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Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB TOLERÂNCIA E AUTOIMUNIDADE. Tolerância imunológica = a não responsividade a um antígeno, conseguida por meio da exposição prévia ao mesmo. - Formas diferentes de um mesmo antígeno podem levar à resposta imunológica ou à tolerância. Os antígenos que induzem a tolerância são chamados de tolerógenos. - Um único antígeno pode ser um imunógeno ou um tolerógeno, dependendo da forma como é apresentado aos linfócitos específicos, seja na presença ou na ausência, respectivamente, de inflamação e respostas imunológicas inatas. Autotolerância: Tolerânca à antígenos próprios. -Indivíduos normais são tolerantes aos seus próprios antígenos porque os linfócitos responsáveis pelo reconhecimento dos autoantígenos estão eliminados ou inativados, ou a especificidade destes linfócitos encontra‑se alterada; -A tolerância resulta do reconhecimento dos antígenos por linfócitos específicos; -A autotolerância pode ser induzida em linfócitos autorreativos imaturos nos órgãos linfoides centrais (tolerância central) ou em linfócitos maduros em locais periféricos (tolerância periférica); -A tolerância central ocorre durante um estágio de maturação dos linfócitos, no qual o encontro com um antígeno pode levar à morte celular ou à substituição de um receptor de antígeno autorreativo por outro que não apresente esta condição; -A tolerância periférica desencadeia‑se quando linfócitos maduros reconhecem autoantígenos e morrem por apoptose ou quando se tornam incapazes de serem ativados pela reexposição àquele antígeno; -A tolerância periférica também é mantida pelas células T regulatórias (Treg) que suprimem ativamente os linfócitos autoantígeno‑específicos; -Alguns autoantígenos são sequestrados do sistema imunológico e outros antígenos são ignorados; -Antígenos externos, na ausência de sinais coestimulatórios, podem inibir as respostas imunológicas por meio da indução da tolerância em linfócitos específicos; -A indução da tolerância imunológica foi explorada como abordagem terapêutica para a prevenção de respostas imunológicas prejudiciais. -Ainda não se sabe quais autoantígenos induzem tolerância central ou periférica (ou quais são ignorados). E mais importante, ainda não se sabe quais mecanismos de tolerância podem falhar nas doenças autoimunes humanas mais comuns; isso permanece como um desafio principal no entendimento da autoimunidade. Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB TOLERÂNCIA DOS LINFÓCITOS T -A tolerância dos linfócitos T auxiliares CD4+ é uma forma eficaz de prevenir tanto as respostas imunológicas mediadas por células quanto as respostas imunológicas humorais a antígenos proteicos, uma vez que as células T auxiliares são indutores necessários a todas essas respostas; - Sabe‑se menos sobre tolerância periférica em células T CD8+; Tolerância Central da Célula T -Células T imaturas que reconhecem antígenos com grande avidez são deletadas e algumas das células sobreviventes na linhagem CD4+ transformam‑se em células T regulatórias. -Questões que realmente são relevantes para a seleção negativa: (1) quais são os autoantígenos presentes no timo e (2) de que forma as células T imaturas que reconhecem esses antígenos são deletadas; -Antígenos no timo: incluem muitas proteínas circulantes e proteínas associadas a células; -Proteína reguladora autoimune (AIRE) – expressão de antígenos de tecidos periféricos Mutações no gene AIRE são a causa de uma doença autoimune que afeta diversos órgãos, chamada de síndrome poliglandular autoimune tipo 1; Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB Tolerância Periférica da Célula T -Mecanismos: (1) anergia (não responsividade funcional), (2) supressão pelas células T regulatórias e (3) deleção (morte celular); ANERGIA: exposição ao antígeno na ausência de coestimulação. Células não morrem, mas não se tornam responsivas. A anergia resulta de alterações bioquímicas que reduzem a habilidade dos linfócitos em responder aos sinais de seus receptores de antígenos; -A célula T torna-se não responsiva ao antígeno por: -Bloqueio na sinalização do complexo TCR: resultado do recrutamento de fosfatases para o complexo TCR ou da ativação de ubiquitina ligases (Ex: Cbl‑b) que degradam proteínas de sinalização. -Envolvimento de receptores inibitórios: CTLA‑4: assim como o receptor de ativação CD28, liga‑se às moléculas B7 Ação: (1) A expressão do CTLA‑4 é baixa na maioria das células T até que as mesmas sejam ativadas por um antígeno, uma vez expresso, o CTLA‑4 termina a ativação contínua dessas células T responsivas; (2) é expresso nas células T regulatórias, mediando a função supressiva dessas células por meio da inibição da ativação de células imaturas Mecanismos: (1) Bloqueio de sinalização (ativação de fosfatases, que removem fosfatos das moléculas de sinalização associadas ao TCR e ao CD28, terminando então as respostas); (2) Redução da disponibilidade de B7 (impede B7 de se ligar ao CD28; Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB CTLA‑4 também captura e faz endocitose das moléculas B7, reduzindo a expressão destas nas APCs); PD‑1: reconhece dois ligantes, conhecidos como PD‑L1 (expresso nas APCs e em muitas células de outros tecidos) e PD‑L2 (se expressa principalmente nas APCs) O PD‑1 inibe as respostas das células T à estimulação por antígeno, provavelmente mediante indução de sinais inibitórios nas células T. SUPRESSÃO PELAS CÉLULAS T REGULATÓRIAS: Linfócitos T controlando respostas de outros linfócitos. -A maioria desses linfócitos T regulatórios CD4+ expressam altos níveis da cadeia α do receptor de IL‑2, denominada CD25; -Fator de transcrição FoxP3 é crítico para o desenvolvimento e função da maioria das células T regulatórias; -LTreg presentam baixos níveis de expressão de receptores de IL‑7 e expressam níveis altos de CTLA‑4; -A produção de algumas células T regulatórias necessita de TGF‑β; -A IL‑2 ativa o fator de transcrição STAT5, que pode aumentar a expressão de FoxP3, assim como outros genes que estão envolvidos na função das células T regulatórias; -LTreg suprimem respostas imunológicas em múltiplos estágios – na indução da ativação da célula T nos órgãos linfoides, assim como na fase efetora dessas respostas nos tecidos. Também podem suprimir diretamente a ativação das células B e inibir a proliferação e diferenciação de células NK; -Mecanismos de supressão: -Produção das citocinas imunossupressoras IL‑10 (inibidor de macrófagos ativados e células dendríticas; inibe a expressão de coestimuladores e moléculas de MHC classe II) e TGF‑β (controle das respostas imunológica e inflamatória; diferenciação de diferentes subtipos funcionais de células T; estimula a produção de anticorpos IgA; reparo tecidual após o término da reação imunológica); -Habilidade reduzida das APCs em estimularem as células T (ex: CTLA-4/B7); -Consumo de IL‑2; DELEÇÃO DE CÉLULAS T VIA MORTE CELULAR POR APOPTOSE: Linfócitos T que reconhecem autoantígenos com alta afinidade ou que são estimulados repetidamente por antígenos podem morrer por apoptose. -Vias principais da apoptose: Intrínseca e Extrínseca; -Via intrínseca ou mitocondrial: -Regulada pela família de proteínas Bcl‑2; -Proteínas citoplasmáticas da família Bcl‑2, que pertencem à Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB subfamília BH3 (ex: Bim em linfócitos)que são ativadas por privação de fator de crescimento, estímulos nocivos, dano ao DNA ou certos tipos de sinalização mediada por receptor; -Bim se liga a duas proteínas efetoras pró-apoptóticas da família Bcl‑2, chamadas Bax e Bak se inserem na membrana mitocondrial externa, aumentando a permeabilidade Como resultado, muitos componentes mitocondriais, incluindo o citocromo c, vazam da mitocôndria para dentro do citosol Essas proteínas ativam as enzimas citossólicas chamadas caspases, inicialmente a caspase‑9 por sua vez, cliva as caspases que estão abaixo na cascata essas caspases levam à fragmentação do DNA e a outras alterações culminando na morte celular por apoptose. -Via extrínseca ou via do receptor de morte celular: -Receptores de superfície da célula (homólogos aos receptores de fator de necrose tumoral – TNF) são ativados por seus ligantes, que são homólogos ao TNF ativam proteínas adaptadoras citoplasmáticas recrutam a pró‑caspase‑8 quando oligomerizada, a pró‑caspase‑8 sofre autoclivagem, produzindo caspase‑8 ativa A caspase‑8 ativa cliva outras caspases da cascata resultando em apoptose. *Em muitos tipos celulares, a caspase‑8 cliva e ativa uma proteína BH3, chamada Bid, que se liga às proteínas Bax e Bak, induzindo apoptose pela via mitocondrial. Portanto, a via mitocondrial pode servir para amplificar a sinalização da via do receptor de morte celular. -Células T que reconhecem autoantígenos na ausência de coestimulação podem ativar a proteína Bim, resultando em apoptose pela via mitocondrial; -A estimulação repetida das células T resulta na coexpressão de receptores de morte celular (Fas) e seus ligantes (FasL), e a ativação dos receptores de morte celular leva à morte por apoptose. -LT CD8: Anergia; Receptores inibitórios como o PD‑1 (processo de exaustão); Inibição por LTreg (inibir diretamente a ativação de células T CD8+ ou suprimir células auxiliares CD4+, que são necessárias para respostas completas das células T CD8+); Fatores que Determinam a Tolerogenicidade de Autoantígenos Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB -A natureza da célula dendrítica que apresenta antígenos para os linfócitos T é um determinante importante da resposta subsequente. TOLERÂNCIA DOS LINFÓCITOS B É necessária para manter a não responsividade dos autoantígenos timo‑independentes. Também desempenha papel na prevenção de respostas dos anticorpos a antígenos de proteínas. Tolerância Central da Célula B -Linfócitos B imaturos que reconhecem autoantígenos na medula óssea com alta afinidade mudam sua especificidade ou são deletados; -Edição de receptores: células B reativam seus genes RAG1 e RAG2 e iniciam uma nova rodada de recombinação VJ no lócus do gene da cadeia leve da imunoglobulina (Ig) κ. -Deleção: Se a edição falhar, as células B imaturas podem morrer por apoptose. -Anergia: Se células B em desenvolvimento reconhecerem autoantígenos fracamente, as células se tornam anérgicas. Tolerância Periférica da Célula B -Linfócitos B maduros que reconhecem autoantígenos em tecidos periféricos na ausência de células T auxiliares específicas podem ser considerados funcionalmente não responsivos ou podem morrer por apoptose; -O reconhecimento de antígeno sem estímulos adicionais resulta em tolerância; -Mecanismos: -Anergia: células B autorreativas que são estimuladas repetidamente por autoantígenos tornam‑se não responsivas a ativações subsequentes. requerem níveis altos de fator de crescimento BAFF/BLys e não podem competir eficientemente pela sobrevivência com células B imaturas normais (menos dependentes de BAFF) nos folículos linfoides. -Deleção: células B podem ser eliminadas ativamente por meio da interação do FasL de células T auxiliares com o Fas de células B ativadas. -Sinalização através de receptores inibitórios: Células B que reconhecem autoantígenos com baixa afinidade podem ser impedidas de responder através do acoplamento de vários receptores inibitórios (limiar para ativação da célula B). TOLERÂNCIA INDUZIDA POR ANTÍGENOS PROTEICOS EXTERNOS Antígenos externos podem ser administrados de maneira que induzam, preferencialmente, a tolerância em detrimento das respostas imunológicas (antígenos administradas sem adjuvantes; administração oral). Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB AUTOIMUNIDADE -Paul Ehrlich (1990): Horror autotóxico; Questões fundamentais a respeito da autoimunidade: (1) como a autotolerância falha; (2) de que forma os linfócitos autorreativos são ativados. -Os fatores que contribuem para o desenvolvimento da autoimunidade são a suscetibilidade genética e os gatilhos ambientais, como infecções e lesão local no tecido. Características Gerais das Doenças Autoimunes -Doenças autoimunes podem ser sistêmicas ou órgão‑específicas; -Vários mecanismos efetores são responsáveis pela lesão do tecido em diferentes doenças autoimunes; -Doenças autoimunes tendem a ser crônicas, progressivas e de autoperpetuação; -Propagação de epítopo: uma resposta iniciada contra um autoantígeno que lesiona tecidos pode resultar na liberação e alteração de outros antígenos teciduais, na ativação de linfócitos específicos para esses outros antígenos e na exacerbação da doença; Anormalidades Imunológicas que Levam à Autoimunidade Autoimunidade resulta da combinação de algumas das três aberrações imunológicas principais: (1) Tolerância ou regulação defeituosas: Defeitos em seleção negativa; número e função de linfócitos T regulatórios; apoptose de linfócitos autorreativos maduros; função de receptores inibitórios; (2) Apresentação anormal de autoantígenos: expressão aumentada e persistência, ou alterações estruturais nesses antígenos, resultantes de modificações enzimáticas ou de estresse ou lesão celular; (3) Inflamação ou resposta imunológica inata inicial: talvez pela ativação das APCs, que se sobrepõem aos mecanismos regulatórios, resultando em ativação excessiva da célula T. -Papel das células T na autoimunidade: (1) células T auxiliares são reguladores‑chave de todas as respostas imunológicas às proteínas e muitos autoantígenos implicados nas doenças autoimunes são proteínas; (2) diversas doenças autoimunes estão geneticamente ligadas ao MHC; Bases Genéticas da Autoimunidade -Doenças autoimunes têm um componente genético muito forte; -Genes agem em conjunto com os fatores ambientais para causarem as doenças; Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB -Dentre os genes que estão associados à autoimunidade, as associações mais fortes são com os genes MHC (na maioria dessas doenças, o lócus do HLA sozinho contribui com metade ou mais da suscetibilidade genética); Imunologia Básica e Clínica Thomás R. Campos | Medicina - UFOB Papel das Infecções na Autoimunidade -Infecções virais e bacterianas podem contribuir para o desenvolvimento e exacerbação da autoimunidade; -O surgimento das doenças autoimunes frequentemente está associado a infecções ou é precedido pelas mesmas; Infecções podem promover autoimunidade por dois mecanismos principais: (1) Ativação das APCs: Microrganismos podem ativar as APCs para que expressem coestimuladores; quando essas APCs apresentam autoantígenos, as células T autorreativas são ativadas em vez de se tornarem tolerantes; (2) Mimetismo molecular: Alguns antígenos microbianos podem apresentar reação cruzada com autoantígenos; Outros Fatores na Autoimunidade Fatores,além de suscetibilidade genética e infecções: -Alterações anatômicas em tecidos, causadas por inflamação (possivelmente secundárias a infecções), lesão isquêmica ou trauma, podem levar à exposição de autoantígenos que normalmente são ocultados do sistema imunológico; -Influências hormonais têm papel em algumas doenças autoimunes; As doenças autoimunes estão entre os problemas científicos e clínicos mais desafiadores em Imunologia. O conhecimento atual dos mecanismos patogênicos permanece incompleto, então, teorias e hipóteses são mais numerosas que fatos. Espera‑se que a aplicação de novas tecnologias e o conhecimento sobre autotolerância (que avança rapidamente) levem a respostas mais claras e definitivas sobre os enigmas da autoimunidade.
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