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Iberografias_37_VersaoFinal

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Uma estratégia alimentar sem território.
Chapter · March 2020
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1 author:
Cecília Delgado
Universidade NOVA de Lisboa
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IberografIas
37
IberografIas
37
PoNTes eNTre agrICULTUra faMILIar 
e agrICULTUra bIoLÓgICa
Cristina Amaro da Costa (coordenação), 
Cristina Parente, Ana Aguiar, Raquel Guiné,
Daniela Costa, Helena Esteves Correia
e Cláudia Chaves
Colecção Iberografias
Volume 37
Título: Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Editores: Cristina Amaro da Costa (Coord.), Ana Aguiar, Cristina Parente, Daniela Costa, Helena Esteves Correia, Raquel Guiné, 
Paula Correia, Cláudia Chaves 
Autores: Ana Aguiar, Ana Entrudo, Andreia Martins, Ângelo Rocha, Aníbal Cabral, Carmo Bica, Cecília Delgado, Cláudia Chaves, 
Cristina Amaro da Costa, Cristina Parente, Daniela Costa, Duarte Costa Guimarães, Emília Coutinho, Emiliano Tapia, Fábio 
Gomes, Fernando Carlos Alves Martins, Fernando Delgado, Fernando Oliveira Batista, Filipa Almeida, Filipa Janson, Francisco 
Bendrau Sarmento, Frederico Costa Guimarães, Helena Esteves Correia, Irene Aurora Santos, Isabel Mourão, Joana Neto, Joaquim 
Pinho, José Rocha Fernandes, José Sousa Guedes, Liliana Pinto, Luísa Silva, Manuel António Silva, Maria C. Silva, Maria do Céu 
Godinho, Maria Helena Marques, Maria Victória Garcia Medina, Paula Nelas, Paula Correia, Paulo Barracosa, Pedro Barbosa, Pedro 
Reis, Sara Moreira, Raquel Guiné, Raúl Rodrigues, Rui Dionísio, Rui Jacinto, Telmo Costa, Vitor Barros
Pré-impressão: Âncora Editora
Capa: Cláudia Fonseca | Âncora Editora
 Fotografia: Ana Santos (Portugal)
Impressão e acabamento: Grafisol
1.ª edição: março 2020
Depósito legal n.º *** ***/2020
ISBN: 978 972 780 717 8
ISBN: 978-989-8676-22-1
Edição n.º 41037
Centro de Estudos Ibéricos
Rua Soeiro Viegas n.º 8
6300-758 Guarda
cei@cei.pt
www.cei.pt
Âncora Editora
Avenida Infante Santo, 52 – 3.º Esq.
1350-179 Lisboa
geral@ancora-editora.pt
www.ancora-editora.pt
www.facebook.com/ancoraeditora
O Centro de Estudos Ibéricos respeita os originais dos textos, não se responsabilizando pelos conteúdos, forma e opiniões neles expressas.
A opção ou não pelas regras do novo acordo ortográfico é da responsabilidade dos autores
“Agradece-se ao Projeto PROJ/CI&DETS/CGD/0006: “Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica”, financiado através 
da parceria entre o Politécnico de Viseu e Caixa Geral de Depósitos, e ao CI&DETS e CERNAS, financiados pela Fundação para a 
Ciência e Tecnologia (FCT)”
Apoios:
PreâMbULo 
O rural e a agricultura: das ausências à geografia da esperança
Rui Jacinto
11
Pontes. e redes.
Cristina Amaro da Costa
19
CaPíTULo 1. agrICULTUra faMILIar e agrICULTUra bIoLÓgICa: CoNCeITos e PráTICas
Editores: Helena Esteves Correia e Daniela Costa
23
CoNCeITos
agricultura familiar e biológica: modelos tecnológicos e dinâmicas
Pedro Reis
29
agricultura familiar e agricultura biológica: conceitos
Isabel Mourão
33
PráTICas
ProVe – Promover e vender
José Sousa Guedes
43
O que fazer para aproximar a agricultura familiar da agricultura biológica. 
Ângelo Rocha
47
A Segurança alimentar, do ponto de vista da agricultura familiar e biológica, como 
um caminho de cura do nosso planeta.
Liliana Pinto
49
Testemunho de um horticultor de agricultura convencional. 
Manuel António Silva
53
Agricultura familiar, agricultura biológica e desenvolvimento rural. Perspetiva de 
uma família de jovens agricultores. 
Filipa Janson, Frederico Costa Guimarães, Duarte Costa Guimarães
57
Um exemplo do programa PROVE na Área Metropolitana do Porto.
Pedro Barbosa
59
CaPíTULo 2. agrICULTUra faMILIar: do dIreITo à aLIMeNTação aTé ao CoNsUMo
Editores: Paula Correia e Raquel Guiné
63
do dIreITo e das PoLíTICas
o alimento e a agricultura familiar.
Paula Correia e Raquel Guiné
67
Uma estratégia alimentar sem território. 
Cecília Delgado
71
O papel central da mulher para a realização da alimentação enquanto direito. 
Maria Victória Garcia Medina
77
A agroecologia como abordagem crítica para pensar a agricultura familiar, 
a agricultura biológica e o desenvolvimento rural. 
Irene Aurora Santos
81
sementes que guardam diversidades.
Maria Helena Marques
85
ao TerrITÓrIo e às Pessoas
Os pequenos agricultores familiares e o direito à alimentação. 
Aníbal Cabral
91
Un proyecto en Salamanca: “5 Colectivos en red – La dignidad de la vida para 
permanecer en su propia tierra”. 
Emiliano Tapia
95
Estratégia Terras de S. Pedro – Município de S. Pedro do Sul. 
Joaquim Pinho
99
«O som é a enxada»: promover a agricultura de proximidade através de uma rádio 
comunitária.
Sara Moreira e Filipa Almeida
101
Agricultura familiar: do direito à alimentação até ao consumo. 
José Rocha Fernandes
105
CAPíTULO 3. AgRiCULTURA fAMiLiAR E dESEnVOLViMEnTO RURAL: SOCiOLOgiA, 
TerrITÓrIo e aMbIeNTe
Editores: Ana Aguiar e Cristina Amaro da Costa
109
soCIoLogIa e TerrITÓrIo
Cultivar laços de confiança e afectividade no seio de uma agricultura familiar que se 
quer de cariz biológico. 
Paulo Barracosa
113
Olhares fragmentados sobre as paisagens rurais dos fogos de 2017 no interior do país. 
Fernando Delgado
117
Agricultura familiar, agricultura biológica e desenvolvimento rural 
Fernando Oliveira Batista
129
Rede Rural nacional – Construir pontes para o desenvolvimento Rural.
Ana Entrudo e Carmo Bica
137
Pontes entre a agricultura familiar e a agricultura biológica
Fernando Carlos Alves Martins
141
aMbIeNTe
Por uma Cultura Agroalimentar Sustentável. 
Vitor Barros
147
Agricultura familiar, agricultura biológica e desenvolvimento rural: aspetos em torno 
da proteção das plantas. 
Maria do Céu Godinho
153
Património frutícola do Minho – Bases para um desenvolvimento sustentável 
Raúl Rodrigues
157
Agroecologia e a consolidaçãoda agricultura familiar na comunidade dos países de 
língua portuguesa.
Francisco Bendrau Sarmento
161
CaPíTULo 4. PoNTes agrICULTUra faMILIar e agrICULTUra bIoLÓgICa. 
UM ProjeTo CoNsTrUIdo
Editores: Cristina Amaro da Costa, Ana Aguiar e Cristina Parente
165
Contruir pontes entre agricultura familiar e agricultura biológica. 
Cristina Amaro da Costa, Raquel Guiné, Daniela Costa, Helena Esteves Correia, 
Cláudia Chaves, Ana Aguiar, Cristina Parente
167
Adesão e resistência a práticas de agricultura biológica entre agricultores familiares: 
uma abordagem a partir de grupos focais.
Cristina Parente
171
Agricultura familiar do norte e centro de Portugal: práticas de agricultura sustentável. 
Ana Aguiar
181
Agricultura familiar: perceções e atitudes face ao uso de pesticidas. 
Telmo Costa, Cristina Amaro da Costa
185
Caracterização da agricultura familiar na região de Entre douro e Minho. 
Luísa Silva, Ana Aguiar
195
a metodologia Lean como ferramenta de avaliação da eficiência de 
explorações de agricultura familiar. 
Luisa Silva, Ana Aguiar, Cristina Parente, Cristina Amaro da Costa
199
“A azeitona e a fortuna: às vezes, muita; às vezes, nenhuma”: a saúde da mulher 
agricultora. 
Cláudia Chaves, Cristina Amaro da Costa, Andreia Martins, Maria C. Silva, 
Fábio Gomes, Emília Coutinho, Paula Nelas
209
“A foice em seara alheia”: pontes nas relações entre a saúde e a agricultura.
Cláudia Chaves, Cristina Amaro da Costa, Andreia Martins, Maria C. Silva, 
Fábio Gomes, Emília Coutinho, Rui Dionísio
215
CAPíTULO 5. POnTES EnTRE AgRiCULTURA fAMiLiAR E AgRiCULTURA BiOLÓgiCA 
reCoMeNdaçÕes a ParTIr de dINâMICas de aUsCULTação ParTICIPadas.
Cristina Parente (Coord.), Joana Neto, Ana Aguiar, Raquel Guiné, Daniela Costa, 
Helena Esteves Correia, Cláudia Chaves, Telmo Costa, Cristina Amaro da Costa
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PREâMBULO
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O rural e a agricultura: 
das ausências à geografia da esperança
Rui Jacinto
CEI, investigação e desenvolvimento.
O livro que se dá à estampa no âmbito da Coleção Iberografias culmina uma investi-
gação a que o CEI acabou por se associar quando elegeu como vencedor o projeto “Pontes 
entre agricultura familiar e agricultura biológica”, submetido por Cristina Amaro da Costa, 
doutorada em Engenharia Agrícola e Professora no Instituto Politécnico de Viseu, à edição 
de 2017 do Prémio CEI – Investigação, Inovação & Território [CEI – IIT]. Como refere o 
preâmbulo do regulamento, o Prémio representa um “compromisso do Centro de Estudos 
Ibéricos (CEI) com a cooperação, a difusão do conhecimento e os territórios fronteiriços 
e de baixa densidade”, espaços onde se têm registado “múltiplas iniciativas que envolvem 
instituições e investigadores de diferentes regiões e países que apostam num justo equilíbrio 
entre a investigação e a ação”. 
Ao “distinguir trabalhos, projetos de investigação e outras iniciativas que revistam uma 
dimensão inovadora”, o que se pretende é “divulgar estudos, experiências e boas práticas que 
concorram para reforçar a coesão, a cooperação e a competitividade daqueles territórios”. 
Os apoios proporcionados por este Prémio enquadram-se em duas modalidades: (i) patroci-
nar trabalhos e projetos de investigação sobre “territórios e sociedades em tempo de mudança” 
que apontem para temas como dinâmicas territoriais e iniciativas de desenvolvimento local, 
património, recursos do território e riscos naturais, coesão social (educação, saúde, com-
bate à pobreza e inclusão social) e governança, capacitação e modernização institucional; 
(ii) apoiar “projetos e iniciativas inovadoras, em territórios de baixa densidade” que apostem na 
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dinamização das economias e das sociedades e na coesão dos territórios de baixa densidade e 
que privilegiem áreas temáticas como a valorização e o uso eficiente dos recursos endógenos, 
as tecnologias ao serviço da qualidade de vida e a inovação territorial.
Dinâmicas territoriais e desenvolvimento rural. 
Os espaços rurais, particularmente os adjacentes à fronteira, são caracterizados por 
uma forte recessão agrícola e demográfica. O prolongado e inexorável êxodo a que esti-
veram expostos, além de acentuar as suas debilidades, vincou um abandono que gerou 
um progressivo envelhecimento, isolamento e uma ausência cada vez mais pesada. A crise 
demográfica que os atravessa transformou-se numa variável que importa levar em consi-
deração por se ter transformado numa condicionante capaz de hipotecar o futuro destas 
finisterras interiores.
Os espaços rurais, que passaram a ser designados, eufemisticamente, territórios de 
baixa densidade, têm na demografia um dos sinais mais visíveis e que melhor expressa as 
profundas assimetrias territoriais que, embora antigas e há décadas identificadas, acabaram 
por atingir proporções desmesuradas. As áreas de fronteira estão, deste ponto de vista, no 
olho do furacão, são o epicentro duma crise que transcende a demografia. Nos longínquos 
anos 40, quando este cenário já se vislumbrava, o escritor Virgílio Godinho apelidou estes 
espaços interiores de Calcanhar do Mundo; José Cardoso Pires, outro escritor natural 
duma região com problemas comuns ao deste interior profundo, São João do Peso, no 
concelho de Vila de Rei, publicou um testemunho, onde perspassa a mesma ideia: “Eu 
próprio, da minha terra natal tenho uma definição antiga e simplista: deserto de pedras, padres e 
pedintes – e uma imagem mais recente: Sicília abandonada, sol a pino, ruas vazias, e a marcar 
o tempo o martelar dum sapateiro num portal. Aldeia emigrada portanto” (Jornal do Fundão, 
3 de Fevereiro de 1974). 
O processo que nos trouxe até aqui é o resultado da confluência de múltiplas dinâmi-
cas que vêm de longe, potenciadas por tendências mais recentes, igualmente pesadas, onde 
relevam alguns momentos marcantes, tais como:
(i) o êxodo rural e a atração urbana, fenómeno persistente que ocorre com ritmos, 
destinos e intensidades, variáveis ao longo do último século, responsável pela con-
centração da população no litoral, nas áreas metropolitanas e nas capitais de distrito, 
fenómeno que no passado mais recente levou à polarização demográfica nas sedes 
de concelho; 
(ii) o surto emigratório ocorrido depois da Segunda Guerra Mundial, muito intenso 
nos anos 60, que veio reorientar o fluxo transatlântico para os países da Europa, 
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evidenciando tanto a nossa dependência no contexto europeu como a inserção na 
divisão internacional do trabalho; 
(iii) a crise internacional (1973), concomitante da mudança política ocorrida em 1974, 
e de subsequente queda do império, que fizeram abrandar a emigração internacional, 
sobretudo para os destinos então típicos (França e Alemanha), e o consequente 
retorno abrupto de um fluxo de mais de meio milhão de portugueses provenientes 
das ex-colónias;
(iv) a adesão à CEE (1986) e a tímida prosperidade, verificada nos anos imediatos 
que mudaram, paulatinamente, os fluxos migratórios, ao ponto de alterar o para-
digma, levando ao aparecimento dum novo discurso que anunciava que Portugal 
havia deixado de ser um país de emigração para se tornar num país de imigração;
(v) a apregoada globalização, que cavalgou os anos 90 e havia de invadir as primeiras 
décadas do século xxi, acabaria por desaguar na crise que se inicia em 2008 e 
na emergência dum novo surto emigratório, que atingiu um valor máximo em 
2013, quantitativamente semelhante ao que se havia verificado em 1969, embora 
qualitativamente distinto, por envolver predominantemente população jovem 
relativamente qualificada.
O impacto cumulativo de todos estes processos nas áreas rurais reforçou o abandono e 
aprofundou o sentimento real e simbólico de perda. Tais territórios acabaram,deste modo, 
ainda mais relegados para as margens dos nós da rede urbana e dos eixos que os ligam, 
afastando-os destes pólos e corredores que estruturam o desenvolvimento e organizam o 
território. Tais periferias sentem-se, assim, mais longe da vista e votadas a um esquecimento 
que lhes subtrai a mais ténue expetativa de sonho e de futuro, debilitando a já depauperada auto-
estima e reduzindo drasticamente o horizonte de esperança. Eduardo Lourenço, profundo 
conhecedor desta realidade e exemplo lapidar da incapacidade destes territórios reterem os 
seus talentos, já nos havia alertado para estes tempos de profundas mudanças quando escre-
veu, em 2001, que “nestas duas décadas não mudamos apenas de estatuto histórico-politico, 
de civilização e de ritos sociais que julgávamos, lamentando-o, característicos de uma sociedade 
quase marginal em relação aos padrões europeus. Mudamos, literalmente falando, e sem quase 
nos darmos conta disso, de mundo. Mudamos porque o mundo conheceu uma metamorfose sem 
precedentes, não apenas exterior, mas de fundo”. 
O saldo natural e o migratório negativos estão alinhados com outras variáveis 
socioeconómicas. Consonantes, são a ponta dum iceberg que representa uma situação 
difícil de contornar. O retrato frio e duro desenhado pelos indicadores demográficos 
e sócioeconómicos projeta uma geografia que deixa pouca liberdade a interpretações 
fora das dicotomias que balançam entre o preto e o cinzento carregado, onde o bran-
co dificilmente conquista alguma representação. A adjetivação de Interior e de rural 
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profundo, que se atribui a esta parcela do país assumiu com o tempo um significado 
ambivalente: se, por um lado, caracteriza dinâmicas e especificidades que lhes são ine-
rentes, por outro, confere a tais territórios uma conotação que os estigmatiza e ostraci-
za. O que se passou a designar por Interior é trespassado por tensões entre contrários: 
tradição e modernidade, continuidade e mudança, presença e ausência, realidades que 
coexistem e se confrontam num mesmo espaço, onde convive um passado a que se 
pretende fugir e um futuro que parece cada vez mais distante. Contudo, será estultícia 
ficcionar um discurso liminar de opostos que se opõem radicalmente, como por vezes 
ouvimos, que procura fomentar um otimismo aparente e infundado, quiçá, gratuito 
e contraproducente. Será porventura mais aconselhado e proveitoso recusar aquelas e 
outras dicotomias, sempre limitativas e redutoras, que oscilam entre irredutíveis pessimismos 
e irreais otimismos1. 
Pano de fundo: evolução estrutural do rural e da agricultura.
Os espaços rurais, como sabemos, são plurais e diversos, seja por influência das con-
dições naturais, da matriz edafoclimática ou das mudanças verificadas, onde o desapareci-
mento de funções tradicionais foi acompanhado da difusão nos campos de novos modos 
de vida. Tais mudanças alteraram os quadros de referência bem como os sentimentos de 
pertença, contributos decisivos para moldar uma nova identidade e alterar o conceito de 
rural tanto aos olhos internos como externos, seja de quem nele vive, de lá é oriundo ou 
aí chega de novo. O abandono demográfico e de algumas atividades ocorridas nos espaços 
rurais, mais evidente em certas regiões do país, é correlativo de mudanças estruturais e pro-
fundas operadas na agricultura, confirmadas por vários estudos e ao longo dos sucessivos 
Recenseamentos Agrícolas que foram sendo realizados2. 
1 Em algumas passagens retomou-se o artigo Calcanhar do mundo: da geografia das ausências à geografia da 
esperança publicado em 2015, na Revista Praça Velha, Revista Cultural da cidade da Guarda, CM Guarda, 
Ano XVII, Nº 35, 1ª série, novembro 2015, pp.: 243-260.
2 Segundo INE a primeira referência a um “levantamento” exaustivo, sistemático e organizado de dados 
estatísticos sobre a agricultura portuguesa foi o “Arrolamento Geral de Gados e Animais de Capoeira”, que 
remonta ao ano de 1934, arrolamentos que se repetiram em 1940 e em 1972. Ao longo deste período, no 
Continente, tiveram lugar outras operações igualmente importantes: Inquérito às Explorações Agrícolas 
do Continente (1952-54 e 1968) e os Recenseamento Agrícola do Continente (1979, 1989, 1999, 2009 
e 2019). Os últimos quatro Recenseamentos, que correspondem a levantamentos exaustivos e simultâneos 
em todas as regiões do país, ocorreram depois de adesão de Portugal à União Europeia; aguardam-se os 
resultados do Recenseamento de 2019 para se perceber o sentido e a profundidade das mudanças 
estruturais verificadas na última década.
(http://ra09.ine.pt/xportal/xmain?xpid=RA2009&xpgid=ra_historia)
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Os resultados dos Recenseamentos Agrícolas são lapidares sobre as profundas transfor-
mações verificadas na agricultura portuguesa, depois da segunda metade do século xx, mas, 
fundamentalmente, após a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, em 
1986. O INE reconhece que a adesão “levou a que o destino da nossa agricultura passasse 
a depender fortemente da Política Agrícola Comum (PAC). A partir de então, acelerou-se 
a transformação da estrutura e da orientação da agricultura portuguesa que perdeu defini-
tivamente a sua posição de principal atividade económica do país, que até então detinha”.
É referido no estudo do INE que estamos a seguir que “entre 1965/68 e 1999, a agricul-
tura portuguesa perdeu quase metade da sua mão-de-obra permanente” e o “número de explo-
rações agrícolas e a superfície agrícola utilizada reduziu-se drasticamente”; “entre 1952/54 e 
1999 desapareceram mais de 500 mil explorações agrícolas (mais de 50%) no Continente, 
quebra essa que se acentuou especialmente a partir de 1979”. A dimensão média das explo-
rações agrícolas, por outro lado, “aumentou quase para o dobro: passou de cerca de 5 ha 
para mais de 9 ha”. Assistiu-se, entretanto, “a uma mecanização crescente da agricultura, que 
passou a utilizar métodos de produção tecnicamente mais evoluídos, os quais permitiram 
obter ganhos de produtividade. Também se intensificou o consumo de certos fatores de 
produção como os adubos e os pesticidas, que apesar de permitirem aumentar a produtivi-
dade, agravou os problemas ligados à poluição e à preservação do meio ambiente”. O estudo 
referido trabalho salienta outros aspetos fundamentais, designadamente que “o número de 
tratores existentes nas explorações portuguesas quase que duplicou entre 1965/68 (pouco 
mais de 17 mil) e 1999 (quase 170 mil); “a ocupação cultural da terra também se alterou ao 
longo dos tempos: a terra arável, que em 1965/68 representava 77% da Superfície Agrícola 
Utilizada (SAU), passou a representar apenas 46% em 1999. Por outro lado, a superfície 
ocupada por pastagens permanentes aumentou mais de 5 vezes em igual período de tempo, 
de 7% para 36% da SAU”. Neste período, verifica-se “que as áreas de vinha e olival, culturas 
permanentes de grande significado e importância para o nosso país, se mantiveram estáveis 
ao longo do período de tempo considerado: em média, entre 1965/68 e 1999, o olival ocupou 
cerca de 44% da área de culturas permanentes e a vinha 33%”.
O Recenseamento Agrícola de 2009, o último disponível enquanto não forem conhe-
cidos os resultados do que foi realizado em 2019, fornece informação que destacada as 
principais variações ocorridas ao nível da estrutura das explorações agrícolas e dos sistemas 
produtivos praticados. Comparando os resultados de 2009 com os de 1999 destacam-se, 
sucintamente, alguns aspetos relevantes da evolução ocorrida na agricultura portuguesa:
(i) Explorações: “uma em cada quatro explorações agrícolas cessou atividade, mas a su-
perfície das explorações ainda ocupa metade do território nacional; as explorações 
de pequena dimensão continuam a predominar, mas 2/3 da Superfície Agrícola 
Utilizada (SAU) já é geridapor explorações de dimensão superior a 50 hectares 
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de SAU; aumento da SAU por exploração em mais de 2,5 hectares, passando em 
média de 9,3 hectares para cerca de 12 hectares, em resultado da absorção das super-
fícies das pequenas explorações pelas de maior dimensão; o número de sociedades 
agrícolas (empresas agrícolas) cresceu 23% e já exploram 27% da SAU”.
(ii) População agrícola: “a população agrícola familiar perde 443 mil indivíduos mas 
ainda representa 7% da população residente; as mulheres representam 1/3 dos 
produtores agrícolas e aumentam a sua importância em 8 pp.; a média de idades 
dos produtores agrícolas aumentou 4 anos”. 
(iii) As explorações portuguesas no contexto europeu: “as explorações agrícolas nacionais 
representam cerca de 3% das explorações e 2% da SAU da UE; a dimensão das 
explorações agrícolas em Portugal é, em média, 5 hectares inferior à da UE”.
O que se acaba de expor leva-nos ainda a três conclusões importantes: (i) “a paisagem 
agrícola alterou-se para sistemas de produção mais extensivos, com as pastagens perma-
nentes a ocuparem praticamente metade da Superfície Agrícola Utilizada”; (ii) “o produtor 
agrícola tipo é homem, tem 63 anos, apenas completou o 1º ciclo do ensino básico, tem 
formação agrícola exclusivamente prática e trabalha nas actividades agrícolas da exploração 
cerca de 22 horas por semana”; (iii) depois de mais de três décadas de Política Agrícola 
Comum (PAC) ainda nos debatemos com alguns problemas básicos, relacionados com a 
“problemática do auto-abastecimento, reflexo da dependência das importações, da volatili-
dade dos preços dos produtos agrícolas e da escalada dos preços dos factores de produção”3.
Os resultados que se aguardam correm o risco de cavar mais fundo e fornecer um 
retrato que já não se revela positivo.
Um estudo de caso: renascimento rural e desenvolvimento local. 
As adversidades que foram sucintamente enunciadas esboçam o pano de fundo onde se 
inscrevem as tendências mais pesadas comuns à generalidade dos espaços rurais, dificilmente 
contrariadas por dinâmicas positivas, demasiado leves, que aqui e ali se observam, incapazes 
de reverter o ciclo vicioso em que foram mergulhando. O apregoado renascimento do rural, 
que possa pontualmente ocorrer em determinados contextos locais, do centro e norte do 
Continente, acaba por ser demasiado ligeiro e, portanto, manifestamente insuficiente para 
contrariar a perda em que se encontram a generalidade daqueles territórios.
Perante semelhante realidade, adquire maior interesse e significado trabalhos como os 
elaborados no âmbito do projeto “Pontes entre agricultura familiar e agricultura biológica”. 
Desde logo porque estão focados na agricultura familiar e na preocupação “de garantir a 
3 INE, Recenseamento agrícola de 2009: análise dos principais resultados.
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produção agrícola, gerida por uma família com base em mão-de-obra familiar não assala-
riada, reunindo componentes de produção agrícola, animal, de transformação e florestal”. 
Temos de ter presente que, em Portugal, continuam a ter um papel fundamental nas zonas 
rurais, pois “a agricultura familiar representa 96% das cerca de 280 mil explorações existen-
tes no continente”4. Depois, porque prosseguem objetivos que não só são pertinentes como 
estão na ordem do dia5 ao pretenderem: “avaliar as potencialidades de inovação ao nível 
dos procedimentos técnicos e tecnológicos e identificar semelhanças (proximidade) com o 
modelo de itinerário técnico teórico adotado em agricultura biológica, os constrangimen-
tos técnicos, económicos e sociais que potenciem a transição para a agricultura biológica”; 
“contribuir para a criação de um modelo produtivo local economicamente mais eficiente 
alicerçado, quer na racionalização do trabalho agrícola e na valorização das práticas dos terri-
tórios, quer na produção de alimentos mais saudáveis e de melhor qualidade, na redução de 
impactos ambientais negativos, e na melhoria da qualidade de vida dos agricultores” (idem).
A importância destes trabalhos decorre ainda de funcionarem como um observatório 
das dinâmicas locais em espaço rural, permitindo identificar tendências emergentes, por 
vezes imperceptíveis, que funcionem como boas práticas que abrem janelas de oportuni-
dade potenciadoras do desenvolvimento local. Deixando de parte considerações sobre a 
orientação metodológica seguida, baseada num núcleo heterogéneo de informantes, releva 
entre os resultados alguns aspetos que merecem destaque: (i) constitui forte preocupação 
“a dimensão económica da agricultura familiar e a sua viabilidade enquanto atividade que 
assegure um rendimento adequado ao agricultor e à sua família”; (ii) importa “garantir a 
sustentabilidade económica das famílias, promovendo um processo de venda eficiente e 
4 In Resumo do Projeto “Pontes entre agricultura familiar e agricultura biológica”. (http://www.cei.pt/iit/projetos-
selecionados-2017.html)
5 O estatuto da pequena agricultura familiar é relativamente recente, tendo sido criado pelo Decreto-Lei 
nº 64/2018, de 07 de agosto de 2018 (Diário da República nº 151/2018) e regulamentado pela Portaria 
n.º 73/2019, de 7 de março. Para este efeito, entende-se por: 
a) «Agregado familiar», os cônjuges, os ascendentes e descendentes na linha reta em primeiro e segundo grau, os 
parentes por afinidade, os que vivam em união de facto, e os demais a cargo que vivam em situação de econo-
mia comum com o titular da exploração agrícola e participem na atividade da exploração de forma regular; 
b) «Agricultura familiar», o modo de organização de atividades produtivas, de gestão do ambiente e de suporte 
da vida social nos territórios rurais, assente numa exploração agrícola familiar; 
c) «Exploração agrícola familiar», a exploração agrícola em que a mão-de-obra familiar, medida em Unidade 
de Trabalho Ano, representa mais de 50 % da mão-de-obra total da exploração agrícola; 
d) «Mão-de-obra da exploração agrícola», o trabalho mobilizado na exploração agrícola, com origem na 
família ou no assalariamento (trabalhadores permanentes, eventuais ou não contratados diretamente pelo 
produtor);
e) «Mão-de-obra familiar», trabalho realizado pelo titular da exploração agrícola (produtor agrícola) e por 
membros do seu agregado familiar; 
f ) «Rendimento coletável», rendimento anual bruto, efetuadas as respetivas deduções específicas; 
g) «Unidade de Trabalho Ano (UTA)», unidade de medida da mão-de-obra correspondente ao trabalho 
realizado num ano por um trabalhador a tempo inteiro
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rentável e uma aproximação ao consumidor”; (iii) subsiste a preocupação sobre “à quali-
dade dos produtos e sustentabilidade ambiental da produção, a informação e formação 
dos agricultores familiares e o acompanhamento técnico dos processos de produção que 
estão na origem da necessidade de aproximar diversos atores do setor agrícola e colocá-los 
em cooperação para pugnarem e promoverem a integração e crescimento da agricultura 
familiar” (in capítulo conclusivo do estudo).
A publicação revisita temas que constituem uma agenda de debate e reflexão sobre o 
tipo de agricultura que subsiste em boa parte do centro e norte do Continente, desde os 
conceitos e práticas da agricultura familiar e agricultura biológica aos aspetos mais con-
cretos relacionados com o direito à alimentação e ao consumo, da relação que as pessoas 
estabelecem com o território; ao fim e ao cabo o que está em causa é a importância que tem 
e o papel que ainda cabe à agricultura familiar e à pequena agricultura no desenvolvimento 
e sustentabilidade dos espaços rurais.
Ou, como é referido nas conclusões, a partir da “observação da agricultura e dos ter-
ritórios ruraisdo Centro e Norte do país”, “facilitar a criação de ecossistemas de inovação 
que, integrando os pequenos produtores no processo e assegurando o estabelecimento 
de redes entre diferentes agentes de apoio, promovam a incorporação de modos de 
produção inovadores e sustentáveis, que originem alimentos mais seguros e saudáveis e 
com menos efeitos negativos no ambiente e que contribuam para o desenvolvimento 
económico local sustentável”.
Resta agradecer a todos os envolvidos no projeto e nos seminários que com os 
respetivos contributos ajudaram a viabilizar o livro Pontes entre Agricultura Familiar e 
Agricultura Biológica. 
A quem o coordenou e editou um especial Bem Haja!
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Pontes. E redes.
Cristina Amaro da Costa
Politécnico de Viseu, CERNAS, CI&DETS
Pontes. Ao longo destes dois anos de projeto, foram pontes que se construíram. E redes. 
Desde os agricultores, que aqui nos trouxeram, passando por todos os que ajudaram na 
construção, pelos que nos apoiaram e reconheceram (e particular o Centro de Estudos 
Ibérico, o Politécnico de Viseu e a Universidade do Porto), até aos que vieram conversar e 
ficaram para nos ouvir. A todos, bem hajam!
Estes dois anos de trabalho comum e participado permitiram estabelecer pontes entre 
a agricultura familiar e a agricultura biológica, e contribuir para uma maior adoção deste 
modo de produção. Partimos de uma reflexão teórica sobre a proximidade entre a realidade 
das práticas agrícolas da agricultura familiar e agricultura biológica, para propor práticas e 
recomendações ao nível das orientações de políticas públicas, que permitam aos agricultores 
familiares alcançar modos de produção mais sustentáveis e saudáveis. 
O que alcançamos foi partilhado em três seminários, com uma estrutura comum, mas 
enriquecida por diferentes oradores que em cada uma das ocasiões vieram trazer a sua ‘espe-
cial’ perspetiva – desde os conceitos, às práticas e ao papel económico, social e ambiental da 
agricultura familiar, com enfoque nos desafios, nos resultados que possamos atingir, e que 
traduzimos agora neste livro.
Começamos por tentar esboçar uma análise da realidade destes dois setores (agricultura 
familiar e agricultura biológica) discutindo conceitos, estatísticas e casos de boas práticas. 
Neste início, ficaram muitas questões em aberto: como contabilizar o valor da mão de obra 
ou do autoconsumo das explorações de agricultura familiar? como ultrapassar a resistência ao 
associativismo ou a menor produtividade destas explorações e calcular o valor do trabalho? 
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como assegurar que a agricultura biológica garante um conjunto de práticas agroecológicas 
e não é uma mera substituição de fatores de síntese por produtos biológicos, mantendo 
o modelo químico-mecânico? como assegurar a continuidade da agricultura familiar em 
paralelo com a sua existência legal/fiscal/real? 
Apesar de ser possível apontar múltiplos casos de sucesso, normalmente associados à 
capacitação técnica dos intervenientes, que encontram caminho em produtos de quali-
dade e diferenciados, que encontram apoios locais muito bem estruturados para resolver 
problemas de produção ou de comercialização, que se organizam em movimentos regio-
nais, a realidade é que grande parte dos agricultores familiares adotam práticas agrícolas 
que os colocam em risco a eles, a nós, e ao ambiente, já que é frequente ouvir que usam 
duas tampas de pesticida em vez de uma, ou fazem a calda a olho, que mobilizam o 
solo intensamente, para não terem ervas por ali, ou que usam a matéria orgânica sem 
ser devidamente compostada, facilitando a ocorrência de problemas de saúde graves. 
É também importante equacionar que esta é uma profissão de risco, desde a exposição 
às condições climáticas, à exigência física do trabalho, ao risco de exposição a pesticidas 
e agentes patogénicos presentes nestes ecossistemas.
Estes agricultores não são todos iguais, mas estão longe de nos disponibilizar produtos 
alimentares tradicionais e seguros, iguais aos dos nossos avós. Para alguns, a mudança será 
fácil, pois estão disponíveis para aprender; para outros, importa perceber novas dinâmicas 
que invertam o seu processo de resistência. 
Palavras como complementaridade, diversidade, escalonamento, qualidade, produção 
animal, biodiversidade e espécies regionais ou autóctones, devem coexistir nas discussões, 
projetos ou políticas que pretendam dinamizar estes agricultores
Mas mais importantes do que estas questões técnicas, são as questões sociais. Não se 
mudam sistemas sem mudar pessoas, seja por género, por escolaridade, por opção política. 
Se os homens são muitas vezes os decisores nas explorações, fazem-no a partir das perceções, 
do conhecimento e das opções das mulheres no seio da família. Se as opções são quase 
sempre económicas e associados ao risco que se aceita, outras vezes decorrem de formas de 
estar, de opções pela sustentabilidade, mas cada vez mais pela saúde – preocupação que é, 
em cada um de nós, cada vez maior.
E aqui surgem as políticas. As políticas que deviam ser feitas por pessoas e para as 
pessoas. As políticas que precisam interiorizar, para além dos modelos técnicos, os mode-
los sociais. As políticas que, quase sempre em prol do desenvolvimento e da economia, 
têm consequências, em particular nos grupos sociais mais frágeis, como é o caso de tantos 
pequenos agricultores. 
Os desafios que aqui se colocam são diversos, e o que hoje é uma realidade, foi em 
tempos uma dificuldade. Principalmente, porque aquilo que definimos para a mudança 
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carece de ir de encontro aos desejos económicos do agricultor, à necessidade de minimização 
do risco, às alterações do trabalho, às suas características sociais, o que nem sempre é fácil 
de conciliar com práticas de agroecologia ou com a adesão a inovações.
A verdade é que o rural vai continuar. Está, hoje, num processo de transformação, 
pelo que teremos de encarar a inevitabilidade da baixa densidade, aceitar o repovoamen-
to, aceitar a relevância das economias locais e refazer, no tecido rural de baixa densidade, 
um tecido económico social sustentável com, por exemplo, atividades associadas a novas 
procuras urbanas.
Isto passa sobretudo pelas políticas públicas. E por isso, depois da assinatura da Carta 
do fortalecimento da agricultura familiar, do Estatuto da agricultura familiar, da criação do 
Conselho de Segurança Alimentar e Nutrição, da decisão de uma Década da Agricultura 
Familiar, o tema deste seminário é, consensualmente pertinente, sendo de todo o interesse que 
os seus resultados possam refletir-se na atual discussão da PAC, possibilitando o redesenho 
com opções de carácter regional, onde o apoio à agricultura familiar é, entre outros, central.
É, neste sentido, que nos propusemos, com todos, a preparar este documento final, 
resultante dos três seminários, que possa disponibilizar aos atores políticos, nacionais e 
regionais, aos técnicos e investigadores, à sociedade em geral, um conjunto de recomendações 
e, esperemos, algumas soluções, que contribuam para melhorar o desempenho e o resultado da 
agricultura familiar através, entre outras, da adoção de princípios de agroecologia e de práticas 
agrícolas sustentáveis. 
CAPÍTULO 1
AgriculturA fAmiliAr e AgriculturA 
biológicA: conceitos e práticAs
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Agricultura familiar e agricultura biológica: 
conceitos e práticas
Helena Esteves Correia
Daniela Costa
Politécnico de Viseu, CERNAS, CI&DETS
A agricultura familiarbaseia-se num modelo agrícola organizado e praticado por pro-
prietários rurais de modo a garantir a produção agrícola, gerido por uma família com base 
em mão-de-obra familiar não assalariada, assumindo um papel importante e fundamental 
nas zonas rurais.
A agricultura familiar, pelas suas caraterísticas próprias, assume, de forma mais ou 
menos declarada, os princípios que norteiam a agricultura biológica: princípio da saúde, 
da ecologia, da justiça e da precaução (FAO, 2014; IFOAM, 2016).
Em dezembro de 2011, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou 2014 como 
o Ano Internacional da Agricultura Familiar e em 2018 entrou em vigor em Portugal, 
o Estatuto da agricultura familiar. 
O desenvolvimento de explorações em agricultura familiar pode passar pela adoção de 
modos de produção como a agricultura biológica, assente em princípios como alimentar 
o solo, otimizar os ciclos de nutrientes através da gestão dos animais e plantas no espaço e 
tempo ou manter relações de proximidade com o mercado, de forma a garantir qualidade 
dos produtos e a assegurar a melhoria dos rendimentos das famílias. 
Importa, por isso, discutir os conceitos associados a estas temáticas, em particular 
associados à realidade da agricultura familiar, às questões sociais, económicas e ambientais 
associadas, ao direito humano à alimentação e à utilização de práticas agrícolas sustentáveis 
e da agricultura biológica, bem como ouvir e aprender com exemplos de sucesso e de boas 
práticas. 
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referências
FAO (2014). 2014 International Year of Family Farming - Feeding the world, caring for the earth. 
Food and Agriculture Organization of the United Nations.
IFOAM (2016). Princípios da agricultura biológica. IFOAM, Bonn: 4p. https://www.ifoam.bio/
sites/default/files/poa_portuguese_web.pdf
CONCEITOS
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Agricultura familiar e biológica: 
modelos tecnológicos e dinâmicas
Pedro Reis
Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária
Ao longo das últimas décadas ocorreram alterações substanciais no setor agrícola e 
nas sociedades das zonas rurais, tanto nas estruturas agrárias, como ao nível da compe-
titividade das empresas agrícolas. No entanto, a agricultura familiar, resistiu e persiste 
com um peso muito relevante: em 2010, 93% das explorações agrícolas (EA) podiam ser 
classificadas como EA familiares, o trabalho familiar representa 81% do trabalho agrícola, 
em unidades de trabalho ano (UTA), e estas explorações detinham cerca de metade da 
área agrícola e florestal, assim como da produção agrícola (em valor da produção pa-
drão) (Cordovil e Rolo, 2014). Vários fatores contribuíram para essa grande capacidade 
de resistência e de adaptação, nomeadamente: a) as racionalidades económicas das EA 
familiares, onde o fator trabalho nem sempre é valorizado a preços de mercado, tornando 
viáveis unidades de produção não competitivas; b) a articulação dos membros do agregado 
familiar com os mercados de trabalho (salários da indústria e nos serviços) e com as transfe-
rências dos regimes de proteção social (as pensões e reformas) ou remessas de emigrantes; 
c) os avanços tecnológicos (ao nível dos inputs variáveis, das inovações e equipamentos de 
menor escala) e organizativos do funcionamento da exploração, como é o caso do recurso 
à externalização de serviços na EA (Baptista, 1993; Baptista e Rolo, 2017). 
A agricultura familiar está fortemente associada à pluriatividade e ao plurirrendimento. 
Apenas 13,9% da população agrícola familiar ativa (PAFA) trabalha a tempo completo na 
EA, e um terço desta PAFA tem uma atividade exterior à exploração agrícola (INE, 2017). 
Relativamente aos rendimentos constata-se que em 78,8% das explorações agrícolas fami-
liares, mais de 50% do rendimento do agregado doméstico do produtor provém de fora da 
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EA, das quais, em 43,2% dos casos, são maioritariamente pensões ou reformas (Baptista 
e Rolo, 2017). 
A agricultura familiar é um componente muito importante na segurança alimentar e 
nutricional e no debate da soberania alimentar, apesar deste último estar muito mitigado 
pela existência de uma política agrícola comum. Anote-se que em cerca de um quinto das 
EA familiares, mais de 50% da produção tem como destino o autoconsumo, que compara 
com apenas 1% nas outras EA (Reis e Rolo, 2019). Acresce àquela importância, a presença 
nas EA das superfícies designadas por “hortas familiares” e os circuitos curtos agroalimen-
tares (CCA). Estes potenciam o consumo de uma maior diversidade de alimentos (frutas 
e hortícolas da época) e possibilidade de acesso a esses produtos com menor dispêndio 
monetário por parte dos consumidores. Os bens produzidos nas “hortas familiares” e em 
outras terras de cultivo da EA, e os CCA são também pontes potenciais entre a agricultura 
familiar e a agricultura biológica.
Antes de nos focarmos nas pontes, analisemos os cruzamentos entre “agricultura fami-
liar” e “agricultura biológica”. Num trabalho recente, apurou-se que apenas 0,1% das EA 
familiares praticavam agricultura biológica, enquanto esse mesmo indicador era de 6,7% 
para as EA não familiares (Reis e Rolo, 2019). Relativamente às áreas, esses valores eram, 
respetivamente, 1,6% e 3,6%. Estes dados indiciam uma maior adesão da agricultura 
não familiar à agricultura biológica. No entanto, duas ressalvas. Face à maior exigência 
de mão-de-obra deste modo de produção, é provável que algumas EA com estrutura e 
lógica de funcionamento similar à agricultura familiar, passem a ser classificadas em “não 
familiares”, se o trabalho passar a ser predominantemente assalariado. Outro fator, a ter 
em consideração, é que apenas cerca de 20% da área em agricultura biológica se destina 
à produção de bens para a alimentação humana. A grande fatia corresponde a pastagens 
permanentes (70%), forragens e pousios (10%).
Referimos “agricultura biológica”, mas importa salientar que este termo encerra dois 
modelos tecnológicos distintos, que iremos explicar recorrendo à produtividade do trabalho. 
Antes, refira-se que o aumento deste indicador é o objetivo primordial do desenvolvimento 
agrícola, pois corresponde a um aumento da remuneração do trabalho (mais rendimento para 
as famílias) e permite libertar recursos humanos para todas as outras atividades (p.e. serviços 
de saúde, educação). A produtividade do trabalho (output/UTA), pode ser decomposta em 
dois fatores: capacidade de trabalho (ha/UTA) e produtividade da terra (output/ha). A 
capacidade de trabalho pode ser incrementada através da mecanização, e agora também 
com a automatização, robotização, e todas as novas tecnologias que vão substituindo o 
trabalho humano. Em relação à produtividade da terra, assistiu-se, através do modelo 
químico-mecânico, à introdução de produtos de síntese para substituir, ou suplementar, 
processos naturais: adubos químicos para fornecer nutrientes às plantas, herbicidas para 
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controlo das designadas infestantes, e uma diversidade de inseticidas e fungicidas para 
combater pragas e doenças das plantas. Na produção biológica não utilizamos estes produ-
tos de síntese mas podem-se seguir duas vias distintas. Uma é sustentar o sistema de produção 
nos processos biológicos do agrossistema, na sua biodiversidade e nos ciclos adaptados às 
condições locais. A outra via, é manter o modelo químico-mecânico, mas substituindo os 
inputs de síntese por inputs de origem biológica, cumprindo os critérios especificados nos 
regulamentos de aplicação da agricultura biológica, para efeitos de certificação dos produtos. 
Para o consumidor de bens alimentares, pode ser indiferente o modelo tecnológico,mas é 
relevante na vertente social e ambiental. 
A agricultura familiar tem um papel muito relevante na conservação e valorização de 
variedades tradicionais (p.e. milho, maçãs, feijão e oliveira) e de raças autóctones (p.e. 
bovinos) (Reis e Rolo, 2017). Esta ligação potencia as pontes entre a agricultura familiar e 
a agricultura biológica, tanto pelo serviço prestado à sociedade na conservação do patri-
mónio genético único, como essa biodiversidade constituiu também um suporte para a 
produção biológica.
O maior peso da agricultura biológica na agricultura não familiar está associado a vários 
fatores: maior capacidade técnica e aproveitamento de economias de escala, tanto ao nível 
de máquinas e equipamentos, como de área de intervenção, importante por exemplo na 
luta biológica; maior capacidade de adesão às medidas agroambientais, como por exemplo, 
o enrelvamento nas entrelinhas; acréscimo das necessidades de mão-de-obra que têm de 
ser satisfeitas pela contratação de assalariados ou prestação de serviços. Acresce ainda, o 
mercado de consumo, sobretudo junto dos consumidores com maior poder de compra 
e preferência por estes produtos diferenciados. Atualmente, as grandes empresas do setor 
agroalimentar apostam nestes produtos em resposta à procura para não perderem mercado.
As dinâmicas do mercado não favorecem a produção biológica nas unidades de agri-
cultura familiar por questões de mercado e de tecnologia. Os pequenos produtores têm 
dificuldades de colocar os produtos na grande distribuição, onde começam a abundar os 
produtos biológicos. Os produtos de síntese são mais acessíveis aos pequenos produtores 
(disponibilidade e custo) e mais fáceis de aplicar. Pelo lado da tecnologia é mais exigente 
em conhecimento, em economias de escala e mão-de-obra. Mas, apesar destas dinâmicas 
tendenciais impulsionadas pelo funcionamento dos mercados, existem casos de sucesso, 
com bom desempenho, associados a jovens empreendedores, com atividades de pequena 
transformação e grande foco no consumidor e no marketing. 
As pontes entre a agricultura familiar e a agricultura biológica têm de ser dinamizadas 
através de políticas públicas e assentes na mobilização dos agentes interessados. As políti-
cas públicas têm de veicular os benefícios para a sociedade e para as gerações futuras. No 
tocante à mobilização social é crucial ter consciência da sua relevância, sobretudo quando 
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se verifica o menor grau de associativismo da agricultura familiar. Esta mobilização tem de 
ser ao nível dos vários agentes, desde os produtores porque têm de ganhar competências 
técnicas e participar no incremento do capital social, até aos consumidores que devem ser 
mais esclarecidos e estarem predispostos a pagar um preço mais justo por estes produtos.
Referências
Baptista FO (1993). Agricultura, Espaço e Sociedade Rural. Coimbra, Fora do Texto.
Baptista FO, Rolo JC (2017). Trabalho agrícola: percursos e modelos. Cultivar, Cadernos de 
Análise e Prospetiva 10, 25-37.
Cordovil F, Rolo JC (2014). Agricultura Familiar em Portugal. Esboço da sua importância e diversidade 
no limiar da década de 2010. Revista “emRede” 5, 13-21.
INE (2017). Inquérito à Estrutura das Explorações Agrícolas 2016. INE, Lisboa.
Reis P, Rolo JC (2019). A agricultura familiar em Portugal (no prelo).
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Agricultura familiar e agricultura biológica: 
conceitos
Isabel Mourão
Centro de Investigação de Montanha, Escola Superior Agrária de Ponte de Lima,
Instituto Politécnico de Viana do Castelo
Muitos dos atuais sistemas de produção de alimentos comprometem a capacidade 
da Terra para produzir alimentos no futuro. A crescente escassez de recursos naturais e 
perda de biodiversidade, o acréscimo da população (particularmente urbana), as alterações 
climáticas e as mudanças no consumo e valores éticos, representam enormes desafios, não 
só para a cadeia alimentar, mas também para a estabilidade global e prosperidade, pois 
podem agravar a pobreza e destabilizar a economia (Freibauer, 2011). Para tornar o sistema 
agroalimentar mais resistente em tempos de crescente instabilidade e incerteza, é inevitável 
uma mudança radical no consumo e na produção de alimentos, incluindo na Europa. 
O ano de 2018 foi profícuo na produção de importantes documentos relativos a questões 
fundamentais, salientando-se os seguintes:
 – Estatuto da Agricultura Familiar, Decreto-Lei 64/2018 de 7 de agosto;
 – Regulamento (UE) 2018/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo à 
produção biológica e à rotulagem dos produtos biológicos (EU, 2018);
 – Relatório Especial sobre o Aquecimento Global de 1,5°C, do Painel Internacional 
para as Alterações Climáticas (IPCC, 2018);
 – Relatório sobre Economia Circular e Bioeconomia, da Agência Europeia do Ambiente 
(EEA, 2018).
A estes documentos, podem ainda adicionar-se os seguintes:
 – Estratégia Nacional para a Agricultura Biológica, Resolução do Conselho de 
Ministros 110/2017 (ENAB, 2017);
 – Programa geral de ação da União Europeia para 2020 em matéria de ambiente 
“Viver bem, dentro dos limites do nosso planeta”, Decisão nº 1386/2013/UE do 
Parlamento Europeu e do Conselho (UE, 2013); 
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 – Guia sobre Desenvolvimento Sustentável - 17 objetivos para transformar o mundo, 
enunciados pela Assembleia Geral das Nações Unidas (UNRIC, 2016).
Nestes documentos destacamos os princípios que se relacionam com os conceitos de 
agricultura familiar (AF) e de agricultura biológica (AB).
a) No Estatuto da Agricultura Familiar (Decreto-Lei 64/2018)
Definição de “Agricultura familiar”: “o modo de organização de atividades produtivas, 
de gestão do ambiente e de suporte da vida social nos territórios rurais, assente numa exploração 
agrícola familiar.
Com efeito, as atividades da agricultura, da produção animal, da floresta, da caça, da pesca, bem 
como as atividades dos serviços que estão diretamente relacionados com a AF são determinantes 
em grande parte do território nacional. Estas atividades assumem, assim, relevância na produção, 
no emprego, na biodiversidade e na preservação do ambiente através, nomeadamente, do incentivo 
à produção e ao consumo locais, que por sua vez minimizam as perdas e o desperdício alimentares, 
garantindo também uma presença em muitas áreas do interior, o que torna imperiosa a promoção 
de políticas públicas que reconheçam e potenciem essa contribuição da AF.
O debate e a reflexão efetuados em Portugal permitiram um conhecimento mais aprofundado 
sobre a AF, sendo de salientar os indicadores de maior relevo, a saber, cerca de 242,5 mil explo-
rações agrícolas classificam-se como familiares, o que representa 94% do total das explorações, 
54% da Superfície Agrícola Utilizada e mais de 80% do trabalho total agrícola.” 
Em todos os países desenvolvidos ou em desenvolvimento, a AF é a forma predomi-
nante de agricultura no sector de produção de alimentos e está intimamente vinculada à 
segurança alimentar mundial (FAO, 2014).
b) No Regulamento relativo à produção biológica (EU, 2018)
“A produção biológica é um sistema global de gestão das explorações agrícolas e de 
produção de géneros alimentícios que combina as melhores práticas em matéria ambiental 
e climática, um elevado nível de biodiversidade, a preservação dos recursos naturais e a 
aplicação de normas exigentes em matéria de bem-estar dos animais e de normas exigentes 
em matéria de produção em sintonia com a procura, por parte de um número crescente 
de consumidores de produtos produzidos através da utilização de substâncias e processos 
naturais. A produção biológica desempenha, assim, uma dupla função social: por um 
lado, abastece um mercado específico que responde à procura de produtos biológicos por35
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parte dos consumidores e, por outro, fornece bens disponíveis para o público em geral que 
contribuem para a proteção do ambiente e do bem-estar dos animais, bem como para o 
desenvolvimento rural.”
Os custos colaterais da AB, relacionados com a erosão dos solos, a poluição da água 
e a morte da vida selvagem, são estimados em cerca de um terço dos custos causados pela 
agricultura convencional (Niggli et al., 2008).
c) No Relatório especial sobre o Aquecimento Global de 1,5°C e no 
Guia sobre o Desenvolvimento Sustentável 
Os impactos do aquecimento global de 1,5°C e de 2,0°C foram divulgados pelo Painel 
Internacional para as Alterações Climáticas (IPCC, 2018), num relatório especial sobre as 
graves consequências se ações fundamentais e imediatas não forem tomadas pelos governos 
e pela comunidade internacional. Estima-se que as atividades humanas tenham causado 
até 2017, aproximadamente, 1,0 ± 0,2°C de Aquecimento Global acima dos níveis pré-
-industriais e, atualmente, está a aumentar 0,2 ± 0,1°C por década, devendo chegar a 
1,5°C em 2040, se o Aquecimento Global continuar a aumentar à taxa atual.
As opções de mitigação consistentes com as vias da meta 1,5°C estão associadas a 
múltiplas sinergias e trade-offs (relações de compromisso), com os 17 Objetivos de 
Desenvolvimento Sustentável (UNRIC, 2016). Estes objetivos aplicam-se a toda a huma-
nidade e os países deverão mobilizar esforços para acabar com todas as formas de pobreza, 
reduzir as desigualdades e combater as alterações climáticas, garantindo que “ninguém seja 
deixado para trás”. 
O importante papel da agricultura ao nível global tem tido uma pesada contrapartida 
de emissão de gases com efeito de estufa (GEE). Em 2010, ao nível global, foram estima-
dos cerca de 24% para as atividades de agricultura, florestas e outros usos do solo, valor 
que representa quase um quarto do total das emissões de todas as atividades económicas 
no Mundo (IPCC, 2014). 
O contributo da AB para atenuar as alterações climáticas é muito importante, 
estimando-se uma diminuição da emissão de CO2 de 48% a 60% (FAO, 2007; Rodale, 
2011), principalmente devido à não utilização de fertilizantes minerais de síntese quími-
ca. Se todos os sistemas agrícolas fossem conduzidos em AB, com exclusão da produção, 
transporte e aplicação destes fertilizantes, particularmente de azoto, haveria uma redu-
ção na emissão de GEE em cerca de 10-20% devido a uma redução de emissão de N2O 
e mais cerca de 10% por menor utilização de energia com libertação de CO2 (Niggli et 
al., 2009).
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d) No Programa geral de ação da União Europeia para 2020 em matéria 
de ambiente e no Relatório sobre Economia Circular e Bioeconomia
Os objetivos do Programa geral de ação da União Europeia para 2020 em matéria de 
ambiente – “Viver bem, dentro dos limites do planeta” (UE, 2013), foram orientados pela 
seguinte visão a longo prazo: “Em 2050, vivemos bem, dentro dos limites ecológicos do pla-
neta. A nossa prosperidade e a sanidade do nosso ambiente resultam de uma economia circular 
inovadora em que nada se desperdiça e em que os recursos naturais são geridos de forma susten-
tável e a biodiversidade é protegida, valorizada e recuperada, de modo a reforçar a resiliência 
da nossa sociedade. O nosso crescimento hipocarbónico foi há muito dissociado da utilização dos 
recursos, marcando o ritmo para uma sociedade global segura e sustentável.”
A transição para uma economia mais circular, em que o valor dos produtos, materiais 
e recursos se mantém na economia o máximo de tempo possível e a produção de resíduos 
se reduz ao mínimo, é um contributo fundamental para desenvolver uma economia 
sustentável, hipocarbónica, eficiente em termos de recursos e competitiva (UE, 2015).
Hoje, é relevante a perspetiva integrada e sistémica para otimizar o uso de produtos 
de base biológica e o uso sustentável de recursos naturais renováveis (bioeconomia circular 
sustentável), uma vez que a circularidade pode ajudar a reduzir a competição por recursos 
terrestres e aquáticos e, assim, contribuir para a mitigação das alterações climáticas e da 
perda de biodiversidade (EEA, 2018).
e) A agricultura familiar e a agricultura biológica também se integram 
na crescente agricultura urbana
Em meados do séc. xx, 30% da população mundial vivia em áreas urbanas, pas-
sando para mais de metade em 2018 (55%) e estimando-se que aumente para 68% 
até 2050 (ONU, 2018). A sustentabilidade das cidades, a capacidade de atraírem ati-
vidades económicas e oportunidades e de garantirem o bem-estar dos seus cidadãos, 
está comprometida, entre outros desafios, pelo acréscimo da população urbana e pelas 
alterações climáticas, o que justifica que a “Resiliência da Cidade” integre os Objetivos 
de Desenvolvimento Sustentável (UNRIC, 2016), tornando-se numa questão essencial 
a nível global. As cidades devem caminhar para uma maior interação com a natureza, 
aproveitando todas as oportunidades para inserir a natureza e favorecer o contato das 
pessoas com os elementos naturais, através de uma infra-estrutura ecológica de ligação 
da cidade ao território, que ofereça serviços ambientais e sociais (Artmann et al., 2017; 
Mourão et al., 2019). 
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A agricultura urbana cumpre estes requisitos (Mougeot, 2015), é essencialmente uma 
agricultura familiar e deve ser biológica. A prática da AB em hortas urbanas é altamente 
recomendável, devido à necessidade de respeitar e preservar os ecossistemas e de ser um 
sistema adequado de produção de alimentos, promovendo uma alimentação saudável. 
Estes benefícios são amplamente reconhecidos, sendo bons exemplos de hortas biológicas, 
a rede de hortas urbanas de Barcelona (Simon-Rojo et al., 2016), as hortas comunitárias 
urbanas em Wisconsin, EUA (Ghose e Pettygrove, 2014) e, em Portugal, as hortas urbanas 
do Parque da Devesa, em V. N. de Famalicão, as hortas comunitárias e terapêuticas do 
Parque José Avides de Moreira, no Porto, e as redes de hortas comunitárias, sociais, peda-
gógicas e associativas, no Porto, promovidas pelo Serviço Intermunicipalizado de Gestão 
de Resíduos do Grande Porto (Lipor) ou em Cascais, promovidas pela Empresa Municipal 
de Ambiente de Cascais (EMAC). As hortas urbanas devem ser implementadas não ape-
nas para os cidadãos comuns, mas também para fins de horticultura social e terapêutica, 
através de programas destinados a idosos, pessoas com deficiência ou dependentes, e em 
diversas situações de reabilitação psicossocial ou inclusão social (Mourão e Brito, 2013).
Em síntese, importa considerar o papel da AF na preservação dos alimentos tradicio-
nais, no contributo para uma alimentação mais equilibrada, na proteção da agrobiodiversi-
dade, no uso mais sustentável dos recursos naturais, representando ainda uma oportunidade 
para impulsionar as economias locais (FAO, 2014), se conjugada com a produção biológica 
(ENAB, 2017), é lícito afirmar a sua importância e o caminho seguro que representa. A 
sustentabilidade da AB baseia-se ainda em estratégias como: a diversificação (multiactivi-
dades/usos/ funcionalidades, como serviços e comércio); a diferenciação (certificação, raças 
e cultivares autóctones, tradições); a verticalização (transformação e distribuição próprias) 
e, a eficiência (gestão profissional, conhecimento, tecnologia), amplamente compatíveis 
com a AF. Por fim, a AB oferece uma maior garantia de alimentar o mundo no futuro, por 
permitir uma maior preservação a longo prazo dos recursos naturais, contribuindo para um 
crescimento económico e desenvolvimento social mais sustentáveis (Sendim, 2011).
Referências
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UNRIC (2016). Guia sobre Desenvolvimento Sustentável – 17 objetivos para transformar o nosso 
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PRÁTICAS
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PROVE – Promover e Vender
José Sousa Guedes
Ader-Sousa – Associação de Desenvolvimento Rural das Terras do Sousa
O PROVE é uma metodologia de comercialização direta e de proximidade, que, esta-
belecendo circuitos curtos de comercialização entre agricultores e consumidores, promove 
a venda de produtos pelo produtor ao consumidor, num raio de 60 km, e contribui para o 
escoamento de produtos locais, fomentando as relações de proximidade entre quem produz 
e quem consome, recorrendo às tecnologias de informação e comunicação.
Esta metodologia está direcionada para pequenos produtores, isto é, com pequenas áreas 
de produção e que têm dificuldade em colocar os seus produtos ou mesmo que nunca tenham 
experimentado a venda das suas produções, ou ainda, que tiveram más experiências com interme-
diários, verificando que o risco ficava com ele e que o maior rendimento ficava com os últimos.
O PROVE foi “desenhado” pela Adrepes – Associação para o Desenvolvimento Rural da 
Península de Setúbal, que tem a sua área de intervenção na Península de Setúbal, mais concre-
tamente nos concelhos de Palmela e Sesimbra. Ao abrigo da EQUAL – Iniciativa Comunitária 
para o período de programação dos Fundos Estruturais entre 2000 e 2006, esta Associação de-
senvolveu um manual muito prático, que depois experimentou e aperfeiçoou, com a colaboração 
da Ader-Sousa e da Monte, também associações de desenvolvimento local, a primeira do Norte e 
a segunda do Sul de Portugal, de forma a testar diferentes realidades. A definição da metodologia, 
para além de ter ido “beber” experiências a França e Espanha, foi desenvolvida em parceira com 
outras entidades, produtores e consumidores. Entretanto o PROVE tem sido disseminado por 
vários territórios de Portugal, com o apoio de outras associações de desenvolvimento local.
O PROVE veio dar solução à afirmação de uma produtora da península de Setúbal 
“Produzir todos sabemos; comercializar o que produzimos é mais difícil”. No entanto, essa 
afirmação engloba uma problemática mais complexa que se observa nos territórios:
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•	 Pequenos produtores agrícolas/agricultores familiares com:
 ű historial familiar ligado à agricultura / baixa autoestima,
 ű produções desajustadas,
 ű reduzida iniciativa económica/empreendedorismo,
 ű parcos conhecimentos de gestão, marketing e comercialização,
 ű inexistência de relação com os consumidores,
 ű deficiente leitura do mercado.
•	 Desvalorização da atividade agrícola por parte das populações locais;
•	 Consumidores que desconhecem as vantagens de adquirir produtos locais através 
de processos de comercialização de proximidade;
•	 Estruturas de comercialização locais desajustadas à realidade produtiva do território.
A solução encontrada passa pela constituição de núcleos de pequenos agriculto-
res, normalmente compostos por três / quatro elementos (mas pode ser um só) que, 
todas as semanas, reúnem as suas produções, previamente acordadas, preparam o cabaz 
de hortofrutícolas e entregam diretamente ao consumidor final, sem a interferência 
de intermediários.
O agricultor passa a ser um empresário, dono de um negócio que começa na produção 
agrícola e termina na venda direta ao consumidor.
O cabaz tem a seguinteconstituição: base de sopa, salada, fruta e aromáticas. É cons-
tituído por diversos produtos diferentes, que respeitam os ciclos da natureza, pelo que tem 
menor variedade no Inverno, que é “compensada” no Verão.
Há cabazes grandes e pequenos, para responder a diferentes famílias e a sua entrega pode 
ser semanal ou quinzenal, também para responder ao consumo dos clientes.
Vantagens para os produtores:
•	 Valor justo pelo trabalho;
•	 Pagamento no ato da venda;
•	 Produção consoante as necessidades (menor desperdício);
•	 Escoamento dos produtos assegurado;
•	 Relação com o consumidor e reconhecimento da atividade;
•	 Desenvolvimento de novas capacidades;
•	 Maior diversidade de produtos, o que permite um melhor controlo de pragas 
e doenças;
•	 Possibilidade de escoar outros produtos extra cabaz (ex.: ovos, marmelada, vinho, 
flores, compotas, pão, bolachas, etc).
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Vantagens dos consumidores:
•	 Reeducação dos hábitos alimentares;
•	 Consumo de novos produtos;
•	 “Os produtos têm uma voz”;
•	 Aquisição de produtos com maior frescura e durabilidade;
•	 Possibilidade de visitar as explorações;
•	 Possibilidade de adquirir outros produtos extra cabaz;
•	 Estabelecimento de relação de confiança com o produtor.
A título de exemplo apresenta-se o cálculo do possível rendimento de um núcleo constituído 
por 5 produtores:
•	 Cabazes vendidos por semana – 100
•	 Preço dos cabazes – 12,50€
•	 Resultado – 1250€ / semana
•	 Após retirar cerca de 150€ para despesas correntes, resultam 1.000€ / 5 produto-
res = 220€ * 4 semanas = 880€ / mês para cada produtor.
•	 Como é óbvio isto é um pequeno exercício, existindo actualmente núcleos que 
vendem mais de 250 cabazes / semana.
O primeiro contato entre os consumidores e produtores é, normalmente, feito através 
de uma inscrição no site do PROVE (www.prove.com.pt/encomendas), onde escolhe o 
distrito onde vive, verifica se algum dos locais de entrega lhe satisfaz, preenche a ficha onde 
para além do tipo, n.º e periodicidade de cabaz, escolhe no máximo 5 produtos que nunca 
quer receber (porque não gosta, é alérgico, etc). No dia, hora e local de entrega vai recolher 
o cabaz e inicia o contato com o produtor.
O sucesso do PROVE pode ser avaliado a partir do número de núcleos de produtores, 
explorações agrícolas e consumidores envolvidos, bem como pelo volume de produção 
comercializado (Tabela 1).
Tabela 1
Resultados do PROVE a Outubro de 2018
RESULTADOS
Quantidade Núcleos de produtores 117
Explorações agrícolas 132
Locais de entrega 158
Consumidores 4890
Toneladas comercializadas semanalmente 39
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O PROVE tem sido reconhecido por várias entidades, de onde se destacam: 
•	 “Projeto do mês Fevereiro 2011” pela Rede Rural Europeia;
•	 “Iniciativa de Elevado Potencial de Empreendedorismo Social” pelo Instituto de 
Empreendedorismo Social;
•	 “Iniciativa Exemplo de Boas Práticas” pelo Observatório para a Sustentabilidade 
Metropolitana da Área Metropolitana de Lisboa;
•	 1.º lugar na categoria “Apoio ao desenvolvimento de mercados ecológicos e à eficiên-
cia dos recursos”, na X Edição dos Prémios Europeus de Promoção Empresarial 
(European Enterprise Promotion Awards);
•	 Projeto selecionado pelo INHERIT como prática europeia de produção sustentável 
e consumo saudável e sustentável.
“…o contacto directo com os clientes é bastante compensador…
cria-se uma família…só isso é espectacular!” – produtor PROVE.
Referências
Bandeiras C, Costa C, Calheiros JP, Alvarez L, Sampaio M, Alter M (2009). PROVE – Contributo para 
um Processo Territorial de Proximidade. ADREPES, Quinta do Anjo, 166p. http://www.portugalglobal.
pt/PT/RoadShow/Documents/2016/Santarem_PROVE-Contributo-para-um-Processo-Territorial-de-
Proximidade.pdf
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O que fazer para aproximar a agricultura 
familiar da agricultura biológica
Ângelo Rocha
Quinta da Comenda/BeiraBio
1 – A agricultura biológica incorpora a seguinte premissa incontornável: a não utilização 
de adubos químicos e a não aplicação de pesticidas sintéticos em quaisquer quantidades ou 
circunstâncias. Independentemente de outras características e práticas culturais, é aquela 
premissa que distingue a Agricultura Biológica (AB).
2 – Na agricultura familiar verifica-se uma utilização generalizada dos adubos quími-
cos e de diversos pesticidas sintéticos (quer sejam fungicidas, inseticidas ou herbicidas). 
Tal facto pode ser facilmente comprovado com as enormes quantidades de vendas destes 
produtos nas lojas da especialidade das localidades do interior do país e que se dedicam 
quase exclusivamente a clientes de agricultura familiar (os produtores profissionais adqui-
rem os seus produtos diretamente a distribuidores especializados que dispõem de condições 
mais favoráveis do que as lojas de venda a retalho).
3 – A agricultura familiar é assim definida como uma agricultura convencional com 
menores dimensões, menos intensiva, menos profissional.
4 – Existe uma tendência para considerar a AF próxima da AB, mas tal não se verifica 
na grande maioria das situações.
5 – O que fazer para aproximar a agricultura familiar da agricultura biológica:
– implementar uma verdadeira política de promoção da AB
– divulgar e informar sobre a prática da AB (de forma acessível e simples)
– disponibilizar produtos permitidos em AB de forma generalizada
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A Segurança alimentar, do ponto de vista da agricultura 
familiar e biológica, como um caminho de cura do 
nosso planeta
Liliana Pinto
Agrinemus
Agrinemus nasceu em 2008 na cidade rural de Castelo de Paiva, numa propriedade de 
família, como um projeto de agricultura biológica de pequena escala movido pela premência 
da cura do nosso planeta utilizando os princípios da agricultura biológica, os saberes locais 
e as sabedorias ancestrais (ex. orientação astrológica da lua).
O incremento da biodiversidade da exploração agrícola sempre foi, e ainda é, um dos 
principais objetivos do projeto. Entendemos que a conservação e aumento da biodiver-
sidade deve ser feito localmente pelo agricultor com as plantas mais adaptadas ao local 
que serão à partida as mais resilientes. Privilegiamos a utilização de sementes regionais/ 
/locais bem como árvores de fruto, por exemplo. Acompanhamos como sócios e guardiões 
de sementes o trabalho da Associação Colher para Semear que se encontra numa fase 
de reestruturação. 
A produção biológica teve início com a instalação de um pomar de variedades regio-
nais de macieiras e pereiras que neste momento está em fase de diversificação para outras 
fruteiras: no entanto, foi sempre reservado um espaço para horta de subsistência, que 
cresceu no últimos 3 anos, e outras culturas anuais. Foi nestes espaços que se começou a 
produzir a semente, o tremoço, cultivado nesta região há muitos anos...
Em 2010 iniciou-se a transformação de produtos agrícolas em modo produção bioló-
gico, nomeadamente o tremoço pronto a consumir com ervas aromáticas e posteriormente 
picante. A unidade de transformação desta bela leguminosa tradicional portuguesa foi 
ampliada em 2018, bem como a sua equipa de trabalho e os seus produtos! 
Desde 2014, os princípios da permacultura complementaram as práticas já imple-
mentadas na exploração, permitindo uma visão mais holistica de como curar o nosso 
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planeta abrangendo preocupações que vão para além do trabalho da terra, como o cuidar 
das pessoas e partilhar de forma justa os recursos, os saberes, as vivências, isto é, como 
criar uma sociedade mais solidária e amiga da natureza.
Desde 2012, o

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