999). A seguir a tabela -2 dos Critérios diagnósticos da dependência de substâncias psicoativas: 14 Quadro - 2: Critérios diagnósticos da dependência de substâncias psicoativas Compulsão para o consumo A experiência de um desejo incontrolável de consumir uma substância. O indivíduo imagina-se incapaz de colocar barreiras a tal desejo e sempre acaba consumindo. Aumento da tolerância A necessidade de doses crescentes de uma determinada substância psicoativa para alcançar efeitos originalmente obtidos com doses mais baixas. Síndrome de abstinência O surgimento de sinais e sintomas de intensidade variável quando o consumo de substância psicoativa cessou ou foi reduzido. Alívio ou evitação da abstinência pelo aumento do consumo O consumo de substâncias psicoativas visando ao alívio dos sintomas de abstinência. Como o indivíduo aprende a detectar os intervalos que separam a manifestação de tais sintomas, passa a consumir a substância preventivamente, a fim de evitá-los. Relevância do consumo O consumo de uma substância torna-se prioridade, mais importante do que coisas que outrora eram valorizadas pelo indivíduo. Estreitamento ou empobrecimento do repertório A perda das referências internas e externas que norteiam o consumo.À medida que a dependência avança, as referências voltam-se exclusivamente para o alívio dos sintomas de abstinência, em detrimento do consumo ligado a eventos sociais. Além disso, passa a ocorrer em locais onde sua presença é incompatível, como por exemplo o local de trabalho. Reinstalação da síndrome de dependência O ressurgimento dos comportamentos relacionados ao consumo e dos sintomas de abstinência após um período de abstinência. Uma síndrome que levou anos para se desenvolver pode se reinstalar em poucos dias, mesmo o indivíduo tendo atravessado um longo período de abstinência. Fonte: CID-10 (1993) Todo critério diagnóstico possui níveis de gravidade. Os critérios diagnósticos de dependência possuem níveis de gravidade distintos para cada caso. Após identificar a 15 presença destes critérios no padrão de consumo de um indivíduo, o segundo passo é determinar sua gravidade. Esta análise é fundamental para individualizar o diagnóstico e colectar subsídios para o planeamento terapêutico (EDWARDS, 1999). 2.1.9. Diferenças entre os Termos Alcoólatra e Alcoolista Para Silveira (2011), os termos alcoólatra e alcoolista são usados, quase que indistintamente pela comunidade científica e pelo público leigo, para definir a “dependência do álcool”. O termo alcoólatra foi utilizado, por muitos anos, para designar aqueles indivíduos que bebiam abusivamente e que, por conta disso, tinham uma série de problemas decorrentes do uso do álcool. O uso do termo alcoólatra é inadequado, pois confunde o dependente do álcool com alguém que idolatra o álcool e, por conta disso, “escolhe” ou “opta” continuar fazendo uso da substância a despeito dos problemas que ela gera para o bebedor e para seus familiares. O termo “alcoólatra”, portanto, estigmatiza e rotula o bebedor como alguém que está fadado a uma condição de depreciação, fraqueza e falta de escolhas, pois privilegia o álcool acima de todas as coisas. Essa condição não é verdadeira, visto que, quando a dependênciaestá instalada, em muitas ocasiões, o indivíduo bebe para minimizar os efeitos da abstinência, e não para ter prazer (SILVEIRA, 2011). O termo alcoolista, por sua vez, é proposto por alguns pesquisadores como uma alternativa menos estigmatizante, visto que o termo coloca o indivíduo como alguém que tem “afinidade” pelo álcool e não é seduzido por ele. O termo alcoolista foi utilizado em substituição ao termo alcoólatra a fim de não responsabilizar unicamente o bebedor pelos problemas decorrentes do uso do álcool, mas sim reconhecer que o álcool é uma substância lícita, socialmente aceita e disponível; todavia, quando utilizada em grandes quantidades e frequências, expõe o bebedor a muitos riscos. (SILVEIRA, 2011). 2.1.10. Experimentação, Uso, Abuso e Dependência de Drogas Duarte e Morihisa (2011), a 10ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID - 10), apresenta descrições clínicas e diretrizes diagnósticas das doenças que conhecemos e é utilizada por nosso sistema de saúde pública. Outro sistema classificatório bem conhecido em nosso meio é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM - 4), da Associação Psiquiátrica Americana. Ambos os 16 sistemas classificatórios refletem, nos seus critérios para dependência, os conceitos de Síndrome de Dependência do Álcool. Interessante é que o diagnóstico da Síndrome de Dependência do Álcool pode estabelecer níveis de comprometimento ao longo de um contínuo, entre o nunca ter experimentado até o gravemente enfermo, considerando os aspectos do grau de dependência relacionado com o grau de problemas (DUARTE & MORIHISA, 2011). Esse conceito de dependência transcende o modelo moral, que considerava beber excessivamente falha de caráter e, até mesmo, o modelo de doença “alcoolismo”, diagnóstico categorial, em que só se pode variar entre ser ou não portador da doença, sem permitir graduações de gravidade dos quadros; no qual a perda do controle, a presença de sintomas de tolerância e abstinência determinam o indivíduo como sendo ou não alcoolista (dependente de etílicos) (DUARTE & MORIHISA, 2011). 2.1.11. Abuso ou Uso Nocivo de Drogas Pode ser entendido como um padrão de uso que aumenta o risco de consequências prejudiciais ao usuário. A Classificação Internacional de Doenças (CID) utiliza o termo “uso nocivo”, referindo-se ao uso de drogas que resulta em dano físico ou mental, enquanto o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) emprega o termo “abuso”, o qual engloba também as consequências sociais. Para uma melhor comparação, veja o Quadro 1, apresentado na página a seguir: 17 Quadro - 3: Comparação entre critérios de abuso e uso nocivo da DSM-IV e CID-10 DSM-IV CID-10 ABUSO USO NOCIVO Um ou mais dos seguintes sintomas, ocorrendo no período de 12 meses, sem nunca preencherem critérios para dependência: Uso recorrente, resultando em fracasso em cumprir obrigações importantes relativas a seu papel no trabalho, na escola ou em casa. Uso recorrente em situações nas quais isso representa perigo físico. Problemas legais recorrentes relacionados à substância. Uso continuado, apesar de problemas sociais ou interpessoais, persistentes ou recorrentes, causados ou exacerbados pelos efeitos da substância. Evidência clara de que o uso foi responsável (ou contribuiu consideravelmente) por dano físico ou psicológico, incluindo capacidade de julgamento comprometida ou disfunção de comportamento. A natureza do dano é claramente identificável. O padrão de uso tem persistido por, pelo menos, um mês ou tem ocorrido repetidamente dentro de um período de 12 meses. Não satisfaz critérios para qualquer outro transtorno relacionado à mesma substância no mesmo período (exceto intoxicação aguda). Fontes: DSM-IV e CID-10 18 Quadro - 4: Comparação entre os critérios para dependência da DSM-IV e CID-10 DSM-IV CID-10 Padrão mal adaptativo de uso, levando a prejuízo ou sofrimento clinicamente significativos, manifestados por três ou mais dos seguintes critérios, ocorrendo a qualquer momento no mesmo período de 12 meses: 1. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos: a. Necessidade de quantidades progressivamente maiores para adquirir a intoxicação ou efeito desejado; b. Acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma quantidade. 2. Abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos: a. Síndrome de abstinência característica para a substância; b. A mesma substância (ou uma substância estreitamente relacionada) é consumida para aliviar ou evitar sintomas de abstinência. 3. A substância é frequentemente consumida em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido. 4. Existe um desejo persistente ou esforços mal sucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso. 5. Muito tempo é gasto em actividades necessárias para a obtenção e utilização da substância ou na recuperação de seus Três ou mais das seguintes manifestações ocorrendo conjuntamente por pelo menos um mês ou, se persistirem por períodos menores que um mês, devem ter ocorrido juntas de forma repetida em um período de 12 meses: 1. Forte desejo ou compulsão para consumir a substância. 2. Comprometimento da capacidade de controlar o início, término ou níveis de uso, evidenciado pelo consumo frequente em quantidades ou períodos maiores que o planeado ou por desejo persistente ou esforços infrutíferos para reduzir ou controlar o uso. 3. Estado fisiológico de abstinência quando o uso é interrompido ou reduzido, como evidenciado pela síndrome de abstinência característica da substância ou pelo uso desta ou de outra similar para aliviar ou evitar tais sintomas. 4. Evidência de tolerância aos efeitos, necessitando de quantidades maiores para se obter o efeito desejado, ou estado de intoxicação ou redução acentuada destes efeitos com o uso continuado da mesma quantidade. 5. Preocupação com o uso, manifestado pela redução ou abandono das atividades prazerosas ou de interesse significativo, por causa do uso ou do tempo gasto em 19 efeitos. 6. Importantes actividades sociais, ocupacionais ou recreativas são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso. 7. O uso continua, apesar da consciência de se ter um problema físico ou psicológico, persistente ou recorrente, que tende a ser causado ou exacerbado pela substância. obtenção, consumo e recuperação dos efeitos. 6. Uso persistente, a despeito de evidências claras de consequências nocivas, evidenciadas pelo uso continuado quando o sujeito está efetivamente consciente (ou se espera que esteja) da natureza e extensão dos efeitos nocivos. Fontes: DSM-IV e CID-10 Como síntese, podemos observar que os transtornos causados pelo uso de substâncias psicoativas, com todas as suas características e consequências biopsicossociais, apresentam-se, na actualidade, como um grave problema de saúde pública. O conhecimento dos padrões de uso de substâncias psicoativas é importante para estabelecer o melhor programa terapêutico para indivíduos usuários/dependentes, além de permitir diagnóstico e classificação acurados. 2.1.12. Critérios para o Diagnóstico de dependência do Álcool (Alcoolismo) A décima versão da Classificação Internacional das Doenças (CID-10) estabelece os seguintes critérios para diagnosticar a dependência do álcool (alcoolismo): 1. Desejo intenso ou compulsão para ingerir bebidas alcoólicas. 2. Tolerância: necessidade de doses crescentes de álcool para atingir o mesmo efeito obtido com doses anteriormente inferiores ou efeito cada vez menor com uma mesma dose da substância; 3. Abstinência: síndrome típica e de duração limitada que ocorre quando o uso do álcool é interrompido ou reduzido drasticamente. 4. Aumento do tempo empregado em conseguir, consumir ou recuperar-se dos efeitos da substância; abandono progressivo de outros prazeres ou interesses devido ao consumo. 5. Desejo de reduzir ou controlar o consumodo álcool com repetidos insucessos. 20 6. Persistência no consumo de álcool mesmo em situações em que o consumo é contraindicado ou apesar de provas evidentes de prejuízos, tais como, lesões hepáticas causadas pelo consumo excessivo de álcool, humor deprimido ou perturbação das funções cognitivas relacionada ao consumo do álcool. Segundo o CID-10, para que se caracterize dependência, pelo menos três critérios devem estar presentes em qualquer momento durante o ano anterior. 2.1.13. Factores que Levam ao Uso de Drogas A família tem um papel fundamental no desenvolvimento do ser humano, ela é a sua primeira referência, é a mediadora entre o indivíduo e a sociedade, porém existem outras condições prexistentes que podem influenciar o desenvolvimento psicológico, físico e social do indivíduo, determinando o seu comportamento frente ao consumo ou não das drogas. Segundo Formigone e Monteiro (1997), algumas culturas seguem rituais estabelecidos de onde, quando e como beber, tendo essas menores taxas de uso abusivo de álcool, quando comparadas com aquelas que simplesmente proíbem o uso. Assim, é aceito que a cultura se constitui como um importante factor determinante na proporção de alcoolistas/ alcooltras. Além disso, alguns fatores de risco ou de proteção podem contribuir para o uso de álcool e outras drogas na comunidade. A SENAD (2006), aponta vários exemplos desses factores de risco e de proteção para o uso de álcool e outras drogas no domínio comunitário, como podemos apreender no quadro abaixo: 21 Quadro - 5: Factores de Risco e Facores de Protecção para o uso de Álcool e outras Drogas. Domínio individual Factores de Risco Factores de protecção Falta de oportunidades sócio-económicas para a construção de um projecto de vida. Existência de oportunidades de estudo, trabalho, lazer e de inserção social que possibilitem ao indivíduo concretizar seu projecto de vida. Fácil acesso as drogas lícitas e ilícitas. Controle efectivo do comércio de drogas legais e ilegais. Permissividade em relação a algumas drogas. Reconhecimento e valorização, por parte da comunidade, de normas e leis que regulam o uso de drogas. Inexistência de incentivos para que o jovem se envolva em serviços comunitários. Incentivos ao envolvimento dos jovens em serviços comunitários. Negligência no cumprimento de normas e leis que regulam o uso de drogas. Realização de campanhas e ações que ajudem o cumprimento das normas e leis que regulam o uso de drogas. Fonte: SENAD, (2006) 22 2.1.14. Factores de Risco e de Proteção no Domínio dos Pares Nesta dimensão, fazem parte os amigos e pessoas de convívio próxi-mo, que podem influenciar, dependendo da forma como pensam sobre o uso de droga e dos ambientes que frequentam. Quadro - 6: Factores de Risco e Facores de Protecção no Domínio dos Pares Domínio dos Pares Factores de Risco Factores de Protecção Pares que usam álcool/drogas, ou ainda que aprovam e/ou valorizam o seu uso Pares que não usam álcool/drogas e não aprovam e/ou valorizam o seu uso Dificuldade de participação em grupos de pares que desenvolvam atividades recreativas, desportivas e laborais tidas como saudáveis Participação em atividades desportivas, laborais e recreativas saudáveis juntamente com seus pares Dificuldade de pertencimento a grupos de iguais na escola e na comunidade Pertencimento a grupos de iguais na escola e na comunidade Dificuldade em aceitar autoridade que não compartilhe de determinações do seu grupo de pares Aceitação de autoridade situada fora do grupo de pares, na escola, na comunidade e na família Não participação em grupos com objectivos sociais e comunitários Participação em grupos com objetivos sociais e comunitários Fonte: SENAD, (2006) 2.1.15. Factores de Risco e de Proteção no Domínio Familiar Neste domínio, os fatores de risco e de proteção referem-se a forma como está estruturada a família e o seu funcionamento, isto é, se os papéis e as regras estão claros e definidos, a seguir o quadro dos Factores de Risco e de Proteção no Domínio Familiar: 23 Quadro - 7: Factores de Risco e de Proteção no Domínio Familiar Domínio Familiar Factores de Risco Factores de Protecção Uso de álcool e outras drogas pelos pais ou familiares Valorização de um padrão de vida saudável na família Isolamento social entre os membros da família Existência de vinculação familiar, boa interação entre os membros da família Frágeis laços afectivos entre os membros da família Existência de fortes vínculos afectivos entre os membros da família Falta de estímulo da família para os estudos, lazer e outras práticas laborais Estímulo da família quanto à educação formal Relações conflituosas, excessivamente autoritárias ou permissivas entre os membros da família Predomínio de um estilo compreensivo de vida, sem autoritarismo ou permissividade, mas com limites Falta de diálogo e de comunicação entre pais, cônjuges, companheiros e filhos Diálogo constante e comunicação eficiente entre cônjuges e companheiros, entre pais e filhos; e troca de informações entre os membros da família sobre as suas rotinas e práticas diárias Ausência e descontinuidade de critérios na aplicação de regras familiares Presença e constância de critérios claros na aplicação de regras disciplinares, desenvolvimento de valores e compartilhamento de tarefas no lar Falta de interesse dos pais pelas conquistas dos filhos e na participação de seus sucessos e fracassos Demonstração de interesse pela vida dos filhos e participação dos pais em seus sucessos ou fracassos Incoerência e incongruência dos pais quanto ao padrão educacional a ser adotado para os filhos Coerência e congruência dos pais quanto ao padrão educacional a ser adotado para os filhos Expectativas negativas em relação aos filhos ou mesmo aos cônjuges e companheiros Expectativas positivas em relação aos filhos e aos demais membros da família 24 Pais que não fornecem um bom modelo, não sabendo transmitir as normas e valores morais e sociais socialmente aceitáveis Presença dos pais como modelo positivo quanto às questões sociais e morais; cultivo de valores familiares Tolerância com relação ao uso de drogas pelos jovens Postura clara e assertiva quanto ao uso de drogas pelos membros da família Ausência de normas e limites claros no ambiente familiar Presença de normas e limites claros no ambiente familiar Fonte: SENAD (2006) 25 2.1.16. Factores de Risco e de Proteção no Domínio Comunitário Fazem parte dos factores deste domínio, a disponibilidade da droga, a facilidade em obtê-la, a falta de fiscalização das leis que já existem, o número de pontos de vendas, entre outros. Quadro – 8: Factores de Risco e de Proteção no Domínio Comunitário Domínio Comunitário Factores de Risco Factores de Protecção Falta de oportunidades sócio-económicas para a construção de um projeto de vida Existência de oportunidades de estudo, de trabalho, de lazer e de inserção social que possibilitem ao indivíduo concretizar seu projeto de vida Fácil acesso às drogas lícitas e ilícitas Controle efectivo do comércio de drogas legais e ilegais Permissividade em relação a algumas drogas Reconhecimento e valorização, por parte da comunidade, de normas e leis que regulam o uso de drogas Inexistência de incentivos para que o jovem se envolva em serviços comunitários Incentivos ao envolvimento dos jovens em serviços comunitários Negligência no cumprimento de normas e leis que regulam o uso de drogas Realização de campanhas e ações que ajudem o cumprimento das normas e leis que regulam o uso de drogas Fonte: SENAD (2006) Um dos grandes problemas sociais frente ao uso de bebidas alcoólicas e outras drogas é marcado pela contradição do lícito e do ilícito (LORENCINI, 1998). As mídias acompanham essas contradições. A população recebe através dos meios de comunicação muitas informações sobre a violência relacionada ao tráfico de drogas, porém,por outro lado a mesma tem sido estimulada ao consumo de bebidas alcoólicas pela propaganda. 26 Diante desse quadro é importante não perder de vista os detalhes socio-culturais do uso de drogas para compreender e identificar as características dos usuários, para melhor adotar sistemas de prevenção e combate. Cada grupo social, cada povo, cada pessoa, tem em sua cultura padrões de comportamento de acordo as diferentes formas de estímulos, produzidos em seu meio ou fora dele. Então é contraditório tentar combater o que na maioria das vezes é incentivado pelo grupo social, pela mídia, pela cultura comunitária, entre outras. 2.1.17. As Drogas e Seus Efeitos Segundo SENAD (2006), para uma compreensão ampla dos efeitos das drogas é necessário considerar a interrelação existente entre as características da droga, as do usuário e as características do contexto. Além dos efeitos psicotrópicos causados pelas diferentes drogas, ou seja, dos efeitos químicos específicos do produto na actividade do Sistema Nervoso Central, destacamos os outros factores que interferem nas sensações e no comportamento do usuário. Estes outros fatores dizem respeito ao usuário e o lugar que este se encontra. É primordial considerar o que cada pessoa sente e busca quando faz uso de drogas, pois neste consumo está presente as crenças das pessoas sobre o que vão obter a partir disto. Outro factor de destaque é o lugar onde este consumo se realiza. Diz respeito às condições do ambiente, que também vão interferir no resultado final, ou seja, no efeito que a pessoa irá sentir. Compreender estes aspectos presentes na pessoa do usuário, no lugar onde o consumo se dá, nas crenças e valores presentes, possibilita uma intervenção mais adequada tanto na prevenção do uso indevido de drogas como no tratamento e na reinserção social. Se por um lado não se pode reduzir a avaliação dos usuários de drogas, considerando apenas os efeitos da substância psicoativa consumida, por outro, deve-se conhecer esses efeitos, ou seja, a dimensão toxicológica de cada droga. (SENAD, 2006). 27 2.1.18. As Drogas e Seus Efeitos no Sistema Nervoso Central A Organização Mundial de Saúde – OMS (1993), possui uma classificação de substâncias consideradas drogas, capazes de produzir alterações no funcionamento do cérebro. Esta classificação faz parte da Classificação Internacional de Doenças da OMS e está na sua 10ª revisão, sendo designada por CID-10. A lista de substâncias na Classificação Internacional de Doenças, 10ª Revisão (CID-10), em seu capítulo V (Transtornos Mentais e de Comportamento), inclui: Álcool; Opióides (morfina, heroína, codeína, diversas substâncias sintéticas); Canabinóides (maconha); Sedativos ou hipnóticos (barbitúricos, benzodiazepínicos); Cocaína; outros estimulantes (como anfetaminas e substâncias relacionadas à cafeína); Alucinógenos; Tabaco; Solventes voláteis. Estimulantes (cafeína), entre outras. Apresentamos, a seguir, uma classificação baseada nos efeitos das substâncias psicoativas no Sistema Nervoso Central, considerada a mais abrangente e também a mais utilizada. Essa classificação é de interesse didático e se baseia nas acções aparentes das drogas sobre o Sistema Nervoso Central (SNC), conforme as modificações observáveis na actividade mental: Álcool; Barbitúricos (calmantes e sedativos); Opióides (ex: morfina); Benzodia-zepínicos (medicamentos para reduzir a ansiedade); Solventes ou inalantes (ex: cola desapateiro, esmalte, lança perfume). Drogas estimuladoras da actividade mental: Anfetaminas (ex: medicamentos para diminuir o apetite); Tabaco; Cocaína (Crack, merla); Cafeína, dentre outras. Drogas perturbadoras da atividade mental: Maconha; Alucinógenos; Ecstasy (anfetamina potencializada); LSD; Anticolinérgicos (ex: lírio, trombeta, saia branca, zabumba). 28 2.1.19. Implicações Psicossociais do Abuso de Bebidas Alcoólicas Muitos acontecimentos violentos e rupturas sociais estão relacionados ao uso e abuso de álcool e outras drogas, os quais podemos citar: homicídios, atropelamentos, acidentes de trânsito, agressões, dentre outros. Os noticiários policiais e rodoviários divulgados pelas mídias televisivas Miramar, STV e TVM, todos os dias mostram que a maioria das ocorrências é nos finais de semana, quando se eleva o uso de álcool, que é a droga lícita mais consumida. As drogas lícitas são substâncias que podem ser produzidas, comercializadas e consumidas sem problema algum. Apesar dessas trazerem prejuízos aos órgãos do corpo são liberadas por lei e aceitas pela sociedade. Essas são as mais consumidas e as que resultam em fatalidades diárias, já que através das alterações realizadas no organismo um indivíduo perde o controlo e acaba por fazer coisas que no seu estado normal não faria. As drogas, além de prejudicar a saúde mental, trazem sérios transtornos físicos para o ser humano, principalmente para aqueles que estão em fase de desenvolvimento. O álcool, por exemplo, torna o raciocínio e a coordenação motora lentos e compromete a capacidade de avaliar riscos (SENAD, 2006). As consequências do consumo disfuncional de bebida alcoólica e outras drogas podem comprometer à saúde física e psicológicas, além de influenciar perdas sociais e económicas importantes para indivíduos (GARCIA & FREITAS, 2015). Além de diversos problemas de saúde provocados pelo consumo excessivo de drogas, o alcoolismo também causa problemas sociais graves que está diretamente relacionado à violência no trânsito, violência doméstica, abandono escolar e abandono do emprego, ou seja, causando perdas financeiras e consequentemente familiares, (CISA, 2013), citado por (SILVA, 2014). Segundo CONASS (2007), citado por Silva (2014), o órgão mais afetado pelo alcoolismo é o fígado, entretanto observam-se problemas em todo o organismo como: cérebro, coração, trato digestivo, sangue e as glândulas. As doenças decorrentes do alcoolismo são muito graves, podendo ser crónicas e até levar o indivíduo à morte. Além de diversos problemas de saúde provocados pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas, o alcoolismo também causa problemas sociais graves que está diretamente relacionado à violência no trânsito, violência doméstica, abandono escolar e abandono 29 do emprego, ou seja, causando perdas financeiras e consequentemente familiares (CISA, 2013), citado pelo (SILVA, 2014). O uso do álcool traz ainda sérios prejuízos para o corpo humano, tais como: gastrite úlcera, hepatite alcoólica, cirrose, câncer no fígado, anemia, alterações de coagulação sanguínea, aumento da pressão arterial, insuficiência cardíaca, maior risco de acidente vascular encefálico, alterações na menstruação e muitas outras complicações de saúde (SENAD, 2008). 2.1.20. Prevenção do Uso de Drogas Para prevenir o uso de drogas, é importante conhecer os efeitos que elas causam, suas diferentes classificações e as consequências de seu uso. 2.1.21. Os Meios de Comunicação, a Prevenção e a Responsabilidade Social Apesar de diversos estudos apontarem os limites das intervenções preventivas puramente informativas sobre o uso de drogas, parece ser inegável a importância de seu papel. Como mencionado anteriormente, os meios de comunicação têm prestado auxílio a vários programas de saúde, seja por meio das informações jornalísticas, seja por meio das campanhas publicitárias elaboradas, especificamente, com essa finalidade. Quando se trata, no entanto, do uso de drogas, os recursos da mídia vêm sendo pouco estudados e explorados como instrumentos de prevenção. Em uma pesquisa qualitativa sobre a atitude dos jornalistas, Mastroianni (2006) observou que os profissionais consideravam superficial a cobertura sobre drogas em decorrência, principalmente, da “falta de tempo” e da “concorrência” entre os jornais/revistas. Esses dados mostram a necessidade de pesquisas e de debates que estimulem a qualidade das matérias sobre drogas no País. A responsabilidade social da mídia tem sidoapontada, também, como um fator importante a ser considerado. As matérias sobre prevenção, embora mais trabalhadas, ainda poderiam oferecer uma visão menos persecutória e mais otimista, valorizando as potencialidades da comunidade, da escola e da família. Actualmente, a postura social frente ao uso de bebidas alcoólicas e de outras drogas é marcada pela contradição do lícito e do ilícito, bem como pela diversidade de opiniões a respeito de danos, benefícios, prazer e desprazer. Os meios de comunicação 30 acompanham essas contradições. De um lado, a população recebe uma série de informações sobre a violência relacionada ao tráfico e sobre os “perigos das drogas”; e, por outro lado, é alvo de sofisticadas propagandas para estímulo da venda de bebidas alcoólicas. Nesse contexto, esses grupos de “drogas”, semelhantes em vários aspectos farmacológicos, passam a ser encarados tão distintamente na opinião pública, o que gera posturas extremamente incoerentes sob a ótica da saúde (NOTO & BOUER, 2011). 31 CAPITULO - III: METODOLOGIA Esta secção descreve a metodologia do trabalho. Para a materialização do mesmo, usou-se o método misto ou combinação da pesquisa qualitativa e quantitativa. Para Creswell e Plano Clark (2011), citados por Paranhos, at al. (2016, p.391), “métodos mistos são procedimentos de colecta, análise e combinação de técnicas quantitativas e qualitativas em um mesmo desenho de pesquisa. O pressuposto central que justifica a abordagem multi-método é o de que a interação entre eles fornece melhores possibilidades analíticas”. O primeiro passo para formular um desenho de pesquisa multi-método é dominar, minimamente, algumas das técnicas quantitativas e qualitativas. Além disso, o pesquisador deve ter claro qual é a sua questão de pesquisa e quais são os objetivos do trabalho (PARANHOS, at al. (2016) Pesquisa qualitativa segundo Oliveira (2011), é entendida, por alguns autores, como uma “expressão genérica”. Isso significa, por um lado, que ela compreende atividades ou investigação que podem ser denominadas específicas. De acordo com Triviños (1987), a abordagem de cunho qualitativo trabalha os dados buscando seu significado, tendo como base a percepção do fenómeno dentro do seu contexto. O uso da descrição qualitativa procura captar não só a aparência do fenómeno como também suas essências, procurando explicar sua origem, relações e mudanças, e tentando intuir as consequências. Para Bogdan & Biklen (2003), citado por Oliveira (2011), o conceito de pesquisa qualitativa envolve cinco características básicas que configuram este tipo de estudo: ambiente natural, dados descritivos, preocupação com o processo, preocupação com o significado e processo de análise indutivo. Segundo Fonseca (2002, p. 20), citado por Gerhardt & Silveira (2009), diferentemente da pesquisa qualitativa, os resultados da pesquisa quantitativa podem ser quantificados. Como as amostras geralmente são grandes e consideradas representativas da população, os resultados são tomados como se constituíssem um retrato real de toda a população alvo da pesquisa. A pesquisa quantitativa se centra na objectividade. Influenciada pelo positivismo, considera que a realidade só pode ser compreendida com base na análise de dados 32 brutos, recolhidos com o auxílio de instrumentos padronizados e neutros. A pesquisa quantitativa recorre à linguagem matemática para descrever as causas de um fenómeno, as relações entre variáveis, entre outras. A utilização conjunta da pesquisa qualitativa e quantitativa permite recolher mais informações do que se poderia conseguir isoladamente (GERHARDT & SILVEIRA, 2009). 3.1. Método de Procedimento Como método de procedimento foi usado o Hipotético-dedutivo pois o mesmo pode ser explicado a partir do seguinte esquema: problema – hipóteses – dedução de consequências observadas – tentativa de falseamento – corroboração. Quando os conhecimentos disponíveis sobre um determinado assunto são insuficientes para explicar um fenómeno, surge o problema. Para tentar explicar o problema, são formuladas hipóteses; destas deduzem-se consequências que deverão ser testadas ou falseadas. Falsear significa tentar tornar falsas as consequências deduzidas das hipóteses” (GERHARDT & SILVEIRA, 2009). Método hipotético-dedutivo - inicia buscando a percepção de uma lacuna nos conhecimentos, acerca da qual formula hipóteses e, pelo processo de inferência dedutiva, testa a predição da ocorrência de fenómenos abrangidos pela hipótese (MARCONI & LAKATOS, 2003). Quanto aos meios de investigação foi utilizada a pesquisa bibliográfica por incorporar uma revisão da literatura sobre o tema, isto é, a recolha e análise de dados para subsidiar teoricamente este trabalho. A referida pesquisa foi feita através de livros, artigos científicos e revistas especializadas. Foi ainda feita uma pesquisa de campo, uma vez que se pretendeu fazer uma investigação empírica aos jovens e adolescentes consumidores de drogas e álcool e, aos funcionários do Centro de Reabilitação de Toxicodependentes da Remar, cidade de Maputo, visando obter dados. Uma das fases cruciais deste trabalho foi na pesquisa bibliográfica, que consistiu na procura de livros, artigos, ensaios que abordam sobre implicações de consumo de substâncias psioativas nos jovens e adolescente em Moçambique e no mundo, onde visitamos as bibliotecas e fizemos o uso de sites da internet, visto que, o material que aborda sobre este tema em Moçambique ainda é escasso sobretudo em português. 33 3.2. Quantos aos Objectivos Este foi um estudo exploratório que, segundo Malhotra (2001), a pesquisa exploratória é usada em casos em que é necessário definir o problema com maior precisão. O seu objetivo é prover critérios e compreensão. Tem as seguintes características: informações definidas ao acaso e o processo de pesquisa flexível e não-estruturado. A amostra é pequena e não-representativa e a análise dos dados é qualitativa. As constatações são experimentais e o resultado, geralmente, seguido por outras pesquisas exploratórias ou conclusivas. Para Gil (1999) a pesquisa exploratória tem como objectivo principal desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. Para o autor, estes tipos de pesquisas são os que apresentam menor rigidez no planeamento, pois são planeadas com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado facto. 3.3. Estudo de Caso Este trabalho é também um estudo de caso, que Segundo Gil (2008), é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalha considerados. De acordo com Yin (2005, p. 32), citado por Gil (2008), o estudo de caso é um estudo empírico que investiga um fenómeno atual dentro do seu contexto de realidade, quando as fronteiras entre o fenómeno e o contexto não são claramente definidas e no qual são utilizadas várias fontes de evidência. O estudo de caso vem sendo utilizado com frequência cada vez maior pelos pesquisadores sociais, visto servir a pesquisas com diferentes propósitos, tais como: a) Explorar situações da vida real cujos limites não estão claramente definidos; b) Descrever a situação do contexto em que está sendo feita determinada investigação; c) Explicar as variáveis causais de determinado fenómeno em situações muito complexas que não possibilitam a utilização de levantamentos e experimentos. 34 O estudo de caso é um dos mais relevantes métodos de pesquisa qualitativa. Este recurso consiste em uma pesquisa sobre um determinado indivíduo, família, grupo ou comunidade que seja representativo de um determinado espaço e tempo, com o intuito de examinar aspectos variados da vida. Essa modalidade pode ser dividida em várias etapas como: formulação do problema, definição da unidade-caso, determinação do número de casos, elaboração
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