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BROUSSE, Marie-Hélène. Entrevista: O que é uma mulher?

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Centro Universitário Newton Paiva
CURSO: Psicologia
DISCIPLINA: O Feminino na Música e na Psicanálise
DOCENTE: Margaret Pires do Couto
ALUNO: Fabrícia Cristine Freitas
FICHAMENTO
BROUSSE, Marie-Hélène. Entrevista: O que é uma mulher? 
_______________________________________________________________
Brousse inicia sua fala na conferência dizendo que ali haviam ouvintes e orador. Que os psicanalistas que a convidaram tentaram fazer com que ela conhecesse o tipo de ouvintes que eles eram. “Eu me perguntava: de onde vocês iriam me escutar? Suponho que vocês irão me escutar a partir das coordenadas do discurso, quer dizer, do laço social no qual vocês estão inseridos, do qual vocês são o efeito. E eu, de onde eu vou lhes falar? Eu vou lhes falar a partir do discurso que me determina, nem sempre, mas que, em todo caso, está-me determinando esta noite, ou seja, do discurso psicanalítico. O discurso determinado pelo lugar central que ocupa o sujeito do inconsciente”.
Obviamente que estão aí reunidas todas as condições para que o mal-entendido seja espesso entre nós. E mesmo que o mal-entendido seja a forma estruturalmente necessária da comunicação entre sujeitos, como diz Lacan, vou de toda forma procurar dissolvê-lo em alguns aspectos. A pretensão da autora é de transmitir aos presentes alguns elementos de saber sobre a questão do feminino que a prática do sujeito do inconsciente esclarece. Esses elementos são verdadeiros apenas dentro do campo da experiência psicanalítica. Eles não pretendem, de modo algum, constituir uma nova filosofia ou uma nova moralidade para a ordem social em geral. Eles têm validade no campo científico que os produz e não podem ser transformados em uma ideologia dominante, sob o risco de transformarem-se em preconceitos de poder. Brousse escolhe não partir de figuras do feminino, como a mãe, a puta, a freira, a virgem, a pecadora, etc.
Não existe complementaridade inscrita no biológico. A questão “O que é uma mulher?”, não pode ser facilmente resolvida. Dizer que a mulher é diferente do homem é uma forma de se esquivar da discussão, mas não resolve a questão. Brousse pretendeu, nesta entrevista, transmitir alguns elementos de saber sobre a questão do feminino que a prática do sujeito do inconsciente esclarece. Segundo ela, esses elementos são verdadeiros apenas dentro do campo da experiência psicanalítica. Eles não pretendem, de modo algum, constituir uma nova filosofia ou uma nova moralidade para a ordem social em geral. O discurso analítico aborda a questão da diferença sexual a partir de duas outras questões: a questão das aparências e a questão das identificações.
A questão das aparências
Ela diz que esse é um assunto ideologicamente delicado, justamente por esbarrar em estereótipos e preconceitos. Essas três palavras – ideologicamente, estereótipos e preconceitos – estão muito presentes nas inúmeras construções sociais que se faz sobre este tema, e aí residiria a grande dificuldade de abordá-lo por um viés que o retira da lógica em que os homens estariam do lado dominante, e as mulheres, do lado dominado.
São duas perspectivas interessantes para pensar a exposição de Brousse, pois ela inicia sua fala pela exclusão de significantes identificatórios que diriam algo sobre a mulher: nem mãe, nem esposa, nem santa, nem puta, nem feiticeira. A problematização que a psicanálise faz em relação ao ser mulher consta desde suas origens. Abordar a feminilidade pela via da psicanálise nos remete às experiências pré-analíticas de Freud com as pacientes apresentadas em Estudos sobre a histeria. Ao final de sua fala, Brousse afirma que o gozo feminino não se reivindica, mas acontece. 
O segundo ponto: a questão da identificação
A psicanálise encontra a sua origem na fala histérica. É graças à escuta das pacientes histéricas que Freud inventa a psicanálise. E a descoberta de Freud será a de que as pacientes histéricas, mesmo que todas orientadas pela procura do feminino, pela importância de uma figura especial e ideal feminina, são, entretanto, determinadas por uma identificação masculina. Dito de outro modo, a partir de uma identificação masculina com o desejo de um homem por uma mulher, uma identificação com o masculino, constitui-se, de algum modo, o nó do sintoma histérico. Essa passagem por uma identificação masculina leva a considerar que não se pode responder em psicanálise à questão “O que é uma mulher? ”, pela questão das identificações. Dito de outro modo, a identificação não permite situar-se, afirmar-se como mulher. Por quê? Porque a passagem pelo desejo masculino para definir o que é uma verdadeira mulher —a histérica, considerando-se ela como não estando à altura, não tão bem, não tanto quanto seria preciso, etc. — certamente erige o feminino como ideal, mas sob o modo de privação. Quer dizer que essa ereção do feminino pelo viés de uma identificação produz sobre o sujeito apenas um efeito, digamos, negativo.
Se retomarmos a trajetória freudiana em que ele se reposiciona de um saber médico à posição de analista, compreenderemos de que natureza se trata tal “acontecer” do gozo feminino: é da natureza de uma imposição. Daí podermos situar a psicanálise como se tivesse nascido da pergunta “o que é uma mulher? ”. A autora pontua que, para Lacan, o “ser homem” e o “ser mulher” centram a questão no discurso e, por isso, tal posicionamento se dá via linguagem, de modo que a posição feminina ou masculina (diferentemente da biologia, que separa macho e fêmea a partir de gametas) diferencia-se pelo discurso através do qual se escolhe localizar-se. Tal “escolha” é entendida por ele a partir dos respectivos gozos envolvidos em cada uma delas. Para ir além da constatação edípica de Freud, Lacan a entende a partir de um gozo Outro, mais-além do Édipo. 
Para articular as construções que Lacan realiza em relação a esse gozo Outro, Brousse afirma que a feminilidade se encontra encerrada em três níveis de aparência. O primeiro deles é o biológico, que alia funções relacionadas à “natureza” e aquelas estabelecidas do ponto de vista social, como o desempenho dito “instintivo” da relação materna. Esse primeiro nível é desmontado pela psicanálise quando a questão ‘ser mãe’ para ‘ser mulher’ surge como demanda de análise. Quanto a isso que remete ao devorar, Brousse fala sobre o segundo nível de aparência – máscara, que serviria como evitação à ansiedade diante da vingança temida dos homens. Assim, a máscara seria um meio de apaziguar o vingador e teria um papel duplo: montar o furo no campo do Outro, evidenciando a castração e um modo de proteger-se contra a ira diante da castração. A mascarada ocupa o lugar de falo para o Outro, colocando-se, assim, num lugar em que o Outro não temeria perder o poder. A ira diante da castração seria, então, aplacada pelo fato de a mascarada representar (não) ter o falo, uma falseta que poderia ser expressa como: “Eu sou só uma mulher”. A perspectiva apresentada por Brousse é de que a mascarada é o feminino. 
A autora afirma que, para aceder à dimensão da sexualidade, todo sujeito humano tem que passar de um ser a um ‘parecer’. Isso indica que a dimensão metafórica da linguagem provoca uma desrealização, em que o real biológico se perde, permitindo, ao sujeito ascender ao circuito do terceiro nível de aparência citado por Brousse que é o nível do semblante, que ela tem cuidado para não opor ao que é autêntico, já que através dos semblantes se constituem os laços entre os sujeitos humanos. Vivemos num mundo de semblantes, porque vivemos num mundo de linguagem, de tal modo que a questão do desejo passa necessariamente pela via do semblante, que seria uma categoria inventada pela psicanálise para retirar a feminilidade de uma posição generalizada no conjunto dos sujeitos humanos. O semblante permitiria uma articulação diferenciada entre real e simbólico. Assim, a máscara encerra as chamadas insígnias femininas, que podem ser transmitidas de uma mulher à outra através de objetos que tocam o corpo feminino e o identificam a partir de critériosideais, uma vez que tais objetos se aproximam metonimicamente do desejo. O semblante, no entanto, não carregaria essa perspectiva.
O terceiro nível de aparência é para Brousse, absolutamente fundamental para tratar da questão da clínica da sexualidade no sujeito humano. Lacan o introduz um pouco mais à frente, em seu ensino: a questão do semblante. Lacan faz da questão do semblante, de acordo com Brousse, a característica mesma do discurso, sendo que ele não define, de modo algum, o semblante em oposição àquilo que, ao contrário deste, seria autêntico. A mascarada é feita desse tipo de elemento emblemático, e podemos pensar na questão, então, acerca dos objetos femininos que são transmitidos de uma mulher à outra, a uma menina, a uma futura mulher. Trata-se de insígnia, ou seja, de significantes, em última instância, de objetos que funcionam sob a vertente de ideal e, portanto, como significantes, ou trata-se de fetiches? Trata-se de algo entre os dois, o que quer dizer que são de objetos ligados à demanda, ligados à transmissão e, ao mesmo tempo, se acentuamos o seu valor de fetiche, são objetos que fazem precisamente existir a máscara mesma, como véu diante da dificuldade de dizer precisamente o feminino.
Tais objetos, que encarnam um lugar que Brousse situa entre o fetiche e o significante, agrupam uma categoria que, pela perspectiva freudiana, pode ser chamada de falo, significante ordenador do desejo. Em sua exposição, a autora pontua que Lacan se dedica a evidenciar a não correspondência entre pênis e falo, situando o falo enquanto significante de desejo para os dois sexos a ponto de inscrever “[...] a sexualidade humana no registro de uma transmissão”. 
A função fálica, portanto, se evidencia por atuar na constituição da sexualidade humana como garantia de vida, por isso de desejo, o que explica a afirmação de Lacan sobre a existência do falo no centro da figura do quadro de Coubert. Isso indica que, sob a perspectiva da sexualidade concebida a partir da linguagem, haveria um significante para os dois sexos.
O questionamento que Marie-Hélène Brousse desenvolve é como dois posicionamentos surgem de um significante, remetendo-se à concepção freudiana de acordo com a qual a diferença se encontra a partir de duas posições: ter e ser o falo, o que situa o menino ao lado do fetiche (ter) e a menina ao lado da erotomania (ser). A partir do ter e do ser, a partir do significante fálico e a partir de sua negação, podemos fazer uma combinatória que define duas posições diferentes originadas a partir de um mesmo significante, ou seja, a partir do significante único do desejo: o falo sob todos esses registros, declinando-se em todos esses emblemas, digamos, em todas essas marcas, e tomado então a partir daí, de duas posições diferentes: uma posição que Lacan vai qualificar do lado menino, lado homem, de fetichista, e uma posição que ele vai qualificar do lado feminino, como erotomaníaca. Não que ele considere que as mulheres são todas erotomaníacas, não é isso, mas ele assinala com isso a importância do amor no registro da sexualidade feminina, por oposição à importância do fetiche na sexualidade masculina.
Diferente de Freud, que “define o feminino pela referência fálica e unicamente por ela, ou seja, em função da castração”, Lacan avança ao considerar a questão do feminino não unicamente através da lógica ter/ser, mas pela questão do gozo, que põe em questão o universal feminino nomeado por Freud em A feminilidade como uma universalidade enigmática presente em construções como “ninguém entende as mulheres”. 
Para Brousse, enquanto tomamos como Freud, a questão do feminino a partir do desejo enquanto condicionado pela demanda, quer dizer, pelo conjunto do aparelho simbólico, o feminino permanece enigmático enquanto tal. Uma parte do feminino pode ser explicitada: o desejo feminino tal como ela evoca para os ouvintes em termos de “mascarado” e o desejo feminino em termos de “ser o falo”, mas algo do feminino escapa quando ficamos no quadro de uma lógica do desejo. Lacan vai abordar a questão a partir do gozo. E ele vai abordar de uma maneira que será percebida, nos anos 70, um pouco como uma provocação, já que ele vai ser levado a pôr em questão o universal feminino, ou seja, o feminino definido a partir daquilo que seria um “todas as mulheres”. Um discurso que valeria para todas as mulheres. É o sentido de uma fórmula, que segundo ela, muitos ali talvez, conhecessem, e que ele havia pronunciado em Roma, pela primeira vez, onde isso havia causado escândalo: “A mulher não existe”, barrando o A do artigo definido A. Isso não quer evidentemente dizer que uma mulher não exista. O que se torna prevalente em sua abordagem dessas questões é o artigo indefinido um, uma. Ele vai falar de uma mulher, ele vai falar de um pai, ele vai falar também, aliás, de um homem. Ou seja, vai levar em conta, as singularidades e não mais o funcionamento simplesmente em termos de universal.
A acepção de que “a mulher não existe” resulta do posicionamento em que Lacan a partir da sujeição do homem à lógica da castração que se evidencia pela existência de “ao menos um”, o pai, que não seria castrado, como descrevemos anteriormente ao falar das fórmulas da sexuação. A ausência de uma castração completa na mulher se daria pela inexistência de uma versão feminina do mito, demonstrando uma ‘não-exceção’ que identificaria a mulher como não-toda. Assim, todos os seres falantes, para Brousse, respondem à lógica do desejo (que é da castração), mas alguns respondem à lógica do gozo, expressa no registro da linguagem e, por isso, do semblante, que é fundada na fantasia. 
Há também uma abordagem pela via do amor cortês que Lacan pôde também fazer do feminino. Mas há todo um conjunto de fenômenos que podemos estudar para tentar aproximar-nos, de maneira mais clinicamente formulável, desse enigma, mas que não é mais um verdadeiramente. Portanto, podemos dizer que, para Lacan, há um mais além do Édipo e é a partir do mais além do Édipo — o que quer dizer, não sem o Édipo, — há um mais além do Édipo que permite definir alguma coisa da ordem do feminino, simplesmente isso não se define em termos de poder, não se define em termos de grupo, não se define em termos de emblema e de identificação. Isso acontece de um lado, e isso age de outro, mas tudo aquilo que é da ordem da reivindicação faz com que se caia imediatamente do lado do falo. Esse gozo seria suplementar ao gozo sexual clássico, portanto não estaria ligado a um órgão, o que situa a posição feminina para além da função paterna, não inteiramente inscrita sob a égide do Nome-do-Pai, de modo que esse tipo de gozo jamais seria totalmente simbolizável, inclusive, jamais simbolizável pelo viés dos ideais identificatórios, tampouco aos ideais registrados pelas relações de poder, uma vez que, repetindo a frase utilizada para localizar a importância das histéricas no nascimento da psicanálise, “o gozo feminino não se reivindica, acontece”.

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