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Jurisprudência - Justa Causa para desfiliação 2

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PODER JUDICIÁRIO 
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO DISTRITO FEDERAL 
 
ACÓRDÃO Nº 2954 
 
Classe : 24 – Petição 
Num. Processo : 153 
Requerente : Aylton Gomes Martins, deputado distrital licenciado 
Advogados : Bruno Franco Lacerda Martins – OAB/DF Nº 22.762 e outra 
Requerido : Partido da Mobilização Nacional – PMN 
Relator : Juiz Josaphá Francisco dos Santos 
 
EMENTA 
 
AÇÃO DECLARATÓRIA DE JUSTA CAUSA – 
IMPROCEDÊNCIA. 
1. Embora não seja a hipótese de mudança substancial do 
programa partidário, aliança com grupo rival, liderado por quem 
paira a forte suspeita de corrupção, demonstra a infidelidade da 
agremiação, tornando justificável a desfiliação. Precedentes do 
TRE/AC e do TRE/PR. 
2. Descaracteriza a justa causa para a desfiliação se o autor se 
filia a partido político que, posteriormente, vem a alinhar-se 
politicamente com o grupo rival. 
3. Julgou-se improcedente a ação 
 
Acordam os juízes do TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL , 
JOSAPHÁ FRANCISCO DOS SANTOS - relator, RAUL SABOIA , JOÃO EGMONT 
LEÔNCIO LOPES , LUCIANO VASCONCELLOS , HILTON QUEIROZ e MARIO 
MACHADO - vogais, em julgar improcedente a Petição 153, nos termos do voto do 
relator. Decisão UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e as notas 
taquigráficas. 
 
Brasília (DF), em 30 de junho de 2010. 
 
 
 
Desembargador JOÃO MARIOSI 
Presidente 
 
 
 
Juiz JOSAPHÁ FRANCISCO DOS SANTOS 
Relator 
 
 
 
RENATO BRILL DE GÓES 
Procurador Regional Eleitoral 
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico de 
09 de 07 de 2010, fls. 1/2 
Acórdão nº 2954 (Petição nº 153) fl. 2 
RELATÓRIO 
 
Aylton Gomes Martins ajuizou ação declaratória de justa causa 
de desfiliação partidária, na forma da Res. 22.610/07-TSE, alegando, em síntese, 
que desejava justificar sua desfiliação do Partido da Mobilização Nacional – PMN, 
tendo em vista a mudança de posicionamento político da agremiação, que passou a 
fazer oposição ao grupo político que governava o DF, sendo que tal situação poderia 
“gerar a ocorrência de grave discriminação pessoal”. 
O PMN foi devidamente citado, porém não apresentou defesa 
(fls. 77/79). 
Foi indeferido o pedido de tutela antecipada, embora o relator 
tenha constatado a verossimilhança dos fatos narrados na inicial (fls. 60/61). 
O Ministério Público Eleitoral opinou pela improcedência da 
ação declaratória, pois a alteração de apoio político não caracterizaria mudança 
programática (fls. 84/90). 
Em face da conexão com a Petição 157, na qual Olair 
Francisco requereu fosse declarada a perda de mandato de Aylton Gomes Martins, 
os feitos foram reunidos, consoante decisão de fls. 109/114. 
É, em síntese, o relatório. 
 
 
HOUVE SUSTENTAÇÃO ORAL POR PARTE DO SENHOR ADVOGADO 
BRUNO FRANCO LACERDA MARTINS – OAB/DF Nº 22.752, 
PATRONO DO REQUERENTE 
 
 
VOTOS 
 
O Senhor Juiz JOSAPHÁ FRANCISCO DOS SANTOS - 
relator: 
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da 
ação. 
Aylton Gomes Martins, em 2006, foi candidato a deputado 
distrital pelo Partido da Mobilização Nacional – PMN, que, naquela oportunidade, 
decidiu apoiar a coligação majoritária do PFL, tendo como chapa José Roberto 
Arruda e Paulo Octávio (fls. 20/23). 
O requerente foi eleito, bem como a chapa majoritária para 
governar o DF. 
Em 22/6/09, o Deputado Distrital Aylton Gomes foi nomeado 
pelo então Governador Arruda para ser o Administrador Regional de Planaltina, 
obtendo licença da Câmara Legislativa do DF para assumir o cargo no Poder 
Executivo (fl. 26). 
Desse modo, está evidente que o requerente tinha ligação 
política com o grupo que governava o DF. 
Acórdão nº 2954 (Petição nº 153) fl. 3 
Ressalta-se que, à época, os escândalos envolvendo o GDF 
ainda não haviam sido deflagrados pela operação Caixa de Pandora, o que somente 
ocorreu em 27/11/09. Portanto, é possível concluir que o grupo político, apoiado pelo 
PMN e do qual fazia parte o requerente, provavelmente tentaria se manter no poder. 
Paralelamente, o ex-Governador Joaquim Roriz não obteve 
apoio político de sua agremiação para se lançar candidato ao GDF, pois o PMDB 
local apoiava a reeleição do então Governador Arruda. Em razão disso, Roriz 
passou a procurar uma legenda para levar a efeito a sua pretensão de voltar a 
governar o DF. 
Enquanto isso, no PMN, houve uma manifestação contra a 
atitude da Secretária-Geral do partido, Thelma Ribeiro, que passou o comando da 
agremiação regional para um grupo liderado pelo ex-Governador Joaquim Roriz. 
O fato foi noticiado pelo Jornal de Brasília (fl. 46), datado de 
18/9/09, que antecipou que Luiz Cláudio Freire de Souza França, presidente regional 
da agremiação, seria destituído para dar lugar à deputada Jaqueline Roriz, filha do 
ex-governador Joaquim Roriz, vejamos: 
“Ele [França] afirma que a guerra não está perdida. França garante 
que não deixará a legenda. ‘Se Roriz perdeu o PMDB, vai levar 
apenas metade do PMN’, provocou. Para ele, a atitude do comando 
nacional da legenda enfraquece a democracia e a imagem dos 
partidos e dos líderes partidários, que já não é das melhores. 
O partido ficou dividido e foi pego de surpresa com a notícia […]. 
Mais moderado, o distrital Pedro do Ovo (PMN) confirma o mal-estar 
causado na legenda. Ele disse ter sido pego de surpresa e ainda não 
sabe como será o futuro do PMN. Mas garante que a situação atual 
não deverá perdurar muito tempo e também considera o fato uma 
‘traição’. 
Os manifestantes divulgaram nota afirmando que a manifestação 
aconteceu contra ‘uma intervenção autoritária e suspeita’. 
‘Indignados com o fato, no calor da manifestação, levaram uma 
bezerra vestida com pano dourado, fazendo uma clara alusão ao 
episódio que levou à renúncia do então senador Joaquim Roriz em 
2007’, afirma a nota.” 
Naquele mesmo jornal, foram reproduzidas as críticas de 
Aylton Gomes contra a intervenção na legenda: 
“O PMN virou uma legenda de aluguel. Foi à venda, para atender 
interesses estranhos aos que defendíamos.” 
Portanto, houve uma mudança da direção partidária, decisão 
que não contou com a participação de seus filiados, nem do parlamentar Aylton 
Gomes, de modo que, de fato, houve alteração substancial de orientação política do 
PMN no sentido de acolher realmente um grupo opositor cuja pretensão seria 
concorrer ao GDF. 
A propósito, conforme anotam Gilmar Mendes, Paulo Branco e 
Inocêncio Coelho1, as decisões partidárias devem ser democráticas, com consultas 
aos filiados, não se justificando as arbitrariedades cometidas em nome da autonomia 
partidária: 
 
1 Curso de direito constitucional. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 769. 
Acórdão nº 2954 (Petição nº 153) fl. 4 
“A autonomia organizatória não há de realizar-se com o sacrifício de 
referenciais democráticos. A função de mediação e de formação da 
vontade impõe que o partido assegure plena participação a seus 
membros nos processos decisórios. Não poderá o partido adotar, em 
nome da autonomia e da liberdade de organização, princípios que se 
revelem afrontosos à idéia de democracia, ou, como observa 
Canotilho, a democracia de partidos postula a democracia no 
partido.” (grifos do original) 
Ademais, ressalta-se que os manifestantes do próprio PMN 
alegaram que a legenda havia sido comprada por esse grupo político liderado pelo 
ex-Governador Joaquim Roriz, que renunciou ao Senado para escapar de eventual 
cassação. 
Portanto, em princípio, não estaria caracterizado o rompimento 
da affectio societatis pelo autor, mas o PMN teria sido infiel com os filiados contrários 
à mudança da orientação política. 
Quer dizer, embora não seja a hipótese de mudança 
substancial do programa partidário, aliança com grupo rival,liderado por quem paira 
a forte suspeita de corrupção, demonstra a infidelidade da agremiação, tornando 
justificável a desfiliação. 
Nesse sentido: 
“1. Parlamentar que se elegeu com discurso de situação e que 
mantém, ao longo de vários mandatos, atuação parlamentar 
situacionista, tem a liberdade e o direito de manter-se fiel ao 
eleitorado que o associa a tal discurso. 
2. A mudança brusca da orientação política de um partido, que passa 
da situação à oposição, contrariando seu discurso de longa data, 
autoriza a desfiliação do parlamentar que deseja manter-se coerente 
ao seu passado e discurso situacionista.” (TRE/AC - PETIÇÃO nº 
190, Acórdão nº 1796/2009 de 30/09/2009, Relator(a) JAIR ARAÚJO 
FACUNDES, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Volume 
-, Tomo 158, Data 02/10/2009, Página 03) 
“Comprovado o desvio do programa ou a mudança substancial do 
ideário partidário, notadamente quando o Partido deixa de prestar 
apoio ao Executivo Estadual e passa a defender posicionamento 
contrário à referida administração, resta configurada a existência de 
justa causa para migração partidária.” (TRE/AC – PETIÇÃO nº 189, 
Acórdão nº 1794/2009 de 30/09/2009, Relator(a) DENISE CASTELO 
BONFIM, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Volume -, 
Tomo 158, Data 02/10/2009, Página 02) 
“Ao acolher novos filiados, dentre estes o prefeito municipal e 
vereadores que o apóiam, aos quais fazia oposição, o partido se 
desvia do rumo, altera sua linha partidária local e discrimina os 
antigos filiados, que não concordando com a mudança, nem com a 
chegada dos novos, estão legitimados a sair para buscar espaço em 
outra agremiação, cujos ideais lhes pareçam mais apropriados.” 
(TRE-PR – REQUERIMENTO nº 1378, Acórdão nº 33.061 de 
27/05/2008, Relator(a) GILBERTO FERREIRA, Publicação: DJ - 
Diário de justiça, Data 4/6/2008 ) 
Ocorre que o requerente, Aylton Gomes, filiou-se ao Partido da 
República – PR, que, em maio deste ano, passou a apoiar a candidatura de Joaquim 
Acórdão nº 2954 (Petição nº 153) fl. 5 
Roriz ao GDF. Essa notícia encontra-se na página eletrônica do Ministério do 
Planejamento2, tendo como fonte o Correio Braziliense: 
“O ex-governador Joaquim Roriz (PSC) conseguiu o aval do PR, 
partido do deputado Jofran Frejat, para tê-lo como vice na chapa 
para a disputa eleitoral de outubro.” 
Na página eletrônica de Joaquim Roriz3, comemora-se a 
adesão do PR: 
“A oficialização da aliança entre o Partido da República (PR) e o 
Partido Social Cristão (PSC) que tem o ex-governador Joaquim Roriz 
como presidente de honra não ficou só na palavra. Na noite de 
ontem (17/05/10), o PR recebeu Roriz para oficializar esse apoio no 
auditório do Colégio Inei (606 Norte), local que ficou pequeno para 
abrigar mais de 1,5 mil pessoas que foram lá prestigiar a aliança que 
há uma semana foi aprovada por unanimidade.” 
Assim, o atual partido do requerente passou a apoiar o ex-
Governador Joaquim Roriz, de modo que é lícito concluir que sua desfiliação do 
PMN não se deu por causa da mudança da orientação partidária. 
Deve-se ressaltar que o requerente não informou a este Juízo 
que seu atual partido também debandou para o grupo político que supostamente lhe 
era contrário. 
Desse modo, considero que os fatos narrados na inicial não 
causaram constrangimentos ao requerente, a ponto de caracterizar justa causa para 
a desfiliação. 
Portanto, tenho que o pedido deve ser julgado improcedente, 
porém, sem perda do mandato. 
É que, conforme já decidido por este Tribunal, a ação de perda 
de mandato (PET 157) foi extinta sem julgamento do mérito, ante a ilegitimidade da 
parte, transcorrendo in albis o prazo previsto no art. 1º, § 2º, da Res. 22.610/07-TSE, 
para que os eventuais interessados pudessem ajuizar a ação. 
A propósito, embora o TSE tenha assentado que a ação de 
perda de mandato tem natureza dúplice (Agravo Regimental na Petição 2778, 
Relator Min. Marcelo Ribeiro), aquela eg. Corte, em precedente também da relatoria 
do Min. Marcelo Ribeiro (Petição 2812), julgou improcedente ação de justa causa e 
não aplicou a pena de cassação do mandato. 
Ademais, o PMN foi devidamente citado, porém não 
apresentou defesa e, consequentemente, não reivindicou o mandato. Desse modo, 
ainda que se considere a ação declaratória de justa causa de natureza dúplice, 
porquanto a ausência de justa causa é justamente o fundamento da perda do 
mandato, não há pedido para esse fim. 
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de justa 
causa. 
É como voto. 
 
 
2 https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/5/8/roriz-fecha-alianca-com-o-pr/ 
3 http://www.joaquimroriz.com.br/noticias/roriz-noticias/187-pr-comemora-alianca-com-psc-e-roriz 
Acórdão nº 2954 (Petição nº 153) fl. 6 
O Senhor Juiz RAUL SABOIA - vogal: 
Acompanho o relator. 
 
 
O Senhor Juiz JOÃO EGMONT LEÔNCIO LOPES - vogal: 
Acompanho o relator. 
 
 
O Senhor Juiz LUCIANO VASCONCELLOS - vogal: 
Acompanho o relator. 
 
 
O Senhor Desembargador Federal HILTON QUEIROZ - 
vogal: 
Acompanho o relator. 
 
 
O Senhor Desembargador MARIO MACHADO - vogal: 
Acompanho o relator. 
 
 
DECISÃO 
 
Julgou-se improcedente a Petição 153, nos termos do voto do 
relator. Unânime. Em 30 de junho de 2010.

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