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FACULDADE LEGALE INSTITUIÇÕES DO DIREITO EULÁLIA FERREIRA DOMINGOS FORTUNA, RENATA PINHEIRO DOS SANTOS E MARCOS DANIEL FERREIRA COMPÊNDIO DE INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO – CAPÍTULO III Conceitos Jurídicos Fundamentais SÃO PAULO – SP 2020 EULÁLIA FERREIRA DOMINGOS FORTUNA, RENATA PINHEIRO DOS SANTOS E MARCOS DANIEL FERREIRA COMPÊNDIO DE INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO – CAPÍTULO III Conceitos Jurídicos Fundamentais Trabalho da Disciplina de Instituições do Direito (Dissertação) Professor Jadilson Vigas SÃO PAULO – SP 2020 Sumário 1.DIREITO POSITIVO ................................................................................................. 1 A. Noção Do Direito ................................................................................................. 1 B.Direito Objetivo E Direito Subjetivo ....................................................................... 2 C. DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO ......................................................... 4 C.1 Fundamentos dessa divisão ........................................................................... 4 C.2. Divisão geral do direito positivo ..................................................................... 5 C.3. Ramos do direito público ............................................................................... 6 C.4.Ramos do direito privado ............................................................................. 10 2.FONTES JURÍDICAS: ............................................................................................ 16 A.Noção e Classificação das Fontes do Direito ..................................................... 16 B.Fontes Formais e Materiais: ............................................................................... 18 C.FONTES FORMAIS ESTATAIS: ........................................................................ 19 Legislação como fonte do direito ........................................................................ 19 2.Produção Jurisprudencial ................................................................................ 24 c.2.3. Poder normativo do juiz ................................................................................ 28 D. Fontes formais não estatais .............................................................................. 30 d.2. Atividade científico-jurídica .......................................................................... 35 d.3. Poder negocial ............................................................................................. 39 3. Norma Jurídica ...................................................................................................... 43 B. Realidade ôntica da norma jurídica ................................................................... 48 C. Conceito essencial da norma de direito ............................................................. 49 c.2. Conceito como objeto Ideal ............................................................................. 52 c.3. Elementos essenciais da norma jurídica ...................................................... 53 c.4. Conceito de norma jurídica .......................................................................... 61 D. Distinção entre norma moral e jurídica .............................................................. 62 E. Classificação das normas jurídicas .................................................................... 64 F. Validade da norma jurídica ................................................................................ 69 f.2. Validade formal ou vigência .......................................................................... 70 f.3. Validade fática ou eficácia ............................................................................ 76 f.4. Validade ética ou fundamento axiológico ...................................................... 76 4. Aplicação do direito ............................................................................................... 81 A. Problemática da aplicação jurídica .................................................................... 81 B. Interpretação das normas e subsunção ............................................................. 85 b.1. Conceito, funções e caráter necessário da interpretação ............................ 85 b.2. Questão da vontade da lei ou do legislador como critério hermenêutico ... 87 b.3. Técnicas interpretativas ............................................................................... 88 b.4. Efeitos do ato interpretativo ......................................................................... 91 C. Integração e o problema das lacunas no direito-464 ......................................... 92 c.1. Localização sistemática do problema das lacunas jurídicas ........................ 92 c.2. Questão da existência das lacunas.............................................................. 93 c.3. Constatação e preenchimento das lacunas ................................................. 98 D. Correção do direito e antinomia jurídica .......................................................... 106 d.1. Noção de antinomia jurídica ...................................................................... 106 d.2. Classificação das antinomias ..................................................................... 107 d.3. Critérios para solução das antinomias ....................................................... 108 d.4. Antinomias de segundo grau e os metacritérios para sua resolução ......... 109 d.5. Incompletude dos meios de solução das antinomias jurídicas .................. 109 E. Tópica como forma de argumentação do aplicador do direito ......................... 110 F. Papel da ideologia na aplicação jurídica .......................................................... 111 G. Limites do ato de decisão judicial .................................................................... 112 5. RELAÇÃO JURÍDICA .......................................................................................... 112 A. CONCEITO E ELEMENTOS ........................................................................... 113 B. SUJEITO DE DIREITO .................................................................................... 113 b.1 Personalidade ............................................................................................. 113 b.2 Pessoa Natural ........................................................................................... 114 b.3 Pessoa Jurídica .......................................................................................... 115 C. OBJETIVO IMEDIATO E MEDIATO ................................................................ 116 D. FATO JURÍDICO ............................................................................................. 116 E. PROTEÇÃO JURÍDICA ................................................................................... 117 Bibliografia............................................................................................................... 118 1 1.DIREITO POSITIVO A. Noção Do Direito Todo conhecimento jurídico necessita do conceito do direito. O conceito é um esquema prévio, munido do qual o pensamento se dirige à realidade, desprezando seus vários setores e somente fixando aquele que corresponde às linhas ideais delineadas pelo conceito. A definição essencial do direito é problema supra científico, constituindo campo próprio das indagações da ontologia jurídica, que deverá encontrar um conceito que purifique o direito de notas contingentes. O conceito universal deve afastar-se de todo conteúdo, por ser variável, heterogêneo, acidental, contendo apenas a essência que se encontra em toda multiplicidade. Portanto não é da alçada do juristaelaborar o conceito geral ou especial do direito, porém, ante o princípio metódico da divisão do trabalho, é imprescindível a decomposição analítica do direito, que é objeto de várias ciências: sociologia jurídica, história do direito etc., para delimitar o aspecto em que será abordado. Ora, percebe – se que o direito só pode existir em função do homem. O ser humano é gregário por natureza, não só pelo instinto sociável, mas também por força de sua inteligência, que lhe demonstra que é melhor viver em sociedade para atingir seus objetivos. O homem é essencialmente coexistência, pois não existe apenas, mas coexiste, isto é, vive necessariamente em companhia de outros indivíduos. Com isso, espontânea e até inconscientemente, é levado a formar grupos sociais: família, escola associações esportiva, recreativa, cultural, religiosa, profissional, sociedades agrícolas, mercantil, industrial, grêmio, partido político etc. Como o ser humano encontra-se em estado convivencial, é levado a interagir; assim sendo, acha – se sob a influência de alguns homens e está sempre influenciando outros. E como toda interação perturba os indivíduos em comunicação 2 recíproca, para que a sociedade possa conservar-se é preciso delimitar a atividade das pessoas que a compõem, mediante normas jurídicas. Se observarmos, atentamente, a sociedade, verificaremos que os grupos sociais são fontes inexauríveis de normas. De modo que uma norma só será jurídica se estiver conforme a ordenação da sociedade política; logo, o Estado é o fator de unidade normativa da nação. De um lado a realidade nos mostra um pluralismo de ordenações jurídicas, e, de outro, a unidade da ordem normativa. A norma jurídica pertence à vida social, pois tudo o que há na sociedade é o suscetível de revestir a forma da normatividade jurídica. Se assim não fosse, a norma jurídica seria, na bela e exata expressão de um fantasma de direito, uma reunião de palavras vazias. A norma não corresponderia a sua finalidade: seria no seio da sociedade, elemento de desordem, anarquia e desequilíbrio ou, ainda uma violência inútil, instrumento de arbítrio e de opressão. Abstraindo – se do homem e da sociedade, alhear – se – ia de sua própria finalidade e de suas funções, passaria a ser uma pura ideia, criação cerebrina e arbitrária. Portanto é mediante normas que o direito pretende obter o equilíbrio social, impedindo a desordem e os delitos, procurando proteger a saúde e a moral pública, resguardando os direitos e a liberdade das pessoas. Logo, os elementos do direito – fato, valor e norma – coexistem numa unidade concreta. B. Direito Objetivo E Direito Subjetivo Costuma-se distinguir o direito objetivo do subjetivo. O direito objetivo é o complexo de normas jurídicas que regem o comportamento humano, prescrevendo uma sanção no caso de sua violação. O direito subjetivo, é a permissão, dada por meio de norma jurídica válida, para fazer ou não fazer alguma coisa, para ter ou não ter algo, ou, ainda, a autorização para exigir, por meio dos órgãos competentes do poder público ou 3 através dos processos legais, em caso de prejuízo causado por violação de norma, o cumprimento da norma infringida ou a reparação do mal sofrido. Compreende – se que duas são as espécies de direito subjetivo: 1° O comum da existência, que é a permissão de fazer ou não fazer, de ter ou não ter alguma coisa, sem violação de preceito normativo. Como por exemplo: o direito de ter um nome, de domicílio, de ir e vir, de casar, de trabalhar, de alienar bens, entre outros. 2° O de defender direitos ou de proteger o direito comum da existência, ou seja, a autorização de assegurar o uso do direito subjetivo, de modo que o lesado pela violação da norma está autorizado, por ela, a resistir contra a ilegalidade, a fazer cessar o ato ilícito, a reclamar reparação pelo dano a processar criminosos, impondo-lhes pena. O direito subjetivo é subjetivo porque as permissões, com base na norma jurídica e em face dos demais membros da sociedade, são próprias das pessoas que as possuem, podendo ser ou não usadas por elas. Ante essa concepção, não podem ser aceitas as três teorias sobre a natureza do direito subjetivos consagradas pela doutrina tradicional, que são: 1) A da vontade, que entende que o direito subjetivo é o poder da vontade reconhecido pela ordem jurídica; 2) A do interesse, para a qual o direito subjetivo é o interesse juridicamente protegido por meio de uma ação judicial. O direito subjetivo abrangeria um elemento material, que é o interesse, e um elemento formal, a proteção desse interesse pelo direito; 3) A mista, que define o direito subjetivo como o poder da vontade reconhecido e protegido pela ordem jurídica, tendo por objeto um bem ou interesse; de Saleilles, concebendo – o - como um poder colocado a serviço de interesses de caráter social e exercido por uma vontade autônoma; 4 Nítida é a correlação existente entre o direito objetivo e o subjetivo. Apesar de intimamente ligados, são inconfundíveis. O direito objetivo é sempre um conjunto de normas impostas ao comportamento humano, autorizando o indivíduo a fazer ou não fazer algo. Estando, portanto, fora do homem, indica-lhe o caminho a seguir, prescrevendo medidas repressivas em caso de violação de normas. Direito subjetivo é sempre a permissão que tem o ser humano de agir conforme o direito objetivo. Um não pode existir sem o outro. O direito objetivo existe em razão do subjetivo, para revelar a permissão de praticar atos. O direito subjetivo, por sua vez, constitui-se de permissões dadas por meio do direito objetivo. C. DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO C.1 Fundamentos dessa divisão A clássica divisão do direito em público e privado é oriunda do direito romano. O direito público era aquele concernente ao estado dos negócios romanos; o direito privado, o que disciplinava os interesses particulares. Em razão disso houve autores que concluíram que o fundamento dessa divisão se encontrava no interesse preponderante. Assim, as normas de direito público seriam as que assegurariam diretamente o interesse da sociedade e indiretamente o do particular; e as de direito privado visariam atender imediatamente o que convém aos indivíduos e mediatamente ao poder público. Entretanto, esse critério é insatisfatório; tão interligados estão os interesses que é impossível verificar, com exatidão, qual o que prepondera. É, portanto, inidôneo separar o interesse público do privado e admitir que o útil aos cidadãos seja antagônico à utilidade pública. Modernamente, recusa-se a utilidade ou interesse como fator exclusivo da diferenciação em tela. Enquanto no direito público o todo se apresenta como fim e o indivíduo permanece em segundo plano, no direito privado cada indivíduo, considerado em si, constitui o fim deste ramo do direito e a relação jurídica apenas serve como meio para a sua existência e 5 para as suas condições particulares. Esta concepção não teve grande aceitação, pois o Estado também pode ser fim de relação jurídica regulada pelo direito privado, como no caso em que for parte num contrato de compra e venda. Outro critério foi proposto, ao sustentar que o cerne da questão está em que o direito privado regulamenta relações dos indivíduos considerados como tais e o direito público, a organização, relações e funções daqueles que têm poder de império, ou seja relações entre sujeitos dotados de imperium e relações entre esses sujeitos e os que se submetem ao seu imperium. Para ele só têm poder de império o Estado e os entes similares. Está tese é imperfeita porque mesmo os sujeitos dotados de imperium podem ser sujeitos de direito privado, como na hipótese em que o Estado é parte num contrato de compra e venda ou num contrato de locação, pois se um particular vende ou aluga um imóvel ao Estado, este, enquantocontratante, está no mesmo nível daquele. Também entendem que o direito público seria um direito de subordinação, havendo desigualdade nas relações jurídicas, com o primado da justiça distributiva, e o direito privado seria um direito de coordenação, em que as partes encontrar-se- iam em absoluta igualdade, subordinadas a justiça comutativa. A maioria dos juristas entende ser impossível uma solução absoluta ou perfeita do problema da distinção entre direito público e privado. Embora o direito objetivo constitua uma unidade, sua divisão em público e privado é aceita por ser útil e necessária, não só sob o prisma da ciência do direito, mas também do ponto de vista didático. C.2. Divisão geral do direito positivo O direito público apresenta normas que regem as relações em que o sujeito é o seu Estado. Pertencem ao direito público interno: o direito constitucional, que visa regulamentar a estrutura básica do Estado, disciplinando a sua organização ao tratar da divisão dos poderes, das funções e limites de seus órgãos e das relações entre governantes e governados; o direito administrativo, que é o conjunto de normas que regem a atividade estatal, exceto no que se refere aos atos 6 jurisdicionais e legislativos, objetivando a consecução de fins sociais e políticos ao regulamentar a atuação governamental, a administração dos bens públicos etc.; No direito público externo, temos o direito internacional, que pode ser público, se constitui de normas disciplinadoras das relações entre Estados, ou privado, se rege as relações do Estado com cidadãos pertencentes a Estados diversos, mas sem embargo desta opinião majoritária, entendemos ser o direito Internacional privado um ramo do direito público interno, apenas no sentido de conter normas internas de cada país que autorizam o juiz nacional a aplicar ao fato interjurisdicional a norma a ele adequada. O privado trata das relações jurídicas entre particulares, constituindo, o direito privado abrange o direito civil, que regulamenta os direitos e deveres de todos os indivíduos, enquanto tais, contendo normas sobre o estado e capacidade das pessoas e sobre as relações atinentes à família, às coisas, às obrigações e sucessões; o direito comercial ou empresarial, que disciplina a atividade do empresário , e de qualquer pessoa, física ou jurídica, destinada a fins de natureza econômica, desde que habitual e dirigida à produção de resultados patrimoniais; o direito do trabalho, regendo as relações entre empregador e empregado, compreendendo normas sobre a organização do trabalho e da produção; e o direito do consumidor; conjunto de normas disciplinadoras das relações de consumo existentes entre fornecedor e consumidor. C.3. Ramos do direito público C.3.1. Direito público interno C.3.1.1. Direito constitucional O direito constitucional engloba normas jurídicas atinentes à organização político-estatal nos seus elementos essenciais, definindo o regime político e a forma de Estado, estabelecendo os órgãos estatais substanciais, suas funções e relações 7 com os cidadãos ao limitar suas ações, mediante o reconhecimento e garantia de direitos fundamentais dos indivíduos, de per si considerados, ou agrupados, formando comunidades. Portanto o direito constitucional contém normas alusivas à organização básica do Estado, que além de estipular a forma da federação brasileira, discriminando o que compete de maneira privativa ou concorrente à União, aos Estados e Municípios, e de distribuir as esferas de competência do exercício do poder político, estabelecendo as condições do regime presidencial, determinando os campos de atuação do Poder Executivo, Legislativo e judiciário, assegura os direitos fundamentais dos indivíduos para com o Estado, ou como membros da comunidade política, não só na seara política, mas também no plano jurídico, social e econômico- financeiro e os direitos e garantias fundamentais. Na constituição apresentam-se dois tipos de normas: as que determinam como outras serão feitas, indicando os limites e os processos de sua elaboração, e as que repercutem imediatamente sobre o comportamento; estas últimas são constitucionais, não por sua matéria (que é dizer como devem ser feitas as normas gerais), mas pela sua forma, porque estão submetidas a certas formalidades de elaboração e de alteração (quórum especial). A Constituição pode ser: a) Escrita, por designar um conjunto de normas reunidas num só corpo. b) Não escrita, por ser composta de normas esparsas, em regra consuetudinárias, que não se encontram reunidas num só texto formando um conjunto único. A constituição não escrita, como é a inglesa, é flexível, poder ser alterada pelos meios ordinários, pelos processos comuns de modificação de qualquer lei. O direito constitucional é a esfera da ordenação estatal que está intimamente relacionada com todas as demais, como direito administrativo, o direito penal, o direito processual civil e o direito internacional público. 8 Os ramos do direito privado, por sua vez, retiram do direito constitucional seus vários caracteres e, principalmente, aqueles seus institutos referentes às liberdades públicas, assim como suas garantias. O direito constitucional exerce influência marcante no civil, com suas normas sobre família, propriedade etc.Com o direito comercial , ou empresarial, é marcante sua relação no que concerne à livre concorrência, às marcas de indústria, ao nome empresarial, à navegação de cabotagem, ao regime bancário, às empresas de seguro etc. Tem também relacionamento concreto com o direito do trabalho, no tocante à legislação do trabalho e previdência social. C.3.1.2 Direito administrativo. Inclui normas reguladoras do exercício de atos administrativos, praticados por quaisquer dos poderes estatais, com o escopo de atingir finalidades sociais e políticas ao regulamentar a atuação governamental, estruturando as atividades dos órgãos da administração pública: a execução dos serviços públicos; a ação do Estado no campo econômico; a administração dos bens públicos e o poder de polícia. C.3.1.3 Direito tributário e financeiro É o direito tributário um conjunto de normas que aludem, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos (impostos, taxas e contribuições), devidos pelos cidadãos ao governo. O direito tributário é, portanto, a ordenação jurídica da atividade desenvolvida pelo governo, para obter e aplicar os meios econômicos indispensáveis à consecução de seus fins. Já o direito financeiro tem por escopo regular a despesa e a receita públicas. C.3.1.4 Direito processual O direito processual tem por finalidade regular a organização judiciária e o processo judicial, referente à ação de julgar os litígios, reintegrando a ordem estatal, 9 ao disciplinar a forma para fazer atuar as normas jurídicas e as consequentes relações definidas em outros ramos jurídicos de direito substantivo. O direito processual rege não só a atividade jurisdicional do Estado para a aplicação das normas jurídicas gerais ao caso sub judice, mas também a organização do Poder Judiciário, a determinação da competência dos funcionários que o integram, a atuação do órgão judicante e das partes na substanciação do processo ou do juiz. C.3.1.5 Direito Penal É o conjunto de normas atinentes aos crimes e às penas correspondentes. Regula a atividade repressiva do Estado, para preservar a sociedade do delito. Suas normas regulam os atos que atentam, direita ou indiretamente, contra a ordem social, pondo-a em perigo, lesando os direitos dos indivíduos, determinando as pernas e as medidas de segurança aplicáveis. Em suma, é o ramo do direito público interno que define, típica e sanciona as contravenções (prática de jogo de azar, exercício ilegal de profissão etc.) e os crimes (homicídio, lesão corporal,furto, roubo, bigamia, estelionato, estrupo, assédio sexual etc.). C.3.1.6. Direito previdenciário O direito previdenciário é um conjunto de normas relativas às contribuições para o seguro social e aos benefícios dele oriundos, como, por exemplo: pensões, auxílios e aposentadorias etc. C.3.2. Direito público externo C.3.2.1. Direito internacional público 10 O direito internacional público é o conjunto de normas consuetudinárias e convencionais que regem as relações, diretas ou indiretas, entre Estados e organismos internacionais ( ONU, UNESCO, OIT, OMS, FAO), que as consideram obrigatórias, Regula, portanto, relações de coordenação e não de subordinação, porque os Estados são igualmente soberanos. C.3.2.2. Direito internacional privado O direito internacional privado regulamenta as relações do Estado com cidadãos pertencentes a outros Estados, dando soluções aos conflitos de leis no espaço ou aos de jurisdição. É preciso esclarecer que o direito internacional privado não disciplina as relações supranacionais, pois tão somente determina quais normas, deste ou daquele outro ordenamento jurídico, são aplicáveis no caso de haver conflito de leis no espaço. C.4.Ramos do direito privado C.4.1. Direito civil Seu conceito passou por uma evolução histórica. Passou a ser um dos ramos do direito privado, por regulamentar as relações entre particulares. Contém o Código Civil duas partes: a geral, que apresenta normas concernentes às pessoas, aos bens, aos fatos jurídicos, aos atos e negócios jurídicos, desenvolvendo a teoria das nulidades e os princípios reguladores da prescrição; e a especial, com normas atinentes ao direito das obrigações, ao direito da empresa, ao direito das coisas, ao direito de família e ao direito das sucessões. Os princípios basilares que norteiam todo o conteúdo do direito civil são os da: personalidade, autonomia da vontade, liberdade de estipulação negocial, propriedade individual, intangibilidade familiar, legitimidade da herança e do direito de testar, e solidariedade social. Os demais ramos do direito privado destacaram-se à regulamentação de atividades decorrentes 11 do exercício de profissões, pois o direito civil, propriamente dito, disciplina direitos e deveres de todas as pessoas enquanto tais e não na condição especial de empresário ou empregado etc. C.4.2. Direito comercial ou empresarial O direito comercial é, portanto, em sua origem, um direito estatutário particular e consuetudinário, visto que não decorreu de obra dos jurisconsultos nem dos legisladores, mas do trabalho dos comerciantes, que o criaram com seus usos, estabelecendo seus estatutos ou regulamentos, pelos quais disciplinavam a concorrência, asseguravam mercados aos comerciantes para os seus produtos, evitavam fraudes e garantiam a boa qualidade das mercadorias. C.4.3. Direito do trabalho O direito do trabalho disciplina relações entre empregador e empregado, caracterizadas pela sua natureza hierárquica e permanente, abrangendo normas, instituições e princípios relativos à organização do trabalho e da produção e à condição social do trabalhador assalariado. Tutela relações de autonomia entre pessoas privadas, mas também relações de subordinação nas quais o Estado e os sindicatos impõem deveres aos entes privados. Apresenta o direito do trabalho traços característicos: proteção aos interesses da classe trabalhadora assalariada; valorização do trabalho ao considerar, como ensina, a igualdade no trabalho (indistinção de sexo, raça, nacionalidade etc.), a justiça salarial e a segurança no trabalho (proteção à inatividade, integridade física, saúde, higiene etc.) e a padronização do contrato de trabalho, de modo que suas cláusulas sejam legais e inoperantes os ajustes que se desviem do modelo legal. O direito do trabalho rege, portanto, as relações individuais e coletivas de trabalho e a condição social do assalariado. 12 C.4.4. Direito do consumidor Direito do consumidor é um conjunto de normas (Lei n.8.078/90) disciplinadoras das relações de consumo existentes entre fornecedores e consumidor, ou seja, da aquisição de bens ou de serviços pelo destinatário final. Noção de Direito positivo segundo MIGUEL REALE: Direito Positivo é a ordenação heterônoma das relações sociais baseadas numa integração normativa de fatos e valores. O Direito Objetivo já é o complexo de normas jurídicas que regem o comportamento humano, prescrevendo uma sanção no caso de sua violação. Já o Direito Subjetivo, segundo o conceito trazido por GOFFREDO TELLES JR, é a permissão dada por meio de norma jurídica válida, para fazer ou não fazer alguma coisa, para ter ou não ter algo, ou, ainda, a autorização para exigir, por meio dos órgãos competentes do Poder Público ou por meio de processos legais, em caso de prejuízo causado por violação de norma, o cumprimento da norma infringida ou a reparação do mal sofrido. Há duas espécies de Direito Subjetivo: 1) Direito Subjetivo comum da existência; 2) Direito Subjetivo de defender direitos; O Direito Público e o Direito Privado: O direito público se divide em dois fundamentos: 1) Direito Romano: onde era concernente ao estado dos negócios romanos, e o privado, o que disciplinava interesses particulares. Contudo, esse critério da utilidade ou interesse visado pela norma é falho, porque não se pode afirmar, com segurança, se o interesse protegido é do Estado ou dos indivíduos. 13 2) Savigny: no direito público o todo se apresenta como fim e o indivíduo permanece em segundo plano; no privado, cada indivíduo, considerado em, constitui o fim deste ramo do direito e a relação jurídica apenas serve como meio para sua existência e para as suas condições particulares. Percebe-se, todavia, que o Estado também pode ser fim da relação jurídica regulada pelo direito privado, como no caso em que for parte numa compra e venda. 3) Ihering: Reduz o direito ao direito de propriedade, ao dizer que a propriedade estatal tem por titular o governo da nação, e a coletiva, o povo. 4) Kahn: O direito privado teria conteúdo patrimonial, e o público, não. Não se foi aceita porque há partes do direito privado que não tem natureza patrimonial e normas de direito público com caráter patrimonial. 5) Jellinek: O direito privado regula relações individuais, e o público, as relações entre sujeitos dotados de imperium. Porém, mesmo os sujeitos que têm império podem ser sujeitos de direito privado, como há hipótese em que o Estado é parte numa compra e venda. 6) Goffredo Telles Jr: Para este jurista a distinção se dá por dois elementos: a) o interesse preponderante protegido pela norma e a forma de relação jurídica regulada por prescrição normativa. A relação jurídica de coordenação é a que existe entre partes que se trata de igual para igual. E a de subordinação, de direito público, é a em que uma das partes é o governo, que exerce poder de mando. 7) Doutrina DOMINANTE: O direito público é aquele que regula relações em que o Estado é parte, regendo a organização e atividade do Estado considerado em si mesmo, em relação com outro Estado e em suas relações com particulares, quando provede em razão de seu poder soberano e atua na tutela do bem coletivo. O direito privado é o que disciplina relações entre particulares, nas quais predomina, de modo imediato, o interesse de ordem privada. RAMOS DO DIREITO PUBLICO E DIREITO PRIVADO: Direito Público Interno: 14 a) Direito Constitucional – visa regulamentar a estrutura básica do Estado, disciplinando a sua organização ao tratar da divisão de poderes, das funções e limites de seus órgãos e das relações entre governantes e governados, ao limitar suas ações. b) Direito Administrativo – Disciplina o exercício de atos administrativos praticados por quaisquer dos poderes estatais,com o escopo de atingir fins sociais e políticos ao regulamentar a atuação governamental, a execução dos serviços públicos, a ação do Estado no campo econômico, a administração dos bens públicos e o poder de polícia; c) Direito Tributário – conjunto de normas que regem direta ou indiretamente à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos; d) Direito financeiro – Rege a receita e despesa públicas; e) Direito Processual – Rege a atividade do Poder Judiciário e dos que a ele requerem ou perante ele litigam, correspondendo, portanto, à função estatal de distribuir justiça; f) Direito Penal – complexo de normas que definem crimes e contravenções, estabelecendo penas, com as quais o Estado mantém a integridade da ordem pública, mediante sua função preventiva e repressiva; g) Direito Previdenciário – conjunto de normas relativas às contribuições para o seguro social e aos benefícios dele decorrentes. Direito Público Externo: a) Direito Internacional Público – consiste no conjunto de normas consuetudinárias e convencionais que regem as relações, diretas ou indiretas, entre Estados e organismos internacionais; b) Direito Internacional Privado – regulamenta as relações do Estado com cidadãos pertencentes a outros Estados, dando soluções para os conflitos de leis no espaço. 15 Direito Privado Rege as relações familiares, patrimoniais e obrigacionais que se formam entre indivíduos encarados como tais, ou seja, enquanto membros da sociedade. O Direito Privado se divide em Parte Geral e Parte Especial: Parte Geral – apresenta normas sobre pessoas; fatos jurídicos em sentido amplo; tem as funções de fixar conceitos, categorias e princípios que produzem reflexo em todo o ordenamento jurídico; Contém normas relativas ao sujeito, ao objeto e à forma de criar, modificar, e extinguir direitos, tornando possível a aplicação da parte especial do código civil; Dá a certeza e estabilidade aos seus preceitos por regular não só os elementos da relação jurídica, mas também aos pressupostos de sua validade, existência, modificação e extinção; Parte Especial – Regula o direito das obrigações; o direito de empresas; o direito das coisas; o direito de família; o direito das sucessões. Direito Civil: Princípios – Origem do Código Civil – LINDB Após árduas e infrutíferas tentativas de codificação, Campos Sales, ao ocupar a Presidência da República, por indicação de Epitácio Pessoa, nomeia em 1899, para essa tarefa Clóvis Beviláqua, que ao fim desse mesmo ano apresenta um projeto, o qual, após 16 anos de debates, transformou-se no Código Civil, promulgado em 1º/01/1916, entrando em vigor em 1º/01/1917, ora revogado pelo atual código, que após 26 anos de tramitação foi aprovado. 16 A LINDB (Lei de Introdução ........) contém normas sobre normas, assinalando-lhes a maneira de aplicação e entendimento, predeterminando as fontes de direito positivo, indicando-lhes as dimensões espaciotemporais. Tem as funções de : a) regular a vigência e a eficácia das normas; b) apresentar soluções ao conflito de normas no tempo e no espaço; c) fornecer critérios de hermenêutica; d) estabelecer mecanismos de integração de normas; e) garantir a eficácia global, a certeza, a segurança e a estabilidade da ordem pública. Ainda nos atendo ao Direito Privado, temos: Direito Comercial: Disciplina a atividade negocial do empresário e de qualquer pessoa, física ou jurídica, destinada a fins de natureza econômica; Direito do Trabalho: Regulamenta as relações entre empregador e empregado, abrangendo normas, princípios e instituições relativas à organização do trabalho e da produção e à condição social do trabalhador assalariado; Direito do Consumidor: disciplina as relações existentes entre fornecedor e consumidor. 2.FONTES JURÍDICAS: A. Noção e Classificação das Fontes do Direito Segundo nos ensina a doutrina de Maria Helena Diniz, utilizando as palavras do Mestre Nelson Saldanha o termo “fonte do direito” é empregado metaforicamente, pois em sentido próprio fonte é a nascente de onde brota uma corrente de água.1 Por ser uma expressão figurativa tem mais de um sentido. “Fonte Jurídica” seria a origem primária do direito, confundindo-se com o problema da gênese do direito. Trata-se da fonte real ou material do direito. Kelsen admite esse sentido do vocábulo, apesar de não o considerar científico-jurídico, quando com esse termo se designam todas as representações 11 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 299 17 que, de fato, influenciam a função criadora e aplicadora do direito, como: princípios morais e políticos, teorias jurídicas, pareceres de especialistas. Fontes essas que, no seu entender, se distinguem das do direito positivo, porque estas são juridicamente vinculantes e aquelas não o serão enquanto uma norma jurídica positiva não as tornar vinculantes, caso em que elas assumem o caráter de uma norma jurídica superior que determina a produção de uma norma jurídica inferior. Emprega-se também o termo “fonte do direito” como equivalente ao fundamento de validade da ordem jurídica. A teoria Kelseniana por postular a pureza metódica da ciência jurídica, libera-a da análise de aspectos fáticos, teleológicos, morais ou políticos, que, porventura, estejam ligados ao direito. O fundamento de validade de uma norma, como assevera Kelsen, apenas pode ser a validez de uma outra, figurativamente denominada norma superior. Assim, a Constituição é a fone das normas gerais. Num sentido jurídico-positivo, fonte jurídico só pode ser o direito, pelo fato de que ele regula a sua própria criação, já que a norma inferior só será válida quando for criada por órgão competente e segundo certo procedimento previsto em norma superior. Entende-se também por fonte jurídica a norma hipotética fundamental que confere o fundamento último de validade da ordem jurídica, por ser impossível encontrar na ordenação jurídica o fundamento positivo para a Constituição, pois é ela o princípio ideal que reduz as normas jurídica a uma unidade absoluta, conferindo-lhes validade. Maria Helena Diniz, cita na sua doutrina que adere a teoria egológica de Carlos Cossio, que entende que o jurista deve ater-se tanto às fontes formais como materiais. Preconizando a supressão da distinção, preferindo falar em fonte formal-material. Além disso, a fonte material ou real aponta a origem do direito, configurando a sua gênese, daí ser fonte de produção, aludindo a fatores éticos, sociológicos, históricos, políticos, etc. A fonte formal lhe dá forma, fazendo referência aos modos de manifestação das normas jurídicas, demonstrando quais os meios empregados pelo jurista para conhecer o direito, ao indicar os documentos que revelam o direito vigente, possibilitando sua aplicação a casos concretos, apresentando-se, portanto, como fonte de cognição. 18 B. Fontes Formais e Materiais: As Fontes formais são os modos de manifestação do direito mediante os quais o jurista conhece e descreve o fenômeno jurídico. Logo, quem quiser conhecer o direito deverá buscar nas suas fontes formais, ou seja, na lei, nos arquivos de jurisprudência, nos tratados doutrinários. As fontes formais podem ser estatais e não-estatais. As estatais subdividem-se em legislativas (leis, decretos, regulamentos, etc.) e jurisprudenciais (sentenças, precedentes judiciais, súmulas, etc.). As não estatais, por sua vez, abrangem o direito consuetudinário (costume jurídico), o direito científico (doutrina) e a convenções em geral ou negócios jurídicos. Essas normas jurídicas (leis, decretos, costumes, sentenças, contratos) não são, como se vê, produtoras do direito, mas consistem no próprio direito objetivo, que brota de circunstancias políticas, históricas, geográficas, econômicas, axiológicas e sociais(fontes materiais) que se completam com um ato volitivo do Poder legislativo, Executivo, Judiciário, etc. Daí dizer García Maynez que as fontes formais são os canais por onde se manifestam as fontes materiais. As Fontes Materiais ou reais são não só fatores sociais, que abrangem os históricos, os religiosos, os naturais, mas também os valores de casa época, dos quais fluem as normas jurídico-positivas. São elementos que emergem da própria realidade social e dos valores que inspiram o ordenamento jurídico. Há um pluralismo das fontes reais do direito, pois se o direito coexiste com a sociedade, tudo que pode influir sobre esta pode influenciar aquele. Montesquieu já dizia “as leis devem ser relativas à condição física do país (dimensão, gênero de vida dos povos, grau de liberdade, religião, às suas inclinações, às suas riquezas, costumes, comércio, etc.) ou seja, ela tem relações entre si. Todas essas relações formam um conjunto o que se chama espírito das leis. 19 Tais fatores decorrem das convicções, das ideologias e das necessidades de cada povo em certa época, atuando como fontes de produção do direito positivo, pois condicionam o aparecimento e as transformações das normas jurídicas. As fontes materiais não são, portanto, o direito positivo, mas tão somente o conjunto de valores e de circunstâncias sociais que, constituindo o antecedente natural do direito, contribuem para a formação do conteúdo das normas jurídicas. C.FONTES FORMAIS ESTATAIS: Legislação como fonte do direito Importância da legislação como fonte jurídica formal A legislação, nos países de direito escrito e de Constituição rígida, é a mais importante das fontes formais estatais. Nos Estado modernos, em sua maioria, a formulação do direito é obra exclusiva do legislador. Apenas nos países anglo-saxões, como a Inglaterra, há forte predominância dos costumes. A experiência jurídica desses países encontra-se vinculada aos usos e costumes e à atividade jurisdicional. Há no Estado moderno uma supremacia da lei ante a crescente tendência de codificar o direito para atender a uma exigência de maior certeza e segurança para as relações jurídicas, devido à possibilidade de maior rapidez na elaboração e modificação do direito legislado, permitindo sua adaptação às necessidades da vida moderna e pelo fato de ser de mais fácil conhecimento e de contornos mais precisos, visto que se apresenta em textos escritos. A legislação é o processo pelo qual um ou vários órgãos estatais formulam e promulgam normas jurídicas de observância geral. A legislação, ou melhor, a atividade legiferante, é tida, portanto, como a fonte primacial do direito, a fonte jurídica por excelência. Lei como resultado da atividade legislativa 20 A grande maioria dos autores, ao se referirem ao problema das fontes jurídicas formais, mencionam dente elas a lei (lato sensu), mas ao fazê-lo não estão olvidando que não é fonte do direito, mas sim produto da legislação. Isso por que como a fonte de um rio não é a água que brota do manancial, mas é o próprio manancial, a lei não representa a origem, porém o resultado da atividade legislativa, assim nos ensina Maria Helena Diniz, trazendo às palavras de Du Pasquier.2 Verifiquemos agora as acepções do vocábulo lei: 1ª) Amplíssima – em que o termo lei é empregado como sinônimo de norma jurídica, incluindo quaisquer normas escritas ou costumeiras. 2ª) Ampla – sendo o vocábulo lei entendido como oriundo do verbo legere (ler) e, portanto, concebe-se que lei é, etimologicamente, aquilo que se lê. Tal etimologia se explica porque, na época da República romana, enquanto o costume não era escrito, conservando-se na memória dos homens, a lei estava escrita, gravada em tábuas de mármore, de bronze, que se fixavam em locais públicos, em Roma, para que o povo a lesse e, conhecendo-a a cumprisse. Em sentido amplo, designa todas as normas jurídicas escritas, sejam leis propriamente ditas, decorrentes do Poder Legislativo, ou outras normas baixadas pelo Poder Executivo. 3ª – Estrita ou Técnica: outra acepção de lei indica tão somente a norma jurídica elaborada pelo Poder Legislativo, por meio de processo adequado. Entendendo-se a lei em sentido amplo, abrange todos os atos normativos contidos no processo legislativo (CF, art. 59, I a VII), que são: A lei Constitucional: sobrepõe-se a todas as demais normas integrantes do ordenamento jurídico. Contém normas que prescrevem como se deve produzir outras normas. Apresenta em seu bojo princípios que servem de guias supremos ao exercício das competências impositivas e normas que garantem direitos individuais dos cidadãos, limitando a ação legislativa. 2 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 305 21 A lei Complementar: (CF, artigos 69, 146-A e 155, XII, a a i, alusiva à estrutura estatal ou aos serviços do Estado, constituindo as leis de organização básica, cuja matéria está prevista na Constituição e, para sua existência, exige-se quórum qualificado do artigo 69 da CF. Lei Ordinária: editada pelo Poder Legislativo da União, Estados e Municípios, no campo de suas competências constitucionais, com a sanção do chefe do Executivo. Não há supremacia da lei ordinária federal relativamente à Estadual, municipal ou distrital. A lei Delegada: estando no mesmo plano da lei ordinária, citando Michel Temer, a autora ensina que: “deriva de exceção ao princípio do art. 2º da Constituição Federal. A lei delegada é elaborada e editada pelo Presidente da República, por Comissão do Congresso Nacional ou de qualquer de suas casas, em razão de permissão do Poder Legislativo e nos limites postos por este. As medidas Provisórias: estão no mesmo escalão hierárquico da lei ordinária, embora não sejam leis. São normas expedidas pelo Presidente da República, no exercício de competência constitucional (CF art. 84, XXVI). Hodiernamente, pelo artigo 62, parágrafos 1º e 2º, da Constituição Federal vigente, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, em caso de relevância do interesse público e urgência, devendo submetê-las, de imediato, ao Congresso Nacional. Tais medidas provisórias perderão sua eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei dentro do prazo de 60 dias, prorrogável por uma única vez por igual prazo, a partir de sua publicação. É vedada a edição de Medida Provisória sobre: a) questões de cidadania, nacionalidade, direitos políticos, partidos políticos, direito eleitoral, direito penal, direito processual penal e processual civil, organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e garantia de seus membros, planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares; b) detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou de qualquer outro ativo financeiro; c) matéria reservada à lei complementar; d) assunto já disciplinado em 22 projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República. As resoluções do Senado: têm força de lei ordinária, por serem deliberações de uma das Câmaras do Poder Legislativo ou do próprio Congresso Nacional sobre assuntos do seu peculiar interesse, como questões concernentes à licença ou perda de cargo por deputado ou senador. São aprovadas por maioria absoluta de seus membros, e não têm sanção, sendo promulgadas pela mesa do Senado, que ordena sua publicação. Estas são as principais categorias de estatutos legislativos, também chamadas primárias, por revelarem, imediatamente, o direito positivo e por bastarem por si mesmas; mas, ao seu lado, temos as secundárias, que consistem em normas subordinadas à lei, em atos de hierarquia inferior à lei, eu, às vezes, lhes dá eficácia, pois se reportam, implícita ouexplicitamente, a ela, e que compreendem: Os decretos regulamentares: são normas jurídicas gerais, abstratas e impessoais estabelecidas pelo Poder Executivo da União, dos Estados ou municípios, para desenvolver uma lei, minudenciando suas disposições, facilitando sua execução ou aplicação. As instruções ministeriais: previstas na CF, art. 87, parágrafo único, II, expedidas pelos Ministros de Estado para promover a execução de leis, decretos e regulamentos atinentes às atividades de sua pasta. As circulares: consistem em normas jurídicas que visam ordenar de maneira uniforme o serviço administrativo. As portarias: são normas gerais que os órgãos superiores (desde o Ministério até uma simples repartição pública) edita para serem observadas por seus subalternos. As ordens de serviço: constituem estipulações concretas para um certo tipo de serviço a ser executado por um ou mais agentes credenciados para isso. 23 O processo legislativo vem a ser um conjunto de fases constitucionalmente estabelecidas pelas quais há de passar o projeto de lei, até sua transformação em lei vigente. A obra legislativa compreende, portanto, várias operações previstas constitucionalmente e levadas a efeito pelo órgão competente. Em regra, os trâmites constitucionalmente previstos são: iniciativa, discussão, deliberação, sanção, promulgação e publicação. Iniciativa: não é propriamente a fase inicial do processo legislativo, mas apenas o ato que o desencadeia, surgindo com a apresentação de um projeto de lei propondo a adoção de direito novo. Discussão: após apresentado projeto de lei, é realizada a discussão pelos corpos legislativos, do projeto, que está sujeito, na forma regimental, ao pronunciamento de Comissões especializadas na matéria sobre a qual versa, podendo receber emendas da sua substância ou de redação, desde que não resultem em aumento de despesa prevista no projeto (CF, ART. 63). Deliberação ou votação: ocorre conforme o processo de aprovação ou rejeição por parte de cada assembleia. O plenário manifesta-se contra ou a favor do projeto. A aprovação deverá ser por maioria simples, se se tratar de lei ordinária, ou absoluta, em se tratando de lei complementar. Sanção ou Veto: aprovado o projeto pelo Legislativo, é remetido à sanção ou veto do Executivo, que exerce uma tarefa legislativa. O veto é a oposição ou recusa ao projeto (CF, art. 66, parágrafo 1º), por inconstitucionalidade ou inconveniência, podendo ser total se atingir todos os dispositivos, ou parcial, se abranger apenas certas disposições. Uma vez vetado o projeto volta ao Legislativo, que poderá aceitar ou rejeitar o veto. Se o acatar, finda-se o processo legislativo; se o recusar por maioria qualificada, o projeto volta ao titular da função executiva para promulgá-lo. Com sanção, o projeto transforma-se em lei, que é promulgada pelo Executivo, imprimindo-lhe obrigatoriedade. 24 Promulgação: é o ato pelo qual o Executivo autêntica a lei, atestando sua existência, ordenando sua aplicação e cumprimento. A promulgação sucede à sanção ou à recusa do veto. Publicação: após a promulgação, vem a sua publicação no Diário Oficial, visando tornar pública a nova lei, possibilitando seu conhecimento pela comunidade (LINDB, art. 1º). 2.Produção Jurisprudencial 1.1 Produção de Jurisprudência: o termo jurisprudência está aqui sendo empregado como o conjunto de decisões uniformes e constantes dos tribunais, resultantes da aplicação de normas a casos semelhantes, constituindo uma norma geral aplicável a todas as hipóteses similares ou idênticas. São através dos recursos ordinários e extraordinários do Supremo Tribunal Federal que vão estabelecendo a possível uniformização das decisões judiciais. Tais recursos são atos processuais pelos quais a decisão de um juiz ou tribunal é submetida a outro tribunal de categoria superior, com competência para reforma-la ou anulá-la; em regra, a uniformização recursal compete ao STF, que coordena e organiza sua jurisprudência mediante enunciados normativos que resumem as teses consagradas em reiteradas decisões. Em suma, a jurisprudência é, portanto, nas expressivas palavras de Miguel Reale, transcritas na obra de Maria Helena Diniz: “jurisprudência é a forma de revelação do direito que se processa através do exercício da jurisdição, em virtude de uma sucessão harmônica de decisões dos tribunais”. 3 Logo, é fácil perceber que a fonte formal é o processo ou a atividade jurisdicional do Estado no exercício da função de aplicar o direito, que se expressa na jurisprudência. Portanto, a obra dos tribunais, havendo uma série de julgados que 3 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 313 25 guardem entre si certa continuidade e coerência, converte-se em fonte formal do direito de alcance geral, pois suas decisões se incorporam na vida jurídica, sendo consideradas pelas pessoas e passando a integrar o direito vigente sob a denominação de Jurisprudência. Maria Helena Diniz, entende que a atividade jurisprudencial é uma fonte do direito consuetudinário, pois a uniformização dá azo à positivação do costume judiciário. Citado por Maria Helena Diniz, Rui Barbosa assim declinou: “Ninguém ignora, hoje em dia, que a jurisprudência modifica incessantemente as leis do direito privado. Toda codificação, apenas decretada, entra sob o domínio dos arestos, no movimento evolutivo que, com o andar dos tempos, acaba por sobrepor à letra escrita do direito dos textos judiciais”. 4 Influência da Jurisprudência como fonte do direito A jurisprudência resulta no direito estabelecido pelas decisões uniformes dos juízes e tribunais. Está, portanto, como já dissemos, constituída por normas gerais e obrigatórias criadas pela prática consuetudinária do Poder Judiciário, consubstanciando normas individuais, pois forma-se no meio de casos concretos. É fonte não só porque influi na produção de normas jurídicas individuais (sentença, p.ex.), mas também porque participa no fenômeno de produção do direito normativo, desempenhando relevante papel, apesar de sua maleabilidade. A grande importância normativa da jurisprudência pode ser demonstrada pela criação da “Súmula da Jurisprudência Predominante” do Supremo Tribunal 4 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 314 26 Federal, para proporcionar maior estabilidade à jurisprudência e facilitar o trabalho do advogado e dos tribunais, simplificando o julgamento das questões mais frequentes. A súmula, enunciado que resume uma tendência sobre determinada matéria, decidida contínua e reiteradamente pelo tribunal, constitui uma forma de expressão jurídica, por dar certeza a certa maneira de decidir. No Brasil, somente o STF poderá emitir súmula vinculante (EC 45/2004). Conforme o artigo 7º, parágrafos 1º e 2º, da Lei 11.417/2006, da decisão ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negando-lhe vigência ou aplicando-a indevidamente, caberá reclamação ao STF, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação. A súmula vinculante deverá ser aprovada por 2/3 dos membros do STF, que se pronunciará ex officio ou por provocação (requisito formal) e sua edição deverá subordinar-se aos seguintes requisitos: (a) Existência de controvérsia atual sobre validade, interpretação e eficácia de normas, entre os órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica; (b) Natureza constitucional da controvérsia (LEI n. 11.417/2006, art. 2º, §1º); (c) Ocorrência de reiteradas decisões sobre a matéria. E a partir de sua publicação na imprensa oficial (Lei n.11.417/2006,art. 2º e § 4º) terá efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. A súmula vinculante terá, portanto, eficácia imediata, mas o STF, por decisão de 2/3 dos seus membros, poderá restringir seus efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público (Lei n. 11.417/2006, art. 4º). 27 O STF também poderá, de ofício ou por provocação, por 2/3 de seus membros, decidir pela revisão e cancelamento da súmula com efeito vinculante (Lei n. 11.417/2006, arts. 2º, §3º, e 5º). São legitimados a propor edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante: o Presidente da República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; o Procurador-Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; o Defensor Público-Geral da União; partido político com representação no Congresso Nacional; confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; a Mesa da Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; o Governador de Estado e do Distrito Federal; os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e territórios, os Tribunais Regionais Federais, os tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares. O Município poderá propor incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo. A decisão sumular é eficaz não só no seu conteúdo interpretativo como também nos fundamentos invocados. Há posicionamentos divergentes acerca das súmulas. A doutrina se divide, havendo quem entenda ser viável a edição de súmulas vinculantes e outros trazem diversas críticas acerca das súmulas. 28 Eis algumas delas: a) à adoção da súmula vinculante compromete os princípios do duplo grau de jurisdição, do devido processo legal, da inafastabilidade do controle judicial, do livre convencimento do julgador e da ampla defesa; b) uma forma de escapar da morosidade do judiciário seria o constante e habitual emprego do processo de arbitragem; c) provoca o engessamento da jurisprudência; d) representa atribuição de função de natureza legislativa ao Judiciário contrariando o princípio da separação de poderes. A ordem brasileira vem, como se vê, recebendo inclusões de instituições próprias de país de commow law, como a súmula vinculante (EC 45/2004) e a súmula impeditiva de recursos, com o escopo de obter maior celeridade na prestação jurisdicional. c.2.3. Poder normativo do juiz Maria Helena Diniz, citando Miguel Reale Junior, nos ensina que: “à norma é o momento culminante de um processo no qual estão em contínua tensão fato e valor. O legislador, ao criar uma norma jurídica geral, generalizada, estabelecendo um tipo legal que, em decorrência disso, está separado da realidade imediata da vida que lhe deu origem, abarcando, tão somente, o seu aspecto geral, concentrando-se em seus traços fundamentais. Ao passo que o magistrado, ao sentenciar, não generaliza, cria uma norma jurídica individual, incidente sobre um dado caso concreto5 Calcada nas ideias de Kelsen, Maria Helena Diniz, argumenta que “as normas individuais são as determinantes da conduta de um indivíduo em uma 5 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 327 29 situação e, portanto, são válidas apenas para um caso particular e podem ser obedecidas e aplicadas somente uma vez. Tais normas são jurídicas porque fazem parte do ordenamento jurídico total, exatamente no mesmo sentido em que aquelas normas gerais, que têm servido de base para a criação das individuais.6 O ato mediante o qual é posta a norma individual da decisão judicial é quase sempre predeterminado por normas gerais. A função jurisdicional se desenvolve em três níveis complementares e interdependentes: a informação sobre as normas gerais a serem utilizadas na avaliação do caso concreto, o conhecimento do dado social conflitivo, confrontando-o com os parâmetros legais, e a avaliação prudente, que redimensiona a norma geral e a situação fática para produzir a norma jurídica individual. A tarefa dos juízes e tribunais ao aplicar o fato à norma geral possui índole político-jurídica. Isso porque a norma geral a ser aplicada é mera moldura dentro da qual surge a norma jurídica individual, em virtude da eleição de uma das possibilidades contidas na norma geral. A função jurisdicional consiste em responder às perguntas que se formulam ao juiz. Para que possa dar a resposta adequada a uma indagação sobre a classificação de um caso individual, o magistrado deve verificar se ele tem ou não as propriedades definitórias do tipo genérico contido na norma. Esta é uma atividade predominantemente cognoscitiva, já que o órgão judicial deve conhecer fatos e averiguar, pela interpretação, o sentido das expressões e os termos mediante os quais se define o caso genérico. Conhecidos os fatos provados e as normas aplicáveis, surge o ato de vontade que escolhe o direito a aplicar, dentre suas possíveis aplicações; assim, o ato de conhecimento é condição do volitivo. Se a norma geral tem várias significações, logicamente possíveis, só uma decisão de vontade poderia deveras, levar a optar por uma delas. Esse ato de vontade, que traz a lume a norma individual, é uma operação axiológica, contendo, é óbvio, sempre em alguma medida, uma valoração do juiz. 6 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 327 30 Pelos ensinamentos de Goffredo Telles Jr, nas palavras de Maria Helena Diniz, “O juiz repensa a norma geral, confronta-a com a realidade social, procurando a solução justa, de forma que a produção de uma sentença implica um complexo de atos de verdadeira elaboração da norma para o caso concreto. A função criadora do Poder Judiciário desenvolve-se pela interpretação, integração e correção, que são instrumentos dinâmicos na criação jurisprudencial, tendo por escopo reavaliar a axiologia que informa a ordem jurídico-positiva. D. Fontes, formais não estatais d.1. Prática consuetudinária d.1.1. Costume como fonte jurídica subsidiária Dentre as mais antigas formas de expressão do direito temos o costume, decorrente da prática reiterada de certo ato com a convicção de sua necessidade jurídica, forma que predominou até a lei escrita. Com decorrer dos tempos, a legislação passou a ser a fonte imediata do direito. Mas o costume ainda continua a ser elemento importante e, algumas vezes, até insubstituível pela lei. Pensamento de Georges Rénard, mencionado por Maria Helena Diniz7. A prática consuetudinária, da qual resulta o costume, é, em regra, uma fonte de cognição subsidiária ou supletiva e da mais alta relevância. Em palavras de Franco Montouro, Maria Helena nos ensina: “O costume não opõe ao direito escrito, mas ao legislado, pois, hodienamente, o costume é formulado por escrito em repertórios, p. ex. nos Assentamentos de Usos e Costumes da Praça do Estado de São Paulo, feitos pela Junta Comercial, com o objetivo de fixá-los e de prová-los.8 7 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 330 8 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 331 31 d.1.2. Natureza jurídica do Costume A natureza jurídica do costume, ou seja, a questão da sua obrigatoriedade, tem provocado grandes polêmicas entre os juristas. Sobre o assunto manifestaram-se várias doutrinas, como a teoria da vontade popular, entendoque a obrigatoriedade do costume descansa no consenso popular tácito (tacitus consensus Populi) ou na presunção de vontade dos cidadãos (tácita civium conventio), sendo, portanto, originária dos romanos. Maria Helena Diniz não concorda com tal teoria, afirmando que não pode ser aceita porque, mesmo no direito romano, os edicta magistratum, as responsa prudentium e a auctoritas rerum perpetuo similiter judicatarum eram tidos como direito consuetudinário, mas neles não intervinha a vontade do povo; além disso há costumes vigentes que são completamente ignorados pelo povo. d.1.3. Conceito e elementos do costume Maria Helena Diniz cita o conceito trazido por Barros Monteiro e Vicente Ráo “Costume é uma norma que deriva da longa prática uniforme ou da geral e constante repetição de dado comportamento sob a convicção de que corresponde a uma necessidade jurídica”9 Maria Helena, citando os ensinamentos de Savigny, Puchta, Gerber, Dah, Stobbe e Thon: “dizem que há no costume dois elementos: um objetivo – o uso, e um subjetivo – a convicção jurídica”. Diz ainda a autora, porém só a convicção ou sentimento de necessidade é essencial; o uso é mero acidente, tendo apenas o valor de prova. Esta convicção seria fundamental para a obrigatoriedade do costume, que se revelaria na conformidade de seu reconhecimento como idôneo para regular comportamentos, justiçando sua aplicação compulsória aos que não se submetem, de modo voluntário, a ela. Assim sendo, por mais que se repitam, os usos não se convertem em jurídicos. E continua Maria Helena Diniz, agora citando Dernburg, Jellinek, Bluntschli, Zitelmann, Demófilo de Buen, Ferrini, Ferrara, como passamos a declinar: 9 Idem pág. 334 32 “A constante repetição é que dá origem à juridicidade do costume, colocando assim a convicção em plano secundário, por entenderem que certos comportamentos e atitudes se observam em determinada comunidade durante longo tempo, sem ser a sua observância julgada como um dever pelos seus membros, que praticam as condutas como todos fazem, sem julgá-las”.10 Contudo, diz a autora, parece-nos que, sem a formação de uma convicção jurídica o costume não pode ser tido como jurídico; seria simples uso social. Nas palavras de Maria Helena Diniz, à luz dos pensamentos de Planiol, Esmein, Lambert e Max Ernst Mayer a obrigatoriedade do costume torna advém das decisões judiciárias, considerando, assim, o labor dos tribunais como verdadeiramente constitutivo e não declaratório do costume. A grande maioria dos juristas, comenta Maria Helena Diniz, entre eles os quais cita: Storm, Windscheid, Wachter, Gierke, Unger, Stahl, Goldschmidt, Besfeier, Regelsberger, Clóvis Beviláqua, Washington de Barros Monteiro, Vicente Ráo, sustenta que o costume jurídico é formado por dois elementos necessários: o uso e a convicção jurídica, que integram o processo total da formação do direito consuetudinário. Sobre o costume, afirma Maria Helena Diniz, citando Washington de Barros Monteiro: “do exposto, percebe-se que são condições para a vigência de um costume: sua continuidade, sua uniformidade, sua diuturnidade, sua moralidade e sua obrigatoriedade”.11 O costume como fonte subsidiária do direito, não requer alegação em juízo, pois o juiz conhece o direito, mas há discussão sobre sua prova em juízo por aquele que o alega. Também é indagado acerca do conhecimento que deve ter o juiz sobre um direito consuetudinário tão perfeito o que ele deve ter da lei. Daí vem Vicente Ráo, citado por Maria Helena Diniz e diz que: “verifica que os modernos juristas admitem: a) que o magistrado, de ofício, pode aplicar o costume, se for notório ou de seu conhecimento, invocando-o 10 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pag. 332 11 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 334 33 quando admitido, como qualquer norma jurídica; b) que, se o desconhece, lícito lhe é exigir, de quem o alega, que o prove; c) que, de qualquer modo, à parte interessada é permitido, sem aguardar a exigência do juiz ou a contestação do adversário, produzir essa prova, por todos os meios permitidos em direito. 12 A consuetudo (uso) e a opinio juris et necessitatis (convicção de que a norma é necessária) são elementos integrantes do processo de formação do costume. O uso deve ser uniforme, constante, público e geral. A existência de um uso requer que não haja, ao mesmo tempo, outro uso contrário, porque então perderia a generalidade que deve caracterizá-lo. O uso deve, ainda, ser conforme à moral, aos bons costumes e à ordem pública. Necessário separar o uso social (mores, folkways) do costume jurídico, pois neste é a convicção que delimita a sua exigibilidade. Para Clovis Beviláqua, a força obrigatória do costume está na conformidade reconhecida entre ele e as necessidades sociais que regula, nos ensina a autora mencionando o jurista. É necessário que o costume seja conforme à ideia de justiça. Daí a exigência da razoabilidade. Por fim, nas palavras de Ferrini, citado pela autora: “Assim sendo, o juiz ao aplicar o costume terá que levar em conta os fins sociais e a razoabilidade, a moralidade e a sociabilidade do costume jurídico”. Havendo de ser considerado sempre na unidade de seus dois elementos essenciais. d.1.4. Espécies de costume Em relação às leis, três são as espécies de costume: secundum legem, praeter legem e contra legem. Nos ensina Maria Helena Diniz que o costume secundum legem está previsto na lei, que reconhece sua eficácia obrigatória, para tanto cita diversos artigos onde a lei traz dentro do comando legal a aplicação do costume para resolução de questões. 12 Idem 34 O Costume é praeter legem quando se reveste de caráter supletivo, suprindo a lei nos casos omissos, preenchendo lacunas. É o tipo que está contido no art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro. Esse costume é invocado, quando não se puder empregar a argumentação analógica, nas hipóteses de silencio da lei sobre determinado assunto, procurando preencher esse hiato legal pela observância de práticas consuetudinárias. Ex: cheque pré-datado. O costume contra legem é aquele que se forma sem sentido contrário ao da lei. Seria o caso da cosuetudo abrogatoria, implicitamente revogatória das disposições legais, ou da desuetudo, que produz a não aplicação da lei, em virtude de desuso, uma vez que a norma legal passa a ser letra morta. Quanto a esse tipo de costume digladiam-se os autores, uns o admitem, outros não. Dentro do direito brasileiro há casos em que os juízes aplicaram o costume contra legem atendendo aos reclamos da justiça e dos fatos sociais (LINDB, art. 5º). Traz como exemplo: No antigo direito pátrio houve um alvará, o de 30 de novembro de 1793, que mandou seguir, em matéria de prova, o costume de preferência à lei, e isso ocorreu numa época em que vigorava a Lei da Boa Razão, editada em 1769, que proibia o costume contrário às disposições legais. A grande maioria dos autores rejeita o costume contra legem por entendê- lo incompatível com a tarefa legislativa do Estado e com o princípio de que as leis se revogam por outras, declara a autora Maria Helena, calcada nas palavras de Vicente Ráo13. Por fim a própria autora conclui: “ “Em que pese a opinião de certos autores sobre a inadmissibilidade da aplicação do costume contra legem, a admitimos em casos excepcionais, como o de desajuste entre a realidade dos fatos e o 13 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 341 35 comando normativo, desde que fundada na justiça”. 14 d.2. Atividade científico-jurídica d.2.1. Origem da doutrina A doutrina é formada pela atividade dos juristas, ou seja, pelos ensinamentos dos professores, pelos pareceresdos jurisconsultos, pelas opiniões dos tratadistas. Originária de Roma, quando Augusto concedeu a uma classe de jurisconsultos emitentes (iurisprudentes) o poder de responder a consultas versando sobre problemas jurídicos, comentando o direito de sua época, procurando seus fundamentos e se esforçando para responder às questões não resolvidas pelos magistrados. As opiniões contidas em suas obras adquiriram o mesmo valor de seus ditames, ou seja, das respostas dadas às consultas (responsa). Tanto as obras dos juristas como as responsam prudentium chegaram a ser uma das fontes jurídicos- formais de maior importância no Império Romano. Mas a questão teórica da doutrina como fonte jurídica só surgiu no século XX, com o advento do fenômeno da positivação do direito, que dá lugar à preponderância da lei como fonte de direito, à concepção da ordem jurídica como sistema e ao controle da legalidade das decisões judiciais. d.2.2. Conceito de doutrina jurídica O termo doutrina advém do latim doctrina, do verbo doceo – ensinar, instruir. Etimologicamente, é o resultado do pensamento sistematizado sobre determinado problema, com a finalidade precípua de ensinar, impondo uma ortodoxia, ou seja, um pensamento tido como correto por determinado ponto de vista ou grupo. Maria H. Diniz nos ensina: 14 Idem pág. 341 36 “A doutrina decorre da atividade científico-jurídica. De estudo científicos realizados pelos juristas, quando da análise e sistematização das normas jurídicas, na elaboração das definições dos conceitos jurídicos, na interpretação das leis, facilitando e orientando a tarefa de aplicar o direito, e na apreciação da justiça ou conveniência dos dispositivos legais, adequando-os aos fins que o direito deve perseguir, emitindo juízos de valor sobre o conteúdo da ordem jurídica, apontando as necessidades e oportunidades das reformas jurídicas, fundamenta Maria Helena Diniz15. Resume a autora, “como se vê, doutrina é o resultado de uma atividade científica dos juristas, portanto, uma forma de expressão jurídica. d.2.3. Doutrina como fonte de direito Indaga-se se a doutrina é ou não fonte jurídica. Há os que entendem não ser a doutrina fonte jurídica, é o caso do Professor Paulo de Barros Carvalho, para ele o discurso descritivo (doutrina) não altera a natureza prescritiva do direito, tão somente serve para sua compreensão, sem modificá-lo. Da mesma forma é o pensamento de Miguel Reale, por entender que as fontes de direito emanam modelos jurídicos, ou seja, são estruturas normativas, têm caráter obrigatório, disciplinam as tantas modalidades de relacionamentos sociais. Nas palavras de Maria Helena Diniz, entendendo ser o direito experiência e as fontes são modelos jurídicos, vejamos: “Como pensamos ter demonstrado em nosso livro, o direito como experiência, enquanto as fontes revelam modelos jurídicos que vinculam os comportamentos, a doutrina produz modelos dogmáticos, isto é, esquemas teóricos, cuja finalidade é determinar: a) como as fontes podem produzir modelos jurídicos válidos; b) que é que 15 DINIZ, Maria Helena – Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 26ª ed. Saraiva, pág. 343 37 estes modelos significam; c) como eles se correlacionam entre si para compor figuras, institutos e sistema ou seja, modelos de mais amplo repertório”16 Abelardo Torré tem a doutrina como fonte material que pode ser usada pelo juiz para suas decisões e pelo legislador quando cria lei. Outros têm a doutrina como fonte indireta, afirmando que não pode ser usada pelo juiz e nem pelo legislador uma vez que o Estado não lhes conferiu poder normativo. Sem dúvida, para Maria Helena Diniz, “a doutrina é decorrente de atividade científica, e esta é tida por muitos, inclusive por nós, como fonte de direito costumeiro”. No nosso direito não há quaisquer empecilhos a eventual uso da doutrina, eis que o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro prevê o recurso aos princípios gerais do direito, sendo muitos deles oriundo da doutrina, como ocorre desde a era romana. Maria Helena Diniz, citando os ensinamentos de A. Machado Pauperio, ensina que a doutrina dominante assim é preconizada quando em um dado momento histórico, consiste em seu caráter de maior razoabilidade ou de maior justiça para resolver questões jurídicas. d.2.4. Influência da doutrina na legislação e na decisão judicial Conceitos, classificações, teorias, noções gerais, sistemas, são construídos pela doutrina. Por isso mesmo exerce função relevante na elaboração, reformas e aplicação do direito, grande influência na legislação e na jurisprudência, inspirando juízes e legisladores, que buscam no estudo dos juristas, que, com sua grande formação científico-juridica, debruçam-se em estudos, reflexões. 16 Idem pág. 344 38 Vale ressaltar que nas obras de juristas surgiram várias disposições legais e a inspiração de julgados que cooperaram para o direito. Foi o que ocorreu com as teorias da imprevisão, do abuso de direito, do direito social, do direito da concubina e dos filhos adotivos e adulterinos, da responsabilidade civil em geral e, em especial, por dano moral, etc. Sendo o ordenamento dinâmico, mutável, não sendo rigorosamente orgânico, e sim lacunoso, o jurista tem o dever de comentá-lo, visando auxiliar o legislador nas renovações e inovações normativas. Menciona Maria Helena Diniz que no contrato busca-se sempre a vontade das partes e prevalece tudo que foi ditado no contrato pelos contratantes. Tudo que foi acordado pelos contratantes deverá ser cumprido (pacta sunt servanda), somente força maior e caso fortuito impede execução patrimonial. Mas a doutrina e a jurisprudência estão temperando esse princípio absoluto, levando em conta também outra criação doutrinária a cláusula rebus sic stantibus. Outro exemplo, é artigo que traz a imutabilidade dos preços no contrato de empreitada. Sendo certo que uma vez aceito a empreitada o empreiteiro não tem direito a exigir acréscimo no preço, por este, o empreiteiro assume o risco do custeio da mão de obra e dos materiais. Ora, a doutrina moderna e os tribunais, ante a realidade social, estão admitindo a revisão dos contratos, em casos graves, quando da superveniência de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis. No direito brasileiro domina o princípio da convenção-lei pacta sunt servanda. Mas a doutrina e o órgão judicante vinham adotando dia a dia a teoria da imprevisão, restabelecendo o status quo ante, pela cláusula rebus sic stantibus. Na relação de consumo basta a onerosidade excessiva oriunda de fato superveniente, não sendo necessário que tal fato seja extraordinário ou imprevisível. Outros exemplos trazidos de trabalhos doutrinários e judiciais foi a rescisão ou modificação dos contratos de locação de prédios celebrados por funcionários públicos, civil ou militares. Não se pode olvidar que projetos de códigos são, às vezes, elaborados com a doutrina dos jurisconsultos, o que se deu com o código de Digesto em Roma, 39 Código de Napoleão, e no Brasil com Clóvis Beviláqua, autor do Projeto do Código Civil de 1916. É evidente a influência da doutrina na decisão judicial, vez que dá ao julgador fundamentos, seja por comentários, críticas ou definições jurídicas apresentadas pela doutrina. Por isso mesmo, o advogado deve alicerçar suas petições em opiniões doutrinárias. A importância da doutrina também está na presença de conceitos jurídicos indeterminados contidos em normas, cuja delimitação é dada pelo cientista do direito e o Juiz necessita desses conceitos para decidir. Para adquirir argumento de autoridade o jurista deve gozar de prestígio, deve haver interação de sua pessoa com outras da comunidade, e para tanto utiliza- se de publicação de livros, de conferências, etc. Houve decisões judiciárias
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