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Fim do Estado Assistencialista - Tom G Palmer

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O FIM DO ESTADO
ASSISTENCIALISTA
Tom G. Palmer
Introdução 
 
Hoje, os jovens estão sendo privados de seus direitos, de sua liberdade, de sua dignidade e de seu 
futuro. Os culpados? A minha geração e as de nossos antepassados. Nós, ou criamos o Leviatã (por meio da 
mutação radioativa de nossas demandas sociais) ou fomos negligentes quanto aos tentáculos que lhe 
permitiram crescer (roubo, degradação, manipulação e controle social). Atualmente, o Leviatã é conhecido 
como Estado de bem-estar. 
O Estado de bem-estar é responsável por duas crises atuais: i) a crise financeira que reduziu, anulou 
ou mesmo tornou negativo o crescimento das economias ao redor do mundo, e ii) a crise da dívida que afeta 
a Europa, os Estados Unidos e outros países. Além de colocar o fardo da dívida nas costas dos vulneráveis – 
crianças e jovens – o Estado de bem-estar fez promessas que não podem ser cumpridas. A crise das obrigações 
não financiáveis dos governos está chegando, e será severa. 
Os ensaios aqui publicados não pretendem ser a última palavra com respeito ao passado, presente 
e futuro do Estado de bem-estar; justamente o contrário: são apresentados na esperança de que venham a 
estimular a reflexão e a investigação sobre o seu papel na vida em sociedade. Alguns deles são apresentados 
em um estilo mais acadêmico, enquanto outros, mais jornalístico; eles são inspirados em diversas disciplinas 
intelectuais. Espera-se que, na prática, ofereçam algo de valor para os leitores. 
À medida que o estado de bem-estar começa a quebrar, implodir ou recuar em escopo, vale a pena 
questionar o porquê de tal desenrolar dos acontecimentos. Qual o papel que o Estado de bem-estar teve e 
tem nas grandes crises internacionais? Qual é a sua origem, como ele funciona, e o que ele substituiu? Por 
fim, o que se seguirá ao insustentável sistema atual? Esse pequeno livro tem como objetivo ajudar os leitores 
a interpretar essas questões e muitas outras. 
Algumas pessoas consideram o Estado de bem-estar como sacrossanto, acima de qualquer suspeita, 
e inerentemente bom. Intenções, e somente intenções, importam para elas. De fato, intenções são 
importantes para avaliar o comportamento humano; todavia, ao avaliar instituições, também deveríamos 
focar na evidência e, assim, investigar os incentivos que levaram a resultados particulares. Pessoas que se 
detêm somente em intenções ignoram evidências e perguntas difíceis, optando por esta linha dedutiva: se 
uma pessoa questiona o Estado de bem-estar, é porque ela tem más intenções, isto é, é uma pessoa má; não 
devemos ouvir pessoas más, pois elas tendem somente a enganar; a melhor coisa a fazer, portanto, é fechar 
os ouvidos para não ser enganado. 
Mas nem todas as mentes estão fechadas. Pessoas com mentes abertas acreditam que deveríamos 
investigar i) se os incentivos estabelecidos pelo Estado de bem-estar tendem a instigar a instabilidade social, 
e a promover um sistema de pilhagem recíproca ao invés de solidariedade mútua, ii) se os sistemas do Estado 
de bem-estar são insustentáveis, iii) se os políticos têm respondido ao incentivo de prometer – e os cidadãos, 
de exigir – muito mais do que pode ser entregue, iv) se, em vez de ser um complemento do liberalismo 
democrático, o Estado de bem-estar nasceu como uma forma antidemocrática de manipulação e tende a 
miná-lo, às vezes súbita, e outras vezes, espetacularmente, e v) se o que o Estado de bem-estar destruiu foi, 
na verdade, mais humano, mais efetivo, e mais sustentável do que ele colocou em seu lugar. O Estado de 
bem-estar deveria ser avaliado não por meio de respostas emocionais e teorias de conspiração, mas sim à luz 
de disciplinas como história, economia, sociologia, ciência política e matemática. Esse pequeno livro destina-
se àqueles que preferem fazer as perguntas difíceis e buscar as respostas com a mente aberta. É hora de 
refletir sobre o que o Estado de bem-estar trouxe, se ele é sustentável, e o que deveria vir depois dele. 
 
Tom G. Palmer 
Jerusalém 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Seção I 
 
Pilhagem recíproca e promessas insustentáveis 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A tragédia do Estado de bem-estar 
 
Por Tom G. Palmer 
 
Muitas reflexões sobre o Estado de bem-estar focam exclusivamente nas intenções daqueles que o 
apoiam, ou oferecem meras descrições dos programas atuais de transferência de renda. Esse ensaio se baseia 
na teoria econômica dos recursos comuns para examinar o Estado de bem-estar como um sistema dinâmico 
e em expansão, uma tragédia dos comuns que criou incentivos para seu próprio esgotamento. 
O Estado de bem-estar tem algo em comum com a pesca. Se ninguém é proprietário ou responsável 
pelos peixes de um lago, e você se torna dono de tudo que pescar, a tendência é que todos tentem pescar o 
maior número de peixes. O raciocínio é simples: “se eu não pescar, alguém pescará”. Mesmo que eu saiba 
que pescar muitos peixes hoje pode gerar escassez de peixes no futuro, se vocês puderem pescar o que eu 
não pescar, nenhum de nós terá incentivo a limitar a pesca, e a população de peixes não terá como se 
reconstituir1. Os peixes são capturados mais rapidamente do que podem se reproduzir, nada sobra no lago e, 
no final, todos acabam em pior situação. 
Ambientalistas, economistas e cientistas políticos chamam tal processo de tragédia dos comuns. É 
um problema sério e que está na origem de muitas das crises ambientais do mundo atual: do esgotamento 
do estoque de peixes à poluição do ar e da água, entre outros problemas. Mas ela não se resume aos 
problemas ambientais. O Estado de bem-estar também funciona como um comum, e a tragédia está tomando 
forma enquanto você lê esse ensaio. No Estado de bem-estar moderno, todas as pessoas têm um incentivo a 
agir como os pescadores irresponsáveis que lutam pelo último pescado do lago: cada pessoa busca obter o 
máximo que puder de seus vizinhos; mas, ao mesmo tempo, seus vizinhos estão tentando obter o máximo 
que puderem dela. O Estado de bem-estar institucionaliza o que o economista francês Frédéric Bastiat 
chamou de “pilhagem recíproca2”. 
Já que podemos saquear uns aos outros, o raciocínio é o seguinte: “se eu não obtiver aquele subsídio 
governamental, alguém o obterá”. Logo, cada pessoa tem incentivo a explorá-lo à exaustão. Elas justificam a 
tomada de fundos governamentais afirmando que “estão somente recuperando o que pagaram em tributos”, 
mesmo quando algumas delas estão recebendo muito mais do que já lhes foi tirado. O incentivo a tomar 
fundos é universal. Essa tragédia tem uma dimensão ausente no caso dos recursos haliêuticos: ao saquearmos 
uns aos outros, não usamos recursos somente para saquear nossos vizinhos, mas também para evitar sermos 
saqueados por eles - o que nos coloca, de fato, em pior situação. Não somente somos saqueados, mas sim 
saqueados acima de níveis sustentáveis. O resultado é o esgotamento. E esse é o caminho trilhado, 
atualmente, pelo Estado de bem-estar: 
 
• Os governos prometem benefícios aos eleitores, tudo à custa de todos, e o sistema torna-
se insustentável, afinal, nenhum dos beneficiários quer abrir mão de seus benefícios. Poderíamos fazê-lo em 
troca de impostos menores, porém, nem temos essa opção. Os governos podem tomar dinheiro emprestado 
e adiar o aumento de tributos por algum tempo, isto é, até a próxima eleição, quando farão mais promessas, 
que serão financiadas com mais empréstimos. 
• O beneficiário exige um aumento do seu benefício, sob o argumento de ser apenas o retorno 
justo após anos de contribuições previdenciárias. Esses benefícios são financiados através do chamado 
sistema de repartição, onde as contribuições pagas pelos trabalhadores atuais são destinadas ao pagamento 
dos beneficiários atuais. Qualquer superávit nessa relação entre fontes de custeio e pagamento de benefícios 
é simplesmente “investido” em títulos da dívida pública governamental, isto é, em promessas de que essedinheiro será retornado com a arrecadação de tributos futuros. É isso que a Previdência Social é: uma simples 
 
1 “Se a terra não tem dono, embora o formalismo jurídico possa qualificá-la de propriedade pública, as pessoas utilizam-na sem se 
importar com os inconvenientes de uma exploração predatória. Quem tiver condições de usufruir de suas vantagens – a madeira e 
a caça dos bosques, os peixes das extensões aquáticas e os depósitos minerais do subsolo – não se preocupará com os efeitos 
posteriores decorrentes do modo de exploração. Para essas pessoas, a erosão do solo, o esgotamento dos recursos exauríveis e 
qualquer outra redução da possibilidade de utilização futura são custos externos, não considerados nos cálculos pessoais de receita 
e despesa. Cortarão as árvores sem qualquer consideração para com as que ainda estão verdes ou para com o reflorestamento. Ao 
caçar e pescar não hesitarão em empregar métodos contrários à preservação das reservas de caça e pesca”. MISES, Ludwig Von. 
Ação Humana. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. p. 748. Disponível em: 
http://www.mises.org.br/files/literature/A%C3%A7%C3%A3o%20Humana%20-%20WEB.pdf 
2 BASTIAT, Frédéric. Frederic Bastiat. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. p. 85. Disponível em: 
http://mises.org.br/files/literature/Fr%C3%A9d%C3%A9ric%20Bastiat.pdf 
http://www.mises.org.br/files/literature/A%C3%A7%C3%A3o%20Humana%20-%20WEB.pdf
http://mises.org.br/files/literature/Fr%C3%A9d%C3%A9ric%20Bastiat.pdf
promessa de pagamento, despachado para a última gaveta de um arquivo governamental qualquer3. De fato, 
não existe um “fundo de capitalização” a ser usado no pagamento de benefícios futuros. É um golpe de 
proporções homéricas. Os jovens de hoje estão sendo forçados a pagar pela aposentadoria de seus avós, de 
seus pais e – se tiver sobrado algo – terão que financiar a sua própria aposentadoria. Os esquemas de 
benefícios da previdência pública são indistinguíveis, em sua estrutura, dos clássicos “esquemas de pirâmide”, 
também conhecidos como “esquemas Ponzi” ou “correntes”, sempre exigindo que a base de pessoas 
(contribuintes) ingressantes no sistema aumente indefinidamente; quando a base para de crescer, a pirâmide 
colapsa. Os governos podem adiar o inevitável ao imprimir moeda ou tomar empréstimos, no entanto, isso 
não passa de um adiamento, e a cada adiamento, a situação piora. Os sinais do colapso do sistema já podem 
ser vistos agora, ao seu redor, em todo o lugar. 
• O agricultor demanda subsídio para suas plantações, que vem à custa do imposto pago pelos 
metalúrgicos; as empresas automobilísticas e os metalúrgicos que delas fazem parte demandam i) “proteção” 
contra importações de automóveis mais baratos, assim como ii) resgates financeiros para empresas do setor 
em processo de falência. As restrições comerciais aumentam os preços dos veículos para os fazendeiros, e os 
resgates financeiros às empresas automobilísticas aumentam os tributos pagos pelos fazendeiros. Os 
metalúrgicos são saqueados em benefício dos fazendeiros, e os fazendeiros são saqueados em benefício dos 
metalúrgicos. O ciclo de pilhagem recíproca segue indefinidamente, com a vasta maioria dos “vencedores” 
sendo perdedores após o final do ciclo. (Alguns, é claro, que se especializam na manipulação do sistema 
político - prática que Ayn Rand chamou “aristocracia do pistolão4 - ganham muito mais que perdem. Empresas 
politicamente conectadas de Wall Street como a Goldman Sachs, grandes conglomerados agropecuários como 
a Archer Daniels Midland, entre outras, têm lucrado descaradamente por meio dela. 
 • O sistema tributário geral nos força a aceitar o sistema de seguro saúde (nos Estados Unidos, 
o pagamento de seguro privado é atrelado aos salários, enquanto tributos sobre salários são usados para 
financiar o Medicare; na Europa, tais seguros são atrelados a tributos e, em alguns casos, a serviços de seguro 
privados); esse “financiamento por terceiros” afeta as escolhas disponíveis ao indivíduo. Como tal ‘seguro’ 
pré-pago normalmente cobre tanto tratamentos de rotina, como eventos catastróficos (lesões por acidentes 
de carro, tratamento de câncer, ou doenças comuns), temos que pedir permissão ao segurador, seja público 
ou privado, antes de termos acesso ao tratamento. Na maior parte dos casos, o “seguro saúde” não é 
realmente um “seguro”, embora assim seja chamado; o tratamento médico pré-pago cria i) incentivos à 
sobreutilização entre os consumidores, e ii) incentivos à monitoração de elegibilidade dos beneficiários por 
parte de companhias de seguros e governos. Como consumidores, perdemos nosso poder de escolha (o qual 
temos com respeito a outros bens importantes), sendo forçados a agir como suplicantes: o tratamento médico 
é, então, racionado por administradores, em vez de adquirido por consumidores. 
Benefícios a grupos particulares são normalmente concentrados, enquanto os custos desses são 
amplamente difusos entre um grande número de pagadores de impostos e consumidores. Tal dinâmica 
incentiva os beneficiários a querer mais, enquanto desestimula os saqueados a defender seus interesses. 
Obter um benefício à custa de outrem é ótimo, porém, quais são os custos disso para a sociedade? Quando 
todo mundo age dessa forma, todavia, os custos tornam-se enormes. Os pobres são os que mais sofrem, pois, 
sob um aparente aumento de benefícios, sua própria pobreza é perpetuada pelo Estado de bem-estar, e 
aprofundada pelas transferências ocultas dos sem poder para os poderosos por meio do protecionismo, 
licenças, e outras restrições sobre a liberdade no mercado de trabalho, e de todos os outros privilégios e 
negócios escusos que os poderosos, os educados, os articulados e os fortes criam para si à custa dos fracos, 
dos deseducados, dos sem voz e dos desamparados. 
Imigrantes são sistematicamente demonizados por, supostamente, “estarem aqui para tomar 
nossas prestações sociais”. Ao invés de bem acolherem pessoas que vem para gerar riqueza, os beneficiários 
do Estado de bem-estar agem para proteger “suas prestações sociais” ao excluírem de seu convívio imigrantes 
potenciais, demonizando-os como sanguessugas e saqueadores5. Enquanto isso, as elites políticas afirmam 
publicamente que estão ajudando os pobres do exterior ao usar o dinheiro de tributos para financiar a 
parasítica indústria da ajuda internacional, repassando o superávit agrícola que tem sido gerado por políticas 
 
3 USA Today. Social Security trust fund sits in West Virginia file cabinet. 28 fev. 2005. Disponível em: www.usatoday.com/news/ 
washington/2005-02-28-trust-fund_x.htm 
4 RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. São Paulo: Arqueiro, 2012. Vol. II, cap. II “A Aristocracia do Pistolão”. 
5 Muitos das alegações sobre os imigrantes são factualmente incorretas. Nos Estados Unidos, pelo menos, os imigrantes 
normalmente pagam mais ao Estado de bem-estar em tributos do que recebem em benefícios e, no passado, contribuíram 
enormemente para o dinamismo econômico e à prosperidade das sociedades para as quais emigraram ao criar novos negócios. As 
questões são tratadas no cap. 3 do livro – RILEY, Jason L. Let Them In: The Case for Open Borders. New York: Gotham Books, 2008. 
p. 91–125. 
assistencialistas (para subsidiar agricultores ao garantir preços mínimos pelos seus produtos) a governos 
autocráticos: em resumo, a internacionalização do Estado de bem-estar. O processo como um todo tem sido 
um desastre, pois i) prejudica a responsabilização democrática em nações em desenvolvimento, já que os 
líderes políticos sabem que são as expectativas dos mestres da ajuda internacional que devem ser atendidas, 
e não aquelas dos cidadãos locais, pagadores de impostos, ii) alimenta o despotismo militar e a guerra civil e, 
iii) leva à destruição de instituições produtivas autóctones6. 
Enquanto se perpetua uma situação de conflito entre cidadãos, e decidadão contra imigrante, em 
um vasto sistema de pilhagem recíproca (e defesa contra pilhagem), as burocracias estatais estendem seu 
controle e tanto criam como alimentam os círculos eleitorais que as sustentam. 
Mas a pilhagem recíproca não é única característica saliente do moderno Estado de bem-estar. Ele 
gerou uma crise após a outra, sendo elas consequências não intencionais de políticas equivocadas adotadas 
por políticos que não têm que assumir as consequências de seus atos. Duas delas estão afligindo o mundo 
nesse exato momento. 
 
A crise financeira e o Estado de bem-estar 
 
A crise financeira emergiu na intersecção entre motivações humanas e incentivos ruins. Esses 
incentivos foram criados por políticas insensatas, as quais têm origem na filosofia de que é missão do governo 
controlar nosso comportamento, tirar a Pedro para dar a Paulo, e usurpar a responsabilidade de nossas vidas7. 
As sementes da crise atual foram plantadas em 1994 quando o governo dos Estados Unidos anunciou um 
plano grandioso para aumentar o número de proprietários de imóveis nos Estados Unidos de 64% para 70% 
da população, por meio de um Plano Nacional da Moradia, uma parceria entre o governo federal e bancos, 
construtoras, financiadores, corretores de imóveis e outros com algum tipo de interesse especial. 
Como Gretchen Morgenson e Joshua Rosner documentam em seu livro Reckless Endangerment: 
How Outsized Ambition, Greed, and Corruption Led to Economic Armageddon, “a parceria alcançaria seu 
objetivo ao ‘tornar mais acessível a aquisição de imóveis, expandir o financiamento criativo, simplificar o 
processo burocrático, reduzir os custos de transação, modificar métodos convencionais de design, construir 
casas mais baratas, entre outras coisas8’”. Essa incursão do Estado de bem-estar no setor imobiliário parecia 
razoável para muitos: por que as pessoas deveriam ser impedidas de ter sua casa própria por motivos tão 
banais como não terem poupado para dar a entrada, não terem histórico positivo de crédito, ou não terem 
empregos? 
Por que não tornar a aquisição de imóveis “mais acessível” por meio de “financiamento criativo”? 
Agências governamentais como a Federal Housing Administration (tradução livre, Administração Federal de 
Habitação), e “empresas apadrinhadas pelo governo” como a Fannie Mae, foram orientadas a transformar 
inquilinos em proprietários - baixando o valor de entrada, reduzindo drasticamente os padrões de empréstimo 
entre os bancos, aumentando a quantidade de dinheiro destinada ao mercado imobiliário através da compra 
e “securitização” de mais hipotecas, além de um conjunto de outras medidas. Foi um esforço bipartidário de 
engenharia social. Sob a administração Bush, o FHA ofereceu garantias de empréstimos em hipotecas com 0% 
de entrada. Como Alphonso Jackson, secretário-adjunto do Department of Housing and Urban Development 
(tradução livre, Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano) proclamou em 2004, “oferecer 
hipotecas com o apoio do FHA, sem nenhuma entrada, permitirá a realização do sonho da casa própria para 
centenas de milhares de famílias americanas, em particular, as que fazem parte das minorias”. Ele adicionou: 
”nós não antecipamos nenhum custo aos pagadores de impostos9”. 
O governo americano deliberada e sistematicamente enfraqueceu os padrões bancários tradicionais, 
e encorajou – na verdade, exigiu – empréstimos cada vez mais arriscados. Riscos que não se concretizassem 
gerariam lucros privados, enquanto que riscos que se concretizassem gerariam perdas socializadas, pois “um 
 
6 A abrangência internacional do Estado de bem-estar também teve consequências hediondas, que são bem-documentadas em 
diversos estudos, incluindo - MOYO, Dambisa. Dead Aid: Why Aid Is Not Working and How There Is Another Way for Africa. London: 
Allen Lane, 2009; HANCOCK, Graham. Lords of Poverty: The Power, Prestige, and Corruption of the International Aid Business. New 
York: Atlantic Monthly Press, 1989; e MAREN, Michael. The Road to Hell: The Devastating Effects of Foreign Aid and International 
Charity. New York: The Free Press, 1997, entre obras importantes. Um estudo pioneiro dos efeitos da ajuda externa pode ser 
encontrado em BAUER, P. T. Dissent on Development. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1976. 
7 Veja o debate sobre a responsabilidade e o poder estatais em SCHMIDTZ, David e GOODIN, Robert E. Social Welfare and Individual 
Responsibility: For and Against. Cambridge: Cambridge University Press, 1998. 
8 MORGENSON, Gretchen e ROSNER, Joshua. Reckless Endangerment: How Outsized Ambition, Greed, and Corruption Led to 
Economic Armageddon. New York: Times Books, Henry Holt & Co., 2011. p. 2–3. 
9 SICHELMAN, Lew. Bush to Offer Zero Down FHA Loan. Realty Times. 20 jan. 2004. Disponível em: http://realtytimes.com/rt-
pages/20040120_zerodown.htm 
banqueiro que deparasse com esses novos requerimentos poderia vender quaisquer empréstimos de risco 
para Freddie e Fannie, responsáveis por financiar as hipotecas residenciais de milhões de americanos.10” Os 
lucros privados e as perdas socializadas caracterizaram a intersecção entre o estatismo de bem-estar e o 
capitalismo de compadrio. 
Os preços das casas subiam à medida que mais dinheiro era injetado no mercado hipotecário. Era 
uma festa: todo mundo estava se sentindo mais rico, afinal, o preço de sua casa estava disparando. As pessoas 
tomavam “hipotecas com taxas de juro variável” para comprar casas maiores do que, de outra forma, seriam 
capazes de comprar, pois esperavam vendê-las antes que as taxas de juro subissem novamente. O crédito era 
fácil e os americanos tomaram segundas hipotecas para financiar férias e adquirir barcos. Mais e mais casas 
foram construídas com a perspectiva de preços mais altos. O resultado foi uma bolha imobiliária de enorme 
magnitude. As pessoas compravam imóveis apenas para vendê-los logo depois para novos compradores. 
Enquanto isso, os reguladores financeiros dos governos ao redor do mundo classificaram empréstimos como 
de baixo risco quando eram, na verdade, de alto risco – entre eles, a dívida governamental (títulos) e títulos 
lastreados em hipotecas11. Bancos alemães compraram títulos da dívida grega, enquanto bancos nos Estados 
Unidos e ao redor do mundo adquiriram títulos lastreados em hipotecas que, supostamente, estavam cobertos 
pelo governo americano. 
As políticas intervencionistas do governo dos Estados Unidos para tornar a aquisição da casa própria 
mais acessível - expandir o “financiamento criativo” e destruir as práticas padrão do setor bancário – se uniram 
à arrogância dos reguladores do sistema financeiro global quanto ao seu real conhecimento da magnitude dos 
riscos – enquanto os participantes do mercado, cujo capital estava em jogo, de nada sabiam. O resultado foi 
que o sistema financeiro global foi contaminado por empréstimos de risco, títulos de dívida sem lastro e ativos 
tóxicos, com resultados desastrosos. O calote das hipotecas subprime cresceu ao ritmo do crescimento das 
taxas de juros - e esses títulos lastreados em hipotecas de baixo risco, que as instituições tinham sido 
encorajadas a comprar, acabaram, por fim, não sendo de tão baixo risco. Poupanças foram perdidas, 
proprietários de casas se viram incapazes de pagar as hipotecas, instituições financeiras ruíram, e a economia 
afundou em recessão. Como culpados, apontamos as numerosas distorções de incentivos causadas por todo 
o sistema de intervenção nos mercados imobiliário e financeiro; não obstante, sem a política do Estado de 
bem-estar americano de “tornar a moradia mais acessível” via “financiamento criativo”, a crise financeira não 
teria ocorrido. A crise financeira global foi o resultado de uma má política após a outra, tendo como principal 
agente o Estado de bem-estar12. 
 
A crise da dívida e o Estado de bem-estar 
 
Enquanto os governos dos Estados Unidos e de alguns países europeus estavam furiosamente 
inflandouma gigante bolha imobiliária, a explosão das despesas em programas assistencialistas (pensões e 
cuidados médicos, por exemplo) havia mergulhado os governos do mundo em uma crise de dívida pública. 
Enquanto muita atenção tem sido dada ao grande aumento da dívida governamental – de fato, estarrecedor 
– pouco se reflete que esses números são pequenos quando comparados aos montantes acumulados de 
obrigações não financiáveis, isto é, promessas feitas aos cidadãos (que nelas confiam), para as quais não existe 
receita correspondente. Se uma firma privada enganasse o público e seus acionistas sobre a magnitude de 
suas obrigações - como os governos sistematicamente o fazem – os seus representantes legais seriam presos 
por fraude. Os governos eximem-se de quaisquer práticas contábeis e, deliberada e sistematicamente, iludem 
o público sobre as obrigações que estão colocando nas costas das gerações futuras. Os governos acham fácil 
comprar o presente e hipotecar o futuro. Mas o futuro está chegando muito rápido. 
Em 2006, os economistas Jagadeesh Gokhale e Kent Smetters calcularam (de forma conservadora) 
que o desequilíbrio total do orçamento federal do governo dos Estados Unidos em 2012 seria de US$ 80 
 
10 MORGENSON, Gretchen e ROSNER, Joshua. Reckless Endangerment: How Outsized Ambition, Greed, and Corruption Led to 
Economic Armageddon. p. 38 
11 Qualquer hipoteca que uma empresa apadrinhada pelo governo securitiza era, sob as regras de Basel [as regulamentações globais 
adotadas pelos governos] lucrativa para os bancos emissores americanos – e lucrativa para eles, novamente, ao serem compradas 
em forma de títulos lastreados em hipotecas (as famosas, mortgage-backed securities). FRIEDMAN, Jeffrey. A Crisis of Politics, Not 
Economics: Complexity, Ignorance, and Policy Failure. Critical Review, Vol. 21, Nos. 2–3. 2009. p. 127–183, p. 144. 
12 Para mais detalhes sobre a combinação das políticas do FED para reduzir as taxas de juros, a “securitização” dos títulos lastreados 
em hipotecas, e as regulamentações financeiras internacionais que classificaram a dívida governamental e as mortgage-backed 
securities como “de baixo risco”, veja NORBERG, Joan. Financial Fiasco: How America’s Infatuation with Home Ownership and Easy 
Money Created the Economic Crisis. Washington, DC: Cato Institute, 2009. Veja também Critical Review, “Special Issue: Causes of 
the Crisis,” edit por Jeffrey Friedman, Vol. 21, Nos., 2–3 (2009), e FRIEDMAN, Jeffrey e KRAUS, Wladimir. Engineering the Financial 
Crisis: Systemic Risk and the Failure of Regulation. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2011. 
trilhões de dólares. O desequilíbrio orçamentário é definido como “a diferença entre o valor presente da 
despesa projetada do governo sob a lei atual em todas as suas categorias - benefícios (direitos adquiridos), 
defesa, estradas (infraestrutura) e todo o resto – e a receita projetada de tributos em todas as contas de 
receita13. Gokhale está atualizando os dados, e a previsão é de que o desequilíbrio seja maior que o previsto 
em 2006. Como Gokhale escreveu “some a ele o aumento provável dos custos relativos ao sistema de saúde 
após a aprovação de novas leis para o setor, e esse número é provavelmente muito otimista, contudo, não 
saberemos até que meu projeto esteja quase concluído. Para a Europa, estimo um desequilíbrio total de EUR 
53,1 trilhões de euros a partir de 2010. Isto é, 434% do PIB anual combinado de 27 países europeus, no valor 
de EUR 12,2 trilhões de euros. Essa também é uma estimativa otimista, visto que as projeções foram feitas 
somente até 2050 (ao contrário das projeções dos Estados Unidos, que se estendem ao infinito14)”. 
 Isso significa que aquelas promessas não podem e não serão cumpridas: para que mesmo uma 
fração das promessas atuais fosse cumprida, os tributos teriam que ser elevados a níveis astronômicos. É 
muito mais provável que os governos não somente deem calote em suas dívidas publicamente reconhecidas 
(títulos públicos em poder de credores), mas também renunciem às promessas feitas aos cidadãos sob a forma 
de pensões, saúde pública e outros benefícios. Por anos, mentiram sobre as condições reais das finanças; e 
essas mentiras, hoje, ficam explícitas quando promessas são quebradas porque, simplesmente, não podem 
ser cumpridas, como estamos vendo desdobrar-se perante nossos olhos na Grécia. Uma forma de os governos 
renunciarem às suas promessas é pagando-as por meio de impressão de moeda, com mais e mais zeros 
adicionados a cada nota, isto é, as moedas nas quais as promessas são redimidas são dramaticamente 
desvalorizadas. (A inflação é especialmente danosa como forma de negociar a dívida, pois ela tanto distorce 
o comportamento geral dos agentes do mercado, como recai desproporcionalmente sobre os pobres e os 
incapazes de se proteger dela). Os estados de bem-estar que conhecemos podem estar desmoronando em 
câmara lenta em alguns países, enquanto rapidamente em outros, mas o fato é que estão desmoronando; e, 
como sempre, o peso cairá nas costas dos que não têm conexões políticas e sofisticação para evitar as 
consequências. 
De forma indignada, muitas pessoas respondem a tais fatos citando suas intenções, sem respeitar 
as consequências. “Nosso objetivo era ajudar as pessoas; nossa intenção não era causar o colapso do sistema 
financeiro global através de uma intervenção no mercado imobiliário, e tampouco quebrar nosso país!”, 
dizem. Como o filósofo Daniel Shapiro pertinentemente notou “instituições não podem ser adequadamente 
caracterizadas pelos seus objetivos15”. “Os melhores objetivos do mundo, se combinados com maus 
incentivos via instituições erradas, podem gerar consequências terríveis16”. As intenções dos defensores do 
Estado de bem-estar são irrelevantes para as consequências de suas políticas17. A filosofia política, como 
normalmente praticada, se resume a uma comparação dos pontos fortes e fracos de uma instituição perante 
a outra. Francamente, isso não é muito útil na tarefa de criar instituições que funcionam, que são sustentáveis, 
e que são justas. Para tal, necessitamos muito mais do que mera comparação de instituições: necessitamos, 
 
13 GOKHLAE, Jagadeesh e SMETTERS, Gokhlae. Do the Markets Care About the $2.4 Trillion U.S. Deficit? Financial Analysts Journal. 
vol. 63, No. 3. 2007. 
14 Conversa particular com o autor em 26 mar. 2012. 
15 SHAPIRO, Daniel. Is the Welfare State Justified? Cambridge: Cambridge University Press, 2007. p. 5. O livro de Shapiro oferece uma 
comparação justa dos argumentos feitos em defesa do estado de bem-estar, tendo como evidência o seu desempenho. 
16 Um exemplo é a insistência do defensor do Estado de bem-estar, James P. Sterba, que a deliberada morte por inanição de cidadãos 
produtivos é apropriada para induzi-los a produzir mais de forma que o Estado possa confiscar e redistribuir o resultado de seus 
esforços produtivos. Sterba argumenta que o direito à assistência social é um “direito negativo” consistente com a liberdade de 
todos e propõe, com base unicamente em sua intuição, ameaçar confiscar os “recursos não produtivos” das pessoas produtivas, a 
saber, não somente o excedente sobre o que é necessário para sobreviverem, mas o alimento necessário para a sobrevivência física, 
de forma a induzir os produtivos a produzirem mais para o Estado redistribuir. Esse professor de filosofia acredita que é consistente 
com o respeito à liberdade das pessoas produtivas ameaçá-las com a inanição deliberada, pois “nosso produtor poderia responder 
ao não fazer nada. O pobre [na prática, é claro, o Estado, supostamente agindo em nome do pobre] poderia então se apropriar dos 
recursos não excedentes do produtor e, então, ao não produzir mais, o produtor simplesmente pereceria, porque não estaria 
disposto a ser mais produtivo”. “Simplesmente pereceria” é o eufemismo de Sterba para o catabolismo,o edema, a falha dos órgãos 
e outros sintomas da morte por inanição. STERBA, James P. Equality is compatible with and required by liberty. em NARVESON, 
James e STERBA, James P. Are Liberty and Equality Compatible?: For and Against. Cambridge: Cambridge University Press, 2010. p. 
23. Para descrições macabras de como a proposta de Sterba funcionaria na prática, veja SNYDER, Timothy. Bloodlands: Europe 
Between Hitler and Stalin. New York: Basic Books, 2010 e DIKOTTER, Frank. Mao’s Great Famine: The History of China’s Most 
Devastating Catastrophe, 1958–1962. New York: Walker Publishing Co., 2010. Propostas radicais baseadas puramente em intuições 
sobre moralidade e justiça, não testadas contra qualquer conhecimento de economia, sociologia ou história geralmente levam ao 
desastre e são, no mínimo, moralmente irresponsáveis. 
17 Existe literatura abundante quanto às asserções morais com respeito ao Estado de bem-estar, principalmente começando com 
intenções e terminando com intenções. Eu trato de parte daquela literatura em meu ensaio – PALMER, Tom G. Realizing Freedom: 
Libertarian Theory, History, and Practice. Washington, DC: Cato Institute, 2009. p. 41–83. 
sim, de história, de economia, de sociologia e de ciência politica, e não meramente de teoria moral divorciada 
da prática. 
 
O futuro está em perigo, mas não está perdido 
 
Os estados de bem-estar atuais são diretamente responsáveis por duas grandes crises econômicas 
que estão afligindo o mundo: i) a crise financeira global que tornou negativa a taxa de crescimento econômico 
em muitos países e extinguiu trilhões de dólares do valor de ativos, e ii) a crise da dívida que tem sacudido a 
Europa e ameaça derrubar alguns dos governos, das moedas e dos sistemas financeiros mais poderosos do 
mundo. Mesmo as melhores intenções podem gerar consequências terríveis quando implementadas por meio 
de instituições e incentivos perversos. 
A história não se resume à tristeza e desolação, todavia. Nós podemos nos livrar do Estado de bem-
estar e o que lhe acompanha: dívida pública, burocracia e pilhagem recíproca. Não será fácil, e é necessária 
muita coragem para se opor a interesses especiais e políticos calculistas. Contudo, isso pode e deve ser feito. 
Os que se manifestam nas ruas contra “cortes orçamentários” (quase sempre meras variações de 
contabilidade criativa) estão, na verdade, se manifestando contra a boa e velha matemática. A soma de mais 
e mais números negativos não gerará um número positivo: a conta, simplesmente, não fecha. Nós precisamos 
de protestos nas ruas em nome da razão, da responsabilidade fiscal, da redução do tamanho do Estado, da 
liberdade para as pessoas decidirem seu próprio destino. Nós necessitamos fazer com que o poder do Estado 
retroceda a ponto de ser limitado à proteção de nossos direitos, e não à tentativa de tomar conta de nós. 
Precisamos de decisões claras de parte dos políticos. É chegada a hora de por um fim ao Estado de bem-estar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Como o Estado de bem-estar acabou com o sonho italiano 
 
Por Piercamillo Falasca 
 
O jornalista e pesquisador Piercamillo Falasca nos conta a história de como políticas sensatas 
lançaram a Itália como uma história de sucesso econômico nas décadas de 1950 e 1960. E como, em contraste, 
políticas assistencialistas iniciadas quando a população era jovem, a economia estava crescendo, e o futuro 
parecia distante, quebraram o país. Falasca é vice-presidente da associação liberal clássica Libertiamo.it e 
pesquisador no think tank italiano Instituto Bruno Leoni. 
 
 “O crescimento da economia, da indústria e do padrão de vida nacionais nos anos do pós-guerra tem 
sido verdadeiramente fenomenal. Uma nação outrora em ruínas, assolada por desemprego e inflação, 
expandiu sua produção e seus ativos, estabilizou seus custos e sua moeda, criou novos empregos e 
novas indústrias em um ritmo inigualável no mundo ocidental”. Presidente John F. Kennedy 
 
Durante reuniões oficiais, palavras cordiais de enaltação são costumeiras. No entanto, o que foi dito 
pelo presidente dos Estados Unidos John F. Kennedy em 1963, durante um jantar dado em sua honra pelo 
presidente da Itália, Antonio Segni, em Roma, foi a constatação de um fato. De 1946 a 1962, a economia 
italiana cresceu a uma taxa anual média de 7,7%, um desempenho brilhante que continuou praticamente até 
o fim da década de 1960 (o crescimento médio nessa década foi 5%). O chamado Miracolo Economico tornou 
a Itália numa sociedade moderna e dinâmica, ostentando firmas capazes de competir globalmente em 
qualquer setor – de máquinas de lavar e refrigeradores a componentes mecânicos de precisão, do setor 
alimentício à indústria cinematográfica. 
A década de 1956 a 1965 viu um crescimento notável na Alemanha Ocidental (70%), na França (58%) 
e nos Estados Unidos (46%), todavia, todos ficaram à sombra do desempenho espetacular da Itália (102%). 
Grandes firmas como a empresa automobilística Fiat; a fabricante de máquinas de escrever, impressoras e 
computadores Olivetti; as companhias de energia Eni e Edison; entre outras, cooperaram com um grande 
grupo de pequenas empresas, cuja gestão, em sua maioria, era familiar - seguindo a forte tradição da 
sociedade italiana. Pelo menos 1/5 da população de 50 milhões mudou-se do pobre e árido sul para o rico e 
industrializado norte, alterando seu estilo de vida, comprando carros e televisores, dominando a língua 
italiana culta, matriculando suas crianças em escolas, poupando dinheiro para comprar casas, além de ajudar 
parentes que ainda viviam no interior. Depois de 1960, o rápido aumento no padrão de vida em conjunto com 
as oportunidades crescentes de negócios e emprego puseram fim à diáspora italiana que, durante quase um 
século, havia levado cerca de 20 milhões de pessoas a deixar sua terra natal com destino a outros países da 
Europa, ou mesmo às Américas. 
Qual foi a fórmula mágica do crescimento econômico italiano? Muitos anos depois, um senador do 
Democrazia Cristiana (“Democratas Cristãos”, um partido cristão de centro-direita), disse em uma entrevista: 
“Nós entendemos e imediatamente percebemos que não poderíamos gerir a sociedade italiana. O país era 
mais forte que a política, e muito mais talentoso. Não fazer nada era uma escolha melhor que muitas medidas 
governamentais”. A quem Piero Bassetti se referia por “nós”? 
Logo após o fim da II Guerra Mundial, um grupo de economistas e políticos de cunho liberal, pró-
mercado, assumiu posições-chave no governo, extinguiu a legislação fascista, e instituiu políticas 
democráticas e reformas de livre mercado. A figura central desse grupo era o economista e jornalista 
antifascista Luigi Einaudi, um dos liberais clássicos italianos mais proeminentes, que retornou à Itália e serviu 
após a guerra como presidente do Banco Central, depois ministro das finanças e, finalmente, presidente da 
república. Ele teve grande influência sobre as políticas econômicas implementadas pelo primeiro-ministro 
Alcide de Gasperi (1945-1953) e, depois da morte de De Gasperi, por seu sucessor, Giuseppe Pella. 
Embora algumas dessas figuras possam não ser reconhecidas fora da Itália, elas representaram uma 
‘exceção’ extraordinária à cultura política europeia. Vinte anos depois do regime fascista de Mussolini e dos 
horrores da guerra, aquele grupo de liberais clássicos representava a única esperança de a nação emergir das 
profundezas de seu passado totalitário para a liberdade do capitalismo democrático. O contexto em que 
operavam dificilmente poderia ser considerado fácil: a Itália era um país pobre que tinha sido devastado pelo 
coletivismo fascista e pela guerra; a maioria da população estava desempregada e, para piorar, era analfabeta; 
a infraestrutura era inexistente ou muito precária; um poderoso Partido Comunista ameaçava substituir o 
coletivismo fascista pelo coletivismo comunista; e as estatais dominavam grande parte da economia. 
A influência dopensamento de Luigi Einaudi foi de suma importância. Uma política monetária 
cuidadosa segurou a inflação por, pelo menos, 20 anos (em 1959, o Financial Times celebrou a lira como a 
moeda mais estável do mundo ocidental); acordos de livre comércio ajudaram a Itália a retornar ao mercado 
internacional; e uma reforma fiscal (a Lei Vanoni, assim nomeada em honra ao ministro que a concebeu) 
reduziu os impostos e simplificou o sistema tributário. Em uma época dominada pelas ideias keynesianas, o 
gasto público da Itália permaneceu relativamente controlado: em 1960, o gasto público mal chegava ao nível 
de 1937 (30% do PIB, com uma parcela significativa de investimentos em capital fixo), ao passo que, em outros 
países europeus, ele havia crescido dramaticamente. 
O famoso jurista Bruno Leoni foi um dos pensadores que advertiu sobre os perigos potenciais caso 
as pessoas se esquecessem do que tinha gerado essa recente prosperidade. O aumento da prosperidade 
parecia a ocasião perfeita para novos gastos e intervenções governamentais. Já na década de 1950, o governo 
italiano criou a Cassa del Mezzogiorno (similar ao Tennessee Valley Authority de Roosevelt, embora localizada 
no pobre sul da Itália). Na década de 1960, o governo italiano aprovou legislação visando a redistribuição de 
riqueza, a expansão do controle governamental da economia (por exemplo, a nacionalização do fornecimento 
de energia elétrica), e o estabelecimento de um Estado de bem-estar mais forte. 
Em uma Itália relativamente próspera, movimentos redistribucionistas obtiveram amplo apoio 
popular. Em 1962, durante negociações relativas ao contrato de trabalho dos metalúrgicos, os sindicatos 
solicitaram jornada de trabalho mais curta, ampliação do período de férias, e mais poder para organizar 
atividades sindicais nas fábricas. O Partito Socialista Italiano (Partido Socialista Italiano) uniu-se ao 
Democrazia Cristiana na coalisão governante, formando o primeiro “governo de centro-esquerda”. Em 1963, 
um programa de moradias públicas que se deu através da nacionalização de terras provocou uma forte 
oposição de associações privadas (entre elas, a Igreja Católica), que convenceram a Democrazia Cristiana a 
abandonar a ideia. No entanto, essas causas coletivistas dominariam o resto da década de 1960, e parte da 
década de 1970. 
Diversas decisões de política pública adotadas naquele período lançaram as bases para a crise atual 
da Itália. A primeira foi o afrouxamento da disciplina fiscal: em 1966, o Tributal Constitucional decidiu 
reinterpretar, arbitrariamente, os limites constitucionais que asseguravam o equilíbrio orçamentário; tal 
estratagema permitiu ao Parlamento aprovar leis cujas despesas anuais passavam a ser cobertas pela emissão 
de títulos do Tesouro, e não mais pela receita fiscal (tributação). A consequência? Um rombo cada vez maior 
no orçamento público, ano após ano. Luigi Einaudi faleceu em 1961 e todos seus apelos por disciplina fiscal 
foram rapidamente esquecidos. Ate o início da década de 1960, o déficit primário, que é o valor dos gastos da 
administração pública direta menos o valor total da arrecadação tributária, excetuando-se o pagamento de 
juros do principal, era praticamente zero; ele subiu rapidamente depois da decisão do Tribunal, e acelerou 
depois de 1972, quando o gasto via déficit (deficit spending) tornou-se uma estratégia política sistemática. Em 
1975, o déficit primário já tinha chegado a perigosos 7,8% do PIB. 
A segunda foi a introdução de um generoso sistema de pensões em 1969 (a Lei Brodolini). O antigo 
mecanismo baseado em contribuição compulsória foi substituído por um sistema redistributivo, isto é, os 
aposentados passaram a receber pensões não determinadas pelo valor total da poupança compulsória 
recolhida durante sua vida laboral, mas sim, meramente, por seus salários anteriores. Uma “pensão social” 
foi estabelecida para todo cidadão, junto com regras de usufruto, permitindo aos trabalhadores se 
aposentarem mais cedo. Além disso, uma abordagem complacente foi adotada na concessão de pensões por 
invalidez no sul da Itália, que foi considerada um substituto para políticas pró-crescimento mais efetivas. 
Poucos, todavia, prestaram atenção à questão da sustentabilidade financeira. Afinal, os eleitores do futuro 
não votam no dia de hoje. 
A terceira foi a regulamentação mais forte do mercado laboral por meio da adoção, em 1970, do 
chamado Estatuto do Trabalhador, incluindo o artigo 18, o qual estipula que, se um tribunal considerar injusta 
a demissão de um empregado de uma firma com mais de 15 empregados com contratos fixos de longo prazo, 
então o empregado tem o direito de ser recontratado. O ônus da prova repousa totalmente nas costas do 
empregador. Ao tornar muito caro demitir empregados, concomitantemente, a lei tornou muito caro 
contratar empregados, fato que tanto reduziu a mobilidade laboral como encorajou o trabalho ilegal. 
A quarta decisão, produto de atos sucessivos entre 1968 e 1978, foi a criação de um sistema público 
de saúde quase em sua totalidade financiado por tributos, significando que havia pouco incentivo para os 
consumidores economizarem no uso dos serviços médicos. 
Por fim, em janeiro de 1970, o governo impôs uma regra compulsória para todos os funcionários dos 
setores de engenharia e de metalurgia, que regulou e limitou substancialmente sua jornada de trabalho. 
Os efeitos negativos de longo prazo dessas e doutras politicas foram obscurecidos no curto prazo 
pelo crescimento ainda forte da Itália e pela baixa idade média da população. Pensões generosas e despesas 
de saúde para um pequeno número de aposentados foram pagas por um grande número de jovens 
trabalhadores. Ano após ano, essas políticas, junto com uma regulamentação cada vez mais pesada dos 
mercados laboral e de serviços, reduziram a produtividade e tornaram o mercado de trabalho mais rígido, 
aumentando, assim, os custos de contratação. De quebra, houve aumento paulatino do gasto público e, 
consequentemente, da dívida pública, a qual, por sua vez, absorvia fatia cada vez maior da poupança privada 
para seu financiamento. 
Com o passar do tempo, o envelhecimento da população reduziu a razão entre a população 
economicamente ativa (PEA) e a população aposentada, tornando os sistemas de pensão e de saúde mais 
onerosos e menos sustentáveis. Durante as décadas de 1960 e 1970, houve aumento geral do gasto público 
entre os países europeus, embora o destaque negativo tenha sido a Itália, que perdeu o posto de país 
fiscalmente sustentável, conquistado a duras penas na década de 1950. Na Itália, o gasto público aumentou 
de 32,7% do PIB em 1970 para 56,3% em 1993, estimulado em parte por uma política irresponsável de 
aumento do funcionalismo público para compensar a falta de empregos no setor privado, especialmente no 
sul. (A falta de emprego era, em grande parte, causada pelos custos extremos de contratação impostos à 
iniciativa privada). Enquanto a dívida pública tinha permanecido estável em uma média de 30% do PIB durante 
as décadas de 1950 e 1960, ela alcançou o espantoso total de 121,8% em 1994. 
Assim acabou o milagre italiano. A taxa média de crescimento do PIB ainda era de 3,2% na década 
de 1970, mas caiu para 2,2% na década de 1980. Graças à desvalorização sistemática da lira, as empresas 
italianas poderiam manter sua competitividade internacional por algum tempo (o primeiro-ministro Bettino 
Craxi anunciou que o país tinha superado o PIB da Grã-Bretanha em 1987), mas a inflação alta e a dívida 
pública estavam claramente comprometendo o futuro. 
Várias tentativas de reforma foram feitas na década de 1990, especialmente depois da crise político-
financeira de 1992-1993, quando o país esteve próximo a um calote soberano, e o sistema político pós-guerra 
foi varrido por acusações de corrupção. Algumas privatizações de empresas estatais ajudaram a reduzir a 
dívida publica para um nível relativamente mais viável. Pequenas mudanças foram feitas no sistema de 
pensõese, em 1997, o parlamento italiano aprovou legislação para modernizar as leis trabalhistas, mas os 
obstáculos políticos à abolição das provisões do Artigo 18 (com respeito ao direito de recontratação de 
empregados dispensados) levaram ao estabelecimento de um mercado de trabalho de dois níveis, incluindo 
contratos hiper-regulados e antiquados, assim como novos contratos com termos fixos. 
Essas reformas deram um gás a uma economia já combalida, postergando por um tempo o acerto 
de contas. A farra, todavia, tinha acabado. 
A Itália ainda é um país rico, mas o sistema político italiano age como um barão empobrecido que 
se vê incapaz de se adaptar a sua nova condição. A consequência mais nefasta do Estado de bem-estar italiano 
e suas intervenções assistencialistas no mercado de trabalho não é política ou econômica, mas cultural. A 
cultura da dependência do Estado de bem-estar é o que tem tornado a mudança muito difícil mesmo nos anos 
recentes, quando a Itália está experimentando uma nova crise da dívida. 
Os italianos contemporâneos não parecem dispostos a arregaçar as mangas, como fizeram seus pais 
e avós, para produzir riqueza em uma economia livre e competitiva, abdicar dos benefícios insustentáveis do 
Estado de bem-estar em troca de mais liberdade, renda e prosperidade. A Itália pode retornar às lições liberais 
clássicas de Einaudi, recuperando o crescimento econômico e a possibilidade de um futuro promissor? Como 
já ocorreu no passado recente, o que acontece na Itália pode servir de bom ou mau exemplo para o resto do 
mundo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O Estado de bem-estar 
 
A Grécia como uma fábula cautelar do Estado do bem-estar 
 
Por Aristides Hatzis 
 
Poucas democracias contemporâneas oferecem uma fábula de fracasso institucional tão 
surpreendente quanto a da Grécia. Apesar de uma história política turbulenta no século XX, a economia grega 
progrediu durante décadas de real criação de riqueza, até que os principais partidos do país passaram a 
disputar o poder recorrendo a instâncias como o estatismo de bem-estar, o populismo barato e a patronagem. 
O estudioso de Direito e Economia Aristides Hatzis mostra como a busca de vantagem política no curto prazo 
via políticas estatistas gerou corrupção, endividamento e colapso político. Hatzis é professor de Filosofia do 
Direito e Teoria das Instituições na Universidade de Atenas e escreve sobre a crise grega no website 
GreekCrisis.net 
 
A Grécia atual tornou-se um símbolo de falência econômica e política, um experimento natural em 
fracasso institucional. Não é fácil encontrar um país que sirva como caso clássico de tantas distorções, 
deficiências e rigidezes institucionais; ainda assim, o governo grego conseguiu tal feito. O caso da Grécia é 
uma fábula cautelar para todos os outros países. 
A Grécia costumava ser considerada algo como uma história de sucesso. Poder-se-ia até mesmo 
argumentar que a Grécia foi uma história de sucesso por várias décadas. A taxa média de crescimento da 
Grécia no período de 1929 a 1980 foi de 5,2%; no mesmo período, o Japão cresceu, em média, somente 4,9%. 
Esses números são impressionantes se você levar em conta que a situação política na Grécia durante 
esses anos foi tudo, menos normal. De 1929 a 1936, a situação política foi anômala - com golpes, rixas políticas 
e ditaduras de curta duração. Ao mesmo tempo, o país se esforçava para assimilar mais de 1,5 milhão de 
refugiados da Ásia Menor (número que representava, aproximadamente, 1/3 da população grega da época). 
De 1936 a 1940, a Grécia teve uma ditadura de direita muito semelhante às outras ditaduras europeias da 
época e, durante a II Guerra Mundial (1940-1944), esteve entre as nações mais devastadas em termos 
percentuais de baixas em relação à população. Logo após o final da II Guerra Mundial, houve uma feroz e 
devastadora guerra civil (em dois estágios: 1944 e 1946-1949) iniciada por uma insurreição organizada pelo 
Partido Comunista. De 1949 a 1967, a Grécia proveu um exemplo típico de uma democracia paternalista 
iliberal, com estado de direito debilitado. Em 21 de abril de 1967, uma junta militar tomou o poder e governou 
a Grécia até julho de 1974, quando ela, finalmente, se tornou uma democracia constitucional liberal. A 
economia grega conseguiu crescer apesar de guerras, insurgências, ditaduras e vida política turbulenta. 
Sete anos após abraçar a democracia constitucional, os (então) nove membros da Comunidade 
Europeia (CE) aceitaram a Grécia como décimo membro (mesmo antes da Espanha e de Portugal). Por quê? 
Embora tenha sido, em grande parte, uma decisão política, não se pode desconsiderar o seu viés econômico, 
afinal, a Grécia já acumulava décadas de forte crescimento do PIB, a despeito de todos os contratempos e 
obstáculos no caminho. Quando a Grécia entrou para a CE, a dívida pública do país representava 28% do PIB; 
o déficit orçamentário era inferior a 3% do PIB; e a taxa de desemprego estava entre 2% a 3%. 
Mas esse não foi o fim da história. 
Em 1º de janeiro de 1981, a Grécia se tornou membro da Comunidade Europeia. Dez meses depois, 
em 18 de outubro de 1981, o partido socialista de Andreas Papandreou (Pasok) chegou ao poder com uma 
agenda radical estatista e populista, que incluía a saída da Comunidade Europeia. Obviamente, ninguém seria 
tão tolo de cumprir tal promessa. Embora a Grécia tenha permanecido na Comunidade Europeia, o Pasok 
conseguiu mudar o clima político-econômico grego em apenas alguns anos. 
A crise atual na Grécia resulta, principalmente, das políticas de curto prazo do Pasok, em dois 
aspectos importantes: 
 
(a) As políticas econômicas do Pasok foram catastróficas; elas criaram uma mistura fatal de 
estado de bem-estar expansivo e ineficiente com intervenção sufocante e excesso de regulamentação do 
setor privado. 
(b) O legado politico do Pasok foi ainda mais devastador no longo prazo, dado que seu sucesso 
político transformou o Partido Conservador da Grécia (Nova Democracia) em uma cópia mal feita do Pasok. 
De 1981 a 2009, ambos os partidos ofereceram unicamente o populismo, o rentismo, o estatismo, o 
nepotismo, o protecionismo e o paternalismo. E assim permanecem até hoje. 
O desfecho atual é consequência da concorrência desastrosa entre partidos para oferecer 
patronagem, populismo assistencialista e estatismo predatório aos seus eleitores. 
 
Qual é o motor do crescimento econômico? 
 
A riqueza é criada por meio da cooperação e da troca voluntárias. Uma troca voluntária não é um 
jogo de soma zero em que ganhos são compensados por perdas. É um jogo de soma positiva que leva à criação 
de valor adicional a ser compartilhado entre os participantes. (Transações involuntárias são, com frequência, 
jogos de soma negativa, já que, nesses casos, as perdas dos perdedores são muito maiores que os ganhos dos 
vencedores; um assaltante pode te esfaquear em um beco e obter EUR 40 de sua carteira, mas a despesa 
médica e o sofrimento da vítima serão certamente muito maiores que meros EUR 40. Da mesma forma, 
esforços políticos de redistribuição de riqueza sempre envolverão o gasto de recursos escassos de ambos os 
lados – para espoliar ou evitar ser espoliado – e o total desses gastos pode ser muito superior ao valor da 
riqueza redistribuída). 
A prosperidade, quer seja chamada riqueza, desenvolvimento econômico ou crescimento, relaciona-
se positivamente ao número de transações voluntárias que ocorrem. O papel do governo nesse processo é i) 
proteger os direitos de propriedade e os contratos em que as trocas voluntárias são baseados, ii) permitir que 
as pessoas gerem riqueza (tornando, assim, os mercados “regulares” - que é o significado original de 
“regulamentação”), e iii) intervir de forma cirúrgica quando uma falha de mercado for detectada – sem 
distorcer o mercado e causar uma falha governamental ainda maior e mais desastrosa do que a que ele está 
tratando. 
Infelizmente, a maioria dos governos contemporâneos assumiu outro papel, mais ambiciosoe 
perigoso: ao invés de “regulamentar” por meio do estabelecimento de regras claras que tornam o processo 
de mercado “estável”, decide “intervir” de forma arbitrária; ao invés de facilitar as transações de mercado, 
decide obstruí-las; ao invés de proteger as transações de soma positiva, geradoras de riqueza, prefere 
substituí-las por transações de soma negativa, destruidoras de riqueza, como subsídios e gastos 
governamentais. Hoje, a maioria dos políticos acredita que se você gastar o suficiente, haverá crescimento; e 
que, se não houver crescimento, não foi gasto o suficiente. Esse caminho de aceleração do gasto público levou 
à crise grega, mas não afeta unicamente à Grécia, pois a mesma dinâmica levou ao primeiro rebaixamento da 
nota de crédito da história dos Estados Unidos, e à crise atual da dívida soberana europeia. 
O gasto é popular entre os políticos porque compra votos no curto prazo; afinal, no longo prazo, 
todos estaremos mortos, ou, pelo menos, não no poder. Da mesma forma, é popular entre os eleitores, porque 
tendem a ver os benefícios governamentais como uma receita inesperada: eles não veem o dinheiro como 
arrecadado de seu próprio bolso, mas como presenteado pelo governo ou, pelo menos, retirado do bolso de 
outrem. 
Desde 1974, os políticos gregos abandonaram os fundamentos econômicos. Depois da queda da 
ditadura militar, até mesmo o governo conservador nacionalizou bancos e corporações, subsidiou firmas, e 
aumentou os poderes do Estado de bem-estar. Não obstante, suas ações foram tímidas em comparação com 
as postas em prática no primeiro governo socialista Pasok, durante a década de 1980. Após 1981, a 
intervenção estatal aumentou, e a regulamentação e o rentismo tornaram-se a regra. Essa foi também a 
política dos governos até 2009, com duas pequenas exceções: i) um curto período no início da década de 
1990, sob reformistas conservadores, durante o qual praticamente todas as tentativas de reforma 
fracassaram miseravelmente e ii) o período anterior à entrada na Zona do Euro em 2002, sob reformistas 
socialistas. Mesmo então, os números foram mascarados e as reformas estruturais, mínimas. 
Como tanto gasto foi possível, tendo em conta que Atenas pode muito bem ser considerada a capital 
da sonegação fiscal do mundo? Como a receita governamental estava limitada por sonegação fiscal e um 
sistema tributário ineficiente, o resto do dinheiro veio de transferências da União Europeia e, é claro, de 
empréstimos. Como o colunista Thomas Friedman do The New York Times acertadamente comentou “a 
Grécia, infelizmente, logo após ter aderido à União Europeia em 1981, de fato, tornou-se simplesmente outro 
país petrolífero do Oriente Médio – só que, ao invés de poços de petróleo, ela tinha Bruxelas, que 
regularmente bombardeava subsídios, ajuda, e euros com taxas de juros baixas”. 
A tomada de empréstimos tornou-se mais fácil e barata depois que a Grécia adotou o euro em 2002. 
Depois de 2002, a Grécia desfrutou de um longo boom baseado em crédito barato e abundante, já que os 
mercados de títulos de dívida pública não mais se preocupavam com inflação alta ou moeda desvalorizada, o 
que permitiu à Grécia financiar grandes déficits em conta corrente: o resultado disso foi uma dívida pública 
insustentável de EUR 350 bilhões de euros (metade da qual devida a bancos estrangeiros). Contudo, mais 
importante, ela também levou a um efeito negativo que é raramente trazido à tona: as transferências da 
União Europeia e o dinheiro dos empréstimos foram alocados diretamente para financiar consumo, e não 
poupança, investimento, infraestrutura, modernização ou desenvolvimento institucional. 
A “festa” grega paga com o dinheiro alheio durou 30 anos e – devo admitir – realmente nos 
divertimos muito! A renda média per capita alcançou US$ 31.700 dólares em 2008, a 25ª do mundo, maior 
que a da Espanha ou a da Itália, e 95% da média da União Europeia. O gasto privado foi 12% maior que a 
média europeia, dando à Grécia o 22º lugar no IDH. Se você está impressionado, lembre que mesmo esses 
dados subestimavam de maneira grosseira a realidade, já que a economia informal grega é responsável por, 
aproximadamente, 25 a 30% do PIB! 
A renda não declarada é, sobretudo, relacionada à sonegação fiscal. Mesmo em 2010, cerca de 40% 
dos gregos não pagaram qualquer tributo, e perto de 95% das declarações fiscais eram por menos de EUR 
30.000 euros por ano. Tal sonegação fiscal generalizada custou aos cofres do Estado um valor estimado de 
EUR 20 a 30 bilhões de euros por ano, isto é, pelo menos 2/3 do déficit para 2009. 
A Grécia estava moral e economicamente mergulhada em corrupção. Considere a tragicômica, para 
não dizer infame, questão das piscinas em Atenas. Como uma piscina é indicação de riqueza na Grécia, nada 
mais normal que a Receita Federal grega usar tal informação para detectar sonegação fiscal. Em 2009, 
somente 364 pessoas declararam que tinham piscinas em casa. Fotos de satélite revelaram que existiam, na 
verdade, 16.974 piscinas privadas em Atenas. Isso significa que somente 2,1% das pessoas que eram 
proprietárias de piscinas submeteram declarações verdadeiras. A questão interessante não é por que 97,7% 
mentiram, mas sim por que 2,1% não mentiram, afinal, a sonegação fiscal na Grécia é uma prática tão comum. 
 
Dívida Grega em comparação à média da Zona do Euro 
 
Fonte: Eurostat. Veja também: http://www.rooseveltmcf.com/files/documents/ BULLX-Greece-
Aug-2011.pdf 
 
Mentir tornou-se um estilo de vida na Grécia. Ainda assim, poder-se-ia argumentar que mentir para 
proteger o que se criou é justificado. Na Grécia, todavia, a riqueza não fora criada, mas simplesmente tomada 
emprestada. Em 1980, a dívida pública representava 28% do PIB; já em 1990, 89% e, no inicio de 2010, já 
passava de 140%. O déficit orçamentário foi de menos de 3% em 1980 para 15% em 2010. Em 1980, o gasto 
governamental representava somente 29% do PIB; trinta anos depois (2009), tinha chegado a 53,1%. Esses 
números foram omitidos pelo governo grego até o ano de 2010 quando ele admitiu formalmente que não 
tinha cumprido os critérios de adesão (Critérios de Copenhague) para se unir à Zona do Euro. O governo grego 
tinha mesmo contratado firmas de Wall Street - com destaque para a Goldman Sachs - para ajudá-lo a 
mascarar os números e enganar os credores. 
 
Esse estado deprimente da economia grega foi o resultado de dois fatores: 
 
• a grave ineficiência e corrupção do Estado de bem-estar grego; e 
• o emaranhado de obstáculos criados por intervenções assistencialistas a transações 
econômicas voluntárias. 
 
De acordo com a publicação do Banco Mundial Doing Business 2012, a Grécia estava na 100ª posição 
entre 183 países ao redor do mundo em termos de facilidade geral de fazer negócios. Foi, é claro, o pior 
colocado entre os países da União Europeia, e os da OECD. A Grécia, membro da União Europeia nos últimos 
30 anos, membro da Zona do Euro nos últimos 10 anos, o 25º país mais rico do planeta, ficou classificado atrás 
de Colômbia, Ruanda, Vietnã, Zâmbia e Cazaquistão. Como o Wall Street Journal coloca: “um país tem que 
trabalhar duro para ir tão mal”. A política governamental grega era hostil ao livre comércio e à propriedade 
privada, obstruindo severamente a mobilidade do capital e do trabalho, geralmente em nome da 
“solidariedade social” e da “justiça”. 
 
A Grécia odeia os negócios (a lista de indicadores você pode verificar aqui para montar a planilha) 
 
Fonte: http://online.wsj.com/article/SB10001424052748703961104575226651125226596.html 
 
Para abrir um negócio na Grécia em 2010, você precisava de, em média, 15 dias e EUR 1.101 euros, 
quando a média no resto da EU era de 8 dias e somente EUR 417 euros. O pagamento de impostos tomava 
224 horas por ano na Grécia; no estado mais rico da UE, Luxemburgo, levava somente 59. O ranking de 
proteção aos investidores era deplorável: 154º entre 183 países. O melhor tópico da Grécia era a facilidade 
de fechar um negócio: 43ª posição.Praticamente todas as profissões na Grécia são, em certa medida, 
altamente regulamentadas e cartelizadas, o que impõe custos aos consumidores, e obstrui a criação de 
riqueza. Some a isso uma burocracia terrivelmente ineficiente que custa à Grécia 7% do seu PIB, o dobro da 
média da EU. 
Burocracias intervencionistas tendem a alimentar a corrupção. De acordo com o relatório da 
Transparência Internacional, o custo da corrupção de pequena escala foi em torno de EUR 800 milhões de 
euros (EUR 1,08 bilhão) em 2009, um aumento de EUR 39 milhões de euros em relação a 2008. 
 
Tamanho da Economia informal em 2007, em % do PIB 
 
 
Fonte: http://online.wsj.com/article/SB10001424052748704182004575055473233674214.html 
 
De acordo com o World Investment Report da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e 
Desenvolvimento (UNCTAD), a Grécia está classificada em 119º de 141 países em investimentos externos 
diretos (IED). 
Não é de admirar que mais de 50% dos jovens gregos esteja desempregado. É esse o resultado de 
um ambiente de negócios que desencoraja o empreendedorismo, em que os custos burocráticos são altos e 
existe muita corrupção na política. O Estado de bem-estar grego convenceu muitos de que seus benefícios 
tem o status de “direitos sociais”. Seria suicídio político para um político ou um partido político fazer cortes 
significativos quando uma população foi acostumada a tantos “direitos” concedidos pelo Estado, e quando a 
uma população em processo de envelhecimento foi prometido um pacote generoso de benefícios de saúde e 
pensões. 
http://portugues.doingbusiness.org/rankings
A Grécia é o exemplo clássico da geração de “direitos” insustentáveis. O governo gasta EUR 10.600 
euros por pessoa em benefícios sociais que geram somente EUR 8.300 euros por pessoa em receitas. Isso 
deixa um déficit de EUR 2.300 euros por pessoa! 
 
A Tragédia Grega – um olhar sobre a crise econômica grega 
 
Menos da metade da PEA está empregada 
Mais de 1/3 da mão de obra jovem está desempregada 
Tamanho estimado da economia informal 
O governo gasta aproximadamente metade do orçamento em benefícios sociais 
Fonte: http://fxtrade.oanda.com/analysis/infographics/ greece-economic-crisis 
 
Ao mesmo tempo, os salários no setor público aumentaram em termos reais (de 1996 a 2009) em 
44%. Em alguns setores, 86%. Os empregados receberam o equivalente a 14 salários por ano, incluindo dois 
pagamentos adicionais como bônus (um no Natal, e outro dividido em duas partes: na Páscoa e nas férias de 
verão). As pensões também aumentaram substancialmente. 
Um homem grego com 35 anos de trabalho no setor público tinha o direito de se aposentar com 
uma generosa pensão aos 58 anos de idade. Uma mulher grega poderia se aposentar ainda mais cedo; se uma 
mulher menor de idade tivesse um filho, ela poderia se aposentar com 50 anos. A idade média de 
aposentadoria na Grécia era 61 anos de idade; na Alemanha, 67. Projeta-se que a população grega acima de 
65 anos crescerá de 18% da população total em 2005 para 25% em 2030. 
Poder-se-ia argumentar que, apesar do custo do Estado de bem-estar (19% do PIB em 1996, mas 
29% em 2009), pelo menos, ele oferece alguma sensação de segurança, além de limitar a desigualdade. Não 
na Grécia! Mesmo que a saúde e a educação sejam providas “gratuitamente” pelo Estado, a família grega 
paga 45% do gasto médico total (sobretudo em propinas a médicos, enfermeiras e servidores públicos para 
fazerem o seu trabalho). Muitas famílias gregas (2,5%) entram em falência todos os anos por causa de altos 
custos médicos. O mesmo se aplica à educação. Mesmo que seja “gratuita” em todos os níveis, as famílias 
gregas gastam mais com a educação de seus filhos (com aulas particulares) do que qualquer outro país da 
União Europeia. 
A grande festa financiada por empréstimos está acabando, e a ressaca se avizinha. Agora é hora de 
recuperar a sobriedade, em vez de buscar novamente o licor da dívida publica. Rentismo e corrupção deveriam 
ser combatidos; e os mercados, liberados. As pessoas deveriam ter liberdade para criar riqueza por meio da 
troca voluntária. A cleptocracia grega deveria ser substituída pelo estado de direito. Uma rede de proteção 
para os pobres não deveria ser desculpa para benefícios exorbitantes a poderosos e ricos que deixaram pobres 
e incapazes em situação pior que, de outra forma, estariam. 
A lição é que o desenvolvimento econômico e a prosperidade não advêm de empréstimos e gastos 
governamentais. A prosperidade advém do mercado, das transações voluntárias, da poupança, do 
investimento, do trabalho, da produção e do comércio. O governo tem um importante trabalho a fazer: criar 
e fortalecer o estado de direito, a segurança, e as instituições legais que viabilizam aquelas transações 
voluntárias; o governo negligencia suas responsabilidades quando cria, ao invés disso, grandes burocracias, 
privilégios insustentáveis, e um sistema de roubo, corrupção, privilégio e desonestidade. 
O problema da Grécia é severo e não será resolvido de um dia para o outro. No entanto, ele pode 
ser resolvido com o remédio adequado. 
 
 
 
 
 
 
Seção II 
 
A história do Estado de Bem-Estar 
O Estado e o que ele substituiu 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O legado de Bismarck 
Por Tom G. Palmer 
 
Para entender o funcionamento e o impacto do Estado de bem-estar, é fundamental entender a sua 
origem. Neste ensaio, dedico-me a revelar a natureza do Estado de bem-estar como sistema político projetado 
para perpetuar o poder daqueles que o criaram. A origem do Estado de bem-estar remonta à introdução de 
esquemas de seguro obrigatório na Alemanha Imperial, passando pelos sistemas contemporâneos existentes 
na Europa e nos Estados Unidos. Apesar de ele ter, indiretamente, desmantelado as instituições voluntárias 
preexistentes, elas servem de exemplo de que é possível a formação de sociedades de pessoas independentes, 
responsáveis, dignas de respeito e prósperas – sem a existência de um Estado de bem-estar. 
 
Estado de bem-estar é distinto de Estado socialista. Socialismo implica, no mínimo, a tentativa de 
planificar a economia como um todo – planejamento central – e, o mais das vezes, o total controle estatal dos 
meios de produção; em resumo, implica a tentativa consciente de usar o planejamento estatal para a alocação 
de capital e trabalho entre usos concorrentes. Um Estado socialista tentará, portanto, planejar e gerir a 
produção de papel, de veículos, de alimentos, de remédios, de roupas, etc. Exemplos de tentativas de criação 
de estados socialistas incluem a União Soviética e seus países-satélites, Cuba, e a República Popular da China 
antes de sua reforma parcial em direção à liberalização de mercados e à instituição da propriedade privada. 
Em contraste, um Estado de bem-estar não exige o controle estatal dos meios de produção como um todo, 
embora nele seja comum a manutenção do controle estatal sobre alguns setores diretamente ligados à 
provisão dos chamados bens públicos, a saber, educação, saúde, recreação e habitação. 
O estado de bem-estar não busca centralizar a gestão de toda a atividade produtiva, contudo, toma 
para si a responsabilidade pelo bem-estar da população. Ele é mais abrangente que o governo limitado dos 
liberais clássicos, o qual provê justiça, segurança, estado de direito e, talvez, uma lista restrita de “bens 
públicos”. Um estado liberal clássico limita-se a criar condições pacíficas dentro das quais as pessoas são livres 
para buscar seu próprio bem-estar. Em contraste, o estado de bem-estar assume a responsabilidade por 
assegurar o bem-estar das pessoas, e não somente de criar as condições sob as quais elas poderiam buscá-lo 
por conta própria; dessa forma, o estado de bem-estar tende a dominar, ou mesmo a monopolizar, a provisão 
de pensões e aposentadorias, saúde, educação e renda básica, além de organizar programas substanciais de 
transferência de renda amiúdejustificados em nome da transferência de renda dos “ricos” para os “pobres”, 
embora, normalmente, a maior parte das transferências ocorra entre os ricos18. 
O estado de bem-estar não transfere recursos exclusiva ou mesmo primariamente para os pobres. 
De muitas maneiras, o estado de bem-estar vitimiza os pobres em benefício dos que são capazes de manipular 
o sistema. (O mesmo estado de bem-estar que disponibiliza “vale-refeição” e outros subsídios de alimentação 
aos pobres é o mesmo que aumenta o preço do alimento na gôndola via subsídios agrícolas, restrições à 
importação de alimentos mais baratos, e aprovação de resoluções e decretos, por exemplo). O estado de bem-
estar alcança estabilidade política ao criar grandes eleitorados em todos os estratos sociais, dos mais ricos aos 
mais pobres. Ele não está essencialmente focado na “redistribuição” de renda para os mais pobres, haja vista 
que grande parte da redistribuição de riqueza ocorre, de fato, na direção contrária, dos pobres para os ricos. 
Nas sociedades ricas, a maior parte da redistribuição de renda se dá na classe média, com o dinheiro sendo 
tirado de um bolso e colocado em outro, menos os custos de transação e ineficiências gerados pela burocracia, 
pela politicagem e pelo capitalismo de compadrio19. 
 
Origens do Estado de bem-estar 
 
Em sua forma moderna, o estado de bem-estar se origina ao final do século XIX na Alemanha, em 
uma manobra política e de “construção do Estado” proposta pelo estadista alemão Otto von Bismarck - o 
chanceler de ferro - que derrotou militarmente a França e a Áustria, e unificou, “à ferro e fogo”, todos os 
 
18 Eles também geraram um conjunto de medidas de “legislação moral” para direcionar o comportamento ao que é considerado 
virtuoso pelas elites políticas. Entre as medidas aprovadas, a criminalização da prostituição, a esterilização dos “moralmente 
degenerados”, a proibição de intoxicantes variados (álcool, maconha, ópio, etc), o banimento do casamento interracial, a 
perseguição e criminalização de práticas sexuais de minorias, a coibição de comportamento considerado muito arriscado e, de forma 
geral, a supressão de substâncias e comportamentos julgados incompatíveis com o bem-estar do povo. Nos anos recentes, com a 
mudança de tradições e costumes populares, o estado de bem-estar tendeu a se adequar a elas, mas a história de tais estados 
“progressistas” é, sobretudo, uma história de censura e repressão moralista. 
19 SHAPIRO, Daniel. Is the Welfare State Justified? p. 149. Daniel Shapiro destaca que o “racionamento governamental normalmente 
favorece a classe média instruída, conectada e bem-motivada”. 
 
estados germânicos em uma única nação, o II Reich. Bismarck travou uma longa guerra política com os liberais 
clássicos na Alemanha, os quais preferiam o uso de meios pacíficos para a criação de uma nação próspera, 
assim como a manutenção da paz para com os países vizinhos, em vez da guerra, da colonização e do 
militarismo. Como parte de seu programa de “construção do Estado” na Europa Central, Bismarck foi pioneiro 
do estado de bem-estar, o qual, desde então, tem colonizado grande parte da esfera política do mundo. 
Bismarck introduziu o estado de bem-estar alemão através de uma série de regimes de seguros obrigatórios 
contra acidentes, doença, invalidez e velhice - aprovados por lei na década de 1880. O chanceler militarista 
Bismarck chamou essas medidas de “socialismo de estado” e, em 1882, declarou que “muitas das medidas 
que temos adotado para a grande benção do país são socialistas, e o Estado terá que se acostumar com um 
pouco mais de socialismo20”. 
O historiador A. J. P. Taylor explicou que “Bismarck queria tornar os trabalhadores mais dependentes 
do Estado e, portanto, dele21”. Acima de tudo, esse foi um estratagema político para criar uma população 
dependente imbuída de uma ideologia de coletivismo nacional. 
Bismarck confirmou que o propósito de seu “socialismo de estado” era gerar a dependência e, por 
conseguinte, a lealdade, de que uma Alemanha poderosa necessitava para dominar a Europa: 
 
Quem tem uma pensão por idade avançada é muito mais feliz, e muito mais fácil de controlar que 
alguém sem tal perspectiva. Olhe a diferença entre um funcionário privado e um funcionário público 
da chancelaria ou da corte; o último trabalhará muito mais, afinal, ele tem uma aposentadoria a sua 
espera22. 
 
Considerarei um grande avanço quando tivermos 700 mil pequenos pensionistas sacando suas 
anuidades do Estado, especialmente se pertencerem àquelas classes que, de outro modo, não tem 
muito a perder se rebelando e acreditando erroneamente que podem ganhar muito mais ao fazer 
isso23. 
 
Taylor concluiu que “a seguridade social tem certamente tornado as massas menos independentes 
em todos os lugares; ainda assim, mesmo o apóstolo mais fanático da independência hesitaria em 
desmantelar o sistema inventado por Bismarck que todos os outros estados democráticos vieram a copiar24”. 
De fato, o estado de bem-estar tornou as massas “menos independentes em todos os lugares”, isto é, mais 
dependentes em todos os lugares. Hoje, todavia, chegamos ao ponto em que podemos e devemos ousar 
desmantelar “o sistema inventado por Bismarck”, pois os estados de bem-estar do mundo, fatalmente, 
passaram dos limites. 
Foi o colapso do inchado / sobrecarregado estado de bem-estar da República de Weimar na década 
de 30, reconhecido, na época, como o estado de bem-estar mais avançado do mundo25, que introduziu a 
ditadura, a guerra, e o estado de bem-estar mais predatório e cruel que se tem notícia, o III Reich. Como o 
 
20 Citado em LINDSEY, Brink. Against the Dead Hand: The Uncertain Struggle for Global Capitalism. New York: John Wiley & Sons, 
2002. p. 33. 
21 TAYLOR, A. J. P. Bismarck: The Man and the Statesman. (1955). New York: Sutton Publishing, 2003. p. 204. Taylor salienta que uma 
das partes do plano de Bismarck foi derrotada no Reichstag; ele desejava que uma parte da “contribuição” adviesse diretamente do 
orçamento estatal. Em vez disso, o Reichstag só impôs uma contribuição a ser paga diretamente pelo empregado, e outra, 
supostamente, a ser paga “pelo empregador”. Como os economistas sabem, todavia, 100% do peso de ambas as “contribuições” 
recaia sobre o empregado, pois era extraída totalmente do que, de outra forma, seria pago em salários; os empregadores pagarão 
o valor pelo trabalho feito e nada mais, tendendo à indiferença quanto ao valor que o empregado recebe em dinheiro. Bismarck foi 
precursor da ideia de um estado formado por “associações corporativas”, que representavam grupos de interesse, ao invés de 
associações de cidadãos com direitos individuais. Como Taylor nota, “o conceito foi levado adiante em sua ênfase nos grupos de 
interesse ao invés de princípios elevados, cuja expressão e meios seriam retomados novamente pelos exponentes do Fascismo no 
século XX”. p. 204. O empilhamento de tributos adicionais sobre o trabalho na forma de “parcela patronal” das contribuições de 
previdência social colaborou para o colapso do sistema parlamentar da República de Weimar. Como Jürgen von Kruedener nota, o 
colapso “foi a consequência da expansão de políticas assistencialistas do Estado, para as quais o salário e o encargos salariais 
contribuíram como uma grande causa”. p. 376. KRUEDENER, Jürgen von. Die Überforderungen der Weimarer Republik als 
Sozialstaat. Geschichte und Gesellschaft, 11, no. 3 (1985), p. 358–376. 
22 TAYLOR, A. J. P. Bismarck: The Man and the Statesman. p. 203. 
23 Speech of May 18, 1889. In KELLEY, David. A Life of One’s Own: Individual Rights and the Welfare State. Washington, DC: Cato 
Institute, 1998. p. 39. 
24 TAYLOR, A. J. P. Bismarck: The Man and the Statesman. p. 203. Taylor destaca que Bismarck foi pioneiro em uma ampla gama de 
esquemas de assistencialismo estatal, e “ao final, falou do ‘direito ao trabalho’

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