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Brasília-DF. Intervenções do PsIcólogo no HosPItal Elaboração Fernanda Silva de Meira Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APrESEntAção ................................................................................................................................. 5 orgAnizAção do CAdErno dE EStudoS E PESquiSA .................................................................... 6 introdução.................................................................................................................................... 8 unidAdE i EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR ................................................................................... 11 CAPítulo 1 A PSICOLOGIA HOSPITALAR .................................................................................................... 11 CAPítulo 2 CARACTERíSTICAS SOBRE ATuAÇÃO dO PSICóLOGO HOSPITALAR ......................................... 24 CAPítulo 3 A HumANIzAÇÃO HOSPITALAR ................................................................................................ 29 unidAdE ii A PRÁTICA dO PSICóLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR ..................................................................... 34 CAPítulo 1 O PSICóLOGO E O PACIENTE ................................................................................................ 34 CAPítulo 2 INTERvENÇõES PSICOLóGICAS NO HOSPITAL ........................................................................ 53 unidAdE iii INTERvENÇõES dO PSICóLOGO COm A FAmíLIA/ACOmPANHANTE E COm A EQuIPE dE TRABALHO .... 61 CAPítulo 1 O PSICóLOGO HOSPITALAR, A FAmíLIA, E A EQuIPE ................................................................ 61 CAPítulo 2 PSICóLOGO NA EQuIPE muLTIPROFISSIONAL .......................................................................... 66 CAPítulo 3 SuPORTE EmOCIONAL AOS PROFISSIONAIS ............................................................................ 71 unidAdE iv dOCumENTOS PARA ATENdImENTO PSICOLóGICO HOSPITALAR .......................................................... 76 CAPítulo 1 PRONTuÁRIO dO PACIENTE .................................................................................................... 76 CAPítulo 2 INTERCONSuLTA ..................................................................................................................... 82 CAPítulo 3 PARECER PSICOLóGICO ........................................................................................................ 86 PArA (não) FinAlizAr ..................................................................................................................... 88 rEFErênCiAS .................................................................................................................................. 89 AbrEviAturAS ............................................................................................................................... 101 5 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 7 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 8 introdução A Psicologia Hospitalar é considerada uma vertente nova nos estudos psicológicos. No Brasil, Matilde Neder é uma das precussoras da área quando iniciou sua atuação na década de 1950 no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) na Clínica Ortopédica e Traumatológica e em seguida na divisão de Reabilitação. Em 2000, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) regulamentou pela Resolução no 014 a especialização de Psicologia Hospitalar. Sair de dentro dos consultórios convencionais e encarar diferentes settings terapêuticos, com possibilidades de inúmeras intercorrências durante os atendimentos, além de trabalhar conjuntamente com diversos profissionais, são alguns dos grandes desafios para o psicólogo. É necessária uma postura ativa, humanizada e acolhedora frente ao indivíduo que traz demandas de cuidados físicos e psicológicos. São muitas as possíveis áreas de trabalho do psicólogo no hospital, por isso é preciso compreender o contexto hospitalar que irá atuar e estudar os tipos de demandas que ocorrem com mais frequência. Neste material, daremos enfoque principal nas intervenções do psicólogo no Pronto-Socorro (PS), na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), na Enfermaria e no Ambulatório. Ressalva-se a importância do acolhimento psicológico desde a entrada do paciente no hospital até a sua preparação para alta hospitalar. Geralmente, a ansiedade, o medo e a angústia frente a circunstâncias desconhecidas são os sintomas principais identificados nos pacientes. O trabalho do psicólogo foca-se em reforçar as capacidades preservadas do sujeito, para que este tenha recursos de enfrentar melhor a doença e a hospitalização. O suporte psicoemocional é também importante aos familiares/acompanhantes, pois reforça a adaptação da família no momento de crise, além de ampliar suas formas de ajustamento e enfrentamento no período da hospitalização. Os atendimentos podem ser individuais ou em grupos, de acordo com a demanda, tempo e espaço ofertados ao trabalho do psicólogo. De forma semelhante, são relevantes as intervenções do psicólogo comos trabalhadores da saúde, os quais estão na linha de frente do cuidado. Alguns exemplos de intervenções são: grupos terapêuticos fechados, grupos de orientações, grupos de suporte psicológico, aconselhamentos individuais, atendimento de apoio emocional individual, encaminhamentos para outros serviços externos de Psicologia, entre outros. 9 Pontua-se a necessidade de cada vez mais os psicólogos buscarem novos conhecimentos e formas de atuação para o contexto hospitalar, além de desenvolverem trabalhos e pesquisas científicas da área. objetivos » Compreender o contexto da Psicologia Hospitalar. » Caracterizar as intervenções do psicólogo hospitalar. » Descrever e contextualizar o acompanhamento psicológico paciente – familiar – profissional. 11 unidAdE i EXPlAnAção SobrE PSiCologiA HoSPitAlAr CAPítulo 1 A psicologia hospitalar A Psicologia Hospitalar A Psicologia Hospitalar passou a se desenvolver mais no final do século XX, quando a medicina psicossomática abriu espaço à atuação dos psiquiatras e dos psicólogos nos hospitais gerais, pois o olhar sobre a saúde começava a ser além do biológico ou físico, propondo o exercício do modelo biopsicossocial. Por registros, aponta-se que 1818, o Hospital McLean, em Massachusetts, inseriu o trabalho do psicólogo em uma equipe multiprofissional de fisiologistas, bioquímicos e patologistas (GORAYEB; GUERRELHAS, 2003; BRUSCATO, 2004). No ano de 1954, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Mathilde Neder estrutura o primeiro Serviço de Psicologia Hospitalar no Brasil sob o convite do Dr. Eurico de Toledo Carvalho. O trabalho foi desenvolvido na Clínica Ortopédica e Traumatológica da USP na preparação psicológica cirúrgica e pós-cirúrgica de pacientes que perpassavam por cirurgia de coluna. Em 1957, Mathilde iniciou seus trabalhos na divisão de Reabilitação do Hospital das Clínicas da USP (ANGERAMI-CAMON, 1994; BRUSCATO, 2004). Os psicólogos hospitalares obtiveram maior inserção em seu trabalho a partir das décadas de 1950, 1960 e 1970 no Brasil, período em que tais profissionais passaram a sair de dentro de seus consultórios para contemplar demandas que “não iam até eles”. Sujeitos que muitas vezes não conheciam o objetivo de trabalho de um psicólogo, ou ainda nem conheciam esta profissão. Outra contribuição para a inclusão da Psicologia nas instituições é diante do contexto histórico. Nos anos 1980, o país passava por recente abertura política paralelamente seguida de grandes manifestações de movimentos sociais. Com a retirada dos militares 12 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR do governo, novas junções políticas e administrativas foram surgindo em torno do poder nacional proporcionando inserção de profissionais das ciências humanas e sociais e iniciou o reconhecimento do papel do psicólogo nas atuações da comunidade, seja clínica ou não. A crise social e econômica desta época colaborou para que os profissionais deixassem os consultórios e procurassem mais espaço nos órgãos públicos, pois a solicitação por atendimentos privados estava bem reduzida (SUNDFELD, 2010). Desta forma, consideram-se recentes as ações da Psicologia Hospitalar, sendo que este termo foi regulamentado na Resolução no 14 pelo Conselho Federal de Psicologia – CFP – em dezembro de 2000, ao estabelecer a especialização desta área aos psicólogos (TONETTO; GOMES, 2005). Na Resolução do CFP no 13/2007, definiram-se as atribuições do Psicólogo especialista em Psicologia Hospitalar, que seguem abaixo: Atua em instituições de saúde, participando da prestação de serviços de nível secundário ou terciário da atenção a saúde. Atua também em instituições de ensino superior e/ou centros de estudo e de pesquisa, visando o aperfeiçoamento ou a especialização de profissionais em sua área de competência, ou a complementação da formação de outros profissionais de saúde de nível médio ou superior, incluindo pós graduação lato e stricto sensu. Atende a pacientes, familiares e/ou responsáveis pelo paciente; membros da comunidade dentro de sua área de atuação; membros da equipe multiprofissional e eventualmente administrativa, visando o bem estar físico e emocional do paciente; e, alunos e pesquisadores, quando estes estejam atuando em pesquisa e assistência. Oferece e desenvolve atividades em diferentes níveis de tratamento, tendo como sua principal tarefa a avaliação e acompanhamento de intercorrências psíquicas dos pacientes que estão ou serão submetidos a procedimentos médicos, visando basicamente a promoção e/ou a recuperação da saúde física e mental. Promove intervenções direcionadas à relação médico/paciente, paciente/família, e paciente/paciente e do paciente em relação ao processo do adoecer, hospitalização e repercussões emocionais que emergem neste processo. O acompanhamento pode ser dirigido a pacientes em atendimento clínico ou cirúrgico, nas diferentes especialidades médicas. Podem ser desenvolvidas diferentes modalidades de intervenção, dependendo da demanda e da formação do profissional específico; dentre elas ressaltam-se: atendimento psicoterapêutico; grupos psicoterapêuticos; grupos de psicoprofilaxia; atendimentos em ambulatório e Unidade 13 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I de Terapia Intensiva; pronto atendimento; enfermarias em geral; psicomotricidade no contexto hospitalar; avaliação diagnóstica; psicodiagnóstico; consultoria e interconsultoria. No trabalho com a equipe multidisciplinar, preferencialmente interdisciplinar, participa de decisões em relação à conduta a ser adotada pela equipe, objetivando promover apoio e segurança ao paciente e família, aportando informações pertinentes à sua área de atuação, bem como na forma de grupo de reflexão, no qual o suporte e manejo estão voltados para possíveis dificuldades operacionais e/ou subjetivas dos membros da equipe. Resolução no 13/2007, p. 21 Percebe-se a ampliação das demandas e locais de atuação do psicólogo hospitalar, lembrando que tal profissional não se detém apenas a hospitais gerais de grande porte, mas trabalha também em instituições hospitalares de médio e pequeno porte, nas Unidades de Pronto Atendimento (UPA), nos Núcleos de Saúde Mental, entre outros, e com diversas especialidades: Traumatologia, Neurologia, Cardiologia, Ginecologia, Reabilitação, Pediatria, Geriatria, Infectologia etc. A Psicologia Hospitalar visa essencialmente à diminuição do sofrimento do paciente causado pelo movimento da hospitalização que, em geral, determina o agravamento da doença. É preciso disponibilizar escuta à subjetividade do paciente enfermo que em muitos momentos pode adquirir sequelas e/ou traumas do processo da doença. Logo, o psicólogo tem a função de entender e tratar os aspectos psicológicos segundo o processo de adoecimento, o qual é originado por diferentes causas: psicológicas, biológicas, sociais/culturais (ANGERAMI-CAMON, 1995; SIMONETTI, 2011). O objetivo do psicólogo hospitalar não se baseia na cura de doenças, em salvar/resgatar vidas ou realizar diagnósticos de uma patologia física, e sim em fornecer suporte emocional, proporcionar escuta e espaço de expressão para a subjetividade do ser, e compreender o momento vivenciado e subjetivo do paciente frente ao seu adoecimento. O diálogo torna-se essencial no processo de hospitalização, pois é por meio da palavra que se desenvolve o trabalho do psicólogo (ANGERAMI-CAMON, 1995; SIMONETTI, 2011). Ao atender, o psicólogo faz um trabalho juntamente com outros profissionais (médico, enfermeiro, nutricionista, fisioterapeuta, assistente social, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo etc.) buscando o resgate do cuidado biopsicossocial da pessoa adoecida. Faz-se relevante aqui pontuar em uma breve explanação sobre a evolução do conceito de saúde, para que o profissional da Psicologia compreenda como hoje a terminologia 14 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃOSOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR foi modificada, porém muitos pacientes, familiares e mesmo profissionais da saúde se voltam para conteúdos do processo saúde-doença mais antigos e diferenciam-se no enfrentamento de determinadas patologias. Em seguida, será feita um breve histórico sobre o desenvolvimento dos hospitais. breve explanação sobre a evolução histórica da saúde Os conceitos e ideias de saúde determinam-se de acordo com épocas, culturas, países, classes sociais, entre outros. De acordo com estudos, pesquisas e práticas, hoje encontram-se as proposições etimológicas de saúde. Tais origens etimológicas da palavra saúde se definem em português salude, termo do século XIII; em espanhol salud no século XI; em italiano salute, e do latim salus (salutis), o qual significa conservação da vida, cura, salvação, bem-estar. O étimo francês santé vem de sanitas (sanitatis), indicando no latim sanus, aquele que está com saúde, são. Este último conceito está mais ligado à concepção grega de higiene, relacionada à deusa Hygea (ALMEIDA FILHO, 2000; FERREIRA, 2004). Straub (2007) expõe o termo saúde como derivação de uma palavra alemã que na língua inglesa significa “integridade do corpo” pelos vocábulos hale e whole. Hale significa saúde e whole significa integral, na tradução da língua portuguesa. Historicamente, estudiosos apontam que a perda da saúde (haleness) acontecia quando os guerreiros se feriam nos campos de batalha. Antes das pesquisas de Hipócrates, considerado o pai da medicina moderna, há aproximadamente 6.000 anos no Ocidente, os responsáveis pela prática do cuidado com a saúde eram os chamados xamãs, que eram os feiticeiros tribais, pajés ou sacerdotes. Os rituais eram os meios de curar as doenças. Acreditava-se que estas últimas aconteciam pelos maus espíritos que apossavam-se do corpo da pessoa, e o xamã seria o responsável por expulsar estas forças do mal por meio de exorcismos, de feitiçaria e pela trepanação, isto é, uma cirurgia considerada arcaica em que perfuravam-se ossos do crânio tanto em pessoas vivas ou mortas. A trepanação caracteriza a medicina primitiva pré-histórica (GUSMÃO, 2004). A nomeação do xamã ocorria depois de um longo tempo de abstinência alimentar e sexual, pelo aprendizado de músicas xamanísticas e pelo uso de plantas com substâncias alucinógenas, que juntos chamavam os espíritos bons e favoráveis para extinguir a doença (SCLIAR, 2007). 15 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I Considera-se o princípio da evolução das ciências da saúde médicas em Roma e na Grécia Antiga, nos séculos VI e V a.C., visto que neste período além do uso de plantas, métodos naturais e ritos religiosos para cura das doenças, houve a propagação dos cuidados higiênicos e de saneamento. Em Roma, foram criados o sistema de drenagem do pântano e o sistema de canalização de água, banheiros públicos, e iniciou-se a fiscalização da limpeza de ordem pública (STRAUB, 2007). No mesmo período na Grécia, as divindades ainda eram consideradas importantes no tratamento da saúde-doença, como o Asclepius ou Aesculapius (deus da medicina), Higieia (deusa da saúde) e Panacea (deusa da cura) (SCLIAR, 2007). Moreira, Romagnoli e Neves (2007) afirmam que com o trabalho e estudos do filósofo grego Hipócrates de Cós (460-377 a. C.), houve uma nova conceituação da atividade médica clínica. Em textos de Platão, Aristóteles e Sócrates encontram-se referências da vida de Hipócrates, cujos estudos propuseram uma visão racional da medicina sem pressupostos mágico-religiosos, e que preocupavam-se com a causa natural da doença e, deste modo, deveria ser tratada e prevenida. Ele introduziu a observação clínica e a anamnese como as etapas iniciais para determinar o diagnóstico e o prognóstico, aos quais conceituaram uma vertente científica de estudos sem métodos cosmológicos. Straub (2007) ainda complementa que, a medicina hipocrática determinou a teoria humoral, isto é, no organismo humano existem quatro fluidos ou humores: a bile amarela, a bile negra, o sangue e o fleuma. A doença se constituiria sem a harmonia destes humores. No texto “Ares, águas, lugares”, Hipócrates definiu também a influência que o meio ambiente tem sobre a saúde e doença do indivíduo, ou seja, as observações deveriam ser feitas além do paciente em si, incluindo os fatores extrínsecos, como os hábitos, higiene e cuidados pessoais, relações sociais, entre outros, e também deveriam ser consideradas as emoções e pensamentos de cada sujeito diante do tratamento. O médico Claudius Galeno (129-200 d. C) foi outro grande cultor que escreveu e contribuiu com estudos de anatomia, dietas, cuidados higiênicos, além de desenvolver um sistema de farmacologia baseado na teoria humoral. Tal sistema é visto hoje como antigo, contudo alguns conceitos e tratamentos de medicinas alternativas assemelham-se ao embasamento farmacológico de Galeno (GUSMÃO, 2004). Diante das proposições acima citadas por seus autores, as ciências médicas, a partir deste período, começaram a se desenvolver. Estudiosos e pesquisadores passaram a debruçar em questões ainda não reportadas em investigações e pesquisas humanas, e o cuidado com a saúde repassa gradualmente ao meio científico. 16 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR Paralelamente ao desenvolvimento das práticas médicas ocidentais, há cerca de dois mil anos no Oriente, o conceito de saúde voltou-se principalmente à harmonia das forças energéticas corporais, e a instauração da doença ocorre quando há o desequilíbrio energético, seja este adquirido por fatores internos ou externos. A medicina chinesa tradicional considera o organismo formado pelas vertentes psíquica, física, emocional e espiritual, as quais relacionam-se com o ambiente extrínseco e com uma destas cinco energias: o fogo, a madeira, a água, o metal e a terra (BRASIL, 2006). Os médicos defensores desta abordagem indicam o corpo saudável àquele que possui equilíbrio entre Yin e Yang e um fluxo adequado de qi ou chi, uma energia vital, nos canais de energia que varia de acordo com as alterações do organismo. As terapias orientais, como a meditação, a acupuntura, a fitoterapia, a dietética, entre outros, trabalhariam em direção à estabilidade do qi. Observa-se que após a Segunda Guerra Mundial, houve grande dispersão dos recursos terapêuticos no Ocidente, como a acupuntura e a massagem terapêutica (JACQUES, 2001). A medicina clássica Ayurveda, a ciência da vida (avy significa vida, e veda significa conhecimento), surgiu na Índia no século VI a. C e foi executada por religiosos e sábios. É vista como uma das mais antigas formas de prevenção, tratamento e cura da saúde, e considera o organismo saudável aquele que se molda diante do equilíbrio entre os níveis mental, físico e emocional. Tal equilíbrio deriva de três humores organísmicos ou doshas, que são Vata, Pitta e Kapha ou em conjunto, o tridosha (GASPERI; RADUNS; GHIORZI, 2008). O objetivo principal da Ayurveda é a prevenção da saúde por meio de uma alimentação saudável, pela prática de exercícios físicos, de cuidados higiênicos, de hábitos adequados, e pelo uso da espiritualidade. A busca harmônica do físico, do psicológico, do emocional e do espiritual proporciona o autoconhecimento, a autoajuda e a autocura (GASPERI et al, 2008). Já na Idade Média (476-1450), considera-se uma involução geral do conhecimento humano, pois o poder da Igreja interrompeu os saberes científicos. Dogmatizou-se a doença como produto do pecado e a cura aconteceria diante da fé e da procura pelas ordens religiosas, ou seja, houve um retrocesso acerca da conceituação saúde-doença e dos tratamentos. Estes últimos voltaram a ser realizados pela expulsão dos maus espíritos por meio de pessoas religiosas e por médicos que incentivavam o uso de feitiços e misticismo. A perseguição era intensa aos estudiosos e cientistas que buscavam a ciência (GUSMÃO, 2004; SCLIAR, 2007). Oliveira e Egry (2000) afirmam queo desenvolvimento de maior intensidade das práticas da clínica médica ocorreu nos séculos XVIII, XIX e XX diante do aperfeiçoamento dos 17 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I aparelhos e procedimentos hospitalares, da descoberta dos fatores extrínsecos da doença como a influência dos vírus, bactérias e outros microorganismos, do desenvolvimento da anestesia, da farmacologia, da homeopatia, da cirurgia, do microscópio e Raios-X, das vacinas, e também por meio de novos tratamentos para doenças, como a lepra, a peste bubônica, a pneumonia, a malária, entre outros. Atenta-se, então, para o surgimento do chamado modelo biomédico de saúde, o qual caracteriza a doença a partir de raízes biológicas somente, sem influências sociais, psicológicas, hábitos ou comportamentos. A doença é causada diante de um patógeno (bactéria, vírus ou microrganismo) que instaura-se no organismo, o que provoca uma teoria reducionista, ou seja, os conceitos saúde e doença, considerados fenômenos complexos, são descritos a partir de um elemento básico/primário. Aqui a saúde é vista apenas como ausência de doença. Além disto, o modelo biomédico se baseia na doutrina cartesiana de dualismo mente-corpo, isto é, tais processos são distintos e autônomos, pois pertencem à natureza e causa diferentes. A mente/pensamento não ascende sobre o corpo e vice-versa (BARROS, 2002). O modelo biomédico foi essencial aos estudos das doenças físicas, porém não alcançou explicações às enfermidades desprovidas de sinais e/ou sintomas físicos observáveis, como por exemplo, os transtornos de conversão desmistificados por Sigmund Freud (1856-1939). Tais transtornos de conversão propunham que os conflitos emocionais inconscientes eram comutados em sintomas físicos (FREUD, 1989). Freud estabeleceu a busca do analista em trabalhar os impulsos, desejos e os conteúdos mentais que ficaram reprimidos no inconsciente do paciente, retirando as resistências existentes e fortalecendo o ego por meio de elementos técnicos. A chamada associação livre tornou-se uma regra fundamental na Psicanálise como elemento técnico. Ela permite que a pessoa fale de forma livre, diga o que vier à mente, com ou sem sentido, e sem proibir qualquer detalhe dos pensamentos, sentimentos, imagens, ou fantasias. A dor ou a vergonha podem ocorrer, contudo são aspectos importantes na compreensão do mundo interior e são o acesso aos processos psíquicos inconscientes (NASIO, 1999). Neste processo a atenção do terapeuta deve estar suspensa, porquanto este precisa estar disposto a escutar, aceitar, interpretar e compreender o conteúdo exposto pelo paciente. Freud denominou tal situação de atenção flutuante, a qual permite que a consciência do analista capte os desejos, fantasias e fatos reprimidos, e aponte conflitos que muitas vezes não são tão explícitos e ordenados (NASIO, 1999). Outra vertente estudada foi a interpretação dos sonhos como fonte de encontro do material inconsciente, pois eles apresentam conteúdo com menos defesa durante o sono, o qual mantém os impulsos reprimidos fora da consciência. Tal conteúdo quando 18 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR interpretado permite a melhor identificação dos conflitos registrados pelo indivíduo (FREUD, 1989b). Portanto, Freud indicou com seu pensamento psicanalítico que não existe descontinuidade na vida mental, ou seja, nada acontece por acaso, e há uma causa para cada pensamento, memória, sentimento, ação ou comportamento, o que contrapõe aos conceitos do modelo biomédico (ZIMERMAN, 2004). Atenta-se para o importante papel que a Psicanálise proporcionou aos estudos e à conceituação da saúde psíquica. Freud estabeleceu preceitos ainda não investigados e alguns até mesmo receosos, como a desmistificação da sexualidade e dos sonhos. Além disto, a teoria psicanalítica embasou e ainda fundamenta muitas abordagens psicológicas que buscam a melhoria da qualidade de vida. Na década de 1940, outro psicanalista chamado Franz Alexander discriminou doenças, como a artrite reumática, que não possuíam infecções ou outros motivos físicos diretos para seu diagnóstico e indicou elementos psicológicos à causa patológica. Tal estudo impulsionou o surgimento da medicina psicossomática, em que psico significa mente, e soma significa corpo. A medicina psicossomática alvitrou o trabalho em diagnosticar e tratar doenças físicas que são consideradas provenientes de segmentos mentais deficientes (STRAUB, 2007). Riechelman (2000) completa a prática médica psicossomática como o exercício laboral de ter lado a lado elementos subjetivos e objetos do indivíduo, ou seja, trabalha-se com uma perspectiva holística hipocrática do sujeito juntamente com avanços e atualizações tecnológicas da medicina moderna e suas especificações. Oliveira e Egry (2000) afirmam que, com o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), ocorreram modificações demográficas, como desenvolvimento da expectativa de vida, fato que consequentemente aumentou o envelhecimento em países mais desenvolvidos; a diminuição da mortalidade; a formação de novos grupos comunitários (favelas, bairros populares, associações de bairros, movimentos populares); entre outros. Observou-se também grande demanda de populações em vivências escassas e à míngua, excluídas socialmente de assistências, atendimentos, tratamentos de saúde. Houve o deslocamento da atuação dos médicos para as organizações hospitalares. Com esses novos e diferentes contextos sociais, econômicos e culturais, percebeu-se a importância de uma conceituação do termo saúde-doença. Neste período, formou-se a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização Mundial de Saúde (OMS), a qual estabeleceu na carta de princípios de 7 de abril de 19 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I 1948, o Dia Mundial de Saúde, que: saúde é o estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de enfermidade (COUTO, 2009). Em 1978, a OMS, na Conferência Internacional de Assistência Primária à Saúde, defendeu que a saúde englobava outros parâmetros, por exemplo: o direito de todos os cidadãos aos atendimentos à saúde na comunidade, com valores acessíveis e de acordo com a economia do país (BRASIL, 2009). Somente no fim da década de 1980, o Brasil decretou na sua Constituição Federal de 1988, no artigo 196, que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação” (BRASIL, CF 1988, art. 196). Assim, visualiza-se uma explanação sobre a significação da saúde, porém como foi dito anteriormente deste capítulo, os conceitos se alteram e continuarão a se modificar diante da dinâmica social, temporal e cultural. O desenvolvimento da saúde é constante e necessita adaptar-se em cada contexto. Os psicólogos hospitalares devem estar atentos ao entendimento que os pacientes e acompanhantes trazem sobre o processo saúde-doença. Por exemplo: existem pessoas que acreditam que a doença é causada por causa do pecado; outros sujeitos desenvolvem a ideia de que sua doença física nada tem haver com seus cuidados higiênicos; outros indivíduos traduzem que estão doentes porque seu corpo quis assim e sua mente nada influencia; entre outros exemplos. Os profissionais precisam prestar atenção e fazer uma escuta detalhada ao paciente e familiar, pois estes apresentam diferentes culturas, religiões, e etnias, e por vezes não são compreendidos pela equipe cuidadora sobre como enfrentam o adoecimento. Além da concepção do paciente e seu familiar, as equipes de saúde também traduzem o binômio saúde-doença ainda com contextualização diferentes, como a biomédica. Portanto, o psicólogo hospitalar possui a função de resgatar o cuidado biopsicossocial do sujeito e proporcionar tal postura aos seus colegas de trabalho.breve histórico sobre os hospitais A terminologia hospital é procedente da palavra latina Hospitalis (ser hospitaleiro, acolhedor) e originou-se pela expressão hospes. Os hospes eram locais em que pessoas doentes, os peregrinos, os órfãos e pobres buscavam ajuda, assistência e hospedagem (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1965). 20 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR Após a era cristã, o hospital passou a ser mais interligado ao vocábulo grego nosodochium, que compreende receber os doentes, e nosocomium que significa asilo ou lugar dos enfermos. A acepção de Hospitium determinou o locus de receber hóspedes, e o hospital passou a abarcar os espaços de tratamentos de enfermos temporariamente (FERREIRA, 2008). Lisboa (1993) coloca que anterior à propagação do Cristianismo, na Antiguidade, poucas civilizações dedicavam-se ao cuidado com a saúde coletiva e individual. Como já ressaltou-se no capítulo anterior deste trabalho, os religiosos eram os responsáveis pela assistência à saúde da população, e através dos estudos de Hipócrates, houve a fundamentação científica dos atendimentos e tratamentos de saúde. Neste período, o Japão, a Índia, a China e a civilização greco-romana possuíram destaque em organizar ambientes hospitalares divididos de acordo com as doenças, clientes e com a especialidade do médico. Considera-se Sidartha Gautama, o Buda, no Oriente, como um dos precursores em difundir a prática hospitalar, pois construiu hospitais e estipulou médicos formados responsáveis pelas unidades em muitas cidades. Upatise, filho de Buda, continuou esta prática de expansão hospitalar (FERREIRA, 2008). Já no período do Cristianismo, novas práxis e organizações foram disseminadas em relação à saúde, como o saneamento de cidades, planejamentos e aperfeiçoamento de espaços hospitalares que assistissem às pessoas enfermas. Ou seja, uma perspectiva mais humanista de desvelo passou a ser difundida na sociedade. O decreto de Milão em 313 d.C., e o Concílio de Nicéia em 325 d.C., afirmados pelo imperador Constantino, foram essenciais para a fundamentação e desenvolvimento de novos hospitais com a roupagem de atendimentos aos carentes e enfermos (SANDRONI, 2007). Helena, mãe do imperador Constantino, e os senadores romanos Zótico e Ébulo foram os construtores dos abrigos de doentes com afecções inespecíficas de pele, chamadas também de lepra nesta época. Os “leprosos” eram separados das pessoas saudáveis e recebiam tratamentos. Helena e Zótico posteriormente receberam títulos de canonização (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1965). Diferentes segmentações aos atendimentos aos doentes, peregrinos, pobres e órfãos surgiram segundo a assistência necessária. Os locais destinados aos leprosos passaram a se chamar lobotrophia; já os espaços de tratamentos de enfermos em geral eram denominados nosocomia, e as casas dos peregrinos e pobres chamavam-se hospitia (MORAES, 2005). 21 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I De acordo com Sandroni (2007), nos anos 380 e 400 d.C. foi criado o primeiro hospital do Ocidente e também os abrigos de africanos que chegavam na Península Ibérica, por meio da matrona Fabíola, a qual foi canonizada em seguida. Em Roma, o senador Pamaquio construiu um senodóquio para atender marinheiros e a população. O Ministério da Saúde (1965) afirma que, a criação das universidades na Idade Média proporcionou grande incentivo ao desenvolvimento da medicina juntamente com o surgimento da imprensa e de instrumentos da ciência médica. Esses parâmetros auxiliaram em uma nova perspectiva de ambiente hospitalar. O Hospital de Cairo, construído em 1283, possui destaque, pois nele já se encontravam enfermarias diferentes aos doentes, isto é, mulheres, pacientes em recuperação, crianças, pacientes lesionados, todos eram separados segundo o diagnóstico. A classe de enfermagem era formada por homens e mulheres que auxiliavam os médicos indicados a cada ala hospitalar (FERREIRA, 2008). A partir dos séculos XVIII, XIV e XX, novas propostas foram disseminadas em relação ao cuidado com a saúde no âmbito hospitalar. O hospital passou a ser uma instituição social, destinada ao acolhimento e tratamento de todos os sujeitos. As muitas descobertas tecnológicas, aperfeiçoamento de técnicas da medicina, especializações, ampliação de profissões da saúde, novas caracterizações de doenças, acompanhamentos e tratamentos são apenas alguns aspectos que podem ser associados à evolução hospitalar (SANDRONI, 2007). Observa-se, de acordo com os autores citados acima, que surge um novo olhar referente à atenção à saúde segundo o desenvolvimento da medicina. Percebeu- se a necessidade de acolher e cuidar daqueles que eram excluídos, pois estavam doentes. Os estudos científicos médicos proporcionaram diferentes perspectivas de tratamentos e outros profissionais da área, como os enfermeiros e os farmacêuticos, passaram a atuar dentro dos hospitais. Explicita-se assim um desenvolvimento gradual dos hospitais paralelo ao processo do cuidado à saúde. Tem-se conhecimento de que o primeiro hospital no continente americano foi inaugurado em 1524 por Cortez, no México, e o primeiro hospital brasileiro, a Santa Casa de Misericórdia, foi fundado por Braz Cubas no ano de 1543, na cidade de Santos, São Paulo. Contudo, as situações permaneciam calamitosas: poucos profissionais atuando, a demanda de enfermos aumentando gradativamente, investimentos de saúde rasos diante da realidade do país e a organização hospitalar precisando ser aperfeiçoada (FERREIRA, 2008). 22 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR Em 1920, no Brasil, criou-se o Departamento Nacional de Saúde Pública que transpôs os artefatos da assistência da saúde ao Estado. Entretanto, neste período, ainda havia a relação imutável com as políticas da Previdência Social, o que dificultava o acesso da população que não participava do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS). Os hospitais filantrópicos, as Santas Casas e, posteriormente, os Hospitais Escola tornavam-se responsáveis pelos atendimentos e tratamentos da demanda não associada à Previdência Social, ou seja, aquela que não poderia pagar hospitais privados (PORTELA; BARBOSA; UGÁ; LIMA; GERSCHMAN, 2002). Ainda na década de 1940, foram propostas classificações das instituições de assistência médico-social a fim de sistematizar e melhorar as estruturas organizativas hospitalares. Determinaram-se dez divisões respectivamente: Classificação Clínica de Assistência Médica e Social; as instituições de assistência médico-social; classificação de acordo com número de leitos; classificação segundo a quantidade e qualidade de assistência médica e de assistência social que realizam; adesão ao internato de estudantes e médicos; classificação quanto à prática profissional ou ao corpo clínico atuante; classificação das instituições hospitalares ou para hospitalares; classificação das construções de instituições em bloco, em relação à planta ou plano de construção e de acordo com a arquitetura do edifício (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1965). No ano de 1955, nas semanas de 26 de junho a 2 de julho, a Divisão de Organização Hospitalar do Ministério da Saúde realizou o Primeiro Congresso Nacional de Hospitais. Em 1957, a Organização Mundial de Saúde (OMS) dispôs o conceito de hospital moderno, que prevê características da atual concepção hospitalar, isto é, determinou-se ao hospital a responsabilidade de assistir e atender toda a população local segundo preceitos preventivos e curativos, tanto em âmbito individual ou familiar, além de promover espaço de formação aos profissionais da área e estudos para pesquisas em saúde (MORAES, 2005). Ficou evidente, então, a caracterização de três vertentes hospitalares: a assistência hospitalar, o hospital geral e o hospital especializado (MOTT, 1999). O hospital geral tornou-se a instituição de tratamento de pessoas enfermas com diversas doenças. O hospitalespecializado seria o espaço destinado ao cuidado de apenas um tipo específico de doença ou de grupos restritos de doenças com especialidades semelhantes. A assistência hospitalar seria os atendimentos nos hospitais gerais e nos hospitais especializados, englobando pacientes internos e pacientes externos atendidos nos ambulatórios (MOTT, 1999). 23 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I Moraes (2005) relata que, o hospital moderno a partir da década de 1960, apresenta cinco pontos relacionados à sua formação: ofertas de especialidades, ofertas de procedimentos cirúrgicos, uso de equipamentos em avanços tecnológicos, equipe em organização administrativa hospitalar e incentivo ao ensino e pesquisa. Estas características são consideradas essenciais na constituição dos hospitais. Observa-se, então, que os hospitais foram gradualmente se modificando de acordo com o desenvolvimento das políticas de saúde do Brasil. Sandroni (2007) aponta que nesta trajetória, a medicina hospitalar passou a atender os âmbitos biológicos e físicos do sujeito e os aspectos psicológicos foram privados do cuidado com a saúde. Com a criação de políticas públicas, programas privados, e a inserção das equipes multiprofissionais nos hospitais, propõem-se a busca da atenção e diligência necessárias aos serviços da saúde, englobando tantos os trabalhadores quanto os usuários das várias unidades hospitalares brasileiras. O psicólogo hospitalar ao buscar saber sobre o histórico dos hospitais tem maior possibilidade de compreender sua rotina, o fluxo do hospital, a composição das equipes, a historicidade e cultura da sua unidade, além de poder dialogar com seus colegas de trabalho de maneira contextualizada. O estudo e pesquisa sobre o contexto hospitalar devem ser posturas frequentes do psicólogo, o qual se aperfeiçoa e disponibiliza melhores atendimentos. 24 CAPítulo 2 Características sobre atuação do psicólogo hospitalar O olhar terapêutico do psicólogo hospitalar é voltado à tríade ─ paciente, familiar e equipe – conforme a realidade das unidades. Diversas técnicas psicoterápicas são utilizadas, como Gestalt-Terapia, Psicodrama, Transpessoal, Comportamental, Psicanálise, Cognitivo-Comportamental etc., e métodos próprios são aderidos dentro da atuação hospitalar. O psicólogo deve observar seu campo de trabalho e adequar de maneira ética sua forma de atuar. Independente de sua abordagem, o psicólogo não pode perder seu em auxiliar ao paciente/familiar/equipe que necessita de apoio psicológico e o favorecimento da melhora sintomática (CHIATTONE, 1998). A orientação teórica mais indicada para os atendimentos psicológicos no hospital é a Psicoterapia Breve (PB), a qual se descreve por ter um tempo definido e objetivos limitados, ou seja, há um foco principal a ser trabalhado, ou seja, um possível tema base para interpretações. Lustosa (2010) corrobora ao expor que o objetivo da PB é a modificação, o alívio ou a extração dos sintomas decorrentes do paciente. Suas origens são psicanalíticas e as principais contribuições derivaram principalmente de F. Alexander, S. Ferenczi, H. Davanloo, D. Malan e P. Sifneos. Contudo, atualmente outras linhas teóricas utilizam-se de seus preceitos, como a cognitva, a comportamental, e a psicodramatista. Sua indicação é para tratamentos de duração curta (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998). Estudiosos apontam características importantes e necessárias para o acompanhamento na PB, que são: motivação do paciente, boa formação de aliança e interação terapêutica, estabelecimento do foco pelo terapeuta, capacidade do paciente em tolerar frustações e/ou ansiedade durante o processo e com a alta, capacidade de insight do paciente, e delimitação do tempo (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998). O psicólogo trabalha com posturas e ações ativas, e sempre que preciso deve se apropriar com maneiras de apoio, como a tranquilização, relaxamentos, psicofármacos, manipulação do ambiente, técnicas de aconselhamento, educação e sugestão, clarificação, entre outros. Lemgruber (1997) propõe conceitos específicos e relevantes da PB: a Experiência Emocional Corretiva (EEC), a Aliança Terapêutica, o Foco, a Atividade e o Planejamento. 25 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I A EEC é descrita como fator curativo da psicoterapia e se desenvolve ao proporcionar um espaço seguro e com condições favoráveis para que o paciente reviva concretamente situações emocionais do passado consideradas intoleráveis e traumáticas, e que não foram totalmente resolvidas. A intensidade da reexposição do paciente é diminuída ao ser comparada com a vivência original, pois há manipulação do ambiente dentro de um contexto de aceitação, além de ausência de cobranças e censura. A EEC é constituída por elementos cognitivos, emocionais, motores e volitivos, os quais formam uma experiência completa ao sujeito (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998). A Aliança Terapêutica (AT) é importante em qualquer processo terapêutico. Ela se baseia no processo do paciente formar uma ligação de trabalho com o psicólogo e também impulsiona a colaboração e progressão do tratamento. Algumas posturas do terapeuta são essenciais para a constituição da AT, como: ter empatia, visualizar a terapia como uma tarefa mútua entre profissional e paciente, reconhecer o desenvolvimento do sujeito, ser receptivo às metas e problemáticas do indivíduo na terapia, corroborar com as experiências positivas e na manutenção de ações e defesas úteis e construtivas (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998). A chamada focalização ocorre quando o psicólogo se detém na escolha do foco, do sintoma, do conflito a ser abordado. O foco delimita-se aos conflitos mais evidentes e urgentes do paciente, seja de material consciente ou inconsciente, caracterizando o problema psíquico mais emergente no momento. Em geral, o foco é definido através de avaliação e planejamento anterior, e seu propósito é guiar e orientar o processo terapêutico para que o sujeito supere seus conflitos (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998). A atividade se desenvolve em uma postura mais ativa do terapeuta no processo da PB, deixando de lado a neutralidade e a atenção flutuante do profissional. Lemgruber (1997) afirma que todos esses conceitos descritos anteriormente contribuem para o planejamento e continuidade da PB, a qual também é caraterizada por: intervenção imediata do profissional; alto nível de atividade do terapeuta; estabelecimento de metas/objetivos limitados e específicos; identificação e manutenção do foco terapêutico; e a delimitação do limite temporal da terapia. A avaliação psicodinâmica do problema e o planejamento de situações que basearão a EEC do paciente são importantes para a PB. Geralmente, os conteúdos são obtidos nas entrevistas psicológicas e também no uso de testes psicológicos se o profissional achar necessário a aplicação de tais testes. É neste processo que o psicólogo visualiza se a PB é indicada para os pacientes (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998). 26 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR As principais indicações para a PB clínica são: situações ou problemáticas agudas que predispõem transtornos crônicos, situações de emergência e crises, pessoas com transtornos de ajustamento e de personalidade leve, reações ansiosas ou fóbicas. As contraindicações se baseiam em: dependências de álcool ou outras drogas, transtorno do pânico, transtorno do humor, psicoses, transtorno de caráter grave, pacientes dependentes e imaturos, transtorno obsessivo-compulsivo ou fóbico incapacitante, pacientes que sofreram tentativas de suicídio, problemáticas difusas com conflitos múltiplos, necessidades de mudanças amplas ou profundas de caráter, situações emergenciais que precisam de mudança ambiental (LEMGRUBER, 1997; CORDIOLI, 1998; LUSTOSA, 2010). A PB pode ser empregada nos diferentes espaços do hospital (Pronto-Socorro, UTI, Enfermarias, Ambulatório) e com os vários pacientes. O psicólogodeve estar atento ao conteúdo verbal e não verbal que o sujeito trará, para assim determinar o foco a ser trabalhado. No ambiente hospitalar não se tem a garantia de quantos atendimentos serão realizados com determinado paciente, pois este último pode receber alta do hospital, ser transferido de unidade ou setor e até mesmo vir a falecer, ou seja, não há frequência nas sessões. Portanto, o psicólogo precisa iniciar e terminar o atendimento, evitando deixar conteúdos para “o depois”, pois o tempo é delimitado (LUSTOSA, 2010). Considera-se essencial trabalhar o conceito do “aqui e agora”, isto é, dar enfoque naquilo que o sujeito vive e traz para o momento da sessão, sem desprezar qualquer informação, seja ela em forma de discurso ou outras coisas que acontecem e que são relevantes (jeito de respirar e olhar; expressões faciais e corporais). A referência terapêutica será os conteúdos do tempo presente (DACRI; LIMA; ORGLER, 2012). Não existem restrições de tempo nos atendimentos, pois estes podem acontecer rapidamente ou perdurar por algumas horas, considerando pausas por exercício de outro profissional (procedimentos médicos, de enfermagem, de laboratório, exames variados), ou por circunstâncias eventuais no ambiente ou com o paciente, dentre outras situações. E não se estipula quantidade de sessões devido à incerteza do prazo em que o enfermo permaneça no hospital (CHIATTONE, 1998; LUSTOSA 2010). Explicita-se outra importante característica da atuação do psicólogo hospitalar: este profissional não possui o setting terapêutico semelhante ao consultório clínico, onde há o uso de divãs ou poltronas ou sofás, além de grandes probabilidades de ocorrerem intervenções extrínsecas no momento do atendimento. 27 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I O setting terapêutico clínico possui um enquadramento formal com horários de duração de cada sessão, prazo de aviso de faltas, reposições de atendimentos se necessário, não pode haver interrupções ou solicitações exteriores, os assentos são mais confortáveis para cliente e psicólogo. A terapia é conduzida pelo psicoterapeuta, o qual é responsável por todo sigilo do conteúdo de seu paciente, salvo casos descritos no Código de Ética do Psicólogo (CFP, 2005). Ressalva-se como as instituições de ensino de Psicologia brasileiras ainda repassam aos seus alunos o modelo clínico cristalizado, não permitindo que os futuros profissionais ampliem sua postura para fora “das paredes do setting tradicional”. É necessária uma formação que saiba trabalhar em equipe e deixe de lado o movimento individualista e às vezes egocêntrico (ANGERAMI-CAMON, 1995). Comumente, os atendimentos psicológicos hospitalares acontecem no leito do paciente independente se este está em enfermarias individuais ou coletivas, nos apartamentos, na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), no Pronto-Socorro (PS), no Centro Cirúrgico, na sala de Estabilização e de Classificação de Risco, nos ambulatórios, nos corredores, no chão, em cadeiras, em pé etc. Em algumas situações outros profissionais da saúde também podem participam do atendimento. Tais situações são exemplificadas: comunicação de más notícias, preparação para uma cirurgia, clarificação de um procedimento e/ou exame invasivo, entre outros. O psicólogo precisa usar sua criatividade para formar um setting terapêutico usando biombos, cortinas, macas, seu próprio corpo, pedir auxílio de silêncio ou pedir licença aos outros pacientes, familiares e profissionais que não estejam participando do atendimento, ou se possível levar o paciente para outro local mais privativo, e entre outras maneiras que podem ser desenvolvidas de acordo com o momento e demanda do paciente. Portanto, observa-se que atuação do psicólogo hospitalar é diferenciada dos princípios da psicologia clínica, pois seu trabalho precisa acontecer dentro dos parâmetros institucionais, isto é, existem rotinas, regras, condutas particulares e dinâmicas a serem acompanhadas pelos profissionais hospitalares. Além disso, o psicólogo não trabalha sozinho, ele faz parte de uma equipe de saúde que busca um objetivo de trabalho coletivo (CHIATTONE, 1998). Os horários de entrada e saída, horários para alimentação e descanso, postura profissional, uso adequado das vestimentas, respeito e cordialidade com todos os trabalhadores do hospital, respeito à hierarquia, desenvolvimento das normas descritas no Regimento Interno, são exemplos de atitudes que o psicólogo hospitalar deve apresentar. 28 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR É de relevância a leitura e seguimento da Norma Regulamentadora - NR 32, a qual “estabelece as diretrizes básicas para a implementação de medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores dos serviços de saúde, bem como daqueles que exercem atividades de promoção e assistência à saúde em geral” (PORTARIA MTE no 485, 2005, p.1). O psicólogo deve estar atento às suas regras, principalmente nos seguintes aspectos: é vedado “o ato de fumar, o uso de adornos e o manuseio de lentes de contato nos postos de trabalho; o consumo de alimentos e bebidas nos postos de trabalho; a guarda de alimentos em locais não destinados para este fim; o uso de calçados abertos” (PORTARIA MTE no 485, 2005, p. 2). Muitas vezes o psicólogo absorve problemas, conflitos, dores em seus atendimentos hospitalares, pois a carga emocional é considerada pesada para algumas pessoas. Pontua-se aqui a notável função do profissional em buscar a psicoterapia ou supervisão para auxiliá-lo. Ou ainda, quando o psicólogo perceber que algum caso no momento não conseguirá atender, por exemplo um óbito, deve pedir ajuda ao colega de profissão. 29 CAPítulo 3 A humanização hospitalar Considera-se a definição de humanização polissêmica, e por isso ainda é debatida. Oliveira, Collet e Viera (2006) apontam a humanização como o processo ético de diálogo, de comunicação entre os sujeitos que de maneira digna busquem o bem-estar de ambos. O ouvir e o falar são essenciais para combater a inumanidade, pois desta maneira haveria a estimulação da organização do trabalho interdisciplinar, da infraestrutura e dos atendimentos concedidos aos usuários. Deslandes (2004) propõe significados relacionados ao conceito de humanização referente ao cuidado com a saúde, embora reconheça que é necessária uma definição mais específica, exata para o termo. Inicialmente afirma que,a humanização se opõe à violência, tanto física como psicológica. Pondera-se aqui que, humanizar se associa ao atender, ao tratar o outro com dignidade e educação, independente de classe social econômica, sexo, cor, idade. Diante disto, há possibilidade de determinar, de oferecer uma cultura organizacional hospitalar pautada no diálogo entre paciente, gestor, profissional e técnico. A humanização também é proposta pela junção deste atendimento qualitativo com a obtenção e uso dos recursos tecnológicos. Tais recursos oferecem agilidade, organização e suporte, porém se usados sozinhos ou se não são bem administrados pelo profissional, perderão seu significado maior, o de auxiliar o desenvolvimento do cuidado. As intervenções estruturais são relevantes, pois garantem melhores condições de hospitalização ao paciente e familiar (DESLANDES, 2004; MOTA; MARTINS; VÉRAS, 2006). O processo de humanização nos serviços de saúde é um tema tão relevante, que em 2003 regulamentou-se a Política Nacional de Humanização da Atenção e da Gestão da Saúde (PNH) no Sistema Único de Saúde (SUS), também denominada HumanizaSUS, a qual propôs vieses de mudança de gestão e cuidado com a inclusão de trabalhadores, usuários e gestores. Os princípios que norteiam a HumanizaSUS são: transversalidade; indissociabilidade entre atenção e gestão; protagonismo, corresponsabilidade e autonomia dos sujeitos e coletivos. Já as diretrizes da política se baseiam no acolhimento, na gestão participativa e cogestão, na ambiência, na clínica ampliada e compartilhada,na valorização do trabalhador, e na defesa dos direitos dos usuários (PEDROSO; VIEIRA, 2009; BRASIL, 2015). 30 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR A transversalidade é a ação de reconhecer que as diversas profissões podem contribuir juntas para o estudo e desenvolvimento do cuidado ao enfermo, ou seja, é o momento de trabalhar em equipe e compartilhar os saberes individuais (BRASIL, 2015). A indissociabilidade entre atenção e gestão se caracteriza pela busca de conhecimento do funcionamento da gestão dos serviços e da rede de saúde por parte dos trabalhadores e usuários, e a participação de todos nas decisões das ações e organizações de saúde. O cuidado e assistência da saúde são responsabilidade dos profissionais, dos usuários e sua rede sociofamiliar (BRASIL, 2015). O protagonismo, corresponsabilidade e autonomia dos sujeitos e coletivos englobam as responsabilidades compartilhadas entre todos os sujeitos dos serviços de saúde: paciente, familiar e profissional. Todos devem almejar a produção de saúde e por isso, possuem seus direitos em todo o sistema (BRASIL, 2015). Compreende, então, que julgam-se necessárias algumas perspectivas a fim de atribuí-las à humanização, como compras de novos equipamentos médico-hospitalares, mais contratações de trabalhadores da saúde com melhores salários, proporcionar melhores condições de trabalho, ampliação e abertura de serviços, entre outros (MOTA; MARTINS; VÉRAS, 2006; OLIVEIRA et al, 2006). Brasil (2004) afirma que “humanizar é, então, ofertar atendimento de qualidade articulando os avanços tecnológicos com acolhimento, com melhoria dos ambientes de cuidado e das condições de trabalho dos profissionais” (p. 6). Observa-se que a humanização hospitalar proporciona o resgate do cuidado biopsicossocial do sujeito, quando o profissional da saúde se aproxima do enfermo ou de quem o acompanha e oferece atendimento igualitário, com respeito e empatia. Um ser humano cuidando de outro ser humano. Portanto, destaca-se que os programas de humanização hospitalar abrange toda a equipe de saúde, incluindo a participação do psicólogo. A atuação do psicólogo no processo de implantação e implementação de programas de humanizações nos hospitais se torna ainda mais relevante, pois tal profissional é capacitado para acolher, escutar, acompanhar pacientes e familiares/acompanhantes desde a entrada até a alta hospitalar. Além disso, o espaço terapêutico também pode ser voltado para os trabalhadores, os quais veem apresentando aumento gradual de adoecimento nas organizações do trabalho. O cuidar do cuidador é essencial, pois o dia a dia reflete situações de contato com saúde, doença, conflitos, morte e luto, frustrações, perdas, entre tantas as sensações, que 31 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I acumuladas podem determinar mecanismos de defesa no profissional. Este olhar de desvelo é sine qua non à progressão da humanização (CODO; VASQUES-MENEZES, 1999; DAMAS; MUNARI; SIQUEIRA, 2004; TIRONI, 2005). Os profissionais que atuam dentro dos hospitais possuem rotinas com de alto grau de tensão, jornada extensas de trabalho, convivem com pessoas transitando e conversando a todo momento, ficam propensos aos sons agudos, intermitentes e variados, além de escutarem e acolherem queixas constantes. Evidencia-se também o contexto socioeconômico que os profissionais perpassam frente ao sofrimento psíquico e físico dos pacientes e familiares, os baixos salários, curtos períodos de tempo para atendimentos dos enfermos, e até mesmo condições precárias de trabalho (CODO; VASQUES-MENEZES, 1999; DAMAS; MUNARI; SIQUEIRA, 2004; TIRONI, 2005). Rees e Cooper (1992) e Sobrinho et al (2010) corroboram ao dizer que, os profissionais de saúde pontuam como os principais fatores de causam elevado estresse são: responsabilidades clínicas, fatores organizacionais e interpessoais, rotinas exigentes com carga horária excessiva de trabalho, e imprevisibilidades em ambientes fechados. Observa-se que estes pontos podem provocar reações psicológicas nos profissionais, exemplificados por ansiedade, aflição, medo, rancor, dor, tristeza, fadiga, mudanças na autoestima e na imagem corporal, alteração no autodomínio e autonomia, sentimentos de incertezas e estranhezas, antipatia, e irritabilidade (COPPE; MIRANDA, 1998). Visualiza-se uma tendência dos profissionais da saúde em desenvolver estratégias individuais e coletivas como mecanismos de defesa frente às diversas vertentes que lhes provocam sofrimento, e consequentemente levam ao seu adoecimento englobando níveis pessoais, familiares, sociais e organizacionais (MENDES, 2007). Faz-se notório a Portaria no 1.823 de 2012, que instituiu a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora objetivando: o fortalecimento da Vigilância em Saúde do Trabalhador - VISAT - e a integração com os demais componentes da Vigilância em Saúde; a garantia da integralidade na atenção à saúde do trabalhador; a ampliação do atendimento de que a saúde do trabalhador deve ser concebida como uma ação transversal; a incorporação do trabalho como determinante do processo saúde-doença dos sujeitos e da coletividade; asseguração que a identificação da situação do trabalho dos usuários seja considerada nas ações e serviços de saúde; e asseguração da qualidade da atenção à saúde do trabalhador usuário do SUS. A humanização compreende-se também na progressão das condições laborais dos profissionais da área da saúde, desde a parte da infraestrutura, de equipamentos e no desenvolvimento pessoal do trabalhador (BRASIL, 2012). 32 UNIDADE I │ EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR É necessário compreender e estudar a demanda de profissionais que procuram ou que são indicados para atendimentos psicológicos. Quando há uma procura psicológica expressiva, há possibilidade de escritas de projetos, reuniões e parcerias com chefias, gestores e Recursos Humanos (RH), objetivando buscar novas formas de atender estes trabalhadores e proporcionar melhores condições laborais. Logo, entende-se que as políticas de humanização dos diferentes hospitais, sejam eles da área pública ou privada, não podem ser resumidas em apenas mais um programa, e sim traduzi-la como atitudes, atuações empáticas, técnicas, ética, diálogos de saber/fazer a serem utilizados tanto nas relações entre profissionais, usuários e familiares. Em resumo, desempenhar os objetivos da humanização é tecer sua rede com os diferentes trabalhadores da saúde, com os familiares, com os pacientes, com os gestores, adquirindo trabalho cooperativo e coletivo. É produzir mecanismos que auxiliem na busca de qualidade de vida, diminuindo a pobreza financeira e social; é conquistar meios de reconhecimento e de gratificação aos vários profissionais que trabalham; é conseguir espaços físicos com equipamentos adequados ao tratamento da saúde; é traçar a corresponsabilidade entre os profissionais (SANTOS FILHO; BARROS; GOMES, 2009). Destaca-se aqui a diretriz da HumanizaSUS chamada ambiência, que é o espaço físico organizado e animado, que foi previamente projetado e arquitetado. Ao mesmo tempo, este ambiente é preparado esteticamente e psicologicamente, ao exercício de atividades humanas (FERREIRA, 2004; BRASIL, 2015). Semelhante a este conceito, Vilar (2008) descreve o termo ambiência segundo os parâmetros da HumanizaSUS, como tratamento fornecido aos espaços físicos que diretamente influenciam as relações sociais, profissionais e interpessoais das instituições. Estes espaços devem oferecer acolhimento aos sujeitos que ali trabalham ou perpassam, além de prestarem serviços completos e resolutivos. Consideram-se alguns principais eixos interligados formadores da concepção de ambiência na HumanizaSUS, os quais se descrevem em: espaço físico confortável que evidencie a privacidade e a individualidade dos usuários e dos profissionais; o ambiente propenso à produção de subjetividades nos encontrosdas pessoas em seus processos de trabalho e local que possibilite um contato empático entre trabalhador e usuário, com uso de recursos que otimizem atendimentos e tratamentos humanizados. Brasil (2010) completa dizendo que a ambiência é junção destes eixos a favor da humanização dos “territórios” de encontros do Sistema Único de Saúde. 33 EXPLANAÇÃO SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR │ UNIDADE I Ao adentrar em um local, a pessoa percebe se este lhe é agradável ou não. Esse fato acontece segundo a harmonia de fatores de ambiência, os quais podem ser representados pela cor, pelo cheiro, pela iluminação, pelo som e pela morfologia do ambiente. Determinou-se, então, por meio da HumanizaSUS que as unidades de saúde devem englobar estes fatores a fim de proporcionar conforto aos sujeitos (BARRANCO; MOREIRA; MENEZES, 2010). As cores usadas no ambiente são recursos importantes, pois estimulam os órgãos sensoriais e assim podem direcionar alguns comportamentos, como o relaxamento, o movimento, o divertimento, as atividades laborais, entre outros; ou ainda definir sensações de frio, calor, fome, alegria, tristeza; fazer absorver ou refletir luz (BRASIL, 2010b). Igualmente, os odores também constituem o ambiente e podem provocar ou não conforto e bem-estar às pessoas que ali frequentam. O som deve ser proporcional a cada unidade de saúde, podendo utilizar músicas em alguns espaços, como salas de espera ou enfermarias. Infelizmente existem barulhos inconvenientes e impróprios – sirenes de ambulância, por exemplo – contudo, deve-se projetar locais com proteção acústica que possibilitem privacidade, como em UTI (BRASIL, 2004b). As luzes precisam ser adequadas mesmo sendo naturais ou artificiais, pois atividades são realizadas a todo momento, além de delimitar um ambiente mais acolhedor. Importante também é a percepção que o paciente precisa ter se é dia, noite, se está calor ou frio, ou tempo chuvoso, pois já se tem conhecimento de que tais percepções interferem no estado de saúde do paciente (BRASIL, 2004b). A morfologia se dirige às dimensões, volumes e formas em que os ambientes precisam ser arquitetados para serem considerados agradáveis e aconchegantes. A sinestesia caracteriza-se pelo movimento do ambiente em suas texturas e superfícies (BRASIL, 2010b). A porta de entrada, jardins, áreas com bancos são locais de vivência, descanso, de interação entre as pessoas, desta forma explicita-se também o tratamento necessário que estas áreas externas devem obter (BRASIL, 2010b). 34 unidAdE ii A PrÁtiCA do PSiCÓlogo no ContEXto HoSPitAlAr CAPítulo 1 o psicólogo e o paciente diferentes contextos de atuação e intervenção do psicólogo no hospital geral Para melhor organização dos hospitais, os gestores e administradores constroem fluxogramas para orientação dos profissionais, pacientes e acompanhantes, de acordo com sua demanda e serviços disponibilizados. Existem diversos modelos de fluxogramas, mas o ideal é que cada unidade hospitalar desenvolva o seu próprio. O fluxograma é um tipo de diagrama com representação gráfica e esquemática que expressa a resolução de um sistema ou problema através de símbolos geométricos que se interligam. Comumente existe uma sequência de atividades, exercícios ou procedimentos que determinam um processo. Em geral, as figuras do fluxograma possuem as informações necessárias e as setas indicam os fluxos e a direção destes fluxos com as informações (FERREIRA, 2004). Abaixo seguem alguns exemplos de fluxogramas utilizados nos hospitais. 35 A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR │ UNIDADE II Figura 1. modelo de Fluxograma. Fonte – Abbas; Possamai, 2008. O psicólogo hospitalar precisar compreender os fluxos do hospital para poder orientar muitas vezes o paciente e ou acompanhante em diversas situações. Exemplo 1 – O paciente chega ao hospital após sofrer acidente automobilístico e o psicólogo percebe grande ansiedade do sujeito no ambiente do Pronto-Socorro. Durante o atendimento, o profissional percebeu que ao relatar os primeiros procedimentos hospitalares – atendimento inicial do médico; encaminhamento para exames radiográficos; retorno para o Pronto-Socorro; encaminhamento para internação/observação/cirurgia; alta hospitalar –, o paciente já tranquilizou e pediu para informar sua família que menos ansioso e que tinha gostado da equipe que iria lhe acompanhar. Observe que a simples explicação dos processos iniciais da hospitalização já proporcionou criar uma relação de confiança entre paciente e equipe, além de uma minimização de ansiedade. Exemplo 2 – Um pai estava muito nervoso e ansioso ao acompanhar seu filho de 7 anos de idade após uma queda da escada na escola. Ao chegar ao hospital de grande porte, o responsável foi orientado sobre os primeiros atendimentos que iriam acontecer. 36 UNIDADE II │ A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR Quando o pai retornava à sala de atendimento com o resultado da tomografia de seu filho, começou a desesperar, pois se perdeu entre corredores e elevadores. Ao passar por um corredor de enfermarias, encontrou um psicólogo que conseguiu auxiliá-lo após escutar os procedimentos que o filho já havia feito e o pai retornou à sala de atendimento correta. Atente que mesmo o psicólogo sendo escalado para atender nas enfermarias, ele conhecia o fluxo hospitalar e proporcionou ajuda ao um familiar perdido dentro da unidade hospitalar. O fluxo hospitalar também proporciona auxílio ao profissional para compreender as muitas áreas dentro de um hospital, como: o Pronto-Socorro (PS), a Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o Centro Cirúrgico, as Enfermarias, o Ambulatório, entre outros. o Psicólogo Hospitalar no Pronto-Socorro Ferreira (2004) define pronto-socorro como hospital, ou setor de hospital, especializado ou não, que se destina aos atendimentos de doentes que representam emergências. É um estabelecimento de saúde designado à assistência aos doentes, com ou sem risco de vida, cujo agravo à saúde dos pacientes precisa de atendimentos imediatos. O pronto-socorro deve funcionar 24 horas por dia e dispor apenas de leitos de observação (BRASIL, 1987). Brasil (1987) distingue os atendimentos de urgência e de emergência dentro dos prontos-socorros. Os atendimentos de urgência destinam-se ao conjunto de ações exercidas pelos profissionais à recuperação de pacientes, sendo que os agravos da saúde destes últimos necessitam de assistência imediata. Já os atendimentos de emergência diferenciam-se pelas ações dos profissionais na unidade de saúde que visa recuperar os pacientes, pois estes apresentam, no momento, risco de vida. A superlotação dos prontos-socorros ainda é presente em muitos hospitais brasileiros, e isso se deve a uma série de fatores, como: parte da população recorre aos hospitais para ter assistência em saúde, obter exames, consultas especializadas, intervenções de alto custo e internações que poderiam ser realizados nas atenções primária e secundária da rede pública de saúde; há elevada demanda associada à falta de leitos para internação; falta de gestão da clínica; altos custos; financiamento inadequado pelas esferas federal, estadual e municipal; equipes pouco treinadas; alta rotatividade de profissionais e baixa remuneração (BRASIL, 2003; AZEVEDO; PEREIRA; LEMOS; COELHO; CHAVES, 2010). Outro aspecto relevante que está causado aumento de usuários nos hospitais é o crescimento de casos provenientes de acidentes e da violência urbana. Acidentes 37 A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR │ UNIDADE II de trânsito, domiciliares ou de trabalho, intoxicações, casos de epidemias, crises de doenças agudas ou crônicas, tentativas de suicídios, casos de violência física, tentativas de homicídios são exemplos da demanda que chegam ao pronto-socorro. Dados do Ministério da Saúde apontam que em 2014 houveram 43.075 óbitos e 201.000 feridos hospitalizados por causa acidentes detrânsito, e no ano de 2015 o Seguro DPVAT foi utilizado em 42.500 indenizações por morte e 515.750 por invalidez (DATASUS, 2016). Assim, em busca de melhorias nos serviços de urgência e emergência, o Ministério da Saúde em 2003 lançou a Política Nacional de Atenção às Urgências, e em julho de 2011, publicou a Portaria no 1.600 que determinou a Rede de Atenção às Urgências e Emergências no SUS, a RUE, objetivando proporcionar ao usuário do Sistema Único de Saúde (SUS) assistência com resolutividade, em tempo hábil e humanizado nas situações de urgência e emergência (BRASIL, 2011; BRASIL, 2013). A RUE foi organizada diante de pesquisas sobre perfis epidemiológicos e demográficos no Brasil, as quais indicaram pela Secretaria de Vigilância em Saúde, alta morbimortalidade relacionada às doenças do aparelho circulatório exemplificado pelo infarto agudo do miocárdio (IAM), e por acidente vascular cerebral (AVC); alta mobimortalidade ligada às violências e acidentes de trânsito entre jovens e adultos de até 40 anos de idade; o rápido envelhecimento da população o que aumenta a expectativa de vida; além das condições clínicas crônicas que muitos sujeitos e famílias enfrentam com alto custo socioeconômico (BRASIL, 2011; BRASIL, 2013). Objetiva-se com RUE reordenar a atenção à saúde em situações de urgência e emergência de maneira coordenada pela atenção básica, possibilitando qualidade e resolução nas ações e serviços de promoção da saúde e prevenção de doenças e agravos, de diagnósticos, tratamentos, reabilitações e cuidados paliativos. Na figura 2, estão descritos os componentes da RUE e suas interfaces (BRASIL, 2013). Figura 2. Componentes da RuE e suas interfaces. Fonte: BRASIL, 2013. 38 UNIDADE II │ A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR Os serviços de urgência e emergência em hospitais públicos ou privados brasileiros em geral são executados com atendimentos médicos, atendimento de enfermagem, realização de exames clínicos e/ou de imagem, alta hospitalar, encaminhamentos do paciente para centro cirúrgico, UTI, enfermarias, salas de retaguarda, ou até mesmo para outra unidade hospitalar, entre outras condutas de saúde. Diante dos diversos casos que chegam até o pronto-socorro, outros profissionais estão constituindo as equipes de urgência e emergência, incluindo o psicólogo, o qual precisa estar preparado para lidar com os casos iminentes de vida que chegam aos serviços de urgência e emergência. Observou-se que muitos atendimentos perpassam além das perspectivas físicas, pois o pronto-socorro torna-se estressante tanto aos pacientes quanto aos seus familiares/acompanhantes. O psicólogo hospitalar, então, identifica e minimiza os fatores estressantes para paciente e/ou do acompanhante e, se necessário, recorre à ajuda de outros profissionais da equipe (GORAYEB; GUERRELHAS, 2003). Há uma urgência subjetiva dos pacientes caracterizada por situações súbitas que modificam a vida da pessoa velozmente. Esta urgência indica diversas reações psicológicas, como ansiedade, aflição, medo, rancor, mudanças na autoestima e na imagem corporal, alteração no autodomínio e autonomia, e sentimentos de incertezas e estranhezas. O acontecimento destas vicissitudes, em paralelo à hospitalização ou possível internação, provocam novos estados de dor, sofrimento, adaptação e perdas ao paciente (COPPE; MIRANDA, 1998). O sofrimento e o estado emocional do paciente hospitalizado podem aumentar significativamente frente ao abandono, o isolamento e a cisão de suas relações afetivas, emocionais, sociais e profissionais. Igualmente, existe ainda um sentimento de impotência diante da dor e uma ansiedade para que este desconforto acabe, e que esta situação chegue ao término o mais breve possível, sem que haja a necessidade de internação ou outros procedimentos médicos. Identifica-se aqui o medo de morrer, aumento da ansiedade e inquietação, do receio de obter sequelas físicas e psicológicas ou de ter que passar por intervenções cirúrgicas. Esta contextualização também inclui as intervenções médicas e de outros profissionais, como exames, enxertos, hemotransfusão, aplicação de medicamentos orais ou intravenosos, cirurgias, amputações etc. – aos quais buscam a melhoria do paciente, mas que geralmente são percebidas como invasivas e ameaçadoras no momento para o sujeito (COPPE; MIRANDA, 1998; SEBASTIANI, 1998). 39 A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR │ UNIDADE II É possível visualizar sentimentos de antipatia, de raiva, de fadiga, de irritabilidade do indivíduo por depender de outras pessoas em horários indefinidos para resolução de seu caso, e sentimento de culpa, caso o próprio paciente tenha colaborado para sua situação atual. Exemplos: pessoa que tentou suicídio e necessita passar por uma lavagem gástrica; sujeito que fez uso excessivo de álcool e outras drogas e terá que ficar em observação por no mínimo 24 horas; paciente que passará por cirurgia ortopédica após colidir seu automóvel com outro carro (motorista passou no sinal vermelho do semáforo de maneira imprudente) etc. Portanto, percebe-se como o psicólogo se torna fundamental nos atendimentos dos prontos-socorros, diante das necessidades de preparação e acompanhamento do paciente que, em geral, encontra-se desorganizado como pessoa nesta nova vivência hospitalar. O exercício psicológico é desenvolvido pela ação do acolhimento, do estar junto, do escutar os conflitos do outro em sua totalidade e o propor maneiras que auxiliem todo esse processo de dor e sofrimento ao paciente e à família (CHIATTONE; SEBASTIANI, 1997; ROSSI et al, 2004). Não existe previsão da rotina do psicólogo no pronto-socorro por causa das diversas intercorrências, e o tempo do atendimento psicológico é variável. O setting terapêutico determina-se pela criatividade do psicólogo em atender em macas nos corredores, leitos improvisados, cadeiras nas salas de espera ou observação, nos necrotérios, nas portarias ou até mesmo fora do ambiente hospitalar. A postura profissional é visualizar o paciente e focar-se em sua queixa, sem que outras instâncias atrapalhem o momento do atendimento, como barulhos de sirene, conversas paralelas, choros, intervenções de outros profissionais, entre outros (CHIATTONE, 1998; COPPE; MIRANDA, 1998). O psicólogo atuante nos serviços de urgência e emergência devem apresentar características particulares e necessárias de proatividade, equilíbrio, e afetividade devido a todas as funcionalidades específicas destes espaços e de suas situações que emergem. Tais situações, podem ser exemplificadas por: óbitos inesperados que causam momentos de angústia e desespero nos pacientes, em familiares e até mesmo em pessoas da equipe multiprofissional; mutilações provocadas por acidentes ou catástrofes; tentativas de suicídio; tentativas de homicídios; casos graves de enfermidades infantis e geriátricos; entre outros (COPPE; MIRANDA, 1998). Coppe e Miranda (1998) completa dizendo que o psicólogo do pronto-socorro precisa demonstrar “bom senso, prontidão interna (habilidade ao lidar com incerteza, com o insólito, com o inusitado), tolerância à frustração e boa fundamentação teórica, para que possa saber e atuar de acordo com a especificidade do que é ser um psicólogo hospitalar”. Orienta-se, então, aos psicólogos que antes de iniciarem suas atuações nos ambientes de 40 UNIDADE II │ A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO HOSPITALAR urgência e emergência, procurem estudar e pesquisar seus instrumentos laborais e suas possíveis demandas para visualizarem se suas condições pessoais encaixam-se neste perfil de trabalho. Igualmente, é relevante que, mesmo os profissionais iniciantes ou não da área, precisam buscar auxílio com outros psicólogos em supervisões ou terapias, pois muitos casos são considerados complicados e o olhar do outro pode ser essencial na resolução deles. O Sistema Único de Saúde (SUS) adotou uma forma mais aprimorada para atender seus pacientes que chegam
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