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SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 1 Apresentação ................................................................................................................................ 5 Aula 1: O surgimento do modelo de educação corporativa no âmbito da especialização flexível ....................................................................................................................................................... 7 Introdução ............................................................................................................................. 7 Conteúdo ................................................................................................................................ 8 As políticas de saúde e o desenvolvimento econômico e social no Brasil ............ 8 O papel do Estado ............................................................................................................. 8 O surgimento da agenda neoliberal .............................................................................. 9 A crise do Estado de Bem-Estar Social ........................................................................ 10 Crises do capitalismo ...................................................................................................... 13 As mudanças no cenário político-econômico mundial .......................................... 13 Regulação em saúde: ensaio de definição ................................................................. 15 As forças de mercado ..................................................................................................... 15 Regulação em saúde: ensaio de definição ................................................................. 16 As mudanças no cenário político-econômico mundial .......................................... 17 Atividade proposta .......................................................................................................... 19 Referências........................................................................................................................... 20 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 21 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 24 Aula 1 ..................................................................................................................................... 24 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 24 Aula 2: O Sistema de saúde do Brasil e auditoria do sistema SUS .............................................. 28 Introdução ........................................................................................................................... 28 Conteúdo .............................................................................................................................. 29 Considerações iniciais .................................................................................................... 29 Previdência social no Brasil ........................................................................................... 29 Lei Eloy Chaves ................................................................................................................ 30 O que as CAPs forneciam? ............................................................................................. 31 A previdência social no Estado Novo .......................................................................... 32 Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP) .............................................................. 33 Encerramento dos anos 50 ............................................................................................ 34 Processo de unificação dos IAPs .................................................................................. 35 Saúde pública no período de 1930 a 1960 .................................................................. 36 Criação do Ministério da Saúde .................................................................................... 37 SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 2 Instituto Nacional de Previdência Social (INPS)......................................................... 37 Ministério da Previdência e Assistência Social ........................................................... 38 Sistema de saúde previdenciário .................................................................................. 39 Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP) ...... 40 Sistema Único de Saúde – SUS ..................................................................................... 41 Constituição brasileira .................................................................................................... 42 Os conselhos de saúde ................................................................................................... 45 Recebimento de recursos .............................................................................................. 46 Pacto pela saúde .............................................................................................................. 46 Pacto da saúde e seus cinco princípios....................................................................... 47 Mudanças marcantes ...................................................................................................... 49 Pacto pela vida ................................................................................................................. 49 Pacto pela vida e seus objetivos ................................................................................... 49 Pacto em defesa do SUS ................................................................................................. 50 Atividade proposta .......................................................................................................... 52 Referências........................................................................................................................... 52 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 54 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 58 Aula 2 ..................................................................................................................................... 58 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 58 Aula 3: O Sistemas de saúde do Brasil e auditoria do sistema SUS ............................................ 61 Introdução ........................................................................................................................... 61 Conteúdo .............................................................................................................................. 62 Modelos assistenciais de saúde .................................................................................... 62 Organização Pan-Americana de Saúde ...................................................................... 62 Modelo Assistencial ......................................................................................................... 63 Proposta de Organização da Vigilância da Saúde ..................................................... 63 Modelo de Atenção é articulada com três dimensões ............................................. 64 Os Modelos de Atenção Hegemônicos ....................................................................... 65 Processo de Descentralização.......................................................................................66 Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) .................................................. 67 Mudança do Modelo de Atenção ................................................................................. 67 Medicina Familiar ............................................................................................................. 69 Programas de Extensão de Cobertura ......................................................................... 70 Promoção da Saúde ........................................................................................................ 70 Programas de Ações Básicas do SUS ........................................................................... 72 SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 3 Princípios e Diretrizes ..................................................................................................... 73 O Piso da Atenção Básica (PAB) .................................................................................... 73 Saúde da Família .............................................................................................................. 75 O Marco Regulatório da Saúde ..................................................................................... 76 Inovações nos Modelos de Assistência ....................................................................... 77 Desenvolvimento de Programas .................................................................................. 78 Objetivos da ANS ............................................................................................................. 78 Implementação de programas de promoção da saúde........................................... 79 Inovação ............................................................................................................................ 83 Inovação Conceito .......................................................................................................... 83 Inovação e o Sistema de Saúde .................................................................................... 84 Os Laboratórios de Inovação ........................................................................................ 85 Duas tipologias de Laboratórios ................................................................................... 86 Laboratórios de Inovação .............................................................................................. 86 Laboratórios de Inovação para Saúde ......................................................................... 87 Processo de Adoção da Inovação ................................................................................ 87 Atividade proposta .......................................................................................................... 89 Referências........................................................................................................................... 90 Exercícios de fixação ......................................................................................................... 94 Chaves de resposta ..................................................................................................................... 99 Aula 3 ..................................................................................................................................... 99 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 99 Aula 4: Sistema nacional de auditoria e sistemas de informações do SUS ............................... 102 Introdução ......................................................................................................................... 102 Conteúdo ............................................................................................................................ 103 Sistema Nacional de Auditoria .................................................................................... 103 Departamento Nacional de Auditoria do SUS .......................................................... 105 Relatório de gestão dos SUS ........................................................................................ 109 Sistema de Apoio ao Relatório de Gestão - SARGSUS ............................................ 112 Estrutura e funcionamento do SARGSUS .................................................................. 114 Sistemas de informações do SUS e custos da saúde no Brasil ............................. 115 SIM - Sistema de Informações de Mortalidade ........................................................ 117 Sistema de Informações de Nascidos Vivos - SINASC ........................................... 118 Sistema de Informações Hospitalares – SIH ............................................................ 119 Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS - SIA ............................................. 122 Outros sistemas de informações ................................................................................ 124 SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 4 Custos da saúde no Brasil ............................................................................................ 125 Implantação do Programa Nacional de Gestão de Custos ................................... 127 Rede de colaboradores ................................................................................................. 129 Sistema de Apuração e Gestão de Custos do SUS – ApuraSUS ............................ 130 Atividade proposta ........................................................................................................ 131 Referências......................................................................................................................... 132 Exercícios de fixação ....................................................................................................... 135 Chaves de resposta ................................................................................................................... 139 Aula 4 ................................................................................................................................... 139 Exercícios de fixação ..................................................................................................... 139 Conteudista ............................................................................................................................... 143 SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 5 Nesta disciplina você terá oportunidade de conhecer e compreender o Sistema Único de Saúde, as Políticas de Saúde, Desenvolvimento Econômico e Social no Brasil, os paradoxos do Estado de Bem Estar Social e a constituição dos direitos e da proteção social. O conteúdo está dirigido para as dimensões históricas e sociais que influenciaram a configuração dos Sistemas de Saúde no Brasil e os modelos assistenciais de saúde aplicados no sistema público de saúde e privado. Será apresentada a regulamentação do sistema nacional de auditoria (SNA), relatório de gestão em saúde, os sistemas de informações do SUS e custos da saúde no Brasil. Objetivo: 1. Compreender as Políticas de Saúde, o Desenvolvimento Econômico e Social no Brasil, os paradoxos do Estado de Bem Estar Social e a constituição dos direitos e da proteção social; 2. Apresentar os acontecimentos relativos às Crises do Estado de Bem-Estar Social que culminaram com a crise do Welfare State, a regulação em saúde e o ensaio de definição das relações entre economia e saúde no planejamento em saúde; 3. Desenvolver as capacidades necessárias para conhecer o processo histórico de construção do sistema de saúde no Brasil; SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 6 4. Compreender as dimensõeshistóricas e sociais que influenciaram a configuração dos Sistemas de Saúde no Brasil; 5. Compreender os modelos assistenciais de saúde, Programas de Ações Básicas do SUS e as alternativas em discussão no ambiente atual. Saúde Pública x Saúde Privada; 6. As principais inovações nos modelos de assistência à saúde em seus sistemas de atenção e gestão dos serviços, com ênfase na realidade brasileira; 7. Desenvolver as capacidades necessárias para conhecer a regulamentação do sistema nacional de auditoria (SNA) e o relatório de gestão em saúde; 8. Compreender os sistemas de informações do SUS e custos da saúde no Brasil. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 7 Introdução Nesta aula, o enfoque está centrado na trajetória histórica e política que consolida a sociedade democrático-burguesa, especificamente europeia, a partir dos ideais do liberalismo e do capitalismo europeu. Nesse percurso, foi relevante para o processo de formação do sistema de saúde e do sistema jurídico-legal brasileiro a articulação com características singulares do Estado de Bem-Estar Social, o Welfare State, e o conceito ampliado de saúde e premissas básicas do SUS. Objetivo: 1. Compreender as políticas de saúde, o desenvolvimento econômico e social no Brasil, os paradoxos do Estado de Bem-Estar Social e a constituição dos direitos e da proteção social; 2. Apresentar os acontecimentos relativos às crises do Estado de Bem-Estar Social, a regulação em saúde e o ensaio de definição das relações entre economia e saúde no planejamento em saúde. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 8 Conteúdo As políticas de saúde e o desenvolvimento econômico e social no Brasil Embora desde o século 15 se reflita sobre formas de proteção do cidadão e da população, de uma forma geral, pode-se afirmar que a consolidação das políticas sociais ocorre somente no século 19, no período de constituição do Estado moderno, capitalista, e da inauguração da sociedade burguesa. É justamente a partir da segunda metade do século 20, com o fim da Segunda Guerra, que o Estado de Bem-Estar Social surge como consequência dos “estragos” acarretados pelas ações do livre mercado, do liberalismo econômico em toda a sua plenitude. (MARANGONI, 2008). O Welfare State, ou Estado de Bem-Estar Social, se tornou historicamente conhecido como Estado-providência, isto é, uma organização política e econômica que assegura ao Estado a função de agente central da promoção e da defesa social, além de estruturador da economia. O papel do Estado Assim, o Estado é quem regulamenta a vida social e a saúde, a política e a economia de um país, em parceria com instituições públicas e privadas conforme a sua cultura política. Em outras palavras, cabe ao Estado de Bem-Estar Social assegurar os serviços públicos e a ampla proteção à sociedade. Na visão de Demo (2006), o Estado de Bem-Estar Social representou uma face mais “humana” do capitalismo. O Estado de Bem-Estar Social representou um novo paradigma de mudanças que ocorreram, ao mesmo tempo, na regulamentação da economia de mercado SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 9 e na agenda de políticas econômicas de inspiração keynesiana (intervenção do Estado na economia). Nessa perspectiva, não é possível desvincular serviços sociais universais e a redistribuição de renda, principalmente através do pleno emprego, como elementos das políticas econômicas que duraram até os anos 1980, década essa que marcou o fim da chamada "era de ouro do capitalismo" (HOBSBAWM apud DEMO, 2006). Com a crise do capitalismo mundial, no fim dos anos 1970, ocasionada, principalmente, pela queda da produtividade e do consumo fordistas, a situação socioeconômica foi ainda mais agravada pela subida dos preços do petróleo, entre 1973 e 1979. Dessa maneira, o modelo de desenvolvimento econômico entrou em colapso finalizando a etapa de crescimento econômico verificado intensamente após a 2ª Guerra Mundial. Nesse contexto, sucedem-se cortes em programas sociais, ampliando a crise do Estado de Bem-Estar Social que atingiu, especialmente, o universo de trabalhadores frente às mudanças tecnológicas e de consumo. O surgimento da agenda neoliberal “A intervenção do Estado na economia não pôde evitar as crises do modo de produção capitalista, o que possibilitou a inauguração de uma agenda neoliberal, minimizando o papel do Estado e ampliando a função do mercado.” (FIORI, 1997). “De acordo com o discurso neoliberal, o Estado precisa ser reduzido a dimensões mínimas, a partir de cortes e com reorientação de gastos públicos. Nesta perspectiva, cabe ao Estado, apenas, administração da Justiça, da segurança externa e a manutenção da ordem interna e principalmente, a SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 10 privatização de outras funções públicas, entre estas, as políticas de proteção social, incluindo a saúde.” (PEREIRA, 1997). Atenção No caso específico da saúde, no Brasil, desde o período do Regime Militar, a empresa médica se torna uma instituição social de forte poder político, que passa a coordenar o desenvolvimento de um sistema de saúde complementar ao sistema de saúde pública. Trata-se do período de criação de grandes hospitais, e seguros privados de saúde, alicerçados pelas diversas especialidades clínicas e propagação das ideias capitalistas de saúde – noção de mercadoria. Entretanto, será no contexto de reconfiguração das relações entre Estado, Sociedade e Economia, a partir dos anos 1990, que se altera igualmente o direito à saúde (COHN, 2003), pois, além de direito social, esse se converge em direito de consumidor. Um exemplo disso é a cifra de segurados privados no país, que ultrapassa os 40 milhões de habitantes (FERREIRA, 2004), em uma realidade social em que existe o direito universal e gratuito da saúde, mas alguns serviços médicos apenas estão disponíveis a alguns segurados privados. A crise do Estado de Bem-Estar Social Durante o fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, o Estado brasileiro tentou viabilizar uma espécie de Estado de Bem-Estar Social, com o objetivo de satisfazer demandas da maioria da população, considerada desprotegida. No entanto, autores como Hoffmann (2001) afirmam que, desde as primeiras décadas do século 20, países como o Brasil não consideraram os gastos com SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 11 políticas sociais como "investimento" produtivo, de acordo com a perspectiva de G. Myrdal. Na prática, a maior parte das políticas desenvolvidas no Brasil foram políticas assistencialistas voltadas para se combater a pobreza e, em menor parte, destinada a criar políticas de distribuição e geração de emprego e renda. Exemplos dessa afirmação se referem à criação do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN), do Funrural, do Sistema Único de Saúde (SUS), posteriormente, e do seguro-desemprego. Recentemente, o Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome representa tentativa de viabilizar a propalada universalização dos direitos sociais. Entretanto, o modelo de desenvolvimento econômico e a base de sustentação financeira das políticas sociais no Brasil têm sido organizados antagonicamente aos ideais de universalização. Dessa maneira, temos uma universalização de direitos que na prática é excludente. As implicações para a cidadania, entendida neste texto de forma ampliada, podem ser consideradas as principais questões que a crise do Estado de Bem- Estar evidenciou, em meio ao permanente quadro de exclusão social e de desigualdades sociais na nossa contemporaneidade. Essa situação é especialmente problemática para países do capitalismo periférico, como o Brasil,pelo retardo no processo de industrialização e pela recente redemocratização; o contexto de globalização excludente acarreta restrições para a cidadania plena, e não os “arremedos” de cidadania concedida ou regulada (SANTOS apud DEMO, 2006). Com o término da agenda de compromissos do Estado de Bem-Estar Social, associado à internacionalização do capital, se acelerou o processo de incorporação de medidas de reestruturação do desenvolvimento como estratégia de superação da crise social e econômica da “década perdida” (1980). SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 12 Nesse período, o Consenso de Washington (1994) marca o início da agenda neoliberal com vistas à reestruturação produtiva e à diminuição do desemprego, através da promoção de medidas de reforma estrutural para os países capitalistas: a desregulamentação dos mercados, a abertura comercial e financeira, a privatização do bem público e a gradual redução do papel e do tamanho do Estado (GIDDENS, 2001). A criação de políticas de saúde do Brasil, tal como o SUS, está inserida no debate sobre a elaboração de políticas sociais dentro do modo de produção capitalista. Nesse sentido, as contradições inerentes ao conflito entre capital e trabalho, os diferentes sujeitos e espaços de criação de identidade e sociabilidade, além das questões políticas e econômicas estruturais, são fundamentais para a composição do quadro de análise das políticas sociais. As realidades sociais e econômicas, por vezes, se misturam e se confundem na conjuntura aludida. Nas palavras de Demo (2006): “as políticas sociais sintetizam a contradição entre modo e relações de produção nas sociedades capitalistas, conformando-se historicamente a partir das correlações de forças estabelecidas na arena política”. Em outras palavras, para ser efetivamente uma política social, essa deve promover a emancipação e reduzir as desigualdades sociais. A classificação de tipos de políticas sociais, a seguir, é sugerida por Demo (1994) e foi atualizada por nós: Assistencial: prioridade absoluta (população não se sustenta) – por exemplo, Programa Fome Zero. Socioeconômica: população necessita de apoio na empregabilidade/renda – por exemplo, Programa Bolsa Família. Participativa: incremento nas esferas de educação, cidadania e cultura, entre outras – por exemplo, PROUNI. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 13 Crises do capitalismo Desde o fim do século 20, destacam-se crises do capitalismo com importantes implicações para elaboração e execução de políticas sociais consideradas mediadoras das relações entre capital e trabalho. Na perspectiva de Harvey (HARVEY apud DEMO, 2006), a principal característica da época é a rigidez dos investimentos de capital fixo de larga escala e de longo prazo, dos sistemas de produção em massa e dos mercados na realocação de recursos e nos contratos de trabalho precarizado. Para se tentar superar os problemas fiscais do Estado, as políticas sociais universais têm paulatinamente perdido o caráter de universalização. Como instrumento de resposta flexível à crise, foi encontrada a “fórmula” de monetarização da economia, aumentando a onda inflacionária que reduziria a expansão dos direitos sociais desde o final da Segunda Guerra. Para Harvey, a crise da rigidez fordista e das estratégias keynesianas implementadas pelo Estado para assegurar o capital monopolista ganham a denominação de acumulação flexível. "(...) caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e comercial." (DEMO, 2006) As mudanças no cenário político-econômico mundial Todavia, a flexibilização do capital implicou em grandes mudanças na economia mundial reorientando novas divisões nacionais e internacionais do trabalho, além de colaborar para a transnacionalização dos mercados e empresas. A industrialização acelerada em países como o Brasil pode ser explicada pelo deslocamento de centros de produção das empresas multinacionais para países SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 14 com salários e preços de matérias-primas mais baixos, o que diminui custos da produção e cria zonas de vulnerabilidade social, econômica e ecológica. Essa flexibilização do capital colocou no cenário da economia mundial países que antes não faziam parte dela, porém, nem sempre de forma simétrica. Atenção Nesse contexto moderno de flexibilidade das relações de produção, evidenciaram-se transformações profundas no mundo do trabalho tais como a precarização dos vínculos empregatícios, através de subcontratos, contratos temporários, a automação de atividades, entre outros, que afetaram substancialmente a população em termos de emprego, renda e qualidade de vida. Dessa forma, desde o planejamento até a execução das políticas sociais, em sociedades capitalistas, ocorrem disputas no campo social, político e econômico, com a mediação, nem sempre eficiente, do Estado. O que caracteriza objetivamente as políticas sociais é a sua proposição em enfrentar as desigualdades sociais e a exclusão social (LAURELL, 2002). O que está implícito é que, embora o Estado capitalista seja mediador do conflito entre o capital e o trabalho, os envolvidos e interessados em mudanças precisam buscar seus direitos e autonomia. Nesse caso, tratam-se do fortalecimento da cidadania ativa e da participação política em se pressionar o Estado na busca por direitos, sejam eles individuais ou coletivos (DEMO, 2006). No debate teórico acerca da crise do welfare state, muitas explicações emergem e destacam a redefinição do papel do Estado, tanto em nível local quanto global, nas sociedades capitalistas. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 15 Esse tipo de Estado ainda se caracteriza por oscilar em funções de investidor econômico e de regulador do mercado e dos conflitos sociais. Mais ainda, esse Estado foi um tipo de organização política que tentou conciliar desenvolvimento econômico com promoção social mediante o desenvolvimento da cidadania. Entretanto, como principais explicações para sua derrocada, temos a crise fiscal ocasionada por gastos públicos, os custos com a proteção social e o desemprego acarretado pela falência do modelo fordista, além da crise de identidade do próprio Estado. Esses fatores convergiram na direção do neoliberalismo. Regulação em saúde: ensaio de definição Constantemente, quando se aborda o tema regulação em saúde, levanta-se uma questão maior cujas correntes teóricas e controvérsias representam singularmente as contradições do mercado capitalista: o mercado da saúde. O que significa, no plano teórico, evidenciar os vínculos entre os campos da saúde e da economia, incluindo o impasse que se tem, quando se confrontam as suas duas éticas: na saúde, para salvar vidas os gastos podem ser ilimitados, mas, na economia, os recursos são sempre limitados. Esse é um fator para a constituição do campo de conhecimento voltado ao estudo das políticas, do planejamento, da gestão e da economia da saúde (PAIM, 2006). Atenção No plano prático, saúde e economia se materializam nos planos e seguros de saúde. De acordo com as leis de oferta e demanda, é através da livre competição que se define a quantidade ótima a ser produzida em uma determinada sociedade. As forças de mercado Para que as forças do mercado atuem é importante que se tenham as condições perfeitas de competição. Pois, quando uma dessas condições não SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 16 funciona, não ocorre a competição e se tem a falha de mercado. Quando ocorre uma falha de mercado, faz-senecessária a intervenção do Estado na economia, que deverá atuar proporcionalmente à natureza e intensidade dessa falha (CASTRO, 2002). Atenção Dentro dessa perspectiva introdutória ao campo de regulação em saúde, pode-se destacar os três conceitos fundamentais para a compreensão do referencial teórico da área: oferta, demanda e mercado. A oferta se relaciona aos serviços ofertadores pelos produtores, no caso da saúde privada, operadoras e seguradoras. A demanda é representada pelos consumidores, no caso, os segurados, e o mercado passa a ser um mecanismo fundamental para o ajuste entre a oferta e a demanda, através dos preços, sem que haja a necessidade de intervenção do Estado. Regulação em saúde: ensaio de definição De acordo com Castro (2002), para que sejam viabilizadas as condições perfeitas de competição é relevante a observação a cinco fatores: Racionalidade, isto é, o consumo que pode ser planejado. A inexistência de externalidades, que são os efeitos produzidos pelo consumo ou pela produção que afeta outros indivíduos positiva (ex.: vacinação) e negativamente (ex.: poluição). O perfeito conhecimento do mercado por parte do consumidor, tanto no que diz respeito à utilidade do consumo quanto às legislações. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 17 Consumidores agindo livremente em seu benefício (a ideia do livre arbítrio). Numerosos e pequenos produtores sem poder de mercado. Na teoria, num mercado competitivo, existem pequenos e variados produtores sem poder de influência no mercado e sobre outros produtores. As mudanças no cenário político-econômico mundial De forma geral, o governo atua de forma a subsidiar renda a certos grupos, como aposentados, desempregados etc., pelo lado da demanda, e, pelo lado da oferta, subsidiando ou desonerando os produtores. No caso da saúde, de acordo com Gerard (1993), tem-se uma situação bastante peculiar, uma vez que inexistem no mercado da saúde condições de perfeita competição, o que justifica uma atuação mais direta por parte do Estado nesse setor. As principais falhas de mercado que podem ocorrer na área da saúde são: A ocorrência de riscos e incertezas, uma vez que o fenômeno do adoecimento é imprevisível na sua totalidade; O risco moral, que ocorre quando a competição não acontece; As externalidades, que são eventos e efeitos nem sempre bem planejados; A distribuição desigual das informações, que se relaciona com a ética, pois não se pode divulgar que se compra a saúde; A existência de obstáculos, que são barreiras de níveis legal, mercadológico ou técnico. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 18 Na economia, a regulação de um setor ou de uma atividade econômica é justificada com base na existência de fracassos de mercado que exigem a intervenção corretiva do Estado de modo a ajustar a eficiência técnica e social no seu funcionamento e, dessa maneira, aumentar o bem-estar social por meio de sua ação reguladora. A regulação de atividades públicas e de fim não lucrativo é crucial, embora as teorias da regulação econômica ainda patinem ao redor de tal problemática. É preciso ainda considerar que a regulação tem componentes políticos e econômicos, podendo o Estado decidir intervir em áreas particulares por razões ético-normativas, principalmente, orientado pela promoção da equidade e não enquanto um agente para detectar fracassos de mercado (FERREIRA, 2004). No entanto, a visão clássica da economia da regulação é insuficiente para explicar a importância da regulação em saúde. Quando se fala em saúde, nessa perspectiva, fala-se, além da prestação de cuidados de saúde, de uma série de especificidades e complexidades bastante estudadas pela literatura da economia da saúde e da saúde coletiva, a qual se torna cada vez mais relevante para a institucionalização do campo de regulação do setor da saúde (NERO, 2002). Os problemas relacionados com a informação destacam-se enquanto limitadores da eficácia da regulação. A literatura sobre regulação econômica, na maior parte dos casos, apresenta o risco que o regulador passa frente aos interesses organizados e à força política das entidades reguladas, podendo a regulação vir a se tornar endógena à indústria regulada, o que favoreceria os grupos politicamente mais poderosos e contribuiria para a ineficiência e a iniquidade (FERREIRA, 2004). Em se tratando especificamente da oferta, o sistema de saúde brasileiro é composto basicamente por serviços privados, constituindo-se em um dos maiores mercados de serviços de saúde no mundo, uma vez que atrai intenso SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 19 movimento de capital. Essa situação condicionou a separação, no caso do Brasil, do financiamento e da provisão desses serviços. No campo da saúde, os setores públicos e privados expandiram-se consideravelmente (BAHIA; VIANA, 2002), obviamente. O incremento desses dois sistemas de saúde gerou uma contradição pautada em uma dicotomia: a expansão dos planos de saúde, justificada pela ineficiência do modelo público, e o avanço das políticas oriundas da agenda neoliberal. Dessa forma, confirma-se a hipótese de Lassey sobre as insuficiências do sistema público como processo de concentração de renda e poder para o sistema privado. Atividade proposta Nesta aula estudamos políticas de saúde do Brasil. A criação de políticas de saúde como o Sistema Único de Saúde - SUS, está inserida na elaboração de políticas sociais dentro do modo de produção capitalista. Para sua atividade pedimos que exponha sobre políticas sociais, descreva a classificação dos tipos de políticas sociais e atualize-as aos programas sociais vigentes no brasil. Chave de resposta: As políticas sociais sintetizam a contradição entre modo e relações de produção nas sociedades capitalistas, conformando-se historicamente a partir das correlações de forças estabelecidas na arena política, segundo (Demo, 2006). Em outras palavras, para ser efetivamente uma política social, esta deve promover a emancipação e reduzir as desigualdades sociais. A classificação de tipos de políticas sociais, sugerida por Demo (1994) e atualizada: • Assistencial: Prioridade absoluta (população não se auto-sustenta). Exemplo: Programa Fome Zero. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 20 • Socioeconômica: População que necessita de apoio na empregabilidade/renda. Exemplo: Programa Bolsa Família. • Participativa: Incremento nas esferas da educação, cidadania e cultura, entre outros. Exemplo: PROUNI. Referências ASSOCIAÇÃO MÉDICA DE MINAS GERAIS. Editorial: Planos de Saúde no Brasil. Jornal da Associação Médica de Minas Gerais, s/n, 1996. BAHIA, L.; VIANA, A. Regulação e Saúde: estrutura, evolução e perspectivas de assistência médica suplementar. 2002. BRASIL. Avaliação Econômica em Saúde: Desafios para Gestão no Sistema Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2008. CARVALHO, J. A regulamentação dos planos e seguros privados de assistência à saúde no Brasil: a reconstrução de uma historia de disputas. Dissertação de Mestrado em Saúde Coletiva. Unicamp, 2009. CASTRO, J. D. Regulação em saúde: análise de conceitos fundamentais. Sociologias, Porto Alegre, a. 4, n. 7, jan./jun. 2002, p.122-135. COHN, A. 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Assim, o desenvolvimento socioeconômico deve ser estruturado em função do: a) Mercado e da integração econômica mundial b) Interesse social e da economia local c) Poder econômico local e do consumo nacional d) Interesse estatal e das preocupações sociais e) Interesse do capital e do governo nacional Questão 2 Pode-se afirmar que a consolidação das políticas sociais ocorre somente no século 19, por que razão? a) Fim da Segunda Guerra b) Período de constituição do Estado moderno, capitalista, e da inauguração da sociedade burguesa c) Proteção do cidadão e da população SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 22 d) Bem-estar social da população e) Através das ações do livre mercado do liberalismo econômico Questão 3 Pode se afirmar que o Estado de Bem-Estar Social se tornou notório como: a) Estado-Social b) Reforma do Estado c) Era de ouro do capitalismo d) Estado neoliberal e) Estado-providência Questão 4 No que tange ao Estado de Bem-Estar Social é incorreto afirmar que: a) Regulamenta vida social, saúde, política e economia de um país b) Ampla proteção à sociedade c) Representou uma face humana do capitalismo d) Assegura os serviços privados e) Regulamentação da economia de mercado Questão 5 Afirma-se que, desde as primeiras décadas do século 20, países como o Brasil não consideraram os gastos com políticas sociais como: a) Despesas intangíveis b) Investimento produtivo c) Aquisição de serviços d) Dispêndio fixo e) Consumo determinado Questão 6 A maior parte das políticas desenvolvidas no Brasil foram políticas assistencialistas voltadas para se combater a pobreza e destinadas a criar políticas de distribuição e geração de emprego e renda. Indique o órgão público SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 23 que não faz parte do contexto de políticas assistencialista conforme o enunciado. a) Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição b) Sistema Único de Saúde (SUS) c) Seguro-desemprego d) Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome e) Agência Nacional de Saúde Suplementar Questão 7 No que tange à concepção de políticas de saúde do Brasil como o Sistema Único de Saúde (SUS) é incorreto afirmar que se referem a: a) Políticas sociais b) Produção capitalista c) Reduzir as desigualdades sociais d) Ausência de relações de produção nas sociedades capitalistas e) Espaços de criação de identidade e sociabilidade Questão 8 Pode-se afirmar que, quando se aborda o tema regulação em saúde, evidenciam-se os vínculos entre os campos da saúde e da economia. Qual impasse se tem, quando se confrontam as éticas de cada um desses campos? a) Fator para a constituição do campo de conhecimento da gestão b) Na saúde, trata-se salvar vidas, os gastos podem ser ilimitados; na economia, os recursos são sempre limitados c) Política assistencialista e acessibilidade aos serviços públicos d) Promove a emancipação e reduz as desigualdades sociais e) Políticas econômicas estruturais Questão 9 Na regulação em saúde, destacam-se alguns conceitos fundamentais para a compreensão do referencial teórico da área. Indique três conceitos essenciais na regulação da saúde. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 24 a) Recursos humanos, financeiros e operacionais b) Assistência, acessibilidade e recursos c) Oferta, demanda e mercado d) Mecanismo de regulação, assistência e recursos financeiros e) Produto, regulação e serviços Questão 10 Sobre a oferta no sistema de saúde brasileiro pode-se afirmar especificamente que se tratam basicamente de: a) Serviços privados b) Serviços não governamentais c) Serviços públicos d) Serviços filantrópicos e) Serviços públicos e privados Aula 1 Exercícios de fixação Questão 1 - A Justificativa: Para que as forças do mercado atuem é importante que se tenham as condições perfeitas de competição; pois, quando uma dessas condições não funciona, não ocorre a competição e se tem a falha de mercado. Quando ocorre uma falha de mercado, faz-se necessária a intervenção do Estado na economia, que deverá atuar proporcionalmente à natureza e intensidade da falha. Questão 2 - B Justificativa: A consolidação das políticas sociais ocorre somente no século 19, no período de constituição do Estado moderno, capitalista, e da inauguração da sociedade burguesa. Questão 3 - E SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 25 Justificativa: O Estado de Bem-Estar Social se tornou conhecido como Estado- providência, isto é, uma organização política e econômica que assegura ao Estado a função de agente central da promoção e da defesa social, além de estruturador da economia. Questão 4 - D Justificativa: O Estado é quem regulamenta vida social, saúde, política e economia de um país, em parceria com instituições públicas e privadas conforme a sua cultura política. Em outras palavras, cabe ao Estado de Bem- Estar Social assegurar os serviços públicos e a ampla proteção à sociedade. Na visão de Demo (2006), o Estado de Bem-Estar Social representou uma face mais “humana” do capitalismo. O Estado de Bem-Estar Social representou um novo paradigma de mudanças que ocorreram ao mesmo tempo na regulamentação da economia de mercado e na agenda de políticas econômicas de inspiração keynesiana (intervenção do Estado na economia). Questão 5 - B Justificativa: Durante o fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, o Estado brasileiro tentou viabilizar uma espécie de Estado de Bem-Estar Social, com o objetivo de satisfazer demandas da maioria da população, considerada desprotegida. Os autores como Hoffmann (2001) afirmam que, desde as primeiras décadas do século 20, países como o Brasil não consideraram os gastos com políticas sociais como "investimento" produtivo, de acordo com a perspectiva de G. Myrdal. Questão 6 - E Justificativa: Na prática, a maior parte das políticas desenvolvidas no Brasil foram políticas assistencialistas voltadas para se combater a pobreza e, em menor parte, destinadas a criar políticas de distribuição e geração de emprego e renda. Exemplos dessa afirmação se referem à criação do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN), do Funrural, do Sistema Único de Saúde (SUS), posteriormente, e do seguro-desemprego. Recentemente, o Ministério SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASILE AUDITORIA DO SISTEMA SUS 26 do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome representa tentativa de viabilizar a propalada universalização dos direitos sociais. Questão 7 - D Justificativa: A criação de políticas de saúde do Brasil, como o SUS, está inserida no debate sobre a elaboração de políticas sociais dentro do modo de produção capitalista. Nesse sentido, as contradições inerentes ao conflito entre capital e trabalho, os diferentes sujeitos e espaços de criação de identidade e sociabilidade, além das questões políticas e econômicas estruturais, são fundamentais para a composição do quadro de análise das políticas sociais – realidades sociais e econômicas, por vezes, se misturando e confundindo. Demo (2006) afirma que “as políticas sociais sintetizam a contradição entre modo e relações de produção nas sociedades capitalistas, conformando-se historicamente a partir das correlações de forças estabelecidas na arena política”. Em outras palavras, para ser efetivamente uma política social, essa deve promover a emancipação e reduzir as desigualdades sociais. Questão 8 - B Justificativa: Quando se aborda o tema regulação em saúde, levanta-se uma questão maior cujas correntes teóricas e controvérsias representam singularmente as contradições do mercado capitalista: o mercado da saúde. O que significa, no plano teórico, evidenciar os vínculos entre os campos da saúde e da economia, incluindo o impasse que se tem, quando se confrontam as suas duas éticas: na saúde, para salvar vidas os gastos podem ser ilimitados; mas, na economia, os recursos são sempre limitados. Esse é um fator para a constituição do campo de conhecimento voltado ao estudo das políticas, do planejamento, da gestão e da economia da saúde (PAIM, 2006). Questão 9 - C Justificativa: Na perspectiva introdutória ao campo de regulação em saúde, pode-se destacar os três conceitos fundamentais para a compreensão do referencial teórico da área: oferta, demanda e mercado. A oferta se relaciona SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 27 aos serviços ofertados pelos produtores, no caso da saúde privada, operadoras e seguradoras. A demanda é representada pelos consumidores, nesse caso, segurados e mercado passam a ser um mecanismo fundamental para o ajuste entre a oferta e a demanda, através dos preços, sem que haja a necessidade de intervenção do Estado. Questão 10 - A Justificativa: Em se tratando especificamente da oferta, o sistema de saúde brasileiro é composto basicamente por serviços privados, constituindo-se em um dos maiores mercados de serviços de saúde no mundo, o qual atrai intenso movimento de capital. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 28 Introdução Nesta aula, abordaremos o processo histórico da constituição do sistema de saúde no Brasil, fornecendo subsídios ao aluno para o entendimento das dimensões históricas e sociais que influenciaram esse acontecimento. Objetivo: 1. Desenvolver as capacidades necessárias para conhecer o processo histórico de construção do sistema de saúde no Brasil; 2. Compreender as dimensões históricas e sociais que influenciaram a configuração dos processos relacionados à saúde no Brasil. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 29 Conteúdo Considerações iniciais Vamos iniciar esta aula conhecendo um pouco do processo histórico de construção do sistema de saúde no Brasil. Preparado? Avance à próxima tela e bons estudos. Previdência social no Brasil O surgimento da previdência social no Brasil aconteceu no início do século XX. Neste período, a economia era essencialmente agroexportadora, assentada na monocultura do café. A acumulação capitalista advinda do comércio exterior tornou possível o início do processo de industrialização no país, que se deu principalmente no eixo Rio- São Paulo. Esse processo foi acompanhado por uma urbanização crescente e pela utilização de imigrantes, especialmente europeus (italianos, portugueses), como mão de obra nas indústrias, visto que possuíam experiência nesse setor, que, na ocasião, era desenvolvido na Europa. Nesse período, os operários não tinham quaisquer garantias trabalhistas, como férias, jornada de trabalho definida, pensão ou aposentadoria. Os italianos traziam a história do movimento operário na Europa e os direitos trabalhistas que tinham sido conquistados pelos trabalhadores europeus. Dessa forma, procuraram mobilizar e organizar a classe operária brasileira na luta pelas conquistas dos seus direitos. Em função das péssimas condições de trabalho existentes e da falta de garantias de direitos trabalhistas, o movimento operário realizou duas greves gerais no país: uma no ano de 1917, e outra em 1919. Através desses movimentos, os operários começaram a conquistar alguns direitos sociais. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 30 Lei Eloy Chaves Na data de 24 de janeiro de 1923, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei Eloy Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil. Através dessa lei, foram instituídas as caixas de aposentadoria e pensão (CAPs). A finalidade da Lei Eloy Chaves teve as seguintes considerações: A lei deveria ser aplicada somente ao operariado urbano. Para que fosse aprovado no Congresso Nacional, dominado, na sua maioria, pela oligarquia rural, foi imposta a condição de que esse benefício não seria estendido aos trabalhadores rurais. Fato que, na história da previdência do Brasil, perdurou até a década de 1960, quando foi instituído o FUNRURAL. As CAPs deveriam ser organizadas por empresas e não por categorias profissionais. Você sabia? A primeira CAP instituída foi a dos ferroviários, pela importância que este setor desempenhava na economia do país naquele período e pela capacidade de mobilização que a categoria dos ferroviários possuía. Segundo Possas (1981), “tratando-se de um sistema por empresa, restrito ao âmbito das grandes empresas privadas e públicas, as CAPs possuíam administração própria para os seus fundos, formados por um conselho composto de representantes dos empregados e empregadores”. A criação de uma CAP não era automática, visto que dependia do poder de mobilização e organização dos trabalhadores de determinada empresa para reivindicar a sua criação. A comissão que administrava a CAP era composta por três representantes da empresa: um era responsável pela presidência da comissão, enquanto os outros dois representavam os empregados e eram eleitos diretamente a cada três anos. O regime de representação direta das partes interessadas, com a participação de representantes de empregados e SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 31 empregadores, permaneceu até a criação do INPS (1967), quando aqueles foram afastados do processo administrativo. (POSSAS, 1981). O Estado não participava do custeio das CAPs, conforme artigo 3º da Lei Eloy Chaves, que designava o seguinte: empregados das empresas (3 % dos respectivos vencimentos), empresas (1 % da renda bruta) e consumidores dos serviços destas. (OLIVEIRA & TEIXEIRA, 1989). Para Silva e Mahar apud Oliveira & Teixeira (1989), a Lei Eloy Chaves não previa o que se pode chamar, com propriedade, de contribuição da união. Havia, sim, uma participação no custeio, dos usuários das estradas de ferro, provenientes de um aumento das tarifas, decretado para cobrir as despesas das caixas. A extensão progressiva desse sistema, que abrangia progressivamente maior número de usuários de serviços devido à criação de novas caixas e institutos, fez o ônus recair sobre o público em geral e, assim, constituir-se efetivamente em contribuição da União. O mecanismo de contribuição tríplice (em partesiguais), que se refere à contribuição pelos empregados, empregadores e União, foi obrigatoriamente instituído pela Constituição Federal de 1934 (alínea h, §1º, Artigo 21). O que as CAPs forneciam? Segundo Oliveira & Teixeira (1989), no sistema das caixas, estabelecido pela Lei Eloy Chaves, as próprias empresas deveriam recolher mensalmente o conjunto das contribuições das três fontes de receita e depositar diretamente na conta bancária da sua CAP. As CAPs forneciam as aposentadorias, pensões, serviços funerários e médicos, conforme as seguintes disposições do artigo 9º da Lei Eloy Chaves: Socorros médicos em casos de doença própria ou de familiar que habite sob o mesmo teto e usufrua da mesma economia. Medicamentos obtidos por preço especial determinado pelo conselho de administração. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 32 Aposentadoria e pensão para seus herdeiros em caso de morte. Ressalta-se também o Artigo 27 da Lei Eloy Chaves, que obrigava as CAPs a custear a assistência aos acidentados no trabalho. Destaca-se que, no período de 1930, o sistema CAPs abrangia 47 caixas de aposentadoria e possuía 142.464 segurados ativos, sendo 8.006 aposentados e 7.013 pensionistas. Marco legal e político Nascimento da legislação trabalhista. Lei Eloy Chaves (1923). Previdência Empresas de natureza civil e privada, financiadas e gerenciadas por empregados e empregadores. Assistência à saúde Assistência médica como atribuição das CAPs através de serviços próprios. A previdência social no Estado Novo Em 1939, regulamenta-se a justiça do trabalho e, em 1943, é homologada a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Veja como se deu o processo histórico de construção do sistema de saúde no Brasil no Estado Novo: A maior parte das inversões no setor industrial foi realizada na região centro-sul (São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte), reforçando o valor econômico e financeiro dessa área na dinâmica das transformações da infraestrutura SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 33 nacional, ocasionando desequilíbrios regionais, especialmente no Nordeste, onde houve grandes êxodos rurais e a proliferação das favelas. (NICZ, 1982). A crescente massa assalariada urbana passou a se constituir no ponto de sustentação política do novo governo de Getúlio Vargas através de um regime corporativista. São promulgadas as leis trabalhistas, que estabeleceram o contrato de capital- trabalho, garantindo direitos sociais ao trabalhador. Ao mesmo tempo, criou-se a estrutura sindical do Estado. Essas ações transparecem como dádivas do governo e do Estado, e não como conquista dos trabalhadores. O fundamento dessas ações era manter o movimento trabalhista contido dentro das forças do Estado. Por esse motivo, a política do Estado estendeu a previdência social a todas as categorias do operariado. Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP) As antigas CAPs foram substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP), onde os trabalhadores eram organizados por categoria profissional (marítimos, comerciários, bancários), e não por empresa. No ano de 1933, foi instituído o primeiro Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM). 01 No decreto de sua constituição, definiam-se os seguintes benefícios assegurados aos associados: Aposentadoria; Pensão em caso de morte para os membros de suas famílias ou para os beneficiários, conforme Artigo 55; Assistência médica e hospitalar, com até trinta dias de internação; SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 34 Socorros farmacêuticos mediante indenização pelo preço do custo acrescido das despesas de administração. O custeio dos socorros mencionados não deverá exceder à importância correspondente ao total de 8 % da receita anual do instituto, apurada no exercício anterior, sujeita a respectiva verba à aprovação do Conselho Nacional do Trabalho. 02 Os IAPs foram criados de acordo com a capacidade de organização, mobilização e importância da categoria profissional em questão. O Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM) foi criado em 1933. Na sequência, em 1934, foram instituídos o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários (IAPC) e Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB). Em 1936, o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários (IAPI) e, em 1938, o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Estivadores e Transportadores de Cargas (IAPETEL). 03 Segundo Nicz (1982), além de servir como importante mecanismo de controle social, os IAPs, até meados da década de 50, tinham papel fundamental no desenvolvimento econômico deste período, como “instrumento de captação de poupança forçada” através de seu regime de capitalização. Segundo o mesmo autor, as seguidas crises financeiras dos IAPs e mesmo o surgimento de outros mecanismos captadores de investimentos (principalmente externos) fazem com que, progressivamente, a previdência social passe a ter importância muito maior como instrumento de ação político-eleitoreira nos governos populistas de 1950-64, especialmente pela sua vinculação clara ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e a fase áurea de “peleguismo sindical”. Encerramento dos anos 50 No período de encerramento dos anos 50, a assistência médica previdenciária não era importante. Os técnicos do setor a consideravam secundária no sistema SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 35 previdenciário brasileiro, e os segurados não faziam dela parte importante de suas reivindicações. É a partir da segunda metade da década de 50, com o maior desenvolvimento industrial, com a aceleração da urbanização e o assalariamento de parcelas crescentes da população, que ocorre maior pressão pela assistência médica através dos institutos e se viabiliza o crescimento de um complexo médico- hospitalar para prestar atendimento aos previdenciários, em que se privilegiam abertamente a contratação de serviços de terceiros. Segundo Nicz (1982), em 1949, as despesas com assistência médica representaram apenas 7,3 % do total geral das despesas da previdência social. Em 1960, já sobem para 19,3 % e, em 1966, já atingem 24,7 % do total geral das despesas, confirmando a importância crescente da assistência médica previdenciária. Processo de unificação dos IAPs O processo de unificação dos IAPs estava sendo articulado desde 1941 e teve grandes resistências na época. A Lei Orgânica de Previdência Social foi sancionada em 1960. A Lei nº 3.807 estabeleceu a unificação do regime geral da previdência social, destinado a abranger todos os trabalhadores sujeitos ao regime da CLT, excluídos os trabalhadores rurais, empregados domésticos e, naturalmente, os servidores públicos e de autarquias e aqueles que tivessem regimes próprios de previdência. Três anos depois, os trabalhadores rurais foram incorporados ao sistema com a publicação da Lei nº 4.214, de 02.03.1963, que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRURAL). SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 36 A lei previa uma contribuição tríplice, com a participação do empregado, empregador e a União. O governo federal nunca cumpriu a sua parte, o que evidentemente comprometeu seriamente a estabilidade do sistema. (POSSAS, 1981). O processo de unificação avançou com o movimento revolucionário de 1964, que, neste mesmo ano, promoveu uma intervenção generalizada em todos os IAPs, sendo os conselhos administrativos substituídos por juntas interventoras nomeadas pelo governo revolucionário. A unificação se consolidou no ano de 1967. Saúde pública no período de 1930 a 1960 A partir de agora, veremos como as dimensões históricas e sociais influenciaram aconfiguração dos sistemas de saúde no Brasil. O Ministério da Educação e Saúde Pública foi criado em 1930, com a desintegração das atividades do Departamento Nacional de Saúde Pública vinculada ao Ministério da Justiça. Em 1941, instituiu-se a reforma Barros Barreto, em que se destacaram as seguintes ações: Instituição de órgãos normativos e supletivos destinados a orientar a assistência sanitária e hospitalar. Criação de órgãos executivos de ação direta contra as endemias mais importantes (malária, febre amarela, peste). Fortalecimento do Instituto Oswaldo Cruz como referência nacional, além da descentralização das atividades normativas e executivas sanitárias. Programas de abastecimento de água e construção de esgotos, no âmbito da saúde pública. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 37 Atenção aos problemas das doenças degenerativas e mentais com a criação de serviços especializados de âmbito nacional (Instituto Nacional do Câncer). Criação do Ministério da Saúde Em 1953, foi criado o Ministério da Saúde, que se limitou ao desmembramento do antigo Ministério da Saúde e Educação. Já em 2 de janeiro de 1967, foi implantado o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que unificou seis Institutos de Aposentadorias e Pensões, o Serviço de Assistência Médica e Domiciliar de Urgência (SAMDU) e a Superintendência dos Serviços de Reabilitação da Previdência Social. Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) O Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), produto da fusão dos IAPs, sofre a forte influência dos técnicos procedentes do IAPI. Estes técnicos, que passam a história conhecidos como “os cardeais do IAPI”, de tendências absolutamente privatizantes, criaram as condições institucionais necessárias ao desenvolvimento do “complexo médico-industrial”, característica marcante deste período (NICZ, 1982). A criação do INPS propiciou a unificação de diferentes benefícios, como todo o trabalhador urbano com carteira assinada ser automaticamente contribuinte e beneficiário do novo sistema. Nesse período, houve um aumento de recursos financeiros capitalizados. O fato do aumento da base de contribuição, aliado ao crescimento econômico da década de 1970 referente ao pequeno percentual de aposentadorias e pensões em relação ao total de contribuintes, fez com que o sistema acumulasse um grande volume de recursos financeiros Ao unificar o sistema previdenciário, o governo foi obrigado a absorver os benefícios que foram incorporados, além das aposentadorias e pensões. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 38 Isso aconteceu principalmente com a assistência médica, que era oferecido por vários IAPs que alguns possuíam serviços e hospitais próprios. Com aumento do número de contribuintes ou beneficiários, tornava-se impossível o sistema médico previdenciário atender a toda a população contribuinte. Por esse motivo, o governo direcionou os atendimentos para a iniciativa privada, visando ao apoio de setores importantes e influentes da sociedade e da economia. Atenção Foram estabelecidos convênios e contratos com os médicos e hospitais existentes no país, pagando-se pelos serviços produzidos (pró-labore), fato que propiciou a capitalização desses grupos. O formato de remuneração ocasionou o aumento no consumo de medicamentos e equipamentos médico- hospitalares, constituindo um complexo sistema médico- industrial. O sistema de saúde tornou-se mais complexo tanto na sua estrutura administrativa quanto financeira, o que gerou, em 1978, a constituição de uma estrutura administrativa própria, denominada Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS). Ministério da Previdência e Assistência Social Em 1974, o sistema previdenciário saiu da área do Ministério do Trabalho para se consolidar como um ministério próprio: o Ministério da Previdência e Assistência Social. Juntamente com esse ministério, foi criado o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS). SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 39 A criação desse fundo proporcionou a remodelação e ampliação dos hospitais da rede privada através de empréstimos com juros subsidiados. A existência de recursos para investimento e a criação de um mercado cativo de atenção médica para os prestadores privados ocasionaram um crescimento próximo de 500 % no número de leitos hospitalares privados no período de 1969 a 1984, que subiram de 74.543, em 1969, para 348.255, em 1984. Somente na década de 70 que algumas categorias profissionais conseguiram se tornar beneficiárias do sistema previdenciário, como os trabalhadores rurais (com a criação do PRORURAL, em 1971, financiado pelo FUNRURAL), e os autônomos e empregados domésticos, em 1972. Em 1975, o país diminuiu o ritmo de crescimento. Nos períodos áureos, esse desenvolvimento chegou a 10 % do PIB, tornando o crescimento econômico não mais sustentável. Sistema de saúde previdenciário Também em 1975, o modelo do sistema de saúde previdenciário começa a revelar determinadas mazelas, como: Por priorizar a medicina curativa, o modelo proposto impossibilitou resolver os problemas básicos de saúde coletiva, como as endemias, epidemias e os indicadores de saúde (exemplo: mortalidade infantil). Aumentos dos custos da medicina curativa, centrada na atenção médica- hospitalar de complexidade. Redução do crescimento econômico, com repercussão na arrecadação do sistema previdenciário, fato que ocasionou a queda de suas receitas. Inabilidade do sistema em atender a população cada vez maior de marginalizados e excluídos do sistema, que não possuem carteira assinada e, consequentemente, não contribuem com a previdência. SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 40 Desvios de recursos financeiros do sistema previdenciário para cobrir despesas de outros setores visando à realização de obras por parte do governo federal. Devido à escassez de recursos para a sua manutenção, ao aumento dos custos operacionais e ao descrédito social em resolver a agenda da saúde, o modelo proposto entrou em crise. Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP) Em 1981, na tentativa de conter custos e combater fraudes, o governo criou o Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP), que é ligado ao INAMPS. O CONASP passa a absorver, em postos de importância, alguns técnicos vinculados ao movimento sanitário, o que deu início à ruptura da dominância de burocráticos previdenciários. O plano iniciou pela fiscalização rigorosa da prestação de contas dos prestadores de serviços credenciados para identificar as fraudes. O plano propõe a reversão gradual do modelo médico-assistencial através do aumento da produtividade do sistema, melhoria da qualidade da atenção, equalização dos serviços prestados às populações urbanas e rurais, eliminação da capacidade ociosa do setor público, hierarquização, criação do domicílio sanitário, organização de um sistema de auditoria médico-assistencial e revisão dos mecanismos de financiamento. Para mencionar a forma de atuação do CONASP e do INAMPS, basta citar que eles opuseram e conseguiram derrotar, dentro do governo e com a ajuda de parlamentares, um dos projetos mais interessantes de modelo sanitário, que foi o PREV-SAÚDE, que, depois de seguidas distorções, foi arquivado. No entanto, SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 41 isso não impediu que o CONASP implantasse e apoiasse projetos pilotos de novos modelos assistenciais, destacando o PIASS, no Nordeste. Devido ao agravamento da crise financeira, o sistema redescobre, quinze anos depois, a existência do setor público de saúde e a necessidade de investir nestaárea, que trabalhava com um custo menor e atendia a uma grande parcela da população carente de assistência. Em 1983, foi criado a AIS (Ações Integradas de Saúde), um projeto interministerial (previdência-saúde-educação) cujo objetivo era um novo modelo assistencial que incorporava o setor público, procurando integrar simultaneamente ações curativas-preventivas e educativas. A previdência passou a contratar e pagar serviços prestados por Estados, Municípios, hospitais filantrópicos, públicos e universitários. Em 1985, diversos movimentos sociais, inclusive na área de saúde, culminaram com a criação das associações dos secretários de saúde estaduais (CONASS) ou municipais (CONASEMS), e com a mobilização nacional por ocasião da realização da VIII Conferência Nacional de Saúde (Congresso Nacional, 1986), que difundiu as bases da reforma sanitária e do SUDS (Sistema Único Descentralizado de Saúde). Esses fatos ocorreram simultaneamente com a eleição da Assembleia Nacional Constituinte, em 1986, e a promulgação da nova Constituição, em 1988. A partir do momento em que o setor público entrou em crise, o setor liberal começou a perceber que não mais poderia se manter e se nutrir daquele, e passou a formular novas alternativas para sua estruturação. Sistema Único de Saúde – SUS SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 42 O Sistema Único de Saúde (SUS) é constituído pelo conjunto de ações e serviços de saúde da gestão pública. Está organizado em redes regionalizadas e hierarquizadas, e atua em todo o território nacional, com direção única em cada esfera de governo. O SUS está inserido no contexto das políticas públicas de seguridade social, que abrangem saúde, previdência e assistência social. Constituição brasileira A Constituição brasileira estabelece que a saúde é um dever do Estado. O Estado não apenas como o governo federal, mas como Poder Público, abrangendo a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. A Lei nº 8.080/90 (BRASIL, 1990) determina, em seu artigo 9º, que a direção do SUS deve ser única, de acordo com o inciso I do artigo 198 da Constituição Federal, sendo exercida, em cada esfera de governo, pelos seguintes órgãos: I. No âmbito da União, pelo Ministério da Saúde. II. No âmbito dos Estados e do Distrito Federal, pela respectiva secretaria de saúde ou órgão equivalente. III. No âmbito dos municípios, pela respectiva secretaria de saúde ou órgão equivalente. Em 1988, concluiu-se o processo constituinte e foi promulgada a oitava Constituição do Brasil. A chamada “Constituição Cidadã” foi um marco fundamental na redefinição das prioridades da política do Estado na área da saúde pública. A Constituição Federal de 1988 define o conceito de saúde, incorporando novas dimensões. Para ter saúde, é preciso ter acesso a um conjunto de fatores, como alimentação, moradia, emprego, lazer, educação e demais circunstâncias determinantes e condicionantes. O Artigo 196 cita que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido, mediante políticas sociais e econômicas, que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 43 universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Com esse artigo, fica definida a universalidade da cobertura do Sistema Único de Saúde. O SUS faz parte das ações definidas na Constituição como sendo de “relevância pública”, sendo atribuído ao poder público a sua regulamentação, a fiscalização e o controle das ações e dos serviços de saúde. Conforme a Constituição Federal de 1988, o SUS é definido pelo Artigo 198 como as ações e serviços públicos de saúde que integram uma rede regionalizada e hierarquizada, e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I – Descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II – Atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas sem prejuízo dos serviços assistenciais; III – Participação da comunidade. O Sistema Único de Saúde é financiado com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, Distrito Federal, Municípios e de outras fontes. O texto constitucional demonstra claramente que a concepção do SUS estava baseada na formulação de um modelo de saúde voltado para as necessidades da população, procurando resgatar o compromisso do Estado para com o bem-estar social, especialmente no que se refere à saúde coletiva, consolidando-o como um dos direitos da cidadania. Ao longo do ano de 1989, procederam-se negociações para a promulgação da lei complementar que daria bases operacionais à reforma e iniciaria a construção do SUS. A Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes. A lei regula, em todo o território nacional, as ações e os serviços de saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou privado (BRASIL, 1990). A Lei nº 8.080/90 SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 44 institui o Sistema Único de Saúde, constituído pelo conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta, e das fundações mantidas pelo Poder Público. A iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de Saúde em caráter complementar. As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o SUS são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no Artigo 198 da Constituição Federal de 1988, obedecendo ainda a princípios organizativos e doutrinários, tais como: Universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; Integralidade de assistência, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; Equidade; Descentralização político-administrativa com direção única em cada esfera de governo; Conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população; Participação da comunidade; Regionalização e hierarquização. A Lei nº 8.080/90 trata do(a): Organização, direção e gestão do SUS; Definição das competências e das atribuições das três esferas de governo; Funcionamento e da participação complementar dos serviços privados de assistência à saúde; Política de recursos humanos; Gestão financeira, dos recursos financeiros, do planejamento e orçamento. A Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área de saúde, SISTEMAS DE SAÚDE DO BRASIL E AUDITORIA DO SISTEMA SUS 45 entre outras providências. Esta instituiu as conferências e os conselhos de saúde em cada esfera de governo (BRASIL, 1990). O SUS conta, em cada esfera de governo, com as seguintes instâncias colegiadas de participação da sociedade: A conferência de saúde; O conselho de saúde. Nos últimos 64 anos (1941-2007), foram realizadas 13 Conferências Nacionais de Saúde – CNS em contextos políticos diversos e cujas características em termos de composição, temário e deliberações foram muito diferentes entre si. Na Lei nº 8.142/90, ficou estabelecido que a Conferência Nacional de Saúde – CNS fosse realizada a cada quatro anos, “com a representação dos vários segmentos sociais para avaliar a situação de saúde e propor diretrizes para a formulação
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