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Drogas no Brasil: legislação e seletividade punitiva

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF 
FACULDADE DE DIREITO 
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MARIA SILVIA SILVESTRE DA MATTA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DROGAS NO BRASIL: LEGISLAÇÃO E SELETIVIDADE PUNITIVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NITERÓI 
2018 
 
MARIA SILVIA SILVESTRE DA MATTA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DROGAS NO BRASIL: LEGISLAÇÃO E SELETIVIDADE PUNITIVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado à Faculdade de Direito 
da Universidade Federal Fluminense 
como requisito parcial à obtenção do 
grau de Bacharel em Direito. 
 
 
Orientador: Prof. Ozéas Corrêa Lopes Filho 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NITERÓI 
2018 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal Fluminense 
Superintendência de Documentação 
Biblioteca da Faculdade de Direito 
 
M435 
 
Matta, Maria Silvia Silvestre da. 
Drogas no Brasil: legislação e seletividade punitiva / Maria 
Silvia Silvestre da Matta. – Niterói, 2018. 
48 f. 
 
Orientador: Prof. Ozéas Corrêa Lopes Filho. 
 
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – 
Universidade Federal Fluminense, 2018. 
 
1. Entorpecente. 2. Política criminal. 3. Tráfico de droga. 4. 
Criminologia. 5. Legislação penal. I. Universidade Federal 
Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável. II. 
Título. 
 
CDD 341.5 
 
 
 
 
MARIA SILVIA SILVESTRE DA MATTA 
 
 
 
 
 
DROGAS: LEGISLAÇÃO E SELETIVIDADE PUNITIVA 
 
 
 
 
 
 
 Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado à Faculdade de Direito 
da Universidade Federal Fluminense 
como requisito parcial à obtenção do 
grau de Bacharel em Direito. 
 
 
Aprovada em julho de 2018. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
 
Prof. Ozéas Corrêa Lopes Filho – Orientador 
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE 
 
 
 
Prof. Paola de Andrade Porto 
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE 
 
 
Prof. Gilvan Luiz Hansen 
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE 
 
 
Prof. Charles da Silva Nocelli 
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho a todos usuários e comerciantes de drogas. 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Agradeço meu pai pois sem você eu jamais estaria aqui. Obrigada por todo 
apoio, incentivo e confiança. À minha mãe por me ensinar que “conhecimento é o 
único bem que ninguém nunca te tira” e ser meu exemplo acadêmico. Às minhas 
muitas irmãs pelas alegrias. À Vó Julia por ser sempre meu porto seguro. À família e 
amigos pelo companheirismo. À UFF, aos estágios em São Gonçalo e professores 
pelo conhecimento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“ A proibição é um saco então / Drogas no saco e saco 
de drogas no saco e drogas no saco de pão / Drogas a 
vácuo e drogas na cara do século / Debaixo da barba do 
cego e na ponta do dedo da mão [...] / Armas não matam 
pessoas / Pessoas machucam pessoas por drogas / 
Drogas machucam pessoas só por diversão [...]/ No 
resto das notas pras crianças a escola dá / Bem mais 
opções que sua sacola dá / E ai que tá / Quem não tem 
escolha sabe bem aonde essa rua dá “ (Renato Froid) 
 
RESUMO 
 
 
O presente trabalho busca, por meio de um estudo histórico, legislativo, doutrinário, 
comparativo e crítico, apresentar o movimento proibicionista, elaborado pelos 
Estados Unidos da América, como uma política criminal, implementada ao longo do 
século XX, e disseminada mundialmente por diversas conferências internacionais, 
tendo maior incidência a partir da década de setenta. Apresenta também a adesão 
do Brasil a esse movimento, sua evolução legislativa, com análise das principais 
normas relativas ao assunto e a vigente Lei de Drogas Brasileira (Lei nº 11.343/06). 
Ademais, busca analisar os discursos fundamentadores desse movimento, sua 
origem xenofóbica, suas justificativas (ético-jurídico, médico-sanitarista e política), e 
a vinculação das drogas à estereótipos criminais (moral, dependência e político-
criminoso). Por fim, aponta o encarceramento gerado no Brasil por tal política e os 
traços étnicos e econômicos destes presos, o que nos revela uma seletividade 
punitiva cruel e arbitrária, fazendo com que essa seja a principal consequência 
dessa política criminal adotada. 
 
Palavras-chave: Drogas. Legislação. Justificação. Seletividade. Punitiva. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
The objective of this paper is, through a historical, legislative, doctrinal, comparative 
and critical study, to present the prohibitionist movement, a criminal policy elaborated 
and implemented by the United States of America during the 20th century. 
Additionally, it was spread worldwide by several international conferences, having a 
greater incidence since the seventies. It also presents Brazil's adhesion to this 
movement along with its legislative evolution, with an analysis of the main norms 
related to the subject and the current Brazilian Drug Law (Law 11.343 / 06). 
Moreover, it aims to analyze the main motivations of this movement, its xenophobic 
origin, its justifications (ethical-legal, medical-sanitarian and political) and the link 
between drugs and criminal stereotypes (moral, dependency and political-criminal). 
Finally, it points out the incarceration generated in Brazil by such policy and the 
ethnic and economic traits of the prisoners, which reveals a cruel and arbitrary 
punitive selectivity, therefore being the main consequence of this criminal policy 
adopted. 
 
 
Keywords: Drugs. Legislation. Justification. Punitive Selectivity. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
1 INTRODUÇÃO 09 
2 HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE 
DROGAS E SUAS INFLUÊNCIAS EXTERNAS 
10 
2.1 DA ORIGEM À DÉCADA DE SETENTA 10 
2.2 DA DÉCADA DE SETENTA AO INÍCIO DOS ANOS DOIS MIL 14 
2.3 DA ATUAL LEI DE DROGAS BRASILEIRA 25 
3 DA SELETIVIDADE PUNITIVA NOS CRIMES DE DROGAS 32 
3.1 DA JUSTIFICAÇÃO 32 
3.1.1 Do discurso ético-jurídico e o estereótipo moral 34 
3.1.2 Do discurso médico sanitarista e o estereótipo da 
dependência 
35 
3.1.3 Do discurso político e o estereótipo criminoso 36 
3.2 DA CONSEQUENCIA IMEDIATA 39 
4 CONCLUSÃO 43 
 REFERÊNCIAS 44 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
1 INTRODUÇÃO 
 
Sempre presentes na história da humanidade, as drogas passaram a ser objeto 
de direito, tal como conhecemos, a partir do século XX. A presente monografia 
buscou, por meio de análises legislativas, lições doutrinarias e dados empíricos 
investigar esse objeto. 
Pretendemos apresentar no primeiro capítulo o histórico da legislação brasileira 
relacionada às drogas e sua confluência com o movimento proibicionista inaugurado 
pelos Estados Unidos da América. 
Tendo como marco inicial a Conferência de Xangai (1909), o movimento 
proibicionista foi ganhando espaço no cenário mundial, sendo pela primeira vez 
positivado no Brasil em 1921. 
Com o passar dos anos, novas conferências internacionais e alterações 
legislativas. Contudo, o final da década de sessenta nota-se um recrudescimento do 
tratamento dado ao tráfico de drogas no globo, sendo esse adotado pelo Brasil por 
meio da Lei nº 6.368 de 1976. 
Com o estabelecimento de uma nova ordem constitucional em 1988 e 
alterações no cenário interacional, que passou a focar no narcotráfico, percebeu-se 
uma defasagem conceitual da lei supramencionada, fazendo com que a mesma 
desse lugar a vigente Lei nº 11.343 em 2006. 
Já no segundo capítulo, passaremos à análise dos discursos justificadores da 
proibição, que se inicia com um ideal moral e religioso, porém, mostra-se um 
subterfúgio para raízes xenofóbicas. Ademais, ao longo do século, desenvolve-se 
justificativas médicas e políticaspara sustentar a proibição. 
Por fim, apresentaremos uma das principais consequências da criminalização 
das drogas, o encarceramento, mostrando o número de presos no Brasil, e 
indicando suas características étnicas e econômicas, o que releva a principal 
conclusão deste trabalho: que a criminalização das drogas tem como alvo a 
população negra e pobre. 
 
 
 
 
 
11 
2 HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE DROGAS E SUAS 
INFLUÊNCIAS EXTERNAS 
 
2.1 DA ORIGEM À DÉCADA DE 70 
 
Uma apresentação linear dos sistemas jurídicos não se mostra suficiente para 
a compreensão do processo de criminalização das drogas. Salo de Carvalho afirma 
que “o processo criminalizador é invariavelmente um processo moralizador e 
normatizador, sua origem é fluida. ”1 Logo, a origem da criminalização das drogas 
per si não pode ser localizada. Contudo, apontar determinados momentos históricos 
mostra-se necessário à percepção da gênese deste processo punitivo. Sendo assim, 
passemos a essa. 
A primeira manifestação da criminalização de porte e comércio de 
substâncias entorpecentes de nosso ordenamento surge nas Ordenações Filipinas 
(Livro LXXXIV), vigentes a partir de 1603. Contudo, a mesma pode ser considerada 
singela e ineficaz, não chegando a ser sequer reiterada no Código Penal do Império 
(1830)2. 
No plano internacional, o império Chinês, buscando uma balança comercial 
favorável, estabeleceu, em 1729, a primeira proibição do ópio e de seu plantio. A 
proibição não impediu a importação do mesmo, fazendo com que, em 1779, a 
Companhia das Índias Orientais, monopolizasse o comércio da substância. Já em 
1838, o governo chinês enrijece a fiscalização e fecha portos, lesando os interesses 
comerciais da Inglaterra. Essa, aliada a outros estados europeus, como França e 
Portugal, então, impõem a legalização e o comércio do ópio à China pela força das 
armas por meio das guerras do ópio (1839-40 e 1856-60). 
Do outro lado do mundo, em 1906, sob a presidência de Theodore 
Roosevelt, é instituída nos EUA a Lei Federal sobre Alimentos e Drogas (Food and 
Drug Act). 
Essa não proibiu qualquer substância psicoativa, mas regulava sua 
produção e comércio, sendo, então, o marco inaugural da intervenção estatal nesse 
campo. 
 
1 CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo criminológico e dogmático 
da Lei 11.343/06 – 8 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 46 
2 Ibid., p. 48 
12 
Com o ideário de consolidação global de uma política proibicionista, os EUA 
organizam a Conferência de Xangai em 1909 para reunir as potências da época e 
debater sobre o ópio, tendo como resultado um acordo pela restrição da droga aos 
seus usos medicinais. Todavia, ações práticas para efetivação do tratado nos países 
europeus foram obstadas pelas grandes indústrias farmacêuticas. 
Já em 1912, realiza-se um novo encontro internacional para o debate sobre 
o tema, a Conferência de Haia. Nessa foi consolidada a posição americana pela 
proibição, incluído a cocaína no rol de substâncias a serem regulamentadas e 
reforçado a necessidade do uso apenas para fins medicinais. 
Considerando que a legislação vigente nos EUA divergia do que foi 
convencionado em Haia, o país teve que adequar sua legislação interna, aprovando, 
em 1914, a Lei Harrison (Harrison Narcotic Act). Essa proibia expressamente o uso 
de substâncias psicoativas sem propósito medicinal e, pela primeira vez, houve a 
distinção dicotômica entre traficante e viciado, cabendo ao primeiro o 
encarceramento e ao segundo tratamento3. 
Ora em 1919, o congresso americano aprovou a 18ª emenda à Constituição, 
fazendo com que fosse instituída a proibição do álcool. Também conhecida como Lei 
Seca, essa estabeleceu que “the manufacture, sale, or transportation of intoxicating 
liquors within, the importation thereof into, or the exportation thereof from the United 
States and all territory subject to the jurisdiction thereof for beverage purposes is 
hereby prohibited.”4 
Retornado ao panorama nacional, percebe-se que até a década de 1920, 
parca era nossa legislação em relação ao tema, possuindo alguns artigos no Código 
Penal de 1890, afinal, o consumo de substâncias como a cocaína e morfina eram 
restritos aos círculos intelectuais e aos filhos da oligarquia paulista. Contudo, o 
crescimento do uso das substâncias por camadas mais populares, aumento do 
estigmatização da maconha como a droga de negros e o comparecimento à 
Conferência de Haia, geraram mudanças em nossa legislação. 
Em 1921, Epitácio Pessoa, então presidente, baixa o Decreto n° 4.294 em 
06 de julho, esse consistiu na primeira legislação específica sobre drogas do Brasil, 
o mesmo estabelecia: 
 
3 VALOIS, Luís Carlos. O direito penal da guerra às drogas. 2. ed. Belo Horizonte: Editora 
D’Plácido, 2017. p. 59. 
4 ESTADOS UNIDOS DA AMERICA. Constituição dos Estados Unidos. Disponível em: 
https://www.senate.gov/civics/constitutionitem/constitutio.htm Acesso em 02/11/2017. 
https://www.senate.gov/civics/constitutionitem/constitutio.htm
13 
Estabelece penalidades para os contraventores na venda de cocaina, 
opio, morphina e seus derivados; crêa um estabelecimento especial 
para internação dos intoxicados pelo alcool ou substancias 
venenosas; estabelece as fórmas de processo e julgamento.5 
 
Sob o governo provisório de Getúlio Vargas a matéria passa a se expandir. 
A Consolidação das Leis Penais em 1932 trouxe maior rijeza ao tratamento 
sancionatório, sendo acrescentado à pena de multa a prisão celular. 
De volta ao plano internacional, verifica-se que a Primeira Guerra Mundial 
(1914-18) fez com que os debates diplomáticos sobre o assunto tivessem uma 
pausa, mas com o fim da dessa, estes foram retomados. A Liga das Nações 
organizou em Genebra três convenções, sendo que essas ocorreram em 1925, 1931 
e 1936 respectivamente, tendo a última maior destaque. 
Também conhecida como Convenção para a Repressão do Tráfico Ilícito 
das Drogas Nocivas, a Convenção de Genebra de 1936 inaugurou uma nova fase 
na política proibicionista pois aumentou o número de substâncias proibidas, definiu 
punições para o tráfico dessas substâncias e fez nascer, internacionalmente, um tipo 
penal de tráfico de entorpecente abrangendo uma pluralidade de verbos 
incriminadores, sendo definida por Valois como “a certidão de batismo do tráfico 
internacional. ”6 
Concomitantemente, aqui no Brasil, os Decretos nº. 780/36 e nº. 2.953/38 
vêm para balizar um novo sistema de gestão, estabelecendo formalidades para 
venda de substâncias entorpecentes e dando ao Departamento Nacional de Saúde 
Pública poderes para sua administração. Já a internalização da Convenção veio por 
meio do Decreto-Lei nº 891/38. 
Cumpre observar que em 1940 há a publicação do Código Penal, cujo artigo 
281 tipificou o “Comércio clandestino ou facilitação de uso de entorpecentes”. O 
delito possuía onze núcleos, sendo a pena cominada de um a cinco anos de 
reclusão, tendo a seguinte redação: 
Art. 281. Importar ou exportar, vender ou expor à venda, fornecer, 
ainda que a título gratuito, transportar, trazer consigo, ter em 
depósito, guardar, ministrar ou, de qualquer maneira, entregar a 
 
5 BRASIL. Decreto nº. 4.294 de 06 de julho de 1921. Estabelece penalidades para os contraventores 
na venda de cocaína, opio, e seus derivados (...) Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/ 
decret/1920-1929/decreto-4294-6-julho-1921-569300-publicacaooriginal-92525-pl.html Acesso em 
02/11/2017. 
6 VALOIS, 2017, p. 255. 
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/%20decret/1920-1929/decreto-4294-6-julho-1921-569300-publicacaooriginal-92525-pl.html
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/%20decret/1920-1929/decreto-4294-6-julho-1921-569300-publicacaooriginal-92525-pl.html
14 
consumo substância entorpecente,sem autorização ou em 
desacordo com determinação legal ou regulamentar.7 
 
A respeito, Nilo Batista tece os seguintes comentários: 
Sobrevém o CP 1940, que confere à matéria uma disciplina 
equilibrada, não só optando por descriminalizar o consumo de 
drogas, mas também com um sóbrio recorte dos tipos legais 
observando-se inclusive uma redução do número de verbos em 
comparação com o antecedente imediato (Dec. 891, art. 33), redução 
tanto mais admirável quando se observa a fusão, no artigo 281, do 
tráfico e da posse ilícita no mesmo dispositivo.8 
 
Haviam também quatro parágrafos que qualificavam, equiparavam ou 
majoravam o crime. O Código, seguindo o ideário da Consolidação das Leis Penais, 
fez com que a matéria fosse recodificada, unificada e estabelecida em consonância 
às regras gerais. Todavia, tal unificação não se manteve, por razões que 
passaremos a demonstrar. 
Dois anos depois, em 1942, é publicado o Decreto-Lei nº. 4.720 que dispõe 
sobre as “normas gerais para o cultativo de plantas entorpecentes e para a extração, 
transformação e puruficação dos seus princípios ativo-terapêuticos. ”9 
No plano internacional, a partir das décadas de quarenta e cinquenta inicia-
se o delineamento da geopolítica das drogas, no qual “os países industrializados de 
ponta exigem maior rigidez no controle de opiácios, maconha, cocaína, produzidos 
pelos países menos desenvolvidos”10 enquanto as drogas sintéticas produzidas 
pelos países centrais industrializados eram parcamente regulamentadas. 
Em 1961 ocorre em Nova York a Convenção Única sobre Entorpecentes 
realizada pelas Organizações das Nações Unidas (ONU), essa “tinha em seu 
preâmbulo expressa preocupação com a ‘saúde e moral da humanidade”11, sendo 
reconhecida por setenta e quatro países signatários. Já a internalização dessa 
Convenção se deu por meio do Decreto nº. 54.216/64, poucos meses após a 
ocorrência do Golpe Militar. 
 
7 BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Estabelece o Código Penal. Disponível 
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del2848.htm Acesso em 11/11/2017. 
8 BATISTA, Nilo. Política criminal com derramamento de sangue. Discursos Sediciosos: crime, 
direito e sociedade, Rio de Janeiro, v. 3, 5/6, p. 77-94, 1998. Disponível em: http://201.23.85.222/ 
biblioteca/index.asp?codigo_sophia=18351 Acesso em: 11/11/2017. p. 84. 
9 BRASIL. Decreto-Lei nº 4.720 de 21 de setembro de 1942. Fixa normas gerais para o cultativo de 
plantas entorpecentes e para a extração, transformação e puruficação dos seus princípios ativo-
terapêuticos.. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-4720-
21-setembro-1942-414751-publicacaooriginal-1-pe.html Acesso em 11/11/2017. 
10 D’ELIA FILHO, Orlando Zaccone. Acionistas do nada: quem são os traficantes de droga. 3 ed. Rio 
de Janeiro: Revan, 2007, p. 85 
11 VALOIS, 2017, p. 255. 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del2848.htm
http://201.23.85.222/%20biblioteca/index.asp?codigo_sophia=18351
http://201.23.85.222/%20biblioteca/index.asp?codigo_sophia=18351
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-4720-21-setembro-1942-414751-publicacaooriginal-1-pe.html
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-4720-21-setembro-1942-414751-publicacaooriginal-1-pe.html
15 
Ainda no ano de 1964, foi editada a Lei nº 4.451, sendo tal diploma alterador 
do delito previsto no artigo 281 do Código Penal, adicionando-se o verbo plantar ao 
caput desse e se revogando as disposições em contrário (Decreto-Lei nº. 4.720/42). 
Em 1968 entra em vigor o Decreto nº. 385, atribuindo ao artigo 281 do 
Código Penal sua terceira redação e dando “... destaque para o endurecimento nas 
penas nas penas para traficantes e usuários.”12 Verifica-se, então, uma 
dicotomização das práticas punitivas, equiparando a conduta do usuário ao 
traficante. 
Ocorre então, em 1967, a edição do Decreto 159, “que iguala aos 
entorpecentes as substâncias capazes de determinar dependência física e/ou 
psíquica. ”13 
O referido decreto vigorou por três anos até a publicação da Lei nº 5.726/71, 
sendo definida por Salo de Carvalho como a lei que “adequa o sistema repressivo 
brasileiro às orientações nacionais, marcando, definitivamente, a descodificação da 
matéria. ” 14 
Convém ressaltar que a mencionada lei “redefine as hipóteses de 
criminalização e modifica o rito processual.”15 O crime de posse se manteve 
equiparado ao de tráfico.16 Contudo, a dicotomização das práticas punitivas é 
atenuada pela previsão de medida de segurança (tratamento psiquiátrico) para os 
“infratores viciados”17 que, caso passassem pela “recuperação completa”, teriam 
extinta sua punibilidade. 
 
2.2 DA DÉCADA DE SESSENTA AO INÍCIO DOS ANOS 2000 
 
No que concerne ao cenário internacional, desde a Convenção Única (1961) 
já havia discussões quanto à inclusão de drogas sintéticas no rol de substâncias 
controladas. Contudo, considerando que essas são produzidas por grandes 
indústrias farmacêuticas nos países desenvolvidos e exportadas para os países 
mais pobres (caminho oposto das substâncias até então proibidas), tal inclusão não 
 
12 RODRIGUES, Thiago. Narcotráfico: uma guerra na guerra. São Paulo: Desatino, 2003. p. 78 
13 CARVALHO, 2016, p.56 
14 Ibid., p. 57. 
15 Ibid., p. 57. 
16 Conforme artigo 23 do diploma legal, que alterava a redação do artigo 281 do CP, onde a conduta 
de posse de substância entorpecente equiparava-se ao tráfico, assim como o inciso III do §1º desse 
artigo. 
17 Conforme artigo 9º e 10 do mencionado diploma legal. 
16 
prosperou. Porém, “em meados da década de 1960 a Organização Mundial de 
Saúde publicava estudos indicando possuírem algumas anfetaminas características 
similares à cocaína e certos alucinógenos propriedades parecidas com as da 
maconha.”18 Dessa forma, a ONU, em fevereiro de 1971, organiza em Viena a 
Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas. ” O resultado da conferência não podia 
ser outro: regras administrativas de controle de psicotrópicos; um tratado bem 
diferente dos demais, nos quais abundavam expressões e normas penais. ”19 
Quanto ao âmbito nacional, a Convenção de 1971 foi aqui ratificada em 
1973, ingressando em nossa legislação mediante o Decreto nº. 79.388/77. A 
alteração do modelo repressivo se dá em 1976, com a decretação da Lei nº. 6.368. 
Essa “instaura no Brasil modelo inédito de controle, acompanhando as orientações 
político-criminais dos países centrais refletidas nos tratados e convenções 
internacionais. ”20 
Revoga-se, então, o artigo 280 do Código Penal, optando o legislador por 
uma lei especial para tratar das drogas, marcando um movimento de descodificação 
sobre o assunto. 
A nova lei “Dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito 
e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física 
ou psíquica, e dá outras providências. ”21 O marco diferencial dessa para a 
legislação anterior não reside nas figuras típicas, que substancialmente se 
mantiveram, mas sim na quantidade de pena aplicada e seu modo de execução, 
representando um enorme agravamento ao tratamento das pessoas que ali se 
enquadravam. 
O primeiro capítulo da nova lei cuida “da prevenção”, estabelecendo em seu 
primeiro artigo que “É dever de toda pessoa física ou jurídica colaborar na 
prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substância entorpecente 
ou que determine dependência física ou psíquica. ”22 
 
18 VALOIS, 2017, p. 279 
19 Ibid., p. 284 
20 Ibid., p. 59 
21 BRASIL. Lei nº 6.368 de 21 de outubro de 1976. Dispõe sobre medidas de prevenção e repressão 
ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes (...). Disponível em: http://www2.camara. 
leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-6368-21-outubro-1976-357249-publicacaooriginal-1-pl.htmlAcesso 
em 12/11/2017. 
22 Caput do artigo 1º da Lei nº 6.368 de 21 de outubro de 1976. 
17 
Em comparação à legislação anterior temos que “Aquele dever jurídico 
genérico do artigo 1º permaneceu, porém, a palavra ‘combate’ foi substituída pela 
expressão ‘prevenção e repressão. ’”23 
Vemos, assim, que há uma pretensão de mobilização nacional, contudo, 
“apesar de apresentar-se como integrante das políticas preventivas, projeta um 
sistema repressivo autoritário típico dos modelos penais de exceção. ”24 
O artigo 3º do mencionado diploma legal institui o Sistema Nacional 
Antidrogas, que recebe a função legal de exercer atividades relacionadas à 
prevenção e repressão do uso indevido de entorpecentes, nos âmbitos federal, 
estadual, distrital e municipal, para que se tenha uma unificação das diretrizes 
formuladas, fazendo com que haja “a criação de uma infraestrutura capaz de 
sustentar o mecanismo legal de que o Estado se armou e se propõe a acionar. ”25 
Salo de Carvalho também assinala duas perspectivas inseridas na Lei nº 
6.368/76, sendo essas a perspectiva sanitarista e a jurídico-política. A primeira 
compete ao capítulo II do diploma legal, consistente em “tratamento e 
recuperação. ”Insta salientar que a lógica sanitarista adotada se consubstancia no 
“tratamento e recuperação dos dependentes, independentemente da prática do 
delito” em razão da “intensa periculosidade social”. Trata-se de uma “espécie de 
criminalização adicção”, tendo como consequência a “aplicação de medida de 
segurança atípica, independente da instauração do devido processo legal. ”26 Logo, 
“o dependente será recebido nos hospitais oficiais, ainda se absolvido fora da 
previsão do artigo 29, isto é, quando a dependência não constituir a causa de 
sentença absolutória, ou mesmo que não esteja respondendo a inquérito ou 
processo por crimes de tóxicos. ”27 
No que concerne à perspectiva jurídico-política, tem-se uma intensificação 
da repressão. O crime de tráfico (art. 12) ganha novos verbos nucleares, tais como 
“remeter”, “fabricar” “adquirir” e “prescrever”, dando maior amplitude ao tipo. No caso 
das condutas equiparadas, previstas no §1º do artigo 12, o núcleo “semear” é nesse 
 
23 BATISTA, 1998, p. 87. 
24 CARVALHO, 2016, p. 66. 
25 MENNA BARRETO, João de Deus Lacerda. Estudo geral da nova lei de tóxicos – 4ª ed. rev. e 
aum. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1988. p. 38. 
26 CARVALHO, 2016, p. 66-67. 
27 MENNA BARRETO, 1988, p. 57. 
18 
inserido. Assim, “existe uma gama diversificada de situações a merecer o exame 
criterioso do aplicador da lei, em ada caso concreto. ”28 
Ademais, a pena cominada em abstrato passa a ser de 3 a 15 anos de 
reclusão, representando um agigantamento da escala penal quando comparada a 
anterior (1 a 6 anos). 
Tem-se, também, a emancipação do crime de “associação para o tráfico”, 
que, mediante o artigo 14, comina uma pena de reclusão de 3 a 10 anos e, ainda, 
permite a aplicação de concurso material com o crime de tráfico. 
Quanto à punição do usuário, resta clara a ausência de tipificação específica 
da conduta de uso, porém, em vista da enorme quantidade de núcleos empregados 
no tipo de tráfico, o mesmo acabava, por caminhos indiretos, sofrendo sanções. E, 
caso não seja possível a subsunção do usuário no tipo penal do tráfico, a lei dispôs, 
em seu artigo 16, quanto ao uso próprio, sendo esse: “Adquirir, guardar ou trazer 
consigo, para o uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência 
física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou 
regulamentar. ”29 Dessa forma, “a lei só incrimina o uso se concomitante com a 
posse, em qualquer de suas formas. ”30 Dessa forma, “A posse para uso próprio, 
entretanto, recebeu uma disciplina a parte, cominando-lhe uma pena privativa de 
liberdade (detenção de 6 meses a 2 anos e multa - art. 16) só excepcionalmente 
executada. ”31 
Prosseguindo, logo no artigo 18, vemos que o legislador manteve a causa 
especial de aumento de pena quando o crime envolver menor de 21 anos (inciso III). 
Não obstante, o legislador aumentou o rol de majorantes, fazendo com que o 
mesmo tivesse a seguinte redação: 
I - no caso de tráfico com o exterior ou de extra-territorialidade da lei 
penal; 
II - quando o agente tiver praticado o crime prevalecendo-se de 
função pública relacionada com a repressão à criminalidade ou 
quando, muito embora não titular de função pública, tenha missão de 
guarda e vigilância; 
III - se qualquer deles decorrer de associação ou visar a menores de 
21 (vinte e um) anos ou a quem tenha, por qualquer causa, diminuída 
ou suprimida a capacidade de discernimento ou de 
autodeterminação; 
 
28 MENNA BARRETO, 1988, p. 61. 
29 Caput do artigo 16 da Lei nº 6.368 de 21 de outubro de 1976. 
30 MENNA BARRETO, 1988, p. 54. 
31 BATISTA, 1998, p. 87. 
19 
IV - se qualquer dos atos de preparação, execução ou consumação 
ocorrer nas imediações ou no interior de estabelecimento de ensino 
ou hospitalar, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, 
recreativas, esportivas ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo 
de estabelecimentos penais, ou de recintos onde se realizem 
espetáculos ou diversões de qualquer natureza, sem prejuízo da 
interdição do estabelecimento ou do local.32 
 
Outra questão relevante consiste na ausência de causas especiais de 
diminuição de pena (com exceção da semi-imputabilidade, prevista no parágrafo 
único do artigo 19). Deve-se apontar também que não há diferenciação de 
tratamento penal entre os grandes traficantes e os varejistas, pois inexiste um tipo 
penal que individualize a conduta do pequeno vendedor. 
A igualdade de tratamento poderia ser amenizada dentro do caso concreto, 
afinal, a previsão da pena comida possuía grande elasticidade, fazendo com que 
houvesse a possibilidade do magistrado, sob o lume dos princípios da 
individualização da pena33 e dos critérios de retribuição e prevenção,34 fixar uma 
pena mais branda ao traficante varejista. Contudo, “a prática forense acabou por 
revelar aplicação genérica de penalidades severas, sem a diferenciação do pequeno 
e do grande traficante de drogas. ”35 
As regras processuais também sofreram modificações para o procedimento 
dos crimes ali previstos, sendo os pontos mais relevantes: a abolição da audiência 
de apresentação e, por consequência, a impossibilidade de denúncia oral; a criação 
de um exame preliminar para constatação da materialidade, fazendo com que haja 
maior celeridade para a instauração do processo; a imposição ao juiz durante o 
interrogatório de questionar o réu sobre possível dependência; a prerrogativa do réu 
menor de 21 ao recolhimento domiciliar sem condições de prestar fiança, desde que 
referendado pelo juiz; a possibilidade de decretação de internamento do réu que 
frustrou o tratamento ambulatorial ou reincidente; e, por fim, a previsão do artigo 35, 
que vinculava o recurso do eventual condenado por tráfico ou pelo crime de 
petrechos para o tráfico (artigos 12 e 13 da Lei nº 6.386/76) ao recolhimento em 
prisão. 
 
32BATISTA, 1998, p. 87. 
33Vigente à época por força do §13 do artigo 150, da Constituição de 1967, e que foi mantido pela 
Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969. Atualmente integra o inciso XLVI do artigo 5º 
da CRFB/1988. 
34Critérios adotados para a fixação da pena pelo nosso ordenamento segundo GRECO, Rogério. 
Curso de Direito Penal – 15ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013. p. 477. 
35CARVALHO, 2016, p.69 
20 
No mesmo ano foram sancionados dois decretos que tratavam sobre a 
matéria, sendo esses o Decreto nº 6.368 e o Decreto nº 78.992. Sobre esse vemos 
as marcas do regime imposto à época por meio do comentário de Nilo Batista, que 
segue: 
... além da vedação de amostras grátis (art.13), proibia qualquer‘texto, cartaz, representação em curso, seminário ou conferência’ 
sobre o tema sem prévia autorização (art. 8º), bem como 
recomendava a fiscalização rigorosa pelas 'autoridades de censura', 
sobre espetáculos públicos, para 'evitar representações, cenas ou 
situações que possam, ainda que veladamente, suscitar interesse' 
pelo tema (art. 9º). 'A liberdade artística - dizia um dos elaboradores 
dessa legislação - precisa ser controlada. ’36 
 
Mais adiante, em 1977, o Código Penal sofre uma reforma por meio da Lei 
nº 6.416. Tal, apesar de não trabalhar especificamente com a temática das drogas, 
institui os atuais regimes penitenciários e cria a suspensão condicional da pena 
menor de 02 anos. Essa tem reflexo direto para os condenados pelo artigo 16 da Lei 
de Tóxicos, pois sua escala penal era de 06 meses a 02 anos. 
Com o fim da Ditadura Militar em 1985 e o início do processo formal de 
redemocratização adveio “inspirada no desejo de ruptura com as políticas 
autoritárias dos sucessivos Governos Militares”. Contudo, a Magna Carta 
promulgada em 1988 manteve o escopo a política de guerra às drogas vigente no 
período ditatorial. “A Constituição recepcionou anseios punitivos colocando em 
xeque seus próprios princípios de contenção da violência punitiva. Tem-se, [...], a 
formação de núcleo constitucional-penal-dirigente. ”37 
Observe-se que a Constituição, como regra, veda a extradição do brasileiro, 
e estabelece duas hipóteses de cabimento, sendo relevante ao nosso tema uma 
delas, que consiste na possibilidade de extradição do brasileiro naturalizado, caso 
comprovado seu envolvimento com o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. 
Para Salo de Carvalho “a exceção demonstra a importância da diferenciação no 
tratamento desta espécie de delito em relação aos demais. ”38 
Outro ponto relevante consiste na apresentação de uma norma 
constitucional de eficácia limitada inserida no inciso XLIII do artigo 5º da Lei Maior, 
sendo essa: 
 
36BATISTA, 1998, p.87 
37CARVALHO, 2016, 39-40. 
38 Ibid., p. 41. 
21 
a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou 
anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas 
afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles 
respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-
los, se omitirem.39 
 
Tem-se, assim, a determinação da criação de uma lei que define crimes não 
passíveis de fiança, graça ou anistia, sendo o tráfico de drogas equiparado à esses. 
Nesse passo, o legislador infraconstitucional, cumprindo com o papel a ele 
designado, edita a Lei de Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90). Contudo, verifica-se 
um excesso de sua parte, pois, além das vedações constitucionais, houve a 
determinação de impossibilidade de liberdade provisória, indulto e progressão de 
regime aos crimes nela previstos. O legislador também optou pela ampliação dos 
prazos da prisão temporária e para o livramento condicional. 
Ademais, a Constituição, em seu artigo 243, comanda a expropriação de 
terras onde forem localizadas culturas ilegais de substâncias psicotrópicas, o que 
veio a ser regulamentado pela Lei nº 8.257/1992. 
Ao mesmo tempo da promulgação de nossa Carta, a ONU organiza em 
Viena a Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e 
de Substâncias Psicotrópicas, essa seguiu os padrões das convenções realizadas 
em 1971 e 1961, contudo, com um enfoque maior nas medidas repressivas. 
Sobre essa, Valois faz as seguintes observações: 
Não há mais preocupação com o usuário. Inclusive, na Convenção, a 
posse para consumo é criminalizada pela primeira vez (art. 3º, 2). 
Nem com medidas de tratamento. O que importa é avançar e, se 
instituir um quadro de combate às drogas internacional. 
Interessante é que a Convenção cria uma legislação policial 
internacional, repleta de medidas repressivas, procedimentos a 
serem tomados entre governos, como se fosse uma norma 
procedimental a ser observada dentro de um único país, como se 
ignorando as soberanias, como se existisse, de fato e de direito, uma 
polícia mundial.40 
 
A adesão do Brasil à Convenção de Viena de 1988 adveio por meio do 
Decreto 154 em 1991. 
 
39 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Artigo 5º, inciso 
XLIII. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1988/ constituicao-1988-5-outubro-
1988-322142-publicacaooriginal-1-pl.html Acesso em 13/11/2017. 
40 VALOIS, 2017, p. 292-293. 
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1988/%20constituicao-1988-5-outubro-1988-322142-publicacaooriginal-1-pl.html
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1988/%20constituicao-1988-5-outubro-1988-322142-publicacaooriginal-1-pl.html
22 
Entre o fim dos anos 80 e início da década de 90 o “conceito de 
centralização do tráfico colombiano ganhou difusão através dos relatórios do DEA41 
[...] a crença de que os grandes narcotraficantes colombianos erguiam impérios 
internacionais foi alimentada. ”42 Tem-se, então, um “discurso econômico-
transnacional [...] centrado no controle geopolítico dos cartéis colombianos”.43 
No Brasil, devido à reflexos, é editada a Lei nº. 9.034/95, conhecida como a 
Lei do Crime Organizado. Essa, apesar de inspirada “nos modelos normativos 
italianos de repressão às organizações mafiosas”44 sofreu alterações, adequando-se 
à realidade nacional, tendo como foco o tráfico de drogas e armas. 
A Lei de Crime Organizado representa uma ”reestruturação no processo 
penal relativo ao tráfico de entorpecentes. ”45 O sistema processual inquisitorial, 
onde o juiz é o grande gestor de provas, constitui a grande marca da mencionada 
lei. Além do mais, por se tratar de uma legislação emergencial, há uma ruptura com 
direitos e garantia fundamentais cabendo destacar: 
Art. 2o Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem 
prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de 
investigação e formação de provas: 
I - (Vetado). 
II - a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial 
do que se supõe ação praticada por organizações criminosas ou a 
ela vinculado, desde que mantida sob observação e 
acompanhamento para que a medida legal se concretize no 
momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e 
fornecimento de informações; 
III - o acesso a dados, documentos e informações fiscais, bancárias, 
financeiras e eleitorais. 
IV – a captação e a interceptação ambiental de sinais 
eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise, 
mediante circunstanciada autorização judicial; 
V – infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de 
investigação, constituída pelos órgãos especializados pertinentes, 
mediante circunstanciada autorização judicial. 
Parágrafo único. A autorização judicial será estritamente sigilosa e 
permanecerá nesta condição enquanto perdurar a infiltração. 
Art. 5º. A identificação criminal de pessoas envolvidas com a ação 
praticada por organizações criminosas será realizada 
independentemente da identificação civil. 
Art. 6º. Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena 
será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração 
 
41 Drug Enforcement Administration é um órgão de polícia federal do Departamento de Justiça dos 
Estados Unidos encarregado da repressão e controle de narcóticos. 
42 RODRIGUES, 2003, p. 62-63. 
43 CARVALHO, p. 94 
44 Ibid., p, 94. 
45 Ibid., p. 96. 
23 
espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e 
sua autoria. 
Art. 7º. Não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, 
aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na 
organização criminosa. 
Art. 9º. O réu não poderá apelar em liberdade, nos crimes previstos 
nesta lei. 46 
 
Ainda na década de noventa, a contrariosensu da onda de repressão penal 
para os crimes hediondos e também o tráfico, ocorreu um movimento de 
despenalização de condutas de menor potencial ofensivo e do uso de 
entorpecentes. Isso porque, em 1995, houve a publicação da Lei dos Juizados 
Especiais (Lei nº. 9.099), que trouxe em seu bojo a transação penal e o sursis 
processual para os crimes com pena máxima não superior a 1 ano (artigos 76 e 89, 
respectivamente). 
Porém, com o advindo da Lei nº. 10.259/01, que instituiu os Juizados 
Especiais no âmbito federal, teve-se uma ampliação do conceito de crime de menor 
potencial ofensivo, pois o artigo 2º da mencionada lei os definiu como aqueles cuja a 
pena máxima não for superior a 2 anos. Por consequência, houve um avanço para 
os que respondiam pelo crime do artigo 16 da Lei nº. 6.368/76, pois agora eram 
suscetíveis a este beneplácito e, após o cumprimento das condições impostas, 
haveria a extinção da punibilidade e mantida a primariedade do agente. 
A defasagem conceitual e operacional da Lei nº. 6.368/76 integrou 
constantemente os debates do Congresso Nacional na década de 90. Críticas 
antiproibicionistas e apelo ao incremento da punitividade fizeram com que diversos 
projetos de lei tramitassem simultaneamente nas Casas Legislativas. 
O destaque foi para o Projeto Murad (PL 1.873/91). Sobre esse Salo de 
Carvalho comenta que “o projeto marcou a política de recrudescimento do sistema 
de controle de teias de comércio, estabelecendo novas categorias de delitos, 
sobretudo daquelas condutas associadas às organizações criminosas e suas 
políticas de financiamento. ” 47 
Em consequência da diversidade de projetos de lei, o Projeto Murad sofreu 
diversas alterações, dando lugar a Lei nº 10.409/02. Essa inicialmente objetivava a 
 
46 BRASIL. Lei nº 9.034 de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para 
a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em: 
http://www2.camara.leg.br/legin/ fed/lei/1995/lei-9034-3-maio-1995-348988-publicacaooriginal-1-
pl.html Acesso em 21/11/2017. 
47 CARVALHO, 2016, p. 91. 
http://www2.camara.leg.br/legin/%20fed/lei/1995/lei-9034-3-maio-1995-348988-publicacaooriginal-1-pl.html
http://www2.camara.leg.br/legin/%20fed/lei/1995/lei-9034-3-maio-1995-348988-publicacaooriginal-1-pl.html
24 
distinção da reprovabilidade aplicada ao comércio da do uso. Quanto ao tráfico, as 
penas foram mantidas como as previstas na Lei nº 6.368/76, sejam pela quantidade, 
sejam pela espécie. Todavia, a inovação consistiu em um novo tipo penal, o do 
agente financiador de grupo ou associação destinada ao tráfico. 
Urge salientar que, para o delito de uso, a supramencionada lei positivou o 
entendimento jurisprudencial da época, explicitando o cabimento das medidas 
previstas no âmbito dos Juizados ao crime de posse para uso pessoal. 
Apesar disso, ao fim do processo legislativo, o projeto de lei, que possuía 59 
artigos, foi parcialmente vetado pelo Presidente da República, à época Fernando 
Henrique Cardoso. Desse modo, “a nova lei de tóxicos foi tida por alguns autores 
como ‘verdadeiro monstrengo jurídico’, diante dos 35 vetos da Presidência da 
República, que atingiram cerca de 83% do texto, ”48 tendo maior destaque o veto 
integral do Capítulo III, que fazia a definição “dos crimes e das penas”. 
Vale ressaltar que a mencionada Lei acabou por não revogar a Lei nº 
6.863/76, pois, o dispositivo que expressamente previa tal revogação (artigo 59) 
também fora vetado pelo Presidente. 
Sendo assim, a inovação legislativa trazida pela Lei nº 10.409/02 limitou-se 
ao procedimento processual, fazendo com que a matéria penal permanecesse 
regulada pela Lei nº 6.863/76, como mostra Salo de Carvalho: 
O veto da matéria penal derivou, na prática forense, situação 
anômala e inédita: a aplicação conjugada de dois textos com 
fundamentos e historicidade diversas. Assim, no que tange ao 
processo penal, a Lei 10.409/02 obteve plena vigência, restando a 
estrutura material do direito penal (delitos e penas) atrelada.49 
 
“Tal solução, no entanto, não foi unânime. Havendo vários autores que 
entendem dever ser aplicada integralmente a lei de tóxicos anterior, diante da 
impossibilidade de se esfacelar uma lei penal. ”50 
Assim temos a Lei nº 6.863/76 definindo os tipos penais relacionados ao 
tráfico, a Lei n° 10. 409/02 estruturando o procedimento processual, que, no que 
concerne às Organizações Criminosas, combina-se com a Lei n° 9.034/95, e a Lei 
 
48 RODRIGUES, Luciana Boiteux de Figueiredo. Controle penal sobre as drogas ilícitas: o impacto 
do proibicionismo no sistema penal e na sociedade. São Paulo, 2006. 273 f. Tese ( Doutorado – 
Programa de Pós-Graduação em Direito. Área de Concentração: Direito Penal, Medicina Legal e 
Criminologia) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2006. p. 178. 
49 CARVALHO, 2006, p. 93. 
50 RODRIGUES, 2006, p. 177. 
25 
de Crimes Hediondos estabelecendo a restrição de direitos como a fiança, liberdade 
provisória, indulto e progressão de regime 
Nesse passo, em 2003, edita-se a Lei nº 10.792, que altera a Lei de 
Execuções Penais (Lei nº 7.210/84) instituindo o Regime Disciplinar Diferenciado 
(RDD), onde se cria a possibilidade de isolamento do preso considerado “ameaça à 
segurança nacional. ” 
O RDD consiste, basicamente, no recolhimento do preso em cela individual 
e restrições de visitação e banho de sol, sendo uma medida administrativa cabível 
ao preso que apresentar “alto risco para ordem e a segurança do estabelecimento 
penal ou da sociedade. ”51 
Para Salo de Carvalho, o RDD foi “nitidamente voltado à segregação e ao 
isolamento dos presos identificados como membros de organizações com 
participação no narcotráfico. ” 52 
O combate ao narcotráfico e suas organizações criminosas ganha nova 
ferramenta em 2004 com a edição do Decreto nº 5.114, também conhecido como 
“Lei do Abate”. “Este Decreto estabelece os procedimentos a serem seguidos com 
relação a aeronaves hostis ou suspeitas de tráfico de substâncias entorpecentes e 
drogas afins, levando em conta que estas podem apresentar ameaça à segurança 
pública. ” 53 
O Decreto define as hipóteses de aeronave “suspeita”, e para essas, 
apresenta medidas coercitivas fundadas em “averiguação, intervenção e persuasão”. 
Caso as medidas não sejam suficientes, a aeronave ganha o status de “hostil” e fica 
sujeita às medidas de destruição. 
A respeito deste Decreto, Salo de Carvalho afirma: 
A harmonização dos meios operacionais das agências punitivas 
brasileiras à política transnacional de guerra às drogas legitima 
medidas de coação direita típicas de períodos de exceção nos quais 
se manifesta o terrorismo de Estado. [...] 
O quadro das políticas da repressão às drogas demonstra, sem 
tergiversações e para além da retórica, a incorporação formal e 
 
51 BRASIL. Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Artigo 52, §1º com 
redação dada pela Lei 10.792 de 1º de dezembro de 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ 
ccivil_03/leis/2003/L10.792.htm Acesso em 21/11/2017. 
52 CARVALHO, 2016, p. 100. 
53 BRASIL. Decreto nº 5.144 de 16 de julho de 2004. Regulamenta os §§ 1o, 2o e 3o do art. 303 da 
Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986, que dispõe sobre o Código Brasileiro de Aeronáutica, no 
que concerne às aeronaves hostis ou suspeitas de tráfico de substâncias entorpecentes e drogas 
afins. Caput do artigo 1º. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_ato2004-
2006/2004/decreto/d5144.htm Acesso em 21/11/2017. 
http://www.planalto.gov.br/%20ccivil_03/leis/2003/L10.792.htm
http://www.planalto.gov.br/%20ccivil_03/leis/2003/L10.792.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_%2003/_ato2004-2006/2004/decreto/d5144.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_%2003/_ato2004-2006/2004/decreto/d5144.htm26 
substancial da lógica beligerante (militarizada) na gestão da 
segurança pública nacional.54 
 
Devido ao amplo processo de descodificação do direito penal ocorrido na 
década de 90 e a renovação da legislação sobre drogas trazida pela Lei nº 
10.409/02, constatou-se que as definições dos crimes relacionados às drogas, 
previstos na Lei nº 6.368/76 e vigentes por trinta anos não mais mostravam-se 
adequados, visto que “ratificaram a ambiguidade e contrariedade dos mecanismos 
de criminalização primária e secundária”, fazendo com que houvesse uma 
“dificuldade das agências governamentais de desenvolvimento de política criminal 
razoavelmente coerente sobre drogas,”55 mostrando-se necessária uma renovação 
na legislação pátria, como se mostra a seguir. 
 
2.3 DA ATUAL LEI DE DROGAS BRASILEIRA 
 
Em agosto de 2006 publica-se uma nova lei de drogas, a Lei nº 11.343, 
sendo seus eixos principais, nas palavras de Luiz Flávio Gomes, definidos como: 
a) pretensão de se introduzir no Brasil uma sólida política de 
prevenção ao uso de drogas, de assistência e reinserção social; b) 
eliminação da pena de prisão ao usuário (ou seja, em relação a 
quem tem a posse de droga para consumo pessoal); c) rigor punitivo 
contra o traficante e o financiador do tráfico; d) clara distinção entre o 
“traficante profissional” e o ocasional; e) louvável clareza na 
configuração do rito procedimental e f) inequívoco intuito de que 
sejam apreendidos, arrecadados e, quando o caso, leiloados os bens 
e as vantagens obtidos com a prática dos delitos de drogas.56 
 
Assim como as demais legislações sobre o tema, a Lei nº 11.343/06 mantém 
os padrões internacionais estabelecidos pela ONU. Nesse sentido, Maria Lúcia 
Karam afirma: 
A nova lei brasileira em matéria de drogas — Lei nº 11.343/06 — não 
traz qualquer alteração substancial, até porque, como suas 
antecessoras, suas novas ou repetidas regras naturalmente seguem 
as diretrizes dadas pelas proibicionistas convenções internacionais 
de que o Brasil, como quase todos os demais Estados nacionais, é 
signatário. A nova lei é apenas mais uma dentre as mais diversas 
legislações internas que, reproduzindo os dispositivos 
criminalizadores das proibicionistas convenções da ONU, conformam 
a globalizada intervenção do sistema penal sobre produtores, 
 
54 CARVALHO, 2016, p. 102-103 
55 CARVALHO, 2016, p. 102-103 
56 GOMES, Luiz Flávio et al. Lei de drogas comentada artigo por artigo: Lei 11.343, de 23/08/2006. 
5. ed. rev. atual. ampl. - São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 7. 
27 
distribuidores e consumidores das drogas qualificadas de ilícitas, 
com base em uma sistemática violação a princípios e normas 
assentados nas declarações universais de direitos e nas 
Constituições democráticas, com base na supressão de direitos 
fundamentais e suas garantias.57 
 
O artigo 1º da Lei nº 11.343/06 nos apresenta uma espécie de sumário do 
texto legal, tendo a redação reproduzida sua própria ementa, sendo essa: 
Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - 
Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção 
e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece 
normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito 
de drogas; define crimes e dá outras providências.58 
 
Observa-se que texto normativo não mais utiliza a nomenclatura “substância 
entorpecente”, utilizando agora o vocábulo “droga”. A definição desse termo trazida 
pelo legislador por meio do parágrafo único do artigo 1º consiste em “substâncias ou 
os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou 
relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. 
59Vemos, portanto, que, assim como na Lei nº 6.368/76, novamente o legislador opta 
pela utilização de uma norma penal em branco, sendo que essa “é caracterizada por 
preceitos incompletos que requerem o preenchimento por terceiros dispositivos, 
normalmente de cunho extrapenal”, fazendo com que haja um “esvaziamento do 
direito penal e processual penal codificado”, pois, “a parte integradora do tipo não 
segue, [...], o rigoroso procedimento de criação da lei penal. Contudo, produz os 
mesmos efeitos incriminadores. ”60 
Prosseguindo, temos, no artigo 2º da supramencionada lei, as exceções à 
proibição, sendo essas as de uso exclusivo para fins medicinais e científicos, com a 
devida licença prévia da autoridade competente, e a de uso ritualístico-religioso. 
Cumpre ressaltar que “pela primeira vez a legislação brasileira faz referência a 
 
57 KARAM, Maria Lúcia. A Lei nº 11.343/06 e os repetidos danos do proibicionismo. Boletim do 
Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (167). São Paulo: IBCCrim, 2006. Disponível em: 
https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3312-A-Lei-no-1134306-e-os-repetidos-danos-do-
proibicionismo Acesso em 28/11/2017. 
58 BRASIL. Lei nº 11.343 de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas 
sobre Drogas (...) Ementa da lei. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2006/lei/l11340.htm Acesso em 22/11/17. 
59 Ibid., artigo 1º, parágrafo único. 
60 CARVALHO, 2016, p. 255-257 
https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3312-A-Lei-no-1134306-e-os-repetidos-danos-do-proibicionismo
https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/3312-A-Lei-no-1134306-e-os-repetidos-danos-do-proibicionismo
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm
28 
plantas de uso estritamente ritualístico-religioso”61, o que já era defeso pela 
Convenção de Viena desde 1971. 
Já no Título II da Lei nº. 11.343/06 há a apresentação do Sistema Nacional 
de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), onde são traçados seus princípios e 
objetivos gerais. “A criação de tal sistema vai ao encontro de uma política criminal de 
drogas mais consentânea com aquelas modernamente recomendadas”62, isso 
porque no plano administrativo adotou-se uma “organização sistêmica” onde “exerce 
papel relevante a atividade de informações, para que as decisões tenham 
consistência. ”63 Quanto à sua regulamentação e organização, essas se deram por 
meio do Decreto nº. 5.912 de setembro do mesmo ano. 
Passemos, então, ao Título III, sendo esse: “Das atividades de prevenção do 
uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas”. 
Esse título se subdivide em três capítulos, sendo esses: 1) Da prevenção; 2) Das 
atividades de atenção e de reinserção social de usuários ou dependentes de drogas; 
e, 3) Dos crimes e das penas. 
Quanto aos dois primeiros capítulos é de se verificar que são temas que já 
haviam sido tratados nas legislações anteriores, contudo, a Lei nº 11.343/06 
apresenta um detalhamento jamais visto antes no Brasil. Ambos se “encontram na 
linha mais moderna de políticas públicas de prevenção. Pecam, todavia, por serem 
apenas hipotéticas, porque, como costuma acontecer no país, não vêm 
acompanhadas dos meios para serem implementadas. ”64 
No que tange ao capítulo III (dos crimes e penas), vemos que o legislador 
insisti na ausência de denominação jurídica para os tipos penais ali apresentados. O 
primeiro crime revela-se no artigo 28, sendo esse: 
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou 
trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou 
em desacordo com determinação legal ou regulamentar será 
submetido às seguintes penas: 
I - advertência sobre os efeitos das drogas; 
II - prestação de serviços à comunidade; 
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso 
educativo. 
§ 1o Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo 
pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de 
 
61 GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos:prevenção, repressão. Comentários à Lei n. 11.343/2006 – Lei 
de Drogas. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 104 
62 GOMES, 2013, p. 29 
63 GRECO FILHO, 2009, p. 109 
64 Ibid., p. 115 
29 
pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar 
dependência física ou psíquica. 
§ 2o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o 
juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, 
ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às 
circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos 
antecedentes do agente.65 
 
A lei continua não criminalizando o uso, contudo, “para usar, alguém 
necessariamente deveria ter trazido consigo”. Porém, tendo em vista que “a 
Convenção Única sobre Entorpecentes, de 1961, recomendou às partes que a 
simples posse de entorpecente fosse controlada”, a punição para a posse se 
manteve na Lei nº 11.343/06, como acima exposto. Cumpre ressaltar que a Lei “não 
descriminalizou nem despenalizou a conduta [...] nem a transformou em 
contravenção”, apenas deu ao tipo penas criminais próprias e específicas.66 
O animus do agente é essencial para a subsunção neste tipo, sendo o 
consumo pessoal sua elementar subjetiva, pois, “requer a vontade específica, ou 
seja, o particular fim de agir para uso próprio”67, sendo essa a distinção o delito do 
artigo 28 com o tráfico de drogas previsto no artigo 33 desta Lei, que veremos mais 
adiante. Não obstante, a lei, em seu §2º do supracitado artigo define critérios 
objetivos para definir a elementar subjetiva. 
Há inúmeros questionamentos quanto à constitucionalidade desse artigo, 
sendo que, atualmente, a mesma encontra-se em debate no Supremo Tribunal 
Federal, por meio do Recurso Extraordinário nº 635-659, que está com o julgamento 
suspenso. 
Já no Título IV da Lei nº 11.343/06 temos “Da repressão à produção não 
autorizada e ao tráfico ilícito de drogas”, que se inicia ressaltando a necessidade de 
licença prévia para o manejamento de drogas ou matéria prima destinada à sua 
preparação, estabelece a destruição das plantações que inobservem as exigências 
legais e, cumprindo o mandamento Constitucional previsto no artigo 243 da 
CRFB/88, determina a expropriação das terras onde se encontrarem os cultivos 
ilícitos. 
 
65 BRASIL. Lei nº 11.343 de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas 
sobre Drogas (...) Artigo nº 28. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
2006/2006/lei/l11340.htm Acesso em 22/11/17. 
66 GRECO FILHO, 2009, p. 126-133 
67 CARVALHO, 2016, p. 264 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm
30 
Passa-se, então, a definir os tipos penais concernentes ao tema, sendo o 
primeiro desses previsto no artigo 33 da mencionada lei, que possui a seguinte 
redação: 
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, 
adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, 
transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a 
consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem 
autorização ou em desacordo com determinação legal ou 
regulamentar: 
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 
(quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. 
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem: 
I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à 
venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou 
guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo 
com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou 
produto químico destinado à preparação de drogas; 
II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em 
desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que 
se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas; 
III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a 
propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente 
que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização 
ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o 
tráfico ilícito de drogas. 
§ 2o Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de 
droga: (Vide ADI nº 4.274) 
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 
300 (trezentos) dias-multa. 
§ 3o Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a 
pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem: 
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 
700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo 
das penas previstas no art. 28. 
§ 4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas 
poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a 
conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja 
primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades 
criminosas nem integre organização criminosa.68 
 
Logo, percebe-se que, em relação à legislação anterior (Lei nº 6.368/76), 
repetiram-se os dezoito verbos nucleares do tipo. Não obstante, houve notável 
aumento na pena mínima cominada, passando agora ser de 5 anos. A ausência de 
vontade específica marca este tipo penal, distinguindo-o do previsto no artigo 28, 
pois aqui não há delimitação da intenção do agente, fazendo com que “estaria 
caracterizado o delito independente de sua destinação ao comércio ilícito”.69 
 
68 BRASIL. Lei nº 11.343 de 23 de agosto de 2006. Artigo nº 33. 
69 CARVALHO, 2016, p. 265 
http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=4274&processo=4274
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Congresso/RSF-05-2012.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Congresso/RSF-05-2012.htm
31 
Já o §2º do artigo acima transcrito dá uma nova escala penal, mais branda, 
às condutas de induzimento, instigação ou auxílio ao uso indevido de entorpecentes, 
o que na lei revogada consistia em crime equiparado ao tráfico. 
Outro ponto relevante reside no §3º do artigo 33, que se refere ao consumo 
compartilhado. Este é definido por Salo de Carvalho como “o único tipo penal 
intermediário entre o tráfico e o porte” Ainda para o professor, “a estrutura do tipo 
penal incriminador, em seus preceitos primários e secundários, descaracteriza 
qualquer possibilidade de qualificação do delito como hediondo”.70 
A inovação legislativa trazida pelo §4º é a causa especial de diminuição de 
pena, também conhecida como “tráfico privilegiado”, no qual o réu “primário, de bons 
antecedentes, que não se dedique às atividades criminosas nem integre 
organização criminosa”, popularmente conhecido como “traficante de primeira 
viagem”, deverá (inobstante a redação legal, visto que é direito subjetivo) ter sua 
pena reduzida de 1/6 a 2/3. 
No que tange ao artigo 34, vemos a tipificação do “tráfico de maquinários”. 
Esse é um crime subsidiário e já era previsto na Lei 6.368/76, estando em 
consonância com a Convenção Única de 1961. Contudo, Salo de Carvalho advoga 
por sua inconstitucionalidade, sob os seguintes argumentos: 
Em modelos de direito penal de fato, regrados processualmente pela 
presunção constitucional de inocência e pelo devido processo legal, 
descarta-se a criminalização dos atos de preparação por não 
representarem perigo concreto ao bem jurídico e estarem distantes 
do início da realização do verbo do tipo. 
[...] 
O art. 34 da Lei de Entorpecentes não apenas expões sua natureza 
de ato preparatório ao vincular os verbos nucleares aos instrumentos 
e objetos de destinação à produção de drogas, violando o princípio 
da lesividade, como cria um tipo penal vago e impreciso, em frontal 
ofensa à taxatividade.71 
 
Prosseguindo, vemos o artigo 35 que reproduz o disposto no artigo 14 da lei 
vigente anteriormente, sendoesse o crime de “associação para o tráfico”. Esse 
exige um animus associativo entre dois ou mais agentes para prática, reiterada ou 
não, do tráfico de drogas. 
Mais uma inovação legislativa é a expressa pelo artigo 36 da Lei nº 
11.343/06, isso porque esse traz um novo tipo autônomo de crime, o sustento do 
tráfico. Antes dessa inovação, aquele que financiasse ou custeasse o tráfico 
 
70 Ibid., p. 287-288 
71 Ibid., p. 300-301 
32 
respondia pelo crime de tráfico, geralmente na condição de partícipe. Já o artigo 37 
prevê o crime de colaboração ao tráfico e o 38 constituí o crime próprio de 
profissionais da saúde que prescrevem ou ministram, culposamente, drogas 
desnecessárias a pacientes. Em seguida, temos sete causas especiais de aumento 
de pena, sendo essas: 
Outrossim, o artigo 41 estabelece uma causa especial de diminuição de 
pena para àqueles agentes que colaborem com a investigação, identificando os 
demais autores do fato e ajudando na recuperação dos produtos do crime. Em 
seguida, o artigo 44 ratifica a lei de crimes hediondos e estabelece a 
inafiançabilidade e insuscetibilidade de sursis, conversão em penas restritivas de 
direito, graça, indulto, anistia, liberdade provisória e, ainda, impõe o cumprimento de 
2/3 a pena para o livramento condicional (vedando-o aos reincidentes específicos) 
aos crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1o, e 34 a 37 da Lei nº 11.343/06. 
No que concerne à inimputabilidade do agente dependente e à semi-
imputabilidade como causa de diminuição de pena, ambas foram mantidas pela 
atual lei (art. 45 e 46), sendo também mantida a previsão de tratamento àqueles que 
comprovadamente necessitarem (art. 47). 
Já em relação às medidas processuais mostra-se necessário o laudo prévio 
de constatação da natureza e quantidade da droga para a lavratura do auto de 
prisão (art. 50, §1º); os prazos para a conclusão do inquérito policial são maiores 
(art. 51); há a possibilidade do flagrante diferido (art. 53, inciso II); tem-se a 
notificação do acusado e apresentação de defesa prévia antes do recebimento da 
denúncia (art. 55); inverte-se a ordem de inquirição na AIJ, sendo o interrogatório do 
réu o primeiro ato a ser realizado; e, no que tange à regra de recolhimento à prisão 
como condição à apelação do condenado, essa fora atenuada, dispensando o 
recolhimento caso o réu seja reconhecido pela sentença condenatória como primário 
e de bons antecedentes. 
Isso posto, aqui se encerra um breve relatório sobre as principais legislações 
brasileiras concernentes às drogas e suas influências externas. 
 
33 
3 DA SELETIVIDADE PUNITIVA NOS CRIMES DE DROGAS 
 
No capítulo anterior buscamos analisar a evolução da legislação pátria 
referente à proibição das drogas e algumas de suas influências externas. Vimos 
então que a partir do século XX às drogas passaram a ser objeto do direito penal, 
sendo o grande incentivador da proibição dessas os Estados Unidos da América. 
Resta agora traçar breves pontos quanto à justificação deste ideal proibicionista, 
algumas de suas consequências e funções. 
 
3.1 DA JUSTIFICAÇÃO 
 
Como já visto, condutas relacionadas às drogas foram definidas como 
crimes, sendo que esse é a institucionalização punitiva de uma conduta desviante. 
Uma conduta é tida como desviante quando “varia excessivamente em 
relação à média. ”72 Sendo assim, uma conduta é desviante por “consequência das 
reações dos outros ao ato de uma pessoa. ”73 
Becker nos apresenta a ideia de que “o desvio não é uma qualidade que 
reside no próprio comportamento, mas na interação entre a pessoa que comente um 
ato e aquelas que reagem a ele. ”74 Logo, ”o desvio é apontado por uma pessoa, 
indicando a estranheza sobre a ação de outra. ”75 
“O certo é que toda sociedade apresenta uma estrutura de poder, com 
grupos que dominam e grupos que são dominados”76 e, busca-se a “expansão dos 
valores do grupo que se pretende hegemônico sobre aquele que deve ser 
dominando”77, mantendo-se, assim, esse seu caráter dominante. Afinal, “o ato de um 
grupo que, ao delimitar atitudes aceitas e desviantes, afirma, antes de mais nada, 
 
72 BECKER, Howard Saul. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro: Zahar 
editora, 2009. p. 18. 
73 Ibid., p. 22. 
74 Ibid., p. 27. 
75 BIAR, Marcelo. Arquitetura da dominação: o Rio de Janeiro, suas prisões e seus presos. 1. ed. 
Rio de Janeiro: Revan, 2016. p 51. 
76 ZAFFARONI, Raúl Eugênio e PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal – parte geral 
– 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 62. 
77 BIAR, 2016, p. 36. 
34 
padrões que acabam privilegiando seu próprio grupo”78 e, “aqueles grupos cuja 
posição social lhe dá armas e poder são mais capazes de impor suas regras. ” 79 
A imposição da cultura dominante se dá por meio do controle social, que é a 
“influência da sociedade delimitadora do âmbito da conduta do indivíduo. ”80 Essa 
delimitação pode ser implícita ou explícita, institucionalizada ou não, punitiva ou não 
punitiva. 
Para desvios mais acentuados se opta pelo controle punitivo, que é a forma 
de controle social onde se institucionaliza e pune os praticantes das condutas assim 
qualificadas. Ou seja, criam-se regras formais para inibir que tal conduta seja 
realizada, e caso essa ocorra, pune-se quem as cometeu. 
“O Estado, ao monopolizar toda forma de reação contra o delito, necessitaria 
de orientações político-criminais como pauta programática das agências de 
punitividade. ”81 A institucionalização formal de uma conduta pelo Estado se dá por 
meio do sistema penal, “englobando a atividade do legislador, do público, da polícia, 
dos juízes, promotores e funcionários da execução penal. ”82 
A primeira etapa do sistema penal, chamada de seletividade punitiva 
primária, se externa por meio da atividade legiferante e o direito penal, consistindo 
em “sancionar uma lei penal material que incrimina ou permite a punição de certas 
pessoas. ”83 
Becker também afirma que “Para que uma regra seja criada, alguém deve 
chamar atenção do público para esse assunto, dar o impulso necessário para que as 
coisas sejam realizadas e dirigir as energias suscitadas na direção certa. ”84 
Nessa linha de pensamento, o tráfico de drogas não é uma conduta 
desviante em si, mas, por ter sido apontada como tal, por uma força política como os 
Estados Unidos da América, passou-se a ser visto dessa maneira, e como forma de 
coibir sua prática, exerceu-se o controle social, na forma de controle punitivo, 
institucionalizando-se o tráfico como crime e cominando punição à sua prática. 
 
78 BIAR, 2016, p. 33. 
79 BECKER, 2009, p. 30. 
80 ZAFFARONI, 2015, p. 62. 
81 CARVALHO, 2016, p. 132. 
82 ZAFFARONI, 2015, p. 70. 
83 D’ELIA FILHO, 2007, p. 16. 
84 BECKER, 2009, p. 167. 
35 
Rosa del Olmo aponta que a legitimação do controle social formal se deu por 
meio de “discursos construídos em torno da droga que permitiram, por sua vez, a 
criação de estereótipos”85. Passemos então à análise desses: 
 
3.1.1 Do discurso ético-jurídico e o estereótipo moral 
 
No que concerne à sua gênese, o discurso pró-criminalização difundido 
possuía “fundamento moral diretamente trazido da moral protestante do século XIX, 
que vê na abstinência um ideal de virtude”.86 No mesmo sentido afirma-se que “o 
movimento proibicionista tinha raízes na tradição puritana do protestantismo, 
interpretação do cristianismo radicalmente contrária à busca do prazer em vida”.87 
Contudo, “a política de proibição, desde o início, já revelava as 
condicionantes socioeconômicas da reação ao uso e comércio de algumas drogas”88 
Thiago Rodrigues ressalta que a proibição das drogas e seu discurso moralista 
serviam de disfarce à um discurso xenofóbico, sendo esse: 
Nos Estados Unidos, a reprovaçãomoral ao uso de substâncias 
psicoativas – representado pelas abstêmias ligas puritanas – foi 
tradicionalmente acompanhado pela associação entre determinadas 
drogas e grupos sociais. Os chineses vindos em larga escala para 
trabalhar na construção de estradas de ferro no oeste nos EUA, 
trouxeram o hábito de fumar ópio e a esse psicoativo foram 
ferrenhamente associados. A maconha era considerada, em 
princípios do século XX como droga de mexicanos, grupo visto pelos 
brancos estadunidenses como indolentes, preguiçosos e, por vezes, 
agressivos. Aos negros, parcela da população lançada em 
miseráveis condições de vida, atribuía-se o uso de cocaína, prática 
que supostamente os tornava sexualmen te agressivos. Por fim, o 
álcool era percebido como uma droga abusada pela comunidade de 
imigrantes irlandeses. Nos quatro casos, uma mesma lógica: 
minorias e imigrantes portavam comportamentos moralmente 
reprováveis que ameaçavam valores profundos dos Estados 
Unidos.89 
 
No mesmo sentido, Rosa del Olmo reconhece: 
Nos Estados Unidos, os opiácios [...] estavam muito mais confinados 
aos guetos urbanos e, em especial vinculados aos negros e porto-
riquenhos. Por sua vez, a maconha também era própria de grupos 
marginais, fundamentalmente emigrantes mexicanos. Era chamada 
 
85 OLMO, Rosa del. A face oculta da droga. Rio de Janeiro: Revan, 1990. p. 23. 
86 RODRIGUES, 2006, p. 47. 
87 RODRGUES, 2003, p. 26. 
88 D’ELIA FILHO, 2007, p. 79. 
89 RODRIGUES, 2003, p. 31. 
36 
de “erva assassina” porque era associada à violência, agressividade 
e criminalidade.90 
 
Em sentido convergente, Vera Malaguti Batista conecta o discurso 
proibicionista e o enfoque da população por ele alcançada ao nível econômico, 
sendo assim por ela descrito: 
A primeira lei federal contra a maconha tinha como carga ideológica 
a sua associação com imigrantes mexicanos que ameaçavam a 
oferta de mão-de-obra no período da Depressão. O mesmo ocorreu 
com a migração chinesa na Califórnia, desnecessária após a 
construção das estradas de ferro, que foi associada ao ópio. No Sul 
dos Estados Unidos, os trabalhadores negros do algodão foram 
vinculados a cocaína, criminalidade e estupro, no momento de sua 
luta por emancipação. O medo do negro drogado coincidiu com o 
auge dos linchamentos e da segregação social legalizada. Estes três 
grupos étnicos disputavam o mercado de trabalho nos Estados 
Unidos, dispostos a trabalhar por menores salários que os brancos.91 
 
Percebe-se então que, até a década de cinquenta, o discurso proibicionista 
se corporificava com um discurso jurídico e fundava-se em um “estereótipo moral, 
que considerava a droga fundamentalmente sinônimo de periculosidade”.92 
Criou-se, portanto, um vínculo formal entre esses grupos e a ilegalidade, 
permitindo que os mesmos fossem passivos de maior vigilância. “Sua associação 
com as drogas que passavam à ilegalidade criava possibilidades concretas para que 
tais comunidades fossem assediadas pelos braços policiais do Estado, sob a 
justificativa de combate ao tráfico”,93 mostrando que “o problema do sistema não é a 
droga em si, mas o controle específico daquela parcela [...] considerada perigosa. ”94 
 
3.1.2 Do discurso médico sanitarista e estereótipo da dependência 
 
Com o passar dos anos, já na década de 60, houve uma explosão do 
consumo de drogas pois essas foram vinculadas aos movimentos de contestação, 
“agrupados sob o nome da contracultura, [...] o uso de drogas ilícitas esteve 
 
90 OLMO, 1990, p. 29. 
91 BATISTA, Vera Malaguiti. Difíceis ganhos fáceis: drogas e a juventude pobre no Rio de Janeiro. 
Rio de Janeiro: Revan: 2003. p. 81. 
92 OLMO, 1990, p. 30. 
93 RODRIGUES, 2003, p. 32. 
94 BATISTA, 2003, p. 134. 
37 
presente como ato de sublevação contra a autoridade estatal”95, surgindo como 
“instrumento de protesto contra políticas belicistas e armamentistas. ”96 
O uso de entorpecentes agora conectados aos movimentos de contracultura 
e pacificação, fizeram com que o espaço público fosse tomado pelo consumo de 
drogas “aumentado sua visibilidade e, consequentemente, gerando ‘pânico moral’, 
que deflagrará intensa produção legislativa em matéria penal. ”97 
Houve, portanto, uma alteração do público consumidor dessas substâncias, 
do espaço onde elas se inseriam e até as substancias em si (surgimento do LSD por 
exemplo). 
O consumo não mais se restringia à guetos urbanos, não sendo os usuários 
apenas imigrantes e negros, como também de jovens brancos, membros da classe 
média norte-americana. 
De tal forma, fez-se necessária uma adequação do discurso proibicionista, 
por meio da criação do estereótipo de dependência para o consumidor, mormente 
na Convenção Única de Entorpecentes de 1961, na qual foi “a toxicomania 
considerada perigo social e econômico para a humanidade. ”98 
Insta salientar que o surgimento do discurso médico-sanitário não aboliu o 
discurso moral, fazendo com que ambos estivessem presentes na legislação 
vigente, seja nas convenções Internacionais, seja nas leis pátrias, que foram 
alteradas à época, conforme visto no capítulo anterior. 
Estabeleceu-se, assim, uma “ideologia de diferenciação”99, onde coexistiam 
dois tratamentos legais para dois estereótipos distintos, um para o traficante e um 
para o consumidor. 
 
3.1.3 Do discurso político da droga e o estereótipo político-criminoso 
 
Já na década de setenta, a heroína ganha maior destaque, visto que seu 
uso se popularizou entre os veteranos que retornavam da Guerra do Vietnã aos 
EUA. Logo, o espaço para essa também se ampliou pois, “até então se limitava aos 
 
95 RODRGUES, 2003, p. 40. 
96 CARVALHO, 2016, p. 52. 
97 Ibid., p. 52-53. 
98 Ibid., p 54. 
99 Ibid., p. 54. 
38 
guetos urbanos e não havia chegado à juventude branca”100, fazendo com que, em 
junho de 1972, o então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, declarasse 
“guerra às drogas”, sendo essas eleitas como inimigos nº 1 da América. 
A declaração de guerra às drogas permitiu que essas fossem percebidas 
como uma “ameaça à ordem”101 e se iniciasse o discurso político. Esse tinha como 
base e a existência de um inimigo externo, quem seja, os países produtores das 
drogas. 
Sobre o tema, pertinente é a colocação do professor Rodrigues: 
Essa guerra, longe se ser apenas uma metáfora, significa a intenção 
de aprofundar as medidas repressivas por meio do crescimento das 
ações policiais de busca e apreensão de drogas ilegais e combate a 
grupos clandestinos e redes de tráfico. Aceitava-se oficialmente a 
existência de países produtores de drogas ilícitas e países 
consumidores, atitude que cumpriria o papel de exteriorizar o 
problema do tráfico de drogas colocando os Estados e regiões do 
Terceiro Mundo como agressores e os Estados Unidos na posição de 
vítima.102 
 
Nessa linha de pensamento temos também a fala do magistrado Valois, 
consistente em: 
A guerra às drogas declara por Nixon, não obstante ser mais forte 
em outras frentes de batalha, fez sua investida no campo da 
legislação internacional, buscando o aumento do rigor das regras da 
Convenção Única, empreitada que originou o Protocolo de Emendas 
À Convenção Única de Entorpecentes, concluído em Genebra, em 
25 de março de 1972.103 
 
Salo de Carvalho ressalta a ideia de Rosa del Olmo no sentido de que o 
“processo de transferência marcado pela responsabilização de países marginais 
pelo consumo interno de drogas no EUA acabou por produzir a dicotomização 
mundo livre e países inimigos ”104. E prossegue reconhecendo que “os reflexos do 
projeto externo norte-americano incidiram diretamente nas políticas de segurança 
pública dos países da América Latina. ”105 
 
100 OLMO, 1990, p. 39. 
101 Ibid., p. 39. 
102 RODRIGUES, 2003, p. 42-43. 
103 VALOIS, 2017, p. 286. 
104 CARVALHO,

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