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3ª Aula - Direito Penal - Controle social penal e Estado Democrático de Direitos - Sistemas de Garantias

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DIREITO PENAL – TEORIA DO CRIME
CONTROLE SOCIAL PENAL E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
DIREITO PENAL E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
O direito penal é um ramo do direito público que pretende sistematizar normas jurídicas que possuem o objetivo de tipificar condutas consideradas penalmente relevantes, bem como suas sanções correspondentes – penas e medidas de segurança. O Código Penal brasileiro trouxe expressamente, em seu artigo 1, a literalidade de que não há crime sem lei anterior que o defina, assim como não há pena sem prévia cominação legal; esse mesmo conteúdo normativo-legal também está estampado no inciso XXXIX, do artigo 5º da Constituição brasileira de 1988.
Assim, o princípio da legalidade é o fundamento regente para a definição de quais condutas serão consideradas crimes pelo Estado. Ou seja, tipificar uma conduta se equipara à lógica da etiquetação estatal de pessoas criminosas e comportamentos eleitos pelo Estado como crime, sendo para isso necessário que o legislador defina previamente, quais são essas questões estatais consideradas penalmente relevantes. 
Na realidade, a lei que institui o crime e sua respectiva pena deverá ser anterior ao fato que se pretende punir, condição fundamental para proteger a dignidade dos cidadãos. Estes não poderão ser surpreendidos com proposições normativas que antes não eram condutas ou ilícito penais, mas repentinamente tornaram-se crimes. Essa previsão legal do que se entende e define como crime é, além de uma garantia que prima pela segurança jurídica, uma forma de assegurar a todas as pessoas condições de se planejarem, no sentido de agirem nos moldes das disposições expressamente previstas no plano legislativo.
O direito de o Estado punir penalmente uma pessoa, por determinada conduta por ela praticada, exige obrigatoriamente a observância do princípio da legalidade. O Estado tem o dever de vincular todas as atividades de seus agentes aos ditames legais e o direito penal “impõe a observância da estrita legalidade para a definição dos crimes e aplicação das penas” (GALVÃO, 2011, p. 110); uma vez que “a vinculação da atividade repressiva do Estado aos limites previamente estabelecidos por lei constitui verdadeiro instrumento de contenção da tirania e do despotismo” (GALVÃO, 2011, p. 110).
A tipicidade penal é um princípio que estabelece o dever de o legislador descrever, minuciosamente e de forma prévia, quais são as condutas humanas consideradas ilícitas e relevantes sob a perspectiva penal. Se o Estado possui o interesse em punir e criminalizar determinada atitude, primeiro deverá descrevê-la de forma clara, pontual, objetiva e sistematizada, uma vez que isso é o que prevê os princípios da legalidade e taxatividade. A legalidade é, assim, uma das mais importantes conquistas do direito penal moderno.
Esse postulado trouxe, ainda, o debate e a importância de sistematização jurídico-legal da anterioridade penal como requisito para a punição de atitudes consideradas penalmente relevantes:
A adequação de uma determinada conduta ao tipo penal exige do aplicador do direito uma interpretação literal e restritiva: não poderá o magistrado ou o órgão acusador interpretar de forma analógica, ampla, valorativa ou metajurídica determinado comportamento objetivando incriminar e punir penalmente seu agente. 
Toda pessoa tem constitucionalmente assegurado o estado de inocência cabendo ao Estado desconstituir essa presunção de inocência apenas quando a conduta humana se enquadrar literalmente ao conteúdo descrito na lei como crime. 
Havendo qualquer possibilidade de o Estado agir fora dos limites estabelecidos pela lei, tal ação será reprimida pelo direito penal; uma vez que o princípio da legalidade (reserva legal), juntamente com a anterioridade penal, tipicidade penal, segurança jurídica e dignidade humana, trouxeram maior segurança e estabilidade jurídica aos cidadãos. 
O Estado tem o dever de vincular todas as atividades de seus agentes aos ditames legais e o direito penal:
Impõe a observância da estrita legalidade para a definição dos crimes e aplicação das penas, uma vez que a vinculação da atividade repressiva do Estado aos limites previamente estabelecidos por lei constitui verdadeiro instrumento de contenção da tirania e do despotismo. (GALVÃO, 2011, p. 110)
Pergunta-se: Mas qual é a finalidade e a missão do direito penal no Estado Moderno de Direito?
FINALIDADE E MISSÃO DO DIREITO PENAL
Originariamente, esse ramo da ciência do Direito deixou claro seu propósito de fortalecer o exercício legítimo do poder estatal, além de ser instrumento de controle social. Pois, no momento em que o Estado etiqueta e estabelece previamente quais são as condutas humanas reprimidas penalmente e consideradas crimes, deixa claro o seu interesse e legitimidade jurídica quanto à punição dos sujeitos que violarem de forma dolosa ou culposa tais determinações legais.
Por isso, o Estado foi colocado “à frente de um fenômeno originado pelo desrespeito de alguns cidadãos aos direitos e garantias individuais de outros, na medida em que bens jurídicos tutelados por escolhas da sociedade, através de seus legítimos representantes, eram ofendidos e necessitavam de proteção” (ANDREUCCI, 2008, p. 3).
Nesse cenário socio-jurídico, o Estado passou a utilizar o direito penal como instrumento institucionalizado de controle social, deixando claro o poder estatal de punir mediante previsões legais estabelecidas no ordenamento jurídico brasileiro. A principal máxima utilizada pelo Estado para justificar sua atuação punitiva é que:
Os bens protegidos pelo Direito Penal não interessam ao indivíduo, exclusivamente, mas à coletividade como um todo, pois a relação existente entre o autor de um crime e a vítima é de natureza secundária, uma vez que esta não tem o direito de punir. (BITENCOURT, 2002, p. 4)
A lógica jurídica estabelecida é que o poder punitivo do Estado tem as seguintes vertentes:
1)Retribuir ao agente a conduta ilícita por ele praticada, objetivando sua ressocialização e mudança de postura diante do contexto individual e coletivo.
2) Reforçar a legitimidade em proteger a coletividade mediante a demonstração simbólica de segurança social. 
A partir dessas premissas, fica bastante clara a missão inicial do direito penal na modernidade: Punir agentes que praticam condutas tipicamente consideradas crimes pela norma legal, além do interesse de prevenir e desestimular a sociedade civil em geral quanto à prática dessas atitudes. 
A retribuição justa ao agente – autor de um crime – é vista dentre essas missões do direito penal trazidas pela modernidade, pois sua tarefa seria a “proteção dos elementares valores ético-sociais da ação e só por extensão a proteção de bens jurídicos” (TOLEDO, 1994, p. 7). Na realidade, a principal missão do direito penal com o advento da modernidade foi fortalecer o poder do Estado, legitimando legalmente a aplicação de penas a sujeitos que transgridam a norma penal, como mecanismo simbólico de proteção da sociedade civil.
A missão do direito penal, nessa perspectiva teórica, é o controle social. Acredita-se que a norma jurídica em si mesma, especialmente se vier acompanhada de penas severas, é capaz por si só de desestimular o agente à prática de ilícitos. Na perspectiva trazida pela modernidade, no momento em que o Estado pune alguém que comete um ilícito penal, estaria desestimulando outros sujeitos a praticarem a mesma conduta, como se fosse uma lógica matemática e quantitativa.
A revisitação das respectivas premissas teóricas na sociedade democrática é de fundamental importância para o entendimento crítico sobre a própria missão democrata-constitucional do direito penal. A norma jurídico-legal, na sua específica literalidade, não tem o condão de desestimular de forma automática e vegetativa os seus destinatários de deixarem de praticar determinada conduta reprimida penalmente.
Missão efetiva do direito penal no Estado Democrático de Direito
A democraticidade da atuação do Estado exige inicialmente que os destinatários dos provimentos estataistenham a oportunidade de participar discursivamente de sua construção. Se determinada norma jurídica é pensada para reprimir condutas, consideradas penalmente relevantes, é importante que seus receptores participem dialogicamente de sua construção e aplicabilidade, para que consigam enxergar e dimensionar a importância desse conteúdo normativo, tanto na esfera coletiva, quanto individual.
No momento em que o Estado constrói e elabora unilateralmente uma lei penal, sem se preocupar em construir um debate, faz com que os destinatários não se sintam partes integrantes e pertencentes à norma. Quando isso acontece, a consequência automática é um déficit de efetividade normativa, ou seja, se o receptor da norma não participou do debate construído no processo legislativo que culminou com sua aprovação, qual é o sentido de visualizar a importância no que tange à aderência ao conteúdo dessa norma? Se é incapaz de compreender a sua importância jurídico-social, qual é o sentido de apoiar o seu conteúdo?
Um exemplo que ilustra bem o fato de que a norma jurídico-penal em si seja incapaz de modificar estruturalmente a realidade social é a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). Se qualquer destinatário de uma norma penal não consegue compreender a dimensão do seu conteúdo simbólico, fica consequentemente comprometido o seu efetivo propósito, que é reprimir e desestimular o agente de praticar a conduta penalmente reprovada pelo Estado.
Antes de o Estado aprovar uma norma penal repressora e punitiva, é importante diagnosticar as razões e motivos que levam as pessoas a praticarem determinadas condutas reprovadas penalmente, o que é objeto da criminologia.
Quando se realiza um estudo preliminar das causas que levam à delinquência, consegue-se diagnosticar outras estratégias interventivas, que vão além da lei penal, no sentido de prevenir a prática de condutas delituosas e lesivas aos interesses individuais e sociais.
É preciso deixar de enxergar o delinquente como um inimigo do Estado e da sociedade civil, procurando-se entender a dimensão em que ele se encontra inserido para, assim, compreender sistematicamente as razões que o levam à prática delituosa. Nesse sentido, destaca-se o princípio da intervenção mínima ou da última ratio, que implica a intervenção do Direito Penal restrita “ao mínimo necessário à manutenção da harmonia social” (GALVÃO, 2011, p. 116).
A força punitiva de intervenção do Estado na esfera penal deve ser bem orientada, pois:
A incriminação só se justifica diante de ataque a bem jurídico considerado relevante, e a apenação, além de ser proporcional ao dano social produzido, deve ser a mínima necessária à realização dos fins de proteção almejados. (GALVÃO, 2011, p. 117)
A intervenção mínima do Estado quanto à tipificação penal deixa claro que o direito penal deve ser utilizado como instrumento subsidiário – não principal – de controle social.
A criminalização somente se justifica democraticamente quando as instituições – sociedade, Estado, família – comprovadamente demonstram sua insuficiente atuação no sentido de prevenir comportamentos delituosos, não restando outra alternativa ao Estado a não ser a incriminação dessas condutas. 
A missão do direito penal democrata-constitucional é proteger amplamente a dignidade humana, seja na esfera individual ou coletiva, motivo esse que justifica a imprescindibilidade de intervenção estatal mínima, no que atine à criminalização e punição de pessoas. Antes de ser instrumento de controle social e fortalecimento do poder punitivo do Estado, a missão constitucionalizada e democratizante do direito penal é permitir que cada cidadão seja amplamente protegido em sua dignidade, quando se encontra diante das arbitrariedades possivelmente praticadas pelo Estado. Isso não foi sustentado pelos estudiosos da modernidade que, contrariamente a essas premissas aqui expostas, defenderam a aplicabilidade do princípio do direito penal máximo.  Os defensores deste preceito insistem na ideia de eleger o criminoso como um inimigo do Estado, ao invés de procurar entender as razões que levam ao aumento constante e significativo dos números da criminalidade no Brasil.
Pergunta-se: Mas quais seriam as razões para o constante crescimento da criminalidade no Brasil?
FATORES PARA O CRESCIMENTO DE ATOS CRIMINOSOS NA SOCIEDADE BRASILEIRA
São inúmeras as razões que explicam, na prática, o crescimento de atos criminosos no Brasil. O déficit de eticidade e alteridade (valorização do outro), o crescente abismo social, além de aspectos morais, sociais e religiosos, são alguns fatores que podem elucidar inicialmente a questão.
O comportamento tipicamente individual e patrimonialista de muitos sujeitos, além da incapacidade de conseguir se colocar no lugar do outro (ausência de alteridade), influencia de forma direta na prática de alguns ilícitos penais, como os crimes contra o patrimônio e contra administração pública.
A desigualdade social e o grande número de pessoas vivendo ou sobrevivendo abaixo da linha da pobreza, desempregadas e sem acesso a direitos fundamentais básicos, também contribuem significativamente para a prática de ilícitos penais, como é o caso do crime de tráfico de drogas.
Razões morais explicam, por exemplo, a prática de crimes contra a dignidade sexual, homicídios, ressaltando-se que a dominação masculina reflete de forma direta em muitos crimes contra mulheres, assim como há o interesse do Estado em criminalizar a sexualidade, ao penalizar atos praticados contra a integridade sexual da vítima.
Pergunta-se: Mas será que essa atuação punitiva do Estado, no sentido de penalizar essas e diversas outras condutas, assegura a modificação de estruturas sociais que explicam muitos desses comportamentos ?
ATUAÇÃO PUNITIVA DO ESTADO: O direito penal é uma ciência normativa que institui como crime condutas consideradas, em princípio, anormais no campo social. Em contrapartida, a criminologia considera crime um problema social, um fenômeno comunitário, que possui quatro componentes.
1)INCIDÊNCIA MASSIVA NA POPULAÇÃO: Não se pode tipificar como crime um fato isolado.
2) INCIDÊNCIA AFLITIVA DO FATO PRATICADO: O crime deve causar dor à vítima e à comunidade.
3) PERSISTÊNCIA ESPAÇO-TEMPORAL DO FATO DELITUOSO: É preciso que o delito ocorra reiteradamente por um período significativo de tempo no mesmo território.
4) CONSENSO INEQUÍVOCO ACERCA DE SUA ETIOLOGIA E TÉCNICAS DE INTERVENÇÃO EFICAZES: A criminalização de condutas depende de uma análise minuciosa desses elementos e sua repercussão na sociedade.
A criação de um tipo penal deve ser reflexo de uma decisão amadurecida do Estado, após análise cuidadosa dos critérios aqui expostos. O crime não pode ser visto como um instrumento normativo-legal, por meio do qual o Estado institucionaliza uma guerra contra quem é por ele declarado como inimigo.
Definitivamente, essa não pode ser a missão do direito penal: criminalizar condutas com o propósito de objetificar sujeitos, fortalecendo a marginalidade e a exclusão reproduzida naturalmente pela sociedade civil.
Na perspectiva da Constituição de 1988, o direito penal tem a missão de reprimir condutas comprovadamente danosas à coletividade, quando não restar outra alternativa a não ser punir o agente mediante a intervenção da norma jurídica. Ou seja, seguindo-se a lógica da intervenção mínima, apenas quando as demais estruturas sociais demonstrarem insuficiência em sua atuação, é que se deve criar um tipo penal. 
A missão democrata-constitucional do direito penal é punir o agente (autor do ilícito penal) de forma a assegurar-lhe, tanto durante o processo judicial quanto ao longo do cumprimento da pena, a proteção ampla e efetiva de sua dignidade. Não se pode admitir a atuação repressiva do Estado na sociedade democrática, ignorando-se os direitos fundamentais constitucionalmente assegurados a todos os sujeitos, especialmente àqueles que praticam ilícitos penais.
Pergunta-se: Sob a perspectiva crítica, qual a utilidade prática e a importância teórica do direito penal para o Estado?Por meio da criação de figuras típicas (crimes), o Estado fortaleceu seu poder na modernidade, explicitando sua autoridade de punir pessoas que praticavam condutas por ele consideradas ilícitos penais. Além disso, o direito penal era visto como um instrumento estatal para marginalizar pessoas, tornar formalmente invisível aqueles sujeitos que já o são socialmente.
É o caso do jovem negro e periférico, peça fundamental para o tráfico de drogas, que se desenvolve naturalmente sob os olhos do Estado, sem que o mesmo assim implemente políticas públicas de repressão efetiva ao negócio de substâncias entorpecentes ilícitas. Ao invés disso, o que o Estado faz?  Criminaliza a conduta do jovem negro periférico, objetificando-o e reforçando a ação das estruturas sociais que naturalizam sua exclusão e marginalidade.
Agindo dessa forma, o Estado simbolicamente oferece à sociedade civil – composta pelos ditos sujeitos de “bem” – uma situação de aparente conforto e segurança jurídica, sem atacar o problema central que permeia a respectiva temática: o combate ao tráfico de drogas mediante o planejamento e a execução de políticas públicas. Estas deveriam objetivar a geração de empregos, a punição dos chefes do tráfico de drogas e o oferecimento de condições dignas para o jovem negro periférico – emprego, educação, moradia.
No momento em que o Estado opta pela punição do jovem negro periférico, em razão de seu envolvimento com o tráfico de drogas, deixa claro que a missão do direito penal é meramente punitiva, segregacionista e marginalizadora, contrariando os ditames constitucionais da dignidade humana e igualdade. Em contrapartida, no Estado Democrático de Direito, a missão do direito penal deve ir muito além do seu caráter condenatório, de controle social e exercício autocrático do poder punitivo estatal.
A missão democrática da norma penal deve ser excepcionalmente punir o sujeito (intervenção mínima), ressaltando-se que a tipificação de condutas como ilícitos penais deve ser a última ratio apenas quando comprovada a insuficiência das demais estruturas sociais (sociedade, família, Estado) em garantir a dignidade, inclusão e igualdade especialmente das pessoas em absoluta condição de vulnerabilidade social. 
A missão do direito penal brasileiro não pode ser o encarceramento em massa, mediante a criminalização da pobreza, com a punição massificada e institucionalizada daqueles sujeitos categorizados legalmente como os inimigos do Estado.  
Pergunta-se: Mas quem seriam os inimigos do Estado?
Políticos, traficantes de drogas, pedófilos, policiais, além dos sujeitos negros e pardos de periferia, são considerados os inimigos legais do Estado brasileiro. Quando essas pessoas são denunciadas pelo Ministério Público passam a conviver com o calvário da presunção da culpabilidade, devendo provar perante o Estado a sua condição constitucional de inocência – que deveria ser presumida. Nesse contexto, temos decisões judiciais autocráticas, fundadas na discricionariedade judicial, num modelo hermenêutico  com forte carga axiológica. O que torna inviável a participação desses sujeitos na construção discursiva e racional do provimento final de mérito, uma vez que, quando são processados, assumem a obrigação de desconstituir a presunção de culpabilidade suportada em razão de serem vistos como inimigos expressos do Estado.
Quando o Estado legitima aprioristicamente a construção legal de um inimigo, utilizando-se da norma penal para segregar tal sujeito, assume um papel inquisidor e autocrático. O direito penal democrático tem a missão de criminalizar condutas, não pessoas escolhidas previamente pelo legislador. O direito penal, quando opta pela criminalização de sujeitos específicos (pedófilos, jovens negros periféricos, políticos, policiais), assume uma missão inquisitiva e de certo modo belicosa, que não se compatibiliza com as diretrizes normativas trazidas pelo texto da Constituição brasileira de 1988.
Outro ponto importante a ser abordado é o papel higienista assumido como missão do direito penal moderno. A norma penal é vista como instrumento de limpeza e higienização social, sendo utilizada como ferramenta para eliminar, objetificar, marginalizar, segregar e robustecer a exclusão daqueles “ditos” inimigos do Estado, que já são natural e socialmente excluídos pelas estruturas de poder vigentes. Quando se faz essa afirmação, pretende-se demonstrar que, sob a ótica do senso comum, os problemas sociais existem como um dado da realidade, como algo natural.
É frequente a reverberação do discurso que a vida em sociedade é naturalmente conflituosa por si só, visando justificar a intervenção normativo-penal, cujo objetivo é regular a própria vida em sociedade. 
A complexidade de fatores que envolvem tal análise é tamanha que nos leva a afirmar que o problema da criminalidade social não pode ser reduzido a soluções mágicas propostas pelo direito penal. Exemplo: A política criminal de combate às drogas, por exemplo, objetiva criminalizar condutas de agentes que comercializam e consomem substâncias categorizadas juridicamente como ilícitas, ignorando-se as razões que explicam a existência de tal fenômeno social.
Quando as estruturas sociais naturalizam o consumo de tabaco e bebidas alcoólicas, responsável pela movimentação direta da economia, estimula-se consequentemente, de forma indireta, o consumo de outras substâncias químicas, como a cocaína, maconha e drogas sintéticas. Visando manter seu poder inato, o Estado criminaliza muitas dessas condutas, categorizando como ilícito o consumo de apenas algumas substâncias químicas. A partir dessas premissas, aquele que consome ou comercializa as ditas substâncias entorpecentes ilícitas será punido criminalmente.
O que se verifica nesse contexto é que o objetivo do Estado, ao criminalizar o uso e o consumo de drogas ilícitas, não é especificamente reprimir o comércio ilegal dessas substâncias, mas sim eleger um inimigo (traficante ou usuário) como forma de demonstrar seu poder de controle social. 
O problema da criminalização do consumo e do uso de substâncias proibidas é, além do fortalecimento do poder estatal, a objetificação dos sujeitos eleitos como pessoas delituosas, justificando a existência e a atuação do Estado punitivista.
A criminalização do consumo e comercialização de drogas no Brasil representa uma estratégia de poder muito articulada e pensada pelo Estado. Não se pretende, por meio da norma jurídica, reprimir efetivamente o consumo de substâncias químicas pela sociedade civil. Objetiva-se, na verdade, o fortalecimento jurídico dos mecanismos de controle social mediante a solidificação do poder autocrático-inquisitivo do Estado. 
No momento em que o Estado cria legalmente um inimigo, utiliza-se da norma penal para punir pessoas específicas e institucionaliza um sistema de seletividade normativo-punitivista, como estratégia simbólica para responder às demandas de uma sociedade que muitas vezes busca a vingança, não a aplicabilidade de penas nos moldes democrata-constitucional  e garantistas.
Pergunta-se: Pode o direito penal ser visto como uma estrutura de dominação e geração de violência praticada e legitimada pressupostamente pelo próprio Estado?
Tem ficado claro que o direito penal, quando utilizado como mecanismo punitivista de seleção de condutas e pessoas determinadas, é considerado uma estratégia que visa fortalecer a atuação do poder autocrático do Estado. Ao invés de ser visto como forma de controle social, dominação e segregação de pessoas, o direito penal garantista deve primar pela proteção ampla, efetiva, sistemática e inclusiva das pessoas, de forma indistinta. Quando o direito penal assume o papel exclusivamente punitivista, gera violência simbólica contra as pessoas, especialmente com relação aos sujeitos categorizados como inimigos ou indignos pelo Estado que, por isso, deverão ser penalizados.
Exemplo: Um clássico exemplo, ainda atual, de utilização do direito penal como espaço de geração de desigualdades entre as pessoas, é a criminalização dahomossexualidade. Nesse contexto, o direito penal é visto como estrutura que legitima o discurso de ódio contra gays e lésbicas, no momento em que estabelece como conduta criminosa e tipificada penalmente a relação afetivo-sexual existente entre duas pessoas do mesmo sexo.
Verifica-se, nesse cenário, que a violência sofrida pela comunidade LGBTQI+ não é apenas advinda das estruturas sociais clássicas (família, sociedade, escola), uma vez que o próprio Estado se apropria desse discurso e o utiliza como fundamento para a criação de tipos penais que criminalizam a sexualidade. É, no mínimo, preocupante saber que, em pleno século XXI, ainda existem países que continuam criminalizando a liberdade sexual. Se é crime a conduta dos gays e das lésbicas, tem-se a norma penal com dispositivo estratégico do Estado para suprimir a liberdade desses sujeitos, fundamento jurídico-legal absolutamente contrário às proposições normativo-legais democráticas.
Situação-problema: 1. Ao afirmar que a função do Direito Penal é a limitação do poder punitivo, tem-se que isso vai ao encontro do mandamento do Estado Democrático de Direito que determina a tutela dos Direitos Humanos. Em outras palavras, ao afirmar que a função do Direito Penal é limitar o poder punitivo, reconhece-se que o Direito Penal e o Processo Penal são eficazes instrumentos de efetivação dos Direitos Humanos, considerados através de uma nova perspectiva, integradora, crítica e contextualizada, nos termos da chamada Teoria Crítica dos Direitos Humanos. (CANTERJI, 2008, p.114). Obs. Trecho extraído do Livro: CANTERJI, Rafael Braude. Política Criminal e Direitos Humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. ISBN 978-85-7348-523-3
2. É ilícita a prova obtida por meio de revista íntima realizada com base unicamente em denúncia anônima. De início, é inarredável a afirmação de que a revista íntima, eventualmente, constitui conduta atentatória à dignidade da pessoa humana, em razão de, em certas ocasiões, violar brutalmente o direito à intimidade, à inviolabilidade corporal e à convivência familiar entre visitante e preso. Em verdade, a adoção de revistas íntimas vexatórias e humilhantes viola tratados internacionais de Direitos Humanos firmados pelo Brasil e contraria recomendações da Corte Interamericana de Direitos Humanos, das Organizações das Nações Unidas e da Corte Europeia de Direitos Humanos. Para compatibilizar os direitos e deveres envolvidos na questão relativa ao controle de ingresso de visitantes em estabelecimentos penitenciários, existem, basicamente, duas correntes. A primeira considera não ser possível a realização de revista íntima em presídios, por ser ela vexatória e atentatória à dignidade da pessoa humana, valor básico ensejador dos direitos fundamentais. Ainda, invoca a proibição constitucional de se submeter qualquer pessoa a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III). Há, no entanto, uma segunda corrente, para a qual é possível, sim, a realização de revista íntima em estabelecimentos prisionais, com base em uma ponderação de interesses, pois existe a necessidade de controlar a entrada de produtos proibidos nos presídios armas, bebidas, drogas etc., de forma que, por questão de segurança pública e em nome da segurança prisional, estaria autorizada a medida (desde que, obviamente, fossem tomadas as cautelas devidas, tais como a realização de revista em mulheres por agentes públicos do sexo feminino). No caso, a acusada foi submetida à realização de revista íntima com base, tão somente, em uma denúncia anônima feita.
Pergunta-se: "Ante o exposto, diante da análise da adoção de um Sistema Penal de Garantias pelo Estado Democrático de Direito descrita no texto acima e comparando-a à ementa do Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça transcrito, avalie as duas correntes suscitadas e formule argumentações jurídicas voltadas a mitigar o referido conflito".
Bibliografia:
Conteúdo interativo da aula 3 do material contido no SIA do Centro Universitário Estácio de São Paulo da disciplina de Direito Penal – Teoria do Crime. 
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