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E-Book - Apostila 
ANÁLISE DO DISCURSO 
E-Book - Apostila 
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E-Book - Apostila 
INTRODUÇÃO À ANÁLISE DE DISCURSO 
Inicie sua Jornada 
Neste estudo você terá contato com a Análise de Discurso (doravante AD), seus principais 
conceitos e noções, seus princípios teóricos e metodológicos, e o modo como, no Brasil, 
essa teoria ganhou algumas especificidades, diferenciando-se da AD francesa. 
Nosso objetivo é que você possa, a partir das questões aqui discutidas, ter uma visão 
geral dessa disciplina que atualmente compõem os estudos dos mais variados campos de 
investigação e pesquisa. Esperamos, ainda, que as reflexões aqui levantadas possam 
auxiliá-lo em seu percurso acadêmico e profissional, uma vez que a perspectiva 
discursiva permite um trabalho singular com a língua e o discurso, o que permite aos 
sujeitos estabelecer uma relação menos ingênua com as questões da linguagem em geral. 
A AD é uma disciplina que tem como gesto fundador os estudos realizados na França, no 
final da década de 1960, pelo filósofo Michel Pêcheux e um variado grupo de professores e 
pesquisadores que, reunidos em torno desse autor, realizaram diferentes pesquisas, 
investigações e análises para pensar aquilo que Maldidier (2003, p.15) chamou de 
“aventura teórica”. 
2-140
E-Book - Apostila 
Embora por questões práticas falaremos neste encontro sempre em uma teoria 
pecheuxtiana, gostaríamos de chamar a atenção para o fato de que as noções e 
procedimentos da AD foram se delineando a partir de uma elaboração teórica coletiva. De 
acordo com Maldidier (2003, p.16), Michel Pêcheux “amava o trabalho comum. Ele 
escreveu bastante com amigos, com colaboradores.” Nesse sentido é importante destacar 
que a teoria do discurso nasce pela força do trabalho da figura de Michel Pêcheux, mas 
não se reduz ao seu pensamento, sendo, assim, a expressão de uma discussão teórica 
que, na França de 1960, estava fortemente marcada por variados interesses de 
pesquisadores que dialogavam com esse autor. 
Desse trabalho conjunto em uma aventura do discurso, surgem reflexões sobre a relação 
dos sujeitos com a língua e também com outros campos de saberes que nos auxiliarão a 
refletir sobre suas noções fundamentais, a partir de 5 aulas: na aula 1, estudaremos sua 
origem na França e no Brasil; na 2 a língua e o discurso; na 3 sobre as condições de 
produção (doravante CP), formações imaginárias e sujeito discursiva; na 4 sobre 
formação ideológica (doravante FI) e formação discursiva (FD) e, para finalizar, na aula 5, 
apresentaremos os conceitos de interdiscurso, intradiscurso e memória discursiva. 
Desejamos a você, um ótimo estudo e muitas reflexões produtivas. 
Desenvolva seu Potencial 
A AD E SEUS FUNDADORES: CONTEXTO HISTÓRICO 
3-140
E-Book - Apostila 
Michel Pêcheux, líder do grupo de fundadores da AD, inicia a escrita de suas reflexões 
com dois textos assinados com um pseudônimo: Thomas Herbert. O primeiro deles, 
“Réflexions sur la situation théorique des sciences sociales, spécialement de la 
psychologie sociale” [Reflexões sobre a situação teórica das ciências sociais, 
especialmente da psicologia social], foi publicado em 1966 em “Cahiers pour 
Analyse"[Cadernos para análise], revista do círculo de epistemologia École Normale 
Supérieure em Paris [Escola Normal Superior de Paris]. O segundo texto, publicado na 
mesma revista, em uma edição de 1968, intitulava-se “Remarques pour une théorie 
générale des idéologies” [Anotações para uma teoria geral das ideologias].Em 1969, é 
publicado o primeiro livro do autor, intitulado “L'Analyse automatique du discours” 
[Análise automática do discurso], doravante AAD69, e, aparentemente, segundo Henry 
(2010) não havia nada em seu livro que remetia às questões que o autor trazia nos dois 
primeiros artigos publicados. Vemos, portanto, que os primeiros textos de Michel Pêcheux 
possuem um teor crítico, que colocava questões para a psicologia e às ciências sociais, ao 
mesmo tempo em que, em seu livro, ocupou-se do desenvolvimento de um método 
específico de análise: o método automático. Mas o que seria, então, a AAD69? Segundo 
Henry (2010, p.17) Pêcheux embora fosse um filósofo de formação era alguém apaixonado 
pelas máquinas, pelas ferramentas, pelos instrumentos e pelas técnicas. “E ele não é um 
filósofo qualquer, mas sim um filósofo convencido de que a prática tradicional da filosofia, 
em particular no que tange às ciências, está desprovida de sentido ou é, no mínimo, um 
fracasso.” (HENRY, 2010, p.17). 
4-140
E-Book - Apostila 
Nesse contexto, com sua análise automática do discurso o autor buscou construir um 
instrumento que permitia pensar sobre a utilização empírica dos instrumentos, porque 
alguns tipos de utilização eram dominantes e não outros. Ou seja, com sua análise 
automática do discurso ele não apenas produziu reflexões importantes para sua posterior 
teoria do discurso, como também fez uma forte crítica ao modo como as ciências sociais 
de sua época se servia dos instrumentos e, consequentemente, uma forte crítica às 
ciências sociais em si mesmas. Era, não apenas o estabelecimento de uma teoria, de um 
instrumento, mas um modo de pensar a ciência na sua relação com o político (Henry, 
2010).Da obra AAD69 achamos importante destacar aspectos que serão importantes para 
um definição de discurso, adotada pelos analistas em geral, como por exemplo: Discurso, 
Condições de Produção, Sujeito, Formações Imaginárias, estão fortemente presentes 
nesse primeiro livro do autor e serão abordadas mais detalhadamente no decorrer desta 
unidade. O que é importante destacarmos nesse tópico é o fato de que as reflexões de 
Pêcheux sobre o discurso nascem dessa preocupação do autor com uma crítica aos 
procedimentos teóricos e analíticos das áreas de atuação às quais ele pertencia e, 
simultaneamente, de sua tentativa de formalização de uma teoria do discurso através de 
procedimentos automáticos.Vale destacar que naquele período a análise de conteúdo era 
predominante nas ciências sociais e que Pêcheux demonstrava uma profunda 
preocupação com os rumos que as análises de textos vinham tomando. Desse modo, a 
AAD69 visava “obter resultados empíricos, de maneira a propor uma alternativa teórica e 
metodológica à análise de conteúdo” (GADET; LEON; MALDIDIER; PLON, 2010, p. 55). Esse 
questionamento é, portanto, um modo de colocar questões ao campo da linguística e ao 
modo como ela se constituiu como uma ciência e como um estudo centrado no 
funcionamento da língua deixa questões não respondidas ao estudo dos textos, que não 
podia até então se constituir como um objeto científico, uma vez que o objeto da 
linguística é exclusivamente a língua.A inclinação pela qual a linguística constituiu sua 
cientificidade deixou descoberto questões sobre o texto, a partir de uma análise 
meramente conteudista, a partir de questões como: a) “O que quer dizer este texto?”; b) 
“Que significação contém este texto?” e c)"Em que o sentido deste texto difere daquele 
de tal outro texto?"(PÉCHEUX, 2010, p. 61). 
Nesse contexto, será de fundamental importância a mudança de perspectiva que o autor 
propõe deslocando aquilo que seria uma análise do texto por ele mesmo, sobretudo uma 
análise do texto como um produto acabado, e uma análise que viria a pensar o texto em 
seu processo de produção discursivo, chamando a atenção, então, para as 
“circunstâncias” dos discursos, que o autor chamará de Condições de Produção e que na 
teoria linguística da época era representada pelas noções de contexto ou situação 
(PÊCHEUX, 2010, p. 73). Foi nesse panorama que o texto passa a ser interpretado a partir 
da seguinte pergunta: “Como esse texto significa?”.Foi nesse panorama francês que 
ocorreu o gesto fundador da AD e é importante ressaltar ainda que essa disciplina assim 
constituída se institucionalizouna França de forma mais ou menos marginal, designando- 
se como uma disciplina de entremeio (relação que a AD estabelece com outras 
disciplinas, pois é a partir dessa relação que ela se constitui), ou seja, a AD fazia sua 
crítica às disciplinas já institucionalizadas (como já dito anteriormente), a partir de três 
campos de estudos: a linguística, o marxismo e a psicanálise. Trata-se de uma disciplina 
de entremeio porque 
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“[...] não acumula conhecimento meramente, pois discute 
seus pressupostos continuamente. [...]. [....]. Levando a 
sua crítica até o limite de mostrar que o recorte de 
constituição dessas disciplinas que constituem essa 
separação necessária e se constituem nela é o recorte 
que nega a existência desse outro objeto, o discurso, e 
que coloca como base a noção de materialidade, seja 
linguística seja histórica, fazendo aparecer uma outra 
noção de ideologia, possível de explicitação a partir da 
noção mesma de discurso e que não separa linguagem e 
sociedade na história. (ORLANDI, 2007, p. 23-25). 
q J 
Nesse sentido, surgem no interior da teoria discursiva uma forma singular de pensar a 
relação entre a língua, o sujeito, a história, produzindo um deslocamento que, segundo 
Orlandi (2007, p.23) "resulta sobretudo do trabalho produzido sobre a noção de ideologia”. 
Michel Pêcheux irá explorar melhor todas as suas reflexões sobre língua, discurso e 
ideologia em um segundo livro, esse mais conhecido e mais estudado no Brasil, intitulado 
“Les Vérités de la Palice”, traduzido para o português sob o título “Semântica e discurso: 
uma crítica à afirmação do óbvio”. 
No decorrer das reflexões aqui realizadas você terá oportunidade de acompanhar um 
pouco mais sobre o modo como a AD trabalha com todas essas noções. Agora que você já 
teve uma noção bem inicial das primeiras reflexões e trabalhos sobre a AD na França, 
vejamos de que modo a teoria é abordada no campo brasileiro. Segundo destaca Orlandi 
(2009) em nota na introdução à edição brasileira da obra Semântica e Discurso a Análise 
de Discurso no Brasil hoje se desenvolve sob diferentes perspectivas e autores que se 
diferenciam entre si. 
Se, nos anos de 1960, ano de surgimento de uma teoria discursiva na França, as 
referências teóricas que influenciaram a disciplina “giravam em torno do estruturalismo 
filosófico, da questão da ideologia e da leitura dos discursos” políticos (ORLANDI, 2012, 
p.14), tendo sobretudo como conjuntura política a crise das esquerdas, no Brasil a entrada 
da AD se dá sob outras bases. 
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No Brasil a entrada da perspectiva discursiva pecheuxtiana se dará no contexto dos anos 
70, cujo o cenário principal é a ditadura militar e é nesse contexto que a pesquisadora Eni 
Orlandi, em volta com as questões políticas e acadêmicos de um período ditatorial, entra 
em contato com a obra de Michel Pêcheux e, a partir da relação que estabelece com ela, 
abre um campo de estudos para pensar o discurso na academia brasileira, a partir de 
aulas e publicações nas quais apresenta noções e conceitos dessa disciplina. Segundo a 
pesquisadora, naquele período os linguistas brasileiros “não aceitam que uma forma de 
conhecimento materialista sobre a linguagem, que ignora o positivismo, se forme 
contraditoriamente no seu interior” (ORLANDI, 2012, p. 22). Vemos assim que a entrada da 
AD pecheuxtiana no Brasil, nos anos 70, não ocorreu sem resistências, anos 70, pois a 
pesquisadora e professora Eni Orlandi insiste, mesmo no contexto de uma ditadura que 
não dava trégua e por isso era preciso ensinar AD, pois nas suas palavras. Nas palavras da 
autora “Era preciso acenar que o sentido podia/pode ser outro” e que “[...] sujeito e 
sentido se constituem ao mesmo tempo” (ORLANDI, 2012, p. 17). 
Certamente , ao longo dos anos essa teoria se disseminou, produziu deslocamentos e a 
própria denominação Análise de Discurso so0freu seus deslocamentos e, no Brasil, se 
desenvolve na relação com outros autores que não Michel Pêcheux, como o filósofo 
Michel Foucault, Patrick Charaudeau, Dominique Maingueneau e outros que se alinham a 
uma perspectiva de discurso mais próxima do pensador Mikhail Bakhtin. 
Hoje, podemos afirmar que a AD no Brasil considera a Linguística nas suas análises, mas 
também a História, a Filosofia, a Sociologia e a Psicanálise e diferentes arquivos de 
análises que perpassam do verbal ao não verbal, do discurso político, ao dos sem-terra, 
grevistas, religiosos, jurídicos científico e cotidiano. 
O) 
SAIBA MAIS 
Para saber mais sobre os textos iniciais de Michel Pêcheux sugerimos que você 
leia o texto “Os fundamentos teóricos da “análise automática do discurso” de 
Michel Pêcheux, escrito por seu colega de pesquisa Paul Henry, no livro intitulado 
“Por uma análise automática do discurso”, organizado por Françoise Gadet e Tony 
Hak, outros dois membros do grupo que se reunia em torno do autor. Essa obra 
reúne alguns trechos do livro de Michel Pêcheux e alguns artigos de 
pesquisadores de seu grupo, que se dedicam a explicar e a demonstrar análises 
realizadas a partir do instrumento de análise automática elaborado por Pêcheux. 
Fonte: as autoras. 
INDICAÇÃO DE FILME 
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A. + 
NÓS QUE AQUI ESTAMOS, 
“POR VOS ESPERAMOS 
** Um filme de Marcelo Mosagão. 
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Nós que aqui estamos, por vós esperamos. 
Ano: 1999 
Sinopse: Um filme brasileiro, cujo título foi inspirado em uma placa instalada na 
frente de um cemitério, produzido pelo gênero documentário que, sob a direção 
de Marcelo Masagão, resume os principais acontecimentos ocorridos no mundo 
durante o século XX, abordando de forma ficcional, criativa e também fatos reais 
- retratos, filmes e outros registros audiovisuais, apresentam a biografia de 
personagens importantes e também homens e mulheres que, escondidos, nunca 
fizeram parte da história documentada, mas fi zeram história, para refletirmos não 
só esse século de grandes acontecimentos - duas grandes guerras, quebra da 
bolsa em 1929, Freud e o inconsciente, Einstein e sua física, Saussure e sua teoria 
da língua, Marx e a divisão de classes, a viagem para a lua, etc - mas também nos 
direciona a uma reflexão entre a linha tênue que separa a vida da morte. Um 
longa-metragem de encher os olhos e que vale a pena assistir. 
Comentário: Um filme interessante para fazer uma análise de discurso, aplicando 
não só os conceitos fundantes, mas também os desdobramentos da teoria, nos 
últimos anos. 
A J 
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS: LÍNGUA E DISCURSO 
Iniciamos nosso percurso apresentando as principais questões que fundamentam as 
reflexões iniciais da teoria da AD, bem como, alguns teóricos franceses que contribuíram 
para a sua ancoragem na sociedade francesa de meados do século XX, sem deixar de 
mencionar também, os desdobramentos da teoria em solo brasileiro. Entretanto, é preciso 
avançar pelos conceitos teóricos específicos para que você comece a compreender tanto 
a metalinguagem, quanto a aplicabilidade da mesma em gestos de análises. 
Tomando o direcionamento de apresentação e definição dos conceitos que participam da 
sua fundação e ainda continuam nas pesquisas atuais, não poderia fugir de duas 
ferramentas básicas para a AD: a língua e o discurso. Por se tratar de termos que fazem 
parte de diferentes campos de saberes, para desenvolvê-los, retomamos autores que 
trabalham com a teoria e lidam diariamente com os mesmos, à luz da AD. 
Pêcheux (2009) reflete e ressignifica a concepção saussuriana de língua, enquanto noção 
de sistema que se opõe à fala. Saussure, ao desconsiderar a função da língua e considerar 
seu funcionamento, no desenvolvimento da teoria, deixou uma porta aberta para que ela 
fosse pensada de forma multifacetada. Assim, a língua é uma base em funcionamento, 
onde os processos discursivos (produção de efeitos de sentido) são construídos pelo 
animal humano socialque fala/escreve como se houvesse somente uma língua, mas ao 
considerá-la no entremeio de outro campos científicos - a história, por exemplo, percebe- 
se que ela é “[...] [...] o lugar material onde se realizam estes efeitos de sentido” (PÉCHEUX 
& FUCHS, 1997, p. 172). 
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Nesse sentido, a língua, apesar de ser uma só para o materialista, idealista ou 
revolucionário vai funcionar conforme a posição daquele que vai colocá-la em 
funcionamento e isso, justifica a nossa afirmativa, pautado em Pêcheux (2009) que tais 
personagens não possuem o mesmo discurso. Por isso, a língua é fluída, ou seja, ela está 
sempre em movimento, vai além das suas regras e não se deixa imobilizar (ORLANDI, 
2009). A língua não tem limites e muito menos se apresenta como um sistema perfeito e 
unidade fechada nela mesma e, por conta disso, ela está sempre sujeita a falhas e sempre 
afetada pela incompletude e pela exterioridade. Para a AD, a língua é opaca. 
A língua é a condição de possibilidade do discurso. Isto significa que este é diferente da 
língua, embora se utilize das suas leis internas para se concretizar e, nesse sentido, 
conforme salienta Orlandi (2001), etimologicamente, remete à ideia de curso, movimento, 
palavra em movimento nos (e pelos) sujeitos. É justamente desse aspecto que a AD vai se 
ocupar, enquanto proposta epistemológica que Pêcheux (1969) articula com as Ciências 
Sociais (História, Sociologia e Filosofia), a Linguística, a teoria do Discurso e a Psicanálise. 
Portanto, não devemos pensar o discurso enquanto mera transmissão de informações, 
mas como a produção de um efeito de sentidos entre os locutores, conforme salienta 
Pêcheux (1997) ou seja, como algo que se produz na relação entre os sujeitos e está para 
além de uma análise simplista da língua, vindo a ser definido como 
“[...] um processo social cuja especificidade está no tipo 
de materialidade dessa base, a materialidade linguística, 
já que a língua constitui o “lugar material" em que se 
realizam os efeitos de sentido. Daí que a forma da 
interpretação - leia-se: da relação dos sujeitos com os 
sentidos - é historicamente modalizada pela formação 
social em que se dá, e ideologicamente constituída 
(ORLANDI, 1996, p. 146-147). 
q J 
O que se depreende das afirmativas aqui elencadas é que o discurso é o objeto teórico, 
conceitual e operacional da AD, mas que para ser efetivado enquanto prática analítica 
dos pesquisadores, precisa estar atrelada a outros componentes como, por exemplo, a 
própria língua e está social e à história. E assim por diante, pois não é possível pensá-lo 
isolado. 
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EU INDICO 
Em tempos de eleição para a reitoria de uma universidade, há uma faixa encorajando 
estudantes e servidores a votarem. Um leitor afetado pelo conteúdo vai pensar: “o 
que essa faixa (texto) quer dizer?”. Um leitor com noções sobre o discurso, sabendo 
que a língua é opaca e está afetada pela exterioridade, vai analisar: “como esse 
discurso significa"? e pelas condições de produção do modo como a campanha está 
ocorrendo, ele vai refletir sobre a possibilidade de coação e ameaça, no processo 
eleitoral. Um efeito de “voto de cabresto”. 
Fonte: Orlandi (2001a). Adaptado pelas autoras. 
CONCEITOS FUNDAMENTAIS: CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO DOS 
DISCURSOS, FORMAÇÕES IMAGINÁRIAS E SUJEITO DISCURSIVO 
E no mar do discurso é preciso avançar por outros conceitos para que sejamos capazes 
de compreender essa teoria e seus riscos dada às especificidades do modo 
pluridimensional em que ela foi pensada por seus fundadores. Por isso, se faz necessário 
compreendermos os conceitos básicos que compõem o rol da teoria da AD, pois esta, 
apesar das ressignificações que vão sendo reformuladas para atender às necessidades de 
análise de cada pesquisador, sempre há um retorno às questões fundantes da mesma e a 
partir dessa compreensão estabelece seu gesto de leitura e de análise. Vamos avançar e 
refletir sobre dois conceitos essenciais para iniciar um projeto pautado por esta teoria: as 
condições de produção do discurso (doravante CP), as formações imaginárias e o sujeito 
discursivo. 
Antes, porém, é preciso não esquecer de sempre lembrar que estamos lidando com uma 
teoria que produz sentidos (veja: produz) e eles não são fixos, mas oscila no (im)possível 
da língua e na posição daquele enuncia. Por isso, retomamos Pêcheux (1997) para sairmos 
da empiricismo que o termo CP nos leva a pensar como algo idêntico à situação, pois 
embora não se possa negar suas aproximações de similaridades conceituais, o autor se 
apropria do esquema informacional (modelo comunicativo) de Roman Jakobson - 
emissor, receptor, referente, canal, código e mensagem. Esta é pensada por Pêcheux, não 
mais como uma simples mensagem, ou seja, uma transmissão de informação de um 
emissor A, para um receptor B, mas como um discurso, ou seja, um “' efeito de sentidos' 
entre entre os pontos A e B” (PÊCHEUX, 1997, p. 82). 
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Dentro da teoria da AD, o que isso significa? Significa que as CP de um discurso (a 
produção de um efeito) incluem o contexto social, histórico e ideológico, ou seja, não é 
possível analisar somente as circunstâncias (a situação propriamente dita) de enunciação 
entre dois (ou mais) locutores físicos e em um contexto imediato permeado pelo aqui e o 
agora, mas como lugares que estão representados no processo discurso e denomina-se 
como formações imaginárias, ou seja, “[...] o lugar que A e B se atribuem cada um a sie ao 
outro, a imagem que eles fazem de seu próprio lugar e do lugar do outro” (PÉCHEUX, 1997, 
p. 82). Ademais, a CP constituem tais discursos, a partir de mecanismos de antecipação 
que coloca o locutor no lugar do outro, para ouvir suas próprias palavras, pois 
" 
Esse mecanismo regula a argumentação, de tal forma que 
o sujeito dirá de um modo, ou de outro, segundo o efeito 
que pensa produzir em seu ouvinte. Este espectro varia 
amplamente desde a previsão de um interlocutor que é 
seu cúmplice até aquele que, no outro extremo, ele prevê 
como adversário absoluto (ORLANDI, 2001 a, p 39). 
Nu J 
Resumidamente: 
As condições de produção implicam o que é material (a 
língua sujeita a equívoco e a historicidade), o que é 
institucional (a formação social, em sua ordem) e o 
mecanismo imaginário. Esse mecanismo produz imagens 
dos sujeitos, assim como do objeto do discurso, dentro de 
uma conjuntura sócio-histórica. Temos assim a imagem 
da posição sujeito locutor (quem sou eu para lhe falar 
assim?), mas também da posição do sujeito interlocutor 
(quem é ele para me falar assim, ou para que eu lhe fale 
assim?), e também a do objeto do discurso (do que estou 
lhe falando, do que ele me fala?) (ORLANDI, 2001 a. p. 40). 
q J 
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De acordo com a autora, todo esse mecanismo também vem permeado por relações de 
força constitutiva da própria estruturação da sociedade que demarcam nossos lugares no 
discurso, pois o discurso do lugar do professor e do aluno, do juiz e do réu produz efeitos 
de sentidos, hierarquicamente, com valores diferentes, ou seja, não necessariamente, 
mas, na maioria da vezes, os discursos do professor e do juiz valem mais do que o do 
aluno e do réu. 
Tais conceituações fazem parte das formações imaginárias e, reforçando, ela se 
caracteriza como algo que não trata de pessoas físicas em situações empíricas, mas que 
funcionam no discurso como se fosse projeções o qual subsidia os analistas do discurso a 
deslocar do lugar ocupados por pessoas físicas para a posição, ou seja, posição ocupadas 
por sujeitos discursivos. 
Falar sobre o sujeito do discurso também requer um deslocamento da concepção de 
indivíduo de carne e osso e dono do seu dizer. pois conforme os preceitos de Pêcheux 
(2009), para a AD, o indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia que com sua força 
material e sua capacidade de produzirevidências se torna a condição para constituir o 
indivíduo em sujeito. Portanto, é nesta relação que entre sujeito e ideologia que os 
sentidos vão sendo produzidos, metaforicamente, como um aceite involuntário de um 
recrutamento obrigatório. Sobre esta questão o autor nos diz que a ideologia “[...] 
'recruta' sujeitos entre os indivíduos e que ela os recruta a todos” (PÉCHEUX, 2009, p. 
144), como se fossem voluntários forçados, ou seja, como indivíduos que “[...] recebem 
como evidente o sentido do que ouvem e dizem, lêem ou escrevem [...] (PÉCHEUX, 2009, 
p. 144). 
N 
É nesse jogo discursivo que a ideologia atua e “[...] 
fornece as evidências pelas quais “todo mundo sabe' o 
que é um soldado, um operário, um patrão, uma fábrica, 
uma greve, etc. evidências que fazem com que uma 
palavra ou um enunciado 'queiram dizer o que realmente 
dizem" e que mascaram, assim, sob a “transparência da 
linguagem [...] (PÉCHEUX, 2009.p. 146). 
PENSANDO JUNTOS 
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E-Book - Apostila 
Pêcheux nos provoca ao desenvolver a teoria do sujeito do discurso, como um 
indivíduo interpelado. Você concorda que essa interpelação é sempre passiva? Será 
que em algum momento esse sujeito resiste? Pense sobre isso, a partir da situação 
política e econômica do Brasil e os movimentos atuais da classe trabalhadora, contra 
a reforma da previdência. 
Fonte: as autoras. 
CONCEITOS FUNDAMENTAIS: FORMAÇÃO IDEOLÓGICA E FORMAÇÃO 
DISCURSIVA 
Na aula anterior, foram apresentadas as reflexões sobre as CP, formações imaginárias e o 
sujeito discursivo enquanto componentes básicos pertencentes ao arcabouço dos 
conceitos fundamentais e tradicionais da AD. Cabe salientar que, embora os mesmos 
estejam sendo apresentados em tópicos segmentados e os analistas tendem a 
desenvolver suas análises, a partir de gestos que priorizam alguns desses componentes, 
embora todos são considerados no momento do desenvolvimento analítico, porque estão 
imbricados um no outro. Nessa articulação, acrescentamos, nesse momento, a Formação 
Ideológica (FI) e a Formação Discursiva (FD) para compor o quadro teórico da disciplina. 
Para iniciar, retomamos o assujeitamento do indivíduo para lembrar que é pela ideologia 
que ele é colocado na posição de um “sempre-já-sujeito” (PÉCHEUX, 2009, p. 140), pois 
essa posição ocorre por meio da interpelação da ideologia que, em outras palavras 
a 
“[...] consiste em fazer com que cada indivíduo (sem que 
ele tome consciência disso, mas, ao contrário, tenha a 
impressão de que é senhor de sua própria vontade) seja 
levado a ocupar seu lugar em um dos grupos ou classes 
de uma determinada formação social (BRANDÃO, 2004, p. 
47). 
q J 
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No entanto, para ocupar tais lugares determinados, sem ter consciência de que é 
constantemente interpelado a fazer isso naturalmente, é preciso que haja a reprodução 
dessa naturalização, garantida pelas instituições públicas, privadas, do terceiro setor 
(filantrópicas/ONGS) e quarto setor (organizações sem fins lucrativos e que tem por 
objetivo gerar impacto positivo). 
Momento que é preciso pensar por meio de Althusser (2008) para dizer que tais 
instituições são subdivididas em: 
Aparelhos Ideológicos de Estado (AIEs) 
Escola, igreja, associação de bairro, partido político, sindicatos, disseminadores de 
informações, etc). 
Aparelho Repressor do Estado (ARE) 
Forças armadas, polícias e prisões. 
A junção dos AIEs e do ARE garantem a reprodução das relações de produção, 
respectivamente, pela ideologia e pela repressão (não são estanques. Há ideologia no ARE 
e repressão sutil nos AlEs). Pêcheux (2009), a partir da releitura dessas concepções 
althusserianas, estabelece o todo complexo das formações ideológicas, a partir da 
seguinte tese sobre o sentido: 
“[...] o sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma 
proposição etc., não existe “em si mesmo” (isto é, em sua 
sua relação transparente com a literalidade do 
significante), mas, ao contrário, é determinado pelas 
posições ideológicas que estão em jogo no processo 
sócio-histórico no qual as palavras, expressões e 
proposições são produzidas, isto é, reproduzidas 
(PÉCHEUX, 2009, p. 146). 
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E o autor, nas suas elucubrações, reafirma a sua teoria, resumindo a mesma tese, 
repetindo que "[...] as palavras, expressões, proposições etc., mudam de sentido segundo 
as posições sustentadas por aqueles que as empregam” (PÉCHEUX, 2009, p. 146). Ou seja, 
tais posições, que são ocupadas pelos sujeitos que, ao serem conduzidos sem se darem 
conta, produzem sentido em referência às Fls. A base de compreensão da FI está em 
Pêcheux & Fuchs (1997), especificamente, quando afirmam que as relações de classes se 
caracterizam pelo afrontamento de posições no interior dos AIEs, que colocam em jogo, 
as práticas associadas aos lugares ocupados nas referidas posições que não 
caracterizam o jeito de ser de cada indivíduo. É a ideologia se materializando na 
explicação que chega à tese de que os indivíduos, interpelados em sujeitos, se organizam 
em formações que mantêm entre si tipos de relações de antagonismo, aliança ou 
dominação. 
É a partir desse momento, que os autores definem a FI como “[...] um conjunto complexo 
de atitudes e de representações que não são nem 'individuais' nem 'universais' mas se 
relacionam mais ou menos diretamente a posições de classes em conflito umas com as 
outras” (PÉCHEUX & FUCHS, 1997, p. 166). Momento em que se faz necessário afirmar que 
tais Fls comportam, como um de seus componentes, uma (ou várias) formações 
discursivas (FD) que se define como “[...] aquilo que, numa formação ideológica dada, isto 
é, a partir de uma posição dada numa conjuntura dada, determinada pelo estado de luta 
classes, determina o que pode e deve ser dito (articulado sob a forma de uma arenga, de 
um sermão, de um panfleto, de uma exposição, de um programa, etc) (PÉCHEUX, 2009, p. 
147). 
Voltemos com o intuito de afirmar que a FD intervêm na FI, ou seja, elas estão intricadas 
e, nesse caso, as palavras, expressões e proposições recebem o sentido da FD que se 
deriva das CP do discurso e que representa, na e pela linguagem, as Fls correspondentes. 
Por meio de Pêcheux (1997) é preciso mencionar, dentro de tais conceitos que são os 
centros das reflexões da AD, que a teoria discursiva não permaneceu estanque (e ainda 
continua em movimento mantendo o legado de Pêcheux de que é preciso ousar se 
revoltar) e, em se tratando de FD, não poderia deixar de salientar que ela não é um espaço 
estrutural fechado e homogêneo (e isso justifica as FDs no plural), ou seja, ela é invadida 
por elementos que vêm de outras FDs, fornecendo-lhes evidências discursivas pelo pré- 
construído, ou seja, “[...] “aquilo que todo mundo sabe” [...]" (PÉCHEUX, 2009, p. 158) e não 
questiona por ser universal e evidente em um contexto situacional. Em outras palavra é a 
matéria prima do sujeito que enuncia por meio de uma FD dominante e é nesse espaço 
que corresponde a "[...] 'um sempre-já-aí' da interpelação ideológica que fornece-impõe a 
'realidade' e seu 'sentido' sob a forma de universalidade (o 'mundo das coisas)” 
(PÉCHEUX, 2009, p. 151) que entraremos no campo de interdiscurso. 
E) atenção 
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A teoria da AD funciona por meio de um objeto de análise. Observe os 
enunciados: 
1) Sem-terras invadem fazenda usada em suposto esquema em Ribeirão. 
(jornal de grande circulação). 
2) Sem-terras ocupam área em Santa Catarina. (site do MST). 
Análise: Superficialmente os dois enunciados tratam da ação do MST. Porém 
os efeitos de sentidos produzidos são diferentes em “invadir” e “ocupar”. Nas 
CP do enunciado “invadem”, o sujeito, inconscientemente, é interpelado a 
ocupar uma posição que não se identifica com a FD (o que pode e deve ser 
dito) sobre o MST e produz um efeito que negativiza o movimento como 
invasores que atacam a propriedade privada.No segundo enunciado, o 
sujeito, por estar afetado pela FD do MST, pois escreve para o site e, 
portanto, pode e deve apoiá-lo, enuncia “ocupar”, produzindo um efeito de 
aceitação e defesa da ação do movimento, diante de áreas improdutivas, 
justificando a ação de ocupar (e não invadir). 
Fonte: Fernandes (2005), adaptado pelas autoras. 
INDICAÇÃO NA WEB 
Apresentação: para que você possa ampliar seus conhecimentos sobre a AD, 
sugerimos a Enciclopédia Audiovisual de AD. produzida pelo Laboratório Arquivos 
do Sujeito (LAS), sob a coordenação da Prof” Dr" Bethania Mariani, anexo à 
Universidade Federal Fluminense (UFF). 
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AULA 5: CONCEITOS FUNDAMENTAIS: INTERDISCURSO, 
INTRADISCURSO E MEMÓRIA DISCURSIVA 
Na reflexão desenvolvida sobre Fis e FDs, aprendemos que nas CP de um discurso e a 
partir da posição ocupada pelo sujeito que enuncia, a(s) FD(s) determinam o que esse 
sujeito pode e deve dizer e que ela apresenta em seu interior diferentes discursos. Fato 
que nos leva a pensar que toda FD “[...] circunscreve a zona do dizível legítimo definindo o 
conjunto dos enunciados possíveis de serem atualizados em uma dada enunciação a 
partir de um lugar determinado” (BRANDÃO, 2004, p. 93). É nessas possibilidades de 
entrelaçamento de diferentes discursos produzidos em torno de uma temática que entra 
o interdiscurso que, para a AD, significa a “presença de diferentes discursos, oriundos de 
diferentes lugares sociais, entrelaçados no interior de uma formação discursiva” 
(FERNANDES, 2005, p.61). 
Esses outros discursos que vão permeando o dizer do sujeito em uma posição dada, 
segundo Orlandi (2001 a) sinaliza que não somos donos do que estamos enunciando, ou 
seja, ele não é uma propriedade particular e sempre é retomado por meio de já-ditos em 
outro lugar e que vão sendo ressignificados nas CP e na FD que vai autorizar esse sujeito 
a dizer uma coisa (e não outra). Tais reflexões sobre o interdiscurso foram bebidas na 
fonte teórica de Michel Pêcheux, especificamente quando ele afirma que 
“f..] o próprio de toda formação discursiva é dissimular, 
na transparência do sentido que nela se forma, a 
objetividade material contraditória do interdiscurso, que 
determina essa formação discursiva como tal, 
objetividade material essa que reside no fato de que “algo 
fala” [.] sempre “antes em outro lugar e 
independentemente”, isto é sob a dominação do 
complexo das formações ideológicas (PÉCHEUX, 2009, p. 
149). 
NU J 
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Retomando Orlandi (2001 b), o interdiscurso está dentro do plano de constituição dos 
sentidos e se caracteriza como irrepresentável, mas capaz de calçar o que pode e deve 
ser dito por um sujeito determinado pelo social e pela história, pois é pelo/no 
interdiscurso que o sujeito é afetado pelo mundo e seus discursos, por meio de um plano 
de formulação dos sentidos, ou seja, pelo fio de um discurso interior apresentado pelo 
sujeito que, nesse caso, denomina-se intradiscurso. Dessa forma 
“[...] pode-se bem dizer que o intradiscurso, enquanto “fio 
do discurso” do sujeito, é a rigor, um efeito do 
interdiscurso sobre si mesmo, uma “interioridade” 
inteiramente determinada como tal “do exterior”. [...] 
diremos que a forma-sujeito (pela qual o “sujeito do 
discurso” se identifica com a formação discursiva que o 
constitui) tende a absorver-esquecer o interdiscurso no 
intradiscurso. 
[...] (PÉCHEUX, 2009, p. 154). 
A J 
O sujeito, dentro dos limites da FD que o domina, o que equivale a dizer que há sentidos 
que jamais poderão ser produzidos, se utiliza de uma rede de discursos disponíveis 
(interdiscurso sobre um determinado tema e o atualiza (intradiscurso) na sua formulação. 
Resumindo: o interdiscurso é a apropriação de discursos já-ditos sobre um determinado 
assunto e que se ressignificam como intradiscurso em sequências discursivas enunciados 
pelo sujeito, em uma FD determinada. Nesse ponto, nos valemos de Indursky (2011) para 
tratarmos da noção de repetibilidade como ponto de observação de que os discursos pré- 
existem ao discurso do sujeito que enuncia (intradiscurso) que. sob o efeito do 
esquecimento dessa pré-existência, pensa ser a origem do que está sendo dito, mas, 
como afirma Brandão (2004), ele está simplesmente retomando, redefinindo, 
reatualizando, transformando, ou mesmo, esquecendo, rompendo e denegando um já- 
dito. 
É nesse jogo discursivo em que a repetibilidade se efetiva que podemos trazer para a 
discussão, mais um conceito denominado como memória discursiva. Diante da 
complexidade da teoria discursiva, nos adiantamos, por meio de Pêcheux (1999) que não 
estamos tratando de uma memória individual e psicologista (lembrar ou recordar de 
alguém, por exemplo), mas de uma memória social que, na produção discursiva faz 
circular formulações alhures. 
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Dessa forma, a memória discursiva se configura “[...] face a um texto que surge como 
acontecimento a ler” sob uma ação de restabelecimento de “implícitos”, “remissões”, 
“elementos citados e relatados”, etc .E o autor diante dessa reflexão, lança um 
questionamento sobre onde localizar tais implícitos, uma vez que eles “estão presentes 
por sua ausência”, na leitura de uma sequência (PÉCHEUX, 1999, p. 52). 
É nesse processo, onde ocorrem diferentes funcionamentos discursivos de retomada/ 
repetição/regularização e efeitos de paráfrase que podem tanto manter o mesmo, como 
desmoroná-lo. A memória discursiva, diante de um acontecimento novo, se configura “[...] 
sob o 'mesmo” da materialidade da palavra abre-se então o jogo da metáfora, como outra 
possibilidade de articulação discursiva... Uma espécie de repetição vertical, em que 
própria memória esburaca-se, perfura-se antes de desdobrar- se em paráfrase” 
(PÊCHEUX, 1999, p. 53). O autor, apresenta a memória discursiva a partir da concepção de 
que ela não é plena e muito menos homogênea, como um espaço que se desdobra e se 
desloca, ou seja, não há memória sem exterior. 
QUADRO RESUMO 
Embora pareçam sinônimos, o interdiscurso e a memória discursiva são conceitos que 
se diferenciam. O interdiscurso significa tudo o que já foi dito sobre um determinado 
assunto, comportando todos os sentidos reunidos (Ex: tudo o que já foi dito sobre o 
tema “tortura”, durante o regime político militar brasileiro). A memória discursiva é a 
existência histórica de enunciados inscritos no interior de uma FD que produzem 
somente os sentidos autorizados ou esquecidos pela posição ocupada pelo sujeito 
(Ex: quem vai discursivizar sobre a “tortura” é um general que fez parte do exército 
ou um cidadão que se opôs ao regime, foi preso e torturado). O que eles estão 
autorizados a dizer e a não dizer? 
Fonte: Indursky (2011). Adaptado pelas autoras. 
APROFUNDANDO 
Abordaremos a respeito das condições de produção dos discursos: língua, formações 
imaginárias e interdiscurso. Pêcheux (1997, p. 83) elabora um esquema para explicar as 
formações imaginárias, a partir do modelo comunicativo de Roman Jakobson gue tem 
como propósito a transmissão de uma mensagem. 
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No entanto, Pêcheux propõe substituir a mensagem pelo discurso, afirmando não se 
tratar da transmissão de informação entre A e B mas, da produção de efeitos de sentidos 
entre Ae B. 
Observe o esquema apresentado no quadro: 
Figura 1 - Quadro das Formações Imaginárias 
Pa 
Expressão que des- Questão implícita suja «res- | 
igna as formações | Significação da expressão posta» subentende a formação 
imaginárias imaginária correspondente. 
Imagem do lugar de A parao | «Quem sou eu para lhe falar 
x ( la (A) sujeito colocado em À assim?» 
la (Bj Imagem do lugar de A parao | «Quem é ele para que eu lhe 
sujeito colocado em B fale assim» 
Imagem do lugar de B parao | «Quem sou eu para que ele me 
& ( lb (B) sujeito colocado em B fale assim?» 
Ib (A) Imagem do lugar de A parao | «Quem é ele paraque ele me 
sujeito colocado em B fale assim» 
A ( la (Rj «Ponto de vista» de A sobre R | «De que lhe falo assim» 
a ( Io (R) «Ponto de vista» de Bsobre R | «De que ele me fala assim» 
Fonte: Pêcheux (1997, p. 82) 
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O discurso, a partir do quadro de formações imaginárias, produz condições para o emissor 
antecipar as representações que faz dos receptores de seu discurso pelo mecanismo de 
antecipação, pois é por meio dele que se compreende quais são as formações imaginárias 
que estão em jogo, em um determinado texto e também qual é a relação estabelecidas 
com discursos anteriores, ou seja, com o interdiscurso.Os sentidos produzidos em um 
texto só poderão ser compreendidos quando desloca da análise do seu conteúdo e da 
visão de língua homogênea e transparente, pois essa, para a AD, é heterogênea e um 
mesmo conteúdo pode produzir diferentes efeitos de sentidos, conforme suas CP, ou 
seja, usamos a língua para produzir sentidos.No que concerne a textualidades 
contemporâneas como hashtags, por exemplo, percebemos que elas se constituem de 
diferentes materialidades, pois são textos híbridos que ocorrem a partir do imbricamento 
de diferentes materialidades significantes como imagens, escrita e sons. Outro fator que 
determina as CP das textualidades contemporâneas é o fato de serem digitais ou 
circularem na internet (em rede). 
Ao analisar a hashtags iilstoÉMachismo que circulou no Twitter e no Facebook, durante o 
processo de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, consideramos que ela funcionou 
como resposta aos discursos machistas muitas vezes naturalizados em capas.Um 
exemplo foi da revista semanal brasileira IstoÉ, cuja edição de 2 de abril de 2016, trazia 
em sua capa, uma imagem “enfurecida” de Dilma com o seguinte título: “As explosões 
nervosas da presidente” e, no seu interior, a matéria referente à capa era intitulada “Uma 
presidente fora de si”. Ao observar as CP imediatas da produção/circulação da hashtag 
ttlstoÉMachismo, observamos que a mesma foi produzida no mesmo dia do lançamento 
da revista, como forma de reação contrária à publicação que orienta para um sentido de 
que a Presidenta estaria perdendo o controle, na dimensão psicológica mesmo, diante da 
instalação de um processo de impeachment contra ela. 
Pensando as relações imaginárias pelas CP sócio-histórica e ideológicas: a imagem que A 
(IstoÉ) faz de B (leitor) é a imagem que a revista atribui a seus leitores e qual a imagem 
ela considera que seus leitores atribuem ao referente, no caso, Dilma Rousseff e, nesse 
caso, por se tratar de um veículo de imprensa, destinado a “informar”, o foco recai no 
referente, sendo importante compreender os lugares de A e B na sua relação com o 
processo de antecipação.Portanto, no jogo de formações imaginárias o elemento 
dominante não recai sobre o emissor ou o receptor, mas sim sobre o referente, ou seja, A 
antecipa a imagem que B faz de R decidindo “de que lhe fala assim”. Desse modo, À opera 
com uma antecipação da imagem de B e da imagem que B faz de R, o que lhe permite 
falar assim de R (no caso de Dilma Rousseff).A relação com o interdiscurso está no fato de 
o discurso da psicologia, psiquiatria, atravessar o discurso jornalístico, pois no nível da 
formulação o sujeito escolhe operar com o discurso médico com vistas a produzir uma 
análise das condições psicológicas de Dilma, usando um discurso de autoridade, por meio 
de uma evidência produzida no texto, ou seja, de que “todo mundo sabe que Dilma 
Rousseff está descontrolada”. 
É na hashtag *lstoÉMachismo e nas CP de textos digitais em rede que se operam com o 
excesso da sua circulação, atingindo não só os supostos leitores da revista IstoÉ, mas 
também uma gama heterogênea de sujeitos que vão produzir outras relações imaginárias, 
de modo que a imagem construída para Dilma Roussef, sofrerá deslizamentos de sentidos 
e dará, ao mesmo tempo, uma imagem da revista materializada na hashtag 
fiIstoÉMachismo. 
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E-Book - Apostila 
PÊCHEUX, Michel; FUCHS, Catherine. A propósito da análise automática do discurso: 
atualização e perspectivas In: GADET, Françoise; HAK, Tony (Orgs.). Por uma análise 
automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Tradução de Bethânia 
S. Mariani et tal. 3. ed., Campinas: Editora da Unicamp, 1997, p. 159-250. 
Novos Desafios 
Faremos agora um retorno pelo percurso que desenvolvemos com o objetivo de situar 
você e também motivá-lo a um mergulho um pouco mais profundo sobre este campo de 
saber que tem como objetivo refletir sobre os acontecimentos sociais, por meio do 
discurso. Afinal, como o grande mestre Michel Pêcheux deixou no seu legado teórico, as 
mesmas palavras e expressões podem ter o mesmo (ou outros) sentido(s), haja vista tudo 
vai depender da posição-sujeito daquele que enuncia. Sendo assim, precisamos investir 
em uma relação menos ingênua com a língua e seus desdobramentos/funcionamentos 
nas nossas relações sociais para compreendermos além que está exposto e por vieses já 
cristalizados que induzem a interpretar de uma forma única, geralmente com o intuito 
manter as coisas devidamente encaixadas.Por isso, reiteramos a importância do acesso à 
teoria da AD para que sejamos capazes de sair do mesmo, mediante outros gestos de 
escuta e leitura, amparados por dispositivos teóricos específicos. Por isso, na aula 1, 
apresentamos a você a base de fundação da teoria no turbulento contexto francês da 
década de 60 e seus principais teóricos, especialmente, o inquieto filósofo e apaixonado 
por máquinas e questões da língua Michel Pêcheux. Inquietude que atingiu também 
pesquisadores brasileiros que se interessaram pela AD, como a linguista Eni Orlandi e 
tantos outros não mediram esforços para deixarem suas marcas, apesar de um regime 
que calava a voz daqueles que ousavam se manifestar. 
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E-Book - Apostila 
E assim prosseguimos, estabelecendo recortes para atender aos limites de páginas pré- 
determinadas, tal como fizemos na aula 2, ao abordar como a língua é teorizada na AD, ou 
seja, com a qualidade (e não defeito) de não ser transparente, pois é na sua opacidade 
que o (des)limite é ultrapassado, em dobraduras que a fazem funcionar produzindo 
sentidos entre os locutores e para sermos analistas competentes é preciso ousar pelas 
trilhas teóricas da AD e refl etir, assim como ocorreu na aula 3, sobre conceitos fundantes 
como as CP, para entender que os fatos ocorrem sempre mediados por questões histórica 
e sociais (e não sem motivo) que nos obriga a compreender, atrelados ao lugares (não 
físicos) compreendido pelas Fls que o indivíduo (sempre, mas não sem resistência) 
interpelado em sujeito do seu discurso deve ocupar, ao enunciar palavras sempre fi liado 
a um conjunto de FDs que, projetada pela FI dadas, vão determinar o que ele pode e deve 
dizer, conforme estudamos na aula 4.Mas o discurso vai além do que enunciamos aqui e 
agora, por meio de uma posição-sujeito subordinada às CP e FDs, pois dentro desse 
quadro básico fundante que alicerça a teoria do discurso, há também o interdiscurso, 
conforme vimos na aula 5, que signifi ca um conjunto de dizeres já ditos anteriormente, 
sobre um determinado tema como, por exemplo, violência e suas causas e 
consequências. Diante desse tema, coloca-se tudo o que já foi dito na pauta, mas é o 
sujeito que vai elencar, no intradiscurso (na sua formulação), conforme a sua posição e a 
FD que o domina o que vai ser por ele repetido ou mesmo esquecido e é nessa 
repetibilidade que a memória discursiva atua e se confi rma na fato de que todo dizer já 
foi dito. 
VAMOS PRATICAR? 
Chegou o momento de testar o conhecimento adquirido até aqui! Para isso, por favor, 
participe da autoatividade que preparamos especialmente para você. São apenas 4 
questões 
4. A Análise de Discurso (AD) é uma 
disciplina que se originou a partir de 
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uma relaçãoconsiderada como de 
entremeio e tem o discurso como seu 
objeto de análise. Sobre os aspectos 
fundantes da AD, assinale a alternativa 
correta. 
a) A A D é uma disciplina que se originou no contexto social e 
histórico francês da década de 60, do século passado, a partir de 
um grupo de pesquisadores entre os quais, apresentamos Michel 
Pêcheux. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
b) A obra denominada Análise Automática do Discurso, de 1969 
(AAD/69) de Michel Pêcheux, tinha como propósito implementar 
análises de texto, a partir de uma metodologia conteúdista. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
c) Diante de um texto, perguntas como: “que quer dizer este 
texto?"“que significação contém este texto?” e “em que o sentido 
deste texto difere daquele outro texto?” são elementares para se 
fazer uma análise discursiva. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
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d) Afirmar que a AD é uma disciplina de entremeio significa que ela 
O se estabelece a partir de uma relação crítica com outras disciplinas, 
entre as quais, as mais importantes são: matemática, gastronomia 
e oceanografia. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
e) A À D também é estudada no Brasil e a entrada da teoria no país 
(e) ocorreu no início da década de 70, em plena ditadura militar, por 
meio da promulgação do Ato Institucional 5 (Al-5) do General Costa 
e Silva. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
2. À AD é uma disciplina que se 
configura por meio de pressupostos 
teóricos e fundantes específicos e é 
por deles que o analista desenvolve 
seu gesto de análise ao se utilizar de 
uma metalinguagem específica da 
teoria discursiva. Leia as assertivas e 
assinale a alternativa correta que se 
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refere tanto aos pressupostos 
teóricos, quanto aos conceitos 
fundantes. 
i Michel Pêcheux elege a língua como um componente 
essencial da teoria discursiva, concebendo-a como 
uma base de funcionamento que vai além dela 
mesma, por ser afetada pela incompletude e 
exterioridade. 
il As CP, por ser um conceito fundamental para a AD, 
vai além da mera situação/circunstância 
propriamente dita a partir, da inclusão de aspectos 
sociais, históricos e ideológicos no processo de 
análise. 
iii Pensar sobre as formações imaginárias significa 
ultrapassar os lugares físicos ocupados por locutores 
para chegar a lugares discursivos ocupados pelo 
mesmo indivíduo que ora é professor, ora é pai ou, até 
mesmo, aluno. 
iv. Um analista de discurso somente desenvolve 
pesquisas a partir de um indivíduo consciente e dono 
do seu dizer, ou seja, pessoas com deficiência mental 
são desconsideradas da teoria discursiva. 
(a) a) As assertivas |, Il, Ill e IV estão corretas. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
Q b) As assertivas |, Il e Ill estão corretas. 
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Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
c) As assertivas Il, Ille IV estão corretas. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
d) As assertivas | e Il estão corretas. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
e) As assertivas Ill e IV estão corretas. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
3. Pêcheux (2009, p. 147) ao afirmar 
que a Formação discursiva (FD) é “[...] 
aquilo que numa formação ideológica 
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dada, isto é, a partir de uma posição 
dada numa conjuntura dada, 
determinada pelo estado de luta de 
classes, determina o que pode e deve 
ser dito (articulado sob a forma de uma 
arenga, de um sermão, de um panfleto, 
de uma exposição, de um programa 
etc”, apresenta uma das ferramentas 
de análise que compõem os conceitos 
fundamentais da AD. Sobre a FD e seus 
efeitos em uma análise, leia as 
assertivas, observe se é verdadeira ou 
falsa e assinale a alternativa correta. 
i Já que a FD determina o que pode e deve dizer. 
podemos afirmar que um indivíduo, em uma posição- 
sujeito de religioso e afetado pela FD religiosa que 
defende a vida em qualquer circunstância, não pode 
defender o aborto diante dos fiéis adeptos de sua 
religião. 
il Já que a FD determina o que pode e deve dizer, 
podemos afirmar que um indivíduo, em uma posição- 
sujeito de professor e afetado pela responsabilidade 
de ensinar todo o conteúdo do currículo pode 
incentivar os alunos a faltarem às aulas e não 
estudarem para prova. 
iii A firmar que uma Fl comporta uma ou várias FD(s), 
compreende-se que o sujeito ao discursivizar sobre 
um tema vai produzindo efeitos de sentidos que não 
se pautam somente uma FD, pois ela é invadida por 
outros discursos que justificam sua heterogeneidade. 
iv. Quando um membro do MST diz que vai invadir uma 
área de terra com plantação de soja, por ela ser 
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extensa e pertencente a um único dono, é cabível 
uma análise que se justifica no fato de que o sujeito 
está posicionado e afetado por uma FD favorável ao 
movimento. 
(a) a) As assertivas | e Il são verdadeiras e as Ille IV são falsas. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
Q b) As assertivas |, Il são falsas e as Ille IV são verdadeiras. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
OQ c) As assertivas | e Ill são verdadeiras e as Ile IV são falsas. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
OQ d) As assertivas | e IV são falsas e as Ile Ill são verdadeiras. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
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5) e) As assertivas |, Ile Ill são falsas e a IV é verdadeira. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
4. O analista de discurso ao 
desenvolver uma análise amparada 
pelo conceito fundamental da memória 
discursiva, precisa antes estabelecer 
diferenças conceituais e de efeito 
prático entre interdiscurso e memória. 
Sobre os dois conceitos apresentados, 
bem como, suas diferenças e 
similaridade, leia as assertivas, 
complete as lacunas e assinale a 
alternativa correta. 
i 0/a ln pode ser considerado/a 
como um mecanismo de análise da AD que significa 
um conjunto de enunciados possíveis (já-ditos) que 
podem ser atualizado/as. 
ii D izer que algo sempre fala em outro lugar e 
independentemente é uma característica do/da 
-000-—-—nnn———— que se confi gura para a AD 
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como algo irrepresentável. 
lil 2. no processo de análise 
significa retomar, ressignificar ou mesmo esquecer e 
apagar dizeres já-ditos no interior de uma FD que vai 
determinar a posição-sujeito. 
iv. Um a das características da memória discursiva é que 
elanãoé 
(a) a) Interdiscurso, interdiscursiva, memória discursiva, heterogênea. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
[b) b) Memória discursiva, interdiscursiva, memória discursiva, 
homogênea. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
[C) c) Interdiscurso, memória discursiva, memória discursiva, 
homogênea. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
OQ d) Interdiscurso, interdiscursiva, memória discursiva, homogênea. 
32-140
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Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
(e) €) Interdiscurso, memória discursiva, memória discursiva, 
heterogênea. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
REFERÊNCIAS 
ALTHUSSER, Louis. Sobre a reprodução. Tradução Guilherme João de Freitas Teixeira. 2. 
ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. 
BRANDÃO, Helena Hathsue Nagamine. Introdução à análise do discurso. 2º ed. rev. 
Campinas, Editora da Unicamp, 2004. 
FERNANDES, Claudemar Alves. Análise do Discurso: refil exões introdutórias. Goiânia: 
trilhas urbanas, 2005. 
GADET, Françoise; LÉON, Jacqueline; MALDIDIER, Denise; PLON, Michel. Apresentação da 
conjuntura em linguística, em psicanálise e em informática aplicada ao estudo do texto na 
França, em 1969. In: GADET, Françoise; HAK, Tony (Orgs.). Por uma análise automática 
do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Tradução de Bethânia S. Mariani 
et tal. 3. ed., Campinas:Editora da Unicamp, 2010, p. 39-58 
HENRY, Paul. Os fundamentos teóricos da “análise automática do discurso” de Michel 
Pêcheux (1969). In: GADET, Françoise; HAK, Tony (Orgs.). Por uma análise automática do 
discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Tradução de Bethânia S. Mariani et 
tal. 3. ed.. Campinas: Editora da Unicamp, 2010, p. 11-38 
INDURSKY, Freda. A memória na cena do discurso. In: INDURSKY, Freda; MITTMANN, 
Solange; FERREIRA, Maria Cristina Leandro (Orgs.). Memória e história na/da análise do 
discurso. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2011, p. 67-89. 
ADRIANO. Juliana. Sem Terra ocupam área em Santa Catarina. 
Disponível em: <http:/www.mst.org.br/2017/05/21/sem-terra-ocupam-area-em-santa-c 
atarina.html.> Acesso em 26 maio 2017. 
MALDIDIER, Denise. A inquietação do discurso: ler Michel Pêcheux hoje. Tradução de Eni 
Puccinelli Orlandi. Campinas, SP: Pontes, 20083. 
33-140
E-Book - Apostila 
ORLANDI, Eni P. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólica Petrópolis, 
RJ: Vozes, 1996. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de Discurso: princípios & procedimentos. Campinas, SP: 
Pontes, 2001a. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Discurso e texto: formação e circulação de sentidos. Campinas: 
Pontes, 2001b. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Interpretação, autoria, leitura e efeitos do trabalho 
simbólico. 5. ed.. Campinas, SP: Pontes, 2007. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Nota à edição brasileira, uma questão de coragem: a coragem da 
questão. In: PÉCHEUX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afi rmação do óbvio. 
Tradução de Eni Pulcinelli Orlandi... et tal. 4º. Ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2009, p. 
7-8. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Língua brasileira e outras histórias: discurso sobra a língua e o 
ensino no Brasil. Campinas, SP: Editora RG, 2009. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Discurso em análise: sujeito, sentido e ideologia. Campinas, SP: 
Pontes, 2012. 
PÊCHEUX, Michel; FUCHS, Catherine. A propósito da análise automática do discurso: 
atualização e perspectivas In: GADET, Françoise; HAK, Tony (Orgs.). Por uma análise 
automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Tradução de 
Bethânia S. Mariani et tal. 3. ed., Campinas: Editora da Unicamp, 1997, p. 159-250. 
PÊCHEUX, Michel. Análise automática do discurso (AAD-69). In: GADET, Françoise; HAK, 
Tony (Orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel 
Pêcheux. Tradução de Bethânia S. Mariani et tal. 3. ed., Campinas: Editora da Unicamp, 
1997, p. 159-250. 
PÊCHEUX, Michel. Papel da memória. ACHARD, Pierre et tal. Papel da memória. Traduzido 
por José Horta Nunes. Campinas, SP: Pontes, 1999, p. 49-57. 
PÊCHEUKX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Tradução de 
Eni Pulcinelli Orlandi... et tal. 4º. Ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2009. 
PÊCHEUKX, Michel. Análise automática do discurso (AAD-69). In: GADET, Françoise; HAK, 
Tony (Orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel 
Pêcheux. Tradução de Bethânia S. Mariani et tal. 3. ed., Campinas: Editora da Unicamp, 
2010, p. 59-158. 
TOLEDO, Marcelo. Sem-terra invadem fazenda usada em suposto esquema em 
Ribeirão. 
Disponível em: < http:/www1.folha.uol.com.br/poder/2017/02/1861690-sem-terra-invad 
em-fazenda-usada-em-esquema-de-corrupcao-em-ribeirao.shtml>. Acesso em 26 maio 
2017. 
DISCURSO E TEXTO 
34 - 140
E-Book - Apostila 
Inicie sua Jornada 
Olá, prezado(a) aluno(a), 
Neste estudo, iremos tratar de uma questão que permeia a nossa vida em sociedade, ou 
seja, o discurso e o texto enquanto componentes da teoria da linguística denominada AD 
que, por meio de teóricos da área, darão subsídios para você iniciar um percurso científico 
pelos estudos do texto para além do senso comum e, por isso, precisamos desvendar os 
mistérios que serão estudados em quatro aulas. 
A primeira aula - texto e discurso - irá situar você sobre como o texto é teorizado sob 
uma concepção teórica que coloca em xeque o tradicional tripé que sustenta a produção 
textual por meio de um começo, um meio e um fim. Para tanto, utilizaremos dos conceitos 
básicos e elementares da AD que dão sustentação teórica para se pensar o texto como 
discurso. 
Na segunda aula - produção textual - desenvolvemos uma reflexão sobre o modo como o 
texto é produzido por um indivíduo que ao ocupar a posição sujeito-autor, somente 
produzirá um texto mediado pelas CP em que o mesmo deverá ser produzido, conforme a 
FD que determina o que ele pode e deve escrever. 
Na terceira aula - texto e textualização -, à luz da AD, voltaremos a refletir sobre o texto 
enquanto um componente que une os discursos sobre um determinado tema e a 
textualização que é o processo de unificação de um conjunto de discursos a ser 
“costurado” pelo sujeito-autor. 
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Na quarta aula - a ordem do discurso e a organização textual - iremos discutir com você 
sobre os dizeres que são autorizados a serem ditos ou escritos ou mesmo interditados por 
um sujeito-autor que, conforme sua posição e a FD a que está filiado, será determinado a 
enunciar ou silenciar os discursos dispersos que serão “unificados” pelo efeito de 
organização. 
Convidamos você aluno(a), a iniciar a leitura desta aula e esperamos que ela seja bastante 
proveitosa e que atinja o objetivo proposto, bem como, seja capaz de instigar e provocar 
você a aceitar o desafio de continuar refletindo sobre e por meio dessa corrente teórica 
denominada AD. 
Sucesso e bons estudos! 
Desenvolva seu Potencial 
Na unidade |, você teve acesso aos conceitos teóricos básicos que norteiam as pesquisas 
da AD de linha francesa e, diante das infinitas possibilidades que os acontecimentos 
sociais nos oferecem como ferramentas de análise, esta aula se dedica à compreensão 
reflexiva do texto, pois este, nesta concepção teórica e por intermédio de Orlandi (1996) 
deve ser pensado como algo multidimensional que, na sua materialidade, não se define 
como uma superfície plana e uma espécie de chapa linear. 
Mas antes, é preciso retomar Pêcheux (1997), especificamente sua afirmação de que os 
estudos anteriores ao desenvolvimento da ciência lingúística, cuja origem é marcada com 
o Curso de Lingúística Geral, de Ferdinand de Saussure, estudavam a língua por meio de 
textos e gramáticas. Atualmente, não há muitas diferenças, quanto aos instrumentos de 
estudos, a não ser no modo como são norteadas as perguntas de análise, pois se 
pensarmos a língua pela análise de conteúdo, as perguntas a serem feitas são: 
a. De que fala este texto”; 
b. Quais são as idéias principais contidas neste texto”: 
c. Este texto está em conformidade com as normas da língua na qual ele se 
apresenta?; 
Ou 
a. Oqueo autor quis dizer?. 
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Tais perguntas são um ponto de crítica do autor para iniciar uma reflexão sobre o texto, a 
partir da teoria discursiva, pois o que tínhamos sobre os estudos da língua era um meio a 
serviço de um fim, a saber, a compreensão do texto. No entanto, foi por meio das 
reflexões de Saussure que a língua passa a ser pensada como sistema, deixa de ser 
compreendida como portadora da função de exprimir sentido para ser o objeto o qual a 
ciência pode descrever ofuncionamento (metáfora do jogo de xadrez). As 
consequências desse deslocamento é de suma importância para os estudos linguísticos, 
na conjuntura histórica e social do início do século XX, mas deixou a descoberto algumas 
questões relevantes que não passaram despercebidas por Pêcheux. 
Nesta perspectiva teórica, o texto é um bólido de sentidos que parte em inúmeras 
direções, em múltiplos planos significantes, sendo, pois a partir dessa concepção que 
começamos a ressignificar nosso conhecimento prévio sobre o texto. Dessa forma, pensar 
em originalidade diante de qualquer texto, em suas múltiplas formas (imagético, sonoro, 
verbal, etc) é mera ficção, pois ele é peça resultantedo compromisso das diferentes 
posições sujeitos e FDs que, no dizer do autor, não pode tomar qualquer direção, pois há 
um regime de necessidade a ser obedecida, vindo da exterioridade. Esta se compreende 
pelo fato de que todo discurso remete a um outro discurso e os sentidos são sempre 
referidos a outros sentidos (conforme estudamos na unidade |, sobre o primado do 
interdiscurso e memória discursiva). 
Exterioridade que em Pêcheux (2009) reside no fato de que algo sempre fala antes, em 
outro lugar e independentemente, colocando em xeque a originalidade e singularidade da 
produção textual, bem como, apresentando-o como um mosaico (ou rede) de discursos 
que se imbricam sob a determinação de um escritor-autor. 
Esta concepção ressignifica (ou mesmo anula) o que temos já dado como pressuposto em 
relação ao texto, pois 
“[...] do ponto de vista de sua apresentação empírica, é 
um objeto com começo, meio e fim, mas que, se o 
considerarmos como discurso, reinstala-se 
imediatamente sua incompletude. [...] o texto, visto na 
perspectiva do discurso, não é uma unidade fechada - 
embora como unidade de análise. ele possa ser 
considerado uma unidade inteira - pois ele tem relação 
com outros textos (existentes, possíveis ou imaginários), 
com suas condições de produção (os sujeitos e a 
situação), com o que chamamos sua exterioridade 
constitutiva (o interdiscurso: a memória do dizer 
(ORLANDI, 2007, p. 54). 
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Essa concepção que marca o texto como heterogeneidade (e não como homogeneidade) 
é interpretada pela autora como atravessado por várias FDs e necessitam ser 
compreendidos pelo leitor (mesmo sem ter essa noção de forma explícita) no que se 
refere ao seu funcionamento, bem como, o modo como os sentidos são produzidos. Nessa 
perspectiva, não se interessa pela organização do texto, mas o que ele se organiza, na 
sua heterogeneidade constitutiva, pela natureza da sua materialidade - imagem, grafia, 
som - e das linguagens - oral, escrita, científica, literária, descritiva, etc -, nas diferentes 
posições dos sujeitos (aqui, um sujeito-autor). 
É por essas premissas que, no processo de produção textual, não produz somente um 
discurso, mas vários, por meio das diversas FDs que compõem o texto como uma unidade 
que permite ao analista, o acesso ao discurso, por meio das trilhas (ou pistas) que o 
materializa na sua estruturação. Em outras palavras 
O texto [.] é a unidade de análise afetada pelas 
condições de produção. [...] é o lugar da relação com a 
representação física da linguagem: onde ela é som, letra, 
espaço, dimensão direcionada, tamanho. É o material 
bruto (ORLANDI, 2007, p. 60). 
QUADRO RESUMO 
Paula, uma aluna sabida, fez a seguinte pergunta ao professor Joel: - Paula: que 
autor é esse que a Análise de Discurso teoriza ? - Professor Joel: autor é uma das 
posições assumidas pelo sujeito no discurso, afetada pela exterioridade, ou seja, 
pelas condições sociais, históricas e ideológicas e pelas exigências de coerência, 
não-contradição e responsabilidade. O autor assume a função social de organizar e 
assinar uma determinada produção escrita, dando-lhe aparência de unicidade. 
Fonte: Ferreira, 2001. Adaptado pelas autoras. 
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O texto é o material bruto a ser lapidado pelo analista que não o considera ponto de 
partida e, muito menos, como ponto de chegada, pois quando se pensa o texto pela via da 
AD, não há como detectar sua origem, seu fim e sua unidade definitiva. Essa concepção 
lógica do texto que o dimensiona e o regula é desconsiderada pela teoria da AD que o 
ressignifica enquanto lugar que a língua funciona sem apego às questões sobre sua 
originalidade e unidade definitiva. Como diz a autora, em uma ordem prática 
N 
“[...] não é sobre o texto que falará o analista, mas sobre o 
discurso. Uma vez atingido o processo discursivo que é o 
que faz o texto significar, o texto ou os textos particulares 
analisados desaparecem como referências específicas 
para dar lugar à compreensão de todo um processo 
discursivo do qual eles - e outros que nem mesmo 
conhecemos - são parte (ORLANDI, 2007, p. 61) 
Nu J 
Nesse sentido, a AD direciona o analista a refletir sobre o texto, enquanto algo queproduz 
sentidos a partir de uma exterioridade que se inscreve refletido nele mesmo, ou seja, é o 
próprio texto que produz as pistas discursivas constitutivas na sua materialidade, 
diferentemente da tarefa de análise conteudista que se situa a análise a partir de “[...] 
algo lá fora” (idem, p. 55). Por isso a pergunta que norteia o analista do discurso em seu 
trabalho é “como esse texto se significa?”. 
Questionamento que refletirá a historicidade do texto em sua materialidade que, no dizer 
de Orlandi (2001) é o acontecimento do texto como discurso, ou seja, o trabalho dos 
sentido nele, ou seja, filiação teórica da AD, o texto não é definido pela sua extensão, pois 
tanto pode ter uma única letra ou mesmo várias palavras, enunciados, páginas, etc, pois 
segundo a autora a vogal “O” escrita em uma porta e a vogal “A” escrita em outra porta, 
em um estabelecimento público como um bar. uma salão de eventos, etc apresenta uma 
unidade de sentido para a situação específica, vindo a significar 
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“f.] em nossa memória, o fato de que em nossa 
sociedade, em nossa história, a distinção 
masculino/feminino é significativa e é praticada 
socialmente até para distinguir lugares próprios (e 
impróprios...) Por isso esse “O” tem seu sentido: tem sua 
historicidade, resulta em um trabalho de interpretação 
(ORLANDI, 20014, p. 69). 
NU J 
A afirmação da autora é um indício de que a AD atua em regiões menos visíveis e menos 
óbvias do texto, mas relevantes para aqueles que refletem sobre a sociedade e suas 
nuances, por meio dos vestígios deixados na composição textual, enquanto unidade de 
análise que vai além do dado linguístico com suas marcas e organização. Tais concepções 
nos remete à compreensão de que olhar o texto como discurso, significa que ele não se 
fecha e que está relacionado com as FDs e estas com a ideologia, valendo a orientação da 
autora de que a AD “[...] não está interessada no texto em si como objeto final de sua 
explicação, mas como unidade que lhe permite ter acesso ao discurso” (idem, p. 72). Esse 
é o percurso que o analista deve percorrer, buscando as CP dos sons, das letras, dos 
espaços, das dimensões do texto e buscar compreender como os sentidos são 
produzidos. 
O) 
SAIBA MAIS 
Agora que você já sabe que o texto é um conjunto de discursos que se juntam 
pelas mãos de um sujeito-autor, vale a pena ler um pouco mais para saber como 
se configura a produção textual, por meio da teoria discursiva e alguns modelos 
de análises. Sugerimos a leitura da obra “Cidade dos Sentidos”, da prof” Eni 
Puccinelli Orlandi, publicado em 2004, pela Editora Pontes. Trata-se de uma obra 
importante, pois ela considera várias materialidades como texto: poesia, música, 
narrativa, pichação, grafite, entrevista, tatuagem, a (des)organização urbana, 
etc. 
Fonte: elaborado pelas autoras. 
N J 
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PRODUÇÃO TEXTUAL 
Iniciamos nossa reflexão pensando nas diversas condições de produção em que um texto 
pode ser produzido: publicidade, campanha política, agradar ou ofender alguém, rir ou 
chorar por meio de uma poesia, atender aos requisitos da instituição escolar, a tatuagem, 
o grafite, o canto, a dança, etc. Enfim, independente da situação, estamos sempre 
produzindo texto e é por conta disso que iremos traçar um percurso de compreensão 
sobre os mecanismos da sua produção, a partir de reflexões concebidas pela AD. Já que o 
texto pode ser metaforicamente compreendido como um mosaico de pequenas peças 
(neste caso, palavras, sons, imagens, gestos) que se juntam, vão produzindo sentidos e 
estão em constante movimento, precisamos retomar alguns conceitos da AD,apresentados na unidade |, e aplicá-los na construção de um texto. 
Estamos pensando no texto enquanto materialidade discursiva produzida por um 
indivíduo interpelado em sujeito pela ideologia (PÉCHEUX. 2009) que. diante das 
condições de produção e a posição autor ocupada por ele, produz “seu” texto nos 
(des)limites das FDs, ultrapassando fronteiras delimitadas, dentro do quadro fixo que 
compõe as regras já postas para se produzi-lo. Concepção que significa o deslocamento 
de um pré-construído cristalizados nas aulas tradicionais de produção textual de que 
todos sabem o que é um texto pelo fato de o mesmo fazer parte da nossa vida cotidiana e 
acadêmica. 
Por isso, ao pensar sobre o processo de produção textual por este viés teórico temos que 
refletir sobre esse sujeito discursivo designado como um sempre já sujeito que se tenta 
ocultar na evidência do dever a ser cumprido, diante do empreendimento de produção 
textual, pois, nessa concepção, o indivíduo não é o senhor da sua morada (neste caso: 
não é o senhor do seu texto), mas aquele que ocupa posições de reprodutor de vários 
discursos que vão sendo costurados, ou mesmo amarrados em pequenos nós, 
metaforicamente comparado a uma rede, na tentativa de formar um todo e cumprir com o 
objetivo proposto (ensinar, convencer, criticar, elogiar, etc). 
Como afirma Gallo (1995), embora se pense o texto limitado a um começo, meio e fim, o 
sentido depende de quem escreve (posição sujeito-autor) e de quem lê (posição sujeito- 
leitor). justificando a premissa de que jamais se pode considerar um texto como de 
direção e efeito único (sentidos previsíveis). Há uma mão dupla, um vai-e-vem 
ininterruptos que, na maioria da vezes, a escola esquece de trabalhar (qual o efeito desse 
esquecimento?), pois as aulas de produção textual estão baseadas na premissa 
conteudista direcionadas pela pergunta “o que o autor quis dizer” e na tentativa de 
expressar ideias e pensamentos deste autor, sem o posicionamento crítico daquele que 
lê. Devemos ir além disso, pois como afirma Lagazzi (2006, p. 85) essa concepção de 
produção textual dos anos 60 e 70 do século XX já não satisfaz aqueles que, afetado, 
pelos movimentos da conjuntura social, começa a pensar o texto “[...] como um espaço de 
possibilidades relacionais” e a escrita “[...] como um processo envolvendo a sociedade”. 
Então, se faz necessário rever conceitos, pois a língua, na concepção teórica discursiva, 
vai além de um sistema que a concebe por ela mesma e nela mesma, ou seja, ela é opaca 
e, na sua incompletude e equivocidade, sempre escapa de efeitos postos e cristalizados. 
Na visão da autora, este aspecto é fundamental para pensarmos esse sujeito que escreve, 
ao ser interpelado como autor, pois é na sua relação com a língua colocada em 
funcionamento no momento da produção textual que a AD 
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N 
“[..] recusa a relação direta e natural entre forma e 
conteúdo, recusa a oposição entre denotação e 
conotação. [...]. Essa abordagem da língua não vai 
privilegiar a informação ou o conteúdo, e nem vai 
considerar que o que se quer dizer já está estabelecido 
antes de ser formulado (LAGAZZI, 2006, p. 88). 
J 
Esse gesto de se conceber a produção textual que começa a vigorar a partir da década de 
60, do século passado, denomina-se como abordagem materialista do texto, justamente 
porque se compreende a língua a partir da materialidade que vai se configurando no 
momento da sua produção. É nesse ponto que retomamos a concepção foucaultiana para 
pensarmos a escrita enquanto uma regularidade que “[...] está sempre a ser 
experimentada nos seus limites, estando ao mesmo tempo sempre em vias de ser 
transgredida e invertida; a escrita desdobra-se como um jogo que vai infalivelmente para 
além das suas regras, desse modo as extravasando” (FOUCAULT, 1977, p. 35). 
A possibilidade que a AD consegue subsidiar por meio de suas reflexões teóricas, abre um 
campo para tecermos críticas sobre a produção textual na escola que mantém o campo 
fértil para a colheita do sentido único, direcionado pelo professores assujeitados 
ideologicamente pelo imaginário escolar que mantém um caminho baseado na direção 
unívoca, de mão única. É preciso ressignificar essa condição produzida no chão da escola 
por meio de uma reflexão teórica e prática que passe longe do senso comum. 
Indursky (2006), ao questionar se o texto pode ser simplesmente definido como uma 
soma de frases, abre possibilidades para pensarmos pelo viés teórico da AD que nos 
possibilita ultrapassar tais limites pelas noções de sujeito, autor, CP, ideologia, sentido, 
FD e os demais componentes fundantes da AD. Em posse de tais conceitos podemos ir 
além da frase, pois segundo ela 
a língua não se constitui de palavras ou de frases 
independentes, maos em discurso contínuo, seja ele um 
enunciado constituído de apenas uma palavra, ou uma 
obra de dez volumes, um monólogo ou uma discussão 
política (HARRIS, 1963, apud INDURSKY, 2006, p. 67). 
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Segundo a autora, é nesse ponto que ocorre um deslocamento da concepção saussuriana 
de língua enquanto componente enclausurado em um sistema, pois percebe-se que os 
aspectos sociais, históricos e culturais passam a fazer parte do texto que, ao considerar 
suas condições de produção, se transforma em discurso, ultrapassando seus elementos 
internos, mobilizando sua exterioridade e seus sujeitos- autores afetados pelo 
inconsciente e historicamente identificados às FDs. Sobre isso cabe ressaltar que há 
dizeres que regem a escrita desse sujeito que, na posição de autor, é considerado 
descentrado e 
" 
age sob a ilusão de estar na origem de seu dizer, mas que 
de fato, precisa imergir no interdiscurso para poder dizer, 
pois aí reside o repetível, a memória discursiva que lhe 
permite dizer. Ou seja: para o sujeito da análise do 
discurso, imergir no interdiscurso é a condição necessária 
para poder dizer, para poder produzir um texto. Esta é a 
natureza da exterioridade e do que se chama de 
condições de produção (INDURSKY, 2006, p. 69). 
A J 
A ideia lançada pela autora reafirma que a produção de um texto está atravessada por 
outros discursos dispersos nele, mobilizando posições-sujeitos e suas vozes anônimas 
que determinam a tessitura do texto que, para a AD, só pode ser pensado como um 
espaço discursivo heterogêneo sob um efeito de sentido que está simbolicamente 
fechado pelo trabalho discursivo do autor que apaga sua dispersão na ilusão de um efeito 
origem. 
PENSANDO JUNTOS 
Você encontrou duas folhas no lixo e nelas estão escritas as letras “H” e “M”. Em um 
barzinho e em meio a boa conversa, você procura um banheiro e se depara com duas 
portas: em uma está escrito a letra “H” e na outra, “M”. Em qual situação, as letras "H” 
e “M” são textos? 
Fonte: elaborado pelas autoras. 
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TEXTO E TEXTUALIZAÇÃO 
Até o momento, foi apresentado a você uma reflexão sobre o texto à luz da teoria 
discursiva e isso significa que assumimos uma posição diante da interpelação contratual 
da produção de um material que tem como objetivo refletir sobre a teoria linguística da 
AD, diante das outras concepções teóricas que foram deixadas de lado: linguística 
textual, teoria da enunciação, semiótica, etc. Sabemos que há uma infinidade de 
temáticas que tem como mote a língua e o texto, pois ambos são importantes 
ferramentas de reflexão, haja vista sua presença diária na vida dos sujeitos sociais e isso 
justifica a importância em estar sempre sendo o motivo de questionamentos críticos, por 
meio de outros campos de saberes. 
Pensando o texto como um conglomerado de discursos que o sujeito-autor unifica em 
limites estabelecidos pela ilusão do tripé começo, meio e fim representado graficamente 
pelo ponto final, é nessas condições que tratamos também da textualização enquanto 
ferramenta de produção textual que trabalha com a língua consideradacomo não 
transparente e que se desdobra diante de várias franjas que vão produzindo gestos de 
interpretação, no modo como o discurso se textualiza e no trabalho do sujeito interpelado 
pela função-autor. 
Para Indursky (2006), o trabalho de textualização é metaforicamente compreendido com 
a profissão de costureira que pega os pedaços de tecidos e vai unindo um ao outro, ou 
seja, o sujeito diante de vários recortes discursivos, trazidos do interdiscurso, vai 
produzindo um efeito-texto, organizado, simbolicamente fechado e ilusoriamente 
completo, como se não houvesse beiradas. 
É nesse trabalho que o sujeito-autor se constitui ao produzir um efeito de 
homogeneidade do texto que se produz, como se fosse a 
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“[...] origem de seu autor, apagados os vestígios de sua 
interdiscursividade e demarcando-se de todos os outros 
textos, [...]. Ou seja, o efeito-texto resulta da ilusão de que 
tudo o que devia ser dito foi dito, nada faltando e nada 
sobrando. Assim, ele se apresenta ilusoriamente dotado 
de começo, meio e fim. O efeito-texto apresenta-se, 
desse modo, como uma peça de linguagem completa, 
acabada, fechada. E o sujeito-autor necessita destas 
duas ilusões - completude e fechamento - tanto para 
dizer como para concluir seu dizer 
(INDURSKY 2006, p. 73). 
A J 
A autora, em um outro trabalho questiona esse efeito ilusório de fechamento, retomando 
a questão da heterogeneidade que é cabível em um item que tem como objetivo refletir 
sobre a textualização. O ponto principal aqui é destacar que nessa “costura” realizado 
pelo sujeito-autor ressoam palavras outras, ditas anteriormente, de outros sujeitos que 
na ordem do já-dito, o repetível vai compondo a tarefa da textualização, unindo o 
disperso por meio de formações discursivas amigáveis ou antagônicas que vão compondo 
o texto que, segundo Indursky (2001) é a materialidade linguística pela qual se tem 
acesso ao discurso. 
Nesta perspectiva, o que menos interessa é saber como o sujeito-autor vai organizar o 
texto, pois, para a AD o que está em jogo "T[...] é o modo como o texto organiza sua relação 
com a discursividade, vale dizer, com a exterioridade e o modo como organiza 
internamente estes elementos provenientes da exterioridade para que produzam o efeito 
de um texto homogêneo” (INDURSKY, 2007, p. 28). 
Essa exterioridade faz parte do processo de textualização por meio das relações 
interdiscursivas que possibilita ao sujeito-autor, dentro das CP estabelecidas, utilizar-se 
de uma rede de formulações e ir compondo o texto para além do seu suporte material. 
Fato que fornece subsídios para pensar que não há texto independente da prática da sua 
produção ou reprodução, conforme salienta Gallo (2008, p. 43) e é nessa linha de 
pensamento que a textualização é concebida enquanto prática que fixa fragmentos pela 
escrita, pois “[...] não se tem jamais um texto em si (como objeto). O que se tem é um 
fragmento determinado, estabilizado, resultado de um trabalho, um funcionamento: a 
prática de sua produção”. 
45 - 140
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Como estamos tratando do texto por meio da teoria discursiva e, como já sabemos, ele 
não é linear, é preciso, então, considerar que a textualização trabalha com fragmentos 
disponibilizados pela materialidade linguística que, pela ação da função-autor, estabelece 
limites e organiza seus sentidos. Entretanto, é no efeito-texto que se tenta conter a 
dispersão dos sentidos, produzindo um (im)possível fechamento que, apesar dessa 
engrenagem, não escapa totalmente da dispersão, durante a prática da textualização, ou 
seja, embora se produza o texto afetado pela ilusão do sentido único e do efeito-fecho 
marcado pelo ponto final, o efeito de fim e o esgotamento dos sentidos se constitui como 
algo meramente ilusório de um sujeito na sua posição-autor. 
Orlandi (1996), ao tratar dessa temática, afirma que há uma relação do sujeito com o texto 
e deste com o discurso que é inserido em uma FD determinada que vai produzir a 
impressão de unidade, transparência e completude, pois 
EN 
“T.] as várias posições do sujeito podem representar 
diferentes formações discursivas no mesmo texto. É 
preciso, no entanto, ressaltar que a relação entre as 
diferentes formações discursivas no texto podem ser de 
muitas e diferentes naturezas: de confronto, de 
sustentação mútua, de exclusão, de neutralidade 
aparente, de gradação, etc (ORLANDI, 1996, p. 57). 
J 
Tais afirmações são convidativas a uma viagem pelo túnel do tempo, onde encontraremos 
com Pêcheux (1997) e sua afirmação de que é impossível analisar um discurso como um 
texto com sequências linguísticas fechadas sobre si mesma e norteadas por perguntas 
conteudista como, por exemplo, “o que este texto quer dizer?”. Para deslocarmos da linha 
do contéudo para a da AD, é preciso reformular a pergunta para “como este texto se 
significa?”, na nossa textualização, ou seja, no nosso trabalho de costureira das palavras. 
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De acordo com infográfico publicado pelo portal 61, em 05 de dezembro de 2016, o 
Pisa - nível básico de 2015, que aponta a porcentagem de estudantes brasileiros 
abaixo do nível básico. As três áreas avaliadas foram ciências, com 56,6%, leitura, 
com 50,99%, e matemática com 70,25%. Alunos interpelados em sujeitos-autores 
analisaram o gráfico como um discurso e pelas relações interdiscursivas produziram 
um texto refletindo sobre as condições de produção da educação no Brasil, 
valorização do tecnicismo, diferenças entre escolas públicas e privadas, do centro e 
da periferia e a desvalorização financeira e moral dos professores. 
Fonte: 
http://g1.globo.com/educacao/noticia/brasil-cai-em-ranking-mundial-de-educacao- 
em-ciencias-leitura-e-matematica.ghtml. 
Acesso em: 18 maio 17. Adaptado pelas autoras. 
A ORDEM DO DISCURSO E A ORGANIZAÇÃO TEXTUAL 
Ao retomar Pêcheux (1997) nos deparamos com reflexões sobre componentes teóricos 
discursivos que nos auxiliam a compreender o modo como um texto se organiza, pois é 
nele que o discurso se materializa por meio da língua, produzindo efeitos de sentidos 
entre os lugares ocupados por indivíduos interpelados em sujeitos. É dessa forma que 
estamos tratando o texto, utilizando-se de uma teoria que escapa da composição clássica 
aplicada na escola que busca compreendê-lo dentro de uma sequência lógica, bem como, 
na busca pelo o que o autor quer dizer no seu gesto de escrita, ou seja, nessa 
perspectiva, o texto é analisado apenas nas suas relações internas. 
Os componentes teóricos da AD produzem uma ruptura a essa praxis, ao considerar as 
CP sociais e históricas do texto e o sujeito-autor inscrito em posições vinculadas à FDs 
que o determinam. Entretanto, tais conceituações do arcabouço teórico da AD não 
significam que o texto é produzido “de qualquer jeito”, pois é pelas CP e na posição de 
autoria que a ordem do seu discurso é determinada, bem como, o modo como sua 
produção será organizada. 
Pensamos a ordem do discurso por meio de Foucault (2004) e o fato de que o texto é um 
conjunto de discursos já acontecidos, ditos e escritos ordenados pelas CP e pelo modo 
como o sujeito pode e deve escrever, pois em toda sociedade 
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“f.] a produção do discurso é ao mesmo tempo 
controlada, selecionada, organizada e redistribuída por 
certo número de procedimentos que têm por função 
conjurar seus poderes e perigos, dominar seu 
acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível 
materialidade (IDEM, 2004, p. 9). 
J 
Por isso, a produção textual comunga com a forma desigual e de classes divididas que 
estrutura a sociedade capitalista neoliberalista, de modo que, o sujeito ao se posicionar 
como autor, assina uma espécie de contrato que, mediante a FD a qual está filiado, o 
autoriza a escrever sobre alguns fatos, tentando delimitar os gestos de interpretação do 
leitor, enquanto interdita outros, pois épor meio da interdição velada que, 
inconscientemente, “sabe-se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode 
falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de 
qualquer coisa” (FOUCAULT, 2004, p. 9). 
Mas o discurso está longe da definição da transparência e neutralidade, pois há palavras 
proibidas que precisam ser controladas e delimitadas pelo sujeito-autor que faz da língua 
a sua ferramenta de trabalho que juntam as palavras em unidades coerentes. Mera ficção 
de organização da desordem e o controle dos discursos, pois segundo o autor, não são 
todas as regiões do discurso que são igualmente abertas e penetráveis. Ora, o texto é 
produzido sob o manto de um ritual que impõe seus autores a ocupar determinada 
posição e a formular enunciados determinados, marcados pela ilusão de ser a fonte do 
dizer, mas que são produzidos por descontinuidades que se cruzam, se ignoram e se 
excluem ou mesmo transgridem ou invertem. 
Nesta concepção, Foucault (1997) afirma que escrita desdobra-se como um jogo que vai 
infalivelmente para além das suas regras, extravasando-as, bem como, determinando 
qual é o lugar que o sujeito deve ocupar e quais regras devem obedecer e apagar-se 
nessa desordem de discursos. Segundo Indursky (2001), é nesse emaranhado que a 
proposta teórica da AD ultrapassa uma linguística da língua, com indivíduos empíricos, 
considerando a organização para além das relações: 
a. Contextuais permeadas por questões culturais, políticas, econômicas, etc; 
b. Textuais que relacionam vários textos entre si; 
c. Intertextuais que direcionam a uma espécie de origem possível, ou seja, 
uma releitura de outros textos como se fosse uma espécie de apropriação 
de outro texto a fim de promover uma transformação ou assimilação. 
48 - 140
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No entanto. para a autora que tem suas pesquisas fundamentadas pela teoria da AD, o 
repetível (memória discursiva) é da ordem de um já-dito que remete o dizer de outros 
sujeitos, em outros discursos e outros espaços, inscritos em FDs amigáveis ou 
antagônicas. Vale dizer que esse já-dito que se organiza na composição da tessitura do 
texto é o interdiscurso, ou seja, outros discursos ditos alhures, produzindo um efeito de 
homogeneidade no seu efeito de organização já determinada por regras impostas pelo 
discurso pedagógico. Na concepção da autora 
a 
“[.] as relações interdiscursivas aproximam o texto de 
outros discursos, remetendo- a a redes de formulações 
tais que já não é possível distinguir o que foi produzido no 
texto e o que é proveniente do interdiscurso. [...] o texto, 
nessa perspectiva, possui sua materialidade linguística, 
mas não se reduz a ela. Em função dessas diferentes 
relações que o texto pode estabelecer com a 
exterioridade, ele vai além de seu porte material 
(INDURSKY, 20071, p. 29). 
q J 
Esta concepção reforça que o texto é uma junção de discursos dispersos que se 
entrelaçam em FDs diversas, mobilizando posições-sujeitos-autores diferentes e, pelo 
fato de pensar no modo como diferentes discursos se organizam no texto, questões sobre 
o espaço discursivo heterogêneo arrumado por um sujeito-autor são retomadas 
mobilizando discursos pela relação interdiscursiva e os organiza, dando-lhe 
configurações de texto em um espaço discursivo heterogêneo estruturado por ele que vai 
tecendo e produzindo um efeito de unidade organizada de sentido, enquanto são 
apagadas as marcas da sua procedência. 
Nesse momento, une-se o disperso pela textualização, por uma espécie de costura que 
reúne diferentes alteridades e as tornam imperceptíveis. É preciso referi-lo ao conjunto 
de discursos possíveis a partir de um estado definido pelas CP em que o sujeito-autor, no 
seu trabalho de organização dos discursos, modela os sentidos preexistentes como fonte 
originária, ou seja, ele pensa ser o dono desse emaranhado de sentidos que lança no seu 
texto. 
Sentidos que para a autora “[...] “são” o que seu autor pretendeu que fossem, 
absolutamente “seus” e “transparentes” e como tal, se cristalizam, não podendo nunca 
serem outros, produzindo o “efeito de evidência”. Em sua ilusão, tais sentidos são 
estáveis, nunca derivam, nem podem deslizar” (INDURSKY, 2001. p. 33). 
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E) atenção 
Na produção textual, o sujeito em posição-autor é afetado pela FD 
dominante, irá garimpar discursos sobre o tema a ser apresentado. Estamos 
nos referindo às relações interdiscursivas que ele utiliza, pois ao formular os 
enunciados pensa ser o criador absoluto do seu dizer, por estar afetado pela 
ilusão da originalidade. Um fato que a AD explica pela teoria dos dois 
esquecimentos, denominados como número um e dois. Este ocorre no nível 
pré-consciente e consciente em que o sujeito seleciona um enunciado (e não 
outro) para compor o seu texto. O primeiro é o que nos interessa, pois ocorre 
em nível do inconsciente e o sujeito pensa ser a origem de um jádito, por não 
poder se encontrar no exterior da FD que o domina. Exemplo: o sujeito-autor 
que escreve para uma revista interpelada pela ideologia capitalista neoliberal, 
não vai defender e apoiar as manifestações populares da classe trabalhadora 
contra o arrocho salarial nos seus textos, publicados na referida revista. 
Fonte: Pêcheux (2009). Adaptado pelas autoras 
INTERTEXTO E INTERDISCURSO 
Entre os estudiosos da linguagem, especificamente quando se ocupam da linguística 
textual e também tem acesso à teoria da AD, é comum a geração de dúvidas entre 
intertexto e interdiscurso, tanto por apresentar um certo grau de similaridade na sua 
nomenclatura, quanto por apresentarem propostas conceituais aplicáveis ao texto, na 
sua multimodalidade. Por isso, a referida aula tem como propósito estabelecer a diferença 
básica entre eles, pois um trata das relações entre uma diversidade de textos que se 
agrupam em um texto e o outro de uma diversidade de discursos que, pela memória 
discursiva, serão agrupados no texto, pelo sujeito-autor. 
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Recorrendo a Koch e Elias (2014), vamos compreender que, dentro da perspectiva teórica 
da linguística textual, um texto é constituído, a partir da recorrência a um ou vários 
textos e aqui também nos deparamos com questões voltadas ao sentido, de um modo 
diferente ao modo como a AD o concebe, pois para o texto fazer sentido é preciso que 
autor e leitor, na sua competência, reconheçam a presença de outro(s) texto(s), durante a 
escrita e a leitura. Nesse trabalho braçal do autor que, pela sua capacidade mental, vai 
incorporando e unificando vários textos no seu texto que ocorre a intertextualidade 
explícita com citação marcada da fonte de onde foi retirada ou mesmo uma 
intertextualidade implícita, ou seja, sem a ocorrência da citação expressa da fonte, onde 
foi retirada. Nesse caso, ocorre uma espécie de “[...] manipulação que o produtor do texto 
opera sobre texto alheio ou mesmo próprio [...]” (KOCH e ELIAS, 2014, p. 93) como 
estratégia de produção textual. Vamos a um exemplo de intertextualidade que lembra um 
escândalo de corrupção no meio político, ocorrido em 2005 e amplamente divulgado 
pelos meio de comunicação de massa, em que o assessor de um deputado, foi presos com 
dólares na cueca e esse fato foi motivo para a produção de outros textos, a partir do caso 
do dólar na cueca: 
Figura 2 - Quadro 1: Um exemplo de intertextualidade 
O cantor Paulinho da Viola canta uma música cuja letra diz:"Dinheiro na mão é vendaval 
1) | navida de um sonhador [..] e no texto que aborda o caso de corrupção, a intertextua- 
lidade ocorreu do seguinte modo:"Dinheiro na cueca é vendaval” 
Há um poema de Carlos Drummond de Andrade, intitulado no meio do caminho que 
diz:“no meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho [.]'e 
um outro intitulado E agora José. Ambos foram utilizados no texto produzido para anun- 
ciar o caso, da seguinte maneira:“tinhaum raio-x no meio do caminho, e agora José”. 
2) 
Fonte: Koch e Elias (2014). Adaptado pelas autoras 
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Já nos referimos sobre o interdiscurso em outros momentos desse material, mas é 
importante retomar, nesse contexto de estabelecimento de diferenciação em relação a 
um outro conceito muito utilizado e discutido pelos pesquisadores da linguística textual, 
pois segundo Indursky (2006, p. 70), "[...] o interdiscurso é o lugar onde residem múltiplos 
sentidos, produzindo por vozes anônimas [...], ou seja, é por meio de relações 
interdiscursivas que se aproximam o texto a outros discursos. Veja: no intertexto, ocorre 
a aproximação de um texto com outros textos; já no interdiscurso, ocorre a aproximação 
(ou mesmo a relação) de um texto com vários discursos. Utilizando-se do exemplo 1, 
especificamente, o enunciado “Dinheiro na cueca é vendaval”, diante da teoria da AD, o 
analista não irá considerar a sua relação com outro texto, no caso a letra da música 
pecado capital, cantada por Viola, mas a uma rede de formulações que considerará, 
entre outras coisas, as CP de produção desse enunciado, a posição do sujeito que 
enunciou e a FD que determina/autoriza enunciar desse modo (e não de outro), 
remetendo a uma seleção da repetibilidade (memória discursiva) sobre os possíveis 
discursos já enunciados (interdiscurso) sobre corrupção, sistema político brasileiro, 
justiça burguesa, divisão de classes, no Brasil, as penas de prisão são direcionadas a um 
grupo (e não outros), etc. Não há como negar que uma linha divisória um pouco tênue, 
entre as duas definições e, nesse caso, é a posição teórica fundamentada do analista que 
o capacitará, diante de qualquer objeto de análise, a desenvolver uma pesquisa 
competente, independente se pelo viés do intertexto ou pelo interdiscurso. 
INDICAÇÃO DE LIVRO 
Discurso e Texto: formulação e circulação dos sentidos d e Eni Puccinelli 
Orlandi é a melhor leitura para complementar seu aprendizado nesta aula. 
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E-Book - Apostila 
Eni P. Orlandi 
DISCURSO 
E TEXTO 
formulação e circulação dos sentidos 
5º Edição 
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E-Book - Apostila 
Discurso e Texto: formulação e circulação dos sentidos 
Autor: Eni Puccinelli Orlandi 
Editora: Pontes 
Sinopse:Afinal o que é um texto? A referida obra apresenta reflexões 
desenvolvidas pela autora sobre as diferentes modalidades textuais (verbal e 
não-verbal), a partir das concepções teóricas da Análise de Discurso. Fugindo da 
concepção clássica do texto, apresentada pela sistema de educação tradicional 
nas aulas de ensino de língua e produção textual, Orlandi ressignifica o texto, ao 
incorporar nele elementos que compõem sua produção, como as condições que 
determinam sua constituição, formulação e circulação, por meio do sujeito-autor 
que unem discursos pelas relações interdiscursivas e vai desmistificando a 
concepção de texto, ao considerar não só a escrita linear tradicional, mas 
também as novas tecnologias de escrita que se deslocam ao longo da história, 
como a tatuagem, o outdoor, o grafite, a pichação, etc. Ela analisa diversas 
materialidades e seus diferentes percursos que produzem efeitos de sentidos, na 
formação social em que a língua, na sua opacidade, se permite funcionar, no e 
pelo texto, por diferentes percursos. Vale a pena ler a obra. 
A J 
APROFUNDANDO 
Vamos falar a respeito da wikipédia e a linguagem hiper (textual): uma proposta de 
trabalho. As aulas de leitura e produção textual ganharam dinâmica diferenciada com a 
emergência dos ambientes colaborativos e é este espaço que será analisado, por meio do 
verbete aluno, para discutir a produção textual no Wikipédia. 
Será focalizado, sobretudo, a não transparência da língua e a produção de efeitos de 
sentidos pelos pressupostos teóricos da AD francesa, pois ela permite o trabalho com os 
sentidos materializados no processo de construção criativa e aberta de tais ambientes 
que tem como proposta a construção de uma enciclopédia, na qual usuários e leitores 
podem editar e colaborar “livremente” na produção de verbetes (termo ou palavra), 
melhorando ou aprimorando constantemente sua definição. 
Acreditamos que o sistema wiki pode ser explorado também nas aulas de língua, desde 
que não seja visto como simples ferramenta, mas, também, como uma nova forma de 
gerar e produzir conhecimento, que possibilita, de quebra, ampla e diferenciada interação 
entre os alunos envolvidos nas atividades com esse ambiente. 
Na perspectiva discursiva, a língua não é considerada um mero “instrumento de 
comunicação” que serve para “transmitir informações”, ela é vista como um objeto 
simbólico, através do qual o homem se relaciona com o mundo que o rodeia. 
Dessa forma, o trabalho com a leitura e produção textual, a partir desta perspectiva 
teórica, deve considerar a linguagem como algo que está constitutivamente relacionado à 
memória e à historicidade, uma vez que é pelo funcionamento destas que podemos 
atribuir sentidos aos textos e discursos que circulam em nossa sociedade. 
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O verbete aluno será compreendido a partir do momento em que considerarmos a relação 
sócio-histórica e ideológica em que eles são produzidos, ou seja, o sentido está 
diretamente relacionado às CP específicas do ambiente que analisaremos o qual funciona 
sobre o imaginário de que, por ser colaborativo e aberto, é um sistema potencialmente 
democrático porque permite tudo dizer, divulgar, circular e armazenar sem que exista um 
ponto central de controle cerceando documentos, conteúdos e sistemas elaborados. 
É justamente por fazer parte desse imaginário que a Wikipédia, por exemplo, define a si 
mesma como uma “enciclopédia livre”, cujo conteúdo “neutro e objetivo”, ganha cada vez 
mais credibilidade, sendo, inclusive, utilizado para pesquisas acadêmicas (mesmo que 
muitos pesquisadores e professores não considerem essa enciclopédia como uma fonte 
legítima de consulta). 
A partir da concepção de que os sentidos de um texto passam por sua relação com outros 
discursos e outros textos, vamos observar daqui em diante como essa relação entre 
textos está funcionando para a produção de sentidos diferentes para a definição do 
verbete aluno na Wikipédia, conforme descrito: 
Figura 3 - Descrição do verbete aluno. 
i
m
 
(Al uno: (do latim alumnus, alumnié) ou discente é o indivíduo À 
que recebe formação e instrução de um ou vários professores ou 
mestres para adquirir ou ampliar seus conhecimentos, geralmente 
nas áreas intelectuais, levando em conta que existem diferentes 
aptidões e estilos de aprendizado para cada aluno - principalmente 
à medida em que avança na vida escolar. 
[.] 
Fonte: Wikipédia. Adaptado pelas autoras. 
Observamos que os sentidos produzidos no texto constroem para o verbete aluno um 
lugar estabilizado, no qual ele exerce um papel passivo, “aquele que recebe formação e 
instrução”, advindas de “professor ou mestres”. 
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O sentido de aluno construído é, ainda, amarrado há duas outras definições já 
determinadas pela Wikipédia: “professor” e “mestre”, cujo direcionamento de sentidos 
corroboram para a construção de sentidos do verbete aluno. Há uma recorrência na 
manutenção dos sentidos estabilizados, e nos pré-construídos em torno daquilo que 
comumente se considera ser aluno, professor, mestre. Não há, como vemos, quebra ou 
ruptura com relação aos sentidos autorizados, que circulam, na sociedade, com seus 
efeitos de “verdade”, de sentido “literal” sobre o que é ser aluno. Há, nesse verbete, a 
permanência de um sentido historicamente construído para aluno, que faz parte do 
discurso oficial: o aluno é aquele que é informado ou instruído em uma área determinada, 
por outro mais instruído e especializado que ele, professor ou mestre, possuidor de um 
conhecimento maior, ou seja, aluno é metaforicamente comparado a um espaço vazio 
(sem história. Sem vida social)que vai sendo preenchido pela história, experiência, 
conhecimento e vida social do professor e, logo, detentor do saber. 
Mas, se a Wikipédia trabalha no efeito da evidência, do sentido único e verdadeiro, na 
construção do texto livre das marcas de subjetividade, como trabalhar com os sentidos 
outros, aqueles que estão fora do texto, mas que o constituem? Como levantar com os 
alunos questões que leve a uma interpretação do texto e não a uma leitura literal? 
Quanto a esse aspecto, entendemos que, tomadas as devidas precauções teóricas e 
pedagógicas, o professor deve sim buscar compreender as manifestações linguístico- 
discursivas desses ambientes e discuti-las em sala de aula, já que elas fazem parte dos 
ambientes por onde circulam a grande maioria de nossos alunos e, sendo assim, os 
professores não podem ignorar as produções aí existentes. 
A AD possibilita trabalhar com o(s) discurso(s) que atualiza uma memória e se textualiza, 
permitindo interpretar que os sujeitos de um e de outro texto se filiam a redes de sentidos 
e, portanto, subsidiam o professor a propor deslocamentos nos modos de ler, bem como, 
fazer um percurso inverso daquele que se realizou na escola por muito tempo: o de 
revelar o que o texto quer dizer pela via do sentido único. 
Muitos elementos e noções da Língua Portuguesa, não trabalhados nesta unidade, 
poderiam ser explorados nesse percurso, como o estabelecimento da coesão e coerência 
na escrita coletiva, os recursos metafóricos ou metonímicos que produzem sentidos 
determinados.Enfim, há uma infinidade de recursos que indicam possíveis trabalhos com 
a língua a partir da ideia de “definir” um verbete ou termo. E, por fim, defendemos a 
necessidade de entrar no universo do aluno, entrar em seu mundo que hoje é 
indiscutivelmente mediado pelas tecnologias e pelos ambientes digitais, onde circulam 
saberes legitimados e não legitimados. Por isso, registramos como possibilidade de 
produção textual, atrelada à teoria da AD, a produção de diferentes leituras e escritas 
pelos alunos, a partir da edição, escrita e reescrita, leitura e releitura de verbetes em uma 
e outra enciclopédia. 
Referências 
ALUNO. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2017. 
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Aluno&oldid=48778427 .Acesso 
em: 26 junho 2017. 
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Novos Desafios 
Neste estudo você teve a oportunidade de conhecer e refletir sobre o texto, por meio de 
um olhar direcionado pela teoria do discurso, enquanto oportunidade de discussão que 
nos capacita a debruçar sobre ele sem se preocupar em garimpar dados linguísticos que 
forneça uma possível resposta que identifique “o que o autor, ou o texto, quis dizer”. A 
noção apresentada aqui sobre o discurso oferece suporte teórico para produzir uma 
espécie de rearranjo do texto que capacita o sujeito-leitor a desenvolver uma análise que 
tem como ponto crucial encontrar as pistas discursivas necessárias para se chegar “ao 
como o texto significa”. 
Desprendemos do tripé que determina a produção textual seguindo a trilha do começo, 
meio e fim e passamos a entender que ele é um feixe de sentidos a ser produzido em uma 
multiplicidade - verbal, imagética, sonora, etc. - que vai sendo construído não como uma 
“máquina de escrever”, mas por meio de indivíduos que, pelo processo de interpelação, 
torna-se um sujeito que vai escrever sob o efeito da ilusão de ser o dono original do seu 
dizer, mas pela FD que o determina na posição de autor que dilui o singular e apodera-se 
da ação de escrita, sempre lapidada pelo que pode e deve ser escrito. 
A missão da teoria do discurso é provocar, produzir tensão para deslocar o que já está 
cristalizado como verdade absoluta e no que tange ao texto, ela recusa essa relação 
enclausurada no sentido único, originalidade do dizer, regras de escrita, pois, às vezes é 
na desordem do texto que os sentidos são produzidos no processo de textualização em 
que a “costura” elaborada pelo sujeito-autor não ocorre pelo meio já estabelecido, ou 
seja, pela sua composição clássica defendida e, salvo raras exceções, 
predominantemente ensinada na escola que pensa o texto pela via interna, sem 
considerar os aspectos sociais e históricos que permeiam qualquer prática que está além 
de uma relação intertextual. Há outros aspectos a serem considerados e a AD busca dar 
conta disso. 
VAMOS PRATICAR? 
Chegou o momento de testar o conhecimento adquirido até aqui! Para isso, por favor, 
participe da autoatividade que preparamos especialmente para você. São apenas 4 
questões 
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1. A Análise de Discurso é uma teoria do 
campo da Linguística que reflete 
criticamente sobre diversos campos de 
saberes, entre os quais o texto e o seu 
modo de produção. Assinale a 
alternativa correta que define o texto 
para a Análise de Discurso. 
a) Para a AD, o texto é comparável a uma chapa linear e a sua 
(a) produção deve seguir critérios estabelecidos para não confundir o 
sujeito-eleitor, ou seja, ele deve ser unidimensional e estar 
marcadamente delimitado com começo, meio e fim. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
b) Para a AD, o texto é comparável a uma superfície plana e a sua 
[b) produção deve ser amparada em critérios pré-definidos pelo 
sujeito-autor para não fugir da sua pergunta básica: “o que o autor 
quis dizer?”. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
c) Para a AD, o texto é comparável a um bólido de sentidos. mas 
que o sujeito-autor direciona para uma única direção, por meio dos 
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E-Book - Apostila 
seus três elementos de composição básicos a ser preenchido, ou 
seja, o começo, omeio e o fim. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
d) Para a AD, o texto é unidade fechada e homogênea somente 
O representada pela escrita, por meio de um sujeito em posição de 
autor que, ao escrever, estabelece um ponto de partida e um ponto 
de chegada. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
e) Para a AD, o texto é multidimensional, possui múltiplas formas - 
(e) verbal, imagética, sonora, etc - organizadas por um sujeito-autor 
que coloca a língua em funcionamento em uma unidade 
homogênea ilusória. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
2. Sempre há motivos para se produzir 
um texto: persuadir, elogiar, ofender, 
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E-Book - Apostila 
criticar, solicitar, etc. A AD se dedica a 
essa importante fase a partir de um 
gesto interpretativo próprio. Sobre a 
produção textual para a AD, considere 
a veracidade ou falsidade das 
assertivas e assinale a alternativa 
correta. 
i A produção textual vai além dos conceitos já dados, 
pois ao fazê-lo o indivíduo, interpelado em sujeito- 
autor, vai considerar as condições de produção em 
que deve ser produzido, conforme a FD que 
determina o que pode e deve escrever. 
ii Aquele que produz um texto é um reprodutor de 
vários discursos que exerce o ofício de uni-los, pela 
posição sujeito-autor, as condições de produção e 
a(s) FD(s) que determinam sua posição. 
iii O texto enquanto produto não se apresenta como 
algo de sentido único e via de uma só direção. Para a 
AD o texto é produto de vários discursos e de um 
sujeito-autor que age sob a ilusão de sempre ser a 
origem do que escreve. 
iv. Para a AD, a produção textual deve ser pensada como 
um espaço discursivo homogêneo e de um efeito de 
sentido fechado no espaço pré-determinado pelo 
tripé: começo, meio e fim. 
(a) VV. VV. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
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OQ b)F,F.F.F. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
OQ CV. V.V.F. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
OQ DFF,FV. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
(e) JFV,FV. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
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3. Pela teoria da AD descobrimos que o 
texto é uma importante ferramenta 
para seanalisar diversas situações 
sociais, por meio de um conglomerado 
de discursos, uma espécie de mosaico 
que vai se unificando no processo de 
textualização pelo sujeito- autor. 
Sobre a prática do texto e da 
textualização complete as lacunas e 
assinale a alternativa correta. 
i Atextualização éotrabalho de... feito 
pelo sujeito-autor que na ordem do já-dito e do 
repetível, vai e compondo o texto pela materialidade 
linguística. 
ii A textualização é uma prática que fi xa fragmentos 
ditos alhures e que são retomados pela 
il A textualização trabalha com 
See >>> —— —— que estabelece limites e 
organizas os sentidos dispersos. 
iv. A textualização produz um efeito de sentido único 
diante da ilusão da completude realizada pelo 
00 — e o efeito de fecho marcado pelo 
ponto fi nal. 
a) Relação interdiscursiva, costura, sujeito-autor, fragmentos. 
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Q b) Costura, fragmentos, sujeito-autor, relação interdiscursiva. 
(C) c) Costura, relação interdiscursiva, fragmentos, sujeito-autor. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
OQ d) Sujeito-autor, costura, relação interdiscursiva, sujeito-autor. 
(e) e) Relação interdiscursiva, costura, sujeito-autor, sujeito-autor. 
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4. Para a Análise de Discurso, há uma 
fronteira porosa e um limite movediço 
marcando o texto e sua organização ao 
ser produzido por um sujeito-autor 
sempre mutável às condições de 
produção e as FDs que determinam o 
que ele pode e deve dizer ou escrever. 
Sobre a ordem do discurso e a 
organização textual, leia as assertivas 
e assinale a alternativa correta. 
i Pensar que o discurso se produz no texto por meio de 
uma ordem já estabelecida significa que há um 
controle na forma como o sujeito-autor irá se 
posicionar obedecendo, inconscientemente, a uma 
espécie de contrato. 
il A ordem do discurso estabelece limites, ou seja, 
interdita e autoriza dizeres. Por exemplo: um religioso 
que defende a vida jamais irá se posicionar a favor do 
aborto em qualquer circunstância. 
iii O modo como o texto é organizado se caracteriza 
pela obediência do sujeito-autor e pela invenção de 
palavras que são discursivizadas nas práticas pré- 
determinadas sem ultrapassar o que já está posto 
pelas regras textuais. 
iv. Quando a AD reporta sobre organização textual 
significa que ela está aderindo às teorias sobre o 
texto que defende sua organização textual a partir do 
tripé do seguinte tripé: começo, meio e fim. 
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(a) a) As assertivas | e Il estão incorretas e as Ille IV estão corretas. 
Q b) As assertivas | e Ill estão corretas e as Il e IV estão incorretas. 
(Cc) c) As assertivas | e IV estão corretas e as Ile Il estão incorretas. 
O d) As assertivas | e Il estão corretas e as llle IV estão incorretas. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
(e) e) As assertivas |, Il e Ill estão corretas e a IV está correta. 
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REFERÊNCIAS 
MORENO, Ana Carolina. Brasil cai em ranking mundial de educação em ciências, leitura 
e matemática. 
Disponível em: <http://g1.globo.com/educacao/noticia/brasil-cai-em-ranking-mundial-de 
-educacao-em-ciencias-leitura-e-matematica.ghtml>. Acesso em: 17 maio 17. 
FERREIRA, Maria Cristina Leandro (Coord.). Glossário de Termos do discurso: projeto de 
pesquisa da teoria do discurso. Porto Alegre: UFRGS, 2001). 
FOUCAULT, Michel. O que é um autor?. Lisboa: Veja; Passagens, 1977. 
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. Tradução de Laura Fraga de Almeida Sampaio. 
10. ed., São Paulo: Edições Loyola, 2004. 
GALLO, Solange Leda. Discurso da escrita e ensino. 2. ed. Campinas, SP: Editora da 
Unicamp, 1995. 
GALLO, Solange Leda. Como o texto se produz: uma perspectiva discursiva. Blumenau: 
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INDURSKY, Freda. Da heterogeneidade do discurso à heterogeneidade do texto e suas 
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leitura e a escrita como práticas discursivas. Pelotas: Educat, 2001, p. 27-42. 
INDURSKY, Freda. O texto nos estudos da linguagem: especifi cidades e limites. In: 
ORLANDI, Eni Puccinelli; LAGAZZI, Suzy. Discurso e textualidade. Campinas, SP: Pontes, 
2006, p. 33-80. 
KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Marial. Ler e compreender: os sentidos do texto. 3. 
ed., 10 reimp. São Paulo: Contexto, 2014. 
LAGAZZI, Suzy. Texto e autoria. In: ORLANDI, Eni Puccinelli; LAGAZZI, Suzy. Discurso e 
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ORLANDI, Eni Puccinelli. Discurso e leitura. 3. ed., São Paulo: Cortez, p, 1996. 
ORLANDI. Eni Pulcinelli. Análise de discurso: princípios & procedimentos. Campinas: 
Pontes, 3. ed. 2001a. 
ORLANDI, Eni Puccinelli. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 5. 
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PÊCHEUX, Michel. Análise automática do discurso (AAD-69). In: GADET, F.; HACK, T. 
(Orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel 
Pêcheux. Tradução Bethânia S. Mariani et al. 3.ed. Campinas: Unicamp, 1997. p.61-162. 
PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Tradução de 
Eni Pulcinelli Orlandi... et tal. 4. ed. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2009. 
DISCURSO, ESCRITA E LEITURA 
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Inicie sua Jornada 
Neste estudo temos por objetivo apresentar o modo como o autor, autoria, interpretação 
e escrita são visto a partir do ponto de vista da Análise de Discurso. Esperamos que esta 
seja uma ótima discussão a propósito da forma singular com que a análise de discurso 
pensa tais questões, tendo em vista que estamos falando de uma teoria materialista e 
que não pode deixar de pensar a autoria do ponto de vista das determinações sócio- 
histórica e ideológicas. 
Nesse aspecto, pensar a autoria é pensar as relações de poder e saber que afetam essa 
noção e o modo como ela se constitui em uma sociedade de escrita como a nossa. 
Sendo assim, dividiremos o estudo em cinco diferentes etapas, nos dedicando em um 
primeiro momento, ao qual será dedica a aula 1, a responder a difícil questão “o que é um 
autor?”, mostrando a heterogeneidade desse termo em nossa sociedade. 
Na aula 2, faremos uma breve relação entre as questões de interpretação e autoria, 
mostrando que em AD essas noções estão sempre imbricadas e não é possível pensar 
uma sem a outra. 
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Na aula 3, buscamos aprofundar as noções que a AD desenvolveu em torno da questão da 
autoria, apresentando as noções de função-autor e efeito-leitor, a partir das quais 
podemos compreender o modo como os textos se constituem, se formula e circulam. 
Na aula 4, retomamos a questão da autoria relacionando-a com o efeito-leitor, pois, 
discursivamente, autor e leitor são responsáveis pelo sentido do texto e não há como 
pensar em um sem o outro. 
Esperamos que a discussão aqui apresentada sirva para uma reflexão não só sobre a 
autoria em geral, mas o modo como ela afeta a sua própria relação com o texto e com a 
sua escrita. Bons estudos! 
Desenvolva seu Potencial 
O QUE É UM AUTOR? 
A pergunta “O que é um autor?” vem sendo feita ao longo do tempo pelos mais variados 
campos de estudo. Isso porque vivemos em uma sociedade da escrita e, por isso, a noção 
de autor afeta substancialmente diferentes processos sociais, tais como a produção 
científica, as produções escolares, as relações de trabalho, entre outras. 
Mas de que nos interessa saber o que é um autor? Ora. compreender os diferentes 
sentidos que nossa sociedade confere ao termo autor implica. em última instância, 
compreender o modo como nós, profissionais envolvidos com os processos educacionais 
ou mesmo de outras áreas, entendemos os poderes e deveres envolvidos no ato de “saber 
ler e escrever". Como vimos na unidade anterior, pensar a relação entre discurso e texto 
pressupõe pensar também as posições-sujeitoem jogo nos processos de textualização. A 
partir dessas considerações podemos refletir agora de que modo compreendemos o que é 
um autor, como nossa concepção sobre o autor pode implicar em uma maneira 
determinada de pensar as questões sociais e, consequentemente, o modo como os 
sentidos se produzem em uma sociedade como a nossa, cujos valores de legitimação se 
dão predominantemente em discursos de escrita. 
Entre os estudiosos que levantaram a questão o que é um autor, situamos a célebre obra 
de Michel Foucault, que tem por título essa mesma questão. Dessa obra é pertinente 
destacar a relação que o autor faz entre o autor e o nome próprio, ou seja, o que significa 
nomear um autor? Sobre isso o autor dirá que 
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o nome do autor funciona para caracterizar um certo 
modo de ele ser no discurso: para um discurso, o fato de 
haver um nome de autor, o fato de que se possa dizer 
“isso foi escrito por tal pessoa”, ou “tal pessoa é o autor 
disso”, indica que esse discurso não é uma palavra 
cotidiana, indiferente, uma palavra que se afasta, que 
flutua e passa, uma palavra imediatamente consumível, 
mas que se trata de uma palavra que deve ser recebida de 
uma certa maneira e que deve, em uma dada cultura, 
receber um certo status (FOUCAULT. 2007, p.13). 
q J 
Quando consideramos, portanto, que para compreender o que é um autor é preciso, como 
propõe Foucault (2001). pensar nos modos de ser autor de um discurso estamos 
considerando que para a AD falar em autor só faz sentido a partir do momento em que 
este aponta para um modo determinado de ser autor de um discurso. Logo, o autor tem 
relação direta com as relações de poder e com o modo como histórica e ideologicamente 
os discursos se produzem de um modo singular na relação entre os sujeitos e a língua. 
Nesse sentido, o autor é aquele que pode ser identificado em um momento dado como o 
sujeito de um discurso determinado. Pensar o autor desse modo requer, por sua vez, 
reconhecer que a noção de autoria implica deixar de nos preocuparmos com o sujeito 
empírico para pensar um sujeito determinados por relações sócio-históricas e, nesse 
sentido, a autoria de um texto é uma função que pode ser ocupada por diferentes 
indivíduos. 
Desse modo nos distanciamos, na perspectiva discursiva, de uma concepção de autor 
como aquele que simplesmente escreve ou produz o texto intencionalmente, com um 
objetivo de dizer X. Muito menos nos interessa perguntar diante de um texto, como já 
vimos nas unidades | e Il, o que “o” autor quis dizer. 
Por isso a noção de autor, como dissemos, é importante para pensarmos como se dão as 
relações de poder em nossa sociedade. Mais do que perguntar o que o autor quis dizer, 
interessa ao analista do discurso perguntar: Porque esse autor pôde (ou não pôde) dizer 
isso aqui e agora ? Por que não pôde dizer de outro modo? Quem pode (ou não pode) ser o 
autor desse texto? 
Discursivamente, interessa mais pensarmos como o que entendemos por autor influencia 
o modo como interpretamos os textos, já que valorizamos a autoria a partir dos textos 
que consideramos legítimos ou não. 
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Para entender a importância da autoria em nossa sociedade é preciso compreendermos 
que a importância da autoria se dá porque somos uma sociedade de escrita, ou seja, de 
acordo com a professora Solange Gallo (que se dedicou ao estudo dos discursos de 
escrita e de oralidade a partir de uma teoria do discurso) o discurso de escrita tem maior 
legitimidade, uma vez que, devido ao modo como se deu o nosso processo de colonização, 
a língua tupi que era língua de oralidade, não passível de escrita, foi considerada ilegítima 
(assim como as demais línguas orais) ao mesmo tempo em que a escola adotou a língua 
da corte (Língua portuguesa) como modelo e norma a ser seguido, legitimando assim a 
língua escrita em detrimento da língua nativa, que permaneceu como língua de oralidade: 
ilegítima. Segundo Gallo (2012), “fixamo-nos em uma discursividade escrita, e tudo o que 
não se parece com a escrita legitimada, que conhecemos dos livros e das publicações, 
não vale como produção legítima”. Sendo assim, o discurso de escrita se sobrepõe ao 
discurso da oralidade, porque dificimente consideramos legítimo aquilo que tem 
característica de língua oral. Isso pode ser percebido facilmente quando pensamos o 
modo como ensinamos nossa língua materna na escola, sempre a partir das normas e 
regras da Língua Portuguesa escrita. Também não consideramos as produções textuais 
escolares como discursos legítimos, porque ainda não são considerados autores 
legítimos, já que estão “aprendendo a escrever”, tanto que dificilmente as produções 
escolares podem ser publicadas. 
É por isso que tem grande importância para alguns perguntarmos, por exemplo, “quem 
pode ou não pode ser o autor de um texto x”. Quando nos perguntamos isso podemos 
perceber ou tentar compreender porque um aluno dificilmente será, em suas produções 
escolares, reconhecido como autor legítimo. Porque ele precisa antes aprender a 
(re)produzir um texto a partir das normas e regras da língua portuguesa escrita. Do 
mesmo modo, pense nas produções escritas que circulam na internet, quais podem ser 
atribuídas a um autor legítimo? Por que valorizamos mais uns que outros? 
O modo como interpretamos um texto está intimamente relacionado ao quanto 
consideramos um texto legítimo, ou seja, como atribuímos ou não legitimidade a um 
determinado tipo de autor e não a outro a partir de sua relação, domínio e intimidade com 
um determinado tipo de escrita e suas regras. 
QUADRO RESUMO 
Na base de toda teoria linguística podemos observar as noções de língua, linguagem, 
escrita, oralidade, discurso, texto, sentido. Porém nas práticas de ensino de língua 
materna essas noções são esquecidas e o que se pratica é o grafismo, a ortografia, a 
leitura, as análises gramaticais. “Será que o aluno, ao deixar a Escola, está preparado 
para entrar em um processo de legitimação de uma sua posição através da escrita?” 
Fonte: Gallo (2008, p.18). Adaptado pelas autoras. 
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INTERPRETAÇÃO E AUTORIA 
Como vimos nos estudos anteriores, o modo como compreendemos a noção de autoria 
afeta o modo como interpretamos um texto. Vejamos, agora, como isso ocorre de modo 
mais efetivo, tendo em vista todas as discussões realizadas nas aulas anteriores sobre o 
modo como a AD pensa os processos de interpretação. 
Interessa para nossa discussão sobre interpretação e autoria pensar que só podemos 
atribuir autoria àquilo que é interpretável, ou seja, para que haja autor é preciso a 
produção de um texto interpretável o que significa que para ser considerado autor é 
preciso se inscrever na ordem de um já dito, reconhecível, mas ao mesmo tempo se 
mostrar como fonte do que diz. É importante, portanto, entendermos o que é esse “já 
dito”, para que não se confunda o que é simples repetição com aquilo que é inscrição do 
sujeito em um repetível que é histórico. 
Orlandi (2007, p.70), ao falar de interpretação e autoria dirá que precisamos distinguir os 
modo de repetição, diferenciando as repetições que não historicizam (a repetição 
empírica e a formal - técnica de produção de frases e exercícios gramaticais) da repetição 
histórica, que é da ordem do interdiscurso, que diz respeito à memória e à rede de 
filiações às quais o texto se relaciona. 
" 
A inscrição do dizer no repetível histórico (interdiscurso) é 
que traz para a questão do autor a relação com a 
interpretação, pois o sentido que não se historiciza é 
ininteligível, ininterpretável, incompreensível. Isto nos 
leva a afirmar que a constituição do autor supõe a 
repetição, logo, como estamos procurando mostrar, a 
interpretação (ORLANDI, 2007, p. 70 ). 
A J 
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Isso significa dizer que sempre interpretamos a partir do reconhecível e é também a partir 
do reconhecívelque nos relacionamos com o autor. Sempre podemos reconhecer em um 
texto aquilo que é da ordem da repetição, mas quando essa repetição é histórica ela 
permite deslocamentos. No âmbito escolar, por exemplo, quando a repetição não 
historiciza ela é uma repetição empírica ou técnica, quando copiamos um texto sem 
modificá-lo, ou quando apenas repetimos exercícios já previamente definidos, não há 
espaço para uma autoria. Por isso, as aulas de redação ou de produção textual, por 
exemplo, são as ditas “mais difíceis” para grande parte dos alunos. 
Um ótimo exemplo disso é o fato de que grande parte dos textos produzidos na escola 
são, em geral, muito semelhantes, justamente porque há formas estabilizadas de autoria. 
Isso quer dizer, um certo jeito de dizer, com certas palavras, em uma certa ordem. 
É nesse momento que ou só “repetimos” ou temos a possibilidade de exercitar um lugar 
de autoria e aí precisamos ao mesmo tempo em que repetimos produzir algo “original”, 
mas sem que esse original “escape” do que pode ser historicamente reconhecível, pois, 
caso seja algo que não seja da ordem de uma repetição histórica, poderemos produzir um 
texto não legível, não interpretável e, assim, não será reconhecida a sua autoria. O texto 
precisa ter leitura: 
N 
Para que uma palavra faça sentido é preciso que ela já 
tenha sentido. Essa impressão do significar deriva do 
interdiscurso - o domínio da memória discursiva, aquele 
que sustenta o dizer na estratificação de formulações já 
feitas, mas “esquecidas”, e que vão construindo uma 
histórica dos sentidos. Toda fala resulta assim de um 
efeito de sustentação no já dito que, por sua vez, só 
funciona quando as vozes que se poderiam identificar em 
cada formulação particular se apagam e trazem o sentido 
para o regime do anonimato e da universalidade. Ilusão de 
que o sentido nasce ali, não tem história. Esse é um 
silenciamento necessário, inconsciente, constitutivo para 
que o sujeito estabeleça sua posição, o lugar de dizer 
possível. (ORLANDI, 2007, p. 72) 
Nu J 
Interessa observar, portanto, que para Orlandi (2007) o autor sempre se posiciona na 
relação com a constituição de um lugar de interpretação que se define por sua relação 
com o interdiscurso. 
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Quer dizer, o lugar de um autor é determinado pelo lugar da interpretação sempre na sua 
relação com a memória do dizer, repetição histórica, e com o seu interlocutor. Um 
exemplo interessante disso é quando pensamos as redações de vestibular que se 
baseiam na solicitação de determinados gêneros discursivos (resumo, carta, notícia, etc.). 
Para produzir um texto possível de ser reconhecido como um texto singular o candidato 
precisa estar na ordem do repetível, saber como se produz um resumo, o que se pode 
dizer em um resumo, saber quem é o seu interlocutor, quem é o leitor deste gênero. Em 
outras palavras, para ser autor de um resumo é precisa entrar nessa ordem do repetível 
ao mesmo tempo em que produz aí algum deslocamento que está justamente na 
interpretação que cada um fará daquilo que for solicitado no comando da redação. Todos 
os candidatos produzirão um resumo, para um interlocutor determinado que é o mesmo, 
mas cada um dos textos será diferente porque para se projetar como autor de sua 
redação cada candidato se colocará em um lugar de interpretação diferente. Ou seja, é o 
modo como cada um interpreta o texto que determinará o lugar que cada um ocupa como 
autor. 
“[...] podemos dizer que o autor, relativamente à injunção 
à interpretação, fica determinado: a) de um lado, pelo fato 
de que não pode dizer coisas que não tem sentido (a sua 
relação com o interdiscurso e com a memória do dizer) e 
b) deve dizer coisas que tenham um sentido para um 
interlocutor determinado (seja ele efetivo ou virtual). 
Desse modo a historicidade se atualiza na função-autor 
através da interpretação. Com efeito, a autoria ao mesmo 
tempo constrói e é construída pela interpretação. 
(ORLANDI, 2007, p. 75) 
Nu J 
Como podemos ver, ser autor de um texto implica sempre em produzir uma certa 
repetição, mas ao mesmo tempo se produz a possibilidade de produzir o novo, sobretudo 
porque um texto sempre será escrito em um outro momento, em outro lugar, sendo assim 
ao mesmo tempo novo. É por isso que para a AD 
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A repetição, entre tantas coisas, requer interpretação e 
memória ao mesmo tempo. A escrita como “novidade” é 
apenas efeito do trabalho de interpretação e de memória, 
visto que o que dizemos reaparece e sempre retorna em 
outro lugar (SCHONS, 2005, p.140). 
EU INDICO 
Segundo uma matéria publicada pela revista GizModo Brasil, em 2014 a revista 
científica Nature, revelou que “as editoras de revistas científicas Springer e IEEE 
removeram mais de 120 artigos publicados entre 2008 e 2013.” Os artigos foram 
produzidos a partir de um sistema de computador que gerava o texto 
automaticamente. O fato é que os artigos foram lidos e avaliados por cientistas e, 
mesmo assim, não conseguiram distinguir a fraude, já que valorizamos tanto a 
normatização escrita, os modelos e a repetição que atualmente mesmo leitores 
especializados em um determinado campo do saber tem dificuldades para reconhecer 
os traços de uma autoria efetiva em grande parte dos textos acadêmicos publicados. 
Isso gera a sensação de que todos os textos de uma área são exatamente iguais. Ou 
seja, buscamos tanto pelo apagamento da subjetividade, pela neutralidade e 
objetividade dos textos que acabamos cerceando o exercício de uma autoria real. 
Fonte: Feinberg (2014). Adaptado pelas autoras. 
FUNÇÃO-AUTOR E EFEITO-AUTOR 
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A escola muitas vezes confunde autoria com escrita, como se o objetivo principal de uma 
aula de produção de texto fosse formar escritores e não sujeitos-autores. É importante 
diferenciarmos o escritor do autor pois, na perspectiva discursiva a partir da qual 
estamos trabalhando são duas noções opostas. O escritor é um autor reconhecido pela 
produção de uma obra específica, que segue determinadas regras editoriais de produção. 
Aquele que tem nome próprio: Machado de Assis, Michel Pêcheux, Sigmund Freud, etc. Já 
o autor para a AD é uma posição do sujeito, um efeito produzido pelo texto e para 
entender melhor o modo como a AD pensa a autoria é importante apresentar duas noções 
importantes: função-autor e efeito-leitor. 
Pensando de formas diferentes a função-autor, gostaríamos agora de discutir o trabalho 
de Solange Gallo que, como já destacamos anteriormente, propõe uma forma singular de 
pensar a autoria em seus estudos sobre o discurso da escrita e da oralidade na relação 
com a escola. 
Preocupada com os modos como o texto se produz a autora irá destacar que para que 
exista autoria, sobretudo nas práticas escolares, é preciso ir além de simples exercícios 
de redação. É interessante a observação da autora quando chama nossa atenção para o 
fato de que a alfabetização e a grafia não são práticas suficientes para a autoria, ou seja, 
saber escrever, grafar, não é o mesmo que ser autor de um texto. 
Desse modo, retornamos à questão principal de nosso debate: o que é um autor?, mas 
dessa vez nos perguntando também: como se tornar (ensinar ou aprender a ser) um 
autor? 
INDICAÇÃO DE FILME 
Narradores de Javéde Eliane Cafféé o melhor filme para complementar seu 
aprendizado nesta aula, 
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O POVO AUMENTA MAS NÃO INVENT 
, Ja a + | Tas =... 
| R4) 1 1 es A E KH E | Va |QOR h' O 1 ie AV e 
DIRIGIDO POR ELIANE CAFEÉ 
HE EEMONT + GERE CAMILO q ROS REDERDE a HELSOS MANTER a LOC] PEREIRA 
NELSCS DANTAS qr ALESSANDRO AZEVEDO a MALEICHO FIZMRA a BEMESILTA 
EATHELS NACHIERGAFLE » ELTESS LIRA 
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Título: Narradores de Javé 
Ano: 2003 
Sinopse: Somente uma ameaça à própria existência pode mudar a rotina dos 
habitantes do pequeno vilarejo de Javé. É aí que elesse deparam com o anúncio 
de que a cidade pode desaparecer sob as águas de uma enorme usina 
hidrelétrica. Em resposta à notícia devastadora, a comunidade adota uma ousada 
estratégia: decide preparar um documento contando todos os grandes 
acontecimentos heróicos de sua história, para que Javé possa escapar da 
destruição. Como a maioria dos moradores são analfabetos, a primeira tarefa é 
encontrar alguém que possa escrever as histórias. 
Comentário: O filme “Narradores de Javé” é uma obra relevante para uma 
reflexão sobre o poder da escrita em nossa sociedade. O fato de o drama girar em 
torno da problemática de uma cidade que precisa “escrever” sua riqueza que está 
na ordem da oralidade tendo um único habitante, Antônio Biá, que sabia ler e 
escrever faz com que a obra gire em torno de questões importantes sobre 
autoria, o poder da escrita, a provisoriedade e a ilegitimidade da oralidade, a 
beleza das narrativas populares, o papel do personagem-autor, etc. Mostra, de 
forma muito forte, o que significa existir em uma sociedade de escrita. 
A A 
Função-autor e efeito-autor 
De acordo com os estudos de Gallo (2011), podemos pensar a função-autor relacionando- 
a mais especificamente com o nível enunciativo, ou seja, na relação do sujeito autor e o 
modo como ele elabora (formula) o seu texto. Isso porque é na dimensão enunciativa que 
o sujeito se relaciona com as formações imaginárias (que já estudamos) afetado pelo 
imaginário de que seu texto é autêntico, podendo, assim, produzir um efeito de fecho ao 
seu texto. Sendo o fecho do texto apenas um efeito podemos compreender que a função- 
autor permite vislumbrar que o texto não é uma unidade real, mas imaginária, e, por isso 
mesmo, podemos dizer que aí há uma função autor, pois há um esforço de reunião de 
dizeres, levando à assunção de uma autoria: aquele que produz um texto com efeito de 
unidade. O sujeito assume, assim, uma função de autoria ao mesmo tempo em que 
formula o seu texto, pois 
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“f...] conduzir uma escrita depende, sim. de um olhar. 
Depende daquele que vê o texto imbricado a outros textos 
e neles, os sujeitos se constituem à medida que 
interagem com os outros, cuja consciência e 
conhecimento de mundo se tornam resultantes do 
produto sempre inacabado desse mesmo processo, de 
suas práticas. Por isso o reconhecimento ou o 
esquecimento de sentidos depende do trabalho do 
sujeito-autor, que pode ratificar o legitimado, mas que 
pode, também, provocar deslizamentos, ou pode afastar- 
se completamente desses sentidos (SCHONS. 2005, 
p.146). 
A J 
Sendo um processo imaginário, pela função-autor sabemos que o texto é provisório e que 
é um processo sempre inacabado, mas para pensar a autoria é preciso também pensar o 
modo como entendemos o texto e, em nossa sociedade, um texto é sempre um produto 
acabado. Quando colocamos um ponto final no texto se produz aquilo que Gallo (2008) 
chamou de efeito de fecho e ao produzir esse efeito de fecho temos simultaneamente a 
produção de um efeito-autor. 
Quando falamos em “efeito” isso significa que algo se produz imaginariamente. Como 
vimos na Unidade Il, o texto se produz na prática da textualização. Um ótimo exemplo 
desse efeito de fecho é quando, na faculdade, solicitam a você a realização de um 
trabalho ou pesquisa, com um prazo determinado para a entrega. Você fará sua pesquisa, 
irá reunir vários “fragmentos” de outros textos, mesclar com suas próprias formulações 
textuais, assinará seu nome no final e entregará na data definida. Ao fazer isso você 
assumiu a posição sujeito aluno, deu um efeito de unidade ao seu texto e assim produziu 
o efeito-autor. Mas você sabe que seu texto poderia não ter se encerrado ali, que você 
poderia, se não tivesse um prazo de entrega, trabalhar no seu texto ainda por vários dias, 
modificando, alterando, ampliando. Ele não acaba, ele não tem fim, mas quando 
colocamos um ponto final e entregamos produzimos esse efeito de fim: efeito de fecho. 
Todo texto que produz esse efeito de unidade final produz um efeito-autor, aquele que 
assume a autoria desse produto final. 
Como já estudamos ao falar sobre texto e textualização, o autor formula seu texto a partir 
de uma “costura” de outros textos e, nesse sentido, a função-autor não se liga 
diretamente com o processo de legitimação do texto, uma vez que quanto mais função- 
autor menos legítimo será o texto produzido. Ou seja, quanto mais livre o sujeito se sentir 
para formular seu texto, mais ele pode derivar para o impensado e o não interpretável. 
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Nesse sentido a função-autor se diferencia do efeito-autor pois o efeito-autor serve para 
para descrever os processos de legitimação dos discursos, pois quanto mais um texto é 
reconhecível como um texto legítimo mais ele produz efeito-autor, ou seja, é preciso se 
inscrever em um discurso já legitimado (o do aluno acadêmico, por exemplo) para que aí 
seja reconhecido um autor: efeito-autor. 
Um exemplo de como na escola para ser considerado um autor a função-autor deve estar 
apagada é o fato de que sempre se exige de um texto escolar ou mesmo acadêmico no 
qual as marcas de subjetividade estejam apagadas. O que isso significa? Significa que é 
preciso aderir à normatização textual, produzir um texto objetivo, apagar todas as marcas 
de um discurso que não seja o discurso de escrita, legítimo. 
Quantas vezes ao receber as correções de um texto escolar seu professor não chamou a 
sua atenção para que você prestasse atenção para não deixar “marcas” muito pessoais 
em seu texto? Somente os textos “acabados”, que produzem um efeito de fecho podem 
produzir o efeito-autor. Historicamente a autoria é relacionada, portanto. aos processos 
de legitimação em que se privilegia a paráfrase (pela repetição de discursos já 
legitimados e em circulação) e menos a polissemia. 
Para a AD, diferente de algumas teorias linguísticas como a Linguística Textual, por 
exemplo, interessa menos pensar a coesão e coerência de um texto, e mais o modo como 
determinados discursos se textualizam, ou seja, o modo como os recortes discursivos são 
provenientes de outros textos, outros discursos. Privilegiar apenas textos que produzem 
o efeito-autor em grande parte dos casos, sobretudo no contexto escolar, é privilegiar a 
repetição sem produção de historicidade. Assim, não seria incorreto afirmar que quanto 
mais original e menos legível for o texto, mais função- autor e quanto mais repetição e 
mais legível for o texto, mais efeito-autor. 
Ao falar em função-autor e efeito-autor podemos perceber que a questão da autoria se 
relaciona com o modo como nos relacionamos com o conhecimento. É por isso que 
dizemos que no contexto escolar atual trabalhamos mais a necessidade de produção 
textual com efeito de fecho e efeito-autor do que com os fragmentos textuais ou com os 
textos que não se enquadram em um modelo estabelecido, como uma posição sujeito 
reconhecível. 
PENSANDO JUNTOS 
“O que dizemos ou deixamos de dizer e como dizemos em nossos textos são “falas” 
que “ecoam e reverberam efeitos de nossa história em nosso dia-a-dia, em nossa 
reconstrução cotidiana de nossos laços sociais, em nossa identidade histórica” 
Autor: Schons (2005, p. 154) 
79 - 140
E-Book - Apostila 
LEITURA E EFEITO LEITOR 
Antes de falarmos de leitor é preciso definir que a noção de leitura é uma noção que 
possui ela mesmo múltiplos sentidos: “Leitura de mundo”, “ Leitura de uma obra”, “Leitura 
como forma de atribuição de sentidos” (ORLANDI, 1988, p. 8). Mas o sentido de leitura que 
interessa para a AD é aquele que diz respeito à interpretação. Se os dizeres, na 
perspectiva da AD, estão na relação com o interdiscurso e com a memória, a leitura diz 
respeito aos modos de gerenciamento da memória coletiva. Desse modo há uma divisão 
que 
" 
“[...] separa os que estão autorizados a ler, escrever e 
falar em seus nomes e todosos outros que, na cópia. na 
transcrição, na classificação, na indexação, na 
codificação, repetem incansavelmente gestos (de 
interpretação) que os apagam por detrás da instituição 
(ORLANDI, 2007, p. 134). 
q J 
Isso significa dizer que, para a AD, os sentidos de um texto não são dados nem pelo autor 
nem pelo leitor no sentido empírico, mas que há sentidos possíveis de serem lidos, de 
acordo com as determinadas condições de produção, em determinadas circunstâncias. 
Em outras palavras, para a AD o sentido sempre pode ser outro, mas nunca poderá ser 
qualquer um. Como escreve Orlandi (2007, p. 136) 
8o - 140
E-Book - Apostila 
há espaços discursivos estabilizados, ou seja, há técnicas 
materiais, há técnicas de gestão social dos indivíduos, há 
espaços que repousam, quanto a seu funcionamento 
discursivo interno, sobre uma proibição de interpretação 
(não se poder dizer “em certo sentido”, “se podemos 
dizer”, etc.) Há, portanto, estabilidade que resulta em 
interdição à interpretação. 
J 
Para a AD os falantes comuns interpretam os textos a partir de um “dispositivo ideológico 
de interpretação” (ORLANDI, 2007, p.141), o que significa dizer que sempre que lemos um 
texto de um determinado modo e não de outro estamos afetados pela memória discursiva 
sem necessariamente nos darmos conta desse afetamento. Diante de qualquer objeto 
somos convidados a “significar” ou seja estamos condenados a interpretar. 
Como vimos, no processo de produção de um texto o sujeito-autor sempre se relaciona 
com as formações imaginárias o que significa que ele sempre produz o seu texto 
projetando um leitor. Nessa concepção 
a relação básica que instaura o processo de leitura é o do 
jogo existente entre o leitor virtual e o leitor real. É uma 
relação de confronto. O que, já em si, é uma crítica aos 
que falam em interação do leitor com o texto. O feitor não 
interage com o texto (relação sujeito-objeto), mas com 
outro(s) sujeito(s) (leitor virtual, autor, etc.) A relação [...] 
sempre se dá entre homens, são relações sociais; eu 
acrescentaria, históricas, ainda que (ou porque) mediadas 
por objetos (como o texto). [...] Leitura e sentido, ou 
melhor, sujeitos e sentidos se constituem 
simultaneamente, num mesmo processo. Processo que se 
configura de formas muito diferentes, dependendo da 
relação (distância maior ou menor) que se estabelece 
entre o leitor virtual e o leitor real (ORLANDI, 1988, p. 10). 
J 
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E-Book - Apostila 
É importante, ainda, destacar que a leitura implica não apenas em atribuir sentido ao que 
está dito, mas também ao que não está no dito, mas que está significando no modo como 
o texto diz e não diz. Do mesmo modo como vimos que o autor é aquele que “costura” 
sentidos a leitura determina que os sentidos que podem ser lidos em um texto fazem 
parte também de sua relação com outros textos. Para ser um leitor não basta, portanto, 
adquirir certas habilidades de decodificação ou de leitura, é preciso saber compreender “o 
que um texto diz e o que ele não diz, mas o constitui significativamente”. Como já vimos 
nas primeiras unidades deste livro. 
Por ora, o que é importante ressaltar na relação do leitor com o texto é que não lemos em 
um texto aquilo que “desejamos” e nem de qualquer forma. Se a produção do texto é 
regulada por mecanismos institucionais de legitimação a leitura também é regulada. Para 
a AD interessa afirmar que há sempre uma determinação histórica que faz com que em 
determinado período alguns sentidos e não outros possam ser lidos. Desse modo, 
N 
leituras que são possíveis, para um mesmo texto, em 
certas épocas não o foram em outras e leituras que não 
são possíveis hoje o serão no futuro. [...] os sentidos não 
são propriedade privada: nem do autor e nem do leitor 
(ORLANDI, 1988, p. 86). 
A J 
Assim, se falamos de um efeito-autor também podemos falar de um efeito-leitor. O 
efeito-leitor “à representação de unidade textual, efeito da relação do autor com o texto 
[...] corresponde a unidade da leitura [...] resultante do efeito-leitor” (ORLANDI, 1988, 
p.104). Em uma perspectiva discursiva o leitor é aquele que assume uma posição sujeito- 
leitor em uma ordem social dada, em um lugar específico. Ele não corresponde, 
necessariamente, ao leitor virtual projetado pelo autor. É, portanto, do leitor 
82-140
E-Book - Apostila 
inscrito no social, que se cobra um modo de leitura 
(coerência, unidade, etc.). Dessa forma, na produção de 
leitura, ele entra com as condições que o caracterizam 
sócio-historicamente. Ele terá, assim, sua identidade de 
leitura configurada pelo seu lugar social e é em relação a 
“esse” lugar que se define a “sua” leitura. O efeito-leitor é, 
pois, relativo à posição-sujeito (ORLANDI, 1988, p. 104). 
NU J 
Nesse sentido, interessa ao analista de discurso passar de um processo de leitura 
superficial, compreendendo os processos de leitura que levam o sujeito à compreensão 
de um texto. Não se trata de afirmar qual a leitura “correta”, ou qual a “interpretação” 
indicada. mas sim de mostrar que os sujeitos e sentidos se constituem sócio- 
historicamente. Ler, nesse sentido, é compreender 
N 
A análise de discurso não é um método de interpretação, 
não atribui nenhum sentido ao texto. O que ela faz é 
problematizar a relação com o texto, procurando apenas 
explicitar os processos de significação que nele estão 
configurados, os mecanismos de produção de sentidos 
que estão funcionando. Compreender, na perspectiva 
discursiva, não é, pois, atribuir um sentido, mas conhecer 
os mecanismos pelos quais se põe em jogo um 
determinado processo de significação. (ORLANDI, 1988, 
2.117) 
PENSANDO JUNTOS 
83-140
E-Book - Apostila 
Você já considerou que quando lê um texto está ocupando um lugar determinado? 
Quantas vezes não sentimos que o autor parece que escreveu aquele texto 
especialmente para nós e, outras vezes, parece que não entendemos nada do que o 
texto quer dizer? Não se trata de saber ou não saber ler, se trata de ocupar uma 
posição sujeito a partir da qual aquele texto produz sentido. É preciso, pois, se 
identificar com o que é dito. 
Fonte: as autoras 
A AUTORIA NO COTIDIANO 
Discutimos bastante sobre o modo como a autoria e a leitura são processos sócio- 
historicamente constituídos que afetam o modo de produção dos sentidos em nossa 
sociedade. Mas cabe ainda nos perguntar de que modo a escrita se produz no cotidiano, 
ou seja, como podemos pensar a autoria e a leitura nas práticas cotidianas e não apenas 
nas produções escritas facilmente reconhecidas? Haveria em nossas práticas cotidianas 
formas de escrita que relativizariam as noções de autor e leitor do modo como estamos 
habituados a pensar? 
Vamos pensar, por exemplo, nas formas de produção de um trabalho acadêmico ou 
escolar realizado em equipe: além da referência aos autores que geralmente informamos 
na “capa” do trabalho a ser entregue ao professor, de que modo a autoria coletiva do 
texto poderia ser percebida? O efeito-leitor que esse texto coletivo produz não é a de um 
único autor? (um texto com unidade estável, com coesão e coerência, sem dispersão?). 
Pense agora no contrário, em um texto escrito há várias mãos, mas assinado por um 
único autor ou sem identificação de autoria, como, por exemplo, um texto publicitário? 
Como pensar a autoria de uma propaganda, sendo a propaganda um texto construído por 
diferentes sujeitos e sem o nome do autor? 
Todas essas questões são complexas e não pretendemos respondê-las aqui, elas servem 
apenas para ilustrar que por mais que as noções de autoria e de leitura tenham já certos 
sentidos estabilizados, como mostramos nas aulas anteriores, elas ainda não foram 
totalmente problematizadas. Esse é também o trabalho do analista de discurso, buscar 
problematizar como determinados sentidos como o de autor e leitor, por exemplo, 
ganham maior força do que outros e porque até agora eles forampouco relacionados à 
uma escrita cotidiana. Por que até aqui pensamos a autoria e a leitura de uma forma e não 
de outra? 
Consideramos que a escrita do cotidiano faz balançar os sentidos estabilizadas de autor e 
leitor, sobretudo aqueles que se fixam, como vimos, em um discurso de escrita, com suas 
filiações há uma forma determinada de registro, com regras e normas. 
84 - 140
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Além dos textos escritos e legitimados não temos em nossas práticas cotidianas outras 
formas textuais e discursivas que colocam em jogo os processos de autoria e de leitura? 
Por exemplo, é possível ler uma obra de arte? Uma dança? É possível ler a cidade? Do 
ponto de vista discursivo, sim. Você acha isso estranho? Vejamos então como isso é 
possível. 
Orlandi (2004) em um belo livro intitulado “Cidade dos Sentidos”, do qual já indicamos a 
leitura, fala um pouco de como a AD pode pensar a(s) escrita(s) e leitura(s) da cidade. “ 
a 
Ora, se a cidade é um espaço social que é politicamente 
dividido, um espaço em que o público está rarefeito, isto 
estará presente também nas manifestações de linguagem 
que este espaço suporta. Sendo a linguagem um fato 
social, a própria escrita, a organização da linguagem tem 
a ver com o modo como, materialmente, esse espaço de 
significação se organiza. Também falamos da escrita 
urbana, pensando a relação da população com a escola 
lugar de institucionalização da escrita) com os 
instrumentos linguísticos, com a forma como a 
publicidade administra a visibilidade gráfica no espaço da 
cidade, etc. (ORLAND|, 2004, p. 106). 
J 
É interessante pensar, como a autora propõe, que os textos se produzem também fora do 
espaço da escola e das editoras. E, se já texto fora desses espaços, também haverá 
autores, certo? Como exemplo de um tipo diferente de autoria, Orlandi (2004) propõe 
pensar as pichações. Como um muro pichado, por exemplo, produz sentidos, mesmo 
quando as pichações são tidas como textos incompreensíveis para muitos de nós? Para a 
autora, uma pichação ilegível faz sentido na medida em que reconhecemos que vivemos 
em uma sociedade na qual grafitar ou pichar é uma forma de escrita a partir da qual os 
sujeitos marginalizados (no caso do picho, sobretudo) buscam produzir um sentido que os 
signifique de algum modo. Sobre a multimodalidade textual, cabe salientar que 
85-140
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N 
O ininteligível faz sentido porque o indecifrável é 
interpretado por grupos segregados, que também 
“comunicam” entre si, fora da ideologia da informação e 
da comunicação (como os outdoors, por exemplo). 
Escrevem, invertendo a racionalidade urbana do jogo da 
quantidade (poucos são os eleitos e muitos são a 
periferia, ou são a periferia); a cidade cobre-se de 
escrituras, grafismos, tags, letras sinuosas e 
indescritíveis. Indecifráveis, para muitos. [...] O sujeito 
pichador de hoje não manda mensagens. Ele se significa 
na criação da sua letra. Não reconhece, não se reconhece 
no regime da alfabetização, das letras distribuídas pela 
escola, na ortografia do certo e do errado [...]. O pichador 
elabora seu sistema e não se submete ao parâmetro do 
certo-errado. Ele resiste com sua letra indecifrável, 
fazendo deslizar a escritura, produzindo um efeito 
metafórico da letra, produzindo um sistema de escrita 
urbano. Sua ilegitimidade é também construída em outro 
lugar, também urbano: o direito de usar (“sujar”) ou não 
os muros (aí chamados de espaços públicos “sagrados” 
para o “coletivo” (ORLAND!I, 2004, p. 106 -107). 
q J 
Assim como o sujeito pichador produz em sua escrita não legítima gestos de autoria no 
cotidiano, o analista de discurso pode aí também ler a cidade de um certo modo. É isso 
que faz a autora Eni Orlandi quando, ao buscar compreender a escrita do pichador pode 
atribuir determinados sentidos a essa escrita que não apenas os sentidos advindo de um 
senso comum que lê na pichação a “sujeira” e a “poluição visual”. Para a autora, a 
pichação é uma escrita que significa uma denúncia da exclusão social. 
“[..] Para que não haja manifestação de hostilidade no 
monumento do Centro, é preciso cuidar que haja espaço 
de vida suportável (sustentável?) na periferia” (2004, 
p.112). 
86-140
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Daí a importância de pensarmos a escrita no cotidiano, porque não podemos nos separar 
jamais do social. É um engano excluir o social, porque ao nos afastar do social ele não 
deixa de existir. 
E o que tem, então, a escola a ver com essa escrita no cotidiano? A escola, do ponto de 
vista da autora, se fecha para formas tradicionais de escrita e não permite compreender 
as outras formas de escrita e autoria que estão se formando. 
Há uma mudança nas formas tradicionais de 
comunicação, mudança que as escolas não estão 
percebendo ou dando atenção ou mesmo entendendo. [...] 
Uma dessas novas experiências de linguagem é, como 
estamos mostrando, a pichação, o grafite. O grafismo na 
parede é comunicação, embora na escola não seja 
considerado. As pessoas aceitam passivamenie uma 
montanha de publicidade mas não aceitam o grafite, a 
pichação (ORLANDI, 2004, p.113). 
Nu J 
Como vemos, não se trata de pensar nesse caso o bom ou mau uso da Língua portuguesa 
na produção de um texto, mas de considerar que há, na sociedade, outras formas de 
escrita sejam elas legitimadas ou não. Historicamente sabemos que nem todas as formas 
de escrita produzidas ao longo dos tempos se constituíram como formas legítimas, mas 
isso não impediu que mesmo frente à imposição de uma Língua Portuguesa, a língua da 
coroa, deixássemos de produzirmos uma escrita nossa, brasileira, adotando traços de 
nossa oralidade, de nossa identidade, nossa brasilidade. 
Olhar, portanto, para a escrita no cotidiano é ir além dos textos e pensar como a questão 
da autoria se coloca frente a outras materialidades significantes: som, imagem, 
movimento, etc. 
Assim, 
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“[..] a conquista do texto se alarga em outras formas de 
(se) dizer. Modos de constituírem-se os sujeitos da 
significação. São muitas as formas de autoria.” (ORLANDI, 
2004, p. 118). 
INDICAÇÃO NA WEB 
Como o AD trabalha principalmente com análises e o assunto da autoria é um tema 
bastante importante para quem trabalha com a linguagem, saiba mais lendo uma 
análise da autoria a partir da leitura de uma seção de cartas do leitor, em artigo 
publicado pela pesquisadora Angela Corrêa Ferreira Baalbaki (UFF/Capes), intitulado 
Seção de Cartas: quando o leitor é autor. 
[O artigo tem como objetivo identificar a constituição da autoria na seção de cartas 
de leitores da revista Ciência Hoje das Crianças, uma das publicações do Instituto 
Ciência Hoje - uma organização social de interesse público sem fins lucrativos, 
vinculada à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) - cuja principal 
meta é a divulgação da ciência para a sociedade.). 
APROFUNDANDO 
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A partir dos estudos a respeito da autoria, da interpretação, da função-autor, efeito-autor 
e efeito- leitor, pudemos tecer algumas considerações sobre a escrita e a autoria no 
cotidiano, caminhando para uma concepção de autoria que não apenas aquela 
cristalizada pelo discurso escolar. 
É importante destacar que a questão da autoria está em relação, portanto, com qualquer 
prática de linguagem, não apenas àquelas tradicionalmente conhecidas e de escrita. 
A partir do que estudamos foi possível perceber que a forma como tradicionalmente 
concebemos o que é um autor está fortemente ancorada em nossa relação com a escrita, 
sobretudo a escrita tradicional. 
A respeito dessa discussão percebemos que não só concedemos ao autor um privilegiado, 
a partir de práticas legitimadas, como isso afeta o modo como consideramos o que é um 
leitor. Quantas vezes você já ouviu o seguinte enunciado? 
O que justifica a recorrência de enunciados como o presente nesta imagem em nosso 
cotidiano?Diríamos, a partir das reflexões realizadas, que esse enunciado é possível 
porque já temos uma concepção de autor. Por que é possível dizermos isso? 
Frequentemente ouvimos falar que os brasileiros não leem, que na Europa, por exemplo, o 
hábito da leitura é mais regular e que todo mundo lê, entre outras observações 
generalizadas deste tipo. Também é comum lermos em revistas e jornais matérias e 
pesquisas que nos “informam” a “baixa” quantidade de leitores que temos no Brasil. Um 
exemplo: 
Figura 4 - 
Ls 
Em 18 de maio de 2016 a escritora Babel, publicou em seu Blog no 
jornal O Estadão, uma reportagem sobre uma pesquisa chamada 
“Retratos da Leitura”, cujo resultado estatístico afirmava que "44% 
da população brasileira não lê e 30% nunca comprou um livro” 
(RODRIGUES, 2016). 
CR, 
Essa reportagem, portanto, sustenta a repetição do enunciado “eles não leem!”, presente 
no imaginário coletivo brasileiro sobre o que é leitura. 
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Observe que há uma relação direta entre os “44% da população que não lê” com uma 
outra porcentagem que é “30% nunca comprou um livro". Mas como é possível essa 
relação? Porque relacionamos leitura e autoria! Veja, do ponto de vista dessa relação, 
para ser considerado “leitor” é preciso ter contato com o livro, para que haja livro é 
preciso que haja autor. Isso implica que se lemos textos todos os dias, mas não são textos 
que circulam em livros, são textos que não tem um efeito-autor e, consequentemente, 
não há também o efeito-leitor. 
Se avançamos na leitura dessa mesma matéria, por exemplo, veremos que essa 
concepção se confirma em várias outras afirmações da pesquisa noticiada. 
"Para a pesquisa, é leitor quem leu, inteiro ou em portes, 
pelo menos 1 livro nos últimos 3 meses. Já o não leitor é 
aquele que declarou não ter lido nenhum livro nos últimos 
3 meses, mesmo que tenha lido nos últimos 12 meses. ” 
(RODRIGUES, 2016) 
q J 
Percebemos, assim, que há, aí, uma concepção bem definida do que é ser autor e ser 
leitor em nossa sociedade. Mas, à luz das discussões que realizamos nessa unidade já 
temos condições de ter uma compreensão melhor de tais noções. 
A partir do que estudamos sobre autoria já temos condições de dizer que não podemos 
considerar que não são leitores aqueles que não leem livros. E, do mesmo modo, não são 
autores apenas aqueles que chamamos de “escritores de livros”. Há aí toda uma 
problemática que diz respeito à questão da legitimidade. “Aqueles que são considerados 
não-leitores leem, mas leem coisa diferente daquilo que o cânone escolar define como 
uma leitura legítima”. (CHARTIER, 1998, p.104). No caso do enunciado genérico tão 
difundido “Eles não leem!” e, também, da matéria que afirma que 44% da população 
brasileira não lê, trata-se do modo como legitimamos também o que é um autor. Segundo 
os discursos materializados nos enunciados analisados. um autor é aquele que escreve 
um livro, ao mesmo tempo em que um leitor é aquele que lê livros 
Desse modo é que podemos afirmar que todo texto se produz pela função- autor, mas 
para produzir o efeito-autor e o efeito-leitor é necessário que o texto seja um tipo de 
texto legitimado: um livro, uma obra de arte, um música, uma poesia. 
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Com os modos de escrita cotidianos e o avanço da tecnologia, no entanto, essa noções 
estão sofrendo deslocamentos. Podemos pensar, por exemplo, exatamente o inverso do 
que as afirmações acima indicaram já que, com os aparelhos tecnológicos e os variados 
instrumentos aos quais temos acesso hoje, nunca lemos tanto, coisas diversas, o dia 
inteiro. Mas aí começamos a entrar em outras questões que envolvem pensar as noções 
de autor e leitor frente à novas materialidades discursivas. É por isso que convidamos 
você a debater as materialidades discursivas na próxima etapa de nossos estudos! Vamos 
lá? 
Referências 
RODRIGUES, Maria Fernanda. 44% da população brasileira não lê e 30% nunca comprou 
um livro, aponta pesquisa Retratos da Leitura. 
Disponível em: <http://cultura.estadao.com.br/blogs/babel/44-da-populacao-brasileira-n 
ao-le-e-30-nuncacomprou-um-livro-apontapesquisa-retratos-da-leitura/>. Acesso em: 
26 jun. 2017. 
Novos Desafios 
Neste estudo nos dedicamos a pensar as questões de autoria e o modo como pensar o 
que é um autor e um leitor afetam a nossa relação com os textos e com os sentidos por 
eles produzidos. Vimos que a questão da autoria é pensada de forma variadas em 
diferentes autores e que, a partir de uma perspectiva discursiva podemos, inclusive, 
pensar o que é ser autor, como ser autor hoje é diferente de ser autor em outros 
momentos históricos. 
Pudemos com essa reflexão compreender como a questão da autoria envolve uma relação 
com o poder, com o modo como em nossa sociedade alguns discursos são mais 
legitimados que outros, o modo como precisamos de um reconhecimento determinado 
para que haja a consideração da autoria. Nesse percurso foi possível discutir a nossa 
relação com os saberes escolares, que definem um modo específico e legitimado de 
autoria, influenciando a nossa relação com a língua e com a nossa própria escrita. 
Ao discutirmos essa relação pudemos compreender que há outras práticas de escrita que 
também permitem uma assunção de autoria, como no exemplo estudado da escrita 
cotidiana. Embora a autoria seja sempre relacionada a uma escrita legitimada, como a 
estudada na escola, os sujeitos produzem gestos de autoria em outras práticas que se 
disseminam e que mostram o quanto a autoria se relaciona com um jogo de forças a partir 
do qual o que está em jogo é a própria constituição dos sujeitos, seus modos de significar 
e se significar cotidianamente, por meio de uma escrita. 
Compreendemos, ainda, que interpretação, função-autor, efeito-autor, efeito-leitor, são 
noções discursivas que nos permitem compreender a relação entre os sujeitos, a língua e 
a história, implicadas em uma relação de contradição com as práticas de autoria em uma 
sociedade dominada pelo discurso da escrita. 
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Esperamos que este estudo tenha contribuído para abrirmos uma reflexão que amplie a 
consideração da autoria para fora dos domínios dos saberes estritamente pedagógicos, 
fazendo com que possamos pensar a relação dos sujeitos com a língua em outros 
domínios. Por isso convidamos você para nos acompanhar em uma discussão que 
buscará pensar novas formas de autoria, a partir do estudo das materialidades 
significantes. Vamos lá?! 
VAMOS PRATICAR? 
Chegou o momento de testar o conhecimento adquirido até aqui! Para isso, por favor, 
participe da autoatividade que preparamos especialmente para você. São apenas 
3 questões 
1. Entre os estudiosos que pensaram a 
questão do autor está o filósofo Michel 
Foucault. Tendo em vista o modo como 
este autor pensa a questão da autoria, 
assinale a alternativa correta. 
a) O autor possui uma relação com o nome próprio, pois sempre 
(a) remetemos o texto à pessoa que o escreve, ao fato de que há 
autores que produzem palavras que não são cotidianas, que têm 
um status dado por um autor determinado, legitimado. 
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Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
b) Ser autor aponta para o fato de que um autor é sempre 
relacionado a um discurso determinado, logo não importa sua 
relação com um nome próprio. 
(C) c) O autor é aquele que escreve, não existe na questão da autoria 
nenhum relação de poder. 
O d) Ser autor de um texto requer apenas originalidade, quanto mais 
original e singular a obra, mais rápido se reconhecerá a sua autoria. 
(e) e) Um autor não precisa de reconhecimento nem legitimidade, seu 
texto dirá por ele mesmo se ali há um autor ou não. 
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2. É importante discursivamente 
distinguir autor de escritor. Para 
explicar a relevância dessa distinção 
considere a veracidade ou falsidade 
das assertivas e assinalea alternativa 
correta. 
Todo o escritor é um autor reconhecido por sua 
relação com uma obra determinada. 
O autor, para a AD, é uma posição-sujeito, um efeito 
produzido pelo texto. 
Discursivamente a autoria é pensada a partir das 
noções de função-autor e efeito-leitor. 
Apenas escrever e grafar não constituem autor, para 
produzir autor o texto precisa produzir o efeito-autor. 
A função-autor pode ser relacionada com o nível 
enunciativo, uma vez que ela se produz pelo modo 
como o sujeito autor formula o seu texto. 
(a) av VV VV 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
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b)JF.F.F,F.F 
JVY VV, F. 
DFFFEVAMV 
JFV.F VV 
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3. Sobre o efeito-leitor, é possível 
afirmar que não só o autor, mas 
também o leitor é responsável pelos 
sentidos do texto. Com relação a essa 
condição discursiva que determina que 
o discurso é sempre “efeito de 
sentidos entre interlocutores”, analise 
as assertivas: 
i Para a análise do discurso, o falante comum 
interpreta o texto a partir de um dispositivo 
ideológico de interpretação, que lhe permite entender 
yenãox. 
ii Na perspectiva discursiva, o leitor assume uma 
posição sujeito-leitor em determinada ordem social. 
Nesse contexto, nem sempre ele corresponde à 
projeção de leitor virtual feita pelo autor. 
iii Se um autor imagina o leitor de forma errada, o seu 
texto será mal interpretado. 
iv. Para ser um leitor eficiente basta adquirir habilidade 
de leitura, aprendendo a decodificar os textos. 
v. O sentido de todo texto está no que ele diz 
explicitamente apenas, as informações implícitas não 
interferem na produção de sentidos do texto. 
Estão corretas: 
(a) a) As assertivas | e Il, apenas; 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
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OQ b) As assertivas III, IV e V, apenas; 
OQ c) As assertivas | e IV, apenas. 
OQ d) As assertivas |, Il e III, apenas. 
(e) e) As assertivas IV e V, apenas. 
REFERÊNCIAS 
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CHARTIER, Roger. A aventura do livro. Do leitor ao navegador. Conversações com Jean 
Lebrun. 1º reimpressão. Tradução Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes. São Paulo: 
Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/Editora UNESP, 1998. 
FEINBERG, Ashley. 120 artigos científicos foram criados em “gerador de lero-lero" e 
ninguém percebeu. Gizmodo: Brasil. Online, 01 mar. 2014. p. 1-1. 
Disponível em: <http://gizmodo.uol.com.br/gerador-artigos-cientificos/>. Acesso em: 30 
maio 2017. 
FOUCAULT, Michel. O que é um autor? In: FOUCAULT, Michel. Ditos e Escritos: Estética - 
literatura e pintura, música e cinema. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 264- 
298. (Volume III). 
GALLO, Solange L. Da escrita à escritoralidade: um percurso em direção ao autor online. 
In: RODRIGUES, Eduardo Alves; SANTOS, Gabriel Leopoldino dos; CASTELLO BRANCO, 
Luiza Katia Andrade. (Org.). Análise de Discurso no Brasil: pensando o impensado sempre. 
Uma homenagem a Eni Orlandi. Campinas, SP: Editora RG, 2011. 
GALLO, Solange. Como o texto se produz: uma perspectiva discursiva. Blumenau: Nova 
Letra, 2008. 115 p. 
ORLANDI, E. P. Interpretação; autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 
Campinas, SP: Pontes,2007. 
ORLANDI, E.; GUIMARÃES, E. Unidade e Dispersão: uma questão do sujeito e do discurso. 
Discurso e Leitura. São Paulo/Cortez, Campinas/Ed. da 
ORLANDI, Eni P.. Cidade dos Sentidos. Campinas-sp: Pontes, 2004. 
SCHONS, Carme Regina; ROSING, Tania M. K. (Org.). Autoria e escrita. In: SCHONS, Carme 
Regina; ROSING, Tania M. K. (Org.). Questões de Escrita. Passo Fundo: Ufp, 2005. p. 150- 
160.0rlandi (2007, p.70) UNICAMP, 1988 
MATERIALIDADES DISCURSIVAS 
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Inicie sua Jornada 
Neste estudo estudaremos a noção de materialidades discursivas, pensando a sua 
relação com noções e análises discursivas mais atuais, tendo em vista a diversidade de 
materiais que são hoje objeto de análise da Análise de Discurso. 
A noção de materialidades discursivas surge no campo da AD francesa no momento em 
que Michel Pêcheux - e o grupo de pesquisadores que se reuniam em torno dele - 
procuravam pensar a noção de arquivo, considerando uma variedade de textos que 
exigiam uma reflexão sobre a leitura e o modo como um conjunto heterogêneo de 
materialidades circulam em nossa sociedade, produzindo sentidos. 
Tendo em vista que a noção de materialidades discursivas permite aos analistas de 
discurso pensar tal variedade de textos, abrindo para a análises que não se fechavam no 
discurso político, estudaremos agora como essa noção permitiu estudos que pensassem 
a relação entre discurso e arquivo, discurso e corpo, discurso e digital, considerando que 
há nesse campo de estudos sempre a preocupação em trabalhar com diferentes 
materialidades significantes. 
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Dessa forma, apresentaremos na aula 1, a origem da noção de materialidades discursivas; 
na aula 2, falaremos da sua relação com os estudos discursivos sobre o arquivo, e o 
tratamento de textos; na aula 3 apresentaremos a noção de materialidades significantes 
proposta por uma pesquisadora do discurso brasileira, para pensar a materialidade fílmica 
e a sua imbricação material; na aula 4 veremos algumas possibilidades de análise 
discursiva sobre o corpo, considerando o corpo como materialidade discursiva. E, 
finalmente, na aula 5, veremos o modo como o digital se relaciona com os estudos 
discursivos, buscando apresentar discussões atuais sobre a questão. 
Esperamos que este estudo possa ilustrar a diversidade de possibilidades de trabalho 
com a teoria discursiva. Desejamos a você um bom estudo e ao final deste encontro você 
tenha a dimensão da riqueza desse campo teórico para pensar a relação sujeito, língua e 
história. 
Desenvolva seu Potencial 
A NOÇÃO DE MATERIALIDADES DISCURSIVAS 
Materialidades Discursivas foi o título de um Colóquio ocorrido em Nanterre, em abril de 
1980, organizado por Michel Pêcheux e outros pesquisadores como: Bernard Conein, 
Jean-Jacques Courtine, Françoise Gadet e Jean-Marie Marandin. O Colóquio contou com 
mesas redondas com os pesquisadores Antonio Culioli, Jean Pierre Faye, Jacques 
Ranciêre e Elizabeth Roudinesco) convidados de diferentes áreas (Linguistas, 
historiadores, psicanalistas, psicólogos) para um debate em torno da noção de 
materialidades discursivas. Muitos desses teóricos fizeram parte do desenvolvimento 
inicial da AD na França, construindo noções e métodos para a teoria do discurso. Mas o 
que seria, então, materialidades discursivas e porque a AD se ocupava dessa noção já em 
1980? 
Importante ressaltar que os textos debatidos nesse Colóquio foram reunidos em uma 
coletânea produzida por seus organizadores e, traduzido para o português em 2016, em 
uma publicação da editora da Unicamp. 
Na introdução à essa publicação brasileira do Colóquio, Eni Orlandi chama a atenção para 
a confusão e superficialidade com a qual alguns analistas de discursos tratam a noção de 
materialidades discursivas. Isso porque ora ela é entendida como o “corpus” do analista. 
ora como o seu objeto de análise. No entanto, para a autora, a noção de materialidades 
discursivas não pode ser dissociada da relação constitutiva da AD com o materialismo. A 
AD é, antes de tudo, uma teoria materialista e é preciso compreender e não perder de 
vista esse aspecto de sua constituição. 
Isso significa dizer que a AD tem um modo singular de pensar as materialidades que tem a 
ver com a noção de materialismo histórico. 
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O materialismo histórico afirma que o modo de produção 
da vida material condiciona o conjunto de processos da 
vida social , política, etc. Nessa perspectiva teórica, a 
matéria é a substância suscetível de receber uma forma. 
O que interessa, assim, é a materialidade histórica da vida 
dos homens em sociedade, isto é, trata-sede descobrir 
(pelo movimento do pensamento) as leis fundamentais 
que definem a forma de organização dos homens em 
sociedade ao longo da história. Pelo caráter material, os 
homens se organizam na sociedade para a produção e 
reprodução da vida; pelo caráter histórico, sabemos como 
se organizam, no curso da história. Qual é, aí, o lugar da 
linguagem? 
Ora, é possível vislumbrar aí a necessária referência à 
definição da teoria do discurso como determinação 
histórica dos processos de significação. Temos, assim, a 
superação da separação sujeito-objeto, pela contradição 
e pelo movimento do mundo. (ORLANDI, 2016, p.12) 
NU J 
Não perdemos de vista, portanto, que a AD tem relação com a noção de ideologia e que 
essa relação é constitutiva da materialidade do discurso que constituem sujeitos e 
sentidos. 
Nessa perspectiva a preocupação da AD frente às diversas materialidades gira em torno 
do modo como se pensa a heterogeneidade irredutível das materialidades quando 
pensadas na sua relação entre a história, a língua e o inconsciente. 
Pêcheux coloca a questão das materialidades discursivas como sendo, então, esses 
objetos heterogêneos que compõem os arquivos textuais, perguntando aos 
pesquisadores do discurso se eles sabem o que é ler, se sabem o que é ler frente ao esse 
conjunto heterogêneo que se constitui de um 
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remoer de falas ouvidas, relatadas ou transcritas, uma 
profusão de escritos mencionando falas e outros escritos. 
Relatos, privados ou oficiais, verídicos ou idealizados, 
murmúrios secretos e gritos, cartas de todos os tipos, 
profissões de fé, promessas, acusações e confissões, 
poemas, romances e canções, réplicas de teatro (em cena 
e na cidade), programas, sermões, chamados e 
instruções, tratados (de paz ou do vazio) e leis (da 
gravidade, da República, de Talião...), descrições, receitas, 
regulamentos e códigos, lições e conferências, 
proclamações, celebrações, declarações (de guerra ou de 
amor), citações (entre aspas, ou de ordem da Nação), 
inscrições e notas, notas de rodapé, atas, notas de 
infâmia... (PÉCHEUX, 2016, p.24) 
q J 
A proposta do teórico é, portanto, a partir de um visão materialista, considerar a 
contradição e os efeitos ideológicos presentes nessa profusão de textos que circulam em 
nossa sociedade, pensando quais são os efeitos discursivos dessa circulação, buscando 
compreender que aquilo que circula de um certo modo, em um certo momento, nunca 
circula de modo aleatório, mas tem relação com materialidades específicas. 
É) 
SAIBA MAIS 
A pesquisadora Eni Orlandi, a propósito das materialidades discursivas, afirma 
que “o sentido está na materialidade discursiva, no fato de que a língua para 
significar tem que se inscrever na história”. Para compreender isso em uma 
linguagem mais acessível, você poderá ler a entrevista que ela concedeu à Globo 
Universidade e que está disponível na internet. 
Fonte: Orlandi (2012). Adaptado pelas autoras. 
q J 
DISCURSO E ARQUIVO 
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Até aqui nós já fzemos um longo caminho por diferentes aulas, apontando os principais 
conceitos da AD, bem como suas diferentes possibilidades teórico-analíticas. 
Nesta nossa reflexão não pode faltar, portanto, a relação que a AD estabelece entre o 
discurso e o arquivo, sobretudo porque pensar os arquivos textuais foi uma das últimas 
ocupações de Michel Pêcheux e do grupo de pesquisadores que se aventuraram na teoria 
do discurso. 
O arquivo não era uma preocupação menor no pensamento pêcheuxtiano, sobretudo 
porque pensar o arquivo era ainda pensar uma metodologia que considerasse a relação 
entre o discurso e as tecnologias que já em sua época avançavam na elaboração de 
técnicas de arquivos e processamento de dados textuais. 
Um dos textos mais citados, debatidos, (re)discutidos de Michel Pêcheux é o texto 
intitulado “Ler o arquivo hoje”, publicado em francês 1981. 
Segundo Maldidier (2003, p.79) esse texto estava no centro dos debates e reflexões do 
grupo que se reunia em torno de Michel Pêcheux no grupo de pesquisa RCP ADELA, grupo 
que visava trabalhar com pesquisas que relacionassem preocupações sócio-históricas, a 
pesquisa linguística e o desenvolvimento da informática textual. De acordo com a autora, 
o grupo se dividia em três grandes setores: “arquivo sócio-histórico”, “pesquisas 
linguísticas sobre a discursividade” e “informática em análise de discurso”. (MALDIDIER, 
2003, p.79). 
Michel Pêcheux apresenta nesse momento o caminho que deseja seguir para continuar 
pensando a teoria do discurso. 
À questão da análise de discurso se junta agora a das 
leituras de arquivo. Se o problema da leitura colocado 
desde a AAD69 ressurge, é de uma maneira radicalmente 
nova que é abordado. De pronto o termo foucaultiano de 
“arquivo” coloca a leitura em um horizonte que não é mais 
o da “máquina de ler”, mas o do confronto com os textos 
sócio-históricos mais diversos. (MALDIDIER, 2003, p. 79) 
J 
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Ler o arquivo hoje é um texto surpreendentemente atual, uma vez que antecipou 
questões que o desenvolvimento informático só fez reduplicar. A preocupação que esse 
texto aponta para a divisão do trabalho intelectual da leitura de arquivos pode ser 
estendida para as questões da leitura de um modo geral, sobretudo nos dias atuais em 
que temos de um lado textos clássicos, legitimados, produzidos por escritores, 
pesquisadores, cientistas e, de outro lado, textos da escrita cotidiana, heterogêneos, não 
legitimados, produzidos por sujeitos que ocupam as mais variadas posições. E, ainda, o 
atravessamento da informática, dos programadores, dos softwares que definem o que e 
como podemos, devemos, escrever, publicar. São muitas as questões atuais sobre a 
relação entre os discursos e os arquivos. 
Diante das inúmeras possibilidades de tratar da relação discurso e arquivo gostaríamos 
de enfatizar aqui a questão da leitura que estava no cerne da reflexão pêcheuxtiana sobre 
o arquivo. 
Para Pêcheux, de um modo amplo o arquivo sempre foi compreendido como “um campo 
de documentos disponíveis e pertinentes sobre uma questão”, mas era justamente essa 
transparência do arquivo que era preciso relativizar. Ou seja, para o autor é preciso 
questionar como esse “conjunto de documentos” aparece como o que devemos ler e, 
ainda mais importante, é compreender porque alguns têm mais direitos de ler e, 
posteriormente, dizer o que aos demais o que é “pertinente” ler. 
Segundo o autor, os autorizados a ler e a dizer o que se deve ler em nossa sociedade até 
aquele momento eram os “literatos”, os homens das letras (filósofos, historiadores, etc). 
No entanto, com o desenvolvimento da científicos e das tecnologias esse privilégio da 
leitura estava passando para a mão dos técnicos (os criadores dos instrumentos e dos 
tratamentos de textos e arquivos). Para Pêcheux, se tratava de duas vertentes da leitura 
de arquivo: “duas culturas que a tradição escolar-universitária designa respectivamente 
como “literária e a “científica” (PÉCHEUX, 2010, p.50), cada uma delas possui uma 
prática diferente de leitura de arquivo apontando para uma divisão social do trabalho de 
leitura. Essa divisão remete a um conflito nos modos de leitura dos arquivos. apontando 
para o modo como nos relacionamos com o conjunto de documentos “disponíveis e 
pertinentes sobre uma questão”. 
Quem tem o direito de produzir, disponibilizar e ler esse arquivo que aparece como 
“dado*? Quem é que constrói esses arquivos? Quais são os gestos de leitura que definem 
antes o que irá compor o arquivo como sendo o conjunto de textos mais “relevante” e 
“pertinente” sobre uma questão? É importante destacar que havia na reflexão do autor 
uma crítica ao distanciamento dessas duas culturas, já que historicamente sempre se 
deram as costas, julgando cada uma delas que faziam uma leitura que dispensava os 
conhecimento do outro campo.De um lado, filósofos e historiadores que ignoram os 
procedimentos técnicos que envolviam a leitura e, de outro lado, os técnicos e cientistas 
que dispensavam o saber erudito, etc. 
Importante ainda relembrar que Pêcheux chamava a atenção para o fato de que os 
literatos estarem perdendo seus privilégios de leitura dos arquivos, já que cada vez mais 
o tratamento informatizado dos textos conduziam os técnicos (científicos) a um lugar 
privilegiado de leitura. Era esses últimos que ganhavam espaço e passavam a definir o 
que era “pertinente” e o que deveria estar “disponível” para ler. 
Ao fazer tais questionamento sobre o modo de construção dos arquivos mostra-se a 
preocupação principal do analista de discursos, pois, para ele 
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Seria do maior interesse reconstruir a história deste 
sistema diferencial dos gestos de leitura subjacente, na 
construção do arquivo, no acesso aos documentos e qa 
maneira de apreendê-los, nas práticas silenciosas da 
leitura “espontânea” reconstituíveis a partir de seus 
efeitos na escritura: consistiria em marcar e reconhecer 
as evidências práticas que organizam essas leituras, 
mergulhando a “leitura literal” (enquanto apreensão do 
documento) numa “leitura” interpretativa - que já é uma 
escritura. Assim começaria a se constituir um espaço 
polêmico das maneiras de ler, uma descrição do “trabalho 
do arquivo enquanto relação do arquivo com ele mesmo, 
em uma série de conjunturas. trabalho da memória 
histórica em perpétuo confronto consigo mesma. 
(PÉCHEUX, 2010, p. 51) 
Nu J 
Esse projeto de leitura que visava reconstituir um trabalho que defendesse um espaço 
polêmico das maneiras de ler, se reflete na prática da AD, pois implica em descrever e 
desnaturalizar aquilo que aparece como evidente na leitura dos arquivos. Isso porque, 
como já vimos, para a AD não há uma única leitura, não há um sentido unívoco, pois a 
leitura nunca é individual, mas social. Existe a contradição e que a questão da leitura hoje 
não pode apagar a sua relação com a informática. Segundo Pêcheux (2010, p.54) “o 
desenvolvimento da informática e a difusão maciça desta” abre espaço tanto para um 
fortalecimento das leituras interpretativas dos literatos, quanto aponta para o risco de 
uma regulamentação “tanto da produção quanto da interpretação dos enunciados 
científicos, tecnológicos, administrativos...mas também (um dia, por que não?) dos 
enunciados políticos.” (PÊÉCHEUX, 2010, p. 55). Em outras palavras, o trabalho do analista 
do discurso descrever os gestos que levam ao domínio das práticas de leitura, visando 
defender que não se deve aceitar que seja possível uma única leitura, um único modo de 
ler. 
Nesse sentido, já podemos observar atualmente o modo como a informática, com seus 
softwares e aplicativos, organizam as relações sociais e regulam o funcionamento dos 
arquivos textuais. 
É, portanto, a partir dessa discussão inicial em torno da noção de arquivo que a AD 
começa a abrir o seu campo de investigação para o problema da leitura, pensando as 
diferentes materialidades discursivas que, com o avanço tecnológico, irá impor novas 
formas de pensar nossos arquivos, nossos textos e o modo como as diversas 
materialidades significantes produzem sujeitos e sentidos. 
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INDICAÇÃO DE LIVRO 
Materialidades Discursivasd e Bernard CONEIN, Jean-Jacques COURTINE, 
Françoise GADET, Jean- Marie MARANDIN e Michel PÉCHEUX é a melhor leitura 
para complementar seu aprendizado nesta aula. 
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Materialidades Discursivas 
Autor: Bernard CONEIN, Jean-Jacques COURTINE; Françoise GADET, Jean- Marie 
MARANDIN; Michel PÉCHEUX. 
Editora: Unicamp 
Sinopse: Muitas questões em torno das materialidades discursivas - e observe- 
se que se trata do plural, como está no título - são trabalhadas neste livro que, 
sem dúvida, marcou um acontecimento universitário, mas, muito mais que isso, 
um acontecimento que atinge o espaço de deslocamento das fronteiras entre 
disciplinas em que diferentes formas de conhecimento se (reJorganizam, para 
trabalhar com as distintas formas de real que anunciamos no início desta 
apresentação, ou seja, o da língua, o da história, o do inconsciente. É esse 
acontecimento que o leitor terá a sua disposição para refletir. Sem cair na ilusão 
de que basta, ecleticamente, a adição ingênua da linguística, à história e à 
psicanálise, para se atingir o discurso. Chegamos, assim, à questão nodal posta 
então por Pêcheux: com que matéria lidamos com a materialidade discursiva? O 
discurso: dejeto da língua dos linguistas ou horizonte para além da frase? Um 
terreno de encontros problemáticos e de questões abertas. Eni Puccinelli Orlandi 
(Da Nota introdutória à tradução brasileira) 
a J 
AS DIFERENTES MATERIALIDADES SIGNIFICANTES 
Como já vimos, as materialidades discursivas se relacionam diretamente com a questão 
da leitura e do arquivo. Sabermos o que é ler, foi a questão levantada por Michel Pêcheux 
no Colóquio sobre materialidades discursivas, do qual já falamos. E, também, a questão 
que moveu o teórico a pensar na leitura dos arquivos. 
Do ponto de vista materialista ler é pensar sobre a forma como os sentidos se produzem, 
é colocar em cena as diversas leituras. superando a análise do conteúdo. É a partir da 
materialidade do discurso que podemos pensar a relação entre a língua e a história. 
O desafio que se impõe aos analistas é, portanto, como analisar, compreender, interpretar 
os discursos em suas diferentes materialidades. 
Nesse contexto, interessa à AD compreender que há diferentes formas de linguagens que 
podem indicar modos distintos de significar. Quando falamos em materialidade estamos 
nos referindo ao fato de que o sentido se dá a partir de uma matéria simbólica (ORLANDI, 
1995). Hoje compreende-se que essa matéria simbólica não pode ser apenas a linguagem 
verbal, visto que a imagem, o som, o gesto também são modos de materialização dos 
sentidos. Para a AD apesar de estarem relacionadas nenhuma dessas materialidades pode 
ser reduzida a outra, pois cada uma delas possui a sua especificidade. 
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No contexto da AD brasileira o trabalho de Suzy Lagazzi, professora e pesquisadora do 
discurso, propõe um trabalho com objetos de análise variados a partir da exploração da 
noção de materialidades significantes. Segundo a autora, ao falar em materialidade 
significante amplia-se o escopo da AD e reitera-se a perspectiva materialista na análise 
de diferentes materialidades, que no caso específico da autora são os filmes e 
documentários. 
N 
Ao definir odiseurso como a relação entre a 
materialidade significante e a história, pude concernir 
o trabalho com as diferentes materialidades e reiterar a 
importância de tomarmos o sentido como o efeito de um 
trabalho simbólico sobre a cadeia significante, na história. 
Materialidades prenhes de serem significadas. 
Materialidade que compreendo como o modo significante 
pelo qual o sentido se formula. (LAGAZZI, 2071, p. 276) 
q J 
A análise de diferentes materialidades significantes permite falarmos, então, sobre 
objetos variados, sem simplificar a noção de materialidade discursiva, considerando, ao 
mesmo tempo que cada uma dessas materialidades significantes se constituem por aquilo 
que Lagazzi (2011) denomina de “imbricação material significante”. 
Segundo a autora, essa imbricação das materialidades significantes “ressaltam que não 
se trata de analisarmos a imageme a falae a musicalidade, por exemplo, como 
acréscimos uma da outra, mas de analisarmos o material no entremeio de seu conjunto” 
(LAGAZZI, 2011, p. 276). 
Nessa perspectiva o analista de discurso irá mobilizar “as diferenças materiais, sem que 
as especificidades de cada materialidade significante sejam desconsideradas, cada uma 
fazendo trabalhar a incompletude na outra pela contradição”(LAGAZZI, 2011). 
Figura 5 - Figura: Materialidade Significante e Imbricação Material 
Significante 
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Materialidade(s) Significantes(s) 
Imbricação Material 
Fonte: As autoras 
Nessa perspectiva, é possível pensar uma materialidade significante como o filme, por 
exemplo, não tomando-o como uma unidade, mas considerando-o como uma 
textualidade fílmica composta por uma imbricação material significante, ou seja, cada um 
de seus elementos (imagem, fotografia, voz, som, etc.) possui uma especificidade e 
significam de determinada forma na sua relação com o social. 
Pensar a imbricação material significante na análise de textualidades específicas é ser, 
portanto, coerente com uma análise materialista do discurso, tendo em vista a 
contradição constitutiva na imbricação de cada materialidade, visto que cada uma delas 
significa diferentemente, na contradição. 
Desse modo o analista poderá, ao descrever e interpretar cada uma das materialidades 
imbricadas, compreender de que modo sujeitos e sentidos, sempre divididos, determinam 
e se determinam nas relações sociais. (LAGAZZI, 2011). 
Pensar as materialidades significantes em sua composição contraditória, segundo a 
autora, significa considerar a impossibilidade da unidade. 
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No que concerne à circulação dos discursos, essa é uma 
questão importante. Os discursos se entrecruzam, se 
esbarram e as formulações se abrem em possibilidades de 
rearranjos significativos. [...] Esse entrecruzamento vem 
marcado por determinações que envolvem o campo 
[específico de cada materialidade significante]. (LAGAZZI, 
2011) 
Você poderá compreender melhor como se realiza uma análise a partir da noção 
de materialidades significantes e imbricação material significante a partir da 
leitura de um dos artigos de Suzy Lagazzi, no qual ela analisa uma textualidade 
fílmica. Sugerimos, portanto, a leitura do artigo, publicado, em 2010, na Revista 
Rua e disponível na web, intitulado “Linha de Passe: a materialidade significante 
em análise”. Neste artigo a autora faz uma análise interessante a partir da qual 
você poderá compreender melhor os conceitos aqui apresentados. 
Fonte: Lagazzi (2010) 
INDICAÇÃO NA WEB 
Artigos e resumos publicados nos Anais do Seminário de Estudos em Análise do 
Discurso 
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Se você tem interesse em conhecer melhor os percursos analíticos dos 
pesquisadores em Análise de Discurso no contexto brasileiro, sobretudo daqueles que 
se relacionam de alguma forma com estudos desenvolvimentos pelo grupo de 
teóricos em torno de Michel Pêcheux, sugerimos a leitura dos artigos e resumos 
publicados nos Anais do Seminário de Estudos em Análise do Discurso, evento que 
reúne a cada dois anos pesquisadores da área no Brasil e no exterior. O evento terá 
neste ano de 2017 a sua 8º edição. Trata-se de um espaço de fortalecimento e troca 
entre os estudiosos do discurso cujas pesquisas e discussões, sempre em elaboração, 
podem ser conhecidas a partir dos Anais do evento. 
DISCURSO E CORPO 
Estudamos até aqui o modo como, a partir da noção de materialidades discursivas, a AD 
se abriu para um campo de investigação que não se fecha na análise de textos escritos 
circunscritos a espaços institucionais, mas considera as diferentes materialidades 
significantes, com seus modos específicos de constituição, formulação e circulação na 
contemporaneidade. 
Foi um longo caminho percorrido que mudou substancialmente a nossa concepção de 
texto, de discurso, de autoria, de leitura e de sentido, não é? 
Pois nesse percurso, a partir do qual a AD começa a se voltar para a produção dos 
sentidos na sociedade contemporânea tendo em vista diferentes objetos, entram em 
cena também as análises que buscam pensar relação entre discurso e corpo. 
Uma das formas de pensar a relação corpo e discurso é por exemplo a abordagem 
proposta pelo analista de discurso Nilton Milanez, coordenador do Labedisco (Laboratório 
de estudos do discurso e do corpo). Em um de seus textos, o pesquisador discute o modo 
como a partir da análise de corpos tatuados é possível pensarmos a questão da autoria. 
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a escritura no corpo que se lança à aventura dos dias, 
alterando seu presente, lembrando-se a si mesmo que ele 
pode ser o dono daquelas palavras, evidenciando os 
mecanismos que constroem suas memórias. Assim, a 
palavra tatuada fundará uma memória, mas não se pode 
pensar, como nos adverte Marc Augé (1989, p.53), em 
memória sem relação, ou seja, inquietamo-nos em direção 
à malha discursiva que coloca a inscrição da frase 
tatuada no corpo do sujeito face ao esquecimento de seu 
autor. O corpo passa a ser o lugar da autoria. Na ânsia de 
preencher os espaços vazios de seu corpo inacabado, o 
corpo do sujeito resiste à soberania da autoria para 
escrever as verdades tomadas para si e redigir a escrita 
da sua libertação. Do apagamento à apropriação, 
iluminam se os traços e marcas da reinvenção do sujeito. 
(MILANEZ, 2007, p.2) 
NU J 
Observe que esse modo de pensar a autoria se distancia substancialmente de uma 
concepção tradicional de autoria, dos direitos de autor. Como já discutimos em aulas 
anteriores, essa forma de pensar a autoria se relaciona com uma escrita cotidiana, que 
não se relaciona diretamente com a escrita escolar ou editorial. Diz respeito à relação dos 
sujeitos, e seus corpos, e ao modo como eles buscam se significar, em uma perspectiva 
que parte do pensamento foucaultiano, tendo em vista uma escrita de si. 
Desse modo, o lugar dos grandes nomes, as celebridades 
autorais, deu lugar ao homem ordinário, investigando a 
história a partir de micro-lugares do cotidiano, dando voz 
a fragmentos de discursos que antes de constituírem 
verdades diacrônicas criam efeitos outros de realidade 
sobre a descontinuidade do sujeito, seu corpo e sua 
escrita de si. (MILANEZ, 2007, p.8) 
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Vemos assim que as questões de autoria tornam-se ainda mais complexas uma vez que 
parece haver aqui uma espécie de apagamento do sujeito autor dos enunciados. Quem é o 
autor de uma tatuagem? O rapaz que queima a sua pele? Aquele que formulou a frase 
tatuada? O dono do corpo? Na escrita do corpo desaparecem as imposições de direito de 
autor, pois paga-se com a própria pele a indistinção da autoria. 
Outra forma de pensar o corpo em discurso é apresentada pelo trabalho da pesquisadora 
Nádia Neckel, que busca pensar o discurso artístico a partir de análises que incluam o 
corpo e suas performances artísticas, sem perder de vista que o discurso artístico coloca 
em cena o imbricamento de diferentes materialidades significantes, 
Entre as quais se encontram a imagem e o corpo 
(visualidade, gestualidade e sonoridade). Falar de sujeito 
discursivo é, necessariamente falar de corpo. O corpo, 
então, na perspectiva discursiva, assume a densidade de 
um objeto discursivo. (NECKEL, 2015, p. 278-279) 
q J 
Estudar o corpo no discurso artístico requer, segundo Neckel (2015, p.281). pensar o 
corpo do sujeito enquanto “uma materialidade duplamente afetada pelas condições do 
discurso, do discurso na contemporaneidade e do discurso artístico”. Isso porque ao 
analisar, por exemplo, a vídeo-performance a autora pensa o corpo por uma dupla 
determinação: 
A primeira diz respeito a um corpo estético, um corpo 
estésico, o corpo dos sentires por meio da experiência: 
visual, tátil, sonora. A segunda, um corpo que produz 
sentidos, um corpo-linguagem. E, como nos ensina 
Pêcheux, “não há discurso sem sujeito e não há sujeito 
sem ideologia”, e é nessa dimensão que pensamos esse 
corpo dotado de sentidos em seus modos de identificação 
da e na linguagem. (NECKEL, 2015, p. 281) 
q J 
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E-Book - Apostila 
É ainda importante observar que o modo como a AD pensa o corpo não tem nenhum 
semelhança com a forma como o corpo é pensado na medicinae nas ciências naturais. 
Como bem destaca Hashiguti (2007) 
O corpo é. em muitas disciplinas, tomado como biológico. 
natural, segmentável, controlável e transparente, mas na 
perspectiva discursiva, ele se desloca para o lugar da 
opacidade, revelando-se como forma material que se 
constitui no-pelo olhar que o discurso possibilita. Um 
corpo pode ser bonito, obeso, magro, normal ou estranho 
a partir do olhar. O olhar aqui não é a capacidade da 
visão, mas o gesto de interpretação opticamente possível 
no discurso. 
Na inter-relação pessoal entre sujeitos, a identificação 
social é um processo que se relaciona à sua condição 
corpórea, ao fato de que ele é sujeito deem uma 
corporalidade e que essa corporalidade é apreendida pelo 
olhar mesmo antes que ele fale. Essa anterioridade da 
materialidade corpórea determina direções de sentidos, 
pois o olhar é sempre olhar pelo discurso. 
PENSANDO JUNTOS 
Você já havia pensando que o corpo poderia ser estudado como um objeto 
discursivo? Pode parecer algo muito distante dos estudos discursivos sobre os 
textos, mas para compreender essa perspectiva é preciso considerar que o corpo, a 
voz, o gestual também produzem sentidos e se produz sentidos ele é um objeto 
discursivo porque demanda interpretação. Ora, diante de um corpo impresso em uma 
tela, em uma fotografia, em um perfil digital, ou mesmo em um vídeo você nunca se 
sentiu impelido a interpretar, a atribuir a esse corpo algum significado? 
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E-Book - Apostila 
DISCURSO E DIGITAL 
Ao longo de nossos estudos sobre a AD vimos que ao mesmo tempo em que a teoria 
nasce pelo interesse em analisar o discurso político, ela também teve, como uma das 
primeiras propostas do teórico Michel Pêcheux, a construção, no ano de 1969, de um 
sistema informático chamado de Análise Automática do Discurso, conhecida como 
AAD69. 
A despeito das inúmeras críticas feitas ao programa AAD 
69, a construção desse sistema informático de leitura 
permitiu determinar, já naquele período, que as 
propriedades das línguas naturais (ambiguidades, 
metáforas. deslizamentos), são propriedades 
“incontornáveis” para a análise de discurso e. por isso, ela 
deve escapar de “toda perspectiva estritamente 
informacional, documentária ou “intelectiva”. (SILVEIRA, 
2015, p.31) 
Nu J 
A paixão deste pesquisador pela relação entre a língua e a informática se marca em 
diferentes textos e diferentes propostas de seu trabalho. Já discutimos aqui, por 
exemplo, o texto “Ler o arquivo hoje”, que já tocava na relação língua e informática. 
Mas como a AD pode ser pensada hoje, frente às materialidades digitais? 
A primeira observação que é importante fazer para responder essa questão é a de que, do 
ponto de vista da AD, não podemos conceber que os instrumentos tecnológicos são 
objetos “neutros” ou “objetivos” e, muito menos, que podemos concebê-lo sem pensar a 
relação que ele estabelece com a língua, tal como a língua é concebida da AD: como não 
transparente, sujeita à falha e ao equívoco. 
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E-Book - Apostila 
As preocupações de Pêcheux com a relação entre discurso e informática enfatizou, 
naquele período, uma reflexão que visava, sobretudo, pensar o modo como se podia usar 
os instrumentos da informática para fazer análises discursivas. Mesmo que suas 
hipóteses e métodos não tenham prosperado e tenham sido abandonadas pelo próprio 
autor, ela permitiu compreender que a língua não é redutível à tecnologia, ou seja, a 
língua é da ordem do equívoco, do inapreensível. 
Hoje, as pesquisas em AD centram-se, sobretudo, em análises que buscam problematizar 
os mais variados espaços digitais, tendo em vista que os chamados “avanços 
tecnológicos” deslocam a nossa relação com a linguagem e o conhecimento. 
Um dos aspectos importantes para começar a pensar a relação entre língua, discurso e 
digital diz respeito à indistinção com a qual, em geral, observamos os discursos que são 
próprios do digital e aqueles que se constituem e se formulam fora do digital. 
Nesse sentido, essa é já uma primeira preocupação do analista quando tem diante de si 
uma materialidade digital: refletir sobre a natureza dos discursos em circulação no digital, 
uma vez que não basta circular na internet para que o discurso seja considerado um 
discurso próprio do digital. 
A linguista francesa, Marie-Anne Paveau, que se dedica a pensar o que ela denomina 
de ADN - Analyse de Discours Numérique [Análise do Discurso Digital], chama a atenção 
para três formas diferentes de circulação dos textos no espaço digital. Para a autora, 
N 
O termo digital é genérico e recobre situações 
tecnodiscursivas diferentes: entre um texto escaneado 
sem modificação e disponibilizado online, e uma postagem 
em um blog com vários hiperlinks, existem diferenças de 
ordem linguística que dizem respeito ao modo de 
produção da escrita, o modo de leitura do texto e sua 
inscrição no ecosistema da web. Eu proponho três 
entradas que repousam sobre esses critérios linguísticos: 
digitalizado [numérisé], digitado [numérique]; digital, 
[numériqué]. (PAVEAU, 2013, p. 5) 
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E-Book - Apostila 
A distinção proposta por esta autora está centrada, pelo menos em um primeiro 
momento, nos tipos de texto: o texto digitalizado seriam aqueles que primeiramente 
foram impressos (documentos, livros, etc.) e que podem, eventualmente, serem 
escaneados para compor algum arquivo digital; os textos digitados são aqueles que são 
escritos em um suporte tecnológico (word, tablets, softwares), mas que não se 
configuram como sistemas online; os textos digitais seriam, portanto, aqueles que tanto 
são escritos em um suporte digital quanto são próprios do online, funcionam em rede 
(postagens de facebook, blogs, whatsapp, etc). Compreender a diferença entre essas três 
formas, permite pensar a formulação dos discursos e os efeitos que tais formulações 
produzem ao circularem no digital. 
Pensando a distinção entre os diferentes tipos de textualização possíveis no digital a 
professora e pesquisadora Solange Gallo também apresenta uma discussão buscando 
fazer uma distinção entre os discursos em contato com a materialidade digital. 
De forma diversa da proposta de Paveau (apresentada acima) para Gallo (2008), não se 
trata de pensar os tipos de textos, mas sim os discursos. 
Em um sentido geral é possível pensar que os discursos que se formulam ou que circulam 
no digital será de um modo ou de outro afetado por essa materialidade 
Nenhum dizer fica imune à tecnologia que o materializa, 
no sentido de ser afetado em seus possíveis efeitos de 
sentido por essa materialidade própria da tecnologia em 
questão. O discurso toma a tecnologia, então, como uma 
materialidade na confluência com todas as outras. 
(GALLO, 2012, online) 
J 
A partir de um desenvolvimento de suas pesquisas a respeito dos Discursos de Escrita e 
dos Discursos de Oralidade, que já estudamos aqui quando trabalhamos as noções de 
autoria. Gallo (2012) propõe pensar uma forma discursiva que é própria das 
discursividades online: a forma discurso da Escritoralidade. De acordo com essa autora, o 
discurso de escrita é um discurso que tem sua constituição na forma escrita, podendo ser 
publicado, tem efeito de fecho e efeito de autoria (livros, documentos, teatro, jornal 
televisivo, missa). 
O discurso de oralidade, por sua vez, não é publicável, mesmo podendo ser grafado, ele 
tem caráter aberto, sem efeito de fecho, sem efeito de autoria (bate-papo, lista de 
compras, anotações). 
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E-Book - Apostila 
O discurso de Escritoralidade reúne as características da escrita e da oralidade. Tem 
forma escrita e oral, é publicado, mas sempre provisório, efêmero, fugaz (postagens de 
internet, vídeos em mídias sociais). Como vemos, a Escritoralidade está diretamente 
relacionada com as discursividades online e apresentam tanto as características de um 
Discurso de Escrita (unidade, legitimidade, certoefeito de fecho) quanto características 
do discurso de oralidade (interlocuções provisórias, sem efeito de fecho ou com efeito de 
fecho provisório, múltiplos interlocutores). 
Vejamos um exemplo desse funcionamento apresentado pela própria autora ao refletir 
sobre a Wikipedia: 
Podemos pensar que a wikipedia é um espaço 
especializado em disponibilizar “informação”, no entanto, 
essa informação assume formas específicas e contornos 
de legitimidade, na medida em que está determinada pelo 
Discurso de Escrita e a memória, aí mobilizada, das 
enciclopédias físicas. Também elas eram de autoria 
coletiva, assim como a wikipedia, e apresentadas com 
unidade de sentido, enquanto um efeito da autoria desse 
discurso. Portanto, a relação de interlocução que a 
wikipedia propõe aproxima-se do Discurso de Escrita, ou 
seja, a relação não presencial de um leitor com um autor, 
assim como aquela que se dá na leitura de um livro. No 
entanto, a fluidez da tecnologia digital faz com que essa 
produção, diferente do livro impresso, seja muito rápida, 
quase instantânea, em relação aos acontecimentos 
sociais que são ali “informados”. Mas ainda assim, apesar 
da condição instantânea dessa textualidade, tão própria 
do ciberespaço, o que difere o autor da wikipedia ainda é 
sua materialidade relacionada ao Discurso de Escrita e ao 
Discurso da Oralidade, simultaneamente. 
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Ora, o modo como você conversa com seus amigos no bar não tem uma relação direta 
com o Discurso de Escrita, pois ali você organiza a sua fala de acordo com condições de 
produção específicas. O mesmo não ocorre quando você conversa com esses mesmos 
amigos em um grupo no Whatsapp, não é mesmo? Por mais que vocês mantenham “o 
mesmo discurso” ou que as conversas sejam muito próximas de uma conversa de bar, o 
que permitiria dizer que se parece muito com um Discurso de Oralidade, ao sofrerem as 
determinações do dispositivo tecnológico e do modo como o aplicativo propõe e 
disponibiliza instrumentos para essa conversa os efeitos de sentidos ali produzidos serão 
afetados por formas que são próximas de um Discurso de Escrita. 
Ao Discurso de Oralidade (conversa provisória e sem efeito de unidade entre amigos) alia- 
se um conjunto de instrumentos tecnológicos próprios do Discurso da Escrita (texto, 
imagens, etc.) = ESCRITORALIDADE. Em AD há inúmeros outros trabalhos e analistas que 
buscam pensar a relação entre discurso e digital, portanto, vemos que é um desafio atual 
para a teoria pensar esse novo modo de produção de discursividades. 
PENSANDO JUNTOS 
Você já havia considerado essas diferenças entre textos e discursos nos ambientes 
digitais online? Quantas vezes você parou para pensar em como deveria formular o 
seu texto e sua escrita considerando as características de possibilidades oferecidas 
pelos diferentes espaços digitais? Se você tem afinidade com os espaços discursivos 
online procure prestar atenção nas diferenças que cada espaço estabelece e como 
essas diferenças modificam não só os seu texto e o modo como você procura 
formular a sua fala de um jeito e não de outro. Sempre negociando com as 
possibilidades “oferecidas” pela materialidade digital. Fonte: as autoras. 
APROFUNDANDO 
Neste estudo enfatizamos o trabalho com as materialidades discursivas que 
possibilitaram uma ampliação do campo de estudos em AD, que passa a considerar a 
análise de diferentes materialidades significantes e, ainda, que entre as discussões atuais 
em torno de diferentes materialidades estão os debates e reflexões sobre as 
materialidades digitais e o modo como elas afetam a nossa relação com a própria 
linguagem. 
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E-Book - Apostila 
Tendo em vista os estudos e discussões do modo como as discursividades online afetam 
os sentidos produzidos por nossos dizeres, fazendo com que nossa formulação passe a 
seguir a normatização do digital, pretendemos apresentar aqui o modo como uma rede 
social específica, o Twitter, normatiza os dizeres, afetando a formulação e circulação dos 
enunciados e, consequentemente, os sentidos que aí se produzem, por sua relação com o 
digital. 
Para pensar em uma dimensão discursiva do Twitter antes devemos problematizar a 
proposta “comunicacional” deste ambiente digital. 
Primeiro é preciso destacar que o Twitter afirma que é uma plataforma que permite aos 
sujeitos participarem de “uma conversa global”. 
Discursivamente essa afirmação pode ser relativizada uma vez que o que existe aí é 
apenas um “efeito de conversa”, já que, é apenas imaginariamente que funciona como 
uma conversa, uma vez que o que acontece no momento de cada interlocução pode não 
se concretizar da forma como aquele que escreve ou lê uma postagem no Twitter imagina 
como deveria ser essa “conversa”. Em um segundo momento é importante perceber que 
não se trata de um ambiente puramente técnico, neutro e objetivo, apesar de parecer 
funcionar de modo mais ou menos neutro e objetivo. 
Isso ocorre porque, antes mesmo que os sujeitos-usuários do Twitter pudessem escrever 
e ler nesse ambiente, o modo como essa escritura e essa leitura poderá ser realizada faz 
parte de uma escrita e leitura anterior: a do programador. 
Observe a seguinte publicação que realizamos no Twitter: 
Figura 6 - 
4 SN 
JULIANA da SILVEIRA 
Gysilveirajuliana 
Gostei do novo jeito do Twitter, permitindo a 
inserção de comentário antes do RT. 
15:23 - 16 de abr de 2015 
dr t+ “w di 
Pé | Tweete sua resposta 
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E-Book - Apostila 
É, em última instância, o gesto do programador que define que neste espaço nosso texto 
deve possuir: apenas 140 caracteres, que, ao ser lido ele poderá apenas ser “respondido”, 
“retuitado”, “curtido”. Uma questão que podemos fazer é, por exemplo, porque não há um 
recurso que permita indicarmos que a publicação não agradou, não foi curtida? Que 
leitura o programador fez das “nossas” necessidades de interação que o levaram a não 
oferecer um botão para negativar uma postagem? 
Discursivamente é importante notarmos que, embora essas escolhas apareçam como 
evidentes e naturais, elas são opacas, não transparentes. Não há, portanto, neutralidade 
nem objetividade nesta escolha do programador. 
E, ainda, não é o programador indivíduo que realiza tais escolhas. Elas são determinadas 
pelo processo sócio-histórico ideológico de constituição dessa mídia social. São essas 
condições sócio-históricas que permitem explicarmos, por exemplo, que o modo como 
esse ambiente se constitui se relaciona com a memória de um outro discurso, o discurso 
jornalístico. É por se relacionar com a memória do discurso jornalístico. ressignificado 
pela plataforma, que o Twitter produz efeitos de sentidos determinados, como, por 
exemplo, aquele que permite com que os sujeitos-usuários mais diversos se sintam eles 
também “comunicadores”. Entramos, assim, em uma ordem do discurso midiática, que 
nos convida e nos interpela a produzir conteúdo, informação, notícias, minuto a minuto. 
Essa interpelação está materializada na tela do Twitter de modo permanente, no espaço 
em branco no qual “devemos” formular o nosso texto. 
Figura 7 - 
A partir de reflexões como essa é que podemos compreender o quanto a noção de 
materialidades discursivas faz avançar os estudos em AD e o quanto essa teoria tem a 
contribuir para tirarmos os discursos de suas “evidências”, mostrando que os sentidos e 
os sujeitos se constituem na medida em que ocupam lugares discursivos determinados, a 
partir de posições-sujeitos determinadas. 
Vale observar também, que como vimos no decorrer desta unidade, essas materialidades 
digitais fazem parte da forma discurso de Escritoralidade e caberia aqui uma certa de 
outras análises que você pode tentar pensar. Por exemplo, você já parou para refletir 
porque não podemos comparar a conversa do Twitter com uma conversa no bar? 
122 - 140
E-Book - Apostila 
Precisamos LER essas novas materialidades paracompreender que 
os gestos mudam segundo os tempos e lugares, os 
objetos lidos e as razões de ler. Novas atitudes são 
inventadas, outras se extinguem. Do rolo antigo ao códex 
medieval, do livro impresso ao texto eletrônico, várias 
rupturas maiores dividem a longa história das maneiras 
de ler. Elas colocam em jogo a relação entre o corpo e o 
tivro, os possíveis usos da escrita e as categorias 
intelectuais que asseguram sua compreensão. 
(CHARTIER, 1998, p.77)" 
q J 
Trata-se, portanto. de buscarmos estabelecer uma relação menos ingênua com a 
linguagem que não é de modo algum natural, mas material. 
Novos Desafios 
Nosso objetivo neste estudo foi fazer um breve percurso pelo modo como hoje os 
analistas de discurso tem pensado a relação entre língua, sujeito e história, a partir de um 
passeio por noções como materialidades discursivas. Assim fomos tateando um vasto 
campo de possibilidades de estudo com as variadas materialidades significantes, 
relacionando discurso e arquivo, discurso e corpo, discurso e digital. 
Nosso propósito maior foi levá-lo a compreender que a AD não é um campo de estudos 
fechado em si mesmo, mas uma disciplina de entremeio que hoje propõe questões não só 
aos estudos sobre a língua, o marxismo e a psicanálise, mas que relaciona esses e outros 
campos com aquele que é o seu objeto teórico: o discurso. 
Desse modo, vimos que pensar o discurso é pensar os processos de significação a partir 
do modo como nos relacionamos com nosso objeto teórico, o discurso, e os variados 
objetos de análise: o corpo, o digital, a fotografia, o cinema, etc. Materialidades 
significantes variadas que exigem pensar suas especificidades, para compreender o 
processo discursivo e os modos diversos de significação que cada materialidade produz, 
desloca, (re)arranja. 
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E-Book - Apostila 
Vimos, assim, que desde o Colóquio Materialidades Discursivas até os procedimentos de 
análise atuais, a AD não se cansa de repensar seus próprios conceitos e metodologia, sem 
estacionar no já concebido, mas sempre buscando novas formas de compreensão dos 
sentidos. 
Pensar o sentido ancorado na noção de materialidade discursiva é não desconsiderar que 
a AD é um disciplina materialista, que pensa o discurso a partir de seu funcionamento 
complexo uma vez que se constituem de múltiplas materialidades discursivas (linguistica, 
cultural, ideológica, inconsciente) e se relaciona com diferentes materialidades 
significantes (imagens, sons, voz, gesto, cinema, fotografia, etc.). 
Vimos, portanto, que é indispensável, discursivamente, pensar o imbricamento dessas 
materialidades para pensar a contradição constitutiva do discurso. 
As contradições que se manifestam nessas diferentes práticas, fazendo circulam 
determinados sentidos e não outros. 
VAMOS PRATICAR? 
Chegou o momento de testar o conhecimento adquirido até aqui! Para isso, por favor, 
participe da autoatividade que preparamos especialmente para você. São apenas 
3 questões 
1. Sobre a relação discurso e digital é 
correto afirmar que há uma 
modificação nas noções de escrita e 
oralidade. A esse respeito, assinale a 
alternativa correta: 
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E-Book - Apostila 
a) O uso de novas tecnologias favoreceu o domínio da oralidade; o 
(a) uso de novas tecnologias permitiu a ampliação do domínio da 
escrita; 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
b) o digital produz uma nova forma discurso, a escritoralidade, para 
pensar a relação complexa da materialidade digital com os 
discursos pré-existentes. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
[C) c) Na sociedade tecnológica os discursos de escrita e oralidades 
não tem mais legitimidade. 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
O d) A tecnologia acaba com a contradição que existia entre escrita e 
oralidade. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
125 - 140
E-Book - Apostila 
2. De acordo com a distinção proposta 
por Paveau, já podemos falar em uma 
Análise do Discurso Digital, uma teoria 
específica para falar do digital. Para 
começar a pensar as especificidades 
do digital a autora propõe uma 
classificação dos textos que circulam 
hoje. Observe as alternativas abaixo, 
avalie qual delas corresponde à 
classificação feita por Paveau, e 
assinale a alternativa correta 
(a) a) Escane ado, fotografado, filmado 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
Q b) Digitalizado, filmado, gravado 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
OQ c) Datilografado, fotocopiado, grafado 
126 - 140
E-Book - Apostila 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
d) Digitalizado, digitado, digital 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
e) Digitado, digitalizado, escaneado 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
3. A Análise de Discurso passou por um 
longo processo até voltar a sua 
atenção para as diferentes 
materialidades discursivas. O que pode 
se afirmar para o fato de hoje essa 
teoria se dedicar a análise de 
diferentes materialidades 
significantes? Assinale a alternativa 
127 - 140
O 
E-Book - Apostila 
correta. 
Outras formas de linguagem significam da mesma 
forma que a linguagem verbal. 
Os estudos sobre o arquivo e a heterogeneidade dos 
texto sabre o campo de estudos da AD para novas 
materialidades. 
As imagens não são uma forma de tradução da 
linguagem verbal. 
Ao tomar o corpo como materialidade discursiva 
busca-se compreender, de certa forma, a relação 
entre o sujeito e a linguagem. 
a) Somente as alternativas | e Il estão corretas 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
b) Somente as alternativas |, Il e Ill estão corretas 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
c) Estão corretas apenas as alternativas |, Ile IV 
Resposta Correta: 
Muito bem! Está bem atento aos estudos! 
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E-Book - Apostila 
OQ d) Nenhum das alternativas estão corretas. 
Resposta Incorreta: 
Continue tentando! 
REFERÊNCIAS 
GALLO, Solange. Como o texto se produz: uma perspectiva discursiva. Blumenau: Nova 
Letra, 2008. 
GALLO, Solange. Discurso e novas tecnologias de informação. 2012. 
Disponível em: <http://solangegallo.blogspot.com.br/2012 08. 01 archive.html>. Acesso 
em: 15 jan. 2015. 
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129 - 140
E-Book - Apostila 
ORLANDI, Eni P. Nota introdutória à tradução brasileira. In: CONEIN, Bernard et al 
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SILVEIRA, Juliana da. Rumor(es) e Humor(es) na circulação de hashtags do discurso 
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em Letras, Universidade Estadual de Maringá, Maringá. 2015. 
Disponível em:<http:/www.ple.uem.br/defesas/def. juliana. da. silveira.htm>. Acesso em 
05 junho de 2017. 
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