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COMO MORA O PROLETÁRIO BRASILEIRO - da senzala a habitação popular (TFG)

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UNINASSAU - CENTRO UNIVERSITÁRIO MAURÍCIO DE NASSAU 
CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO 
 
 
 
 
 
 
Thiago Luis de Oliveira 
 
COMO MORA O PROLETÁRIO BRASILEIRO: 
Da Senzala a Habitação Popular. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RECIFE 
2012 
Thiago Luis de Oliveira 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
COMO MORA O PROLETÁRIO BRASILEIRO: 
Da Senzala a Habitação Popular. 
 
 
 
Trabalho de Graduação apresentado à 
UNINASSAU - Centro Universitário Maurício De 
Nassau para obtenção do título de Bacharel em 
Arquitetura e Urbanismo. 
. 
 
Orientador: André Lemoine 
 
 
 
 
RECIFE 
2012 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico a todo trabalhador... 
 
 
“Calçada pra favela, avenida pra carro 
Céu pra avião e pro morro descaso” 
Criolo 
AGREDECIMENTOS 
 
Agradecer vai ser a parte mais difícil desta monografia, porém cheia de prazer, 
pois a contribuição de muitos foi importante para meu amadurecimento durante o 
curso como também a abertura dos meus olhos a enxergar tema tão rico e, se caso 
me esquecer de alguém desculpem. 
Gostaria de começar pelos hoje apenas nas lembranças meus avós maternos 
operários de outros tempos responsáveis pela minha veia nesta atmosfera proletária. 
Aos meus avós paternos, exemplo a todos aqueles que desejarem viver de 
forma justa e plena em sociedade. 
A minha mãe Márcia dona de um coração de ouro e que me deu a oportunidade 
da vida, ao meu pai Mano Som das bikes responsável pela possibilidade dos meus 
estudos durante minha vida, a Dionísio meu padrasto exemplo de força, hombridade 
e agora construtor das minhas obras, a todos meus familiares que estão sempre a me 
apoiar ou repreender nos momentos que precisei. 
Aos vários personagens diário ou esporádico da faculdade pela convivência 
durante o curso (galegosa, os charas, W.I.C., Jô rudeboy, Mita-mitológica e todos do 
Bloco “M”) ao grupo de futuros Arquitetos e Urbanistas Alene Morais, Felipe Nunes, 
Ravena Souza, Stein Herculano, Erick “federal”, Marina Rocha e, sobretudo a Jorge 
Pedro “o africano” com o qual depois de vários trabalhos, perrengues e rocks criei 
laços verdadeiros de irmandade. 
Ao meu orientador, Professor André Lemoine pela cautela, estímulo, 
entendimento e forma com que acompanhou este trabalho. 
Aos professores os quais realmente entenderem o significado de transmitir 
conhecimento. 
A esses tenho apenas que agradecer pela nossa convivência e crescimento, 
Obrigado! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Para meus Avôs Bau Peinha e Antônio. 
 
RESUMO 
A cidade é uma teia, construída por fios de natureza diversa, privada, pública, 
grupal ou independente, formando o que vimos a denominar o corpo do espaço 
urbano. 
Esse pode ser analisado justamente a partir das intervenções exercidas por 
todos os agentes da sociedade, mudanças que acompanham a evolução do governo, 
e consequentemente a estrutura social brasileira, tornando-se muitas vezes 
determinante no plano de ação tomado por todos os personagens como também no 
resultado dos mesmos. 
Possibilitando a compreensão do processo sofrido pela habitação operária no 
decorrer da história do Brasil, este iniciado no período colonial, porém amplamente 
implantado no âmbito da revolução industrial por volta do século XIX até metade do 
século XX, época que as condicionantes da construção de moradia operária já se 
confundiam com as da habitação social culminando no momento da explosão 
demográfica nas cidades, fazendo a problemática sair do controle governamental, 
encontrando por aqui referencial nas experiências de industrialização europeia como 
nos modelos pós-guerra da Alemanha, França, Estados Unidos e Inglaterra, essas 
que caracterizaram o cenário de surgimento do capitalismo e deste modo o 
embasamento da sociedade moderna. 
 Para isso será tomado como base de estudo o complexo habitacional 
construído pela Companhia Industrial Pirapama na cidade de Escada, Pernambuco 
em 1925 o qual originou o bairro da Vila Operária, levando em conta desde sua 
fundação, expansão, influência socioeconômica como interferências no desenho 
urbano, estilo arquitetônico das construções, capacidade das unidades residenciais 
em atender as necessidades dos moradores e futura descaracterização. 
 
 
Palavras-chave : habitação proletária, vilas operárias, revolução industrial, sociedade 
moderna. 
 
ABSTRACT 
The city is a web, built by wires of different nature, private, public, group or 
independent, forming what we saw to name a body of urban space. 
This can be analyzed precisely from the interventions undertaken by all agents 
of the society, changes that follows the evolution of the government and consequently 
the Brazilian social structure, often becoming determinant the plan of action taken by 
all the characters as well as the result of themselves. 
Allowing the understanding of the process suffered by workers dwelling along 
the history of Brazil, this begun on the colonial period, but, widely deployed in the 
context of the industrial revolution around the nineteenth to mid twentieth century, at 
the time of determinants of housing construction workers were already confused with 
the social housing, culminating when the population demographic explosion in the 
cities, making it to be out of the governmental control, finding here the referential 
experiences of European industrialization postwar models from Germany, France, 
America and England, those that characterized the scenario of emergence of 
capitalism and hence the foundation of modern society. 
This will be taken as the basis for the studies of the habitational complex built 
by the Pirapama Industrial Company, in the city of Escada, Pernambuco, in 1925 which 
gave the distract name of workman village, considering since the foundation, 
expansion, social economy influence as part of the urban design and architecture style 
of the constructions, capacity of the residential units to comply the needs of the future 
residents and mischaracterization. 
 
 
Keywords: housing proletarian, workers' villages, industrial revolution, modern society. 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 
 
Figura 01 – Engenho Noruega, Escada – PE, por Cícero Dias, 1933..................... 16 
Figura 02 – Ilustração da estrutura dos engenhos de açúcar do sec. XVII. ........... 17 
Figura 03 – Comunidade Sapucají, vila de trabalhadores livres do Engenho 
Sapucají, 2013. ....................................................................................................... 19 
Figura 04 – Trem da Usina União Indústria antigo engenho do sec. XVIII.............. 20 
Figura 05, 06, 07 – Cortiços no Rio de Janeiro. ...................................................... 21 
Figura 08 – Entrada para cortiços no Vale Do Bixiga, São Paulo............................ 22 
Figura 09 – Plano de imola por Leonardo da Vinci, 1502........................................ 24 
Figura 10 – Representação artística da ilha da Utopia de Thomas More................ 25 
Figura 11 – Complexo da vila de Saltaire, atualmente............................................ 27 
Figura 12 – Mietkasernen, elevações de fachada externa (dir.) e interna (esq.). ... 28 
Figura 13 – Sanzala2 Quicongo, noroeste de Angola. ............................................ 32 
Figura 14 – Planta de casas operárias a serem acrescidas à vila já existente no 
antigo Largo Conde de Sarzedas (1901), Hoje Praça Mário 
Margarido ................................................................................................................ 32 
Figura 15 – Casa popular situada nas imediações da baixada do Glicério, 
Travessa Ruggero, 1901. ........................................................................................ 34 
Figura 16 – Favela no moro da providência, provável 1º favela do 
Rio De Janeiro, ao fundo a cidade industrial. .........................................................35 
Figura 17 – Vila de Paranapiaba, Santo André, SP (2008). ................................... 39 
Figura 18 – Vila de subtenentes e sargentos em Bayeux, PB (2009). ................... 40 
Figura 19 – Reforma no bairro do Recife, iniciada em 1910. .................................. 41 
Figura 20 – Capela de Santa Filonila, com a entrada já alterada, 2013.................. 48 
Figura 21, 22 e 23 – Detalhes das Residências da Vila Operaria, 
Escada – PE, 2013. ................................................................................................ 49 
Figura 24 – Mapa setorizado da Vila Operária da CIP em 1925 e evolução. ......... 50 
Figura 25 – Único detalhe encontrado nas Residências para operários em 
geral da CIP 2013. .................................................................................................. 51 
Figura 26 – Rua Carlos Burles, Vila Operária, escada – PE, 2013. ....................... 41 
Figura 27 – Residência destinada aos cargos administrativos da CIP, 2013. ........ 52 
Figura 28, 29, 30 e 31 – Elementos arquitetônicos da esquerda para direita, 
foro estilo muxarabi, piso de taco e diferentes ladrilhos hidráulico, residências 
 C.I.P., Escada – PE, 2013..................................................................................... 52 
Figura 32 – Castelo da Vila Operária da CIP, 2013. ............................................... 53 
Figura 33 – Mapa da cidade de escada em 1965, tendo os principais 
pontos identificados. ............................................................................................... 55 
Figura 34 – Rua das casas novas, 2013. ................................................................ 56 
Figura 35 – Visão atual da vila operária da CIP, 2013. ........................................... 57 
Figura 36 – Cidade de escada, PE, em destaque bairro da vila operária. ........... 59 
Figura 37 – Bairro da Vila Operária e bairros ao seu redor, em destaque o 
complexo industrial original. .................................................................................... 60 
Figura 38 – Bairro da Vila Operária, destacando o complexo industrial original... 61 
 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS 
 
Gráfico quantitativo do êxodo rural no Brasil ............................................................ 41 
Tabela 01 – Fonte Bonduki (1998) ............................................................................ 42 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
BNH – Banco Nacional da Habitação 
CEF – Caixa Econômica Federal 
CIP – Companhia Industrial Pirapama 
FCP – Fundação da Casa Popular 
FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço 
IAB – Instituto dos Arquitetos do Brasil 
IAPs – Instituto de Aposentadoria e Pensões 
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
IPASE – Instituto de Pensões e Aposentadoria dos Servidores do Estado 
JOC – Juventude Operária Católica 
PME – Prefeitura Municipal da Escada 
SERFHAU – Serviço Federal de Habitação e Urbanismo 
SFH – Sistema de Financiamento Habitacional 
 
LISTA DE ANEXOS 
 
Poema Favelário Nacional, Carlos Drummond de Andrade...................................... 74 
Contrato de compra da casa, Nº05 na Rua Noé Barros, 1981.................................. 75 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1. INTRODUÇÃO....................................................................................................... 11 
 
2. A FACE SOCIAL .................................. ................................................................ 16 
 
3. CONCEITOS E MOLDES IMPORTADOS .................. .......................................... 24 
 
4. A MODERNIZAÇÃO NA REPÚBLICA VELHA .............. ...................................... 31 
 
5. O NOVO ESTADO POPULISTA ........................ .................................................. 41 
 
6. ESTUDO DE CASO – A VILA OPERÁRIA DA C.I.P....... ..................................... 47 
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................... ....................................................... 62 
 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 64 
 
APÊNDICE ................................................................................................................ 66 
 
ANEXOS ................................................................................................................... 74 
 
GLOSSÁRIO ......................................... .................................................................... 82 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 11 
1 INTRODUÇÃO 
 
Muitos estudos são dirigidos ao tema desta monografia, porém a 
abordagem acaba ficando apenas nas eventuais interferências do governo, ou na 
tentativa de descobrir quem fez ou não as primeiras ações sociais e ainda apenas no 
tardio processo de desenvolvimento industrial brasileiro ocorrido no final do século 
XIX. 
Dessa vez a pretensão será abrangente e buscará examinar vários fatos 
da história do Brasil relacionados com o tema, pois deles é preciso para o 
entendimento dos acontecimentos que cadenciam a situação da sociedade em seus 
momentos, sendo imprescindível a identificação dos atuantes, assim como, a 
importância desses no sistema, o que caracteriza quase sempre os modificadores a 
fim de garantir seus interesses e os modificados com a necessidade de se enquadrar 
ao ambiente social, portando os dois irão assim transformar e adaptar os espaços do 
campo a cidade, criando formas, distribuições e limites que definem o variado conjunto 
de intervenções adotadas na produção habitacional do proletário no Brasil. 
Gilberto Freyre brilhantemente no livro Casa-Grande & Senzala de 1936, 
remete toda a formação da sociedade brasileira a família patriarcal rural definindo-a 
como “agrária, escravocrata e híbrida”, Freyre ainda vai mais além e esmiúça a 
mentalidade que outorga o sistema familiar e o espaço doméstico. 
... tendo a família rural e semi -rural por unidade, quer através de gente 
casada vinda do reino, quer das famílias aqui constituídas pela união de 
colonos como mulheres caboclas ou com moças órfãs ou mesmo à-toa 
mandadas vir de Portugal pelos padres casamenteiros. Vivo e absorvente 
órgão da formação social brasileira, a família colonial reuniu, sôbre a base 
econômica da riqueza agrícola e do trabalho escravo, uma variante de 
funções sociais e econômicas. (FREYRE, 1936). 
“À noção de campo social acrescenta-se o conceito de habitus – (sistema 
de disposições duráveis, estruturas predispostas a funcionarem como estruturas 
estruturantes)” (BOURDIEU 1994 apud STANCHI 2008). Com isso fica entendido que 
a moradia, seja maior que a construção em um logradouro, a edificação é um dos 
pontos primordiais para entendimento e identificação do nosso status na sociedade, a 
qualidade de vida sendo reflexo dessa condição habitacional é inclusa como 
importante fator que propícia o desenvolvimento humano. 
 12 
Nessa argumentação Zarankin (2002) apud Stanchi (2008) apoia o conceito 
defendido, qual a configuração espacial onde se vive é ampla, responsável e 
definidora da posição, relação e sentimento do homem com o grupo social qual se 
encontra inserido como também o espaço ao qual esse pertence. 
Os prédios são objetos sociais, e como tais estão carregados de valores e 
sentidos próprios de cada sociedade. No entanto, não são um simples reflexo 
passivo desta, pelo contrário, são participes ativos na formação das pessoas, 
dito de outra forma, a arquitetura denota uma ideologia, e possui a 
particularidade de transformá-la em real –material–, para desta forma 
transmitir seus valores e significados por meio de um discurso material. 
Assim, se considerarmos que os prédios são formas de comunicação não-
verbal, então eles podem ser lidos. (ZARANKIN, 2002 apud STANCHI 2008 
É preciso se valer deste entendimento assim como do conhecimento das 
muitas outras questões que afetam o desenvolvimento e relações, histórico-sócio-cultural das cidades, buscando entender a participação desses catalisadores no 
resultado do produto físico-espacial. Destrinchar as vertentes do pensamento sobre 
qual o material, as construções em si, e desenho do espaço físico criam simbologias 
que se pluralizam nos costumes da sociedade, é vital para alcançar sua compreensão, 
tanto quanto sua participação no sistema. 
Vicente Del Rio abrange o pensamento sobre a paisagem ser o cenário da 
sociedade quando fala que 
A paisagem deve ser entendida como o cenário que nos rodeia, participa e 
conforma o nosso cotidiano. Até a economia política marxista já admite que 
a paisagem não é um simples subproduto da luta de classes, mas que 
participa desta luta e influência as relações sociais se apenas por sua inércia 
histórico-funcional como físico (DEL RIO, 1995) 
O autor ainda continua neste ponto de vista revelando a paisagem como 
fonte mágica de estudo para os diversos campos profissionais 
Arquitetos, Urbanistas, geógrafos, paisagistas, escritores, agrônomos, 
biólogos, engenheiros de transporte, sociólogos e tantos outros, querem 
produzir, moldar, estudar, complementar, descrever, destruir, conservar, 
usar, se apropriar da paisagem (DEL RIO, 1995) 
Uma interpretação aberta e concisa do sistema onde o proletário está 
condicionado ao patrão pela moradia desde a escravidão não pode parar nos volumes 
físicos, é preciso explanar o pensamento sobre o produto das relações entre espaço 
urbano, condições sociais, econômicas e seus modificadores, devendo-se ressaltar a 
percepção e modo de influência destes agentes no meio social qual está inserido, 
 13 
abrindo questionamento pertinente às alterações causadas às características e 
costumes das pessoas integrantes da sociedade. 
Desse modo o escravo africano e o indígena não podem ser excluídos, 
visto que o processo de dominação existente na sociedade colonial no movimento de 
catequese indígena e com o branco das casas-grandes o dono da terra e os negros 
nas senzalas qual recebia comida para apenas sobreviver e trabalhar, vai ser 
encontrada no decorrer da nossa história culminando no processo da industrialização 
e posteriormente mascarado pela intenção social. 
De extrema importância também é encontrar as bases filosóficas que vão 
influenciar os modelos habitacionais para a classe de baixa renda na América do 
norte, Alemanha, França e principalmente Inglaterra, pois é das experiências 
governamentais nestes países que o arquétipo brasileiro vai encontra base para seu 
planejamento. Questionamento importante sobre essa condicionante é: nós 
importamos ou fomos empurrados a essa via de regras? 
Anna Finger (2009) propicia a resposta enquanto é categórica ao afirmar que 
... no panorama europeu, visando oferecer melhores condições de habitação 
aos seus funcionários, os empreendimentos industriais começaram a investir 
na construção de vilas para, por um lado, manter os operários próximos aos 
seus locais de trabalho e, por outro controla-los de perto, exercendo um duplo 
papel de benfeitoria e dominação... Já no caso brasileiro, sendo um país 
calcado na produção agrícola desde os tempos coloniais, a introdução dos 
conceitos e hábitos “modernos” não se deram da mesma forma. Na maior 
parte dos casos foram importados os modelos utilizados nos países 
europeus, introduzidos no Brasil em meio a uma sociedade rural e 
escravocrata, contribuindo para ressaltar ainda mais as contradições dos 
modelos econômicos até então adotados. 
O período da Primeira República será avaliado seguindo estudos de Eudes 
Campos (2008) que concluiu: 
O pensamento liberal da época reconhecia a necessidade de construção de 
casas populares em quantidade suficiente para abrigar a classe trabalhadora 
e extinguir os cortiços, mas sempre deixou esse encargo inteiramente à 
iniciativa privada, que mediante incentivos e favores propiciados pelo Estado, 
deveria construí-las e explorá-las modicamente. Os empresários, porém, só 
se interessavam pela questão da construção da moradia proletária, pelo viés 
imediatista da rentabilidade. Ao mesmo tempo, a mentalidade discriminatória 
da burguesia daquele tempo não admitia a presença do pobre dentro da área 
urbana da cidade. 
Apoiando-se no trabalho de Bonduki (1998) que analisa as iniciativas e 
intervenções da produção habitacional como de interesse governamental até a “social” 
 14 
entre 1930 e 1964, para que a cidade urbana-industrial brasileira não passe de um 
nível desorganizado que sempre fez parte para um plano caótico, a vila operária passa 
a ser enfocada por fazer parte do complexo sistema qual a indústria atrela a cidade, 
grande causadora do paradigma habitacional que deu possibilidade do controle dos 
seus funcionários dentro da fábrica e fora pela moradia e outros serviços oferecidos 
pelo patrão o que gerava um domínio múltiplo. 
Portanto, enxergar que o envolto social fabril, está submetido a valores 
materiais e simbólicos, acrescido de visões amplas como da filosofa Viviane Mosé 
qual no estudo das simbologias sobre a vida fabril adicionado ao cotidiano escolar, 
remete a estrutura e nomenclaturas da escola brasileira ao processo fordista, os níveis 
escolares são séries, a matéria agora é disciplina, o sinal sonoro ao fim de cada aula 
é o apito da fábrica, o aluno não é mais levado a ter opinião, nesta configuração 
escolar, há um desestímulo a crítica e ao questionamento do papel de cada cargo, 
uma total ausência de criação e então a apreciação da repetição, a finalidade escolar 
torna-se a transformação da massa popular em proletário pacífico. 
Na sociedade industrial, a diferenciação tornou-se desejada pelos que se 
viam ameaçados por uma suposta igualdade social e a arquitetura foi mantida 
como um instrumento poderoso para afirmação da superioridade de uns e 
consequentemente inferioridade de outros. Podemos perceber uma grande 
diferença entre o discurso e a prática burguesa no que se refere à construção 
da moradia para classes subalternas. (STANCHI, 2008) 
É necessário fazer uma abordagem em linha cronológica a fim de buscar 
os aspectos relevantes ao capítulo da permanência imprópria como mora o proletário 
no Brasil, levando em conta os parâmetros econômicos e a situação governamental, 
manobristas da sociedade, da questão habitacional e assim do plano arquitetônico e 
urbanístico, mostrando o entendimento da causa pelos profissionais, mas a nem 
sempre liberdade de atuação, resultando propostas que simbolizam os momentos 
pelo qual a moradia pode ser examinada. Sendo principalmente após a revolução 
industrial quando o camponês abandona a terra, a manufatura, migrando para a 
cidade que se vão criar métodos de garantir o homem explorando o homem. 
Sob esse enfoque identificar às diretrizes que serviram de embasamento 
para origem das construções destinadas a habitação proletária no Brasil depende não 
só apenas da análise da situação dos conjuntos habitacionais, mas também da 
reflexão sobre os fatos históricos, que abrangem e renovam o ponto de vista sobre a 
 15 
organização, produção e evolução desses espaços durante os vários períodos da 
história. Desta forma, fundamentado no método de Stanchi (2008) a análise deverá 
envolver três níveis de pesquisa, o primeiro restringe-se ao discurso qual apoia a 
sustentação de um modelo de construção, no segundo acontece à busca do 
entrosamento entre o discurso e o produto desse pensamento, a sua representação 
física, e o terceiro e mais difícil o comportamento dos atores sociais mediante ao 
discurso e prática. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 16 
2 A FACE COLONIAL 
 
A história sobre a origem da habitação das classes mais baixas no Brasil 
desenvolve-se por volta de 1532 com a chegada dos colonizadores portugueses e, 
portanto dos primeiros esboços de “vida social” pelos fidalgos da metrópole 
estabelecidos entre as quinze capitanias hereditárias, decisão decisivana efetiva 
colonização das terras brasileiras. 
Portugal se encontrava eticamente ligado à moralização imposta pela 
religião, por lá entendida como religião apenas o catolicismo; a colônia sua extensão 
extra continental não poderia ficar muito distante dessa benção recebida pela 
metrópole, grande seria os investimentos para tornar esse anseio em realidade, a 
domesticação indígena acontecida neste processo vai ser uma das primeiras formas 
de subjugar costumes de uma classe em dominação. 
... sob a pressão técnica e moral da cultura adiantada, esparrama-se a do 
povo atrasado. Perde o indígena a capacidade de desenvolver-se 
autonomamente tanto quanto a de elevar-se de repente, por imitação natural 
ou forçada, aos padrões que lhe impõe o imperialismo colonizador” 
(FREYRE, 1936) 
 
FIGURA 01 – ENGENHO NORUEGA, ESCADA – PE, POR CÍCERO DIAS, 1933. 
FONTE: HTTP://COMIDAEHARTE.BLOGSPOT.COM.BR/ 
 17 
A era colonial em linha geral vai caracterizar-se pela mão-de-obra escrava 
de início indígena, na extração de pau-brasil e a partir da segunda metade do século 
XVI africana nos engenhos de açúcar, no latifúndio de algodão ou na mineração. 
O engenho de açúcar está nas raízes da questão sobre a criação dos 
primeiros núcleos habitacionais com destino a empregados ainda que escravos por 
patrões, com a instalação dos engenhos de açúcar na terra brasilis foi possível 
articular a exploração da América e da África – fornecedora de mão-de-obra – Aqui 
no Brasil, Pernambuco e São Vicente hoje São Paulo ganham destaque como 
principais produtores, vai ser nesses complexos agroindustriais que surgem em 
adjacência pequenas vilas quais apresentam além da casa-grande, moita, capela, 
senzalas para os escravos as moradias para trabalhadores livres. Gaspar Barléu 
relata sobre a Paraíba no período de domínio holandês além da cidade de Filipéia 
“não possui outras povoações senão os lugarejos dos engenhos, que, pela multidão 
dos trabalhadores, constituem verdadeiras aldeias” (BARLÉU, 1974, 71). 
 
FIGURA 02 – ILUSTRAÇÃO DA ESTRUTURA DOS ENGENHOS DE AÇÚCAR DO SEC. XVII. 
FONTE: HTTP://WWW.ESSASEOUTRAS.XPG.COM.BR 
A produção açucareira ampliava e estava voltada para exportação, neste 
momento da história o açúcar atingia preço bastante elevado, o ouro branco. No final 
do século XVIII a economia sob as regras da política mercantilista estava direcionada 
para produção agrícola ou extração mineral sendo totalmente controlada por poucos 
comerciantes (burgueses) portugueses. O fato é que a riqueza da colônia está 
baseada em produtos agrícolas “sendo inadmissíveis os desvios de esforços ou de 
 18 
investimentos paralelos a este objetivo” Stanchi (2008), esse modelo fica conhecido 
por a economia de plantation e desfruta de mão-de-obra escrava, impactando 
diretamente o desenvolvimento industrial brasileiro, resultando seu atraso, pois sendo 
a base da estrutura constituída por escravos, não se tornava atrativo aos profissionais 
livres ou mão-de-obra qualificada, em maiorias imigrantes europeus. Essas 
condicionantes validam o que se pode classificar como primeiro estágio da habitação 
proletária colonial no Brasil. 
Um segundo estágio configura-se com o aparecimento de novos países 
produtores de açúcar que provocaram a alta concorrência no mercado incidindo na 
sua desvalorização, o deslocamento do eixo econômico do nordeste para o sudeste 
com o aparecimento do cultivo do café e a recém-transferência da corte para o Rio de 
Janeiro, em 1808. Em situação financeira delicada o império desembarca buscando 
novas fontes de renda para desenvolver e sustentar-se, suspende as proibições sobre 
manufaturas tal como da indústria têxtil restringida pelo alvará de 1785, pois até então 
a produção de tecido deste período visava apenas à fabricação de roupas para os 
escravos, o café encontrando as condições naturais ideais de cultivo se torna o 
principal produto de exportação, marcando início do ciclo econômico cafeeiro que 
conduz a economia por cerca de 100 anos, este estruturado no mesmo modelo 
açucareiro, estava organizado de maneira a atender as necessidades do mercado 
externo e continuava a explorar o escravo. 
A intenção durante o regime colonial é sustentar-se na economia de 
plantation, utilizando como base estruturadora à agro exportação dos produtos, para 
isso buscava o governo apoiar essa produção e escoamento, a tarifa Alves Branco de 
1844, servindo de retaliação às taxas de importação impostas pela Inglaterra ao 
açúcar brasileiro, passava a atribuir taxas de 30% para a grande parte dos produtos 
manufaturados importados, inclusive os tecidos de algodão, foi um dos poucos atos 
interventivos que foram de encontro essa vontade, o debate sobre o atraso industrial 
e os novos meios de produção estavam abertos quando “pouco depois houve uma 
suspensão das taxas alfandegárias que incidiram sobre máquinas e matérias-primas, 
o que estimulou a fundação de fabricas de fiação e tecelagem”. Stein (1979) apud 
Stanchi (2008). Há uma intensificação das lutas e leis em prol do fim da escravidão. 
 19 
Em meados do século XIX os engenhos tinham dado lugar às usinas “que 
se difundiram a partir da década de 1860” (AZEVEDO, 1949, p. 62). Esta fase 
acontece apenas 10 anos após a Lei Eusébio de Queiroz, que proíbe o tráfico 
negreiro, período ainda em que se alastrava o pensamento liberal/modernista 
idealizado na Inglaterra por Francis Bacon e na França por René Descartes em defesa 
da “lei da oferta e procura”, apenas o senhor de engenho consumia bens, a ideia é 
todos, e porque não!?, tornando crescente o número de trabalhadores livre nos 
campos e cidades, a favela se iniciaria por esta época com os negros se refugiando 
nos morros do Rio de Janeiro, a forma construtiva de uma raça possui características 
próprias, por vezes ímpar de acordo com região, cultura, crença e certamente o 
principal fator a disponibilidade de material, é nesse período e contexto que a 
arquitetura popular vai ganhar variada contribuição devido à grande diversidade de 
origem dos ex-escravos e como narra Günter Weimer (2005) “Certamente o capítulo 
mais difícil da história da arquitetura popular brasileira é o da contribuição das 
civilizações africanas, por serem as menos conhecidas e as mais mal estudadas.” 
 
FIGURA 03 – COMUNIDADE SAPUCAJÍ, VILA DE TRABALHADORES LIVRES DO ENGENHO SAPUCAJÍ, 
2013. 
FONTE: ACERVO PRÓPRIO 
A ascensão dos engenhos a usina de açúcar desfrutando do maquinário 
moderno, invenções possibilitadas pela tecnologia do vapor, vê insípida a quantidade 
de residências necessária para atender seus funcionários e operários, o que faz 
ampliar o número de unidades residenciais a ser construído, como torna mais 
completo o programa das casas neste embrião de centro industrial. 
 20 
“... em alguns casos, verdadeiras cidades em miniatura, em que se aglomera, 
em lugar da escravaria das senzalas, numerosa população constituída pelo 
proletariado rural e pelos operários das fábricas e empregados nos serviços 
de administração e de transportes” (AZEVEDO, 1949, 61). 
As linhas férreas foram de grande importância para a firmação desse 
processo, a capacidade obtida por esse meio de transporte tanto para o escoamento 
das principais plantações quanto das mais remotas, até o transporte da mão-de-obra 
se dava por meio das estradas de ferro que ligavam diretamente os produtos ao porto 
para as sua exportação. O valor dos trens nesse processo semi-industrial fica explícito 
com as linhas privadas das usinas de açúcar, a locomotiva a seguir fazia parte de um 
sistema ferroviário privado com 60 km de extensão, sete locomotivas e capacidade de 
transportar o produto final de 500 toneladas de cana. 
 
FIGURA 04 – TREM DA USINA UNIÃO INDÚSTRIA ANTIGO ENGENHO DO SEC. XVIII. 
FONTE: ARQUIVO PRÓPRIO 
Nas cidades surgem soluções habitacionais insalubres, essas não levavam 
em conta os devidos cuidados com a higiene, tipos dehabitação que por algum tempo 
supririam a lacuna imobiliária do rápido desenvolvimento urbano, os quais favorecidos 
por privilégios se tornariam um bom investimento para quem possuísse condições de 
fazer pequenas aplicações no setor como ampliação da sua renda mensal, a 
organização no terreno era buscada para haver economia de material e total 
aproveitamento espacial. 
 21 
O Rio de Janeiro concentrando cerca de 50% dos imigrantes portugueses 
e com uma população que chegaria aos 522.651 em 1890 (TEXEIRA, 1994) vê nascer 
o cortiço, uma adaptação claramente inspirada nas “ilhas” da cidade do Porto, 
possuindo também diferentes nomes: estalagens, avenidas, casa de cômodos, entre 
outros, tais variações justificadas de acordo com a forma da habitação ou até mesmo 
a habitação, porém em momentos diferentes. 
“As casas de cômodos eram casas locadas em partes mais antigas da cidade, 
que, conforme a procura de habitação de baixo custo aumentava, eram 
subdivididas em vários apartamentos, quartos, cubículos, a fim de alojarem 
um número cada vez maior de pessoas... O cortiço do Rio de Janeiro era 
descrito como um tipo de habitação popular composto de fileiras de casas 
pequeninas — às vezes mesmo apenas de quartos — edificadas ao longo de 
um terreno mais profundo, abrindo para pátio Ou corredor, com feição de 
ruela. Nesses casos era frequente a existência de um só conjunto de 
instalações sanitárias e tanques, dispostos no pátio, para uso comum” 
(TEIXEIRA, 1994). 
A infraestrutura dos cortiços era bastante miserável, e nestes 
assentamentos se chegou a alojar mais de 25% da população do Rio de Janeiro 
estimando-se até os 36%, os moradores dos cortiços pertencia basicamente às 
classes baixas e profissionais autônomos, equipamentos como cozinhas e sanitários 
era de uso comum a todos os seus habitantes, relatórios realizados em 1883, referem 
a exemplos de cortiços com uma latrina para dez ou vinte habitações –esses números 
chegavam às centenas– podendo alguns cortiços ainda estar completamente 
desprovidos de instalações sanitárias. Não existia canalização de esgotos, sendo, em 
vez disso, utilizadas fossas. O abastecimento de água era feito através de fontes 
públicas, que podiam estar situadas fora ou no interior desses conjuntos. 
 
FIGURA 05, 06, 07 – CORTIÇOS NO RIO DE JANEIRO. 
FONTE: ACERVO CORREIO DA MANHÃ: ARQUIVO NACIONAL 
 22 
Em sua expressão no estado de São Paulo o cortiço também foi 
protagonista da habitação proletária não existindo diferença das alcovas com porta do 
Rio, erguidas lado a lado em série por primórdios especuladores, os proprietários dos 
cortiços. O lucro sobre os cortiços era tão grande que fortes impostos foram aplicados 
desde 1877, mas apenas em 1881 é que os vereadores de São Paulo conseguem 
estabelecer uma real definição de cortiço para que pudesse haver devida fiscalização, 
o que não aconteceu em prática. “quartos encarreirados cobertos de meia-água, com 
pé-direito variando de 10 a 12 palmos (2.20 m a 2.64 m) e cujas frentes não davam 
para a via pública” (Atas da Câmara Municipal de São Paulo, 1881. p.77 apud Santos. 
 
FIGURA 08 – ENTRADA PARA CORTIÇOS NO VALE DO BIXIGA, SÃO PAULO. 
FONTE: HTTP://SAUDADESAMPA.NAFOTO.NET/ 
No proceder dos anos 70 e 80, seriam criados vários cursos voltados para 
a formação de mão-de-obra qualificada – a Sociedade Propagadora de Instrução 
Popular (1874), o Instituto dos Educandos e Artífices (1874), Instituto D. Ana Rosa 
(1874), Liceu de Artes e Ofícios (1882), Liceu do Sagrado Coração de Jesus (1885). 
 23 
Nesse momento já se tem a preocupação dos salubristas da corte com a 
condição e qualidade das construções particulares e da cidade –não sendo fato 
exclusivo da República como levanta alguns pesquisados– “Em 1886, por exemplo, 
havia sido criada na Província de São Paulo a Inspetoria de Higiene Provincial, 
dependente da Inspetoria Geral de Higiene do Império” (EUDES). A introdução de 
novas noções de higiene as moradias a fim de evitar as entre outras doenças, às 
epidemias de varíola que eram constantes, procuram garantir as condições do 
proletário, uma mão-de-obra barata, exercer suas funções, nesse sentido de acordo 
com Gilberto Freyre desde o primeiro estágio colonial sempre houve preocupação 
com a condição do trabalhador ao menos a garantia de comida. 
Em 1888, pleno ciclo econômico do café a abolição da escravidão é 
deflagrada, um período de mudanças está estabelecido, a imigração de trabalhadores 
livres para o Brasil que não se via favorecida por causa da mão-de-obra escrava agora 
encontra novas condições nesse modelo em que na base da pirâmide está o trabalho 
remunerado, marcando a mudança do perfil dos imigrantes, assim como do comércio, 
a função do governo entra em pauta esse momento é ponto chave para definir a ritmo 
da industrialização. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 24 
3 CONCEITOS E MODELOS IMPORTADOS 
A habitação é um dos fatores básicos que condicionam a vida em 
sociedade. Nas cidades elas são parte constituinte dos diversos problemas que as 
afligem, contudo é após a revolução industrial que o processo do êxodo rural explode, 
é devido à precária urbanização e acelerada produção imobiliária a fim de fomentar o 
mercado que os problemas das cidades vão se agravar. 
Filósofos, arquitetos, urbanistas, economistas, médicos entre tantos outros 
atores fazem parte de um coro que sempre esteve “atento” ao debate sobre as 
condições do meio-urbano, a fim de idealizar cidades belas e funcionais que existam 
sob a sombra de um governo justo, pondo em datas, a cidade planejada faz parte do 
imaginário e das ações humanas desde 3500 a.C. com o planejamento urbano grego, 
sendo considerado como pioneiro Hippodamus com suas teorias e ideias sobre o uso 
ideal da terra e da localização de ruas e edifícios nas cidades de Mileto e Pireu, no 
século IV a.C., de muita importância a leitura do diálogo de Plantão A República onde 
narra o que seria as ideias elementares de organização social e política na cidade 
fictícia de Calípole (Kallipolis, que significa cidade bela), onde nestes dois sentidos a 
sociedade estaria em harmonia, entretanto é no renascimento que são concebidas 
formas práticas para organização física do meio-urbano o que significa uma real 
intenção do controle e produção do espaço urbano, são exemplares desse período: 
De re aedificatoria de Leon Battista Alberti (1452), como também o Trattato de Antônio 
Avelino, o Filarete (1400-1466) vindo até o próprio Leonardo Da Vinci a desenvolver 
detalhado modelo urbanístico que ajudaram a embelezar cidades italianas. 
 
FIGURA 09 – PLANO DE IMOLA POR LEONARDO DA VINCI, 1502. 
FONTE: HTTP://CAMILO0109.BLOGSPOT.COM.BR 
 25 
Outro personagem nesta cadeia do pensamento de organização espacial 
socialista é Thomas More que em 1516 no seu livro a Ilha da Utopia, de onde provém 
o termo utopia, engloba todas as questões anteriores, nele More descrever uma ilha 
imaginária com uma sociedade perfeita composta por 54 cidades idênticas em toda 
sua organização, um plano uniforme, racional, regular e repetitivo, onde a base 
estrutural está apoiada na família camponesa qual tem responsabilidades sobre as 
terras da cidade e também direitos, a propriedade privada não existe, mercados são 
estabelecidos entre os quatros bairros da cidade e fornecem a comida necessária aos 
chefes de família não sendo preciso comprar ou fazer trocas de produtos, utopia. 
 FIGURA 10 – REPRESENTAÇÃO ARTISTICA DA ILHA DA UTOPIA DE THOMAS MORE 
FONTE: HTTP://THEGOSPELANDUTOPIA.BLOGSPOT.COM.BR 
As cidades utópicas estão conectadas com a racionalização do estilo de 
vida burguês e não obrigatoriamente seriam cidades para serem construídas, são 
modelos que favorecem a explanação do tema, trazem concepções de cidades mais 
ordenadas que as existentes até aquele momento, com crescimento de instinto 
vernácular sem planos, são ensaios de condições: social,política e urbana buscando 
 26 
combater o desenvolvimento desordenado das cidades a fim de organizar e obter 
melhorias de vida para a sociedade qual estavam inseridos. 
A partir do século XIX a explosão demográfica nas cidades juntamente com 
a precária situação da habitação para a classe proletária europeia faz ressurgir 
pensamentos e propostas com intuito de tornar a sociedade em suas muitas escalas 
algo um tanto ideal, incorruptível, digno; o filósofo francês Charles Fourier (1772 – 
1837) lança em 1822 suas ideias do Palácio Societário ou Falanstério onde ele 
discorre sobre “um grande edifício onde, além das habitações para três mil e 
quinhentas pessoas, alguns equipamentos de uso coletivo complementariam a vida 
doméstica comunitária” (TRAMONTANO, 1998, p.22 apud VIANNA (2004). No Brasil 
em Santa Catarina por volta de 1841 o Falanstério do Saí foi desenvolvido, chegando 
até obter resultados positivos por alguns anos, porém sem sucesso prolongado. 
No campo da indústria com posicionamento de vanguarda o britânico 
Robert Owen (1771 – 1858) foi um dos precursores da visão de controle social, 
acreditando que o caráter humano era fruto das condições do local em que ele se 
formava. Defendendo a adoção de práticas sociais que primassem pela felicidade, 
harmonia e cooperação, assim, poderia ser superado os problemas causados pela 
economia capitalista. Seguindo seus princípios de visão progressista, Owen reduziu a 
jornada de trabalho seus operários das comuns 14 a 16 horas para 10,5 horas diárias, 
defendeu a melhoria de suas condições de moradia e educação como organizou seus 
funcionários para que entendessem dos seus direitos. 
Inglaterra, França, Alemanha e Estados Unidos estão no centro das 
experiências de habitação para o proletariado patrocinada pelo setor privado e 
governo, são nestes países onde acontecem as primeiras intervenções por meio de 
leis regulamentadores nesta esfera e também quando já no final do século XIX abre-
se a visão para este problema de política social. 
Na Inglaterra por volta de 1825 passou a existir construções patrocinadas 
por pequenos investidores visando rentabilizar o espaço do desregrado processo de 
desenvolvimento fabril, associações entre industriais, denominadas building societies, 
juntos eles criaram um conjunto de vilas operárias na região das cidades de Bradford, 
Halifax e Leeds, os slums, em português literalmente favela, como ficou conhecido o 
modelo inglês de vila operária, Titus Salt outro grande industrial da Inglaterra absorveu 
 27 
todo conhecimento possível do socialismo utópico e foi o responsável por empregar 
estas novas teorias em seu complexo industrial a vila de Saltaire, construída entre 
1851 e 1872, ficando a três milhas do centro de Bradford ele conseguiu apresentar 
alto nível de crescimento com base no controle das necessidades dos seus 
funcionários dentro do próprio conjunto, o modelo de Titus seria um dos mais 
importados pelos industriais fora da Europa, em Saltaire a vida era totalmente distinta 
do que acontecia na cidade de Bradford, qual se encontrava em pleno caos industrial, 
suja, onde surtos de epidemias se tornaram comuns, a poluição industrial extrapolava 
o habitual e os conflitos políticos eclodiam o que caracterizava um segundo modo de 
vida fabril, a crise habitacional era fato consumado no país e foi, sobretudo após a 
primeira guerra mundial que as políticas sociais tiveram mudanças significativas, os 
agora desprovidos de habitação acabara de voltar da guerra como retrata Silva (1997) 
seria uma situação vergonhosa que ex-combatentes não possuíssem residência, o 
autor ainda dimensiona o tamanho do problema “entre 1919 e 1933/34, em toda 
Inglaterra, as autoridades locais foram responsáveis pela produção de 763.000 
moradias, estando por essa data cerca de 30% dela concluídas.” (SILVA, 1997). 
 
FIGURA 11 – COMPLEXO DA VILA DE SALTAIRE, ATUALMENTE. 
FONTE: NTURISMO.COM 
 
A Alemanha possivelmente é dos países que apresentam maior intimidade 
com a questão, por volta de 1847 surgem exemplares de habitação provinda de bases 
cooperativas, uma intenção de caráter social fica percebida pelo público acolhido no 
 28 
programa, apenas na cidade de Berlim estima-se que existiam cerca de 222,000 mil 
habitantes sem residência em 1825, passando esse número a ser maior que o dobro 
em um período de 30 anos. As Mietkasernen “casernas de aluguel” como se 
denominou a variante berlinense para as edificações, possuiu incentivos desde 
Frederico, o grande (1712-1786) sendo ele visto como “pai” do modelo, várias cidades 
da Alemanha desenvolveram as Mietkasernen (Hamburgo, Hanover, Celle), porém as 
mais importantes foram as experiências de Berlim e Frankfurt, tais construções 
caracteriza-se por seguidos blocos de apartamentos com cinco pavimentos que 
podem ser descritos com a seguinte estrutura de acordo com as unidades 
habitacionais e seus respectivos preços de aluguel: 4º piso: três unidades à 100 
Taler1; 3º piso: duas unidades por 150 Taler; 2º piso: três unidades por 200 Taler; 1º 
piso: uma unidade por 500 Taler; Térreo: duas unidades por 200 Taler; Porão ou 
construção posterior: unidades à 50 Taler. 
 
FIGURA 12 – MIETKASERNEN, ELEVAÇÕES DE FACHADA EXTERNA (DIR.) E INTERNA (ESQ.). 
FONTE: PALACE PRISON MIETSKASERNE, ROLF KUCK. 
A França está entre os países que vivenciaram o início e crescimento ápice 
da revolução industrial, em razão disso, aliado a falta de projetos com soluções 
aceitáveis para as classes de menor renda e uma política de visão atrasada e 
convencionalista fez com que suas cidades desenvolvessem problemas sociais e de 
infraestrutura grandíssimo, mas por lá o combate à falta de residência para população 
do nível base do sistema não obteria resultado significativo perto do acontecido na 
Alemanha e Inglaterra. 
Entre 1894 e 1914, apenas 10.000 moradias foram produzidas em toda 
região de Paris, grande fator disso foi o aumento dos valores imobiliário, neste período 
Paris passava pelas reformas urbanísticas de Haussmann, grande número da 
 
1 Taler – moeda de prata que foi usada na Europa por mais de 400 anos. 
 29 
população sem poder monetário passa então a ocupar e subdividir imóveis em antigos 
bairros. Os bidonvilles ocupações ilegais se espalharam por todas as regiões, 
ocupando terrenos vazios, “nas últimas décadas do século XIX e primeiras do século 
XX, são bastante evidentes as similaridades com os cortiços, favelas e loteamentos 
periféricos atualmente existentes nas grandes cidades brasileiras” (SILVA, 1997). A 
França tem importância neste grupo de países devido ao modo que tratou a 
regulamentação da produção das residências, por meio de (secretarias de habitação) 
organizada por cada gestão municipal, fica introduzida a ideia de que o estado tem 
obrigações com o povo. 
Os Estados Unidos igualmente em diversas temáticas apresentaram uma 
configuração própria de solução para habitação proletária, devido ao liberalismo não 
existia uma política de habitação social podendo se falar até em antipolítica já que o 
estado parecia não querer interferir no sistema, por lá os primeiros investimentos 
também acontecem por parte do capital privado e com o intuito obvio de apenas 
rentabilizar a cidade, aparecem os tenements construções sem regulamentação, 
edificadas de forma que fosse aproveitada toda a extensão do terreno com blocos de 
vários andares, na cidade de Nova York bairros inteiros viriam a ser constituído com 
este tipo de moradia, havia ainda os dumb-bell tenements um progresso nesse tipo 
de habitação onde a iluminação e ventilação foram tratadas com mais cuidado, não o 
devido. Em 1901 a condição de não intervenção do estado se altera, acontecendo 
uma grande contra partida para novas construções, leis agora organizam a sua 
configuração básica levando ao desenvolvimento de melhorias significativasnas 
mesmas, muitos tópicos são abordados, porém os mais relevantes eram ventilação, 
iluminação, sistemas elétrico, hidráulico e dispositivos de proteção contra incêndios, 
estes antigos resíduo de imigrantes foram transformados em museus, o modo 
característico dos americanos do norte tratar e valorizar sua cultura e tudo que por lá 
se produz. 
O desenvolvimento do modelo urbanístico americano não levava em conta 
a residência como uma unidade base do plano, isso reflete o pensamento do governo 
da não intervenção, as ações estavam concentradas na implantação de parques e 
áreas verdes, o movimento City Beautiful, da Civic Art e do City Efficient são o limiar 
consolidado desse raciocínio, a explicação para isso acontecer é que as leis foram 
eficientes e postas em prática, sobretudo as contra incêndio. 
 30 
A primeira guerra mundial foi verdadeiramente um fator importante nos 
países que dela participaram. Em 1917 o governo da América do Norte deflagrou um 
programa conhecido como “economia da guerra” esquema onde o estado tornou-se 
durante cerca de um ano o responsável pela garantia de “serviços e bens em setores 
específicos... as war villages construídas nesse breve período foram responsáveis 
pela provisão de moradias para cerca de 360.000 trabalhadores e suas famílias.” 
(SILVA, 1997). Depois de a fase caótica passar e então conseguir se estabilizar que 
os Estados Unidos voltam a sua posição de origem –o não intervencionismo–
reabrindo assim o mercado da habitação aos investidores. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 31 
4 A MODERNIZAÇÃO NA REPÚBLICA VELHA 
O império se entrelaçava com a escravidão, e a abolição em 1888 tornou 
uma questão de tempo até que os republicanos obtivessem a vitória, porém: 
longe de corresponder às inspirações populares, a república não passaria de 
um mero golpe militar. A prova da escassa receptividade à ideia republicana 
pretende-se encontrá-la no insignificante número de pessoas inscritas no 
Partido Republicano e na sua escassa penetração nos meios parlamentares. 
A proclamação da república teria sido facilitada pelo desprestigio que recaia 
sobre a Monarquia, em virtude das críticas que os próprios monarquistas lhe 
dirigiam. (COSTA 1987). 
As iniciativas tomadas pelos governos da República Velha (1889-1930) no 
sentido de produzir habitação ou de regulamentar o mercado de locação residencial 
são praticamente nulas (GAP, 1985). Aos moldes do liberalismo onde o poder público 
não tem intenção direta de intervir nas decisões individuais, o conjunto do livre 
mercado faz a produção privada ficar responsável por satisfazer todas as 
necessidades do sistema inclusive assim à construção de casas para seus 
trabalhadores, ficando o estado com a responsabilidade de fazer intervenções apenas 
nos casos mais graves de insalubridade como aconteceram com os cortiços do Rio 
de Janeiro e posteriormente nos mocambos de Recife, e como será apontado o 
resultado dessas ações não soluciona como aumenta a problemática e revolta da 
população desabrigada. 
A produção de moradia operária no período de implantação e consolidação 
das relações de produção capitalista e de criação do mercado de trabalho 
livre, que corresponde aos primórdios do regime republicano, era uma 
atividade exercida pela iniciativa privada, objetivando basicamente a 
obtenção de rendimentos pelo investimento na construção ou aquisição de 
casas de aluguel. (BONDUKI, 1998). 
No final do século XIX a frágil e pequena classe industrial, planejando sua 
afirmação passa a pleitear parceria com o governo, oferecendo proposta para 
atualizar a estrutura do estado oligárquico objetivando alcançar os novos modelos de 
produção, esta instaurada a transição do país agrícola mercantilista em moderno, 
industrializado e endividado. Mesmo tendo atrapalhado a insípida indústria brasileira 
foi do estreitamento nas relações entre Brasil e Inglaterra, que ficou possibilitado a 
 32 
vinda da era das máquinas, e assim a instalação das primeiras indústrias no país, 
quando igualmente chegamos ao desenvolvimento das primeiras experiências de vilas 
operárias por aqui, pesquisadores corretamente defendem que o princípio de controle 
nesses complexos não se diferenciava muito do presente nas senzalas. 
 
 
FIGURA 13 – SANZALA2 QUICONGO, NOROESTE DE ANGOLA. 
FONTE: HTTP://WWW.IHGRGS.ORG.BR/ 
 
 
 
 
FIGURA 14 – PLANTA DE CASAS OPERÁRIAS A SEREM ACRESCIDAS À VILA JÁ EXISTENTE NO ANTIGO 
LARGO CONDE DE SARZEDAS (1901), HOJE PRAÇA MÁRIO MARGARIDO. 
FONTE: ACERVO AHMWL 
 
2 Sanzalas, as aldeias norte-angolanas formadas por duas filas de casas geminadas ao longo de uma rua, 
zoneadas conforme os clãs e separadas por famílias, quando as casas passavam a fazer parte do contexto 
urbano de uma cidade. 
 33 
 
A estimulada industrialização ocupava ainda o segundo plano na estrutura 
econômica, estando o comércio da produção agrícola com a maior fatia de 
participação; com a abolição e imigração vinda ao final do século XIX o Brasil agora 
dispõe de uma classe de trabalhadores livres que além de trabalho nas lavouras 
veem-se atraídos pelas várias atividades decorrentes do desenvolvimento econômico 
da cafeicultura, o capitalismo abraça a cidade e vice-versa. 
Cidades de todo o país estavam em crescimento, porém no sudeste o 
quantitativo populacional passa a duplicar e até mais que quadruplicar em um período 
muito curto do tempo, exemplo São Paulo qual “a população da cidade cresceu de 
40.000 habitantes em 1886 para 260.000 em 1900 e 580.000 em 1920” (BONDUKI, 
1998) o déficit no número de residências faz com que construções para atender esse 
quantitativo sejam promovidas como também recebam o incentivo do estado, por volta 
de 1910 quase toda a população paulista morava em casas de aluguel, cerca de 
apenas 19% das construções estava ocupada por seus donos, com o apoio da Lei de 
isenção de impostos definitivamente transforma-se numa alternativa rentabilizar os 
espaços da cidade, sobretudo os localizados nos contornos das fábricas, a absorção 
de todas as classes por esse mercado reflete no variado tipo de habitação produzido 
já que a posição econômica de uma camada está ligada a sua escolha e possibilidade 
de moradia, a valorização imobiliária. 
Com a crise habitacional instaurada desde a metade do século, está em 
discussão um novo padrão para suplementar os problemas de habitação 
operária/popular, agora com base em diferentes pontos de vistas, adequando-se aos 
condicionamentos do poder público, da base econômica, atributos sanitários exigidos 
e viabilidade –o que significa barato–. O problema de moradia já era significativo 
desde 1850 e é apenas crescente com o passar do tempo e expoente 
desenvolvimento das cidades, como referido anteriormente na tentativa de 
estabelecer as regras para a produção e exploração habitacional pelo poder privado 
é instituída fortes taxas desde 1877, conseguindo se estabelecer reais regras por volta 
de 1881, mas apenas vindo a ser posta em pratica após 1886 “ para a construcção de 
casas, para trabalhadores a imitação das conhecidas no Rio de Janeiro com o nome de Villas, 
isto é, com entrada para um pateo commum, porém em melhores proporções que as dos 
actuaes cortiços.” (transcrição do Correio Paulistano de 18 de Agosto de 1886.) 
 34 
O governo republicano, aliado às oligarquias, visava o progresso por meio 
da instauração da ordem pública. Assim, confinou-se os pobres para as margens do 
perímetro urbano, para além do calçamento e do saneamento das ruas do centro. 
“Trata-se do problema do relacionamento entre o cidadão e o Estado, o cidadão e os 
sistema político, o cidadão e a própria atividade política” (CARVALHO, 1987, p. 10). 
Nesse cenário espalham-se as práticas de criação de vilas operárias, 
podendo ser estas diferenciadas em dois distintos moldes de acordo com seu 
construtor/proprietárioe serventia, a primeira eram vilas promovidas por empresas 
com destino apenas aos seus funcionários e de acordo com a serventia consistiam 
em assentamentos habitacionais patrocinados por investidores privados dedicados ao 
aluguel. “Inserida em estratégia de disciplina da mão de obra, fundamentada na 
sedenterização, na moralização dos costumes e na difusão de novas noções de 
higiene” (CORREIA, 1997, p.2). 
 
FIGURA 15 – CASA POPULAR SITUADA NAS IMEDIAÇÕES DA BAIXADA DO GLICÉRIO, TRAVESSA 
RUGGERO, 1901. 
FOTO: HUGO SEGAWA ACERVO SEMPLA 
 
 
 
 35 
Do Nordeste brasileiro os ex-combatentes da Guerra dos Canudos 
trouxeram mais que a morte dos seguidores de Antônio Conselheiro, por ficarem 
desamparados pelo governo, os que não tinham condições de vida passaram a se 
instalar nos morros do Rio de Janeiro juntamente com ex escravos, ao lembrar uma 
planta característica e bastante resistente da caatinga a Favela característica do 
Morro da Favela na original Canudos, este tipo de “assolação construtiva” foi lembrada 
pelos moradores pela força e rapidez que evoluía nos diversos espaços da cidade e 
assim foi batizada de favela. 
 
FIGURA 16 – FAVELA NO MORO DA PROVIDÊNCIA, PROVÁVEL 1º FAVELA DO RIO DE JANEIRO, AO 
FUNDO A CIDADE INDUSTRIAL. 
FONTE: HTTP://MEDIOCRIDADE-PLURAL.BLOGSPOT.COM.BR/ 
Um dos primeiros centros fabris da América Latina é também encontrado 
no estado Pernambucano na cidade de Camaragibe, propriedade do empresário 
argentino Pereira Carneiro em parceria de outros investidores foi fundada em 1891 a 
Companhia Industrial Pernambucana essa qual possuiria amplo complexo além da 
vila para moradia. É sobre tudo devido a gerencia de Carlos Alberto Menezes 
engenheiro civil, líder católico e bacharel em letras, influenciado pela encíclica Rerum 
Novarum: sobre a condição dos operários do Papa Leão XIII –documento dirigido a 
todos os bispos qual fala sobre as condições operárias– e de correntes europeias de 
gerência cristã fabril que ele desenvolve progressista atuação sobre a questão, 
 36 
chegando a fundar a em 1900 a Corporação Operária de Camaragibe entidade 
responsável por representar todos operários da cidade. Esta representação atuava 
em todos os assuntos dos trabalhadores e suas famílias ministrando o que seria moral, 
espiritual e intelectual. 
 “... 
A solução socialista 
 
3. Os Socialistas, para curar este mal, instigam nos pobres o ódio invejoso 
contra os que possuem, e pretendem que toda a propriedade de bens 
particulares deve ser suprimida, que os bens dum indivíduo qualquer devem 
ser comuns a todos, e que a sua administração deve voltar para - os 
Municípios ou para o Estado. Mediante esta transladação das propriedades 
e esta igual repartição das riquezas e das comodidades que elas 
proporcionam entre os cidadãos, lisonjeiam-se de aplicar um remédio eficaz 
aos males presentes. Mas semelhante teoria, longe de ser capaz de pôr 
termo ao conflito, prejudicaria o operário se fosse posta em prática. Pelo 
contrário, é sumamente injusta, por violar os direitos legítimos dos 
proprietários, viciar as funções do Estado e tender para a subversão completa 
do edifício social. 
 
A propriedade particular 
 
4. De facto, como é fácil compreender, a razão intrínseca do trabalho 
empreendido por quem exerce uma arte lucrativa, o fim imediato visado pelo 
trabalhador, é conquistar um bem que possuirá como próprio e como 
pertencendo-lhe; porque, se põe à disposição de outrem as suas forças e a 
sua indústria, não é, evidentemente, por outro motivo senão para conseguir 
com que possa prover à sua sustentação e às necessidades da vida, e espera 
do seu trabalho, não só o direito ao salário, mas ainda um direito estrito e 
rigoroso para usar dele como entender. Portanto, se, reduzindo as suas 
despesas, chegou a fazer algumas economias, e se, para assegurar a sua 
conservação, as emprega, por exemplo, num campo, torna-se evidente que 
esse campo não é outra coisa senão o salário transformado: o terreno assim 
adquirido será propriedade do artista com o mesmo título que a remuneração 
do seu trabalho. Mas, quem não vê que é precisamente nisso que consiste o 
direito da propriedade mobiliária e imobiliária? Assim, esta conversão da 
propriedade particular em propriedade colectiva, tão preconizada pelo 
socialismo, não teria outro efeito senão tornar a situação dos operários mais 
precária, retirando-lhes a livre disposição do seu salário e roubando-lhes, por 
isso mesmo, toda a esperança e toda a possibilidade de engrandecerem o 
seu património e melhorarem a sua situação 
... 
Obrigações dos operários e dos patrões 
10. Entre estes deveres, eis os que dizem respeito ao pobre e ao operário: 
deve fornecer integral e fielmente todo o trabalho a que se comprometeu por 
contrato livre e conforme à equidade; não deve lesar o seu patrão, nem nos 
seus bens, nem na sua pessoa; as suas reivindicações devem ser isentas de 
violências e nunca revestirem a forma de sedições; deve fugir dos homens 
perversos que, nos seus discursos artificiosos, lhe sugerem esperanças 
exageradas e lhe fazem grandes promessas, as quais só conduzem a 
estéreis pesares e à ruína das fortunas. 
 37 
Quanto aos ricos e aos patrões, não devem tratar o operário como escravo, 
mas respeitar nele a dignidade do homem, realçada ainda pela do Cristão. O 
trabalho do corpo, pelo testemunho comum da razão e da filosofia cristã, 
longe de ser um objecto de vergonha, honra o homem, porque lhe fornece 
um nobre meio de sustentar a sua vida. O que é vergonhoso e desumano é 
usar dos homens como de vis instrumentos de lucro, e não os estimar senão 
na proporção do vigor dos seus braços. O cristianismo, além disso, prescreve 
que se tenham em consideração os interesses espirituais do operário e o bem 
da sua alma. Aos patrões compete velar para que a isto seja dada plena 
satisfação, para que o operário não seja entregue à sedução e às solicitações 
corruptoras, que nada venha enfraquecer o espírito de família nem os hábitos 
de economia. Proíbe também aos patrões que imponham aos seus 
subordinados um trabalho superior às suas forças ou em desarmonia com a 
sua idade ou o seu sexo. 
Mas, entre os deveres principais do patrão, é necessário colocar, em primeiro 
lugar, o de dar a cada um o salário que convém. Certamente, para fixar a 
justa medida do salário, há numerosos pontos de vista a considerar. Duma 
maneira geral, recordem-se o rico e o patrão de que explorar a pobreza e a 
miséria e especular com a indigência, são coisas igualmente reprovadas 
pelas leis divinas e humanas; que cometeria um crime de clamar vingança ao 
céu quem defraudasse a qualquer no preço dos seus labores: «Eis que o 
salário, que tendes extorquido por fraude aos vossos operários, clama contra 
vós: e o seu clamor subiu até aos ouvidos do Deus dos Exércitos»(6). Enfim, 
os ricos devem precaver-se religiosamente de todo o acto violento, toda a 
fraude, toda a manobra usurária que seja de natureza a atentar contra a 
economia do pobre, e isto mais ainda, porque este é menos apto para 
defender-se, e porque os seus haveres, por serem de mínima importância, 
revestem um carácter mais sagrado. A obediência a estas leis — pergunta-
mos Nós — não bastaria, só de per si, para fazer cessar todo o antagonismo 
e suprimir-lhe as causas?.”(Transcrição de trechos da Rerum Novarum: sobre 
a condição dos operário) 
A igreja que desde outras épocas estava silenciada sobre o 
condicionamento dado a mão-de-obra entra neste panorama concebendo a visão de 
que a moral do ser humano havia sido perdida no último século com a revolução 
industrial, a massa popular não mais detendo o meio de produção em suas mãos 
estava a mercê do industrial, a posição no topo da pirâmide social onde estava o clero 
juntamente com o governo estava ameaçada por revoltas preste a ser declarada, a 
igreja reivindica assim a posse da terra aos trabalhadores, mas nega totalmente a 
qualquer desvio de pensamento para igualdade entretodos, condenando o Socialismo 
e Comunismo como práticas que atiçam as classes pobres contra os ricos, podendo 
ser até mesmo a cauda do empobrecimento, havia incentivo ao conformismo desta 
classe em suas funções na sociedade, delegando o poder a própria natureza que fez 
eles assim, uma medida que tem o aspecto de servir como método de controle para 
as prováveis revoltas proletárias contra o patrão, para os ricos ela guarda a posição 
de que “as riquezas não os isentam da dor; que elas não são de nenhuma utilidade 
para a vida eterna, mas antes um obstáculo”. (Mt 19,23-24). 
 38 
O bairro de Vila Isabel no Rio de Janeiro é uma porção visível da 
mentalidade e processo de industrialização vivido pelo país no final século XIX, 
Stanchi (2008) relatando o período da instalação das várias indústrias no bairro sendo 
elas as: Fábrica do Sabão Russo, Fábrica Sabonete Santelmo, Fábrica de Barcos, 
Fábrica de Vidros Scarrone, Fábrica de Uniformes Militares Moraes Alves, Fábrica de 
Móveis Walter Soares, Fábrica de Cerveja Portugal, Indústria de Bebidas Amazônia 
LTDA e a Companhia de Fiação e Tecidos Confiança Industrial, está última objeto de 
sua pesquisa, ele revela a permanecia e existência da fragmentação social assim 
como o atrelamento da força de trabalho ao patrão causando uma amarração desde 
quando ainda o país era escravocrata, muito longe do discurso de tratamento moderno 
dado a questão. 
Ainda no Rio de Janeiro, numa ação governamental de cunho social é 
provável que as primeiras moradias produzidas tenham sido as 120 unidades 
habitacionais construídas na Avenida Salvador de Sá em 1906 pela prefeitura do 
então Distrito Federal esta que se via em alvo constante de críticas em relação à 
situação deixada os antigos moradores dos cortiços recém-derrubados, a atitude vem 
a ser apenas paliativa e não resolve a assunto, já que o número de desabrigados na 
derrubada dos cortiços era imensamente maior que este número de unidades 
edificadas, nesta mesma cidade as vilas proletária de Marechal Hermes começaram 
a ser edificadas contudo sendo abandonada ainda nos alicerces por quase duas 
décadas. Em Recife apenas no ano de 1926 é que vieram a ser construídas 40 
unidades pela Fundação A Casa Operaria (GAP, 1985) sendo este órgão “a primeira 
instituição pública do país a ser criada especificamente para produzir habitação com 
caráter social.” (BONDUKI, 1998). 
As vilas fabris foram intencionalmente a forma escolhida pelo estado e 
classes ricas para servir de modelo para habitação operária durante a fase do estado 
velho. de modo que pelo lado do estado facilitava o controle de produção enquanto 
garantiria a qualidade “apropriada” para as casas, o que de fato não tenha tido real 
significado já que estudos apontam que cerca de 72% dos projetos tenham sido 
modificados, a vila também ajustava-se ao pensamento do patrão qual a intenção era 
obter “controle ideológico, político e moral aos trabalhadores, muito bem visto frente 
ao sempre presente temor de uma revolta operária” (Rago, 1985), poucas empresas 
construíram vilas dignas com casas e aluguel a preços justos. 
 39 
No Brasil além da vila fabril aconteceram outras manifestações de vila 
construída por empresas estatal ou privada para seus funcionários, por consenso 
geral de muitos escritores sobre o tema nestes complexos a intenção e maneira que 
são edificadas essas vilas não se distingue muito do que promoveu a igreja o governo 
ou a indústria, a diferença acontecia no âmbito do discurso que defendia sua 
implantação e no melhor dos casos o fator de maior relevância e influência era a 
presença do arquiteto, por isso tais vilas aqui não serão estudadas a fundo e apenas 
apresentadas para fazer jus ao conhecimento. 
As vilas ferroviárias vão ser encontradas no Brasil entre a primeira metade 
do século XIX e a segunda metade do século XX o que representa mais de um século 
em construção, FINGER (2009) possibilita dimensionar um quantitativo dessas 
construções quando diz que nos tempos de origem aproximadamente a cada 20km 
de linha deveria ser alojado um funcionário, mas revela que esse mapeamento seria 
praticamente impossível a autora ainda vai discorre sobre o modo que o governo 
introduz as vilas na época de construção das primeiras linhas férreas e as mantem 
por um período, fazendo enfoque na pesquisa ao projeto arquitetônico e urbanístico 
qual estavam inseridas e a origem das companhias que as edificaram “em sua maioria 
estrangeiras, destacando-se as inglesas, belgas, americanas, francesas e alemãs). 
 
FIGURA 17 – VILA DE PARANAPIABA, SANTO ANDRÉ, SP (2008) 
FOTO: ANNA FINGER (2008) 
Os escritores BONATES e VALENÇA (2010) são concisos e exatos ao 
descreverem as Vilas militares no Brasil em sendo “No geral, as vilas militares reúnem 
 40 
número pequeno de casas e/ou blocos de apartamentos – não mais do que 50, 
aproximadamente –, mas, pelos motivos a seguir discutidos, exercem um papel 
importante no contexto local, chegando, excepcionalmente, até a dar nome a bairros. 
De baixa densidade, com vastos terrenos e equipamentos urbanos, anexas quase 
sempre a outras instalações militares, ocupam largas áreas das cidades. As vilas, que 
são classificadas e alugadas conforme o rank da Corporação, são de suma 
importância para as Forças Armadas devido à natureza do trabalho militar, que exige 
o movimento espacial de seu efetivo. São geridas pela Corporação, que as mantém 
preservando o seu modelo original (a maioria foi construída nas décadas de 1930-
60s) e realizando apenas pequenas adaptações às novas necessidades da vida 
urbana que surgem ao longo do tempo, tais como: garagens, instalações para 
condicionadores de ar e internet, entre outras.” 
 
FIGURA 18 – VILA DE SUBTENENTES E SAGENTOS EM BAYEUX, PB (2009) 
FOTO: BONATES E VALENÇA (2009) 
Já as vilas das hidrelétricas, como relata Mônica Vianna (2004) eram vilas 
bem construídas e com boa manutenção, podiam ser definitivas buscando a 
acomodação dos engenheiros e departamento técnico, ou, provisória objetivando a 
moradia dos trabalhadores no período da construção do conjunto que “além das 
casas, possuem pequenos hotéis, clubes, piscinas, áreas para prática esportiva e 
cuidadoso tratamento paisagístico” (VIANNA, 2004). 
 
 
 41 
5 O NOVO ESTADO POPULISTA 
Após a primeira guerra mundial o Brasil vivia uma crise generalizada. A 
recessão econômica acentuada com o crash mundial de 1929, a insatisfação das 
camadas médias urbanas e dos trabalhadores com o predomínio político dos 
fazendeiros e então a ruptura do governo café-com-leite culminaram no golpe de 
1930. 
É a partir e durante o governo do estado novo que o poder público passa a 
interferir definitivamente no sistema de produção habitacional, tomando posição 
social, estruturadora, construtiva e até então radical visto a sempre posição de 
privilegiar os interesses dos investidores da economia. “depois de 1930, um longo 
processo de criação das novas condições que passam a fazer das atividades urbano-
industriais as centrais na nossa economia.” (OLIVEIRA, 1971). 
Getúlio Vargas foi o escolhido para assumir a presidência, precisando 
adotar soluções que pudessem legitimar o poder do estado novo, que se via formado 
por grupos da classe média, tenentes, oligarquias regionais, entre outros, porém ainda 
sem força perante a totalidade, as massas populares/trabalhadora tornam-se o alvo 
para conseguir este respaldo. 
“necessitados do apoio das massas urbanas, os detentores do poder se vêem 
obrigados a decidir, no jogo dos interesses, pelas alternativas que ser 
enquadram nas linhas de menor resistência ou de maior apoio popular” 
(WEFFORT, 1966, 144) 
“assim legitimado e de certa forma pairando sobre todas as classes, o que 
significava abrir-se a todos os tipos de pressões sem se subordinar 
exclusivamente aos objetivos imediatos de qualquer uma delas, o Estado 
brasileiro pós-30 pode formular umpolítica econômica e social que, apresar 
de às vezes ser contraditória e descontinua, apresenta certas características 
bem definidas.” (BONDUKI, 1998) 
A habitação sempre foi um assunto penoso às classes menos abastadas, 
e mesmo que o assunto passe a ser tratado de modo mais organizado não se 
consegue estruturar uma política habitacional articulada e coesa entre os órgãos e 
ministérios visto a proporção tomada pela crise e seus vários aspectos. Ações como 
a criação das: Caixas de Aposentadoria e Pensão da Estrada de Ferro em 1928, 
 42 
Carteiras Imobiliárias das Caixas de Aposentadoria e Pensões pela Lei Eloi Chaves e 
em esfera nacional a criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs) em 
1933, originam a organização do seguro social, tendo estas entidades reunindo em 
1937 o significativo número de 844.800 associados (FINEP-GAP, 1985). 
Até a década de 40 há um grande incentivo à produção de casas populares 
por investidores privados o que tornava esta prática totalmente rentável, fato disso é 
que apenas 25% dos domicílios eram ocupados por seus proprietários (IBGE, 1940), 
sofrendo constantes aumentos desde 1938 o custo de vida do trabalhador fica cada 
vez mais fora do que podemos chamar adequado; Os governantes atentos as 
condições do proletário veem a abertura suficiente para tomar iniciativa que se 
alinharia a própria necessidade –o aquecimento da industrialização– é, portanto em 
1942 que a Lei do Inquilinato entra em prática congelando os preços do alugueis. “com 
esse objetivo o governo tomou uma série de medidas de controle administrativos que 
substituem os mecanismos de mercado, visando fazer a economia funcionar de forma 
não automática” (Oliveira, 1971). 
 
GRÁFICO QUANTITATIVO DO ÊXODO RURAL NO BRASIL 
FONTE: BONDUKI (1998) 
 43 
Em 1946 no já então governo do presidente Dutra é criado a Fundação da 
Casa Popular (FCP) primeiro órgão nacional destinado exclusivamente a solucionar a 
prolongada crise da habitação no país, está qual novamente agravou-se durante o 
período pós-guerra, propondo financiar, além de moradia, infraestrutura, saneamento, 
indústria de material de construção, pesquisa habitacional e até mesmo a formação 
de pessoal técnico dos municípios, realmente muito ambicioso, o órgão acaba não 
alcançando o feitio esperado, devido à falta de articulação entre os diversos órgãos 
responsáveis pelo tema, como pela necessidade de centralização sob única gestão 
exigindo a extinção e controle dos recursos dos IAPs sendo este último um fator de 
peso visto que apresenta alta resistência principalmente por sua ligação e influência 
com “esquemas políticos” e organizações trabalhistas, as ações do órgão ficam assim 
limitadas fazendo com que não aconteça uma estratégia aprimorada em nível 
nacional, não foi a falta de entendimento sobre o tema, mas sim o fato da FCP não 
obter legitimidade e poder devidos, porém a mesma deve ser creditada como marco 
na habitação de intenção social provida pela estado, já que as IAPs mesmo sendo 
anteriores e com programa mais efetivo em número de residências construídas, eram 
instituições previdenciárias que tinham por função garantir e investir o capital 
acumulado da Previdência Social. 
NÚMEROS DA PRODUÇÃO OU FINANCIAMENTO ESTATAL DE HAB ITAÇÃO 
IAPs (Plano A) IAPs (Plano B) FCP TOTAL 
47.789 76.236 16.964 140.989 
TABELA 01 – QUANTITATIVO DE HABITAÇÃO PRODUZIDA 
FONTE BONDUKI (1998) 
Várias prorrogações da Lei do Inquilinato fizeram com que ela perdurasse 
até 1964, contrariamente a função pensada a lei provocou uma reação no setor 
imobiliário com impacto desfavorável aos rentistas. O resultado do congelamento 
abalou a produção de moradias por seus principais investidores e com o acentuado 
êxodo da população rural atraídos para as grandes cidades pelas novas condições 
econômicas, a crise habitacional brasileira tomou proporções de uma gravidade 
drástica, como mostra Bonduki (1998) o problema era diariamente retratado pela 
imprensa, o óbvio acontecia à falta de casas para aluguel nas principais cidades fez 
com que os proprietários procurassem todos os meios de tornar novamente rentável 
 44 
suas habitações e terrenos, o valor do aluguel estabilizado não trouxe nenhum 
proveito aos já alojados, o fato do reajuste da base salarial depender diretamente de 
fatores ligado a moradia e inflação do período os torna vítimas categóricas, o despejo 
passa a fazer parte da ação dos proprietários das casas e se torna talvez o maior 
problema nos bairros operários, estima-se que neste período 10% da população 
paulistana tenha sido despejada, como previsto por lei o despejo deveria ser uma 
prática bastante limitada assim como o reajuste dos valores do aluguel que só 
poderiam ser conseguido em caso de novos contratos, porém, 
os casos de despejos estavam limitados aos proprietários que conseguissem 
provar terem necessidade da casa para moradia própria, para si ou para 
ascendente ou descendente direto, ou que tivesse planta aprovada para 
construir edificação de maior área no terreno resultante da demolição do 
prédio alugado. Muitas ações foram, no entanto, montadas de modo artificial, 
com alegações mentirosas. Segundo pareceres de advogados da época, 
apenas 30% das ações havia sinceridade. (BONDUKI, 1998) 
São Paulo, Recife, Santos, Rio de Janeiro entre outras grandes cidades 
que haviam passado por intensiva transformação urbana no início do século, apoiadas 
no ideal de “saneamento urbano” plano dirigido por Saturnino de Brito que proponha 
a requalificação das áreas centrais entendidas como deteriorada visto que estavam 
ocupadas pela população pobre, o centro das cidades eram espaço de intensa 
obsessão dos investidores. Com a possibilidade do despejo para ampliação e 
valorização dos terrenos perto de áreas reformadas, ocorre um acelerado processo 
de verticalização atividade que muito interessava a indústria da construção civil e 
buscava atender uma população que não era o pobre –sistema muito idêntico ao de 
hoje– ao lado proletariado coube mais uma vez procurar habitar as periferias, é neste 
circuito onde acontece a propagação da casa autoconstruída uma forma própria 
encontrada para combater ao colapso e abusiva situação da habitação. 
 
FIGURA 19 – REFORMA NO BAIRRO DO RECIFE, INICIADA EM 1910. 
FONTE: RECIFE.GOV.BR 
 45 
O seminário Habitação e Reforma Urbana de 1963 durante o governo de 
João Goulart realizado pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) com o apoio do 
governo federal através do Instituto de Pensões e Aposentadoria dos Servidores do 
Estado (IPASE), gerou várias propostas para uma nova política habitacional e urbana, 
o Banco Nacional da Habitação (BNH) e o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo 
(SERFHAU) ambos criados em 1964 pelo regime militar fazem parte desta proposta. 
“Propostas, que, por serem progressistas e antagônicas ao caráter conservador do 
novo regime, não foram implementadas, mas que permaneceram latentes, sendo 
retomadas quase duas décadas depois” (FELLOWS, 2011). 
O golpe militar de 1964 que durou até 1985 parece ter atacado não apenas 
o governo, mas também os órgãos recém-criados para conduzir a política habitacional 
do Brasil, as ações do BNH são contestáveis e não apenas por ser um banco atrelado 
à ditadura miliar, avaliando o investimento, a quantidade e qualidade em relação ao 
produzido pelos IAPs, como explica (FELLOWS, 2011) fica claro que houve uma 
ruptura entre arquitetura e moradia popular, até 1970 o banco estava empenhado na 
sua função social e estima-se que durante estes cincos primeiros anos foram 
construídas 178.227 unidades habitacionais, porém a partir deste ano os recursos são 
direcionadas para a habitação de classe média muito mais rentáveis que o mercado 
popular, durante o seu funcionamento o BNH produziu em torno de 4,5 milhões de 
unidades sendo 33% das unidades com direção ao setor popular. 
Em 1988 o Brasil volta

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