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FUNDAMENTOS DE FARMACOTÉCNICA Keline Lang Cálculos em farmacotécnica I Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Realizar cálculos básicos percentuais para a elaboração de formas farmacêuticas líquidas e semissólidas. � Praticar cálculos de diluição de ativos. � Calcular o fator de correção de ativos farmacêuticos diluídos. Introdução Para produzir um medicamento, é necessário que o farmacêutico realize cálculos da quantidade de fármaco e excipientes necessários para a formulação. Isso vai garantir a dosagem correta e, consequentemente, um medicamento seguro e eficaz para o paciente. Neste capítulo, você vai estudar os cálculos básicos percentuais para a elaboração de formas farmacêuticas líquidas e semissólidas. Você tam- bém vai verificar como realizar a diluição de fármacos de baixo índice terapêutico, além de compreender os cálculos do fator de correção de insumos farmacêuticos ativos diluídos. Cálculos básicos percentuais para a elaboração de formas farmacêuticas As porcentagens são essenciais nos cálculos farmacêuticos. São utilizadas, normalmente, para exprimir concentrações do insumo farmacêutico ativo ou de um excipiente na preparação farmacêutica. O termo por cento corresponde ao sinal “%” e vem do latim per centum; significa “por 100” ou “partes em 100”. Por exemplo, 30% significa “30 partes de um componente em 100”. Perceba que a porcentagem é uma fração em que o numerador é expresso — nesse caso, o 30 —, porém, o denominador fica implícito, sendo que % corresponde a 100. Para efetuar cálculos, utiliza-se a fração ou o valor decimal, como 30/100 ou 0,30, conforme lecionam Ansel e Stoklosa (2008). Os tipos de preparações farmacêuticas podem ter porcentagem peso-volume (p/V), volume-volume (V/V) ou peso-peso (p/p). Vejamos a seguir cada um desses tipos de preparações. Porcentagem peso-volume (p/V) No caso de soluções ou suspensões em que substâncias sólidas são adiciona- das a um meio líquido, o percentual utilizado é massa por volume, ou seja, peso-volume (p/V). O cálculo corresponde a uma quantidade em gramas de um componente sólido em 100 mL de uma solução ou preparação líquida, conforme lecionam Thompson e Davidow (2013), e a quantia é expressa em % (p/V). Essa porcentagem também é utilizada para soluções de gases em líquidos, conforme expõem Ansel e Stoklosa (2008). Na porcentagem peso-volume, admite-se que a concentração “correta” de 1% (p/V) de uma solução ou preparação líquida contém 1 g da substância sólida para 100 mL de produto. Sendo assim, considera-se que a solução ou o líquido possuem densidade relativa como se fosse água; ou seja, a densidade fica definida como de valor 1. Assim, 100 mL da solução ou líquido, conse- quentemente, pesam 100 g. Considerando que a água pode representar qualquer tipo de solvente/veículo, é possível preparar soluções com concentrações conhecidas utilizando a seguinte fórmula: Volume (em gramas) × % (em decimais) = gramas (g) de soluto ou componente Ou seja, deve-se multiplicar a quantidade do volume total, em gramas (g), pela concentração do soluto, expressa na forma decimal, para obter a quantidade de soluto, em gramas (g), na preparação líquida ou solução. Cálculos em farmacotécnica I2 Exemplo 1: quantos gramas de ureia são necessários para preparar 1.000 mL de uma solução a 15%? Resposta: são necessários 150 g de ureia para preparar 1.000 mL de uma solução a 15%. Também é possível resolver a questão acima por análise dimensional, ou seja, rela- cionando grandezas físicas (peso, volume, etc.), sendo que uma delas é tomada como padrão. Veja o exemplo abaixo. Resposta: se o objetivo é produzir uma solução à 15%, isso quer dizer 15 g/100 mL, mas essa solução deverá ter um volume final de 1.000 mL. Assim, 15 g/100 mL multiplicado por 1.000 mL resulta em 150 g de ureia. Nesse caso, a unidade tomada como padrão é o mililitro (mL). Agora, veja o exemplo a seguir no qual é informada a quantidade em gramas do soluto na solução/preparação líquida, porém, precisa-se saber qual é a concentração dessa solução/preparação em percentual. Exemplo 2: qual é a porcentagem de concentração (p/V) de uma solução de bicar- bonato de sódio, sendo que em 60 mL da solução há 9 g de soluto? Resposta: uma solução com volume total de 60 mL contendo 9 g de bicarbonato de sódio corresponde a uma concentração de 15% (p/V). 3Cálculos em farmacotécnica I Porcentagem volume-volume (V/V) A porcentagem volume-volume, expressa em % (V/V), é utilizada em soluções de líquidos em líquido, ou seja, tanto o soluto como o solvente são líquidos. Portanto, corresponde ao número de mililitros (mL) de um componente em 100 mL de solução ou preparação líquida. Para preparar soluções com concentrações conhecidas, pode-se utilizar a seguinte fórmula: Volume (mL) × % (expresso em decimal) = mililitro (mL) de soluto ou componente Ou seja, deve-se multiplicar a quantidade do volume total, em mililitros (mL), pela concentração do soluto, expressa na forma decimal, para se obter a quantidade de soluto, em mililitros (mL), na preparação líquida ou solução. Também é possível encontrar a concentração da solução por análise dimen- sional; veja o exemplo abaixo. Exemplo 3: qual é a quantidade, em mililitros, de propilenoglicol que deve ser adi- cionada a uma solução de volume total de 120 mL, para que a sua concentração na solução seja de 8%? Resposta: são necessários 9,6 mL de propilenoglicol para preparar 120 mL de uma preparação líquida a 8%. Resolvendo a questão acima por análise dimensional, o cálculo será: Para descobrir a porcentagem (V/V) de uma solução, veja o exemplo abaixo. Cálculos em farmacotécnica I4 Exemplo 4: qual é a porcentagem (V/V) de uma preparação de 150 mL em que há 12 mL de propilenoglicol? Resposta: uma solução com volume total de 150 mL contendo 12 mL de propileno- glicol está a uma concentração de 8% (V/V). No caso de a substância (soluto) possuir densidade relativa diferente da água, siga conforme os exemplos abaixo. Exemplo 5: qual é a porcentagem da concentração (V/V) de uma preparação líquida na qual foi adicionado 25 g de uma substância líquida, de densidade relativa 0,500, em uma quantidade de solvente suficiente para (q.s.p.) preparar 180 mL? Considere que 25 g de água corresponde a 25 mL. Resposta: uma solução com volume total de 180 mL, contendo 25 g da substância líquida (50 mL, densidade relativa 0,500), está a uma concentração de 27,8% (V/V). Pode-se também resolver este exemplo por meio do cálculo dimensional, como mostrado a seguir. Volume (em gramas) × % (em decimais) = gramas (g) de soluto ou componente 5Cálculos em farmacotécnica I Porcentagem peso-peso (p/p) A porcentagem peso-peso é também chamada de percentual massa por massa, que é a quantidade em gramas de uma substância em 100 g de mistura. Esta, normalmente, consiste em pomadas, cremes e supositórios; porém, pode estar relacionada com uma solução ou um sólido. Para preparar líquidos/semissólidos utilizando a unidade de medida em massa, com concentrações conhecidas, pode-se utilizar a seguinte fórmula: Massa da preparação líquida (g) × % (em decimal) = gramas (g) de soluto ou ou semissólida componente Veja os exemplos abaixo. Exemplo 6: sabe-se que a preparação líquida deve ter uma concentração de 5% (V/V) utilizando 33 mL do insumo farmacêutico ativo (IFA). Qual é o volume final da preparação farmacêutica? Resposta: em uma preparação farmacêutica em que a concentração final é de 5% (V/V) do IFA e que deve ter 33 mL desse insumo, o volume final será de 660 mL. Exemplo 7: quantos gramas de dipropionato de betametasona devem ser utilizados para manipular a seguinte fórmula: Dipropionato de betametasona: 0,2% Pomada hidrofílica q.s.p.: 10 g Cálculos em farmacotécnica I6 Resposta: em uma preparação farmacêutica em que a concentração de dipropionato de betametasona é de 0,2% em 10 g de uma pomada, a quantidade, emgramas, de dipropionato de betametasona é de 0,02 g ou 20 mg. Exemplo 8: quantos gramas de um insumo farmacêutico ativo (IFA) líquido são ne- cessários para preparar 120 g de uma solução a 3% (p/p) em água? Resposta: em uma preparação farmacêutica em que a concentração do IFA é de 3% em 120 g de uma solução, a quantidade, em gramas, do IFA é de 3,6 g. Exemplo 9: quantos gramas de um insumo farmacêutico ativo (IFA) devem ser adi- cionados a 120 mL de água para preparar uma solução a 6% (p/p)? Veja que, neste caso, o peso final da solução não é conhecido. Sendo assim, descubra o quanto de água há na preparação farmacêutica. Resposta: em uma preparação farmacêutica em que se tem 120 mL de água e o IFA, e na qual a concentração da preparação final é de 6%, a quantidade de IFA a ser adicionado é de 7,7 g. Exemplo 10: qual é a quantidade em gramas do IFA para preparar 120 mL de uma solução 4% (p/p), sendo que a densidade relativa do solvente é de 1,10? Ou seja, 7Cálculos em farmacotécnica I Cálculos de diluição de ativos A diluição é um método utilizado para assegurar que pequenas quantidades de pós, geralmente fármacos potentes, estejam distribuídos uniformemente em uma mistura. Sendo assim, a diluição consiste em adicionar ao fármaco um excipiente inerte. Esse procedimento normalmente ocorre quando um medicamento é pres- crito em uma concentração muito baixa, como micrograma (μg) ou miligrama (mg). Sendo assim, para garantir a dosagem correta do medicamento, dilui-se o fármaco em um excipiente e, assim, a quantidade utilizada (a ser pesada) do fármaco diluído será maior. Essa diluição poderá ocorrer no próprio estabele- cimento (farmácia magistral), ou o fármaco pode ser adquirido já diluído pelo fornecedor. Além de facilitar a pesagem, essa diluição garante a segurança na dosagem, desde que a mistura seja homogênea, no caso de a dose terapêutica ser próxima à dose tóxica (baixo índice terapêutico). A diluição do fármaco pode ocorrer nas proporções 1:10, 1:100 ou 1:1.000, sendo que a metodologia de homogeneização deve seguir a técnica de diluição geométrica, conforme leciona Brasil (2007). Diluir o fármaco na proporção 1:10 quer dizer pesar 1 g do fármaco e 9 g de excipiente, o que corresponde a um total de 10 g. No caso da diluição 1:100, deve-se pesar 1 g de fármaco e 99 g de excipiente, totalizando 100 g. Já no caso de 1:1.000, deve ser pesado 1 g do fármaco e 999 g de excipiente, totalizando 1.000 g. Para quantidades de até 0,1 mg do fármaco no medicamento, recomenda- -se a diluição 1:1.000. De 0,11 mg a 0,99 mg, recomenda-se a diluição 1:100. Acima de 1 mg, recomenda-se a diluição 1:10. Resposta: para uma preparação farmacêutica em que se quer preparar 120 mL (132 g) de uma solução na concentração final de 4% (p/p), com solvente de densidade relativa 1,10, a quantidade de IFA é de 5,5 g. Exemplo 11: em uma preparação líquida que pesa 250 g, há 12 g de fármaco. Qual é a concentração (p/p) da solução? Resposta: uma preparação farmacêutica que contém 12 g de fármaco e pesa um total de 250 g está na concentração de 4,8%. Cálculos em farmacotécnica I8 Veja os exemplos a seguir. Exemplo 12: é necessário preparar 200 g da diluição 1:10 para manter em estoque. Qual é a quantidade, em gramas, do fármaco necessária para realizar essa diluição? Nota: 10 g de diluição contém 1 g do fármaco. Resposta: para preparar 200 g de uma diluição 1:10, será necessário pesar 20 g do fármaco e 180 g de excipiente. Exemplo 13: quantos gramas do fármaco ser necessário pesar para obter 250 g de uma diluição 1:1.000? 1.000 g de diluição contém 1 g do fármaco Resposta: para preparar 250 g de uma diluição 1:1000, será necessário pesar 0,25g de fármaco e 249,75g de excipientes. Fator de correção de ativos farmacêuticos diluídos Após diluir o fármaco, é necessário saber o quanto dessa diluição é necessária para chegar à dosagem descrita na receita médica. Portanto, calcula-se o fator de correção, que deverá ser multiplicado pela dosagem prescrita, antes da pesagem. E como chegar nesse fator de correção (Fc)? No caso das diluições realizadas na farmácia, que são 1:10, 1:100 e 1:1.000, os fatores de correção serão, respec- tivamente, 10, 100 e 1.000. Conhecendo a concentração que o fármaco deverá estar na formulação, basta multiplicar essa concentração pelo Fc correspondente à diluição realizada. Veja os exemplos a seguir. 9Cálculos em farmacotécnica I Exemplo 14: quantos gramas de uma diluição 1:10 serão necessários para obter 65 mg do fármaco? Considerando que o fator de correção de uma diluição 1:10 é 10, basta multiplicar 65 mg por 10. Resposta: para obter 65 mg do fármaco, é necessário pesar 0,65 g do fármaco diluído 1:10. Também é possível realizar o cálculo da seguinte forma: Uma vez que 10 g da mistura contém 1 g do fármaco, então Exemplo 15: quantos gramas do fármaco diluído 1:100 serão necessários para produzir 30 cápsulas, considerando que cada cápsula deverá conter 1,5 mg de fármaco? Resposta: para obter 30 cápsulas contendo 1,5 mg do fármaco em cada uma delas, será necessário pesar 4,5 g do fármaco diluído 1:100. Veja outra forma de realizar o cálculo do Exemplo 15. Uma vez que 100 mg da mistura contém 1 mg do fármaco, Cálculos em farmacotécnica I10 Ao adquirir fármacos já diluídos, deve-se calcular o fator de correção para 100% da concentração. Ou seja, a fórmula para a obtenção do fator de correção é: Onde, Veja o exemplo a seguir. Exemplo 16: a farmácia possui em estoque a vitamina E 50%. Quantos gramas desse fármaco serão necessários para produzir um medicamento na concentração de 15 mg? Resposta: para obter 15 mg de vitamina E, são necessários 30 mg de vitamina E 50%. Conforme estabelece a RDC nº. 67/2007 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (BRASIL, 2007), as substâncias, antes de sofrerem o processo de diluição, devem ter a embalagem claramente identificada com etiqueta, aler- tando: ATENÇÃO! ESTA SUBSTÂNCIA SOMENTE DEVE SER USADA QUANDO DILUÍDA. A substância diluída deverá ter o alerta: SUBSTÂNCIA DILUÍDA, além de apresentar na etiqueta o nome da substância e o fator de diluição. Essas substâncias diluídas devem ser armazenadas em local separado das substâncias concentradas e, quando pesadas, deverão ter dupla checagem, do operador e do farmacêutico. 11Cálculos em farmacotécnica I ANSEL, H. C.; STOKLOSA, M. J. Cálculos farmacêuticos. 12. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Reso- lução-RDC nº. 67, de 08 de outubro de 2007. Dispõe sobre Boas Práticas de Manipulação de Preparações Magistrais e Oficinais para uso Humano em farmácias. Disponível em: <https://www20.anvisa.gov.br/segurancadopaciente/index.php/legislacao/item/ rdc-67-de-8-de-outubro-de-2007>. Acesso em: 1 fev. 2019. Leitura recomendada ALLEN JR. L. V.; POPOVICH, N. G.; ANSEL, H. C. Formas farmacêuticas e sistemas de liberação de fármacos. 9. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. Cálculos em farmacotécnica I12
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