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Trabalho de Conclusão de Curso ESTUDO DA BALÍSTICA FORENSE NA ODONTOLOGIA LEGAL JENNIFER MATOS MENDES Universidade Federal de Santa Catarina Curso de Graduação em Odontologia UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CURSO DE GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Jennifer Matos Mendes ESTUDO DA BALÍSTICA FORENSE NA ODONTOLOGIA LEGAL Trabalho apresentado à Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para a conclusão do Curso de Graduação em Odontologia Profa. Dra. Beatriz Álvares Cabral de Barros Florianópolis 2019 Jennifer Matos Mendes ESTUDO DA BALÍSTICA FORENSE NA ODONTOLOGIA LEGAL Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado, adequado para obtenção do título de cirurgião-dentista e aprovado em sua forma final pelo Departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 22 de maio de 2019. Banca Examinadora: ________________________ Prof.ª, Dr.ª Beatriz Álvares Cabral de Barros, UFSC Orientadora ________________________ Prof.ª, Dr.ª Alessandra Rodrigues de Camargo, UFSC Membro ________________________ Prof., Dr.ª Ana Paula Marzagão Casadei, UFSC Membro Dedico a aqueles que tão cedo tiveram sua voz calada, seus olhos cerrados, sonhos interrompidos. Dedico a aqueles que aqui ficam, com a dor, com a saudade, com a esperança na justiça. Dedico a aqueles que se dedicam a tornar o mundo mais justo e pacífico. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus e a todos meus Guias, por iluminar o meu caminho, com saúde e força para continuar através dos dias difíceis. Aos meus pais Dionisia e Rony, meu amor incondicional e gratidão. Obrigada por todo o esforço e sacrifício feito em prol de nossa educação por todos esses anos. O amor, dedicação, estrutura, educação e compreensão são o bem mais precioso que vocês nos deram. Obrigada por sempre apoiar meus sonhos. Obrigada por tudo. Ao meu irmão Ryan, por todas as conversas e parceria. Tenho o maior orgulho do ser humano que você está se tornando. Ao meu companheiro Igor, por todo o amor, dedicação e confiança. Sem você este trabalho seria inimaginável de ser realizado. Todo o conhecimento, ajuda, amparo, ideias, generosidade, não tenho palavras para expressar tamanha gratidão. Muito obrigada. A minha dupla Corine , por ser amiga, companheira, confidente e se um anjo na minha vida durante essa longa jornada. Obrigada por toda nossa convivência durante esses anos. À minha orientadora Profª. Drª Beatriz Alvares Cabral de Barros, que acreditou na ideia mais louca e seguiu comigo nessa jornada. Agradeço por aceitar a orientação e por todo o comprometimento, disponibilidade, ensinamentos e dedicação para com este trabalho. Muito obrigada por acreditar no meu sonho em trilhar meu caminho na odontologia legal. À Prof.ª . Drª. Alessandra Rodrigues de Camargo, pela gentileza em ser parte da minha banca. Admiro muito o ser humano e profissional incrível que você é. Como eu sempre digo “quero ser você quando crescer”. A toda a família do COMBAT, em especial Vitorino, por toda a ajuda, suporte, estrutura, conhecimento e dedicação. Muito obrigada por acreditar neste trabalho, vocês são parte fundamental para a realização deste. As meus colegas e funcionários da UFSC, por tornarem meus dias mais leves e felizes. “Elementar; meu caro Watson.” (Sherlock Holmes - Sir Arthur Conan Doyle) RESUMO A odontologia legal se apresenta como área do conhecimento que capacita profissionais para a atuação em perícia criminal, sendo uma disciplina que exige profissionais capazes de trabalhar com diversas áreas da ciência, exercendo uma atividade multidisciplinar. O odontolegista deve possuir afinidade pelo estudo contínuo e diversificado acerca das áreas de atuação, ao passo de possuir a chamada mentalidade clínico-jurídica. Este artigo propõe o estudo da balística forense, através de revisão de literatura e ilustração das lesões causadas por diferentes calibres e projéteis comumente mais usados no Brasil. Assim o presente estudo busca dar subsídios a estes profissionais à luz dos novos conhecimentos, desmistificando conceitos pré-estabelecidos, por hora obsoletos, tendo como objetivo empregar os conceitos de balística no entendimento da produção de lesões e suas características. Conclui-se estabelecendo a importância do estudo da balística forense acompanhando o desenvolvimento da indústria bélica e sua aplicabilidade no trabalho do odontolegista e perito criminal. Palavras-chave: Balística forense. Odontologia legal. Ferimentos por arma de fogo. ABSTRACT Legal dentistry presents itself as an area of knowledge that enables professionals to act in criminal expertise, being a discipline that requires professionals capable of working with several areas of science, exercising a multidisciplinary activity. The forensic dentist must possess affinity for the continuous and diversified study about the areas of action, while possessing the so-called legal-clinical mentality. This article proposes the study of forensic ballistics, through literature review and illustration of the injuries caused by different calibers and projectiles commonly used. Thus, the present study seeks to give subsidies to these professionals in the light of new knowledge, demystifying pre-established, hourly obsolete concepts, aiming to use ballistic concepts in the understanding of injury production and its characteristics. It concludes by establishing the importance of the study of forensic ballistics accompanying the development of the war industry and its applicability in the work of forensic dentist and criminal expert. Keywords: Forensic ballistics. Forensic dentistry. Wounds gunshot. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Imagem das armas longas Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’ (Boito®, Rio Grande do Sul, Brasil), Rifle .22 Semiautomático 7022 Way CBC (CBC®, Rio Grande do Sul, Brasil). Figura 2 - Imagem das armas curtas Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil), Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’ (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil), Revólver Taurus 838 .38 SPL 6.5’’ (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) Figura 3 - Imagem dos diferentes tipos de munições de rifle, pistola, revolvel e rifle de caça cano liso. Figura 4 - Imagem da lesão de entrada causada em espécime suíno por Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’ (Boito®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição balote, tiro perpendicular á distância de 1,60 metros Figura 5 - Imagem da lesão de entrada causada em espécime suíno por Revólver Taurus 838 .38 SPL 6.5’’ (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição SPL, tiro perpendicular á distância de 1,60 metros Figura 6 - Imagem da lesão de entrada causada em espécime suíno por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição ogival, tiro perpendicular encostado no alvo Figura 7 - Imagem da cavidade efetuada em argila por Rifle .22 Semiautomático 7022 Way CBC (CBC®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição LR Standart, tiro perpendicular á distância de 4,40 metros Figura 8 - Imagem da lesão de entrada causada em espécime suíno por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP (Taurus®,Rio Grande do Sul, Brasil) com munição ogival, tiro perpendicular á distância de 1,60 metros Figura 9 - Imagem da lesão de saída causada em espécime suíno por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição ogival, tiro perpendicular á distância de 1,60 metros Figura 10 - Imagem da lesão de entrada causada em calota craniana em espécime suíno por Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’ (Boito®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição balote, tiro perpendicular á distância de 1,60 metros Figura 11 - Imagem da lesão de entrada causada em espécime suíno por Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’ (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição ogival, tiro perpendicular encostado no alvo Figura 12 - Imagem da lesão de entrada causada em espécime suíno por Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’ (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição ogival, tiro perpendicular á distância de 1,60 metros Figura 13 - Residuograma de entrada em tecido de algodão por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil) com munição ogival, a) tiro perpendicular á distância de 1,60 metros b) tiro perpendicular encostado Figura 14 - Residuograma de entrada em tecido de algodão por Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’ (Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil), com munição ogival, a)tiro perpendicular á distância de 1,60 metros b) tiro perpendicular encostado LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Armas e Munições ........................................................... 21 Tabela 2 - Alvos e Distâncias ........................................................... 22 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO....................................................................................... 19 1.1 OBJETIVOS ......................................................................................... 20 1.1.1 Objetivo Geral .................................................................................... 20 1.1.2 Objetivos Específicos ......................................................................... 20 2 MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................... 21 3 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................ 23 4 DISCUSSÃO ........................................................................................... 32 5 CONCLUSÃO ......................................................................................... 40 REFERÊNCIAS ......................................................................................... 41 ANEXO A - Ata de apresentação.................................................................44 19 1 INTRODUÇÃO Segundo o World Health Statistics 2017, no ano de 2015 estima-se o número de 468 mil homicídios, sendo que 32,9 % destes se concentram nas Américas. O Brasil teve 7 pessoas assassinadas por hora em 2016, ocorrendo 61.283 mortes violentas intencionais, maior número já registrado no Brasil, um crescimento de 4,0% em relação a 2015. Apesar disso, 80% dos crimes de homicídio nos estados não são solucionados pelo poder público (FBSP, 2017). Entre 1980 e 2016 cerca de 910 mil pessoas foram mortas por perfuração de armas de fogo no país (CERQUEIRA et al., 2018). De acordo com o relatório Onde Mora a Impunidade?, publicado pelo Instituto Sou da Paz, a baixa resolutividade destes casos de homicídios tem dentre os fatores causais a escassez de servidores nas polícias civis e técnico-científicas. Logo verifica-se a necessidade investimento na contratação e capacitação de profissionais que atuem na área de perícia criminal. Há também, o amplo uso de armas de fogo nestes homicídios e cabe á balística o estudo dos efeitos, sendo a balística a parte da mecânica que estuda o movimento dos projéteis e as forças envolvidas na sua impulsão, trajetória e efeitos finais. No caso particular dos projéteis de arma de fogo, abrange o conhecimento dos propelentes e do mecanismo das armas (balística interna), o trajeto e a trajetória do projétil (balística externa) e dos efeitos produzidos no alvo (balística dos efeitos) (HÉRCULES 2005). A Resolução do CFO-63, de 08 de abril de 2005 (publicada no Diário Oficial da União de 14 de maio de 2005), na sua Seção VIII, estabelece a área de atuação da Odontologia Legal, definindo que esta é a especialidade que tem como objetivo a pesquisa de fenômenos psíquicos, físicos, químicos e biológicos que podem atingir ou ter atingido o homem, vivo, morto ou ossada, e mesmo fragmentos ou vestígios, resultando lesões parciais ou totais reversíveis ou irreversíveis. Dentre as áreas de competência para atuação do especialista incluem perícia criminal e balística forense. Tão logo o objetivo deste trabalho é, por meio da revisão da literatura e documentação da contestação prática realizada, investigar a relação entre a arma, o tipo de munição e as lesões em cabeça de espécime suíno e a elaboração do presente trabalho abordando os conceitos acerca da balística na área de atuação do odontolegista. 20 1.1 OBJETIVOS 1.1.1 Objetivo Geral - Apresentar os conceitos de balística no entendimento da produção de lesões, suas características e sua aplicabilidade no trabalho do odontolegista e perito criminal. 1.1.2 Objetivos Específicos - Elucidar os conceitos inerentes a balística - Referenciar o papel do odontolegista na perícia criminal - Ilustrar a correlação dos diferentes calibres de arma de fogo, diferentes projéteis e as particularidades das lesões produzidas por estes 21 2 MATERIAIS E MÉTODOS Esta revisão de literatura ilustrada foi realizada sem necessidade de tramitação Comissão de Ética no Uso de Animais, amparada pelo Art. 3o da Lei 11.794 que define experimentos para animais. Todas as práticas e procedimentos envolvendo armas de fogo foram realizadas em ambiente controlado, no COMBAT Clube e Escola de Caça e Tiro Esportivo, localizado na Ponte do Imaruim, Palhoça – Santa Catarina, por profissionais capacitados em instrução de tiro. Cinco tipos de armas de fogo e diferentes munições foram usadas no presente trabalho (Tabela 1). Tabela 1 - Armas e Munições Arma Modelo Marca Munição Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil Ogival Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’ Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil Ogival Revólver Taurus 838 .38 SPL 6.5’’ Taurus®, Rio Grande do Sul, Brasil Ogival Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’ Boito®, Rio Grande do Sul, Brasil Balote Rifle .22 Semiautomáti co 7022 Way CBC CBC®, Rio Grande do Sul, Brasil LR Standart 22 Os tipos de armas de fogo selecionadas foram conforme a disponibilidade do clube de tiro, bem como serem armas amplamente comercializadas. As armas de fogo foram usadas para produzir feridas na cabeça de 4 porcos adultos Large White. Estes animais foram utilizados devido à semelhança de seus tecidos duros e macios com tecidos humanos. Todos os animais foram mortos anteriormente por objetivos comerciais. Nenhum animal foi morto durante este estudo, sendo o estado inicial dos espécimes suínos congelados e mantidos em refrigeração até seu descongelamento e realização dos disparos. Também foi utilizado bloco de argila mimetizando didaticamente os efeitos do tiro dentro dos tecidos humanos e a produção de residuograma sobre tecido de algodão branco com tiros de prova com as mesmas armas, munições e distâncias utilizados anteriormente nos espécimes suínos. Os tiros em espécime suíno, residuograma e argila foram efetuadosde modo perpendicular ao alvo e nas distâncias descritas na Tabela 2. Tabela 2 - Alvos e Distâncias Alvo Encostado Distância Espécime suíno Apoiado no alvo 1,60 metros Argila - 4,40 metros Residuograma Apoiado no alvo 1,60 metros As distâncias aplicadas no trabalho foram escolhidas de forma experimental, simulando distâncias de real combate e com embasamento na descrição da literatura. Porém, nos tiros em argila devido a sua baixa resistência, os primeiros disparos à distância de 2 metros resultaram na explosão do bloco, logo a distância escolhida foi de 4,40 metros para demonstração dos efeitos neste material. 23 3 REVISÃO DE LITERATURA Para a identificação das lesões produzidas por projéteis de arma de fogo é de suma importância entender sua estrutura, mecanismo de ação e particularidades, uma vez que estes elementos irão produzir subsídios para avaliação de ferimentos a projéteis e elucidação de questões técnicas relacionadas (REIS et al., 2018; SEGUNDO et al., 2013; SILVA, 2013). Arma de fogo é uma “máquina termodinâmica apta a lançar à distância, com grande velocidade, corpos pesados, chamados projéteis, utilizando o impulso resultante da força expansiva dos gases gerados pela queima do propelente, com energia suficiente para provocar graves ferimentos a pessoas ou danos a material” (ALMEIDA JÚNIOR, 2017). Tipos de armas O modo de classificar as armas de fogo é variável, estas são categorizadas de acordo com: comprimento do cano (curto ou longo), ao acabamento interno do cano (liso ou raiado), ao seu calibre (.380, .22, 7,65), seu uso (de esporte, caça, defesa), velocidade do projétil (baixa energia e alta energia), funcionamento (tiro unitário, não automática, automática ou semiautomática) e empunhadura (arma de mão, arma de ombro) (PF, 2018; TOCHETTO, 2012; VANRELL, 2012). São armas longas (Figura 1) as construídas para operar com ambas as mãos do atirador e exigem um apoio, no ombro, para a coronha. Dentro desta categoria estão as espingardas e slug guns (armas com cano de alma lisa e raiada respectivamente) e rifles (armas com cano de alma raiada e diferenciam-se pelo comprimento do cano) e os fuzis (arma de cano de alma raiada em calibre potente) (PF, 2018; TOCHETTO, 2012). 24 Figura 1 – Armas longas: A) Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’, B) Rifle .22 Semiautomático 7022 Way CBC As armas curtas (Figura 2) são as destinadas para operar com uma ou com as duas mãos, não necessitando do apoio de ombro. São exemplos destas últimas as pistolas (armas semi-automáticas ou automáticas) e os revólveres (arma não automática, cano único e câmaras de combustão que integram o tambor) (PF, 2018; TOCHETTO). Figura 2 – Armas curtas: A) Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP, B) Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’, C) Revólver Taurus 838 .38 SPL 6.5’’. 25 Calibre e munição A determinação do calibre de uma arma de fogo varia nos países dos diferentes continentes. No Brasil, o calibre é real, medido em milímetros diretamente na boca do cano desconsiderando-se a profundidade do raiamento (CROCE D e CROCE DJ, 2017). Para os americanos a definição do calibre é dada pela medição junto à base do estojo do cartucho, sendo esta medida em centésimos de polegada e para os ingleses o mesmo método é utilizado, porém a medida é em milésimos de polegada. Disto resulta que o calibre 38 americano corresponde ao 380 inglês. Para as armas de caça de cano liso, o calibre nominal corresponde ao número de projéteis contidos na carga, pesando no total uma libra. Desse modo, uma arma será de calibre 28 se sua carga constar de 28 projéteis uniformes, pesando no total uma libra de boticário (CROCE D e CROCE DJ, 2017). Logo nos deparamos com formas diversas de nomear o calibre de cada arma, sendo a munição usada nesta relativa ao seu calibre bem como as particularidades de cada tipo que resulta na ampla gama de variantes de uma munição (Figura 3) de um dado calibre e sua finalidade, sendo composta de forma geral por cápsula, espoleta, carga, bucha e projétil (eis). Os projéteis encamisados podem ter sua capa externa aberta na base e fechada na ponta (projéteis sólidos) ou fechada na base e aberta na ponta (projéteis expansivos). Os projéteis sólidos têm destinação militar, para defesa pessoal ou para competições esportivas. Destaca-se sua maior capacidade de penetração e alcance. Os projéteis expansivos destinam-se à defesa pessoal, pois ao atingir um alvo humano é capaz de amassar-se e aumentar seu diâmetro, obtendo maior capacidade lesiva (BRASIL, 2012). No resultante do disparo tem-se o objetivo deste(s) projétil(eis), separando-se dos demais elementos que compõe a munição, atingir o alvo, assim as lesões causadas por projétil único em geral caracteriza-se por lesão única, já com múltiplos projéteis e dependendo da distância e separação das esferas de chumbo pode-se ter uma lesão única ou lesões múltiplas e pequenas (LEANDRO, 2016; TOCHETTO, 2012). 26 Figura 3 – Imagem dos diferentes tipos de munições de A) Revólver, B) Rifle de caça cano liso, C) Rifle, D) Pistola. Lesões por arma de fogo Os projéteis de armas de fogo ou instrumentos semelhantes como a ponta de um guarda-chuva, são conhecidos comumente por causarem lesões perfurocontundentes. Estas feridas são provocadas pela atuação sobre o alvo de forma concomitante perfurando-o e contundindo-o (CROCE D e CROCE DJ, 2017). O estudo das lesões oriundas da ação de uma arma de fogo compreende a ferida de entrada, o trajeto, orifício de saída, a forma e a dimensão, e os elementos de vizinhança que habitualmente as acompanham (CROCE D e CROCE DJ, 2017). Os ferimentos perfurocontusos provocados por armas de fogo podem ser causados por disparos efetuados em distâncias variáveis. O tiro encostado ou á distância zero é aquele tiro que a boca do cano da arma se apoia no alvo, possibilitando que a lesão seja produzida pela ação do projétil e dos gases resultantes da deflagração da pólvora. Tiro a curta distância é aquele desferido contra o alvo dentro dos limites da região espacial varrida pela ação dos gases e seus efeitos explosivos, pelos resíduos de combustão da pólvora e microprojéteis expelidos pelo cano da arma. Quando à mínima distância também é denominado de queima-roupa. 27 Por conseguinte, o tiro à distância é caracterizado quando estão presentes apenas os efeitos primários do tiro, isto é, aqueles produzidos exclusivamente pela ação do projétil (TOCHETTO, 2012; VANRELL, 2012). Efeitos primários O ferimento de entrada é variável segundo a distância do disparo, direção e projétil. Os elementos que são comuns a todo tipo de tiro, a não depender da distância entre a arma e o alvo se denomina de efeitos primários do tiro, sendo as ações mecânicas do projétil sobre o alvo, consequentemente próprios do orifício de entrada (VANRELL, 2012). Os efeitos primários do tiro compreendem o ferimento perfurocontuso com o ferimento de entrada que apresenta o diâmetro do calibre do projétil quando sobre cartilagem e osso, maior diâmetro quando encostado ou á curta distância e menor diâmetro a maior distância podendo por vezes ter a forma de estrela e as orlas, sendo o conjunto destas denominado de anel de Fisch (Figura 4). Figura 4 – Imagem da lesão de entrada de tiro a distância em espécime suíno por Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’. 28 A orla de enxugo (Figura 5) caracteriza-se por ser uma auréola escura ao redor do orifício de entrada e é proveniente pela “limpeza” dos resíduos de impurezas do cano da arma transportados pelo projétil. A orla de escoriação, em volta do orifício de entrada, provém da abrasão da epiderme pelo projétile pôr fim a orla equimótica, área de equimose resultante da lesão contundente, rompendo pequenos vasos por fim extravasando e infiltrando sangue, provocada no momento que o projétil atinge o corpo (FRANÇA, 2004; TOCHETTO, 2012; VANRELL, 2012). Figura 5 – Imagem da lesão de entrada de tiro a distância em espécime suíno por Revólver Taurus 838 .38 SPL 6.5’’ Efeitos secundários Logo os efeitos secundários do tiro são aqueles que se relacionam com a ação ou com o depósito de produtos residuais da combustão dos explosivos, iniciador e propelente, bem como com corpúsculos metálicos provenientes da abrasão dos projéteis na alma do cano. Se dividem em zonas, sendo estas; Zona de chamuscamento sendo a resultante da queimadura do alvo pelo aquecimento dos gases chamuscando os pelos presentes no local , queimadura da epiderme de aspecto tostado e 29 enegrecido com odor característico, Zona de esfumaçamento decorrente da deposição de fuligem circunscrita ao ferimento e Zona de tatuagem caracterizando-se como pequenos ferimentos puntiformes produzidos pelo impacto dos grãos de pólvora ou pequenas partículas do projétil (DIMAIO, 1998; FRANÇA, 2004; VANRELL, 2012). Alguns tipos de disparos podem apresentar também características que recebem nomenclaturas específicas: Câmara de mira de Hoffmann tem aspecto de cratera de mina por ser um orifício grande, estrelado de borda irregulares evertidas e laceradas. Sinal de Benassi definido pelo halo de fuligem na lâmina externa do osso referente ao orifício de entrada, Sinal de Puppe-Wergarten (Figura 6) é quando em disparo apoiado tem-se a queimadura pela estampa do cano da arma com a massa de mira em volta do orifício de entrada. Figura 6 – Imagem da lesão de entrada de tiro encostado no alvo, com Sinal de Puppe-Wergartenem espécime suíno por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP 30 Sinal do funil de Bonnet sendo a escariação da tábua óssea em forma de funil e lesão em buraco de fechadura em calota craniana quando o projétil a atinge tangencialmente. Os efeitos secundários podem ser utilizados para avaliar a distância entre a boca de fogo do cano da arma e o alvo, e, eventualmente a direção do cano da arma em relação à vítima (DIMAIO, 1998; FRANÇA, 2004; VANRELL, 2012). Trajeto No trajeto do projétil, forma-se um túnel equimótico e a cavidade formada se divide em cavidade temporária e cavidade permanente até o ferimento de saída. A cavidade temporária (Figura 7) origina-se da expansão da cavidade permanente no momento de passagem do projétil, para armas curtas de três até cinco vezes o calibre deste, devido a transferência de energia cinética, dependente da constituição dos tecidos da área atingida e seu coeficiente de elasticidade. Logo cavidade permanente é resultante do rompimento e destruição tecidual proveniente da passagem do projétil pelos tecidos, após a penetração no alvo (LEANDRO, 2016). Figura 7 – Imagem mimetizando a cavidade temporária efetuada em argila por tiro á distância por Rifle .22 Semiautomático 7022 Way CBC. 31 O orifício de saída do projétil, que independe da distância do disparo possui características comuns em geral como orifício maior que o de entrada, orifício de forma irregular, bordas evertidas, podendo apresentar ou não orla equimótica e de contusão se houver um anteparo que não permita a expansão da pele e comprima contra este (FRANÇA, 2004; LEANDRO, 2016; TOCHETTO, 2012). 32 4 DISCUSSÃO A identificação da arma e munição usadas na produção de lesões pode ser de forma direta quando o exame é feito na própria arma com todas as particularidades que envolvem esta e de forma indireta o qual se dá pelo estudo comparativo das características nas deformações macroscópicas e microscópicas em elementos da munição (DIMAIO, 1998), sendo os projéteis ou fragmentos deste os elementos mais importantes neste tipo de análise, que por muitas vezes podem estar alojados na vítima. Porém, quando não há vestígios da arma ou munição usados no delito, o estudo da balística forense na produção de lesões em seus pormenores fornece subsídios às questões práticas determinantes na elucidação acerca das circunstâncias que envolvem os ferimentos por arma de fogo. Assim pode-se aproximar um suspeito à cena do crime ou excluí- lo a depender da conjuntura apresentada através do estudo dos efeitos do tiro, pesquisáveis junto às lesões estabelecendo em muitos casos o trajeto, distância e traços da(s) arma(s) usada(s). Para o diagnóstico diferencial entre o orifício de entrada e saída em tecidos moles observa-se de forma geral as características descritas. Os ferimentos de entrada são bem definidos, bordas invertidas (FRANÇA, 2004) e com suas orlas e zonas características a depender da distância (Figura 8). 33 Figura 8 – Imagem da lesão de entrada com orla de enxugo, tiro á distância em espécime suíno por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP O orifício de saída apresenta feridas irregulares com bordas evertidas, dilaceradas e sem as orlas presentes na entrada (Figura 9) (CALABREZ, 1997). A orla equimótica não é visível, uma vez que a lesão foi produzida em espécime post-mortem. 34 Figura 9 – Imagem da lesão de saída tiro a distância em espécime suíno por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP Descreve-se também a diferenciação de orifício de entrada e saída em superfície externa óssea (Figura 10), através do Sinal de Bonnet, sendo o menor diâmetro de entrada e maior de saída (VANRELL, 2012). Porém, a literatura (VANRELL, 2012; FRANÇA, 2004) não menciona suas características para os diferentes tipos de projéteis, encamisados ou expansivos, por exemplo. Além disso, quando há fragmentação do projétil, pode-se ter dois ou mais orifícios de saída (TOCHETTO, 2012). 35 Figura 10 – Imagem da lesão de entrada tiro à distância em calota craniana com fratura causada pelo tiro em espécime suíno por Espingarda Boito Pump Standard Cal.12 7+1 Cano 24" 5’’ Infere-se a partir das características da lesão a direção e distância da qual foi efetuado o disparo. Os tiros perpendiculares formam cavidades circulares com zonas de tatuagem concêntricas (TOCHETTO, 2012). Já os tiros oblíquos produzem lesões excêntricas e elípticas com eixo maior próximo a direção de disparo. Nesta direção, há maior concentração de resíduos e zona de tatuagem mais intensa no lado de maior inclinação da arma (TOCHETTO, 2012). Entretanto, constata-se que o padrão da lesão e deposição de resíduos é divergente do descrito na literatura (FRANÇA, 2004; HERCULES, 2005; VANRELL, 2012) nos tiros perpendiculares utilizando uma arma que possui o mecanismo compensador de recuo. Este mecanismo redireciona a saída dos gases pelo cano a fim de diminuir o recuo da arma (DIMAIO, 1998; TOCHETTO, 2012). Observa-se em tiros perpendiculares com esta arma que os resíduos se concentram em forma de leque superior a cavidade de entrada (Figura 11), que por sua vez assume a forma oval (Figura 12). 36 Figura 11 – Imagem da lesão de entrada tiro perpendicular encostado no alvo com zona de chamuscamento e zona de esfumaçamento em forma de leque acima do orifício de entrada em espécime suíno por Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’. 37 Figura 12 – Imagem da lesão de entrada tiro à distância, apresentando A) orla de enxugo, B) orla de escoriação, C) forma elíptica em espécime suíno por Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’. O tiro encostado caracteriza-se pelo orifício de entrada como amplo e irregular, em geral maior que o diâmetro do projétil usado, podendo possuir sinal de Werkgaertner próprio desta distância, sinal de Benassi e mina de Hofmann quando há plano ósseo subjacente(VANRELL, 2012; TOCHETTO, 2012). No tiro a curta distância o orifício de entrada tem forma arredondada ou ovalar, com bordas invertidas, orla de contusão, enxugo, aréola equimótica e, a depender do tipo de pólvora, arma, comprimento do cano, encontramos zona de esfumaçamento e tatuagem (VANRELL, 2012; TOCHETTO, 2012). A zona de esfumaçamento, à medida que a boca do cano se afasta, vai diminuindo de diâmetro até ficar mais tênue deixando nítida a orla de tatuagem. Quando, apesar de não encostado, a distância for mínima e apresentar zona de chamuscamento usa-se o termo tiro à “queima roupa” (VANRELL, 2012; TOCHETTO, 2012). Por conseguinte, no tiro distante, não se encontrando ao alcance e recobrimento dos efeitos secundários do tiro, as orlas estão mais evidentes apresentando por via de regra o ferimento de entrada menor ou equivalente ao diâmetro do projétil de forma arredondada ou ovalar, bordas reviradas para dentro, com orla de escoriação, halo de enxugo, auréolas equimóticas (VANRELL, 2012; TOCHETTO, 2012). Também para determinação de distância do tiro obtém-se o residuograma. Este condiz à secção transversal da região onde os resíduos correspondentes aos efeitos secundários se dispõem. De forma comparativa o residuograma é realizado com arma e munição idêntica à do fato, em alvo análogo, compara-se o cone de dispersão dos chumbos até que se obtenha um similar ao examinado (Figura 13). 38 Figura 13 – Residuograma de entrada em tecido de algodão por Pistola Taurus 58 HC Plus .380 ACP com munição ogival, A) à distância B) tiro encostado Os resultados observados no residuograma sugerem que a arma que possui compensador de recuo altera o padrão da lesão, que apresenta forma oval e depósito de resíduos acima do orifício de entrada (Figura 14) (TOCHETTO, 2012). O uso de silenciador influência na menor aderência de partículas na superfície do residuograma (DIMAIO, 1998). Lembrando também que a mudança na composição química e de quantidade dos componentes da munição pode variar o residuograma. Portanto há variações em conceitos pré-estabelecidos para determinação de distância de tiro somente pelas características das lesões e os testes de residuograma, que devem ser os mais fidedignos possível aos elementos usados no fato. Figura 14 – Residuograma de entrada em tecido de algodão por Revólver Taurus 627 .357 Magnum com compensador de recuo 4’’ A) tiro à distância B) tiro encostado 39 O trajeto nada mais é do que o segmento da trajetória percorrido pelo projétil no interior do corpo (TOCHETTO, 2012). A determinação deste deve levar em conta os desvios que ocorrem no interior do corpo e posição de necropsia. O trajeto do projétil juntamente com as peculiaridades da cena de crime apresenta seu valor legal na reconstituição e contestação dos fatos. A análise dos elementos correspondentes aos quais determinam-se os danos causados pelas lesões devem levar em consideração a complexidade fisiológica e a topografia corporal de cada indivíduo, não sendo esta uma ciência exata (LEANDRO, 2016). A perfuração e a cavidade permanente formada são determinantes para qualificar o fator causal incapacitante. A cavidade temporária produzida com armas curtas apresenta menor relevância ao estudo do fator incapacitante por não ter efeito confiável em tecidos elásticos, exceção feita quando envolve órgãos críticos (LEANDRO, 2016). Entretanto, devido a crescente variedade de tipos e adaptações de armas, de munições com novas características, a exemplo a expansão e fragmentação dos projéteis, projéteis de alta energia e composição química do propelente, as lesões apresentam atualmente divergências dos conceitos clássicos descritos na literatura. 40 5 CONCLUSÃO Observa-se com o presente trabalho que as lesões apresentam variações quanto a distância em que o disparo foi efetuado, ao calibre da arma, quanto ao tipo de munição usada dentre outros fatores envolvidos. Assim conclui-se que o estudo acerca da balística forense por vezes limita-se a antigas tecnologias e definições outrora estabelecidas em sua descrição na literatura. Entretanto, este assunto por conta das inovações industriais é amplo, mutável. Por fim enfatizamos que os estudos devem acompanhar os avanços na criação de produtos disponíveis na indústria bélica. Reforça- se a importância do perito odontolegista nos institutos de perícia, atuando em suas áreas de competência, na qual inclui-se a balística forense e a importância deste profissional fornecendo aporte na elucidação de casos. 41 REFERÊNCIAS ALMEIDA JÚNIOR, Otaviano de. Um estudo sobre o movimento dos projéteis balísticos e sua trajetória: [livro eletrônico]. São Paulo: Blucher, 2017. 70 p. ASSIS, Cíntia de. Perícia odontolegal. Revista Brasileira de Odontologia, v. 68, n. 1, p. 72, 2011. BRASIL. Poder Judiciário. Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas. Manual de Armamento e Manuseio Seguro de Armas de Fogo. Manaus, 2012. CALABREZ, Mara Cristina Tramajuras. Traumatologia forense. In: Compêndio de odontologia legal. 1997. p. 245-88. CERQUEIRA, Daniel et al. Atlas da Violência 2018. CFO - Conselho Federal de Odontologia. Consolidação das Normas para Procedimentos nos Conselhos de Odontologia, aprovada pela Resolução CFO-63/2005, atualizada em 18 de maio de 2005. 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