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Texto e discurso Em um questionamento rápido, você saberia distinguir o que é texto e o que é discurso? Tais termos seriam sinônimos ou teriam significados diferentes? Vamos iniciar com a etimologia da palavra “texto”: ela vem do latim texere (“construir”, “tecer”), cujo particípio passado, textus, também era usado como substantivo, e significava “maneira de tecer”', ou “coisa tecida”. Se você já observou de perto um tecido, pode observar que ele é uma trama em que os fios se entrelaçam para formar o produto. Assim é também o texto. Como podemos definir “texto” Durante muitos séculos, a palavra foi aplicada exclusivamente para caracterizar material escrito. Porém, a partir do século XX, as definições e as teorias linguísticas acrescentaram a essa definição a ideia de uma unidade comunicativa, resultado da atividade verbal humana, seja ela oral, escrita ou relacionada a diversos recursos. Nos estudos linguísticos, conforme afirma BAGNO, o interesse pelos textos é recente. Durante muitos séculos, a língua foi organizada como uma sequência de níveis que começava nas letras, das letras seguia para as sílabas, depois para as palavras, até chegar à frase ou sentença, dotada de significado completo. Para os filósofos gregos, a combinação de substantivo/sujeito mais verbo/predicado formava a estrutura básica da atividade linguística. A investigação se detinha nessa estrutura que chamavam de lógos. Então, os textos eram considerados um encadeamento, cada um com sua combinação. Quando os romanos tomaram conhecimento do conteúdo gramatical-filosófico grego, não efetuaram grandes mudanças no que os helenos tinham feito no campo intelectual. Sendo assim, seguiram com a análise sintática tradicional. Ainda segundo Bagno, muito tempo mais tarde, já nos estudos linguísticos do século XX, para algumas perspectivas formalistas a frase continuava sendo satisfatoriamente aceita como unidade final da análise. Para correntes funcionalistas, no entanto, a busca precisaria ser mais complexa, a fim de compreender a língua como uma atividade social, de interação humana em que a frase está inserida: o texto e seu contexto. Observe: Formalismo: considera a língua como um sistema operacional encerrado em si mesmo, cujas regras de funcionamento são independentes dos fatores externos. Funcionalismo: a língua é um instrumento de interação social e possui funções sociais e cognitivas, que são determinantes para a competência comunicativa. Nesse sentido, o texto pode ser analisado por diversas perspectivas, de acordo com a área da Linguística e seu interesse de observação científica. Sendo assim, pode-se considerar que um texto é uma estrutura significativa superior à frase, haja vista que se trata de uma unidade linguística dotada de sentido completo em um determinado contexto. Os textos, por serem de inúmeras variedades e estilos, são passíveis de classificação e organização em diversos grupos. Como a linguagem, podem ser verbais, não verbais e mistos; literários e não literários; de diferentes tipos e gêneros. A diferença entre um texto literário e um texto não literário consiste na maneira como eles são construídos e em seu objetivo. Segue uma definição sucinta dessas duas classificações: • Texto literário: De caráter estético, em geral é escrito em linguagem poética, utilizando figuras de linguagem e pontuação diferenciada. Por meio do estilo do autor, busca cativar o leitor com emoção, arte e beleza. As palavras, frases e parágrafos são distribuídos na página de forma expressiva, com o objetivo de sensibilizar. Alguns exemplos são os poemas, romances e contos. • Texto não literário: Sua principal função é informar, de forma objetiva e clara. Utiliza linguagem denotativa a fim de evitar que o entendimento seja prejudicado. São exemplos de textos não literários as notícias, as propagandas publicitárias, os artigos científicos, as receitas culinárias, os compêndios didáticos etc. Pode-se também classificar os textos em tipos e gêneros textuais. Faremos aqui uma breve explanação, a fim de introduzir o assunto, apenas. Tipos textuais Os tipos textuais constituem uma categoria definida fundamentalmente pela propriedade linguística de sua composição (tempos verbais, referências lexicais, aspectos sintáticos) e abrangem um conjunto limitado desclassificações. Os principais tipos textuais são: • Narrativo: nesta modalidade textual um fato, real ou fictício, é contado. Há o envolvimento de personagens e um determinado espaço e tempo. Usualmente é escrito em prosa e apresenta alguns tipos de discurso, referentes à intervenção do narrador. • Descritivo: é o retrato escrito de uma pessoa, animal, objeto ou lugar. O adjetivo é a classe de palavra em evidência. O autor transcreve cenas, aspectos sensoriais, quando se trata de descrição humana, confere características físicas e psicológicas, de acordo com a sua sensibilidade. • Expositivo: apresenta informações sobre algum assunto. Explica, avalia e expõe ideias. Deve ser compreensível e convincente. O artigo científico é um exemplo dessa tipologia. • Dissertativo/argumentativo: há exposição de ideias com posicionamento pessoal. A argumentação, a fim de defender um ponto de vista, é a base para a construção de um texto lógico e coerente. Sua estrutura é dividida em introdução (apresentação da tese, ou ideia principal), desenvolvimento (argumentos) e conclusão (síntese e retomada da posição assumida). • Injuntivo: encaminha como alguma ação deve ocorrer. Predominam os verbos no modo imperativo, com a intenção de orientar, ordenar ou aconselhar. A linguagem deve ser simples e objetiva. Dentre os textos desse tipo, pode-se citar os manuais, os editais, as receitas culinárias etc. De acordo com Marcuschi, entender e distinguir gênero de tipo textual é muito importante em todo o trabalho com produção e compreensão textual. Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição. A expressão gênero textual, definida com mais propriedade a seguir, torna-se um pouco vaga para nos referirmos à materialização dos textos que encontramos no nosso cotidiano e que apresentam características sociocomunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais e estilo. Gêneros textuais Definir gênero textual é uma tarefa difícil, mediante uma abundância e diversidade de fontes e perspectivas de análise. Segundo esse mesmo autor, gênero é uma categoria cultural; uma forma de ação social; uma estrutura textual; um esquema cognitivo. Alguns exemplos de gêneros são palestra, resenha, carta ao editor, e-mail, mensagem de celular, biografia, diário etc. Quando escrevemos um e-mail, por exemplo, estamos utilizando um gênero textual que pode conter alguns tipos textuais em seu conteúdo. Nesse e-mail é possível descrever algo (tipo descritivo), passar instruções de como proceder para realizar alguma tarefa (tipo injuntivo), narrar algum acontecimento (tipo narrativo), tentar convencer meu leitor do meu ponto de vista (tipo argumentativo). Há possibilidade de todos esses tipos textuais estarem incluídos no gênero textual que escolhi para transmitir a mensagem, e isso também pode acontecer com todos os outros gêneros. O ponto de partida para os modernos estudos da linguagem é atribuído a Saussure e sua dicotomia entre língua e fala. No entanto, a partir de então outras vertentes surgiram e se tornaram mais pertinentes para as análises linguísticas como as supracitadas e sua cientificidade. Apesar da importância da língua e de seu estudo para a comunicação, passa-se a investigar a compreensão da linguagem como interação, como produto da manifestação do pensamento, denominado discurso. Discurso As reflexões teóricas de Bakhtin, que considerouque a língua é um fato social propiciaram a base para entendermos que discurso se realiza por meio da língua em um determinado contexto. Refere-se ao uso da língua relacionado aos fatores extralinguísticos, produzindo uma dimensão de sentidos na construção de significados. Para construir os sentidos, as compreensões e as interpretações, foi necessário reconhecer que o objeto de pesquisa dos estudiosos da área de Letras e Linguística deve ser agora a linguagem em funcionamento, como parte da atividade humana, mantendo assim o discurso como interesse prioritário. A partir do momento em que as pesquisas linguísticas começaram a se distanciar do estudo da estrutura da palavra, o sujeito passa a ter o seu lugar reconhecido e a língua passa a ser percebida como uma possibilidade de agir sobre o outro. A linguagem, como produção social e possibilidade de interação entre interlocutores, integra a questão ideológica, que está presente vigorosamente nas estruturas sociais. Sendo assim, o discurso deve ser percebido a partir de um viés contextual e ideológico. A ideologia consiste em uma série de atuações influentes dentro de uma determinada classe social. A visão de mundo específica dessas classes que estão sempre em conflito na sociedade, definem o modo como o discurso é produzido. É o conjunto de pensamentos, propósitos, ideais ou crenças de um indivíduo ou de um grupo de pessoas. Discurso, definido de forma simples e direta por Pêucheux, seria a linguagem materializada pela ideologia. Isso condiz com um conjunto de enunciados realizados e produzidos por um sujeito que ocupa uma certa posição em uma estrutura social, política ou cultural agregada de crenças e valores. Os sujeitos envolvidos na atividade comunicativa denominada discurso estão posicionados em um determinado tempo e espaço. As ideologias sempre transparecem nos discursos realizados por esses sujeitos. Sendo assim, podemos afirmar que não há discurso neutro. Muitas vezes os sentidos podem estar implícitos, ou por vontade própria, ou por falta de adequação em relação ao tempo, lugar ou estrutura social. Porém, a intenção está ali subentendida ficando para os interlocutores a compreensão do sentido. Uma escolha lexical demonstra que existe uma ideologia que rege os discursos: Para noticiar um fato, a equipe jornalística escolhe as palavras e a construção do enunciado indica qual ideologia está ali subentendida. Dependendo dessa escolha uma mesma pessoa pode ser um jovem infrator ou um delinquente. Um ativista do movimento sem-terra ou um invasor de propriedades privadas. Percebe como as escolhas podem influenciar o ouvinte com relação às ideologias implícitas na mensagem do falante? Para entender todos os elementos que abrangiam as ideologias envolvidas nas escolhas sintáticas e lexicais, além de suas relações com a sociedade como um todo, tornou-se necessária uma análise linguística específica para compreender as visões de mundo implícitas no contexto das estruturas sociais, sob uma perspectiva que levasse em conta os fatos externos à linguagem. Esse componente, que conceitua a relação da ideologia do indivíduo com sua história, seu conhecimento de mundo e a sociedade em que vive, seja de caráter pragmático, histórico ou social, é a Análise do Discurso. A análise do discurso A Análise do Discurso (AD) é de extrema importância para os estudiosos da área da linguagem, pois é o campo da Linguística que analisa o uso da língua sob uma perspectiva discursiva, investigando como acontece a construção ideológica em um texto. Ela trata das questões de linguagem nas diferentes práticas discursivas da sociedade. Sendo assim, é fundamental compreender o que se entende como discurso e como ele se constitui, entre as várias correntes teóricas. A AD surgiu na França na década de 60, a partir das críticas de um dos pioneiros dessa área, o francês Michel Pêcheux, que afirmava que o sentido não é da ordem da língua e por esse motivo não se submete aos seus critérios. Segundo o linguista, para um indivíduo se tornar sujeito, ele precisa se “sujeitar”, ou passar pelo “assujeitamento”, que é criar uma opinião sobre tudo o que aprendeu ao longo de sua vida, através do conhecimento de mundo. Por exemplo, a partir do momento em que uma pessoa conhece as religiões, ela pode criar opiniões diferentes a respeito de uma ou outra crença. Assim, suas ideologias serão refletidas explícita ou implicitamente no seu discurso. Pêcheux declarou que a linguística saussuriana permitiu a constituição da fonologia, da morfologia e da sintaxe, mas não foi suficiente para permitir a constituição da semântica. Para Michel Foucault, ser um sujeito é ocupar o papel do enunciador, pois todos os discursos são enunciados. Para ele, ser sujeito é coerente com a concepção de discurso. O seu objetivo era definir um novo caminho no campo antes ocupado pelas ideias. Para FOUCAULT discurso é dispersão, ou seja, um conjunto de enunciados que se remetem a uma mesma formação discursiva. Ele considera que o sujeito é um espaço vazio a ser preenchido por diferentes indivíduos que o ocuparão ao formularem o enunciado. Mikhail Bakhtin, por sua vez, defendia que a linguagem apresenta duas esferas indissociáveis: a dimensão do uso da língua, ou seja, a língua em funcionamento, e a dimensão da atividade humana. Segundo o filósofo russo, o uso da língua se efetua na forma de enunciados, sejam eles orais ou escritos. Essas duas esferas contam com inúmeros modos e variedades, que constituem padrões e formas típicas de cada um. Quando o pesquisador fala em formas típicas e estáveis de enunciados, está se referindo aos gêneros do discurso. Bakhtin também faz uma crítica à teoria de Saussure, prescindindo da língua como objeto de estudo e assumindo o interesse pelo diálogo. Dessa forma, o enunciado passa a ser a unidade de comunicação. A construção de sentido dos enunciados é feita a partir de um locutor e um interlocutor, que são os elementos essenciais para a situação interlocutiva e produção de sentido dos enunciados gerando sempre uma atitude responsiva ativa. Da perspectiva teórica da Análise do Discurso nem sempre é possível dizer qual é o sentido de um termo ou de um enunciado, porque o sentido é o resultado das circunstâncias de produção do discurso. Portanto, o objetivo da AD é realizar leituras críticas e reflexivas, compreendendo como ocorre a produção de sentido, expondo as razões para o entendimento da natureza e do funcionamento do discurso. Michel Pêcheux foi um filósofo francês, nascido em 1938. Foi considerado um dos precursores e maior expoente da chamada Análise do Discurso, juntamente com Michel Foucault, Bakhtin, entre outros. Mikhail Bakhtin nasceu na Rússia em 1895 e foi uma das figuras mais importantes para os estudos da linguagem humana. O teórico foi o líder de um grupo denominado “Círculo de Bakhtin” e suas teorias revolucionaram os estudos nessa área. Ele exerceu grande influência sobre os intelectuais contemporâneos. Suas teorias, que abordam principalmente a relação entre o poder e o conhecimento, e como elas são usadas com o objetivo de controle social influenciaram acadêmicos, que trabalham em estudos de sociologia, teoria literária, teoria crítica, comunicação. Ao realizarmos este pequeno percurso, nessa área tão rica e abrangente que é a AD, procuramos instaurar o entendimento de como surgiu, quais são os objetivos e despertar o interesse nessa área de características tão abrangentes.
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