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Cis ou trans: Buscando uma Identidade

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CIS OU TRANS: 
 
BUSCANDO UMA IDENTIDADE 
 
 
 
 
ERASMO HERA DA ROCHA 
 
 
2 
 
 
 
PREFÁCIO 
Este livro é oportuno a todos aqueles interessados, 
estudiosos e/ou ativistas, na discussão sobre gênero e 
identidade sexual. Sobre a trajetória acadêmica do autor, 
posso dizer que pude perceber em Erasmo um grande 
desejo de saber sobre as Ciências Humanas: da História 
ao Direito, dos estudos de raça aos de gênero. O percurso 
traçado em sua vida acadêmica estará, em parte, retratado 
nesta obra, em que elabora uma genealogia das 
contradições do discurso médico-científico sobre a 
identidade, do autoreconhecimento e das discussões de 
gênero. Durante nossas conversas sobre o tema, pude 
aprender sobre as muitas dimensões envolvidas nessa 
discussão e suas relações com o contemporâneo. Cada 
vez mais, este tema assume importância no social e todos 
os sujeitos são convocados a debater tal tema, o que era 
anteriormente construído e normalizado, é 
problematizado e ressignificado. 
Com esses escritos podemos indagar como a 
História e o Direito, aliados à teoria crítica, nos ajuda a 
pensar o conceito de gênero e a construção da 
3 
 
 
 
sexualidade no contexto social, bem como, identificar as 
disposições responsáveis por produzir as configurações 
das identidades de gênero na contemporaneidade. Aponto 
como marco da obra a análise do caso John/Joan, e como 
o discurso científico/jurídico/social pode comportar 
contradições, em um joguete de ilusão que torna o 
arbitrário cultural normal e legitimo. Em suma, trata-se 
de uma atenciosa análise sobre as contradições no 
discurso social sobre gênero! 
 
Eduardo Pio, setembro 2020. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
O presente trabalho apresenta como tema o 
desenvolvimento da percepção do conceito de 
“indentidade de gênero” na contemporaneidade 
ocidental. 
“Gênero” para o Dicionário Aurélio 2009 é “7. 
Antrop. A forma culturalmente elaborada que a diferença 
sexual toma em cada sociedade, e que se manifesta nos 
papéis e status atribuídos a cada sexo e constitutivos da 
identidade sexual do indivíduo.” Segundo Joan Scott: 
“Mais recentemente (...) as feministas começaram a 
utilizar a palavra ‘gênero’ mais seriamente, num sentido 
mais literal, como uma maneira de se referir à 
organização social da relação entre os sexos (Scott, 
1995). E para Butler, apud Scott: “gênero é uma 
construção social e cultural a serviço da dominação da 
mulher pelo homem (Scott, 2012). “O homem fode a 
mulher; sujeito, verbo, objeto (MacKinnon, apud Scott, 
2012). Para Joan Scott (1941-) uma “história das 
mulheres” é sexista, pois coloca a mulher como 
5 
 
 
 
“diferente” do homem, e por isso subalterna, já que na 
frase de MacKinnon ela é sempre objeto. Judith Butler 
(1956-) cita Kristeva: “não se pode dizer que existem 
‘mulheres’ (Butler, 2018).” Isso significa que não existe 
a categoria “mulheres” e apenas “a” mulher! o “segundo 
sexo”, ou mesmo a “sem sexo”. 
Na definição de Butler, o significado de 
“identidade” [subentende] “que as identidades são 
idênticas a si mesmas, persistentes ao longo do tempo, 
unificadas e internamente coerentes.” Vem da palavra 
idem, que quer dizer “igual”. Portanto, “identidade de 
gênero” não é menos que uma permanência de uma 
construção social consolidada. A identidade de gênero 
pode ser “percebida”, quando se define o gênero pela 
genitália do bebê, ou “autopercebida”, que é a construção 
do gênero pela própria pessoa que se espelha nos 
personagens sociais para construir seu próprio gênero. 
Entrementes, não se pode dizer que o gênero é totalmente 
pessoal ou social, mas podemos afirmar que a identidade 
de gênero é uma descoberta que a pessoa faz, que tanto 
pode reafirmar seu gênero designado no nascimento no 
6 
 
 
 
caso das pessoas “cis”, ou “transgredir” os papéis sociais 
e se reconhecer como uma pessoa “trans”. A identidade 
trans é uma permanência no sentido de que, desde a 
infância, a maoria desses indivíduos se sente divergente 
do gênero “percebido”. 
Com a contribuição da teoria de gênero de Judith 
Butler e dos estudos de Alfred Kinsey sobre a 
homossexualidade, a antiga1 definição de 
“homossexualismo” foi cortada dos textos científicos e 
tirada dos catálogos de doenças: CID (Código 
Internacional de Doenças) e DSM (Diagnostic and 
Estatistical Manual of Mental Disorders) [Manual 
Diagnóstico e Estatístico e de Doenças Mentais]. Já a 
transgeneridade, até o ano de 2018, era considerada 
doença mental; porém, com a edição do CID-11, passou a 
se localizar na seção de “saúde sexual” e denominar-se 
 
1 Como diria Foucault, em “História da sexualidade” vol.1, pg. 44: 
“antes a sodomia era uma dissidência, agora homossexual é uma 
espécie.”. A partir do século XIX descobrem-se várias categorias de 
“desvios sexuais”, patologizando o “homossexualismo” como 
doença no primeiro DSM (Diagnostic Estatistical Manual) de 1952 – 
O “ismo” significa doença, tanto que não existe a palavra 
“heterossexualismo” no Aurélio de 2009 – o termo só foi retirado do 
manual em outra publicação do DSM em 1973. 
7 
 
 
 
“incongruência de gênero”. No último DSM, o DSM-V, 
atualizado em maio de 2013, o termo utilizado é “disforia 
de gênero”, podendo ser sintoma de doenças como a 
esquizofrenia. O CID-11 entra em vigor em janeiro de 
2022. 
De fato a esquizofrenia pode levar ao conflito de 
identidade de gênero, já que nessa doença o paciente se 
aflige com tudo que é dicotômico, desde o conflito com o 
verdadeiro gênero, até a posição política: direita ou 
esquerda. A transgeneridade, no entanto, não é uma 
doença mental como bipolaridade, depressão etc. O que 
pode levar a esses quadros é o preconceito e a exclusão 
social. 
Para Georges Canguilhem (1904-1995) (apud 
COELHO e FILHO, 1999), no séc. XX a medicina dos 
fenômenos orgânicos e mentais apontou para uma 
diferença qualitativa entre normal e patológico. Mas “o 
patológico não é o contraditório lógico do conceito de 
normal. O patológico não é a ausência de normas, mas a 
presença de outras normas vitalmente inferiores, que 
impossibilitam o indivíduo viver um modo de vida 
8 
 
 
 
anterior, permitido aos indivíduos sadios (COELHO e 
FILHO, 1999, pg. 24).” O oposto de patológico então 
seria “sadio”: 
“O termo saúde, originado do termo 
latino sanus, possui ascendência grega 
(saós) e envolve dois sentidos: íntegro, 
intacto ou bem conservado e infalível ou 
seguro. Daí a expressão popular são e 
salvo (...). Canguilhem observa que ao 
longo da história, a saúde foi tradada 
como se ela não pudesse ser apreendida 
pela razão (...). No século XVIII, Kant 
teria afirmado que a saúde é um objeto 
fora do campo do saber e que, por isso, 
não é um conceito científico, mas uma 
noção vulgar, popular, ao alcance de 
todos (COELHO e FILHO, 1999, pg. 
25). 
 
Até o séc. XVI, o louco era um personagem 
mágico, místico, portador de uma verdade. Ele 
perambulava pelas ruas contando histórias como um 
jornalista; os loucos podiam falar por si mesmos. Foi a 
partir do séc. XVII, com a contribuição de René 
Descartes (1596-1650) para o pensamento lógico e da 
razão, que o louco passou a ser silenciado e visto como 
um objeto de estudo. Primeiro silenciado pelo juiz, que o 
taxava de “vontade perversa”; depois, pelo médico, por 
9 
 
 
 
um problema no corpo; então pelo psiquiatra, por 
deficiência na mente/cérebro. E até hoje continua sendo 
silenciado pela psicologia/psicanálise.2 Às vezes não é o 
alienista que sugere a internação e sim o próprio 
psicólogo que acompanha o paciente. O problema é que 
quando ocorre um surto ele põe em risco a própria 
integridade física e de outrem, por isso deve passar por 
processos disciplinares como o “manicômio” ou o 
ambulatório. 
O/a transexual é louco/a? Os manuaisditam que 
sofrem a chamada “disforia de gênero” ou, mais 
recentemente, “incongruência de gênero”. O termo mais 
aceito na comunidade trans é “transgeneridade”. 
Transgêneros seriam pessoas que divergem dos padrões 
estabelecidos entre sexo/gênero. 
Atualmente a sociedade está aceitando mais as 
“transgressões de gênero” (LANZ, 2015), principalmente 
depois da calça jeans e os grupos como os emos e 
 
2 Disponível em: 
https://www.youtube.com/watch?v=X570ChG5Nas. Acesso em: 07 
jun. 2019. 
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10 
 
 
 
roqueiros que pintam as unhas e se maquiam; mulheres 
que dispensam a saia no dia a dia e usam cabelos curtos. 
É verdade que, desde os primórdios, guerreiros 
vikings usavam cabelos compridos, mas no séc. XIX-XX 
foi resgatado o estilo masculino dos romanos: cabelos 
curtos, o famoso “corte militar”. O séc. XX passou pela 
patologização do transexual e culminou até mesmo com 
sua naturalização, depois da teoria queer, que foi 
reforçada pela cultura dos jovens nascidos entre 1990 e 
2001, cada vez mais andrógina. Homens e mulheres 
usam calças apertadas, camisas de time, cabelos longos 
ou curtos, mulheres de barba, homens sem barba, com ou 
sem maquiagem. A moda transgênera é capaz até de 
passar despercebida, o que faz somente você se 
perguntar: “É moça ou rapaz?” É como perguntar o sexo 
do bebê: não é visível ao espectador. Só precisamos 
apenas de nos livrar de alguns preconceitos e assinarmos 
o “contrato contrassexual” de Paul Beatriz Preciado 
(1970-) para nos tornarmos corpos falantes e não seres 
sexuados sujeito a normas e estereótipos de gênero. A 
sociedade futura é como a de Aldous Huxley, apud 
11 
 
 
 
Coelho e Filho, 1999, sem médicos nem doentes; todos 
seriam normais, ou seja, ninguém fugiria da norma, já 
que a norma não admite a doença, e esta não seria sã, 
mas patológica. Explica-se a partir do conceito de 
Canguilhem de que todos são normais e 
o homem normal saudável teria que se 
sentir capaz de adoecer e afastar a 
doença. Se a possibilidade de testar a 
saúde através da doença lhe fosse 
eliminado, o ser humano não teria mais a 
segurança de ser normal e de poder 
enfrentar qualquer doença que 
porventura viesse a surgir. Isso, 
paradoxalmente, configuraria uma nova 
e devastadora patologia, a patologia da 
saúde perfeita (COELHO e FILHO, 
1999, pg. 23). 
Entendemos que a transgeneridade não é uma 
patologia, a sociedade que é doente por excluir essas 
pessoas diariamente e lhes negar direitos básicos como o 
nome e o trabalho. Mais que lutar contra o preconceito, 
devemos encampar a luta LGBT para que esses direitos 
sejam conquistados plenamente por todos “diferentes”. 
12 
 
 
 
“Identidade” vem de igual, mas “diferença” vem do latim 
DIS, “fora, afastado de”, mais FERRE: “levar, portar, 
carregar”, portanto levar para [deixar de] fora. É assim 
que a sociedade trata os transgressores de gênero, como 
forasteiros sociais. O ideal seria nos tratarmos 
simplesmente como “corpos falantes” (PRECIADO, 
2014), corpus: parte animal e falante: parte humana, ou 
seja, animais dotados de fala. O sexo seria tão individual 
que existiriam tantos sexos quanto pessoas (DELEUZE; 
GUATTARI apud BUTLER, 2009)3. Militantes 
defendem que a transgeneridade, assim como foi a 
homoafetividade, seja retirada dos manuais diagnósticos. 
O que aconteceu no novo CID foi que passou a 
denominar-se “incongruência de gênero” e a ser 
classificada nem como saúde física nem mental, mas em 
“saúde sexual”, junto com disfunção erétil e outros 
diagnósticos4. Porém é também importante o tratamento 
hormonal e cirúrgico para as/os chamadas/os 
 
3BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da 
identidade. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2018. 
4 Disponível em:< 
https://portugues.medscape.com/verartigo/6502525>. Acesso em 25 
nov. 2018. 
13 
 
 
 
“transexuais verdadeiros”, que, segundo Benjamin 
(1999)5, são aqueles/as que têm total aversão a sua 
genitália, podendo automutilar-se ou até tentar o 
autoextermínio. Para esses casos, Benjamin afirma que, 
apenas alterando as características sexuais secundárias 
(barba, seios etc.) visando a alteração das características 
primárias (orgãos genitais), o indivíduo se sentirá 
realizado. Quanto à psicoterapia, segundo o médico, é 
inútil para eles/elas. 
É também importante o acompanhamento 
psiquiátrico para aqueles/as que ocasionalmente tiverem 
depressão ou outro quadro psíquico, geralmente causados 
pelo preconceito da sociedade. Se em mais ou menos 
dois anos, durante o “teste da vida real”6, o paciente não 
apresentar desejo de reconfigurar a genitália ou 
interromper voluntariamente a terapia hormonal, deve ser 
 
5 BENJAMIN, Harry. The Transsexual Phenomenon. Dusseldorf: 
Symposium, 1999. 
6 É chamado “teste da vida real” o procedimento em que a/o paciente 
vive integralmente como do sexo oposto por pelo menos dois anos, 
passo necessário para autorização feita pelo/a psiquiatra para a 
cirurgia de “transgenitalização”, vulgo “mudança de sexo”. 
14 
 
 
 
descartado qualquer “transtorno da identidade sexual”7 
(CID-10), e começar a tratar isoladamente uma possível 
doença (esquizofrenia, bipolaridade, depressão etc.). As 
pessoas trans deveriam se encaminhar para o 
endocrinologista e cirurgião e, se não for constatada 
nenhuma doença mental pelo psiquiatra, o próprio clínico 
geral deve acompanhar o/a paciente (BUTLER, 2009) 
dali para frente. 
Neste trabalho, procura-se questionar a 
comunidade científica quanto a “gender assignment at 
birth” (gênero designado no nascimento), que acredita-se 
ser uma falácia, já que, em nossa concepção, o aparelho 
genital não decide necessariamente o gênero, que é 
construído mentalmente à medida que a criança cresce. A 
identidade de gênero começa a se firmar entre os 2 e 3 
anos de idade, quando a criança começa a observar os 
papéis sexuais designados pela sociedade. 
Também critica-se a ideia de Money e Tucker 
(1981) de que a pessoa deve escolher entre o gênero 
masculino e feminino para viver em sociedade, uma vez 
 
7 Usamos o termo do CID-10 (F-64) que corresponde ao 
“transexualismo, travestismo bivalente”, etc. 
15 
 
 
 
que a teoria queer8 mostra que os gêneros são infinitos, 
desde o gênero neutro, bigênero (homem e mulher ao 
mesmo tempo) ou até mesmo trigênero (homem, mulher 
e neutrois), ou nenhum dos três, os chamados gêneros 
não binários (genderqueer).9 
Porém não devemos falar de “identidade sexual”, 
já que a própria definição de “gênero” é fluida (sem 
permanência), diferente do sexo, que na maioria das 
vezes já está bem definido ao nascer, com a exceção dos 
intersexos. Benjamin (1999) define vários tipos de 
“sexos”: morfológico, cromossômico, genital, legal, 
social e psicológico. Devemos então falar de 
 
8 A chamada teoria “queer” surgiu nos anos 1980 especialmente com 
Judith Butler, desestigmatizando o termo queer, que em tradução 
livre do inglês significa “bicha”. Outras definições que cabem são: 
“extraordinário”, “diferente”, “esquisito”. A teoria quer desconstruir 
a estigmatização da sociedade com os sexos opostos e excludentes, 
mostrando que é possível identificar-se com uma ontogênese 
diferente do padrão homem/mulher. Assim como o termo “vadia” da 
Marcha das Vadias. 
9 “Termo associado a pessoas cuja identidade ou expressão de gênero 
não se limita às categorias "masculino" ou "feminino" (...) Uma 
pessoa não binária também pode se apresentar como genderqueer ou 
afirmar que tem identidade de gênero não conformista.” Disponível 
em: 
<https://universa.uol.com.br/noticias/redacao/2018/03/19/glossario-de-genero-entenda-o-que-significam-os-termos-cis-trans-
binario.htm>. Acesso em 19 mar. 2018. 
16 
 
 
 
“diversidade” sexual (ou de gênero) com a única 
diferença que a sexual é a variedade de possibilidades de 
sexos divergentes num mesmo indivíduo; e “de gênero” 
é a autopercepção pessoal de cada um que se espelha em 
algum membro social. Por isso também não existe 
“ideologia de gênero”, preferências não têm explicação, a 
pessoa simplesmente “gosta” ou se identifica com 
alguém. Nem casais héteros tem somente filhos héteros, e 
nem todo casal gay tem filhos gays. Assim se dá com os 
trangêneros também! O relato no final desse trabalho 
(caso John/Joan) mostra que não é possível “moldar” um 
ser humano para seguir determinado gênero, já que este é 
uma construção pessoal de cada um, que vê a sociedade 
com seus próprios olhos encontrando seus espelhos. Há 
autores que afirmam existirem 7 bilhões de gêneros no 
mundo, tantos gêneros quanto pessoas. Transformar 
“gênero” numa categoria de análise apenas reforça que 
assim como não é possível classificar “mulheres” num 
único objeto, não se pode falar em uma categoria “de 
gênero” A própria definição de categoria diz: “2. Série, 
grupo. 3. Classe, qualidade, ordem (Aurélio, 2009)”. E 
17 
 
 
 
gênero não é um grupo, é o que diferencia uma pessoa da 
outra. O que existe é a “mulher” (cada uma com sua 
personalidade), assim como existe o “gênero” (cada um 
com o seu). De acordo com o pensamento marxista, não 
existem o gênero masculino e o feminino, apenas o 
gênero humano. Somente é possível a generalização com 
a espécie humana já que existem homens femininos, 
mulheres masculinas, queers andróginos, semigarotos, 
semigarotas... Podemos dizer apenas “gênero humano”, 
já que “gêneros” (no plural) são infinitos, e não se pode 
medir o infinito. 
Procuramos aqui diferenciar a identidade de 
gênero “percebida” da “autopercebida” (autopercepção 
de gênero). A primeira é a chamada gender assignment at 
birth, designação do gênero pelo sexo do bebê. Já a 
“autopercebida” acontece a partir dos 2 anos (a maioria 
dos/as transgêneros é percebida pela família ou escola 
entre os três e cinco anos de idade), quando o indivíduo 
pode tanto manter o gênero que lhe foi designado ou não. 
Isso não constitui uma “ideologia de gênero” como 
berram alguns. E por que não é? Porque nós não 
18 
 
 
 
queremos impor uma visão falsa, ou tentar convencer 
através da dominação, apenas acreditamos que o que 
existe é a liberdade para a aceitação do próprio gênero 
(autopercepção), pela qual todas/os nós passamos, seja 
para reafirmar ou contestar o que a sociedade nos impôs. 
Respeitar a identidade de gênero não é ideologia no 
sentido marxista de “inversão da realidade”10. Os críticos 
argumentam que essa dita “ideologia” quer “ensinar as 
crianças a fazer sexo, ensinar a dançar músicas eróticas e 
mostrar pornografia”11, sendo que a educação sexual 
serve para conscientizar a criança sobre o que é afeto e 
abuso, a saber mais sobre o próprio corpo12 e para 
mostrar-lhe que o relacionamento de pessoas do mesmo 
sexo não é “anormal”, sendo que diversos tipos de 
família são aceitáveis. (Frisando que a criança 
 
10 “A ideologia é, assim, uma consciência equivocada, falsa, da 
realidade. Desde logo, porque os ideólogos acreditam que as ideias 
modelam a vida material, concreta, dos homens, quando se dá o 
contrário: de maneira mistificada, fantasmagórica, enviesada, as 
ideologias expressam situações e interesses radicados nas relações 
materiais, de caráter econômico, que os homens, agrupados em 
classes sociais, estabelecem entre si (O Capital, pg. 30).” 
11 Disponível em: https://www.almanaquesos.com/educacao-sexual-
na-escola-ensina-criancas-a-fazer-sexo/. Acesso em 29/11/2018. 
12 Ibd. 
19 
 
 
 
“descobre” seu verdadeiro gênero, dado que gênero é 
uma condição, e não uma escolha. O fato somente sai do 
Id e vai para o Ego). São eles que querem impor através 
do poder da religião uma visão determinista e formadora. 
Se a transexualidade fosse uma ideologia existiriam 
tantos transgêneros quanto cristãos no mundo. 
O objetivo da pesquisa é identificar a 
transgeneridade como fenômeno histórico e social no 
século XXI, com origens no séc. XX, a partir do estudo 
da literatura científica, comparando os estudos 
sociológicos de Bento, Butler e Preciado com a literatura 
médica (Benjamin, Kinsey e Money). Justifica-se pela 
quase inexistência de trabalhos sobre transexualidade no 
âmbito da historiografia. A Nova história no entanto, traz 
a possibilidade desse assunto ser mais trabalhado; e, 
como diz FOGAÇA, 2019, “amplia o campo de pesquisa e 
permite que o historiador utilize novas ferramentas para a 
produção historiográfica”. Assim como as já consagradas 
história da mulher (DEL PRIORI); da sexualidade 
(FOUCAULT) e do amor (LINS), a “história da 
trangeneridade” está sendo escrita, mas, como diria Marc 
Bloch, “Documentos são vestígios”, e tudo que já foi 
20 
 
 
 
escrito sobre o assunto pode e deve ajudar a deixar um 
rastro na história, sejam textos jornalísticos, jurídicos, 
médicos ou de psicologia, áreas em que a transexualidade 
é mais explorada. 
A pesquisa se divide em quatro partes: Na 
primeira, desenvolveremos o conceito de “Trans” como 
um “fenômeno transexual” (BENJAMIN, 1966); e 
discutiremos sobre a transgeneridade em si, como um 
conceito a priori; a segunda traz o estudo de caso do/a 
gender fluid Y13; a terceira, o relato de um fato 
conhecido como caso John/Joan; e por último, a 
definição de identidade sexual. 
Enfim chegaremos à conclusão: Não devemos 
criar nossos filhos e filhas para serem quem nós 
queremos que sejam. Respeitar a identidade de gênero de 
cada um é praticar a dignidade da pessoa humana, pilar 
das sociedades democráticas e pluralistas. Disse a 
psicanalista Letícia Lanz, em entrevista ao programa 
“Persona” em 2015, que se as crianças fossem criadas 
com mais liberdade não existiriam apenas “dois” 
 
13 Gender fluid em tradução livre seria como “gênero fluido”, aquela 
pessoa que transita entres os gêneros durante a vida. 
21 
 
 
 
gêneros, mas 7 bilhões.14 Como tem dito Paul Beatriz 
Preciado, todas e todos nós deveríamos “neutralizar” os 
próprios nomes, colocando um nome masculino e 
feminino juntos, como o/a autor/a Erasmo Hera da 
Rocha. Assim, o conceito de gênero seria diluído e não 
mais julgaríamos as pessoas por serem homens e 
mulheres, mas apenas por serem “corpos falantes” 
humanos. Esta seria a sociedade preconizada pelo 
Manifesto Contrassexual de Paul Preciado15. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
14 Disponível em:< 
https://www.youtube.com/watch?v=MhvO59RjYtc>. Acesso em 06 
ago. 2019 
15 Preciado, Beatriz. Manifesto Contrassexual. São Paulo, n-1 
edições, 2014. 
22 
 
 
 
1. O QUE É TRANS*? 
 
Trans*16 é a categoria de um tipo de gênero 
binário, podendo significar transgêneros masculinos ou 
femininos. Os gêneros não binários não pertencem a essa 
categoria, apesar de que alguns dos seus adeptos 
acreditem que estão “entre” os gêneros binários, como, 
por exemplo, os demiboys e as demigirls (dos quais 
falaremos mais adiante). 
 
1.1 A Ideia 
Em nossa concepção, para se fazer uma pesquisa, 
é preciso estabelecer um recorte de tempo e espaço de 
um tema que seja historicamente relevante para o/a 
pesquisador/a. O presente estudo se justifica ao 
considerar o “fenômeno transexual” na leitura de textos 
médicos e científicos e fazer um estudo comparado com 
as principais obras que estudaram o assunto no século 
XX e até o início do séc. XXI com a mudança do CID-11 
 
16O asterisco indica tanto o homem trans como amulher trans. Põe-
se o asterisco quando não se especifica o gênero. Por praticidade, no 
restante do texto optamos por excluir o asterisco. Quando se 
especificar o gênero ele será indicado. 
23 
 
 
 
(2018). A importância deste trabalho é estudar o outro 
lado da transexualidade. Em vez de se pautar no 
preconceito e dificuldade que as pessoas trans enfrentam, 
apesar de fazer uma crítica a como a sociedade vê os/as 
transexuais, o texto propõe um estudo a priori da 
transgeneridade, sem o julgamento da sociedade e com a 
perspectiva científica desse fenômeno, que passou a ser 
estudado a partir do século XX. 
Busca-se com essa pesquisa uma maior 
visibilidade para as pessoas trans, mostrando que suas 
identidades não são apenas construídas socialmente, mas, 
sobretudo, individualmente. É a chamada “identidade de 
gênero autopercebida”, que não é influenciada nem pela 
família nem pela genética, mas pela própria pessoa, que, 
em contrapartida, se espelha em algum ator social, seja a 
mãe ou o pai ou qualquer pessoa. Por isso dizem que o 
papel de gênero está no cérebro, pois somos únicos. Por 
dentro somos seres fisiológicos (“sexo biológico”), mas 
por fora somos seres sociais, e o fato de estabelecer a 
roupa que vamos vestir todos os dias, seja um vestido ou 
um paletó, diz apenas de nossa “expressão de gênero”. Já 
24 
 
 
 
a “orientação sexual” diz respeito a atração, ao passo que 
“identidade” e “expressão” dizem respeito a como 
encarar o mundo. 
“A sexualidade, assim como a 
orientação sexual, não está instalada 
somente no genital, tampouco a 
identidade de gênero, que também não 
pode ser confundida com a expressão de 
gênero. Contudo, não é possível ignorar 
e dizer que esses conceitos não se 
atravessam ou que não estejam 
relacionados - o que não significa dizer 
que dependam um do outro17.” 
 
 
1.1 O Fenômeno 
 
A partir dos anos 1980, já no fim da ditadura militar no 
Brasil, voltou da Inglaterra a atriz Roberta Close (1964-), 
a primeira mulher transexual brasileira a ser 
publicamente famosa. Os jornais da época estampavam: 
“A mulher mais bonita do Brasil é um homem”18. Foi o 
primeiro caso de destaque de uma mulher transexual que 
 
17Disponível em:< http://www.meupalco.com.br/2015/09/>. Acesso 
em 14 jul. 2018. 
18 Disponível em: 
http://anos80incriveis.blogspot.com/2010/09/mulher-mais-linda-do-
brasil-era-homem.html. Acesso em: 13/07/2018 
25 
 
 
 
havia feito cirurgia de transgenitalização no exterior, já 
que aqui era configurado como crime de mutilação 
genital. Porém isso não impedia que pessoas transgênero 
o fizessem clandestinamente. 
O caso de João W. Nery (1949-2018), contado em 
sua autobiografia “Viagem Solitária” (2011), que retirou 
os ovários e as mamas e foi proibido de exercer a 
profissão de psicólogo, já que o diploma foi conseguido 
com os documentos femininos, e a lei concebia que 
“mudar o nome” para adequar a identidade de gênero era 
crime de dupla identidade. João W. Nery, que dá nome 
ao PL 5.002/2013, de Jean Willys (PSOL-RJ) e Érica 
Kokay (PT-DF), que regulamenta a identidade de gênero, 
faleceu aos 68 anos devido a um câncer no cérebro, com 
o título de doutor honoris causa pela Universidade 
Federal do Mato Grosso (UFMT). 
A dita manchete sobre Roberta Close apareceu em 
1984. O país vivia um momento de redemocratização, 
mas os direitos dos homens e mulheres trans estavam 
longe de ser levados em consideração. Roberta só 
conseguiu mudar seus documentos já nos anos 2000, ou 
26 
 
 
 
seja, até aquele momento, ela era vista como “um homem 
que virou mulher”. Ou nem isso, “um homem que pensa 
que é mulher”. 
 
1.2 A Lei 
 
A sociedade demorou a pautar e o CFM 
(Conselho Federal de Medicina) custou a lançar 
resoluções regulando o atendimento às/aos transexuais. A 
primeira delas foi a Resolução 1.482/97 e, atualmente, a 
Resolução vigente é a 1.955/2010, que revogou uma 
posterior à de 1997: 
RESOLUÇÃO CFM n° 1955/2010. 
(Publicada no D.O.U. de 3 de setembro 
de 2010, Seção I, p. 109-10). Dispõe 
sobre a cirurgia de transgenitalismo e 
revoga a Resolução CFM nº 1.652/02. 
As resoluções são muito parecidas. A primeira 
tem apenas quatro artigos, que entendiam o 
“transexualismo” como um transtorno mental, e 
apresentava como pré-requisito: 
 
3. A seleção dos pacientes para cirurgia de 
transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe 
27 
 
 
 
multidisciplinar constituída por médico-psiquiatra, 
cirurgião, psicólogo e assistente social, obedecendo 
aos critérios abaixo definidos, após dois anos de 
acompanhamento conjunto: 
- diagnóstico médico de transexualismo; 
- maior de 21 (vinte e um) anos; 
- ausência de características físicas inapropriadas para 
a cirurgia. 
 
A mais nova resolução (2010) já diz: Art. 3°: 
“Que a definição de transexualismo obedecerá (...) 
1. Desconforto com o sexo anatômico 
2. Desejo de eliminar genitais e adquirir características 
sexuais secundárias do sexo oposto. 
3. Permanência desse desejo por no mínimo dois anos. 
4. “Ausência de outros transtornos mentais” (Leia-se 
“Ausência de transtornos mentais”). 
 
 Quanto aos pré-requisitos, só muda de 
“diagnóstico médico de transexualismo” para 
“diagnóstico médico de transgenitalismo.” 
 
1.3 A Batalha 
 
Em 1910, o médico alemão Magnus Hirschfeld 
(1868-1935) escreveu um livro intitulado Die 
28 
 
 
 
Transvestiten [The Transvestites - The Erotic Drive to 
Cross-Dress] para designar os chamados cross-dressing, 
ou seja, as travestis. Porém a palavra em português 
significa muito mais que "vestir-se atravessado", é uma 
definição de luta dessa classe que se identifica com o 
gênero feminino. Por isso não existe "o" travesti, o que a 
mídia e a literatura médica insistem em ignorar. 
Em 2015 foi proposta na Câmara Federal a 
alteração de alguns artigos do Plano Nacional de 
Educação (PNE) de 2010 para enfatizar o combate à 
discriminação de identidade de gênero e orientação 
sexual nas escolas brasileiras. Porém o setor reacionário 
da sociedade se pôs contra, inventando que o governo 
imporia uma “ideologia de gênero” desde a educação 
infantil. No Rio Grande do Sul, o PEE (Plano Estadual de 
Educação) foi aprovado suprimindo as menções a 
“identidade de gênero”, presentes em 14 artigos do 
documento.19 Seus algozes acreditam que “discutir sobre 
gênero” fará as crianças serem sexualizadas mais cedo, 
 
19Disponível em: 
<http://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/assembleia-gaucha-
retira-direito-identidade-de-genero-do-plano-estadual-de-educacao-
16533802>. Acesso em: 20 jun. 2015. 
29 
 
 
 
ensinando-lhes pornografia, a fazer sexo e dançar 
músicas eróticas. 
Em 2013, o deputado Jean Willis (PSOL-RJ) e 
Érika Kokay apresentaram um projeto de lei para 
substituir o art. 58 da lei 6.015/73, que dizia: 
"Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, 
todavia, a sua substituição por apelidos públicos 
notórios. (Redação dada pela Lei nº 9.708, de 1998)." 
 
Com a nova lei, ficaria: 
"Art. 58º. O prenome será definitivo, exceto nos casos 
de discordância com a identidade de gênero 
autopercebida, para os quais se aplicará a lei de 
identidade de gênero. Admite-se também a 
substituição do prenome por apelidos públicos 
notórios." 
 
Porém, até o momento, a lei não foi modificada, o 
que mantém a população trans marginalizada. O PL 
5.002/13 (Também chamado Lei João W. Nery) ainda 
diminuiria a idade mínima para cirurgias de adequação 
de gênero para 18 anos (atualmente é aos 21) e facilitaria 
seus trâmites. 
 
 
 
30 
 
 
 
1.4 O Conceito 
 
“Trans” é um prefixo que em latim significa “do 
outro lado”20. Serve para identificar pessoas que nascem 
com um sexo determinado fisiologicamente, mas que 
pertencem mentalmente ao sexo oposto.O asterisco é 
usado quando não se especifica o gênero (masculino ou 
feminino). 
Harry Benjamin (1885-1986), em The 
Transsexual Phenomenon [O Fenômeno Transexual] 
(primeira edição em 1966), identifica vários tipos de 
“sexos”: Morphological ou anatomical sex; gonadal ou 
genital sex; endocrine ou hormonal sex; legal sex; e, 
ainda, o physichological sex, que corresponde à 
identidade de gênero do indivíduo. O primeiro (sexo 
anatômico) é a fisiologia do indivíduo; sexo genital ou 
gonadal é o critério principal na definição do gênero do 
recém-nascido; sexo hormonal é o que determina as 
características secundárias um pouco mais tarde na vida; 
 
20 Disponível em: <http://espectrometria-nao-
binaria.tumblr.com/post/95841791923/gloss%C3%A1rio-termos-
sobre-g%C3%AAneros-sexualidades>. Acesso em 13 jul. 2018. 
31 
 
 
 
sexo legal é aquele registrado no cartório e aceito pela 
sociedade, (atualmente já se pode mudar o sexo legal sem 
alterar o sexo genital); por último, o sexo psicológico é o 
filtro através do qual vemos a sociedade, já que gênero 
está no cérebro e a sexualidade está no coração. 
Por exemplo: Uma pessoa classificada como 
mulher por ter uma vulva pode sentir-se do gênero 
masculino, assim como um indivíduo que nasce com 
pênis pode reconhecer-se socialmente como mulher. 
Elas/eles são, portanto, transgêneros. 
Para a biociência, “sexos” existem dois: macho ou 
fêmea (além dos intersexos, vulgo hermafroditas). 
Gênero é o que pertence ao universo masculino ou 
feminino; papel de gênero (role gender) é o que a 
sociedade classifica como “de homem” ou “de mulher”. 
A transgeneridade ativista prefere que a pessoa seja 
tratada pelo gênero com que se identifica; já a Medicina 
usa o adjetivo do sexo biológico do indivíduo para 
categorizá-lo. “Transexual feminina” é, para as Ciências 
32 
 
 
 
Médicas, o homem trans para o movimento LGBT, e 
“transexual masculino”, a mulher trans.21 
 
1.5 A orientação 
 
O psicólogo norte-americano Alfred Kinsey 
(1894-1956) desenvolveu uma tabela que indica que 50% 
dos homens são exclusivamente héteros, 46% têm 
preferência pelos dois sexos, mas em graus diferentes, e 
apenas 4% da população masculina são “homo[s] 
exclusivo[s]”. Essa classificação vai de 0 a 6 sendo zero 
o primeiro grupo; 1-2 bissexuais com preferência por 
mulheres; ‘3’ “homo e hétero na mesma proporção” e ‘6’ 
os exclusivamente homossexuais. O X corresponde ao 
assexuado. Trangêneros e travestis podem se encaixar em 
 
21 LGBT: movimento Lésbico-Gay-Bissexual-Transgênero. Fazendo 
uma crítica a tal movimento, que de certo modo exclui o gênero 
queer, que não tem as mesmas reivindicações dos demais LGBTs: 
cirurgia de redesignação e casamento entre pessoas do mesmo sexo, 
por exemplo (SILVA, 2016), notamos a necessidade de falar em 
movimento LGBTQI (queers e intersexos incluídos/as), no sentido 
em que aqueles/as que não se encaixam na binaridade de gênero 
possam pautar sua agenda frente a uma sociedade heteronormativa 
que não respeita a diversidade de gênero e não se identificam nem 
como homem nem como mulher. 
33 
 
 
 
qualquer um dos três; até porque existem trans que são 
héteros (ou seja, gostam de pessoas cis22 heterossexuais 
ou de outros trans com identidade de gênero oposta) e 
transgêneros que são gays. Uma relação de um homem 
trans e uma mulher trans é considerada “heteroafetiva”, 
enquanto mulher trans com mulher trans e homem trans 
com homem trans é homoafetiva. O sexo biológico não 
determina a orientação sexual, e sim o gênero. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
22 Cisgênero, ou simplesmente “cis”, é o indivíduo que aceita seu 
próprio corpo. Já o transexual ou a travesti, como já foi dito, está “do 
outro lado”, ou seja, pertence ao gênero oposto ao determinado pelo 
nascimento. Cis em latim significa “deste lado (e não do outro)”, 
segundo o site “Transfeminismo”. Disponível em: 
<https://transfeminismo.com/o-que-e-cissexismo/>. Acesso em 13 
jul. 2018. 
34 
 
 
 
1.6 A Origem 
 
Os termos Cis e Trans são emprestados da 
biologia: 
→ Arranjo cis: Em um cromossomo 
existem apenas alelos dominantes (AB), 
enquanto no outro encontramos alelos 
recessivos (ab). 
→ Arranjo trans: Em cada 
cromossomo homólogo encontramos um 
alelo dominante e outro recessivo 
(Ab/aB). 
 
 
 
 
 Tabela 2. Crédito na 
imagem:https://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/2leidem
endel5.php 
 
Pela Lei de Mendel, traduzida para a teoria do 
gênero, o indivíduo “cis” é aquele que tem o gênero e o 
sexo congruentes: A com B e b com a (maiúscula com 
35 
 
 
 
maiúscula e minúscula com minúscula). Já no transexual, 
o sexo e o gênero são divergentes: A com b e a com B 
(maiúscula com minúscula e minúscula com maiúscula). 
 
1.7. A Transgeneridade em si 
 
Já apresentamos Alfred Kinsey com seus estudos 
pioneiros sobre orientação sexual. A seguir, estudaremos 
a origem do termo transsexual [transexual] e como ele se 
popularizou, deixando o armário e as alcovas para virar 
um fenômeno social no mundo inteiro. 
Na esteira da tabela de Kinsey, Harry Benjamin 
criou uma tabela diferenciando tipos de 
“transexualismos” (sic), o que ele chamou de “fenômeno 
transexual”. 
 
 
 
 
 
 
 
36 
 
 
 
Tradução Livre 
Tipo Caracterização 
1 Fetichista 
2 Travesti (TV) de baixa intensidade 
3 TV feminofilo23verdadeiro 
4 Típico assexual 
5 Típico transgênero (transgender) 
6 Transgênero sexual intensivo típico 
7 Transexual (TS) operado 
Fonte: Benjamin (1999) pg. 18 
Obs: Não existe a palavra feminofilo em português 
 
 
Harry Benjamin não acreditava na psicoterapia 
como forma de tratar as/os transexuais. A 
transexualidade seria um fator clínico, e apenas 
hormônios e a cirurgia poderiam resolver seus conflitos 
 
23 femiphile em inglês e feminofilo em espanhol vem de 
feminofilia: característica daquele(a) que sente atração (philia) por 
mulheres. Infelizmente não temos essa palavra ao menos no novo 
Aurélio de 2009. Travestis “feminófilos” são aquelas que se vestem 
de mulher, mas têm atração pelo sexo feminino. Diferente dos 
fetichistas, o “True femiphile TV” não tem propriamente “tesão” em 
se travestir. No CID-10 caberia nessa definição o diagnóstico 
travestismo bivalente: F64.1 
37 
 
 
 
de gênero. Hodiernamente, admite-se a importância da 
psicoterapia e da psicanálise para o autoconhecimento e 
descoberta de gênero ou orientação autopercebida, 
lembrando que um psicólogo ou um psicanalista, 
segundo o Conselho Federal de Psicologia (CFP), não 
podem induzir ou ofertar tratamento de “cura” para o 
homossexualismo (sic) e a transexualidade. Como já foi 
dito, em 1973, a APA (Associação Americana de 
Psiquiatria, sigla em inglês), retirou a agora chamada 
“homossexualidade” da lista de doenças psíquicas. No 
Brasil, entretanto, só deixou de ser patologia em 1990. 
Recentemente, em 24 de abril de 2019, o STF concedeu 
liminar ao CFP reafirmando a resolução 01/99, que 
proibia a oferta de tratamento de reversão sexual “uma 
vez que a homossexualidade não é patologia, doença ou 
desvio”24. Infelizmente, mesmo as pessoas trans 
repudiando o termo “transexualismo”, ainda há médicos 
que dele se utilizam para falar dessa “doença” que antes 
era considerada “transtorno de identidade de gênero” 
(DSM-IV, publicado em 1994), e agora, com o novo 
 
24 Disponível em:< https://site.cfp.org.br/stf-concede-ao-cfp-liminar-
mantendo-resolucao-01-99/>. Acesso em: 01 maio 2019. 
38 
 
 
 
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 
(DSM-V), de 2012, é chamada “disforia de gênero” 
(genderdysphoria). Como dissemos mais acima, agora se 
fala em “diagnóstico médico de transgenitalismo”. 
Atualmente há um movimento para tirar o 
transexualismo (sic) amenizado pelo DSM-V como 
“disforia de gênero” da lista de doenças. O CID-11 já o 
tirou da “saúde mental” para a “saúde sexual” como 
“incongruência de gênero”. Porém na contramão da total 
despatologização dessa disforia: “inquietação, mal-estar 
provocado por ansiedade [oposto de euforia]” (Aurélio, 
2009), há ainda, segundo Carla Machado, em Arilha M. 
(2010), pg. 161: 
 
“pessoas que se autodenominam 
portadoras de um desacordo biológico, 
identificando-se como mulheres ou 
homens que nasceram com uma 
disfunção biológica de genital e 
endocrinológica. Dessa forma, essas 
pessoas entendem-se portadoras de certa 
patologia do corpo, e não do gênero, 
como a medicina impõe.” (grifos 
nossos). 
 
39 
 
 
 
Baseado na publicação do MEC (Ministério da 
Educação e Cultura), “Escola Sem Homofobia” (2009), 
que relata que “se permanecermos presos a uma visão 
que insiste na ideia de dois sexos mutuamente exclusivos 
e incomunicáveis”, nunca sairemos do binarismo 
“homem é homem e mulher é mulher”, propomos um 
novo modelo de classificação de gênero, não exclusivista, 
mas “complementarista”. É o que chamamos de Relógio 
de Gênero, que considera o meio-dia representando o 
genótipo masculino (XY) e 6h, o feminino (XX). Entre 
eles há uma gama de identidades de gênero que vão 
desde a travesti ao homem trans não operado; da drag 
queen ao drag king, do demi boy à demi girl. 
A seguir apresentamos nossa visão do relógio, 
com as devidas explicações dos conceitos que podem 
gerar dúvidas: 
 
40 
 
 
 
 
 
 
 
Legenda: 
12 – XY (masculino) (Ser humano “macho”) (gay ou 
hetero)25. 
01 – Drag Queen (Homem biológico que interpreta um 
papel feminino em performances). 
 
25 É importante definir “gay ou hetero” pois a sociedade considera os 
homossexuais “efeminados”. Só que, na definição de gênero, não há 
nenhuma diferença entre um deles com um hetero, se se vestem 
masculinamente. Podem ter a “expressão de gênero” feminina; mas 
isso não significa necessariamente que são gays. Ou seja, um 
homossexual é um Homem (com H). O mesmo vale para as lésbicas 
(com o feminino). 
41 
 
 
 
02 – Demi boy (Pessoa que, independente do genótipo, 
representa um papel masculino e neutro ao mesmo 
tempo). 
03 – Neutro (XY) (Neutrois, em inglês, que não se define 
como homem nem mulher, mas algo entre eles. Por isso 
se situa no “meio” do relógio). 
04 – Travesti (Homem biológico que se traveste para ter 
prazer sexual. A diferença com as mulheres trans é que 
não tem complexo com seu genital. No Brasil, “travesti” 
é uma palavra política, pois abarca a luta das 
profissionais do sexo, reduto de grande parcela dessa 
população). 
05 – Mulher trans operada (Homem biológico que se 
reconhece no gênero oposto, mas que procura também 
fazer a cirurgia da transgenitalização26; diferente da 
travesti, que visa apenas alterar as características sexuais 
secundárias – ganhar peito e perder a barba. 
06 – XX (feminino) (“Fêmea” humana) (gay ou hetero). 
07 – Drag King (Mulher biológica que se veste de 
homem em performances). 
 
26 É o procedimento cirúrgico que ou “inverte” o pênis e o torna uma 
vagina, ou implanta um falo feito do tecido do próprio paciente. 
42 
 
 
 
08 – Demi girl (Pessoa que, independente do genótipo, se 
vê como menina e neutrois ao mesmo tempo). 
09 – Neutro (XX) (Indivíduo que não se vê como homem 
ou mulher, mas como algo entre eles). 
10 – Homem trans não operado (Seria a travesti com 
genótipo feminino, mas como esse segmento não tem 
uma classe organizada como as prostitutas, não há 
identificação política desse gênero). 
11 – Homem trans operado (A única diferença com um 
homem biológico é o genótipo). 
 
A deficiência desse relógio é que não considera os 
gêneros não binários, mas ousamos dizer que eles 
“tangenciam” o círculo, e um/a gender fluid funciona 
como um relógio que não para de girar, transitando entre 
os gêneros. É o caso do/a Y que contaremos a seguir. O 
que chamamos de “transgenderização” é a aceitação dos 
transgêneros e a respectiva inserção desses indivíduos na 
sociedade. 
 
 
43 
 
 
 
2. MEU NOME É “Y” 
 
Estava um dia chuvoso. Eram 5h da manhã 
quando Y e Lucas voltavam para casa nas ruas desertas e 
molhadas do Grajaú. Tinham deixado uma amiga no 
ponto de ônibus, e quando chegaram, um outro amigo, 
Arthur, estava dormindo. Comeram um arroz soltinho e 
foram dormir também. Lucas era o dono da casa, estavam 
ali para comemorar o término das aulas, tinham acabado 
de completar o 2° período de licenciatura em História na 
Universidade Protágoras. 
Foi naquela estiagem da manhã. Já estava tarde, o 
Arthur já tinha ido embora, almoçaram um prato de 
feijão com arroz com a boca esturricada dos dois maços 
de cigarro de palha que haviam fumado na noite anterior, 
quando de repente Lucas perguntou a Y: “Você quer ter 
uma relação homoafetiva? Sabe, uma experiência.” 
Surpreso/a, Y perguntou: “Você quer me beijar?”. Ele 
disse que não, queria apenas “experimentar”. Foi tomar 
banho e Y ficou mexendo no celular, pensando na 
relação que teria dali a uns instantes. 
44 
 
 
 
Já excitado/a na cama, depois de umas investidas 
no seu sexo, pediu: “Quer tentar me comer?” 
Empertigou-se no colchão e o aguardou pegar a 
camisinha no outro cômodo. Ele voltou nervoso, com a 
camisinha na mão, mas dizendo que não ia rolar. Y disse 
tudo bem e voltou a investir no seu falo, mas percebia 
que ele continuava aflito. (Depois Lucas confessou sentir 
asco daquilo tudo). 
Quem visse Y na sua infância não diria que ele/a 
fosse “diferente”, e apesar de não ser alvo do interesse 
das meninas da sua idade, Y nunca teve orientação 
homossexual; interessava-se por meninas acreditando ser 
um garoto e, como todo garoto que conhecia, se 
interessava por garotas. Os meninos que não “chegavam” 
em outras meninas deviam gostar de garotos. Achava um 
deles lindo, mas nunca criou coragem de se declarar. 
Pedia para que os amigos “chegassem” nas garotinhas 
para ele, sendo que a primeira vez que conquistou uma 
menina sem intermediários foi na festa junina da escola, 
aos quinze anos, com uma garota um pouco mais nova. 
45 
 
 
 
Hoje Y acredita ter gênero fluido, às vezes se 
sente mulher e às vezes homem. Quanto à orientação 
sexual se declara bissexual. Sua tendência homossexual 
vem desde os 16 anos, quando abordou um colega antigo 
pensando ser ele gay também. Mas nunca teve sua 
sexualidade definida sendo que somente aos vinte anos 
teve uma relação com outro homem. 
Quando voltou às aulas, já no 3° período, teve 
uma briga com o Lucas. Saiu dela muito mal e teve uma 
crise de choro no dia seguinte. Dois dias depois, manteve 
uma conversa com ele por meia hora no telefone, em que 
acertaram as arestas e ele aconselhou Y a se assumir, já 
que para Lucas ele era “submisso”, “bicha-louca” e 
“supersensível”. Isso deu uma reviravolta em Y. “Bicha-
louca” sabia que não era, mas foi a primeira vez que 
alguém lhe atribuía características estereotipicamente 
femininas assim deliberadamente. Desligou o telefone 
acreditando que a conversa foi melhor do que com 
qualquer psiquiatra do mundo. Para Y, Lucas havia 
aberto sua mente para o que sempre esteve lá: a 
identidade feminina. No passado, colocava fotos e nomes 
46 
 
 
 
femininos nos seus perfis de redes sociais como Dakota 
Fanning. Lindsay Lohan e Winona Rider. Mas nunca 
alguém lhe perguntou se queria ser chamado assim. 
Houve tempos em que pensava todos os dias antes de 
dormir que só tinha dois caminhos: o sexo feminino ou o 
suicídio. Chegou até a cogitar fazer a operação de 
transgenitalizaçãoquando fizesse 21 anos, mas como as 
pessoas o chamavam apenas pelo seu nome de cartório, e 
ninguém, nem seu psicólogo ou sua própria mãe, nunca 
enxergaram quem realmente era, aceitou todos esses anos 
ser chamado pelo gênero que lhe foi designado e 
interpretar o papel de gênero masculino a maior parte do 
tempo, exceto nas redes sociais. Seu nome feminino era 
visto como um pseudônimo, ninguém nunca o chamou de 
"Dakota" na escola ou fora da Internet, e nem sequer ele 
cogitava em se assumir assim na vida real. Ele mesmo foi 
esquecendo sua vontade de mudar de sexo, e, com 21 
anos teve sua primeira paixão homossexual (já que Lucas 
era hétero). No mesmo ano conheceu Lucas e Arthur no 
curso de História e no fim do semestre teve sua relação 
com o primeiro. Depois da conversa pelo telefone, 
47 
 
 
 
decidido que era mulher, começou a se vestir como tal. 
Começou a tomar hormônios femininos no dia 16 jun. 
2015, um dia antes do chá-de-panela do seu melhor 
amigo, um homem cis, heterossexual e futuro historiador, 
como ela. Ele era baixo e nesse dia estava menor que sua 
noiva, por conta do salto alto que a moça usava. Y 
percebeu imediatamente o poder de uma mulher de salto. 
Baixinha e acanhada no dia do noivado, agora mostrava 
confiança e apagou qualquer superioridade que ele 
poderia ter sobre ela. 
Numa conversa com uma amiga, esta lhe disse 
que devia se inspirar nas mulheres trans. Só que Y não as 
achava tão bonitas quanto as mulheres cis. Mas depois se 
lembrou da Ariadna, participante do Big Brother Brasil 
11, a primeira trans-mulher de que teve notícia, e a 
achava uma das mulheres mais bonitas que já vira na 
vida. Depois conheceu Laerte, Léa T, Laverne Cox e 
muitas outras, e quando teve seu primeiro contato com o 
texto de Daniela Andrade (ativista trans), se identificou 
definitivamente com essas mulheres, tão lindas e 
48 
 
 
 
emponderadas como qualquer outra cisgênero que um dia 
quis ser. 
Assim termina o relato de uma pessoa que desde a 
adolescência se indaga sobre seu verdadeiro gênero. É a 
razão do título desse livro: “Cis ou Trans: Buscando uma 
Identidade”, a qual é um conflito, uma luta de todos/as 
gender fluid do mundo. 
Lutamos pela “transgenderização”, para que cada 
vez mais, gêneros não conformistas sejam reconhecidos 
socialmente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
49 
 
 
 
3. JOHN/JOAN CASE 
 
 Mostramos pessoas como Roberta Close e João 
W. Nery que decidiram mudar consciente e 
voluntariamente suas identidades de gênero percebidas. 
O caso abaixo aconteceu com uma criança que foi 
designada como do sexo masculino, mas que, por conta 
de um acidente, foi levada a crer que era uma menina. 
Em 2000, o jornalista da revista “Times”, John Colapinto 
(1958-), trouxe essa história a público e causou muita 
polêmica com o relato da experiência que foi considerada 
um sucesso pelo médico responsável, segundo seus 
relatórios em “Man & Woman, Boy & Girl” 
(EHRHARDT, MONEY, 1973). 
Em 22 de agosto de 1965, na cidade de Winnipeg, 
Canadá, nascem os gêmeos Bruce e Brian Reimer. Porém 
um acidente, quando eles tinham oito meses, marcou suas 
vidas futuras. Um urologista, num procedimento de 
circuncisão, mutilou o pênis de Bruce. Segundo o 
especialista, nenhum reparo cirúrgico poderia ser feito. 
Os familiares procuraram em vão outros médicos até que 
50 
 
 
 
ouviram o Dr. John Money (1921-2006) no programa de 
televisão canadense “This Hour Has Seven Days” [Esta 
Hora Tem Sete Dias] e resolveram procurá-lo. Entraram 
em contato com o sexologista, e ele sugeriu que o 
visitassem em Baltimore (EUA), em sua clínica na 
Universidade de Johns Hopkins (John Hopkins Gender 
Identity Clinic). 
Segundo o psicólogo e sexologista especializado 
em transexualidade John Money, a criança, nos dois 
primeiros anos de vida, não tem um gênero 
preestabelecido. Se a família de Bruce e Brian criasse 
Bruce como menina, por não ter pênis (já que foi 
mutilado), assim ele se identificaria com o sexo 
feminino. Sua teoria de “neutralidade de gênero” (gender 
neutrality) poderia ter uma comprovação nesse caso que 
ficou conhecido como John/Joan case. Para John Money, 
haveria o nature versus nurture [inato x adquirido]; o 
gênero, nesse ponto de vista, é “adquirido”, ou seja, 
construído socialmente. Para alguns autores (MONEY e 
TUCKER, 1981), a construção da identidade de gênero 
requer a identificação com um dos sexos (homem ou 
51 
 
 
 
mulher). Não se pode, como o caso John/Joan confirmou, 
criar uma mulher em um organismo masculino. A 
identidade de gênero só se faz necessária quando nos 
deparamos com uma sociedade que não consegue ver 
fora da caixinha binária homem/mulher. Paul Beatriz 
Preciado, no Manifesto Contrassexual (2014), é 
favorável à abolição dos gêneros, ao reconhecimento do 
corpo como “produtor de dildos27” e à renúncia à 
propriedade dos “fluxos seminais” ou do produto do 
útero. Assinando o “contrato contrassexual”, o indivíduo 
renuncia a quaisquer “laços de filiação (maritais ou 
parentais)”. Renuncia à “condição natural” de homem ou 
mulher, para se tornar apenas um “corpo falante”, 
reconhecendo as outras pessoas também como corpos 
falantes. Portanto a identidade de gênero nessa sociedade, 
que substitui o contrato social pelo contrassexual, seria 
abolida. 
O sexo genital não nos diz nada quanto à 
orientação sexual ou identidade de gênero, assim como 
 
27 Dildo é um objeto cilíndrico, podendo representar um pênis ou um 
símbolo sexual. Em Preciado (2014) há uma explicação de “como 
masturbar um braço”. 
52 
 
 
 
nem o sistema hormonal ou morfológico; apenas o 
psychological sex (sexo psicológico) nos diz o que 
somos, e, se for assim, existem tantos sexos como 
existem pessoas (DELEUZE e GUATTARI apud 
BUTLER, 2009)28, pois cada uma/um é unique, como se 
diz nos países de língua inglesa. 
Voltando ao caso de Bruce Reimer (John/Joan 
case), John Money retirou os testículos de Bruce e 
orientou a família para jamais revelar que ele havia 
“nascido homem”, e foi decidido que ele (agora ela) se 
chamaria Brenda. 
Brenda cresceu orientada pelo 
psicólogo/sexologista juntamente com seu irmão Brian, 
que também desconhecia a condição da irmã. Numa 
sessão em conjunto, Money pergunta “quem mandava” 
entre os dois. Brenda responde: “Brian, porque ele é 
menino”. Brian é questionado se ele “revida” [fight back] 
quando as outras crianças o provocam, e ele diz que sim. 
John pergunta se Brenda também “revida às vezes” e ela 
 
28 BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão 
da identidade. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2018, p. 206. 
 
53 
 
 
 
diz que não. Por ser uma menina e “girls don´t fight back, 
do they?” Brian conclui dizendo que as garotas não 
revidam porque “batem fraquinho” [don’t kick very 
hard]. 
Numa sessão individual, Brenda é questionada 
por Money o que diferencia um menino de uma menina e 
ela responde “I don´t know” [Eu não sei]. Mesmo com a 
insistência do psicólogo, sugerindo que os garotos tinham 
uma “coisa” entre as pernas e as garotas não, Brenda 
continua enfaticamente: “I don´t know”. 
Está claro que Bruce/Brenda, nessa época com 
sete anos, está em conflito com seu verdadeiro gênero. 
Ela gosta de brincar com os bonecos de Brian e por isso 
não tem muitas amigas na escola, e os meninos não a 
incluíam em suas brincadeiras por causa de sua aparência 
feminina. Em mais uma sessão, John Money tenta 
convencer Brenda e Brian a tirar a roupa e tirar fotos para 
ela ver as diferenças entre os meninos e as meninas. 
Brenda sai dali com asco do médico e anuncia a sua 
família que preferia morrer a voltar a vê-lo. 
54 
 
 
 
Foi então que, segundo a família, Bruce/Brenda 
iniciou seus desejos suicidas que acabarão portirar sua 
vida quando tinha 38 anos. 
Antes disso, John Money sugere que a família 
enfim revele o “segredo” de Bruce/Brenda (nessa época 
com 15 anos) e quem é o mais atingido é Brian, que 
desenvolve esquizofrenia e morrerá de overdose de 
medicamentos psiquiátricos em 2002. Por outro lado, a 
partir dali, Brenda começa a sentir pela primeira vez “um 
pouco de esperança”. Muda seu nome para David Reimer 
e se casa com Jane Fontaine em 1990 (aos 25 anos), além 
de fazer uma cirurgia de transplante de pênis. 
Porém o jovem David se sente frustrado em 
relação à esposa por não poder dar-lhe filhos (já que ele 
havia sido castrado). E com a morte de seu irmão 
congênito acaba tirando a própria vida com um tiro de 
pistola a cinco de maio de 2004. A família ainda culpa o 
médico John Money pelo suicídio, mas seu ex-aluno 
Richard Green (1936-) garante que Money fez a escolha 
certa naquele tempo, e que ele faria o mesmo hoje. 
 
55 
 
 
 
4. IDENTIDADE SEXUAL 
 
Ingenuidade do seu pai e da sua mãe, que assim 
como John Money no caso de David Reimer, 
acreditavam que podiam definir para você um papel de 
gênero para a vida toda. É costumeiro dizer: “Fulano 
nasceu menino, mas virou mulher”. Simone de Beauvoir 
já dizia: “Não se nasce mulher, torna-se”. Com o gênero 
masculino se dá o mesmo. A designação do sexo no 
nascimento é só baseada no genital do bebê [gender 
assignment at birth]. Nascemos, e nossa família nos 
impõe aquilo que por incrível que pareça está respaldado 
na lei. Para comprar presente, principalmente para bebê, 
não se pergunta do que a criança gosta e sim se é menino 
ou menina! No mercado há artefatos e roupas separados 
por gênero, mas parecem ignorar o neutro, o agender, o 
intersexo, e assim por diante. Como se tudo se resumisse 
ao binarismo e à falsa dicotomia entre masculino e 
feminino. Esses são gêneros que se complementam como 
yin e yang, mas a vida não se resume a isso. Existem as 
forças divergentes que não se encaixam no padrão 
dualista, os gêneros não binários; que nem por isso estão 
56 
 
 
 
em desarmonia com a natureza. Imagine se todos/as 
fôssemos héteros e gerássemos uma grande quantidade 
de filhos? O mundo iria entrar em colapso! A própria 
infertilidade é uma forma natural de controle da 
população, e os intersexos (vulgo hermafroditas) estão aí 
para mostrar que o homem e a mulher têm a mesma 
origem e são em muito quase idênticos. Como uma 
fábrica que trabalha com a mesma matéria-prima na 
confecção de carros diferentes; por vezes pode rolar uma 
confusãozinha e trocarem-se algumas peças e deixá-los 
meio “ambíguos”. Porém nem tudo no ser humano tem 
explicações físicas ou mecânicas. O diagnóstico de uma 
doença mental não se dá por exames fisiológicos, e sim 
pela subjetividade de cada paciente. Um/a transexual 
geralmente não tem nenhuma discrepância hormonal ou 
genética, apenas uma identidade de gênero divergente 
daquela que se espera ao nascer. Ninguém, quando a filha 
(ou filho) nasce, pensa: “Ela vai ser uma transexual 
primária” ou “Ele vai ser um travesti bivalente”. Todo 
mundo crê que se forem educados pelos padrões 
vigentes, eles/elas crescerão de maneira saudável e serão 
57 
 
 
 
pessoas “normais” no futuro. A palavra já indica: 
Normal: “o que está dentro da norma”, no caso, a 
heteronormatividade. Engravidar “por acidente” é 
normal? “Brincar” de matar e morrer é normal? Podem 
até estar no campo do instinto de sobrevivência ou 
preservação da espécie, mas, por favor! Somos seres 
racionais; a cabeça está aí para ser usada. Tudo bem se 
alguns a usam para entender coisas fúteis, e que o uso da 
violência às vezes é justificável e necessário. Entretanto 
não podemos esquecer da violência institucional ou 
velada. Seja da tropa de choque, do professor explosivo 
ou do apresentador inescrupuloso; todos justificam o 
revanchismo e a resistência da outra parte. 
O sexologista John Money supunha que aos dois 
anos de idade a criança “fechava as portas” de sua 
identidade sexual. Dizia que apenas uma travesti com 
duas personalidades podia “reverter a direção após os 
primeiros anos”. (MONEY, 1981, pág. 104). 
Mas o que é trans*? O que essa palavra significa 
para nós? Falamos de pessoas transexuais como João W. 
Nery e Roberta Close. Mas o que isso quer dizer? 
58 
 
 
 
A primeira vez que a palavra surgiu na literatura 
científica foi em 1949, com David Cauldwell (1897-
1959), num ensaio intitulado “Psycopathia Transexualis”. 
No entanto, é atribuído a Harry Benjamin, a difusão do 
termo “transexual”. Em The Transsexual Phenomenon, 
disserta sobre o “transexualismo” e “travestismo”. Ele 
acreditava que para os “verdadeiros transexuais” (sic), 
apenas a cirurgia de transgenitalização podia causar certo 
alívio, sendo que a psicoterapia era praticamente inútil 
nesses casos. (BENJAMIN, 1999). Quanto aos 
“transvestites”, reconhece também os “verdadeiros” (true 
TVs), que NÃO se travestem apenas por fetiche, mas que 
também NÃO sentem necessidade de passar por cirurgia 
de reconstituição genital. 
Em 1910, o médico alemão Magnus Hirschfeld 
(1868-1935) escreveu um livro intitulado Die 
Transvestiten [The Transvestites – The Erotic Drive to 
Cross-Dress] para designar os chamados cross-dressing, 
ou seja, as travestis. A palavra em português, porém, 
significa muito mais que “vestir-se atravessado”, é uma 
definição de luta dessas pessoas que se identificam com o 
59 
 
 
 
gênero feminino. Por isso não existe “o” travesti, o que a 
mídia e a literatura médica insistem em ignorar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
60 
 
 
 
CONCLUSÃO 
 
O estudo do caso John/Joan possibilitou conhecer 
um pouco mais o que antes estava encoberto da ciência. 
Apesar de basicamente só os testículos produzirem 
testosterona (o principal dos hormônios masculinos), 
como esse estudo propôs esclarecer, a “identidade de 
gênero” está muito além de hormônios e genitálias, ela é 
um construto individual de cada um e, sem medo de 
errar, podemos reafirmar: existem 7 bilhões de “gêneros” 
ao redor do mundo. O Facebook estadunidense, por 
exemplo, dá para seus usuários a opção de 52 gêneros 
diferentes29. 
O binarismo feminino/masculino, boy or girl, não 
passa de uma imposição cultural, baseada em argumentos 
tradicionalmente consolidados como o utilizado por altos 
manuais de Medicina como o DSM-5, que, ainda em 
2013, categoriza a transgeneridade como “disforia de 
gênero”, e pressupõe preferência a “brinquedos 
 
29Disponível em:<https://epoca.globo.com/vida/noticia/2014/03/52-
opcoes-de-bidentidade-sexual-no-facebookb.html> Acesso em 30 
out. 2019. 
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61 
 
 
 
estereotipicamente” femininos ou masculinos30 para 
diagnosticar um ser humano que quer apenas viver sua 
individualidade e brincar e ser o que ela/ele quiser, 
independente da sociedade castradora e do “espírito de 
grupo”, que apenas reafirma essa castração, impondo 
normas de convivência do que é ser “homem” e o que é 
ser “mulher”, desde a tenra infância. 
Portanto, a teoria de John Money não se sustenta. 
Não nascemos “sexualmente neutros”. A presença ou não 
de um pênis intriga a criança desde o parto, e a chamada 
“gender assignment at birth” [designação sexual 
determinada pelo genital do bebê] é sim, como diria 
Kant, uma característica da “menoridade” intelectual, 
pois é uma característica mesquinha do ser humano, que 
ainda não alcançou sua “maioridade”. Como o caso 
John/Joan mostrou, não dá para você criar a criança para 
ser de tal gênero. A identidade de gênero é construída 
(descoberta?) por cada um, à medida que cresce. A 
identificação não é uma patologia, é a questão central 
para o desenvolvimento da criança como “sujeito 
 
30Manual diagnóstico e estatísticode transtornos mentais [recurso 
eletrônico]. Porto Alegre, Artmed, 2014. 
62 
 
 
 
sexuado” (WOODWARD, 2014); é uma condição! 
Entretanto o nosso instinto, pervertido pela civilização e 
principalmente pela “fala”, quer dar nome a tudo que se 
vê, e categorizar tudo que existe. A separação do que é de 
homem e o que é de mulher é apenas uma normalidade 
patológica (arbitrário cultural), doentia. A 
heteronormatividade considera que tudo que não é 
homem-hétero-masculino é inferior. A dominação 
masculina parte do princípio de que a mulher é um ser 
que precisa ser subjugado, e a própria categorização dela 
como inferior justifica essa sujeição. 
Chegamos à conclusão de que a identidade de 
gênero é construída individualmente e socialmente, se 
espelhando nos papéis sociais com que nos 
identificamos. E, repetindo, não podemos “moldar” 
nossos filhos e filhas para serem quem nós queremos que 
sejam. O que devemos fazer é respeitar as identidades de 
gênero. Um menino pode ser menina ou uma menina 
pode ser menino. Gênero é uma condição, não uma 
escolha, e não depende da genitália. 
 
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