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Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Delmo Mattos 2ª e di çã o Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade DIREÇÃO SUPERIOR Chanceler Joaquim de Oliveira Reitora Marlene Salgado de Oliveira Presidente da Mantenedora Jefferson Salgado de Oliveira Pró-Reitor de Planejamento e Finanças Wellington Salgado de Oliveira Pró-Reitor de Organização e Desenvolvimento Jefferson Salgado de Oliveira Pró-Reitor Administrativo Wallace Salgado de Oliveira Pró-Reitora Acadêmica Jaina dos Santos Mello Ferreira Pró-Reitor de Extensão Manuel de Souza Esteves Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Marcio Barros Dutra DEPARTAMENTO DE ENSINO A DISTÂNCIA Diretora Claudia Antunes Ruas Guimarães Assessora Andrea Jardim FICHA TÉCNICA Texto: Delmo Mattos Revisão: Lívia Antunes Faria Maria e Walter P. Valverde Júnior Projeto Gráfico e Editoração: Andreza Nacif, Antonia Machado, Eduardo Bordoni e Fabrício Ramos Supervisão de Materiais Instrucionais: Janaina Gonçalves de Jesus Ilustração: Eduardo Bordoni e Fabrício Ramos Capa: Eduardo Bordoni e Fabrício Ramos COORDENAÇÃO GERAL: Departamento de Ensino a Distância Rua Marechal Deodoro 217, Centro, Niterói, RJ, CEP 24020-420 www.universo.edu.br Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universo – Campus Niterói M444e Mattos, Delmo. Ética, valores humanos e transdisciplinaridade / Delmo Mattos ; revisão de Lívia Antunes Faria Maria e Walter P. Valverde Junior. 2. ed. – Niterói, RJ: UNIVERSO, 2011. 167 p. ; il. 1. Ética. 2. Moral. 3. Ética empresarial. 4. Responsabilidade social da empresa. I. Maria, Lívia Antunes Faria. II. Valverde Junior, Walter P. III. Título. CDD 170 Bibliotecária: ELIZABETH FRANCO MARTINS – CRB 7/4990 © Departamento de Ensino a Distância - Universidade Salgado de Oliveira Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, arquivada ou transmitida de nenhuma forma ou por nenhum meio sem permissão expressa e por escrito da Associação Salgado de Oliveira de Educação e Cultura, mantenedora da Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Informações sobre a disciplina Carga horária: 60 Créditos: 04 Ementa: Ética e moral. A ética profissional. A responsabilidade social. A questão da alteridade como principio da relação social. Os valores humanos fundamentais à construção de uma cultura de paz. Transdisciplinaridade e convergência de conhecimentos. Objetivo geral: oferecer ao discente as condições de referência para a compreensão da ética e da moral, do ponto de vista filosófico, bem como, a sua importância para a sua atividade profissional e acadêmica. Além disso, refletir e discutir sobre a dimensão ética na existência do ser humano, dentro do contexto da crise dos valores da nossa sociedade, conduzindo a uma compreensão global da influência da reflexão ética no âmbito das decisões e responsabilidades inerentes aos atores sociais e econômicos da atualidade. Conteúdo programático Unidade 1 – Fundamentos da Ética e da Moral: contexto histórico e social, conceitos e definições fundamentais. Distinguindo Ética da Moral. O caráter histórico e social da Moral. O caráter histórico e social da Ética. Unidade 2 – Problemas Éticos e problemas morais: consciência moral, virtude, amizade, liberdade e felicidade. A consciência moral e os valores éticos. A busca da felicidade: virtude e o bem viver em Aristóteles. Aristóteles e a amizade como um problema ético-moral. Pensando a liberdade: La Boétie e Sartre. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Unidade 3 – Ética aplicada: a ética na empresa e nos negócios. Pressupostos teóricos da ética empresarial: história e desenvolvimento. Empresa ética e visão ético-empresarial. A ética nos negócios ou negociando com ética: lucro x princípios morais. O código de ética profissional: funções e limites. Unidade 4 - Ética profissional e responsabilidade social. Ética profissional: os valores sociais da profissão. O desempenho ético-profissional: ambiência e relações pessoais. Ética e responsabilidade social nos negócios. Decisões morais racionais. Bibliografia Básica VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. 304p. CAMARGO, M. Fundamentos de ética geral e profissional. 3ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. 118p. Bibliografia Complementar NASH, L. Ética nas empresas: boas intenções à parte. São Paulo: Makron Books, 2001. 359p. ASHLEY, P. A. (Coord.). Ética e Responsabilidade Social nos Negócios. São Paulo: Saraiva, 2002. 340p. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Palavra da Reitora Acompanhando as necessidades de um mundo cada vez mais complexo, exigente e necessitado de aprendizagem contínua, a Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO) apresenta a UNIVERSO Virtual, que reúne os diferentes segmentos do ensino a distância na universidade. Nosso programa foi desenvolvido segundo as diretrizes do MEC e baseado em experiências do gênero bem-sucedidas mundialmente. São inúmeras as vantagens de se estudar a distância e somente por meio dessa modalidade de ensino são sanadas as dificuldades de tempo e espaço presentes nos dias de hoje. O aluno tem a possibilidade de administrar seu próprio tempo e gerenciar seu estudo de acordo com sua disponibilidade, tornando-se responsável pela própria aprendizagem. O ensino a distância complementa os estudos presenciais à medida que permite que alunos e professores, fisicamente distanciados, possam estar a todo momento ligados por ferramentas de interação presentes na Internet através de nossa plataforma. Além disso, nosso material didático foi desenvolvido por professores especializados nessa modalidade de ensino, em que a clareza e objetividade são fundamentais para a perfeita compreensão dos conteúdos. A UNIVERSO tem uma história de sucesso no que diz respeito à educação a distância. Nossa experiência nos remete ao final da década de 80, com o bem- sucedido projeto Novo Saber. Hoje, oferece uma estrutura em constante processo de atualização, ampliando as possibilidades de acesso a cursos de atualização, graduação ou pós-graduação. Reafirmando seu compromisso com a excelência no ensino e compartilhando as novas tendências em educação, a UNIVERSO convida seu alunado a conhecer o programa e usufruir das vantagens que o estudar a distância proporciona. Seja bem-vindo à UNIVERSO Virtual! Professora Marlene Salgado de Oliveira Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Reitora Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Sumário 1. Apresentação da disciplina ............................................................................................................. 09 2. Plano da disciplina .............................................................................................................................. 11 3. Unidade 1 – Fundamentos da Ética e da Moral: contexto histórico e social, conceitos e definições fundamentais. ......................................................................... 13 4. Unidade 2 – Problemas éticos e problemas morais: consciência moral, virtude, amizade, liberdade e felicidade. ..................................................................................................47 5. Unidade 3 – Ética aplicada: a ética na empresa e nos negócios ................................... 85 6. Unidade 4 – Ética profissional e responsabilidade social .................................................117 7. Considerações finais........................................................................................................................... 153 8. Conhecendo a autora ........................................................................................................................154 9. Referências ............................................................................................................................................. 155 10. Anexos ...................................................................................................................................................... 165 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Apresentação da Disciplina Caro aluno, Seja bem-vindo à disciplina Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade. O tema da ética constitui-se em uma das áreas de conhecimento da Filosofia que mais desperta interesse em nossa sociedade nos dia de hoje. Sabe-se, por exemplo, a maioria das profissões e empresas possui seus códigos de ética, o que nos leva a supor que estas se preocupam, especificamente, na fundamentação e sistematização dos princípios e valores que orientarão respectivamente as ações dos seus profissionais e dos seus funcionários. Também, podemos constatar um profundo interesse em discutir e refletir sobre os problemas relacionados à vida humana, principalmente, devido às descobertas mais recentes da medicina, da biologia e da genética que promovem uma alteração inigualável nos padrões habituais pelo qual pensávamos e reagíamos a situações, como a clonagem humana, o uso de alimentos transgênicos e a utilização de células tronco. Por outro lado, igualmente, constata-se uma preocupação em revisar os parâmetros habituais do homem em relação ao meio ambiente, assim como do nosso dever em conscientizarmos, do ponto de vista ético, a responsabilidade com o futuro de nossa espécie e das demais que habitam o nosso planeta. Estas são apenas algumas das questões que suscitam um debate relacionado à ética e à moral verificadas por nós diariamente nos jornais, revistas e nos noticiários da televisão. Mas porque este interesse tão grande sobre a ética? A ética, mais do que qualquer outra disciplina, está diretamente relacionada à nossa experiência cotidiana. Ela nos conduz a uma reflexão crítica acerca dos valores adotados por nós, o sentido dos atos praticados e a forma pela qual as nossas decisões são tomadas e que tipo de responsabilidade devemos ter sobre elas. A ética é um campo de estudo altamente controverso e absolutamente relevante para nossa época. Desejando ou não, todos nós somos confrontados por questões éticas a cada dia. Cada vez mais somos sobrecarregados de perguntas que, no fundo, são estritamente éticas. Vemo-nos cercados por decisões acerca de como devemos viver e de que tipo de pessoas devemos ser. De certa forma, possuímos consciência 9 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade de que o que fazemos e quem somos são coisas absolutamente relevantes para nossa conduta enquanto ser social. Diante dessa perspectiva, estamos todos, de certa forma, refletindo sobre a ética. Neste sentido, é concebível afirmar que a ética está tão próxima de nós quanto estamos próximos dela. Contudo, o estudo da ética não se deve limitar em discutir e apresentar apenas os seus pressupostos fundamentais. Necessitamos ir sempre além deles, promovendo em nossa prática cotidiana os elementos que nos conduzirão a sermos indivíduos mais atentos com os valores básicos de nossa sociedade, e assim, tornando-nos capazes de possuirmos responsabilidade sobre nossas ações a fim de torná-las eticamente possíveis. Por isso, espera-se que o estudo da ética não seja tomado somente como exigência acadêmica. A ética é muito mais do que isso! Esta disciplina fora construída tendo em vista a fornecer um quadro geral de uma determinada questão ou problema, o que facilita o seu estudo em profundidade, pois permite facilmente uma visão crítica do âmbito em que está colocada cada questão particular da ética. Sendo assim, esta disciplina não se constitui em uma síntese esquemática e sufocante como muitas vezes acontece com certas apostilas e manuais, mas procura oferecer uma exposição que contempla o que há de mais valioso sobre uma determinada questão ou assunto da ética, deixando outras para que você tenha iniciativa de investigá-la por conta própria diante das variadas sugestões de bibliografia que serão apresentadas ao longo das unidades. Neste contexto, a disciplina apresenta uma integração que se manifesta no equilíbrio da sua exposição, na proporção e divisão dos assuntos abordados de modo a facilitar a compreensão em seu conjunto. Por outro lado, o desenvolvimento linear das unidades tem por finalidade fazer você se contagiar pelo gosto da disciplina, do raciocínio e da utilização da reflexão ética na sua vida pessoal e profissional, pois veremos então que esta disciplina, em lugar de ser penosa como muitos pensam, é condição para o viver em harmonia e liberdade respeitando as diferenças. Estaremos sempre presentes para auxiliá-lo em suas tarefas. Bons estudos! 10 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Plano da Disciplina Esta disciplina fora construída tendo em vista a fornecer um quadro geral de uma determinada questão ou problema, o que facilita o seu estudo em profundidade, pois permite facilmente uma visão crítica do âmbito em que está colocada cada questão particular da ética. Desse modo, esta não se constitui em uma síntese esquemática e sufocante como muitas vezes acontece com certas apostilas e manuais, mas procura oferecer uma exposição que contempla o que há de mais valioso sobre uma determinada questão ou assunto da ética, deixando outras para que você tenha iniciativa de investigá-la por conta própria diante das variadas sugestões de bibliografia que serão apresentadas ao longo das unidades. Diante desse contexto, a disciplina Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade apresenta uma integração que se manifesta no equilíbrio da sua exposição, na proporção e divisão dos assuntos abordados de modo a facilitar a compreensão em seu conjunto. Sendo assim, faremos um breve resumo de cada unidade, enfatizando seus objetivos para que você tenha uma visão geral daquilo que irá estudar: Unidade 1: Fundamentos da Ética e da Moral: contexto histórico e social, conceitos e definições fundamentais Apresenta esquematicamente os aspectos históricos e sociais da ética e da moral e situa os seus elementos constitutivos no desenvolvimento da humanidade. Objetivo: expor a problemática relativa à distinção entre ética e moral e suas respectivas definições e objetos de estudo. Unidade 2: Problemas Éticos e problemas morais: consciência moral, virtude, amizade, liberdade e felicidade Esta unidade fornece os problemas norteadores da ética e discute a problemática da liberdade, da responsabilidade e do determinismo nos filósofos La Boétie e Sartre e, em seguida, dá noções de felicidade amizade e virtude na reflexão filosófica de Aristóteles. 11 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Objetivo: refletir sobre a nossa prática cotidiana e avaliar a direção para a qual nossos valores éticos dirigem-se no mundo em que vivemos hoje. Unidade 3: Ética aplicada: a ética na empresa e nos negócios Trata dos pressupostos teóricos da ética empresarial e seus fundamentos, para a partir deste, expor os aspectos éticos presentes nas relações comerciais ou nos negócios. Objetivo: abordar a prática da ética no nível das organizações e nos negócios. Unidade 4: Ética profissional e responsabilidade social Esta unidade versará sobre problemática relativa à distinção aos valores sociais da profissão. Trata-se, portanto, de debater a essência da ética profissional. Objetivo: expor os conceitos capitais da ética e da responsabilidade social nos negócios e expor os princípios norteadores das decisões morais racionais. 12 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade Fundamentos da Ética e da Moral: contexto históricoe social, conceitos e definições fundamentais Distinguindo Ética de Moral. O caráter histórico e social da Moral. O caráter histórico e social da Ética. 1 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 14 Caro aluno, bem-vindo à nossa primeira unidade de estudo. Comecemos esta módulo apresentando a você o contexto histórico do surgimento da ética e da moral, assim como os principais conceitos e definições que as envolvem. Trata-se, portanto, de uma unidade introdutória cujo teor da abordagem preparará você ao entendimento seguro das questões tratadas nas unidades seguintes. Espero que, por intermédio desta explicação, você sinta-se confortável ao se introduzir no universo especulativo da ética e seus problemas fundamentais. Objetivos da unidade Apresentar a problemática relativa à distinção entre ética e moral, assim como as suas respectivas definições e objetos de estudo. Esboçar, de forma esquemática, os aspectos históricos e sociais da ética e da moral. Situar os seus elementos constitutivos no desenvolvimento da humanidade. Plano da unidade Distinguindo Ética de Moral. O caráter histórico e social da Moral. O caráter histórico e social da Ética. Como parceiros de sua aprendizagem, desejamos sucesso na sua formação! Bons Estudos! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 15 Distinguindo Ética da Moral No sentido geral, a palavra ética origina-se do grego antigo ήθική [ήθική φιλοσοφία] "filosofia moral" e do adjetivo ήθος (ēthos) que quer dizer "costume, hábito". Conexo ao conceito de ética está o conceito de moral, também originado de uma palavra grega “mores” (ήθος = mos) possui aparentemente um significado semelhante ao de ética. No entanto, se atentarmos como os gregos realmente usavam a grafia e a pronúncia do termo ēthos, nota-se uma nítida diferença de significado entre ambas. São elas: (pronunciado como êtos) = para designar "costume”. (pronunciado como étos) = para designar a índole, no sentido de caráter e temperamento natural da pessoa. Compreendeu como a diferença da pronúncia de ēthos altera substancialmente o seu significado? Certamente, em um ato concreto realizado por uma pessoa a diferença de sentido entre ambas não são claramente percebida. Por exemplo: o ato do cidadão grego de partir, com seus iguais, para a guerra, em defesa da cidade-estado (pólis), está presente nos dois sentidos indicados pelas duas palavras gregas. É costume da cidade grega que o cidadão seja soldado e não escravo, pois o ato de defender a cidade é um ato honroso. Com efeito, o ato de ir à guerra diz também algo íntimo acerca do homem, pois está relacionado ao seu caráter: ele é um homem corajoso e, como tal, valoroso. Vejam, nestas frases comuns entre nós, como os dois sentidos da palavra ēthos utilizados pelos gregos antigos estão intimamente relacionados: a) "O rapaz foi muito ético: não revidou agressão." b) “Aquele político é um homem ético." c) "Todos aqui o respeitam como um homem de moral." Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 16 Diferentemente dos gregos, os romanos utilizavam a palavra latina mos (mores) para designar o costume ou costumes. Foi a partir deste termo romano que surge o modo como entendemos o significado de moral na Língua Portuguesa. Sendo assim, na nossa Língua, os dois termos, ética e moral, implicam, simultaneamente, de alguma forma, nos dois significados diferentes antigos e, de fato, tanto a ética quanto a moral, incidem sobre estas duas dimensões, ou seja, uma valoração do homem como tal e do seu agir em conformidade ou não com os costumes e a tradição. Reconhecendo as dificuldades para separar de modo consensual e técnico o que é ético do que é moral, em um terreno em que não há acordo fácil entre os filósofos sobre a distinção entre ambas, vejamos como o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda as define: 1. ÉTICA: refere-se ao "estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto" (HOLANDA, 1999, p. 848-849). 2. MORAL: refere-se ao "conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada" (HOLANDA, 1999, p. 978- 979). IMPORTANTE: A distinção do dicionarista está de acordo com a certa tradição filosófica: a de considerar moral como as normas de convivência social e ética como o estudo e a reflexão teórica, sobre a moral, o comportamento moral dos homens e as valorações morais das diferentes culturas e sociedade, segundo uma metodologia estritamente racional, ou seja, filosófica e científica (Cf. VÁZQUEZ, 2001). Percebe-se claramente que as definições de ética e moral fornecidas pelo dicionarista apresentam uma diferença técnica entre os dois termos, segundo seu uso correto em nossa língua, em que está também a chave da solução para Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 17 entender o modo confuso e equivocado com que as duas palavras são usadas: os homens modernos não gostam de dizer que suas ações são morais, pois isto equivaleria a dizer que elas são corretas apenas porque são conformes ao costume e à tradição. Preferem dizer que agem segundo uma ética para denotar um suposto caráter independente, reflexivo e filosófico de sua posição existencial e política. Diante dos clamores da imprensa, dos políticos e dos militantes dos movimentos sociais por "mais ética na política", nos últimos anos, usa-se o termo ética e não o termo moral para uma fuga, até certo ponto fictícia, do caráter "tradicionalista" da moral. Por um lado, se avaliarmos bem quais seriam os "princípios éticos" que, em última análise, se espera dos políticos, encontraríamos antigos valores da cultura ocidental, consignados em mandamentos da lei de Deus, conforme a tradição mosaica e incorporada pelo cristianismo: “Não matarás; não roubarás”; “não levantarás falso testemunho”; “não cobiçarás as coisas alheias” (Cf. VÁZQUEZ, 2001). Diante disso, o apelo por mais ética na política nada mais é do que um apelo por mais fidelidade aos antigos valores morais do mundo ocidental. Desta forma, lá onde se alardeia uma novidade, produto de uma reflexão "filosófico-ética" original, nada mais há do que valores antigos sob novos nomes ou "novas fachadas". Por outro lado, há níveis de complexidade dos problemas humanos reais e concretos que já não são tão facilmente resolvidos com base nos costumes tradicionais. Veja-se que ninguém precisa fazer apelo à reflexão ética para dizer que "é imoral um vizinho roubar o cachorro do outro e dá-lo de presente a um amigo". Em geral, poder-se-ia dizer que a lei moral "não roubarás" surgiu neste mesmo contexto elucidativo, ou seja, problemas humanos antigos continuam sendo suficientemente bem resolvidos pela moral tradicional. Logo, um dos grandes dilemas dos estudos da moral na atualidade pode ser resumido nas seguintes questões: existem ou não valores morais válidos para todos os homens? Como justificar a classificação das ações em moralmente corretas ou incorretas, boas ou más? Tradição mosaica: tradição proveniente dos ensinamentos de Moisés. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 18 Retomando a problemática da distinção conceitual entre ética e moral, Vázquez afirma que a “ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. Ou seja, é a ciência de uma forma específica do comportamento humano” (VÁZQUEZ, 2001, p. 12). Essa definição ressalta o caráter científico da ética, isto é, corresponde à necessidade de uma abordagem científica dos problemas morais. Por outro lado, Valls afirma que: “a ética preocupa-se com as formas humanas de resolver as contradições entrenecessidade e possibilidade, entre tempo e eternidade, entre o individual e o social, entre o econômico e o moral, entre o corporal e o psíquico, entre o natural e o cultural e entre a inteligência e a vontade, evidenciando as contradições enfrentadas pelos indivíduos na tomada de decisões envolvendo dilemas éticos (VALLS, 1996, p. 48). Comparando as definições fornecidas pelos autores, poderemos traçar o seguinte esquema: 1. a ética relaciona-se com a ciência (o conhecimento científico); 2. a ética relaciona-se com avaliação da conduta humana; 3. a ética é uma ciência normativa; 4. a ética, pelo contrário, é uma reflexão filosófica, logo puramente racional; 5. a ética possui um caráter universalista opostamente ao caráter restrito da moral. Conforme explicitado, os problemas éticos caracterizam-se pela sua generalidade; isto os distingue dos problemas morais relativos à vida cotidiana. De acordo com Vázquez, “por causa de seu caráter prático (…), tentou-se ver na ética uma disciplina normativa, cuja função fundamental seria a de indicar o comportamento melhor do ponto de vista moral” (VÁZQUEZ, 2001, p. 10). Desse Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 19 modo, o ético tornar-se-ia uma espécie de “legislador do comportamento moral” dos indivíduos ou da comunidade. No entanto, ainda segundo Vázquez: A função fundamental da ética é a mesma de toda teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando os conceitos correspondentes. Por outro lado, a realidade moral varia historicamente e, com ela, variam os seus princípios e as suas normas (VÁZQUEZ, 2001, p. 10). Portanto, não cabe à ética formular juízos de valor sobre a prática moral de outras sociedades ou épocas, mas sim explicar a razão de ser destas mudanças de moral, esclarecendo o fato de o homem ter recorrido a práticas morais diferentes e até opostas. É importante notar que a ética não deve ser confundida com moral, como podem induzir expressões correntes como “ética católica” ou “ética do capitalismo”. Segundo Robert Srour: Enquanto a moral tem uma base histórica, o estatuto da ética é teórico, corresponde a uma generalidade abstrata e formal. A ética estuda as morais e as moralidades, analisa as escolhas que os agentes fazem em situações concretas, verifica se as opções se conformam aos padrões sociais. (…). Distingue-se das morais históricas que imbuem coletividades amplas (nações, classes ou categorias sociais) e que remetem a conceitos específicos ou de “espécie” (SROUR, 2000, p. 270). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 20 Embora sejam temas de natureza teórica, as definições construídas pela ética podem interferir substancialmente nas práticas morais. Por isso, Vázquez afirma que teoria ética e a prática moral, ainda que distintas, devem viver entrelaçadas ou, nas suas palavras, em “retroalimentação” permanente. Neste sentido, a ética estudaria os comportamentos “prático- morais”, trazendo-lhes depois questionamentos e proposições. Quanto à moral, entende-se um conjunto de normas e regras destinadas a regular as relações entre os indivíduos. O seu significado, função e validade não podem deixar de receber uma variação histórica nas diferentes sociedades. De fato, o comportamento moral varia de acordo com o tempo e o lugar, conforme as exigências nas quais os indivíduos se organizam ao estabelecerem as formas de relacionamento e as práticas de trabalho. À medida que estas relações se alteram, exige- se uma modificação progressiva nas normas do comportamento coletivo. Por exemplo, a idade média caracterizava-se pelo regime feudal, baseado, sobretudo, na hierarquia de suseranos, vassalos e servos (ARANHA, 2003). Neste regime, o trabalho era garantido pelos servos, possibilitando aos nobres uma vida dedicada ao ócio e à guerra. A moral cavalheiresca deriva e baseia-se no pressuposto da superioridade da nobreza, exaltando a virtude da lealdade e da fidelidade — suporte do “sistema de suserania”. Em contraposição, o trabalho é desvalorizado e restrito aos servos. Esta situação foi alterada substantivamente com o aparecimento da burguesia, a qual, formada pelos antigos servos libertos, tendeu a valorizar o trabalho e criticar a ociosidade (Cf. ARANHA, 2003). IMPORTANTE: Diante disso, é possível perceber que uma mudança radical na estrutura social acarreta uma mudança fundamental de moral. Em cada indivíduo, entrelaça-se, de modo particular, uma série de relações sociais próprias ou particulares de sua época ou da sua sociedade, o que demonstra que a sua individualidade possui também um caráter social. Percebe-se, por outro lado, que existe uma gama de padrões que, em cada sociedade, modelam o comportamento individual, o seu modo de trabalhar, o seu modo de se vestir, sentir, amar, etc. Estes padrões variam de uma sociedade para outra e, por isso, não há sentido em falar de uma individualidade fora das relações que os indivíduos encontram na sociedade. Retroalimentação significa, neste contexto, uma troca constante e mútua de elementos da moral e da ética que se entrecruzam simultaneamente. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 21 Contudo, ainda que a moral mude historicamente, e uma mesma norma moral possa apresentar um conteúdo diferente em diferentes contextos sociais, a função social da moral em seu conjunto ou de uma norma particular é a mesma, isto é, regular as ações dos indivíduos nas suas relações mútuas ou as do indivíduo com a comunidade, objetivando preservar a sociedade no seu conjunto ou a integridade do grupo social. Para Vázquez (2001, p. 233): Assim a moral cumpre uma função social bem definida: contribuir para que os atos dos indivíduos ou de um grupo social desenvolvam-se de maneira vantajosa para toda a sociedade ou para uma parte. A moral implica, portanto, uma relação livre e consciente entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade. Mas esta relação está também socialmente condicionada, precisamente porque o indivíduo é um ser social ou um nexo das relações sociais. O indivíduo se comporta moralmente no quadro de certas relações e condições sociais determinadas que ele não escolheu e dentro também de um sistema de princípios, valores e normas morais que não inventou, mas que recebe socialmente e segundo o qual regula as suas relações com os demais ou com a comunidade inteira. Com base nestes elementos conceituais, podemos definir a moral da seguinte forma: “A moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade, de tal maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico e social, sejam acatadas livre e conscientemente, por uma convicção íntima, e não de uma maneira mecânica, externa e impessoal (VÁZQUEZ 2001, p. 84). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 22 A moral, portanto, possui um caráter social, porque os indivíduos se sujeitam a princípios, normas ou valores socialmente estabelecidos. Também, regula somente atos e relações que acarretam consequências para outros e exigem necessariamente a sanção dos demais. Por outro lado, cumpre a função social de induzir os indivíduos a aceitar livre e conscientemente determinados princípios, valores e interesses. Com base na definição de moral em Vázquez, delinearemos um quadro comparativo entre ética e moral. Vejamos a seguir: ÉTICA MORAL Parte da filosofia prática que objetiva elaborar um reflexão sobre os problemas fundamentais da moral fundamentado em um estudo metafísico do conjunto de regras da conduta considerada como universalmente válida. A moral é uma forma de comportamento humano que compreende tanto uma aspecto normativo quanto um aspecto factual. Diferente da moral, a éticapreocupa-se em detectar os princípios de uma vida conforme a sabedoria filosófica, em elaborar uma reflexão sobre as razões de se desejar a justiça e a harmonia e sobre os meios de alcançá-la. A moral é um fato social. A ética é a ciência da moral, ou seja, de uma esfera do comportamento humano. Neste sentido, a ética não é moral nem a moral é científica. Embora a moral possua um caráter social, o individuo tem um papel fundamental, pois a moral exige a interiorização das normas e deveres. Diante desse quadro comparativo, é possível constatar a confluência dos enunciados com as definições de ética e moral formuladas anteriormente. Ética e moral relacionam-se, mas com objetos diferenciados, específicos e bem definidos. Com efeito, ambas as palavras mantêm uma relação que não possuíam propriamente em suas origens etimológicas. Certamente, a moral diz respeito ao conjunto de normas ou regras adquiridas pelo hábito. Neste caso, a ela refere-se ao comportamento adquirido socialmente ou modo de ser conquistado pelo homem. A ética, por sua vez, baseia-se em um modo de comportamento que não corresponde a uma disposição natural, mas é adquirido ou conquistado pelo hábito. É precisamente esse caráter não-natural da forma de ser do homem que, no período antigo da humanidade, conferia a este mesmo homem uma “dimensão moral”. A seguir, discutiremos com mais detalhe o caráter histórico e social da moral, especificando esta dimensão moral do homem. Preparados? Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 23 O caráter histórico e social da Moral Mesmo considerando a origem divina das ideias morais, por intermédio das quais os indivíduos teriam adquirido a consciência dos meios adequados à sua elevação ao plano espiritual dos valores perenes, a investigação do problema da moral não pode desprezar os processos históricos responsáveis pelos mecanismos de criação, funcionamento e aplicação dos padrões e das regras morais. Todas as sociedades humanas possuem valores padrões, normas de conduta e sistemas que garantem a aplicação e o funcionamento das mesmas. O estudo do modo de implementação social desses sistemas de regulação moral revela-nos que o fundamento sobre o qual repousam constitui-se de hábitos e atitudes firmados diante de “padrões de conduta”, que funcionam como “cimento da unidade social dos grupos humanos”. A questão que nos interessa é saber se estes padrões de conduta moral são impostos a partir da própria estrutura de poder vigente ou se refletem a natureza geral humana. IMPORTANTE: No primeiro caso, a existência desses padrões é objetiva: está posta nas leis e normas emanadas das instâncias de poder. No segundo caso, fazem-se necessárias especulações e discussões sobre o que é a natureza humana e como ela deve ser cuidada para se manter fiel a si mesma. Para auxiliarmos no entendimento destas questões, verificaremos o comentário de Howard Parsons (1982, p. 158) sobre esta problemática: A “moral”, em suas raízes latinas, caracteriza-se como algo de pesado, inamovível e campesino: os mores são os usos e costumes de um povo, embebido de hábitos que estão na base dos seus caracteres e que os une num sólido liame. Destruam os mores, destruirão os homens e a sociedade. A moral tradicional, porém, não satisfaz muita gente hoje em dia. A sociedade e a mores estão em uma convulsão como nunca se viu antes. Deriva daí que a nossa pesquisa não deve voltar-se nem tanto para uma nova moral (os frutos), nem tampouco para velhas morais (troncos vazios), e sim para raízes eternas. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 24 Baseados no comentário citado pelo autor, podemos dividir as concepções quanto à origem da moral em dois tipos básicos: aquelas que explicam esta origem por princípios metafísicos e, como tal, supra-históricos ou a-históricos. Alinham-se neste primeiro tipo as teorias que veem um poder sobre-humano como fonte das normas morais. Também as que veem o homem como origem e fonte da moral, mas referindo-se a uma essência eterna e imutável a todos os indivíduos. De outro lado, estão as teorias historicistas, ou seja, as que procuram a origem da moral no horizonte da história, vendo-a como produto histórico e social do homem. Entre as teorias a-historicistas ou metafísicas, poder-se-ia citar a posição Neotomista. Esta corrente de pensamento europeia e católica (representada por Garrigou-Lagrange e Jacques Maritain) surgiu entre as duas grandes guerras mundiais e que teve penetração no Brasil a partir dos anos cinquenta através do Pe. Leonel Franca e de Alceu de Amoroso Lima (Tristão de Ataíde). Estes seguem o pensamento de São Tomás de Aquino e afirmam que o homem é dotado de um senso moral natural, "no sentido de que possui uma infalibilidade resultante da própria natureza da inteligência" (Cf. ARANHA, 2003, p. 67). O senso moral, segundo Tomás de Aquino, é o "sentimento imediato e absoluto da lei reguladora do conhecimento e da ação práticos", define-se "adequada e essencialmente pelo princípio de que é preciso fazer o bem e evitar o mal". Desta forma, a vontade humana tende necessariamente para o bem. Por esta razão, os sentimentos morais, considerados componentes da consciência moral, manifestem uma tendência ao bem e uma repulsa ao mal, o respeito do dever e a antipatia pela má conduta. Tomás de Aquino que foi chamado o mais sábio dos santos e o mais santo dos sábios. Seu maior mérito foi a síntese do cristianismo com a visão aristotélica do mundo, introduzindo o aristotelismo, sendo redescoberto na Idade Média, na escolástica anterior, compaginou um e outro, de forma a obter uma sólida base filosófica para a teologia e retificando o materialismo de Aristóteles. Em suas duas "Summae", sistematizou o conhecimento teológico e filosófico de sua época : são elas a "Summa Theologiae", a "Summa Contra Gentiles" (Disponível em: <www.wikpedia.com.br>. Acesso em 16 maio 2008.) Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 25 As teorias historicistas, por outro lado, defendem que a moral de uma comunidade encontra-se essencialmente em seus costumes. Em outras palavras, para estes os costumes dizem como cada homem deve agir em situações concretas em função daquilo que a comunidade considera como sendo o bem e o mal. Por isso, consideram o modo de agir e de pensar baseado na "moral" como aquele que está em conformidade com a moralidade. Por sua vez, para estes a moralidade consiste na obediência ao costume de tal forma que onde não há nenhum costume classificado como certo, não há moralidade, pois se pode agir de diferentes modos sem que nenhum deles seja visto pela comunidade como um ato imoral ou amoral. Mas o que é imoral e amoral? No sentido geral, o termo imoral significa algo que é contrário à moral. Especificamente, diz respeito a uma conduta ou regra que contraria a moral prescrita pela sociedade. Em outras palavras, entende-se por imoral tudo aquilo que uma sociedade (em um determinado espaço e tempo) consensualmente não admite ou julga ser correto ou justo em relação à conduta ou ao comportamento social de um indivíduo e um grupo de indivíduos que pertencem a ela. De outra forma, o termo amoral significa propriamente ausência de moral, ou seja, é o instante que não se pode avaliar ou emitir um juízo de valor de natureza moral ou imoral sobre o agir de um indivíduo ou mesmo um grupo de indivíduos pertencentes a uma determinada sociedade. Percebeu como estes dois termos estão intimamente relacionados ao comportamento dos indivíduos no seio da sociedade? É exatamente este o ponto de vista de Vázquez (2001, p. 244): A necessidade de ajustar o comportamento de cada membro aos interesses da coletividade leva a que se considere como bom ou proveitoso tudo aquilo que contribui para reforçar a união ou a atividade comum e,ao contrário, que se veja como mau ou perigoso o oposto; ou seja, o que contribui para debilitar o minar a união; o isolamento, a dispersão dos esforços, etc. Estabelece-se, assim, uma linha divisória entre o que é bom e o que é mau, uma espécie de tábua de deveres Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 26 ou obrigações baseada naquilo que se considera bom ou útil para a comunidade. Destacam-se, assim, uma série de deveres: todos são obrigados a trabalhar, a lutar contra os inimigos da tribo, etc. Estas obrigações comuns comportam o desenvolvimento das qualidades morais relativas aos interesses da coletividade: solidariedade, ajuda mútua, disciplina, amor aos filhos da mesma tribo, etc. O que mais tarde se qualificará como virtudes ou como vícios acha-se determinado pelo caráter coletivo da vida social. Numa comunidade que está sujeita a uma luta incessante contra a natureza, e contra os homens de outras comunidades, o valor é uma virtude principal porque o valente presta um grande serviço à comunidade. Por razões análogas, são aprovadas e exaltadas a solidariedade, a ajuda mútua, a disciplina, etc. Ao contrário, a covardia é um vício horrível na sociedade primitiva porque atenta, sobretudo contra os interesses vitais da comunidade. E se deve dizer a mesma coisa de outros vícios como o egoísmo, a preguiça, etc. Cabe notar que a partir desta consideração, Vázquez entra em uma calorosa discussão entre as teses metafísicas e historicistas sobre a origem da moral, o que nos conduz a uma reflexão sobre os seus fundamentos, ou seja, uma discussão a respeito da legitimidade com que a moral se impõe aos indivíduos. Se a moral possui uma origem metafísica, não está ao alcance do homem modificar seus postulados fundamentais, tais como, o princípio "faça o bem e evite o mal". Um princípio metafísico como este garante por si mesmo uma forte fundamentação teórica para o ordenamento moral da sociedade. Se concepções historicistas da origem da moral estiverem certas, a moral a que estamos submetidos relativiza-se os nossos próprios atos, o que torna um desafio repensar os seus fundamentos. Com efeito, torna-se possível não apenas reformá-la, mas fazê-la com a consciência de que ela é apenas um produto humano. Isto retira boa parte de sua força de imposição e legitimidade proveniente da ideia de sua origem metafísica, transcendente e sagrada. O que acontece com o indivíduo e com a sociedade que dessacraliza sua moral? Surge o risco da desordem e da desestruturação da sociedade? Desestruturar a sociedade é correr risco de voltarmos para a animalidade, para a barbárie. Barbárie: estado ou condição de bárbaro. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 27 Por conta disso, o âmbito da moral passar a existir como um traço de formação que todo homem recebe do processo de interação. Essa formação é inteiramente não-religiosa na sua própria justificação: por isso se diz que a moral do homem moderno é laicizada. Os valores morais não são reconhecidos como revelados por uma um origem divina, ou seja, trata de valores que não são sagrados. Ao contrário, estes valores são resultantes do processo histórico de sua dessacralização. A eles recusa-se qualquer transcendência, qualquer caráter sagrado. Mas existem objetivamente e sua existência pode até ser estatisticamente verificada, ou seja, justificada através de critérios científicos. Não é somente o critério científico que a moral justifica-se. Ela pode ainda ser justificada pelos seguintes critérios: critério de justificação social: na medida em que a moral desempenha a função social de garantir o comportamento dos indivíduos de uma comunidade numa determinada direção, toda norma corresponderá aos interesses e necessidades sociais. Em suma, em uma comunidade em que se verifica a necessidade de um indivíduo ou o interesse de um indivíduo particular, justifica-se uma norma que exige o seu comportamento adequado; critério de justificação prática: uma norma moral somente pode ser justificada se forem verificadas as condições reais para que a sua aplicação não se ponha às necessidades sociais da comunidade. Sendo assim, em uma determinada comunidade na qual se verificam as condições necessárias, justifica-se a norma que corresponde a tais condições; critério de justificação lógica: a justificação lógica das normas satisfaz plenamente a função social de toda moral, pois impede que uma comunidade determinada elabore normas arbitrárias ou caprichosas que, precisamente, por não se integrarem no respectivo sistema normativo, entrariam em contradição com os interesses e necessidades da comunidade. Neste contexto, uma norma se justifica logicamente se demonstrada a sua coerência e não- contraditoriedade com respeito às demais normas do código moral do qual faz parte. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 28 Veremos a seguir alguns aspectos desta discussão, apresentando a você o contexto histórico e social da ética. Vamos lá? O caráter histórico e social da Ética Como já discutimos, toda coletividade humana possui sua própria moral ou suas morais (diferentes morais para diferentes grupos da mesma sociedade). Isto, porém, não significa que todo povo tenha uma ética, entendida como um estudo racional da moral. O nascimento (origem ou gênese) da moral data do próprio nascimento da coletividade humana e do seu processo de interação. Pode-se afirmar que as doutrinas éticas nascem e se desenvolvem em diferentes épocas e sociedades como respostas aos problemas básicos apresentados pelas relações entre os homens e, em particular, pelo seu comportamento moral efetivo. Por essa razão, existe uma estreita vinculação entre os conceitos morais e as realidades humana e social, sujeitas historicamente à mudança. Com efeito, as doutrinas éticas não podem ser consideradas isoladamente, mas dentro de um processo de mudança e de sucessão que constitui propriamente a história. Ética e história, portanto, relacionam-se duplamente: com a vida social e com a sua própria história, uma vez que cada doutrina ética está em conexão com as anteriores. Toda moral efetiva se elaboram certos princípios, valores ou normas. Assim, mudando radicalmente a vida social, muda também a vida moral. Os princípios, valores e normas encarnados nela entram em crise e exigem a sua justificação ou a sua substituição por outros. Assim explica-se o surgimento e sucessão de doutrinas éticas fundamentais em conexão direta com a mudança e sucessão de estruturas sociais e, dentro delas, da vida social. A gênese da moral é também um problema em relação à moral estabelecida na atualidade. O fato de ela estar estabelecida, de sustentar-se e perpetuar-se historicamente exige uma explicação. Por isso, do ponto de vista filosófico, há uma necessidade intrínseca para explicar a gênese e os pressupostos fundamentais da moral. A ética, enquanto estudo da moral, por outro lado, tem data de nascimento certa e, graças à história da filosofia, podemos conhecer o seu surgimento e a sua evolução. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 29 A ética surgiu na Grécia, no século V a.C., com o surgimento dos sofistas e com a atitude de reação aos sofistas por parte de Sócrates. A sofística aparece num momento cultural e político muito específico da história e cultura grega. No período clássico grécia, os sofistas rejeitam a tradição mítica ao considerar que os princípios morais resultam de convenções humanas. Embora na mesma linha de oposição aos fundamentos religiosos, Sócrates se contrapõe aos sofistas ao buscar explicar os princípios morais não nas convenções, mas na natureza humana. Segundo Hamlyn (1990 p. 25): A ética propriamente dita começou com Sócrates, embora os sofistas lhe tenham dado um estímulo importante. Isto a despeito do fato de que Sócrates, a julgar pelas indicaçõesque nos dá Platão, se opunha a eles. Para seus contemporâneos, de qualquer maneira, eles provavelmente pareciam mais próximos a ele do que nos parece hoje. Os sofistas eram mestres ambulantes que davam cursos ou aulas individuais sobre vários assuntos e cobravam por esse privilégio. Alguns deles, pelo menos, parecem ter ganho bom dinheiro com essas atividades. É tentador atribuir a esse fato o desfavor em que são hoje tidos, embora seja duvidoso que cobrar honorários por serviços prestados tenha sido motivo de desaprovação para o ambiente ateniense típico de meados do século V a.C. Sócrates censurava-os porque achava que eles alegavam fornecer mais do que realmente davam. Em especial, alegava que eles diziam que podiam ensinar virtude ao homem e achava que não faziam nada disso. Um sofista era um professor e, por este motivo, a palavra sophistés era utilizada para se referir aos poetas, que foram os primeiros educadores na Grécia. Em princípio, a palavra sofista não possui um sentido pejorativo que veio adquirir mais tarde, em Atenas, quando os seus inimigos os acusavam de charlatães e mentirosos. O que ensinavam os sofistas? Os sofistas ensinavam a arte de argumentar e persuadir, arte decisiva para quem exerce a cidadania em uma democracia direta. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 30 Mais uma vez, contudo, se acreditarmos nos diálogos de Platão, os próprios argumentos de Sócrates, considerados puramente como tais, são amiúde pouco melhores do que os de seus adversários sofistas. Pouca dúvida pode haver de que os contemporâneos de Sócrates o teriam julgado tão inigualável a esse respeito como os sofistas. Por outro lado, muitos tributavam a todos eles uma análoga admiração prudente. Sócrates, no entanto, exercia um fascínio próprio, como dá notícia Alcibíades em O Banquete, de Platão, e era o caráter do homem e a profundidade de sua consciência moral que o tornava especial. Inúmeros são os diálogos de Platão em que são descritas as discussões socráticas a respeito das virtudes e da natureza do bem. Resulta daí a convicção de que a virtude se identifica com a sabedoria e o vício com a ignorância. Neste termos, para Platão, a virtude pode ser aprendida. Na célebre passagem de República em que Platão descreve o mito da caverna reaparece essa ideia: o sábio é o único capaz de se soltar das amarras que o obrigam a ver apenas sombras e, dirigindo-se para fora, contempla o sol, que representa a ideia do Bem. Portanto, "alcançar o bem" se relaciona com a capacidade de "compreender bem". Todavia, apenas o filósofo atinge o nível mais alto de sabedoria, só a ele cabe a virtude maior da justiça e, portanto, lhe é reservada a função de governar a cidade. Outras virtudes menores, mas também importantes para a cidade, caberão aos soldados defensores da pólis e aos trabalhadores comuns, artesãos e comerciantes. IMPORTANTE: Herdeiro do pensamento de Platão, Aristóteles aprofunda a discussão a respeito das questões éticas. Mas, para este, o homem busca a felicidade, que consiste não nos prazeres nem na riqueza, mas na vida teórica e contemplativa cuja plena realização coincide com o desenvolvimento da racionalidade. O que há de comum no pensamento dos dois filósofos gregos em questão é a concepção de que a virtude resulta do trabalho reflexivo, da sabedoria, do controle racional dos desejos e paixões. Além disso, o sujeito moral não pode ser compreendido ainda, como nos tempos atuais, na sua completa individualidade. Os homens gregos são, antes de tudo, cidadãos, membros integrantes de uma comunidade, de modo que a ética se acha intrinsecamente ligada à política e a pólis. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 31 No período helenista, os filósofos se ocupam predominantemente com questões morais, e destacam-se duas tendências opostas: hedonismo e o estoicismo. Para os hedonistas (do grego hedoné, "prazer"), o bem se encontra no prazer. O principal representante do hedonismo grego, Epicuro (341-270 a.C.), considera que os prazeres do corpo são causas de ansiedade e sofrimento. Para permanecer imperturbável, a alma precisa desprezar os prazeres materiais, o que leva Epicuro a privilegiar os prazeres espirituais, dentre os quais aqueles referentes à amizade. Na mesma época, o estoico Zenon de Cítio (336- 264 a.C.) despreza os prazeres em geral, ao considerá- los fonte de muitos males. As paixões devem ser eliminadas, porque só produzem sofrimento e, por isso, a vida virtuosa do homem sábio, que vive de acordo com a natureza e a razão, consiste em aceitar com impassibilidade o destino e o sofrimento (Cf. ARANHA, 2003). As teorias estoicas foram bem aceitas pelo cristianismo ainda na época do Império Romano, tendo também fecundado as ideias ascéticas do período medieval. Durante a Idade Média, a visão teocêntrica do mundo fez com que os valores religiosos impregnassem as concepções éticas, de modo que os critérios do bem e do mal se achavam vinculados à fé e dependiam da esperança de vida após a morte. Na perspectiva religiosa, os valores são considerados transcendentes, porque resultam de doação divina, o que determina a identificação do homem moral com o homem temente a Deus. No entanto, a partir da Idade Moderna, culminando no movimento da Ilustraçao no século XVIII, a moral se torna laica, secularizada. Ou seja, ser moral e ser religioso não são polos inseparáveis, sendo perfeitamente possível que um homem ateu seja moral e, mais ainda, que o fundamento dos valores não se encontre em Deus, mas no próprio homem. Epicuro (341-270 a.C.), filósofo grego (nascido em Samos) atomista, fundador do epicurismo. A base de seu sistema é uma física fundada nos *átomos como em Demócrito. Pontos últimos se deslocando no vazio. Os átomos constituem a explicação última do mundo: nada existe a não ser os átomos e o vazio no qual se move: a alma, como tudo o que existe, é formada de átomos materiais: tudo o que acontece no mundo deve-se às ações e interações mecânicas dos átomos. Visão teocêntrica é aquela que atribui Deus como centro de tudo. Laico e secular significam respectivamente o oposto ao eclesiástico. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 32 O movimento intelectual do século XVIII conhecido como Iluminismo, Ilustração ou Aujklärung e que caracteriza o chamado Século das Luzes exalta a capacidade humana de conhecer e agir pela "luz da razão". Esta critica a religião que submete o homem à heteronomia, que o subjuga a preconceitos e o conduz ao fanatismo. Rejeita toda tutela que resulta do princípio de autoridade. Em contraposição, defende o ideal de tolerância e autonomia. No lugar das explicações religiosas, a Ilustração fornece três tipos de justificação para a norma moral: aquela se funda na lei natural (teses jusnaturalistas), no interesse (teses empiristas, que explicam a ação humana como busca do prazer e evitação da dor) e na própria razão (tese kantiana). A máxima expressão do pensamento iluminista encontra-se em Kant (1724- 1804) que, além da Crítica da razão pura escreveu a Crítica da razão prática e Fundamentação da metafísica dos costumes, nas quais desenvolve a sua teoria moral e ética. A razão prática diz respeito ao instrumento para compreender o mundo dos costumes e orientar o homem na sua ação. Analisando os princípios da consciência moral, Kant conclui que a vontade humana é verdadeiramente moral quando regida por imperativos categóricos. O imperativo categórico é assim chamado por ser incondicionado, absoluto, voltado para a realização da ação tendo em vista o dever. A tradição da moral ocidental encontrou no pensamento do filósofo alemão do século XVIII um momento de aparente resolução do antagonismo histórico entre as fontes judaicas e helênicas da moralidade. Para este, uma ação moralmente justificáveldeve ser pública e, como tal, não pode estar a serviço de qualquer intenção ou interesse particular ou egoísta. Deve-se, portanto, agir somente na medida em que a nossa ação possa ser imitada por todos sem prejuízo a ninguém. Ou seja, a norma a que obedeço é a norma que eu próprio me dou, mas que deve poder ser defendida publicamente, para que possa ser seguida por toda a humanidade como um “lei universal” ou , no mínimo, não ser rejeitada por esta. Imperativo categórico: Kant criou o termo imperativo no seu livro Fundamentação da Metafísica dos Costumes, escrito em 1785. Esta palavra pode ser entendida, segundo alguns autores, como uma analogia ao termo bíblico Mandamento. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 33 Para Kant, esse ato de autonomia e de poder agir publicamente, sem ser acusado por ninguém, é a fonte da satisfação moral. Essa atitude moralmente válida decorre unicamente do uso de nossa capacidade racional, da liberdade da nossa vontade e, sobretudo, da orientação que, por educação, imprimimos à nossa vontade para que se torne boa ou para que seja absolutamente boa. Nesse sentido, fica patente que Kant rejeita as concepções morais predominantes até então, quer seja da filosofia grega, quer seja da cristã, e que norteiam a ação moral a partir de condicionantes como a felicidade ou o interesse privado. Por exemplo, para Kant não faz sentido agir bem com o objetivo de ser feliz ou evitar a dor, ou ainda para alcançar o céu ou não merecer a punição divina. O agir moralmente funda-se exclusivamente na razão. A lei moral que a razão descobre é universal, pois não se trata de descoberta subjetiva (mas do homem enquanto ser racional) e é necessária, pois é ela que preserva a dignidade dos homens. Isso pode ser sintetizado nas seguintes afirmações do próprio Kant (1988, p. 34): "Age de tal modo que a máxima de tua ação possa sempre valer como princípio universal de conduta"; "Age sempre de tal modo que trates a Humanidade, tanto na tua pessoa como na do outro, como fim e não apenas como meio". A autonomia da razão para legislar supõe a liberdade e o dever. Pois todo imperativo se impõe como dever, mas a exigência não é heterônoma — exterior e cega e sim livreniente assumida pelo sujeito que se autodetermina. Vamos exemplificar: suponhamos a norma moral "não roubar”. Para a concepção cristã, o fundamento da norma se encontra no sétimo mandamento de Deus. No entanto, para os teóricos jusnaturalistas (como Rousseau e Hobbes), ela se funda no direito natural, comum a todos os homens; por outro lado, para os empiristas (como Locke, Condillac) a norma deriva do interesse próprio, pois o sujeito que a desobedece será submetido ao desprazer, à censura pública ou à prisão. Lei moral é a expressão de um princípio moral, sob forma que explicite o que é o bem e o mal, a partir do qual se pode justificar a validade das normas ou valores morais por ele aceitos como fonte de sentido para a sua existência. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 34 Para Kant, a norma se enraíza na própria natureza da razão; ao aceitar o roubo e consequentemente o enriquecimento ilícito, elevando a máxima (pessoal) ao nível universal, haverá uma contradição: se todos podem roubar, não há como manter a posse do que foi furtado. A reflexão ética de Kant foi importante para fornecer as categorias da moral iluminista racional, laica, acentuando o caráter pessoal da liberdade. Mas, a partir do final do século XIX e ao longo do século XX, os filósofos começam a se posicionar contra a moral formalista kantiana fundada na razão universal, abstrata, e tentam encontrar o homem concreto da ação moral. É nesse sentido que podemos compreender o esforço de pensadores tão diferentes como Marx, Nietzsche, Freud, Kierkegaard e os existencialistas. Vejamos a posição de Nietzsche. O pensamento de Nietzsche (1844- 1900) se orienta no sentido de recuperar as forças inconscientes, vitais, instintivas subjugadas pela razão durante séculos. Para tanto, critica Sócrates por ter encaminhado pela primeira vez a reflexão moral em direção ao controle racional das paixões. Segundo Nietzsche, nasce aí o homem desconfiado de seus instintos, tendo essa tendência culminado com o cristianismo, que acelerou a "domesticação" do homem (ARANHA, 2003). Segundo Machado (1999), em diversas obras, como A genealogia da moral, Para além do bem e do mal e Crepúsculo dos ídolos Nietzsche faz a análise histórica da moral e denuncia a incompatibilidade entre esta e a vida. Em outras palavras, o homem, sob o domínio da moral, se enfraquece, tornando-se doentio e culpado. Nietzsche relembra a Grécia homérica, do tempo das epopeias e das tragédias, considerando-a como o momento em que predominam os verdadeiros valores aristocráticos, quando a virtude reside na força e na potência, sendo atributo do guerreiro belo e bom, amado dos deuses. Nessa perspectiva, o inimigo não é mau: "Em Homero, tanto o grego quanto o troiano são bons. Não passa por mau aquele que nos inflige algum dano, mas aquele que é desprezível". Ao fazer a crítica da moral tradicional, Nietzsche preconiza a "transvaloração de todos os valores" e denuncia a falsa moral, "decadente", "de rebanho", "de escravos", cujos valores seriam a bondade, a humildade, a piedade e o amor ao próximo. Também, contrapõe a ela a moral "de senhores", uma moral positiva que visa à conservação da vida e dos seus instintos fundamentais. A “moral de senhores” é positiva, porque baseada no sim à vida e se Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 35 configura sob o signo da plenitude, do acréscimo. Por isso, ela funda-se na “capacidade de criação”, de invenção, cujo resultado é a alegria, consequência da afirmação da potência. O homem que consegue superar-se é o “super-homem”, diz Nietzsche apud MACHADO (1999, p. 67). À moral aristocrática, “moral de senhores”, que é sadia e voltada para os instintos da vida, Nietzsche contrapõe o pensamento socrático-platônico (que provoca a ruptura entre o trágico e o racional) e a tradição da religião judaico- cristã. A moral que deriva daí é a moral de escravos, moral decadente, porque baseada na tentativa de subjugação dos instintos pela razão, o “homem- fera”, “animal de rapina”, é transformado em “animal doméstico ou cordeiro”. De acordo com Nietzsche, a moral plebeia estabelece um sistema de juízos que considera o bem e o mal valores metafísicos transcendentes, isto é, independentes da situação concreta vivida pelo homem. O que é proveitoso constitui o valor. O homem é o criador de valores, mas se esquece de sua criação. A moralidade é o instinto gregário do indivíduo, pois quem é punido é quem pratica os atos. Para Nietzsche, na sociedade, existem os “instintos de rebanho”. Atribui-se às palavras um sentido fixo e acha que ela espelha a realidade, que tem caráter transitório. O homem chega, pelos costumes, à convicção de que é preciso obedecer. No inverso disso, existe o prazer, a autodeterminação e a liberdade de vontade. De acordo com Nietzsche (1987, p. 45): Qual a genealogia da moral, isto é, a origem do conceito “bom”?] (...) O juizo “bom” nao provém daqueles aos quais se fez o “bem”! Foram os “bons” mesmos, isto é, os nobres, poderosos, superiores em posição e em pensamento, que sentiram e estabeleceram a si e a seus atos como bons, ou seja, de primeira ordem, em oposição a tudo o que era baixo, de pensamento baixo, vulgar e plebeu (...). De uma forma geral, o que Nietzsche denomina de valor e, ao contrário do que poderíamos pensar, não é uma entidade utilizada para ajuizamento moral, mas o nome com que se designa todo tipo de manifestação engendrada por esse conflito. Quanto a sua apreensão, os valores podem apresentar-se sob duas disposições fundamentais para o filósofo em questão: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade36 1. “disposição afirmativa”, como aquela que se faz em sintonia com o lance e cadência do citado binômio, afirmando-o como modo estrutural da realidade em sua gênese; 2. “disposição reativa”, que não se conforma com este modo constitutivo, fazendo que irrompa uma perspectiva derivada, que se arroga no direito de requerer um modo de realização da existência diverso do que se dá nessa instauração. Estes modos dos valores são possibilidades de realização dessa vida para Nietzsche. Estes, por estarem articulados com o próprio modo de dar-se da vida, isto é, com o movimento da vontade, são sempre passíveis de apreensão através de duas disposições fundamentais: as disposições afirmativas e reativas. Respectivamente, aquelas que indicam sintonia e dissintonia com a compreensão de vida como valor. No primeiro caso, a disposição afirmativa surge na sintonia com uma perspectiva que se constrói a partir do “aquecimento” do modo de ser sempre eterno da gênese de realidade, celebrando a vida enquanto experiência de criação (Cf. MACHADO, 1999, p. 78). De acordo com Machado (1999), a esse processo Nietzsche chama “vontade criadora”. No segundo caso, a disposição negativa irrompe em uma perspectiva que, ao se instaurar, nega a si mesma enquanto perspectiva e se arroga o direito de determinar — para além de toda e qualquer instância de realização — o modo de ser da totalidade dos entes. Esta é a compreensão da verdade, como uma instância que surge em função da separação radical frente ao mundo fenomênico, e recebe o nome de “vontade de verdade”. O que Nietzsche revela com isso é que os escravos negam os valores vitais e resulta na passividade, na procura da paz e do repouso. Nesta perspectiva, o homem se torna enfraquecido e diminuído em sua potência. A alegria é transformada em ódio à vida, isto é, o “ódio dos impotentes”. A conduta humana, orientada pelo ideal ascético, torna-se marcada pelo ressentimento e pela “má consciência”. O ressentimento nasce da fraqueza e é nocivo ao fraco. Por sua vez, para Nietzsche, o “homem ressentido”, incapaz de Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 37 esquecer, é como o dispéptico: fica "envenenado" pela sua inveja e impotência de vingança. Ao contrário, o homem nobre sabe "digerir" suas experiências e esquecer é uma das condições de manter-se saudável. A má consciência ou sentimento de culpa é o ressentimento voltado contra si mesmo, daí fazendo nascer a noção de pecado, que inibe qualquer ação. Neste sentido, o ideal ascético nega a alegria da vida e coloca a mortificação como meio para alcançar a outra vida num mundo superior, do além. Assim, as práticas de altruísmo destroem o amor de si, domesticando os instintos e produzindo gerações de fracos. É por isso que, contra o enfraquecimento do homem, contra a transformação de fortes em fracos (tema constante da reflexão nietzschiana), é necessário assumir uma perspectiva além de bem e mal, isto é, "além da moral". Mas, por outro lado, para além de bem e mal não significa para além de bom e mau. A “dimensão das forças”, dos instintos, da vontade de potência, permanece fundamental. "O que é bom? Tudo que intensifica no homem o sentimento de potência, a vontade de potência, a própria potência. O que é mau? Tudo que provém da fraqueza” (MACHADO, 1999, p. 77). IMPORTANTE: Os pontos de vistas éticos apresentados não são os únicos existentes e nem representam a totalidade dos problemas relativos a ética. Existem várias doutrinas que se debruçaram sobre o tema da ética apresentado e refletindo sobre seus fundamentos e aplicacações. Cabe neste momento, apresentar as principais teorias ou doutrinas de ética e suas respectivas especifidades teóricas: ● egoísmo ético: pressupõe que devemos agir apenas em função do nosso interesse pessoal. A única obrigação moral é promovermos o nosso próprio bem- estar. Critério moral: são as consequências que as ações têm para nós próprios que as tornam certas ou erradas. O egoísmo ético é, portanto, uma teoria consequencialista: o que conta são as consequências que as ações têm para nós próprios. Regra moral básica: “age sempre e apenas em função do teu próprio bem-estar”; Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 38 ● utilitarismo ético: pressupõe que devemos agir com a finalidade de promover o máximo de bem-estar a um maior número possível de pessoas, numa perspectiva imparcial. O utilitarismo é também uma teoria consequencialista: o que conta são as consequências que as ações têm para a generalidade das pessoas (e não já apenas para nós próprios). Critério moral: são as consequências que as ações têm para o maior número de pessoas que as tornam certas ou erradas. Sendo assim, uma ação está moralmente certa apenas quando maximiza o bem-estar, ou seja, quando promove tanto quanto possível o bem- estar e está errada quando não o promove. Regra moral básica: “age de tal modo que as tuas ações possam proporcionar o maior bem possível ao maior número de pessoas, imparcialmente consideradas”; ● ética deontológica: pressupõe que devemos agir de acordo com o Dever e não pensar nas consequências das nossas ações. A pergunta a fazer é: toda as pessoas deveriam fazer o mesmo em idênticas circunstâncias? A ética deontológica é, portanto, uma teoria anticonsequencialista. O critério moral desta é a relação das ações com os deveres universais (são os esmos para todos os seres humanos) que as tornam certas ou erradas. Há, portanto, ações intrinsecamente más (ou seja, são más em si mesmas), ainda que tenham consequências boas. Desse modo, uma ação está moralmente certa quando não infringe os nossos deveres e está errada quando infringe intencionalmente algum desses deveres. Regra moral básica: “age de tal modo que as tuas ações possam valer para todo o ser racional, sem nunca infringir os deveres universais”. SUGESTÃO DE FILME Pegue seu caderno de anotações, sente-se e assista ao filme A Letra Escarlate de Douglas Day Stewart, baseado em livro de Nathaniel Hawthorne. Ele contextualizará melhor ainda o conteúdo que você acabou de estudar. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 39 LEITURA COMPLEMENTAR Visando enriquecer seu processo de aprendizagem, procure efetuar a leitura complementar dos seguintes textos: ARANHA, M. L. de A.; MARTINS, M. H. P. FILOSOFANDO - Introdução à Filosofia. 3ª edição. São Paulo: Editora Moderna, 2001. 439p. MACHADO, R. Nietzsche e a verdade. São Paulo: Brochura, 1999. 116p. HAMLYN, D. W. Uma história da filosofia ocidental. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1990. 416p. GRENZ, S. J. & SMITH, J. T. Dicionário de Ética. 1ª Edição. São Paulo: Brochura, 2005. 184p. VALLS, Á. L.M. O que é ética. 9a edição. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1996. 84p. PARSONS, H. As raízes humanas da moral: Moral e sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. 300p. VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. 304p. PEREIRA, O. O que é moral? São Paulo: Brasiliense, 1996. 90p. É HORA DE SE AVALIAR! Lembre-se de realizar as atividades propostas no caderno de exercícios! Elas são fundamentais para ajudá-lo a fixar o conteúdo teórico trabalhado, a sistematizar as ideias e os conceitos apresentados, além de proporcionar a sua autonomia no processo ensino-aprendizagem. Caso prefira, redija suas respostas no caderno de exercícios e depois as envie através do nosso ambiente virtual de aprendizagem (AVA). Procure interagir permanentemente conosco e utilize todos os recursos didáticos e pedagógicos disponibilizados com o objetivo de aprimorar a sua formação acadêmica. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 40 Nesta unidade, você estudou o contexto histórico do surgimento da ética e da moral, assim como os principais conceitos e definições que as envolvem. Apresentamos a problemática da distinção entre éticae moral, assim como as suas respectivas definições e objetos de estudo. Além disso, esboçamos, de forma esquemática, os aspectos históricos e sociais da ética e da moral, objetivando situar você nos elementos do contexto do desenvolvimento da humanidade. Na próxima unidade, discutiremos alguns dos problemas fundamentais no qual a ética se ocupa. Trata-se, portanto, de apresentar a você os temas recorrentes da ética, tais como, a consciência moral e os valores éticos e a dicotomia liberdade versus determinismo, a felicidade, a virtude e a amizade. Bons estudos e até a próxima unidade! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 41 Exercícios - unidade 1 1ª QUESTÃO: Assinale a letra correspondente à alternativa que preenche CORRETAMENTE as lacunas do texto a seguir: “Vázquez (2001, p. 12) afirma que a “ética é a ________ do comportamento moral dos homens em sociedade. Ou seja, é a ciência de uma forma específica do ___________.” a) Senso comum ou ciência - comportamento antissocial b) Hermenêutica ou ciência - comportamento surreal c) Teoria ou ciência - comportamento humano d) Psicologia jurídica - comportamento social e) Teoria ou anticiência - comportamento antirreal 2ª QUESTÃO: Qual das alternativas abaixo NÃO se relaciona aos pressupostos da ética? a) A ética relaciona-se com a ciência. b) A ética relaciona-se com avaliação da conduta humana. c) A ética é uma ciência normativa. d) Os problemas éticos caracterizam-se pela sua particularidade e a ausência de critérios normativos e científicos. e) A função fundamental da ética é a mesma de toda teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando os conceitos correspondentes. 3ª QUESTÃO: Segundo Robert Srour: “Enquanto a moral tem uma base histórica, o estatuto da ética é teórico, corresponde a uma generalidade abstrata e formal” (SROUR, 2000, p. 270). Seguindo a afirmativa de Srour, indique qual das alternativas abaixo corresponde ao correto sentido da ‘moral’. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 42 a) A moral implica uma relação livre e consciente entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade. b) A moral não se relaciona em nada com a ética. c) A moral não cumpre uma função social bem definida. d) A moral não possui um caráter social, porque os indivíduos se sujeitam a princípios, normas ou valores socialmente estabelecidos. e) A moral possui um caráter social, porque os indivíduos se sujeitam a princípios, normas ou valores socialmente construídos com base em normas artificiais. 4ª QUESTÃO: Mesmo considerando a origem divina das ideias morais, por intermédio das quais os indivíduos adquirem consciência dos meios adequados à sua elevação ao plano espiritual dos valores perenes, a investigação do problema da moral não pode desprezar os processos históricos responsáveis de fato pelos mecanismos de criação, funcionamento e aplicação dos padrões e das regras morais. Como base nesta explicação, podemos afirmar que: a) o âmbito da moral passa a existir como um traço de desinformação que se recebe no processo de interação e de identificação a priori. b) as regras morais em nada correspondem aos pressupostos morais. c) os costumes nunca dizem como cada homem deve agir em situações concretas em função daquilo que a comunidade considera como sendo o bem e o mal. d) o termo imoral significa algo que é o mesmo que o de moral. e) todas as sociedades humanas possuem valores padrões, normas de conduta e sistemas que garantem a aplicação e o funcionamento das mesmas. 5ª QUESTÃO: Não é somente o critério científico que a moral justifica-se. Ela pode ainda ser justicada por alguns critérios. Entre estes critérios podemos apontar: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 43 a) o critério de justificação social e o critério de justificação prática. b) o critério de justificação metafísica e o critério de justificação anárquica. c) o critério de justificação eloquente e o critério de justificação factual. d) o critério de justificação ilusório e o critério de justificação fatídico. e) o critério de justificação anormal e o critério de justificação multissocial. 6ª QUESTÃO: As doutrinas éticas nascem e se desenvolvem em diferentes épocas e sociedades como respostas aos problemas básicos apresentados pelas relações entre os homens e, em particular, pelo seu comportamento moral efetivo. Uma dessas doutrinas é o egoísmo ético. Sobre esta doutrina afirma-se: a) que devemos agir com a finalidade de promover o mínimo de bem-estar a um menor número possível de pessoas, numa perspectiva imparcial. b) que devemos agir de acordo com o coração e a mente e não pensar nas consequências das nossas ações. c) que devemos agir de acordo com o Dever e não pensar nas consequências das nossas ações. d) que devemos agir com a finalidade de promover o máximo de bem-estar a um maior número possível de pessoas, numa perspectiva imparcial. e) que devemos agir apenas em função do nosso interesse pessoal. Para esta a única obrigação moral é promovermos o nosso próprio bem-estar. 7ª QUESTÃO: No sentido geral, a palavra ética origina-se do grego antigo ήθική [ήθική φιλοσοφία] "filosofia moral" e do adjetivo ήθος (ēthos) que quer dizer "costume, hábito". Diferentemente dos gregos, os romanos utilizavam a palavra latina mos (mores) para designar o costume ou costumes. Foi a partir deste termo romano que surge o modo como entendemos o significado de moral na língua portuguesa. Diante do exposto, podemos afirmar que: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 44 a) na nossa Língua, os dois termos, ética e moral, implicam, simultaneamente, de alguma forma, nos dois diferentes significados antigos e, de fato, tanto a ética quanto a moral, incidem sobre estas duas dimensões, ou seja, uma valoração do homem como tal e do seu agir de conformidade ou não aos costumes e à tradição. b) na nossa Língua, os dois termos, ética e moral, implicam, simultaneamente, de alguma forma, os dois diferentes significados antigos e, de fato, tanto a ética quanto a moral, não incidem sobre estas duas dimensões, ou seja, uma valoração do homem como tal e do seu agir de conformidade ou não aos costumes e à tradição. c) na nossa Língua, os dois termos, ética e moral, não implicam, simultaneamente, de alguma forma, nos dois diferentes significados antigos e, de fato, tanto a ética quanto a moral, incidem sobre estas duas dimensões, ou seja, uma valoração do homem como tal e do seu agir de conformidade ou não aos costumes e à tradição. d) na nossa Língua, os dois termos, ética e moral, implicam, simultaneamente, de alguma forma, nos dois diferentes significados antigos e, de fato, tanto a ética quanto a moral não relaciona-se as duas dimensões, ou seja, uma valoração do homem como tal e do seu agir de conformidade ou não aos costumes e à tradição. e) na nossa Língua, os dois termos, ética e moral, diferem, simultaneamente, de alguma forma, dos dois diferentes significados antigos e, de fato, tanto a ética quanto a moral, afasta-se das dimensões contemporânea e medieval, ou seja, uma valoração do homem como tal e do seu agir de conformidade ou não aos costumes e à tradição. 8ª QUESTÃO: Apesar de serem conceitos aparentemente idênticos, ética e moral possuem diferenças fundamentais. O ato de perceber os valores, de avaliar as nossas ações de acordo com o que é bom e o que é mau, ou quais são justas e injustas, corretas ou não é o que, de certa forma, diferencia o comportamento humano do comportamento animal. Neste contexto, podemos dizer que: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 45 a) para o animal, o campo da moralidade é inacessível, pois seu comportamento jamais pode ser guiado pelos seus instintos imediatos. Os seres humanos,por sua vez, possuem a consciência moral, ou seja, a “faculdade de observar a própria conduta e formular juízos sobre os atos passados, presentes e as intenções futuras”. b) para o animal, o campo da moralidade é completamente acessível, pois seu comportamento é guiado pelos seus instintos imediatos. Os seres humanos, por sua vez, possuem a consciência moral, ou seja, a “faculdade de observar a própria conduta e formular juízos sobre os atos passados, presentes e as intenções futuras”. c) para o animal, o campo da moralidade é inacessível, pois seu comportamento é guiado pelos seus instintos imediatos. Os seres humanos, por sua vez, possuem a consciência moral, ou seja, a “faculdade de observar a própria conduta e formular juízos sobre os atos passados, presentes e as intenções futuras”. d) para o animal, o campo da moralidade é inacessível, pois seu comportamento é guiado pelos seus instintos imediatos. Os seres humanos, por sua vez, possuem a consciência amoral, ou seja, a “faculdade de observar a própria conduta e formular juízos sobre os atos passados, presentes e as intenções futuras”. e) para o animal, o campo da moralidade é inacessível, pois seu comportamento é guiado pelos seus razões imateriais. Os seres humanos, por sua vez, possuem a consciência moral, ou seja, a “faculdade de observar a própria conduta e formular juízos sobre os atos passados, presentes e as intenções futuras”. 9ª QUESTÃO: A experiência moral é comum a todos os homens, em todas as sociedades. Entretanto, nem todos são capazes de desenvolver uma crítica do conteúdo da moral. Essa é, portanto, tarefa da ética. Como você sabe há uma tendência de empregar indiscriminadamente os termos moral e ética. Em que consiste a moral? Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 46 __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 10ª QUESTÃO: De acordo com Vázquez (2001, p. 10): “A função fundamental da ética é a mesma de toda teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando os conceitos correspondentes. Por outro lado, a realidade moral varia historicamente e, com ela, variam os seus princípios e as suas normas”. Comente esta consideração de Vázquez. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 47 Problemas éticos e problemas morais: consciência moral, virtude, amizade, liberdade e felicidade. A consciência moral e os valores éticos. A busca da felicidade: virtude e o bem viver em Aristóteles. Aristóteles e a amizade como um problema ético-moral. Pensando a liberdade: La Boétie e Sartre. 2 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 48 Na unidade anterior, você teve a oportunidade de estudar o processo histórico da moral e da ética, assim como seus conceitos e definições mais relevantes. Nesta unidade, discutiremos alguns dos problemas fundamentais no qual a ética se ocupa. Trata-se, portanto, de apresentar a você os temas recorrentes da ética, tais como, a consciência moral e os valores éticos e a dicotomia liberdade versus determinismo e a liberdade versus responsabilidade. Para tanto, apresentaremos o ponto de vista filosófico sobre esta problemática em La Boétie e Sartre. Além disso, buscaremos debater o que é ser virtuoso e o que é necessário para ser feliz, segundo a perspectiva de Aristóteles. Esperamos que você desfrute dessa discussão e compreenda estes conceitos tão fundamentais na nossa prática cotidiana. Vamos lá! Objetivos da unidade Fornecer alguns dos problemas norteadores da ética. Discutir sobre a problemática da liberdade, da responsabilidade e do determinismo nos filósofos La Boétie e Sartre. Compreender as noções de felicidade, amizade e virtude na reflexão filosófica de Aristóteles. Avaliar a direção para a qual nossos valores éticos dirigem-se no mundo em que vivemos hoje. Plano da unidade A consciência moral e os valores éticos. A busca da felicidade: virtude e o bem viver em Aristóteles. Aristóteles e a amizade como um problema ético-moral. Pensando a liberdade: La Boétie e Sartre. Bons estudos! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 49 A consciência moral e os valores éticos A ideia de valor tem sido objeto de muitas reflexões ao longo da história da filosofia. Não cabe expor os pormenores deste debate nem o seu desdobramento na contemporaneidade. No entanto, propomos a você as seguintes noções gerais sobre os conceitos de “valor” e “valorar”: os valores não são coisas. Não podem ser percebidos como se percebe as coisas, pois os valores são qualidades que as coisas têm, mas que não estão nas coisas de modo real e sensível, como estão a figura, o peso, a cor, etc; o valor não se caracteriza pelo prazer que produz, se o produz. É errôneo dizer que as coisas são valiosas porque nos produzem prazer. Na realidade, os valores valem independentemente do prazer que produzem. os valores podem se classificados também em “valores-meio” e “valores- fim”. Os “valores-meio” são aqueles cuja valia consiste em servir para a obtenção de outros valores. Por sua vez, os “valores-fim” são os que valem por si e sem necessidade de servirem à obtenção de outros valores. Diante desses apontamentos gerais, podemos adiantá-lo que valorar implica uma avaliação e uma apreciação pelo qual emitimos juízos. Diante disso, toda moral e toda ética se relacionam diretamente aos juízos, que são avaliações e apreciações seja da melhor forma de vida, seja da boa ou má ação. Sendo assim, os valores são nada mais do que regras que orientam a conduta humana, servindo de padrão às deliberações dos indivíduos e dando coerência à sua vida social. Neste momento, você deve estar indagando sobre o que é um juízo. Pois bem, juízos são avaliações e apreciações da melhor ou pior forma de vida e da boa ou má ação. No entanto, podemos identificar dois tipos principais de juízos. Por exemplo: se dissermos “está amanhecendo”, estaremos enunciando um acontecimento constatado por nós e o juízo proferido é um juízo de fato. Se, porém, falarmos “o amanhecer é bom para os animais” ou “o amanhecer é esplêndido”, estaremos interpretando e avaliando um acontecimento. Nesse caso, proferimos um juízo de valor. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 50 Os juízos de fato são aqueles que dizem o que as coisas são, como são e por que são. Em nossa vida cotidiana, mas também na metafísica e nas ciências, os juízos de fato estão presentes. Diferentemente deles, os juízos de valor — avaliações sobre coisas, pessoas e situações — são proferidos na moral, nas artes, na política e na religião. Estes juízos avaliam coisas, pessoas, ações, experiências, acontecimentos, sentimentos, estados de espírito, intenções e decisões como bons ou maus, desejáveis ou indesejáveis. Todos os juízos éticos de valor são normativos, isto é, enunciam normas que determinam o dever ser de nossos sentimentos, nossos atos e nossos comportamentos. Estes juízos determinam obrigações e avaliam intenções e ações segundo o critério do correto e do incorreto. Por outro lado, osjuízos éticos normativos nos dizem quais sentimentos, intenções, atos e comportamentos devemos ter ou fazer para alcançarmos o bem e a felicidade. Além disso, enunciam que atos, sentimentos, intenções e comportamentos são condenáveis ou incorretos do ponto de vista moral vigente. IMPORTANTE: Cabe indagar: qual é a origem da diferença entre os dois tipos de juízos, isto é, os de fato e os de valor? A diferença está na distinção entre a natureza e a cultura. A primeira é constituída por estruturas e processos necessários, que existem em si e por si mesmos, independentemente de nós: o amanhecer é um fenômeno cujas causas e cujos efeitos necessários podemos constatar e explicar. Por sua vez, a cultura nasce da maneira como os seres humanos interpretam a si mesmos e suas relações com a natureza, acrescentando- lhe sentidos novos, intervindo nela, alterando-a através do trabalho e da técnica, dando-lhe valores. Dizer que o “amanhecer é bom para as plantas” pressupõe a relação cultural dos humanos com a natureza, através da agricultura. Considerar o amanhecer belo pressupõe uma relação valorativa dos humanos com a natureza, percebida como objeto de contemplação. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 51 Com efeito, para que haja conduta ética, é preciso que exista o agente consciente (a consciência moral), isto é, aquele que conhece a diferença entre bem e mal, certo e errado, permitido e proibido, virtude e vício. A consciência moral não só conhece tais diferenças, mas também se reconhece como capaz de julgar o valor dos atos e das condutas e de agir em conformidade com os valores morais, sendo por isso responsável por suas ações e seus sentimentos e pelas consequências do que faz e sente. Consciência e responsabilidade são condições indispensáveis da vida ética (Cf. VÁZQUEZ, 2001). A consciência moral manifesta-se, antes de tudo, na capacidade para deliberar diante de alternativas possíveis, decidindo e escolhendo uma delas antes de lançar-se na ação. Esta possui a capacidade para avaliar e refletir as motivações pessoais, as exigências feitas pela situação, as consequências para si e para os outros, a conformidade entre meios e fins — empregar meios imorais para alcançar fins morais é impossível —, a obrigação de respeitar o estabelecido ou de transgredi-lo se o estabelecido for imoral ou injusto. Em outras palavras, a consciência moral diz respeito a uma escuta individual que todos temos como seres racionais e que às vezes faz com que sintamos remorso por ter agido de uma forma em vez de outra. Ou seja, pela consciência moral, operam-se julgamentos de adequação entre comportamentos escolhidos voluntariamente e ideais de conduta adotados pela máxima a que se deve obedecer. Por essa razão, o conceito de consciência moral está estritamente vinculado com o conceito de obrigatoriedade. Cabe observar que as normas obrigatórias mantêm-se sempre em um plano geral e, por conseguinte, não fazem referência ao modo de agir em cada situação concreta ou especifica. É a consciência moral que, neste caso, atua informando-se da situação concreta e com a ajuda das normas estabelecidas interioriza-as, tomando as decisões que consideramos adequadas e internamente julga os seus próprios atos como morais ou não (Cf. VÁZQUEZ, 2001). O ato amoralmente válido subdivide-se em duas formas fundamentais: o normativo e o fatual. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 52 Normativo: constituído pelas normas ou regras de ação e pelos imperativos que enunciam algo que deve ser; Fatual: constituído por certos atos humanos que se realizam efetivamente, ou seja, que são independentemente de como pensamos que deveriam ser. No âmbito normativo, estas regras postulam determinados comportamentos, tais como: “cumpra o seu dever como cidadão”; “ama a teu próximo como a ti mesmo”, etc. É importante frisar que o normativo e o fatual não coincidem, mas encontram-se em mútua relação. O normativo exige ser realizado e, dessa forma, orienta-se no sentido do fatual. Assim, o realizado ou o fatual somente possui algum significado moral na medida em que pode ser referido a uma norma. Não existem normas que sejam indiferentes à sua realização, nem existem fatos que na esfera moral não sejam vinculados com as normas vigentes. Desse modo, o normativo e o factual — no âmbito da moral — são dois planos que podem ser distinguidos, mas não podem ser completamente apartados. A seguir, vamos discutir a problemática da virtude e da felicidade em Aristóteles. Note ao longo da discussão como o filósofo apresenta de forma clara e distinta a relação da felicidade e a virtude em relação ao “bem viver”. A busca da felicidade: virtude e o bem viver em Aristóteles Segundo Savater (2002), se considerarmos que o preceito fundamental da ética é aquele que diz respeito ao “saber-viver” ou a “arte de viver”, então podemos afirmar que os homens agem em direção ao viver e, acima de tudo, ao viver bem. Ora, para viver bem, é preciso alguns requisitos fundamentais que satisfaçam as exigências mínimas para alcançar este fim ou objetivo proposto. Entre estes requisitos está a felicidade. Para Aristóteles, a felicidade é o resultado do saber viver. Entendendo a ética como a “arte de viver”; o resultado desse viver seria, portanto, a felicidade. O que é necessário fazer para atingir a virtude e, portanto, ser feliz? A virtude, que segundo Aristóteles, é o que vai garantir ao homem a felicidade, é “o hábito que torna o homem bom e lhe permite cumprir bem a sua tarefa”, a virtude é “racional, conforme e constante”. (Cf. ARISTÓTELES, 2001). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 53 Na obra Ética a Nicômacos, Aristóteles discute a finalidade de toda arte, indagação, ação e propósito da vida humana e conclui que é sempre o bem a que todas visam. Ao debater qual seria este bem que é a finalidade da vida humana, o filósofo nos apresenta a felicidade. Só que, simultaneamente, afirma que a felicidade é o “bem supremo” e indaga pela função própria do homem. De acordo com este: (...) o bem para o homem vem a ser o exercício ativo das faculdades da alma de conformidade com a excelência, e se há mais de uma excelência, de conformidade com a melhor e mais completa entre elas. Mas devemos acrescentar que tal exercício ativo deve estender-se por toda a vida, pois uma andorinha não faz verão (...); da mesma forma um dia só, ou um certo lapso de tempo, não faz um homem bem- aventurado e feliz (ARISTÓTELES, 2001, p. 24-25). Pressupondo que a felicidade é a finalidade de nossa vida, Aristóte- les preocupa-se em demonstrar que a vida humana possui em si uma finalidade, ou seja, uma função para a qual está dada. E, portanto, tal finalidade se objetiva dentro da função a que a vida acontece. Sendo assim, a felicidade resultará do atendimento a esta função. O que está pressuposto não é a felicidade em si mesma, mas a relação da mesma com a arte de viver, com o saber viver que estamos discutindo desde o início. Neste momento, cabe atentarmos para o modo como Aristóteles caracteriza a felicidade: (...) Parece que a felicidade, mais que qualquer outro bem, é tida como este bem supremo, pois a escolhemos sempre por si mesma, e nunca por causa de algo mais; mas as honrarias, o prazer, a inteligência e todas as outras formas de excelência, embora as escolhamos por si mesmas (...), escolhemo-las por causa da felicidade, pensando que através delas seremos felizes. Ao contrário, ninguém escolhe a felicidade por causa das várias formas de excelência, nem, de um modo geral, por qualquer outra coisa além dela mesma. (ARISTÓTELES, 2001. p. 23). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 54 Aristóteles fundamenta a ética — a arte de bem viver — tendo como refe- rência primordial o papel do homem, ou seja, da vida humana,pois não se trata da vida de um homem e sim do ser humano em geral. Com base nisso, o filósofo aponta para a felicidade como sendo a busca, em si mesma, da vida humana, ou seja, o bem supremo a que toda arte, indagação, ação e propósito o qual devam ter em vista. Devemos atentar para a Ética a Nicômacos, lugar onde Aristóteles discute as condições necessárias para ser feliz. (...) Devemos observar que cada uma das formas de excelência moral, além de proporcionar boas condições à coisa a que ela dá excelência, faz com que esta mesma coisa atue bem; por exemplo, a excelência dos olhos faz com que tanto os olhos quanto a sua atividade sejam bons, pois é graças à excelência dos olhos que vemos bem. De forma idêntica a excelência de um cavalo faz com que ele seja ao mesmo tempo bom em si e bom para correr e levar seu dono e para sustentar o ataque do inimigo. Logo, se isto é verdade em todos os casos, a excelência moral do homem também será a disposição que faz um homem bom e o leva a desempenhar bem a sua função. (ARISTÓTELES, 2001, p. 41). O termo excelência utilizado por Aristóteles é corriqueiramente entendido também por virtude. Há duas espécies de excelência: a intelectual e a moral. A intelectual nasce e se desenvolve com a instrução, ou seja, com o processo educativo e formativo. Por isso, desenvolve-se com o tempo e a experiência. É o que de certa forma estamos fazendo desde que iniciamos nossa vida escolar e que vai se aprimorando à medida que nos dedicamos mais aos estudos. Cada um de nós pode perceber o quanto se aprimorou desde o dia em que esteve pela primeira vez em uma sala de aula. Já a excelência moral é produto do hábito, é tudo aquilo que podemos alterar pelo hábito. Virtude: etimologicamente, a palavra virtude deriva do latim virtus, que significa a qualidade própria da natureza humana. De modo geral, a expressão virtude designa, atualmente, a prática constante do bem, correspondendo ao uso da liberdade com responsabilidade. O oposto da virtude é o vício, que consiste no hábito de praticar o mal, correspondendo ao uso da liberdade sem responsabilidade. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 55 IMPORTANTE: Então a excelência moral é adquirida através da prática, assim como as artes. Por exemplo: você toca violão na medida em que passa a praticar e quanto mais tempo praticar, maior será sua habilidade e chances de se tornar um exímio tocador. Por que o desenvolvimento da excelência moral é tão importante para nós? Porque está relacionada com as ações e emoções, que por sua vez estão relacionadas com o prazer ou sofrimento e, por isso, a excelência moral se relaciona com os prazeres e sofrimentos. Pode-se dizer que a excelência moral é a capacidade que vamos desenvolver para lidar com nossas emoções e ações na relação direta com o prazer e o sofrimento. E disso resultará o bom uso que faremos ou não do prazer e do sofrimento. Para Aristóteles (2001, p. 38), “toda a preocupação, tanto da excelência moral quanto da ciência política, é com o prazer e com o sofrimento, porquanto o homem que os usa bem é bom e o que os usa mal é mau”. Mas o fato de a excelência estar relacionada ao domínio que fará do prazer e sofrimento implica em que a excelência é o que garantirá atingir o alvo do meio-termo. Isto porque em relação as nossas ações e emoções há excesso, falta e meio-termo. Portanto, “a excelência moral é o que fará com que se busque sempre atingir o meio termo” (Cf. TUNGENDHAT, 1997). Vamos retomar o que o filósofo entende por disposição de caráter para que possamos entender o que seja a excelência moral ou virtude do homem. Ora, disposições de caráter são “os estados de alma em virtude dos quais estamos bem ou mal em relação às emoções” (ARISTÓTELES, 2001, p. 40). Isto nada mais seria que a nossa disposição em relação às coisas, ou melhor, como sentimos, encaramos a realidade que nos cerca, com certo grau de intensidade e ou indiferença. Por exemplo, pode-se sentir medo, confiança, desejos, cólera, piedade, e de um modo geral prazer e sofrimento, demais ou muito pouco e, em ambos os casos, isto não é bom; mas experimentar estes sentimentos no momento certo, em relação aos objetos certos e às pessoas certas, e de maneira certa, é o meio-termo e o melhor, isto é, característico da excelência. (ARISTÓTELES, 2001, p. 41-42). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 56 Fala-se que a excelência moral é o desenvolvimento de hábitos que nos farão escolher nossas ações e emoções, que são marcadas pelo excesso, falta e meio- termo. Mas o que é o “meio-termo” para Aristóteles? De tudo que é contínuo e divisível é possível tirar uma parte maior, menor ou igual, e isto tanto em termos da coisa em si quanto em relação a nós; e o igual é um meio termo entre o excesso e a falta. Por “meio termo” quero significar aquilo que é equidistante em relação a cada um dos extremos, e que é único e o mesmo em relação a todos os homens; por “meio termo em relação a nós” quero significar aquilo que não é nem demais nem muito pouco, e isto não é único nem o mesmo para todos” (ARISTÓTELES, 2001. p. 41). Portanto, a busca é pelo “meio-termo”, ou seja, o equilíbrio entre o excesso e a falta. Encarar este equilíbrio é o desafio e enfrentamento diante de cada ação e emoção. É por isso que a formação da excelência moral é uma busca constante e depende da capacidade racional, pois exige a todo o momento reflexão e escolha. A mediania não é algo pronto e dado, mas escolhido e que precisa ser entendido para que se chegue a atingi-la. Ao estudar o pensamento de Aristóteles, percebermos facilmente que a virtude do homem está relacionada às escolhas que cada um faz. Essas escolhas não no sentido de querer ou não um ou outro objeto, mas escolhas no sentido de nossa racionalidade (da nossa razão), ou seja, de agirmos de uma ou outra forma. São esco- lhas que orientam o nosso agir e que estão ligadas ao que dissemos já no início, a arte de bem viver. Para Aristóteles, o homem só pode viver na pólis, cidade grega, e isto por ser, por natureza, um animal político, ou seja, que vive na pólis, portanto, em sociedade, pois seu agir não é isolado ou solitário, mas é sempre um agir em relação ao outro (Cf. ROOS, 1987). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 57 Ora, se nossa vida ocorre em sociedade e nossas ações se dão em relação ao outro com quem convivemos, como ser virtuoso? O que Aristóteles nos aponta como meio de atingirmos a virtude, haja vista que somos marcados por escolhas e desde que nos levantamos pela manhã até nos deitarmos à noite? Ora, a excelência moral se relaciona com as emoções e as ações, nas quais o excesso é uma forma de erro, tanto quanto a falta, enquanto o meio-termo é louvado como um acerto; ser louvado e estar certo são características da excelência moral. A excelência moral, portanto, é algo como a equidistância, pois (...) seu alvo é o meio-termo. (ARISTÓTELES, 2001). É adequado destacar que a ética aristotélica não se apresenta de forma alguma como algo imperativo, ou seja, “faça isto”, não “faça aquilo”. O que está em questão é a opção a cada um de nós para que façamos as escolhas e sejamos assim sujeitos de nossos próprios atos e escolhas. Sendo assim, não há uma verdade preestabelecida e que nos cabe apenas segui-la, sem reflexão ou questionamento. Assim nos deparamos com a necessidade de, a cada ação, fazer a escolha e o desafio é o de fazer a escolha certa. É, portanto, mais difícil, pois exige de nós uma atitude ativa e não simplesmente passiva diante da vida e das coisas e escolhas que nos cercam. Veja como poder escolher e, portanto, poder errar é sempre o que acaba por inibir as pessoas. Precisamos refletir e desenvolver nossa capacidade de análise da realidade, pois isso depende exclusivamente de nós. E comoo mundo que nos cerca é também o mundo das relações humanas, saber escolher é um desafio constante e que diante das escolhas que fizermos não há retrocesso. Para o pensamento aristotélico, tudo isso diretamente relacionado com o fato de eu viver na pólis, ou seja, “viver em sociedade”. IMPORTANTE: Para o mundo grego, a ética e a política estão juntas, pois entendem que a comunidade social é o lugar necessário para a vivência ética. O homem só pode viver e buscar sua finalidade, que para Aristóteles é a felicidade, na comunidade social, pois é um animal político, ou seja, social. Portanto, não pode o homem levar uma vida moral como indivíduo isolado, pois vive e é membro de uma comunidade. E como a vida moral não é um fim em si mesmo, mas um meio para se alcançar a felicidade, não se pensa a ética fora dos limites das relações sociais, ou seja, não se pressupõe a ética sem a política. É por isso que, segundo Savater (2002, p. 16), “(...) os antigos gregos chamavam quem não se metia em política de idiotés, palavra que significava pessoa isolada, sem nada a oferecer às demais, obcecada pelas mesquinharias de sua casa e, afinal de contas, manipulada por todos”. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 58 Você compreendeu como a questão da felicidade em Aristóteles é um tema relevante na sua reflexão sobre a ética? Vejamos, a seguir, como a amizade é também um problema ético e moral na reflexão aristotélica. A amizade como um problema ético-moral A amizade foi também motivo de investigação em Aristóteles em Ética a Nicômacos. Este, nos livros IX e X, discorre de forma minuciosa e exaustiva sobre o tema. Para Aristóteles, a amizade parece também manter as cidades unidas, e parece que os legisladores se preocupam mais com ela do que com a justiça; efetivamente a concórdia parece assemelhar-se à amizade, e eles procuram assegurá-la mais do que tudo, ao mesmo tempo em que repelem tanto quanto possível o facciosismo, que é a inimizade nas cidades. Quando as pessoas não têm necessidade de justiça, mesmo quando são justas, elas necessitam da amizade; considera-se que a mais autêntica forma de justiça é uma disposição amistosa. A amizade não é somente necessária diz o filósofo; “ela também é nobilitante, pois louvamos as pessoas amigas de seus amigos, e pensamos que uma das coisas mais nobilitantes é ter muitos amigos; além disto, há quem diga que a bondade e a amizade se encontram nas mesmas pessoas” (Aristóteles, 2001, p. 153-154). Aristóteles apresenta a amizade como fundamental para a união das cidades e dos povos. A inimizade entre as cidades e países gera conflitos e guerras, por isso a preocupação dos legisladores em evitar que haja divisões. Para entender melhor a questão da amizade como uma questão ética é preciso ter claro o que Aristóteles pressupõe, ou seja, os valores que fundamentam e dão sustentação à amizade. A “amizade perfeita”, que poderíamos aqui denominar de “correta”, ocorre entre pessoas boas e inexiste a calúnia, pois há confiança e sinceridade, já que pessoas boas gostam do que é bom. Por que Aristóteles diz isso? Nobilitante: aquele que nobilita, ou seja, aquele que se torna nobre ou engrandecedor. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 59 Por entender que: “(...) aquilo que é irrestritamente bom e agradável parece ser estimável e desejável, e para cada pessoa o bom ou o agradável é aquilo que é bom ou agradável para ela; e uma pessoa boa é desejável e estimável para outra pessoa por ambas estas razões (...) a pessoas boas, tornando-se amiga, torna-se um bem para seu amigo” (ARISTÓTELES, 2001, p.159). Então a amizade para Aristóteles está diretamente ligada à bondade. E a bondade é algo agradável e desejável e, por isso, torna-se busca para as pessoas boas. Mas o que nos torna bons, segundo Aristóteles, é o fato de agirmos de forma certa, buscando em tudo o equilíbrio em nossas ações e diante de nossas emoções. A amizade está relacionada a esta ação, equilíbrio por ter como características e causas a boa disposição e a sociabilidade, pois “(...) as pessoas boas são ao mesmo tempo agradáveis e úteis”. (ARISTÓTELES, 2001, p. 160). Ao mesmo tempo em que Aristóteles apresenta as características e causas da amizade e as afirma nas pessoas boas, procura destacar que nem sempre as pessoas estão em igualdade de situação nas relações de amizade. Ele passa a relacionar as espécies de amizade em que há a superioridade de uma das partes. São os casos de amizade entre pai e filho, pessoas idosas e jovens, marido e mulher e, em geral, entre quem manda e quem obedece. São amizades que diferem entre si, pois a excelência moral e suas funções, bem como as razões de envolvimento das pessoas são diferentes. Nestas amizades “(...) os benefícios que cada parte recebe e pode pretender da outra não são os mesmos da outra”. (ARISTÓTELES, 2001, p. 161). Sendo assim, nestes tipos de amizade o que ocorre é a diferença na proporcionalidade de amor que cada uma das partes recebe e tem para com a outra. Então, se na justiça “(...) o que é igual no sentido primordial é aquilo que é proporcional ao merecimento”; na amizade “(...) a igualdade quantitativa é primordial e a proporcionalidade ao merecimento é secundária” (ARISTÓTELES, 2001, p. 161). Segundo Aristóteles, isto é mais evidente em casos onde “(...) há um grande desequilíbrio entre as partes em relação a excelência moral ou à deficiência moral ou à riqueza ou a qualquer outra coisa”. (ARISTÓTELES, 2001, p. 161). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 60 A maioria das pessoas, por causa de sua ambição, parece que prefere ser amada a amar, e é por isso que a maioria gosta de ser adulada; efetivamente, o adulador é um amigo de qualidade inferior, ou que tem a pretensão de ser amigo e quer estimar mais do que ser estimado; ser estimado é quase a mesma coisa que receber honrarias, e são a estas que a maioria das pessoas aspira. (ARISTÓTELES, 2001). Pelo fato de haver proporcionalidade ao merecimento no caso da amizade ser secundário, já que há relações de amizade em que há superioridade de uma das partes, Aristóteles alerta que por ser comum as pessoas preferirem serem amadas a amarem, ou seja, serem aduladas, atraírem para junto de si amigos de qualidade inferior: o adulador. IMPORTANTE: Um outro conceito que Aristóteles apresenta relacionado à amizade é a justiça. Afirma que entre amigos não há necessidade de justiça. Aristóteles pressupõe a vida do homem na pólis, na cidade, por ser o homem um ser social. O conceito de justiça está diretamente ligado à vida na pólis. Quando se fala da pólis é preciso esclarecer que existem dois espaços: o da pólis – público — e o do oikos, da casa, o privado. A amizade entre os cidadãos Aristóteles denomina concórdia. Se- gundo ele, a amizade não é apenas necessária, mas também nobilitante, ou seja, nobre, louvável. Conclui que a amizade e a bondade encontram-se nas pessoas que são amigas de seus amigos. Antes de opinar sobre o que seja a amizade, Aristóteles apresenta o que os estudiosos de sua época diziam, ou seja, alguns filósofos que o antecederam ou foram seus contemporâneos (Cf. ROOS, 1987). Mas não poucos aspectos da amizade são objeto de contestação. Alguns estudiosos do assunto definem a amizade como uma espécie de semelhança entre as pessoas e dizem que as pessoas semelhantes são amigas — daí vem os provérbios como “o semelhante encontra seu semelhante” (...). Outros tentam achar uma explicação mais profunda e mais física para este sentimento. Eurípides, por exemplo, escreve: “A terra seca ama a chuva, e o divino céu pleno de chuva ama molhar a terra!” Heráclito, em contraste, diz: “Os contrários andam juntos”, “A mais bela harmonia é feita de tons diferentes” e “Tudo nasce do antagonismo!” Outros sustentam um ponto de vista oposto a este, principalmente Empédocles,segundo o qual “o semelhante busca o semelhante” (ARISTÓTELES, 2001, p. 154). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 61 De acordo com os intérpretes, segundo Aristóteles, basicamente dois princípios definem o sentimento amizade: o de Heráclito — “os contrários andam juntos” e o de Empédocles — “o semelhante busca o semelhante”. É preciso esclarecer que tanto Heráclito como Empédocles apresentam uma explicação física para a amizade. Independente de qual dos dois autores você tenha escolhido, para continuar é preciso posicionar-se em relação aos problemas que Aristóteles nos apresenta, após afirmar que em ambos os casos, Heráclito e Empédocles, a amizade é examinada como um problema físico e que deve ser analisada como “(...) problemas relativos ao homem, per- tinentes ao caráter e aos sentimentos. (ARISTÓTELES, 2001, p. 154.). Para responder aos questionamentos que havia levantado, Aristóteles começa por afirmar que há várias espécies de amizade e “(...) a questão das várias espécies de amizades talvez possa ser esclarecida se antes chegarmos a conhecer o objeto do amor”. (ARISTÓTELES, 2001, p. 154). Também diz: “Parece que nem todas as coisas são amadas, mas somente aquelas que merecem ser amadas e estas são o que é bom, ou agradável, ou útil”. (ARISTÓTELES, 2001, p. 154). Aristóteles assevera a existência de várias espécies de amizades e admite que as mesmas estejam relacionadas aos objetos de amor, ou seja, de que amamos o que é bom, ou agradável, ou útil e, portanto, a amizade vai estar relacionada a isso. É preciso lembrar que Aristóteles concebe o homem como algo que realmente é: Ato; e algo que tende a ser: Potência. Então, o homem por meio de seus atos poderá ou não realizar o que é em potência. Isto irá ocorrer em busca de sua finalidade, isto é, a felicidade. Para isso, o homem dispõe da razão que lhe serve como guia, orientadora de suas ações. Por meio da razão o homem irá construir, desenvolver hábitos e formas de agir a partir da excelência moral, a virtude, que o possibilitará fazer as escolhas equilibradas para suas ações e emoções, ou seja, buscar a harmonia. Portanto, quando Aristóteles refere-se à amizade, e que a amizade perfeita é a que se dá entre pessoas boas, é preciso saber que, para o filósofo grego, as pessoas não são boas em si mesmas, mas o bem e a bondade estão em potência nas pessoas, que poderão, a partir de suas escolhas, atingirem ou não. Aristóteles pressupõe a existência da amizade entre os diversos tipos de pessoas e diz que o que demonstra uma pessoa ser boa ou má é a excelência moral de suas ações. “A amizade perfeita é a existente entre as pessoas boas e semelhantes em termos de excelência moral” (ARISTÓTELES, 2001, p. 156). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 62 Havendo então três motivos pelos quais as pessoas amam, a palavra “amizade” não se aplica ao amor às coisas inanimadas, já que neste caso não há reciprocidade de afeição, e também não haverá o desejo pelo bem de um objeto (...) mas em relação a um amigo dizemos que devemos desejar-lhe o que é bom por sua causa. Entretanto, àqueles que desejam o bem desta maneira atribuímos apenas boas intenções se o desejo não é correspondido; quando há reciprocidade, a boa intenção é a amizade. (ARISTÓTELES, 2001, p. 155). A amizade, segundo Aristóteles, pressupõe reciprocidade. É um sentimento específico para os nossos semelhantes, pois precisamos que nosso sentimento seja correspondido. É por isso que muitos intérpretes de Aristóteles e do pensamento grego afirmam que a amizade para os gregos é o “(...) que torna, entre si, semelhantes e iguais” (VERNANT, 1973). Então, segundo Aristóteles, “(...) para que as pessoas sejam amigas deve-se constatar que elas têm boa vontade recíproca e se desejam bem reciprocamente”. (ARISTÓTELES, 2001, p. 155). Havendo então três motivos pelos quais as pessoas amam, a palavra “amizade” não se aplica ao amor às coisas inanimadas, já que neste caso não há reciprocidade de afeição e também não haverá o desejo pelo bem de um objeto (...) mas em relação a um amigo dizemos que devemos desejar- lhe o que é bom por sua causa. Entretanto, àqueles que desejam o bem desta maneira atribuímos apenas boas intenções se o desejo não é correspondido; quando há reciprocidade, a boa intenção é a amizade. (ARISTÓTELES, 2001, p. 155). Existem espécies de amizade em que predomina a busca pelo útil ou agradável ou algo passageiro, segundo Aristóteles, pois é uma característica do ser, que ele chama de “acidente”, por se tratar de características que não são permanentes, pois a utilidade está sempre em mudança, pelo fato de ser o resultado de algum bem ou prazer. Este tipo de amizade, segundo Aristóteles, parece existir principalmente entre as pessoas idosas (nesta idade as pessoas buscam não o agradável, mas o útil) e, em relação às pessoas que estão em plenitude ou aos jovens, entre aqueles que buscam o proveito. Entre estas amizades se incluem os laços de família e de hospitalidade. (Cf. ARISTÓTELES, 2001.). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 63 Aristóteles afirma ainda que entre os jovens o motivo da amizade é o pra- zer, por viverem sob a influência das emoções e buscarem o que agradável, porém o prazer muda com a idade. Para tanto, o filósofo faz uma observação minuciosa das fases da vida e de como as emoções e o prazer são diferentes em cada uma delas. Não está, contudo afirmando ou declarando que não seja possível outro tipo de amizade nestas fases da vida, mas demonstrando o que lhes é mais comum. A amizade perfeita é a existente entre as pessoas boas e semelhantes em termo de excelência moral. Neste caso, cada uma das pessoas quer bem à outra de maneira idêntica, porque a outra pessoa é boa, e elas são boas em si mesmas. Então as pessoas que querem bem aos seus amigos por causa deles são amigas no sentido mais amplo, pois querem bem por causa da própria natureza dos amigos e não por acidente. Logo, sua amizade durará enquanto estas pessoas forem boas e ser bom é uma coisa duradoura (ARISTÓTELES, 2001, p. 156). Aristóteles apresenta em que consiste uma “amizade perfeita”. A “amizade perfeita” acontecerá entre pessoas boas e semelhantes em relação à virtude, ou seja, as que fazem a escolha adequada de suas ações e emoções e que querem o bem aos amigos por causa deles mesmos, da própria natureza dos amigos e não por ser agradável ou útil. Toda amizade é baseada no bem ou no prazer. Portanto, a baseada no bem só poderá ocorrer entre pessoas boas. Quando se fala em bem, considera-se a ética, pois pressupõe que o homem age sempre em busca de ser feliz e que conseguirá isto se buscar o bem, pois o seu contrário lhe acarretará a infelicidade. As pessoas boas são aquelas que possuem uma vida orientada pela busca do agir ético, visam ao equilíbrio em suas ações e emoções. Então, quando a amizade é por prazer ou por interesse, mesmo duas pessoas más podem ser amigas, ou então uma pessoa boa e outra má, ou uma pessoa que não é nem boa nem má pode ser amiga de outra qualquer espécie; mas pelo que são em si mesmas é óbvio que somente pessoas boas podem ser amigas. Na verdade, pessoas más não gostam uma da outra a não ser que obtenham algum proveito recíproco (ARISTÓTELES, 2001). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 64 De acordo com Ross (1987, p. 34), “Aristóteles fala da amizade que se dá pelo prazer ou interesse e a que se dá pelo que as pessoas são em si mesmas. Considera que a que se dá por prazer ou interesse poderá existir entre as pessoas más”. Mas a amizade perfeita só poderá ocorrer entre as pessoas boas e semelhantes pelo fato de que amam a pessoa em si mesma. Você já deve ter ouvido muito o ditado popular: “Diga-me com quem andas e te direi quem és”. Esse ditado popular é muito usado quando nos orientam a respeito de nossas amizades, de nossas com-panhias. Ele traduz o que nos ensina Aristóteles a respeito da amizade. Pois, podemos estar andando com pessoas más sem percebermos que o que em nós as atrai não é o que somos, mas o que lhes oferecemos ou temos a oferecer. Compreendeu como Aristóteles apresenta o seu conceito de amizade? A seguir discutiremos como os filósofos La Boétie e Sartre compreendem um outro tema importante para a temática geral ética, isto é, a liberdade. Vamos lá!! Pensando a liberdade: La Boétie e Sartre Hannah Arendt, na obra Entre o passado e o futuro, apresenta-nos a indagação sobre que é liberdade? Citemos a filósofa: O campo em que a liberdade sempre foi conhecido, não como um problema, é claro, mas como um fato da vida cotidiana, é o âmbito da política. E mesmo hoje em dia, quer saibamos ou não, devemos ter sempre em mente, ao falarmos do problema da liberdade, o problema da política e o fato de o homem ser dotado com o dom da ação; pois ação e política, entre todas as capacidades e potencialidades da vida humana, são as únicas coisas que não poderíamos sequer conceber sem ao menos admitir a existência da liberdade, e é difícil tocar em um problema político particular sem, implícita ou explicitamente, tocar em um problema da liberdade humana. A liberdade, além disso, não é apenas um dos inúmeros problemas e fenômenos da esfera política propriamente dita, tais como a justiça, o poder ou a igualdade; a liberdade, que só raramente – em épocas de crise Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 65 ou de revolução – se torna o alvo direto da ação política, é na verdade o motivo por que os homens convivem politicamente organizados. Sem ela, a vida política como tal seria destituída de significado. A raison d‘être da política é a liberdade, e seu do- mínio de experiência é a ação (ARENDT, 2003, p. 191-192). Partindo desta citação de Hannah Arendt, comecemos a analisar a discussão de La Boétie. A obra Discurso da servidão voluntária, de Etienne de La Boétie, é de um momento histórico bastante distinto. O período em que ela surge e é divulgada é marcado pelo que denominam os historiadores da filosofia de “nova ordem social”. Trata-se de um período de ruptura dos antigos laços sociais de dependência social e das regras corporativas; promovem, portanto, a liberação do indivíduo e os empurram para a luta da concorrência com outros indivíduos, conforme as condições postas pelo Estado e pelo capitalismo. O sucesso ou o fracasso nessa nova luta dependeria de quatro fatores básicos: acaso, engenho, astúcia e riqueza. Para os pensadores renascentistas, a educação seria o fator decisivo. Percebe-se que é um tempo em que as mudanças estão produzindo novas necessidades. É nesse contexto que é escrito o Discurso da servidão voluntária. É preciso atenção, sobretudo, para a questão da liberdade, pois ela age como princípio ético para a ação humana diante das circunstâncias por ele vivenciadas. La Boétie começa a discutir buscando entender porque os homens abrem mão de sua liberdade concedendo a um, no caso o rei, o direito de decidir e a todos comandar. Segundo este: Nossa natureza é de tal modo feita que os deveres comuns da amizade levam uma boa parte de nossa vida; é razoável amar a virtude, estimar os belos feitos, reconhecer o bem de onde recebemos, e muitas vezes diminuir nosso bem-estar para aumentar a honra e a vantagem daquele que se ama e que o merece. Em consequência, se os habitantes de um país en- contraram algum grande personagem que lhes tenha dado provas de grande providência para protegê-los, grande cuidado para governá-los, se doravante cativam-se em obedecê-lo e se fiam tanto nisso a ponto Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 66 de lhe dar algumas vantagens, não sei se seria sábio tirá-lo de onde fazia o bem para colocá-lo num lugar onde poderá malfazer; mas certamente não poderia deixar de haver bondade em não temer o mal de quem só se recebeu o bem. (LA BOÉTIE, 2001, p. 12) A questão que intriga La Boétie é o fato de os homens abrirem mão de sua liberdade em benefício de outro. Pensa ser estranho até mesmo quando este outro é alguém que sempre tenha a todos feito o bem, tenha agido como amigo. Ao fazer uma análise ao longo da história, observou o fato de que apesar “(...) da bravura que a liberdade põe no coração daqueles que a defendem (...), e mesmo assim (...) em todos os países, em todos os homens, todos os dias, faz com que um homem trate cem mil como cachorros e os prive de sua liberdade?” (LA BOÉTIE, 2001, p. 14). Isto é tão ilógico e irracional para La Boétie que ele assim pergunta: “Quem acreditaria nisso se em vez de ver apenas ouvisse dizer?” (LA BOÉTIE, 2001, p. 14). O filósofo está falando diretamente a seus contemporâneos, procurando sensibilizá- los a lutar pela liberdade, a romperem com a servidão. Passa a indicar o que no seu entendimento faz com que os homens estejam sobre pesados jugos, afirmando que: Portanto são os próprios povos que se deixam, ou melhor, se fazem dominar, pois cessando de servir estariam quites; é o povo que se sujeita, que se degola, que, tendo a escolha entre ser servo ou ser livre, abandona sua franquia e aceita o jugo; que consente seu mal – melhor dizendo, persegue-o. Eu não o exortaria se recobrar sua liberdade lhe custasse alguma coisa; como o homem pode ter algo mais caro que restabelecer-se em seu direito natural e, por assim dizer, de bicho voltar a ser homem? Mas inda não desejo nele tamanha audácia, permitindo-lhe que prefira não sei que segurança de viver miseravelmente a uma duvidosa esperança de viver à sua vontade. Que! Se para ter liberdade basta desejá-la, se basta um simples querer, haverá nação no mundo que ainda a Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 67 estime cara demais, podendo ganhá-la com uma única aspiração, e que lastime sua vontade para recobrar o bem que deveria resgatar com seu sangue – o qual, uma vez perdido, toda a gente honrada deve estimar a vida desprezível e a morte salutar? (LA BOÉTIE, 2001, p. 14-15). La Boétie afirma que são os próprios homens quem se fazem dominar, pois bastariam rebelar-se que teriam de volta a liberdade que lhes fora roubada. Nesse sentido, este trabalha com uma ideia revolucionária, que é o fato de atribuir ao povo, à população, o papel de sujeito da própria História. Por conseguinte, alerta para o fato de que se não o faz, talvez o seja pela segurança que sente sob o jugo do poder dos reis e príncipes. Porém, ao agir dessa forma, os homens vivem como se fossem bichos. E qual seria a causa de todas as mazelas que o homem sofre no seu dia-a-dia? Segundo La Boétie: A liberdade, todavia um bem tão grande e tão aprazível que, uma vez perdido, todos os males seguem de enfiada; e os próprios bens que ficam depois dela perdem inteiramente seu gosto e sabor, corrompidos pela servidão. Só a liberdade os homens não desejam; ao que parece não há outra razão senão que, se a desejassem, tê-la-iam; como se se recusassem a fazer essa; bela aquisição só porque ela é demasiado fácil. (LA BOÉTIE, 2001, p. 15). O filósofo insiste na ideia de que se não temos liberdade é porque não a que- remos. E que todos os males que sofremos são decorrência de a havermos perdido e, no entanto, não nos dispomos a recuperá-la. Para sermos felizes, segundo ele, bastaria que “(...) vivêssemos com os direitos que a natureza nos deu e com as lições que nos ensina seriamos naturalmente obedientes aos pais, sujeitos à razão e servos de ninguém” (LA BOÉTIE, 2001, p. 17). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 68 IMPORTANTE: Pressupondo que é de nossa própria natureza ser livre, La Boétie rejeita a tese de que uns sejam mais felizes do que outros, como alguns teóricos da “Teoria do direito divino”, que pressupunham que orei e a família real eram mais em dignidade que o restante dos homens, o que justificava a obediência e reverência a eles prestadas. Por isso, procura de forma contundente denunciar o marasmo diante da servidão. De acordo com este: “É incrível como o povo, quando se sujeita, de repente cai no esquecimento da franquia tanto e tão profundamente que não lhe é possível acordar para recobrá-la, servindo tão francamente e de tão bom grado que ao considerá-lo dir-se-ia que não perdeu sua liberdade e sim ganhou sua servidão” (LA BOÉTIE, 2001, p. 20). Embora fale para o conjunto da população, como os que detêm o poder em relação a rebelar-se contra o jugo da servidão, La Boétie tem o cuidado de distinguir entre aqueles que jamais conheceram a liberdade. Pode-se aqui entender a população a quem sempre foi negado tais direitos, daqueles que tornam o povo objeto de tirania: Por certo não porque eu estime que o país e a terra queiram dizer alguma coisa; pois em todas as regiões, em todos os ares, amarga é a sujeição e aprazível ser livre; mas porque em meu entender deve- se ter piedade daqueles que ao nascer viram-se com o jugo no pescoço; ou então que sejam desculpados, que sejam perdoados, pois não tendo visto da liberdade se- quer a sombra e dela não estando avisados, não percebem que ser escravos lhes é um mal. (LA BOÉTIE, 2001, p. 23). Com efeito, o filósofo procura ser mais enfático ao falar daqueles que são instrumentos da tirania: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 69 Vendo, porém essa gente que gera o tirano para se encarregar de sua tirania e da servidão do povo, com frequência sou tomado de espanto por sua maldade e às vezes de piedade por sua tolice. Pois, em verdade, o que é aproximar-se do tirano senão recuar mais de sua liberdade e, por assim dizer, apertar com as duas mãos e abraçar a servidão? Que ponham um pouco de lado sua ambição e que se livrem um pouco de sua avareza, e depois, que olhem-se a si mesmos e se reconheçam; e verão claramente que os aldeões, os camponeses que espezinham o quanto podem e os tratam pior do que a forçados ou escravos – verão que esses, assim maltratados, são no entanto felizes e mais livres do que eles” (LA BOÉTIE, 2001, p. 33). Realmente, você concorda que a posição de La Boétie é tão atual? Não é interessante o seu ponto de vista sobre a questão da liberdade? A sua discussão poderia perfeitamente caber na nossa época atual? Bem, reflita sobre estas indagações em seguida, pois discutiremos agora o que Sartre propõe como debate sobre a liberdade. Vamos lá! Primeiramente, cabe ressaltar que Sartre preocupa-se em esclarecer que há dois tipos de existencialismo, o cristão, que tem como representantes Jaspers e Gabriel Marcel do o “existencialismo ateu”, que tem como representante Martin Heidegger, os “existencialistas franceses” e o próprio Sartre. O que há em comum entre os existencialistas cristãos e ateus é “(...) o fato de considerarem que a existência precede a essência. (SARTRE, 2004, p. 4-5). Isso significa que, diferente dos filósofos anteriores, sobretudo, da filosofia do século XVIII, os existencialistas não aceitam o fato de o homem possuir uma natureza humana. Por sua vez, o “existencialismo ateu”, do qual Sartre é um dos mentores, fundamenta a inexistência de uma natureza humana pelo fato de afirmarem a inexistência de Deus. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 70 Sobre isto, reflete Sartre: (...) Se Deus não existe, há pelo menos um ser no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito: este ser é o homem (...) o homem existe, encontra a si mes- mo, surge no mundo e só posteriormente se define. O homem, tal como o existencialista o concebe, só não é passível de uma definição porque, de início, não é nada: só posteriormente será alguma coisa e será aquilo que ele fizer de si mesmo (SARTRE, 2004, p. 5-6). Para o existencialismo, o homem ao nascer não está definido, mas irá através de sua existência fazer-se homem. Quando nasce, diferente dos demais animais, o homem tem em suas mãos o que poderá tornar-se. Como afirma Silva “(...) liberdade implica que posso sempre ser um outro projeto, porque nenhuma escolha é em si justificada”. Sendo que “(...) nenhuma escolha decidirá sobre a própria liberdade, porque não posso escolher ser livre” (SILVA, 2004, p. 144). Sartre alerta para o fato de que mesmo que a escolha seja subjetiva, ou seja, individual, o homem está sempre relacionado aos limites da pró- pria realidade humana. Assim, escolher ser isto ou aquilo é afirmar, concomitantemente, o valor do que estamos escolhendo, pois não podemos nunca escolher o mal; o que escolhemos é sempre o bem e nada pode ser bom para nós sem o ser para todos. Se, por outro lado, a existência precede a essência, e se nós queremos existir ao mesmo tempo em que moldamos nossa imagem, essa imagem é válida para todos e para toda a nossa época. (SARTRE, 2004, p. 6-7). Para Borheim (2000), a realidade, a existência de cada um de nós se dá inserida nos limites da subjetividade humana. O ser humano ao mesmo tempo em que é indivíduo, torna-se e realiza-se enquanto ser através da sua relação com os demais de sua espécie e, portanto, as escolhas que faz são escolhas que engajam toda a humanidade. Entretanto, “(...) essa escolha de ser, como todas as que poderiam ser feitas, está sempre em questão, porque a realidade humana é uma questão: nenhuma resolução, nenhuma deliberação assegura a persistência da escolha”. (SILVA, 2004, p. 145). É importante destacar que a ética sartreana fundamenta-se no Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 71 valor e na responsabilidade. Desse modo, instituir valores é implicitamente negar valores, pois devo optar por um único critério e, quando o faço, os outros não permanecem como virtualidades positivas, mas se desvanecem como não-valores. É nesse sentido que a universalidade está implicada na instituição do valor imanente à escolha: só posso escolher um negando os outros e então aquele que escolho torna-se universal; naquele momento, ele é o único capaz de orientar a minha escolha, porque foi essa própria escolha que o posicionou como único. A “radicalidade” da escolha não permite que a instituição de um valor conserve uma pluralidade possível: ela anula todos os outros critérios. (SILVA, 2004, p. 147). O que, na realidade, Silva busca alertar é para o fato de que não há um valor em absoluto e que a cada escolha, ao instituir-se valores, ocorre a anulação dos demais critérios utilizados anteriormente. Na discussão da responsabilidade, e tendo claro que “(...) toda decisão é sempre decisão de criar valores (...) não é possível não escolher, não é possível não assumir responsabilidade pelas escolhas”. (SILVA, 2004, p. 150-151). Nesse sentido, é interessante discutir a questão histórica de responsabilidade do cidadão alemão comum com o Holocausto. É o que afirma o historiador Michael Marrus, quando afirma que: “Assim, temos apenas uma ideia muito vaga das relações entre a política antijudaica nazista e a opinião pública. Embora haja uma crença disseminada de que o antissemitismo fazia parte da força de coesão ideológica do Terceiro Reich, mantendo unidos elementos opostos da sociedade alemã, os historiadores não foram capazes de identificar um impulso assassino fora da liderança nazista”. Eu argumentei que as variedades populares de antissemitismo, sozinhas, nunca foram fortes o suficiente para apoiar a perseguição violenta na era moderna. No caso de certos grupos, como o alto comando da Wehrmach, é muito provável que as predisposições antijudaicas tenham facilitado sua colaboração efetiva no genocídio. Em outros casos, “a indiferença ou a superficialidade parecem ter sido mais comuns — o que é suficientemente chocante quando vemoshorrores do Holocausto, mas de fato isto é muito diferente de um incitamento ao assassinato em massa” (MARRUS, 2003, p. 180-181). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 72 A discussão historiográfica mais recente busca entender como se comportava a população alemã diante do genocídio. Há alguns historiadores que responsabilizam a população alemã pelo fato de ter se comportado de forma indiferente ao que ocorria. Contudo, a posição do historiador Michael Marrus é de que apesar de sua indiferença não é possível responsabilizá-la. É interessante destacar que toda essa discussão histórica tem uma forte conotação ética por se tratar de valorar as ações dos homens diante de um acontecimento considerado hediondo, pelo fato de estender a responsabilidade a toda a população e ter saído do corriqueiro que é atribuir apenas aos governantes e aos que estavam a serviço do poder, mas também ao cidadão comum que se portou de forma indiferente ao que ocorria em sua pátria naquele momento. Para Sartre, o homem é liberdade. Como entender essa afirmação? Entende-se que não há certezas e nem modelos que possam servir de referência, cabe ao homem inventar o próprio homem e jamais esquecer-se que é de sua responsabilidade o resultado de sua invenção. Pelo fato de ser livre é o homem quem faz suas escolhas e que ao fazê- las, torna-se responsável por elas. É por isso que: o existencialista declara repetidamente que o “homem é angústia”. Tal afirmação significa o seguinte: o homem que se engaja e que se dá conta de que ele não é apenas aquele que escolheu ser, mas também um legislador que escolhe simultaneamente a si mesmo e a humanidade inteira, não consegue escapar ao sentimento de sua total e profunda responsabilidade. (SARTRE, 2004). O conceito angústia está relacionado ao binômio: liberdade versus res- ponsabilidade. Faço as escolhas e ao fazê-las sou eu, exclusivamente eu, o único responsável por elas. A angústia é o sentimento de cada homem diante do peso de sua responsabilidade, por não ser apenas por si mesmo, mas por todas as consequências das escolhas feitas. Com a angústia, há um outro sentimento que é fruto também da liberdade: o desamparo. É preciso lembrar que o conceito de angústia foi desenvolvido pelo filósofo Kierkegaard e o conceito de desamparo, pelo filósofo Heidegger (Cf. BORHEIM, 2000). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 73 O existencialista, pelo contrário, pensa que é extremamente incômodo que Deus não exista, pois, junto com ele, desaparece toda e qualquer possibilidade de encontrar valores num céu inteligível; não pode mais existir nenhum bem a priori, já que não existe uma consciência infinita e perfeita para pensá-lo; não está escrito em nenhum lugar que o bem existe, que devemos ser honestos, que não devemos mentir, já que nos colocamos precisamente num plano em que só existem homens. Dostoiévski escreveu: ‘”Se Deus não existisse, tudo seria permitido” (SARTRE, 2004, p. 9). O desamparo se dá pelo fato de o homem saber-se só. É por isso que Sartre diz que “(...) o homem está condenado a ser livre”. (SARTRE, 2004, p. 9). Pois não há nenhuma certeza, não há nenhuma segurança e tudo o que fizer é de sua irrestrita responsabilidade. De fato o homem, sem apoio e sem ajuda, está condenado a “(...) inventar o homem a cada instante”. (SARTRE, 2004, p. 9). Diante da constatação de que “(...) somos nós mesmos que escolhemos nosso ser”. (SARTRE, 2004, p. 12), surge o outro sentimento: o desespero. O que marca o desespero é o fato de que só podemos contar com o que depende da nossa vontade ou com o conjunto de probabilidades que tornam a nossa ação possível. Quando se quer alguma coisa, há sempre elementos prováveis. Posso contar com a vinda de um amigo. Esse amigo vem de trem ou de ônibus; sua vinda pressupõe que o ônibus chegue na hora marcada e que o trem não descarrilhará. Permaneço no reino das possibilidades, porém trata-se de contar com os possíveis apenas na medida exata em que nossa ação comporta o conjunto desses possíveis. A partir do momento em que as possibilidades que estou considerando não estão diretamente envolvidas em minha ação, é preferível desinteressar-me delas, pois nenhum Deus, nenhum desígnio poderá adequar o mundo e seus possíveis a minha vontade. Não posso, porém contar com os homens que não conheço, fundamentando-me na bondade humana ou no interesse do homem pelo bem-estar da sociedade, já que o homem é livre e que não existe natureza humana na qual possa me apoiar (SARTRE, 2004, p. 12). Pelo fato de a realidade ir além, extrapolar os domínios de minha vontade e de minhas ações, o reino das possibilidades passa a evidenciar que minha ação deverá ocorrer sem qualquer esperança. O desespero é, portanto, o sentimento de que não há certezas e verdades prontas, é o sentimento de insegurança que impregna a vontade e o agir, pelo fato de ambos serem confrontados com o reino das possibilidades e apontarem para o limite a liberdade de cada indivíduo. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 74 A realidade não existe a não ser na ação; (...) o homem nada mais é do que o seu projeto; só existe na medida em que se realiza; não é nada além do conjunto de seus atos, nada mais que sua vida (SARTRE, 2004, p. 13). Segundo Borheim (2000, p. 23), “uma vez que não existe para cada um senão aquilo que faz, ou seja, o resultado de suas ações; a vida é, portanto, a somatória dos próprios atos”. Sendo assim, Sartre destaca a ideia de que o homem é levado a agir, pois é por meio do engajamento que direciona seus atos em relação aos outros homens. Alerta Sartre que não se nasce herói, covarde ou gênio, mas é o engajamento que faz com que assim se torne. Isso se dá pelo fato de que: (...) se bem que seja impossível encontrar em cada homem uma essência universal que seria a natureza humana, consideramos que exista uma universalidade humana de condição. Não é por acaso que os pensadores contemporâneos falam mais frequentemente da condição do homem do que de sua natureza. Por condição, eles entendem, mais ou menos claramente, o conjunto dos limites a priori que esboçam a sua situação fundamental no universo (SARTRE, 2004, p. 16). IMPORTANTE: Ao falar da condição do homem, Sartre apresenta o que delimita o agir. Portanto, para este cada um enfrentará os limites de sua própria existência que está dada em sua condição e diante da qual “(...) a escolha é possível, em certo sentido, porém o que não é possível é não escolher. Eu posso sempre escolher, mas devo estar ciente de que, se não escolher, assim mesmo estarei escolhendo.” (SARTRE, 2004, p. 17). É interessante que as escolhas são ativas ou passivas e a responsabilidade pesa sobre elas, seja qual delas for. É verdade no sentido em que, cada vez que o homem escolhe o seu engajamento e o projeto com toda a sinceridade e toda a lucidez, qualquer que seja, aliás, esse projeto, não é possível preferir-lhe um outro; é ainda verdade na medida em que nós não acreditamos no progresso; o progresso é uma melhoria; o homem permanece o mesmo perante situações diversas e a escolha é sempre uma escolha numa situação determinada (SARTRE, 2004, p. 18). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 75 É o homem quem escolhe seu engajamento e isto, segundo Sartre, “jamais mudará”. É por isso que o filósofo preocupa-se em dizer que não há a ideia de progresso em relação ao homem, já que o mesmo sempre estará diante da escolha de seu engajamento. Talvez fique mais evidenciada a ideia de que o homem não é uma essência, pois não se trata de chegar a um ponto ou lugar determinado, antes o que resta a cada um é fazer sua escolha, a escolha que lhe for possível. Quando declara que a liberdade, através de cada circunstância concreta, não pode ter outro objetivo senão o de querer-se a si própria, quero dizer que, se alguma vez o homemreconhecer que está estabelecendo valores, em seu desamparo, ele não poderá mais desejar outra coisa a não ser a liberdade como fundamento de todos os valores. Isso não significa que ele a deseja abstratamente. Mas simplesmente, que os atos dos homens de boa fé possuem como derradeiro significado a procura da liberdade enquanto tal (SARTRE, 2004, p. 19). Portanto, o valor máximo da existência humana é a liberdade. Mas a liberdade não é algo individual, ou seja, a nossa liberdade implica na dos outros. Apesar das circunstâncias é a liberdade o valor imprescindível da vida humana. O alerta que faz Sartre em relação à liberdade como fundamento de todos os valores é o de que: Temos que encarar as coisas como elas são. E, aliás, dizer que nós inventamos os valores não significa outra coisa senão que a vida não tem sentido a priori. Antes de alguém viver, a vida, em si mesma, não é nada; é quem a vive que deve dar-lhe um sentido; e o valor nada mais é o que esse sentido escolhido. (SARTRE, 2004, p. 21). O homem, pelo fato de ser livre e tornar-se homem, já que a existência precede a essência, depara-se com a situação de que a vida não possui sentido anteriormente dado. O sentido da vida é traçado a partir das escolhas que faz e através dos atos que realiza. Sendo assim, Sartre não aceita os demais humanismos, pois apresenta um sentido à vida humana como sendo uma meta, algo pronto e acabado ao qual cada indivíduo deva alcançar. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 76 Existe uma universalidade em todo projeto no sentido em que qualquer projeto é inteligível para qualquer homem. Isso não significa de modo algum que esse projeto defina o homem para sempre, mas que ele pode ser reencontrado. Temos sempre a possibilidade de entender o idiota, a criança, o primitivo ou o estrangeiro, desde que tenhamos informações suficientes. Nesse sentido, podemos dizer que há uma universalidade do homem, porém ela não é dada, ela é permanentemente construída. (SARTRE, 2004, p. 16). Uma das diferenças entre o humanismo divulgado pelo existencialismo está no fato de que há uma universalidade humana que é uma “construção do próprio homem”, contrária à afirmação de uma essência humana já que a mesma entende-se como algo dado, pronto e sempre o mesmo. Por não haver valores estabelecidos, o homem pode inventá-los e, ao fazê-lo, atribui sentido à própria vida. O humanismo do qual fala o existencialismo é o que permite que os homens, por meio da invenção de valores, criem a comunidade humana. Deve-se destacar o fato de que não há um modelo ou meta predeterminada, mas se dá por meio da própria ação dos homens (Cf. BORHEIM, 2000). A afirmação de Sartre “(...) o homem é liberdade” depara-se com o humanismo proposto pelo existencialismo que entende que o homem não pode ser colocado como meta ou fim. É por isso, que mesmo havendo a meta, para os demais humanismos, Sartre a rejeita pelo fato de entender que é por meio de sua ação — engajamento —, o homem, por não haver valores estabelecidos, pode inventá-los e, ao fazê-lo, atribui sentido à própria vida. O humanismo do qual fala o existencialismo é o que permite que os homens por meio da invenção de valores criem a comunidade humana. De acordo com Silva (2004, p. 34) (...) deve-se destacar o fato de que não há um modelo ou meta predeterminada, mas se dá por meio da própria ação dos homens. Também, por entender que o homem não é uma meta, é impossível, para Sartre, admitir que o homem possa julgar o homem”. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 77 Quando recusou o prêmio Nobel de literatura, o fez por entender que nin- guém poderia valorar, ou seja, julgar a sua obra. Para o existencialismo, o humanismo está dado na realização da própria vida, em que por meio das escolhas e diante das circunstâncias e condições o homem realiza sua existência por meio da liberdade. O problema da liberdade é verdadeiramente uma questão intrigante e atual. Espero que você tenha aprendido sobre esta problemática de forma tranquila e segura, pois não é tão difícil como aparenta ser. SUGESTÃO DE FILME Pegue seu caderno de anotações, sente-se e assista ao filme A Dona da História de Daniel Filho. Ele contextualizará melhor ainda o conteúdo que você acabou de estudar. LEITURA COMPLEMENTAR Visando enriquecer seu processo de aprendizagem procure efetuar a leitura complementar dos seguintes textos: ARISTÓTELES (Tradução de Mário da Gama Kury). Ética a Nicômacos. 4ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília - UNB, 2001. 240p. ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2003. 350p. BORHEIM, G. A. Sartre. São Paulo: Editora Perspectiva, 2000. 320p. LA BOETIE. E. Discurso da Servidão Voluntária. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001. 455p. TUNGENDHAT, E. Lições sobre ética. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1997. 432p. VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. 304p. VERNANT, Jean-Pierre. Mito e Pensamento entre os gregos. 28ª ed. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 2005. 400p. MARRUS, M. R. A assustadora história do Holocausto. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. 340p. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 78 SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. São Paulo: Nova Brochura, 2004. 257p. SAVATER, F. Ética para meu filho. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 189p. SILVA, F. L. Ética e Literatura em Sartre: ensaios introdutórios. São Paulo: UNESP, 2004. 264p. É HORA DE SE AVALIAR! Lembre-se de realizar as atividades propostas no caderno de exercícios! Elas são fundamentais para ajudá-lo a fixar o conteúdo teórico trabalhado, a sistematizar as ideias e os conceitos apresentados, além de proporcionar a sua autonomia no processo ensino-aprendizagem. Caso prefira, redija suas respostas no caderno de exercícios e depois as envie através do nosso ambiente virtual de aprendizagem (AVA). Procure interagir permanentemente conosco e utilize todos os recursos didáticos e pedagógicos disponibilizados com o objetivo de aprimorar a sua formação acadêmica. Nesta unidade, procuramos fornecer alguns dos problemas norteadores da ética. Vimos a discussão sobre a problemática da liberdade, do determinismo e da responsabilidade nos filósofos La Boétie e Sartre. Também, buscou-se compreender as noções de felicidade amizade e virtude na reflexão filosófica de Aristóteles. Além disso, debatemos o que é ser virtuoso e o que é necessário para ser feliz, segundo a perspectiva de Aristóteles. Espero que você tenha desfrutado dessa discussão e tenha compreendido a relevância destes conceitos tão na nossa prática cotidiana. Na próxima unidade discutiremos a aplicação prática dos fundamentos da ética. Bons estudos! Te vejo na próxima unidade! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 79 Exercícios - unidade 2 “Para definir um ______, temos de ponderar, avaliar, ajuizar, apreciar ou estimar. Neste sentido, valorar implica uma avaliação e uma _________. Logo, toda moral e toda ética se relacionam diretamente aos _______, que são avaliações e apreciações seja da melhor forma de vida, seja da boa ou má ação”. a) Valor – apreciação - instintos b) Valor – apreciação - juízos c) Humor – discriminação - instintos d) Valor – apreciações - juízos e) Humor – discriminação - instintos 2ª QUESTÃO: Marque (V) para as afirmativas verdadeiras e (F) para as falsas e assinale a alternativa CORRETA. ( ) Valorar é dar preferência ao que é melhor. ( ) Juízos são avaliações e apreciações da melhor ou pior forma de vida e da boa ou má ação. ( ) Alguns dos juízos éticos de valor são informativos. a) V, V, F. b) V, V, V. c) F, V, F. d) V, F, F e) F, F, F. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 80 3ª QUESTÃO: É o homem quem escolhe seu engajamentoe isto, segundo Sartre, “jamais mudará”. É por isso que o filósofo preocupa-se em dizer que não há a ideia de progresso em relação ao homem, já que o mesmo sempre estará diante da escolha de seu engajamento. Em relação a esta afirmativa, podemos afirmar que, para Sartre: a) o homem, pelo fato de ser livre e tornar-se homem, já que a existência sucede a essência, depara-se com a situação de que a vida não possui sentido anteriormente dado. b) o homem, pelo fato de ser livre e tornar-se homem, já que a existência precede a essência, depara-se com a situação de que a vida não possui sentido anteriormente dado. c) o homem, pelo fato de não conseguir ser livre e tornar-se um animal, já que a existência precede a essência, depara-se com a situação de que a vida não possui sentido anteriormente dado. d) o homem, pelo fato de ser livre e tornar-se homem, já que a existência precede a inconsistência, depara-se com a situação de que a vida possui um sentido anteriormente dado. e) o homem, pelo fato de ser livre e tornar-se homem, já que a essência precede a existência, depara-se com a situação de que a vida não possui sentido anteriormente dado. 4ª QUESTÃO: Para La Boétie é preciso atenção, sobretudo, para a questão da liberdade, pois ela age como princípio ético para a ação humana diante das circunstâncias por ele vivenciadas. Seguinte a esta sentença, é possível afirmar que: a) para La Boétie, os homens são escravos e a sua existência precede a sua essência. b) a questão que intriga La Boétie é o fato de os homens abrirem mão de sua liberdade em benefício de um outro. c) La Boétie afirma enfaticamente que a lei moral é um imperativo categórico. d) a questão que intriga La Boétie é aquela que diz respeito ao profissionalismo religioso. e) para La Boétie, a amizade é um fenômeno sagrado e impositivo. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 81 5ª QUESTÃO: Assinale a letra correspondente à alternativa que preenche CORRETAMENTE as lacunas do texto a seguir: “Existem __________ em que predomina a busca pelo útil ou agradável, ou algo passageiro, segundo Aristóteles, pois é uma característica do ser, que Aristóteles chama de ______, por se tratar de características que não são permanentes, pois a utilidade está sempre em mudança, pelo fato de ser o resultado de algum bem ou prazer.” a) espécies de moralidade - “acidente” b) espécies de coragem - “lei moral” c) espécies de amizade - “acidente” d) espécies de coragem - “lei moral” e) espécies de amizade - “imperativo” 6ª QUESTÃO: Leia atentamente o texto a seguir: “De tudo que é contínuo e divisível é possível tirar uma parte maior, menor ou igual, e isto tanto em termos da coisa em si quanto em relação a nós; e o igual é um meio termo entre o excesso e a falta. Por “meio termo” quero significar aquilo que é equidistante em relação a cada um dos extremos, e que é único e o mesmo em relação a todos os homens; por “meio termo em relação a nós” quero significar aquilo que não é nem demais nem muito pouco, e isto não é único nem o mesmo para todos” (ARISTÓTELES, 2004. p. 41). Com base na sua leitura podemos afirmar que: a) para Aristóteles, a busca é pelo “meio-termo”, ou seja, o equilíbrio entre o excesso e a falta. b) para Aristóteles, o “meio-termo” é a própria essência da felicidade. c) para Aristóteles, a busca é pelo “meio-termo”, ou seja, o equilíbrio entre o processo e a falta. d) para Aristóteles, o “meio-termo” é o meio para o fim da coragem. e) para Aristóteles, o equilíbrio e a falta são termos metafísicos fora do alcance da infelicidade. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 82 7ª QUESTÃO: Dentre as alternativas a abaixo, qual delas é completamente FALSA? a) Aristóteles fundamenta a ética — a arte de bem viver — tendo como refe- rência primordial o papel do homem, ou seja, da vida humana, pois não se tra- ta da vida de um homem e sim do ser humano em geral. b) para Aristóteles, a felicidade é o resultado do saber viver. c) para Aristóteles toda a preocupação, tanto da excelência moral quanto da ciência política, é com o prazer e com o sofrimento, porquanto o homem que os usa bem é bom e o que os usa mal é mau. d) na obra Ética a Nicômacos é o lugar onde Aristóteles discute as condições necessárias para ser feliz. e) o termo excelência utilizado por Aristóteles é corriqueiramente entendido também por coragem. 8ª QUESTÃO: Considere as afirmativas: I. Para que haja conduta ética, é preciso que exista o agente consciente. II. A consciência moral não só conhece tais diferenças, mas também se reconhece como capaz de julgar o valor dos atos e das condutas e de agir em conformidade com os valores morais. III. A consciência moral manifesta-se, antes de tudo, na incapacidade para deliberar diante de poucas possíveis, decidindo e escolhendo uma delas antes de lançar-se na ação. IV. A consciência moral diz respeito a uma escuta coletiva que todos temos como seres irracionais e que às vezes faz com que sintamos remorso por ter agido de uma forma em vez de outra. Assinale a alternativa verdadeira. a) I e II são corretas; III e IV são falsas. b) I e III são corretas; II e IV são falsas. c) II e IV são corretas; I e III são falsas. d) I e II são falsas; III e IV são corretas. e) I, II e IV são falsas; III é correta. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 83 9ª QUESTÃO: O ato amoralmente válido subdivide-se em duas formas fundamentais: o normativo e o fatual. Como se constitui o ‘ato normativo’? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 10ª QUESTÃO: Todos os juízos éticos de valor são normativos, isto é, enunciam normas que determinam o “dever ser” de nossos sentimentos, nossos atos, nossos comportamentos. Com base no que você estudou nesta unidade, discorra sobre as especificidades dos juízos éticos de valor normativos. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 84 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 85 Ética aplicada: a ética na empresa e nos negócios Pressupostos teóricos da ética empresarial: história e desenvolvimento. Empresa ética e visão ético-empresarial. A ética nos negócios ou negociando com ética: lucro x princípios morais. O código de ética profissional: funções e limites. 3 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 86 Seja bem-vindo à terceira unidade de estudo. Na unidade anterior, você teve a oportunidade de estudar alguns dos temas mais recorrentes da ética, no plano tradicional da história da filosofia. O estudo daqueles temas foi fundamental para que você se sentisse confortável e seguro para entender o que estudaremos a partir desta unidade. Trata-se, portanto, de discutirmos a aplicação prática dos fundamentos da ética. Sendo assim, nesta unidade, ressaltaremos a aplicação da ética no plano das empresas e dos negócios. Uma abordagem estritamente fundamental para quem atua ou atuará no ramo da administração ou da contabilidade, assim como os que possuem interesse em compreender como procedem as relações éticas no âmbito empresarial emgeral. Bom estudo! Objetivos da unidade Discutir a abordagem prática da ética no nível das organizações e nos negócios. Compreender os aspectos éticos presentes nas relações comerciais ou nos negócios. Discutir o código de ética e seus fundamentos. Plano da unidade Pressupostos teóricos da ética empresarial: história e desenvolvimento. Empresa ética e visão ético-empresarial. A ética nos negócios ou negociando com ética: lucro x princípios morais. O código de ética profissional: funções e limites. Bons estudos! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 87 Pressupostos teóricos da ética empresarial: história e desenvolvimento Atualmente é notória a importância da ética no desenvolvimento das organizações, isto é, da postura que as empresas adotam para terem uma conduta ética e dos instrumentos de aplicação da mesma. Estas investem cada vez mais na criação de estruturas adequadas ao fortalecimento das relações éticas com os seus consumidores, fornecedores e a comunidade em que está inserida. Qualquer que seja a razão ou o motivo, tudo isto nos faz compreender que a ética é realmente um “ótimo negócio”! Segundo Moreira (2002), o comportamento ético nos negócios é esperado e exigido por toda a sociedade, pois é a única forma de obtenção de lucro com respaldo moral ou ético. Por sua vez, Nash (2001) avalia que vários empresários vêm resgatando os valores morais compreendidos pela conduta ética nos negócios, tais como: honestidade, justiça, respeito pelos outros, compromisso cumprido, confiabilidade, entre outros. Para a autora, a aplicação da ética nos negócios consiste em um diferencial competitivo, que pode determinar a permanência da empresa no mercado tão competitivo. Mas o que é uma empresa? O que a caracteriza? Considerando a empresa como uma “unidade econômica”, podemos dizer que, através dela, todo empresário utiliza os três fatores técnicos em relação à sua produção: a natureza, o capital e o trabalho. Estes fatores aliados suscitam um resultado bem definido, que é um serviço ou um bem ou até mesmo um direito. O bem, ou o serviço, ou o direito é, por sua vez, vendido ao mercado pelo preço mais adequado que este puder oferecer. Por conseguinte, a diferença entre o preço da venda e o custo da produção é o proveito monetário designado de lucro. Deste modo, defini-se uma empresa como uma organização cujo seu objetivo final é a garantia do lucro. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 88 Nestes termos, a ética empresarial objetiva avaliar ou investigar as consequências do comportamento de uma empresa, isto é, de uma “unidade econômica” quando a sua ação está ou não em conformidade com os princípios morais e as regras do bem proceder aceitas pela coletividade nas quais está inserida. Por outro lado, a ética empresarial reflete e discute as normas e valores dominantes de uma empresa, também interroga pelos fatores qualitativos que fazem com que determinado agir seja um agir eticamente válido. Por outro lado, sob o prisma da ética aplicada, ela tem como meta estabelecer, através do acordo com as pessoas atingidas, pelo agir empresarial, normas materiais e processuais que foram postas em vigor na empresa como possuindo “caráter vinculante” (MOREIRA, 2002, p. 22). Por fim, podemos ainda enfatizar que a ética empresarial ou organizacional pode ser apreendida como o “descobrimento e a aplicação dos valores e normas compartidos pela sociedade no âmbito da empresa ou organização, especificamente, no processo de tomada de decisões a fim de aumentar sua qualidade” (MOREIRA, 2002, p. 33). Pensando assim, a tarefa principal da ética empresarial consiste em elucidar o sentido e o fim da atividade empresarial e propor orientações e valores éticos específicos para alcançá-los. Com efeito, as decisões concretas ficam nas mãos dos sujeitos que são responsáveis por elas e, portanto, não “podem tomá-las sem considerar o fim que se persegue, os valores éticos orientadores, a consciência ética socialmente alcançada e os contextos e consequências de cada decisão” (TOFFLER, 1993, p. 34). Cabe salientar que estas definições somente fazem sentido se tivermos em mente as características fundamentais da ética empresarial. Quais são estas características? Como se caracteriza a ética empresarial? Toffler (1993) destaca os seguintes pontos: “A ética empresarial não consiste em uma ética de convicção, mas sim de responsabilidade pelas consequências das decisões tomadas. No entanto, deve-se evitar extremos, pois aquele que pauta seu agir puramente pela ética da responsabilidade, sem convicções, pode transformar-se em um frio calculador de consequências”; Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 89 Entende-se por ética de convicção a que prescreve ou proíbe determinadas ações, incondicionalmente, como boas ou más em si, sem levar em conta as condições em que devem realizar-se ou omitir-se ou, ainda, sem considerar as consequências que podem advir de sua realização ou omissão. E por ética da responsabilidade, a que ordena ponderar as consequências previsíveis das próprias decisões ou das circunstâncias em que ocorrem. “Uma vez que a atividade empresarial tem uma função social que a legitima, a empresa que esquece este aspecto não logra esta legitimação. Desta forma, os consumidores são interlocutores válidos e constitui-se uma exigência para a ética da empresa ter em conta seus interesses através de mecanismos de participação efetiva”; “Os membros da empresa devem cumprir com suas obrigações e “co-responsabilizarem-se” pelo andamento de suas atividades com a cooperação, suplantando o conflito e a apatia”. Com isso, pode-se concluir que, de acordo com Toffler, uma empresa ou organização que atua de forma eticamente adequada é a que persegue os objetivos pelos quais realmente existe, isto é, satisfazer as necessidades humanas e caracteriza-se fundamentalmente pela agilidade e iniciativa, pelo fomento da cooperação entre seus membros, pela solidariedade, pelo “risco racional” e pela “co-responsabilidade”. Contudo, todas estas evidências devem ocorrer dentro dos parâmetros da justiça, sem o qual a organização estaria em desacordo com os princípios éticos e morais da sociedade em que está inserida (TOFFLER, 1993, p. 56). Bem, depois dessa breve explanação sobre os pressupostos da Ética empresarial, vejamos alguns dos seus pressupostos históricos. Vamos lá? A evolução histórica da ética empresarial seguiu concomitantemente ao desenvolvimento econômico, histórico e social da nossa civilização. Este desenvolvimento concomitante fez surgir vários problemas. Você deve estar perguntando que problemas são estes? Bem, inicialmente, na economia baseada em “troca” das sociedades primitivas e antigas, não havia lucro e nem efetivamente o que hoje denominamos de empresa. Com efeito, o advento do conceito de lucro como finalidade das operações econômicas representou uma dificuldade para a moral e para a ética, assim como para o que hoje entendemos como empresa. Você deve estar se perguntando: como assim? Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 90 Durante muito tempo, pensadores, intelectuais e estadistas debruçaram-se a estudar apenas a “economia de troca”, na qual se assumiam valores idênticos para os bens comercializados. Em função disso, consideravam o lucro como um acréscimo indevido ou um “ato imoral” (contra a moral ou antiético). Todavia, no século XVII, Adam Smith demonstrou, na sua obra A Riqueza das Nações (1776), que o lucro não e um “acréscimo indevido” nem algo de imoral, mas um “vetor de distribuição de renda” e de “promoção do bem-estar social”. Com isso, Adam Smith logrou expor pela primeira vez a compatibilidade entre ética e a atividade lucrativa (Cf. TOFFLER, 1993). Não obstante, a primeira tentativa formalde impor um comportamento ético a empresa foi encíclica Rerum Novarum, do papa Leão XIII. Nela, foram expostos os princípios éticos fundamentais aplicáveis aos relacionamentos entre a empresa e seus empregados. Esses princípios valorizavam, sobretudo, o respeito aos direitos e a dignidade dos trabalhadores. Em 1890, nos Estados Unidos, vigorou a lei denominada Sherman Act a qual passou a proteger a sociedade contra acordos entre empresas contrárias ou restritivas da livre concorrência. Ainda nos Estados Unidos, foi promulgada, no começo do século XX, a Lei Clayton, modificada na década de 30, mediante a emenda Pattman Robison. Essa lei complementou a Sherman Act, proibindo a prática de discriminação de preço por parte de uma empresa em relação aos seus clientes. Por conseguinte, nas décadas seguintes, de 50 a 70 do século passado, os Estados Unidos permitiram que outras nações como Alemanha e Japão, por exemplo, crescessem sem quaisquer obstáculos, perdendo importantíssimas empresas para concorrentes estrangeiros. Os países de origem Alemã, na década de 60, começaram a incentivar debates sobre a ética nos negócios, com o objetivo de fazer do trabalhador um participante dos conselhos de administração das organizações ou das empresas. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 91 Ainda na década de 60, tanto as faculdades de administração e de negócios nos Estados Unidos, iniciaram a inclusão em seus currículos o ensino da ética, quando alguns filósofos e intelectuais deram suas contribuições aproximando suas pesquisas com o ensino da ética. Como consequência imediata da aproximação e aplicação do ensino da ética nas Universidades americanas, surge os primeiros balbucios da Ética empresarial. Contrário aos Estados Unidos, na América Latina, o desenvolvimento do estudo e da pesquisa da ética nos negócios ou nas empresas iniciaram-se a partir dos esforços isolados de professores e pesquisadores universitários, além das atividades subsidiárias das empresas multinacionais instaladas em alguns países. Com efeito, foi somente na segunda metade do século XX que o tema da ética empresarial de fato ganhou importância fora do meio acadêmico. Como exemplo, podemos citar o ano de 1972 quando a organização das nações unidas (ONU) realizou em Estocolmo, na Suécia, a conferência internacional sobre o meio- ambiente. Este evento serviu para alertar todos os segmentos sociais, inclusive as empresas, sobre a necessidade de se preservar a proteger o nosso planeta. Depois dessa conferência, quase todos os países do mundo adotaram ou reforçaram as suas leis, subordinando a atividade econômica à proteção do meio ambiente. Em 1977 o congresso norte-americano aprovou uma lei relativa à ética empresarial, que chamou a atenção do mundo. Ela foi denominada Foreign Corrupt Practices Act (FCPA). Tal lei passou a proibir e a estabelecer penalidades para pessoas ou organizações que oferecessem subornos a autoridades estrangeiras para obter negócios ou contratos. Em 1980, os jesuítas abrem, em Wall Street, um “centro de reflexão” para os banqueiros e os bolsistas católicos, procurando estimular um debate qualificado sobre a ética empresarial ou dos negócios através de seminários, palestras e estudos dirigidos. Neste mesmo ano, a Universidade de Harvard recebe uma doação de 23 milhões de dólares do presidente da Securities and Exchange Commission (SEC) para financiar pesquisas na área de ética. Em 1988, a ética nos negócios tornou-se disciplina obrigatória para todos os seus estudantes de administração de empresas nos Estados Unidos. Também, criaram-se, numerosos manuais para o ensino da ética empresarial, abrangendo conceitos básicos e soluções práticas ou aplicadas. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 92 Posteriormente, a ética dos negócios ou empresarial converte-se em tema de um best-seller com a publicação do Manager Minute, de Kenneth Blanchard. Em seguida, este publica com Norman Peale, The Power of Ethical Management. Em 1988, Gordon Shea publica Pratical Ethics, promovida no meio dos negócios e nas Universidades pela American Management Association (AMA). No Brasil, mais especificamente em São Paulo, a Escola Superior de Administração de Negócios (ESAN), pioneira na área, mantém no currículo o ensino da ética desde sua fundação, em 1941. Contudo, somente em 1992, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) aconselhou que todos os cursos de graduação e pós- graduação prestigiassem o ensino da ética e seus desdobramentos teóricos. Neste mesmo ano, foi desenvolvida uma sólida pesquisa sobre a Ética nas empresas brasileiras pela Fundação (FIDES) (ARRUDA, 2002). Cabe salientar que, em 1992, a Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, criou o (CENE), isto é, o Centro de Estudos de Ética nos Negócios. Depois de vários projetos de pesquisa desenvolvidos com empresas, os próprios estudantes da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV) solicitaram a ampliação dos objetivos do CENE para incluir organizações do governo e não-governamentais. A partir de 1997, o CENE passou a ser denominado Centro de Estudos de Ética nas Organizações e introduziu novos projetos em suas atividades contribuindo decisivamente para os estudos da ética empresarial no Brasil (Cf. ARRUDA, 2002). Tanto o Brasil como em outros países, as leis e, principalmente, as decisões judiciais voltam-se no sentido de exigir das empresas um comportamento ético em todos os seus relacionamentos. Para motivá-las a seguir os princípios da ética, através do estímulo aos seus “instintos egoísticos” alguns países permitem que os tribunais imponham condenações milionárias às empresas infratoras e antiéticas. Atualmente, a preocupação com a ética empresarial, em todo o mundo, é de tal relevância que podemos afirmar estarmos vivendo uma nova era nesse assunto. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 93 De acordo com Jacomino (2000, p. 56): A importância da ética nas empresas cresceu a partir da década de 80, com a redução das hierarquias e a consequente autonomia dada às pessoas. Os chefes, verdadeiros xerifes até então, já não tinham tanto poder para controlar a atitude de todos, dizer o que era certo ou errado. Não obstante, é importante ressaltar que a questão da ética empresarial passa necessariamente pela questão do indivíduo. São os indivíduos que formam as organizações e nela convivem diariamente. Neste sentido, a conscientização da importância de valorização da ética deve partir do indivíduo. Sobre esta questão Jacomino (2000, p. 29) destaca: “Além de ser individual, qualquer decisão ética tem por trás um conjunto de valores fundamentais. Ser ético nada mais é do que agir direito, proceder bem, sem prejudicar os outros”. IMPORTANTE: Com efeito, o “agir eticamente” é, acima de tudo, uma “decisão pessoal e moral”, ou seja, uma opção particular de cada indivíduo. A partir do momento que há o despertar para a relevância sobre assunto, ele passa a estar cada vez mais presente nas atitudes das pessoas que compõem a organização e nas decisões que venham a ser tomadas. Ainda segundo Jacomino (2000, p. 31): Não podemos ser inocentes e pensar que empresas são apenas entidades jurídicas. Empresas são formadas por pessoas e só existem por causa delas. Por trás de qualquer decisão, de qualquer erro ou imprudência estão seres de carne e osso. E são eles que vão viver as glórias ou o fracasso da organização. Por isso, quando falamos de empresa ética, estamos falando de pessoas éticas. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 94 Para tanto, é fundamental que a empresa defina regras claras para a condução dos seus negócios e para o relacionamento entre as pessoas que compõem as equipes de trabalho, buscando promover a participação de todos na discussãodos “limites éticos na organização”. No entanto, para Arruda (2002, p. 34): Enquanto a ética profissional está voltada para as profissões, os profissionais, associações e entidades de classe do setor correspondente, a ética empresarial atinge as empresas e organizações em geral. A empresa necessita desenvolver-se de tal forma que a conduta ética de seus integrantes, bem como os valores e convicções primários da organização se tornem parte de sua cultura. De forma geral, Srour (2000, p. 45) indica que a: (...) ética empresarial ou dos negócios responde de forma instrumental às necessidades empresariais, valendo o esforço de conciliar os conflitos dos mais variados, relacionamento com clientes, conquistar novos consumidores potenciais que simpatizam com determinada atividade comercial”. Além disso, esta produz no imaginário social a ideia de que se preservam os valores morais internamente e externamente, e, sobretudo, a necessidade de se alcançar os objetivos intentados pela empresa pela tomada “racional” de decisões que exigem grande poder de deliberação em decorrência da análise das circunstâncias e das complexidades que a envolve. Compreendeu como a ética empresarial se constitui? Percebeu as nuances que a caracteriza? Vejamos a seguir as razões que identificam uma empresa ética: o que é visão ético-empresarial? Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 95 Empresa ética e visão ético-empresarial Como já dissemos anteriormente, o comportamento ético por parte da empresa é “esperado e exigido por toda a sociedade” (MOREIRA, 2002). Ele é a única forma de obtenção de lucro com “respaldo da moral”. Este respaldo impõe que a empresa aja com ética em todos os seus relacionamentos, especialmente com clientes, fornecedores, competidores e seu mercado, empregados, governos e públicos em geral. Você deve estar indagando: ora, as afirmações são suficientes para esclarecer os motivos básicos para que uma empresa se convencesse a agir com ética ou eticamente? Sim, você tem toda razão. No entanto, existem outros motivos bem definidos e específicos. Vejamos quais são. Uma empresa ética incorre em custos menores do que uma antiética. A empresa ética não faz pagamentos irregulares ou imorais, como subornos, compensações indevidas e outros. Exatamente por não fazer este tipo de transação, ela consegue colocar em prática uma avaliação de desempenho de suas áreas operacionais com mais precisão e eficácia do que a empresa antiética. Uma empresa ética cultiva valores, define suas estratégias de acordo com princípios, possui responsabilidade social baseado em juízos estritamente racionais, enquanto a empresa antiética não se pauta por valores e nem possui responsabilidade alguma. A empresa ética propõe valores, como a integridade, honestidade, transparência, qualidade do produto, eficiência do serviço, respeito ao consumidor, entre outros. Por outro lado, na empresa antiética, o comprador se envolve com o fornecedor e acaba favorecendo-o mesmo sem a intenção de fazê- lo. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 96 De acordo com Camargo (2006, p. 56), A legitimação de uma empresa, assim como a sua identidade na sociedade, só se constrói pela ética. A consciência tranquila e o caminho da virtude dão a merecida credibilidade e confiança a uma instituição. Quanto menos um funcionário de uma empresa internalizar esses valores, maior será o sinal de fraqueza dessa organização. Por outro lado, a internalização se da quando uma instituição estabelece os canais de comunicação numa perspectiva de realização pessoal. O sujeito passa a ser ator e não receptor passivo das ordenações. Diante do exposto, percebemos que uma empresa ética possui a necessidade de criar uma “autoidentidade”, estabelecendo uma interiorização de valores, crenças e interesses, ou seja, promover a ideia de pertencimento, uma “identidade espiritual” que se consolida tanto externa como internamente. Portanto, a identidade da empresa ética está baseada em três princípios fundamentais: internalizar; exteriorizar; objetivar. Estes princípios são passíveis de análise crítica, pois são eles que distinguirão a ética do lucro ou a ética construída no dia-a-dia, a partir do envolvimento daqueles que compõem a empresa. Obviamente, diz Camargo (2006), uma empresa que prima por bons princípios éticos procura, no funcionário, um “ser crítico”. A consciência crítica é fundamental para a construção da ética e, se viver em sociedade constitui um preceito para a condição humana, a empresa é uma das instituições mais relevantes para fornecer credibilidade e moral à constituição de uma ética fundamentada. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 97 Por isso, neste contexto, a consciência crítica tem a função de desmascarar as falsas intenções, pois o indivíduo não pode ser visto somente como “fazedor de coisas” e objeto daquilo que faz, mas como sujeito de suas ações, ou seja, deve saber por que, como e para que realiza suas ações ou atividades. Também, a consciência crítica ajuda a estabelecer a diferença entre o discurso e a práxis, na medida em que a desconexão entre teoria e prática é compreendida como algo danoso para o estabelecimento do “agir ético” na empresa (CAMARGO, 2006, p. 34). Em outras palavras, compreender quando uma empresa prega as “boas intenções” (a teoria), mas que sua ação pode ser carregada do “ranço autoritário” (prática), por exemplo. Assim, viver socialmente na empresa não pode constituir-se em um fardo, mas uma “condição existencial ética” que personifique uma nova “estrutura do ser” integrado e preocupado com o outro e as diferenças. Com efeito, para que isso ocorra, torna- se fundamental que os empregados participem das decisões, propiciando um ambiente de união e cooperação em que exista cumplicidade entre as partes, de modo que todos saiam ganhando neste processo. Isso somente pode ser obtido se a empresa souber trabalhar e identificar as diferenças, respeitando-as e compreendendo-as. Assim, o desafio a ser alcançado, em termos éticos pela empresa, é perceber-se como parte de uma equipe na qual, se um indivíduo ganha ou perde, todos ganham ou perdem. Daí a importância da empresa ver a pessoa não como uma peça de engrenagem, mas como motor de uma estrutura organizacional. Cabe ressaltar que uma empresa ninguém está isolado, em decorrência disso, estabelece-se uma rede de confiabilidade e solidariedade em vista a tecer um bom entrosamento e proporcionar a construção de uma convivência humana, de forma ética e sólida. Este entrosamento possibilita a construção de amizades e afetividades, numa perspectiva que se aproxima perfeitamente da harmonia e da cooperação. Práxis: na filosofia marxista, a palavra grega práxis é usada para designar uma relação dialética entre o homem e a natureza, na qual o homem, ao transformar a natureza com seu trabalho, transforma a si mesmo. A filosofia da práxis se caracteriza por considerar como problemas centrais para o homem os problemas práticos de sua existência concreta: "Toda vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que dirigem a teoria para o misticismo encontram sua solução na práxis humana e na compreensão dessa práxis" (Marx, Oitava tese sobre Feuerbach). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 98 IMPORTANTE: Nesta perspectiva, cabe salientar que ética distinguem-se em dois grandes planos de ação que são propostos como desafios às empresas: de um lado, em termos de projeção de seus valores para o exterior (exteriorização), fala-se em “empresa cidadã”, no sentido de respeito ao meio ambiente, incentivo ao trabalho voluntário, realização de algum benefício para a comunidade, responsabilidade social, sustentabilidade, etc. Por outro lado, sob a perspectivade seu público mais próximo, tais como: executivos, acionistas, empregados, colaboradores, fornecedores, percebe-se esforços para a criação de um sistema que assegure um modo ético de operar, sempre respeitando os princípios gerais da empresa e os princípios do direito, da justiça e da moral. Enfim, na atualidade a empresa que quiser ser competitiva e obter sucesso tanto no mercado nacional como no mundial, terá de manter impreterivelmente uma sólida reputação no que diz respeito a seu comportamento ético-moral. Para tanto, é necessário que a empresa tenha bem definida a sua missão, a sua filosofia de atuação e a sua visão empresarial. Você deve estar se perguntando: o que significam estes termos? A “filosofia de uma empresa” consiste em um conjunto de princípios, diretrizes e atitudes que auxiliam a programar metas, planos e regras para todos os seus empregados. Por outro lado, a “visão” de uma empresa está diretamente relacionada à ideia de futuro. A “visão” de uma empresa é a visão que ela possui do seu futuro e do futuro da sociedade. Por fim, a “missão de uma empresa” esta relacionada à ideia de encargo ou incumbência, ou mesmo, dever a cumprir e compromisso. Nestes termos, a “missão da empresa” indica e afirma a forma pela qual ela faz e age em seus negócios. Com efeito, esta noção de missão poderia ser ampliada, contemplando-se também a história, as intenções atuais, os fatores de ambientes, etc. Neste sentido, a missão tem o objetivo de orientar e delimitar a ação da empresa, definindo o que ela se propõe a fazer e a forma como atua. Na verdade, é a missão quem exprime a razão de existência da empresa. A seguir, apresentaremos a você alguns exemplos de como certas grandes empresas definem suas respectivas missões: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 99 Sony: “Experimentar a alegria de fazer avançar a tecnologia e aplicá-la em benefício das pessoas”. Cobra: “Contribuir para a informatização da sociedade, mediante o domínio e a difusão da tecnologia, ofertando soluções para a realidade brasileira”. 3M: “Resolver problemas ainda pendentes de maneira inovadora”. Medtronics: “Ajudar as pessoas a voltarem a viver plenamente”. Mary Kay Cosmetics: “Dar às mulheres oportunidades ilimitadas”. Merck: “Preservar e melhorar a vida humana”. Wal-Mart: “Dar às pessoas comuns a chance de comprar as mesmas coisas que as pessoas ricas”. Walt Disney: “Fazer as pessoas felizes”. Depois dessa breve exposição sobre a visão, missão e filosofia da empresa ética e os seus pressupostos fundamentais, a seguir discutiremos de forma específica e contextualizada alguns elementos da ética nos negócios. Então, vamos lá? A ética nos negócios ou negociando com ética: lucro x princípios morais Em sua obra A ética protestante e o espírito do capitalismo (1905), Max Weber reproduz as teses fundamentais apresentadas por Benjamin Franklin que permeiam o “espírito” ou a essência do capitalismo. Com base nestas teses, Weber faz uma investigação minuciosa a respeito da ética capitalista baseada estritamente no “utilitarismo”. Max Weber foi um dos principais responsáveis pela formação do pensamento social contemporâneo, sobretudo do ponto de vista metodológico, quanto à constituição de uma epistemologia das ciências sociais que, segundo sua visão, deve ter um modelo de explicação próprio diferente do das ciências naturais. É de grande importância sua distinção entre a razão instrumental e a razão valorativa, sendo que os juízos de valor não podem ter sua origem nos dados empíricos. Em sua análise da formação da sociedade contemporânea, Weber investigou os traços fundamentais do Estado moderno, da sociedade industrial que o caracteriza e da burocracia que tem nele um papel central. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 100 Segundo Weber (1967, p. 32-35): O homem é dominado pela produção de dinheiro, pela aquisição encarada como finalidade última da sua vida. A aquisição econômica não mais está subordinada ao homem como meio de satisfazer as suas necessidades materiais. Esta inversão do que poderíamos chamar de relação natural, tão irracional de um ponto de vista ingênuo, é evidentemente um princípio orientador do capitalismo, tão seguramente quanto ela é estranha a todos os povos fora da influência capitalista. Um estado mental como o expresso nas passagens de Franklin e que receberam o aplauso de todo um povo, teria sido proscrito como o mais baixo tipo de avareza e como uma atitude inteiramente desprovida de autorrespeito, tanto na Antiguidade como na Idade Média. Percebe-se que Weber destaca a condição última do capitalismo à qual vai se sujeitar toda a cadeia de “valores éticos” e comportamentais da sociedade, a saber: a utilidade. Em uma sociedade regida por este pressuposto, só tem valor o que pode ser considerado útil. Este conceito de utilidade está intrinsecamente relacionado no capitalismo à ideia de lucro, aumento de capital e de patrimônio. Sendo assim, o que é útil é o que produz algum tipo de ganho econômico. Daí, as pessoas serem levadas a uma busca incessante pelo “ter”, pelo “acumular”, numa corrida desenfreada em que os fins sempre justificarão os meios. É um verdadeiro “vale-tudo”, em que ficam para trás valores como honestidade, lealdade, solidariedade e outros, a menos que estes se subordinem à ideia do “útil”, quando, então, deixarão de ser legítimos. Essa situação remete-nos à principal reflexão Srour sobre a ética nos negócios, na medida em que, para este, nos momentos de decisão e condução de um negócio, o agente deve saber o que é certo fazer em relação ao lucro ou a utilidade. Todavia, o limiar desta transição pode modificar-se, fazendo com que o agente (o empresário) deixe de tomar a decisão certa, justificando-se mediante as possíveis vantagens que vislumbrou diante do desconhecimento do outro e, a partir daí, “fazendo deslizar na incerteza moral às vezes peculiar do comportamento humano” (Cf. SROUR, 2000). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 101 Para Srour (2000, p. 274), existem três inferências que nos ajudam a entender uma situação como esta: as pessoas não são legítimas, isto é, totalmente boas ou totalmente más; não basta enunciar normas morais e pautas de decência para que os agentes ajam com probidade; controles permanentes e sanções intimidadoras são indispensáveis para que as normas morais prosperem. A moral e a ética estão de certa forma entrelaçadas no mundo dos negócios, porque, por um lado, não se ganha dinheiro sem ser pragmático e, noutro sentido, não se é pragmático sem se preocupar em refletir eticamente sobre as ações que se deve tomar. O autor mostra sua visão sobre este paradigma dos negócios: Ora, pode-se contra-argumentar dizendo que toda a organização – e, sobretudo toda empresa capitalista – opera em um ambiente hostil em que os stakeholders defendem interesses próprios. Uma vez que as contrapartes são vulneráveis a produtos, ações e mensagens, as decisões organizacionais não podem ser neutras. Quem decide faz escolhas entre diferentes cursos de ação e deflagra consequências. Aí entra a reflexão ética. Ela antecipa o que poderia ser danoso aos negócios e responde a algumas indagações tais como: o que afeta o meio ambiente? Quais os efeitos colaterais os produtos geram nos consumidores? Como as políticas corporativas atingem empregados e clientes? Quem se beneficia e quem sai prejudicado? (Srour, 2000, p. 291) A razão de ser desta “reflexão ética” mencionada pelo autor mostra-nos que as empresas possuem tendências a não operarem mais com tomadas de decisões em curto prazo e sem preocupação em agir de forma ética, principalmente, aquelas que podem expor ao risco a sua imagem publicamente. Cada vez mais as ações e decisões das empresas, consideradas com responsabilidade social, são submetidasao crivo do cidadão disposto a retaliar as empresas que negligenciem a confiança e credibilidade dos seus parceiros e sociedade. Pragmático: relacionado à doutrina filosófica que adota como critério da verdade a utilidade prática. Paradigma: modelo padrão. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 102 Ainda se pode afirmar que as decisões das empresas não são em totalidade imorais e morais em sentido forte do termo, pois suas atividades não estão acima do bem e do mal. Se desta forma fossem, as operações econômicas ilícitas seriam legitimadas dentro da normalidade do mercado e os efeitos colaterais gerados de seus produtos seriam desconsiderados e sem repercussão da responsabilidade caso atingisse de forma maléfica o meio ambiente ou o ser humano. Podemos perceber que a reflexão acima a despeito da imagem das organizações é de extrema responsabilidade e aponta a importância de resguardar e zelar por ela, pois a imagem representa a sustentação e continuidade dos negócios e, além disso, é o patrimônio essencial para o reconhecimento no mercado. E dentro desta análise, Srour (2000, p. 292) confirma que: A imagem da empresa não pode ser vilipendiada impunemente, nem pode ser reduzida à mera moeda publicitária, porque ela representa um ativo econômico sensível a credibilidade que inspira. Então, afirmar sem mais nem menos que as empresa simulam serem morais apenas para manterem as aparências ou para não sofrer penalidades legais, seria pressupor que elas estariam dispostas a quaisquer imoralidades para obter lucros. Pode-se ainda, dentro dessa reflexão do autor, aprofundar a análise e concluir que é extremamente difícil desvencilhar moral e interesses organizacionais e desvinculá-las também das pressões exercidas pela sociedade civil. Desta forma, o que importa é saber se as organizações têm um código de ética ou se suas ações são provenientes de uma “essência moral do seu estatuto” ou se os reflexos de suas tomadas de decisões são ou não legais e benéficas para os seus parceiros comerciais e a sociedade como um todo. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 103 Diante dos fatos, não podemos imaginar que todas as empresas agem de acordo com a ética em seus negócios. O meio capitalista é regido em um ambiente hostil e as organizações se movimentam mostrando suas forças e presença nos negócios e, se não fizer, certamente será dominada por outras ou mesmo padecer diante do mercado. Evidencia-se, com isso, o alto risco que uma empresa enfrenta quando orienta- se pela “maximização dos lucros”, sobretudo, pelas pressões que a sociedade e o “sistema capitalista social” exercem atuando como legítimos indicadores e controladores da gestão dos negócios de uma empresa. Por outro lado, quando uma empresa por si mesma encontra o equilíbrio entre o lucro, sobrevivência e a responsabilidade social, esta acaba formando a sua identidade ética que terá reflexos expressivos nos seus negócios e na sua “imagem corporativa”. Dentro dessa ótica reflexiva, Srour (2000, p. 294) afirma: (...) praticar uma moral da integridade não equivale sempre a bom negócio como prega a máxima e good ethics is good business, mas significa sabedoria preventiva no campo em que forças se enfrentam sem cessar. Reconhecer tal fato representa um passo decisivo para a saúde das empresas. Implica abandonar o velho registro da maximização do lucro em benefício do lucro com a responsabilidade social. Trocado em miúdos, as empresas não mais desempenham apenas uma função econômica, mas também uma função ética. Percebe-se que, dentro do ponto de vista do autor, as empresas que atuam efetivamente dentro do modelo capitalista, embora na sua maioria operem por códigos morais, estas só passam a se comportar conforme o código rege quando se colocam em risco a sua continuidade ou mesmo sua sobrevivência. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 104 O autor também se refere ao lucro sim, todavia com responsabilidade social. Nota-se que a responsabilidade social deve ser compreendida como orientação para a necessidade humana e do ecossistema e não deve ser confundida como produto de interesses empresariais, como simplesmente “jogos” comerciais. Sabe- se que tornar compatíveis lucros e respeito a parceiros, meio ambiente, empregados e clientes, é uma “equação bastante complicada”. No entanto, se esta compatibilização for aplicada com eficiência, terá efeitos benéficos na “imagem corporativa” de uma empresa desde que praticada na sua essência. Diante do exposto, percebe-se que inclusão ética no comportamento organizacional fornece lucro às empresas. Os padrões éticos são a base do comportamento dos funcionários e favorece a criação de uma cultura organizacional. As empresas precisam estar alertas e permanentemente criando condições e espaço para a ética sem perder o foco na sua produtividade e na agilidade das respostas para as necessidades que o mercado, a sociedade e o meio ambiente colocam-na comumente. Portanto, ser ético nos negócios significa: a necessidade de obedecer a regras relativas à ocupação territorial, costumes e expectativas da comunidade, princípios de moralidade, políticas da organização, atender à necessidade de todos por um tratamento adequado e justo; entender como os produtos e serviços de uma empresa e as organizações e as ações de seus membros podem afetar seus empregados, a comunidade e a sociedade como um todo de modo positivo e de modo negativo. Depois de tudo que você leu fica fácil compreender como as relações empresarias concretizam-se no sentido de propagar uma ética no mundo dos negócios, sintonizadas com as mudanças ocorridas na sociedade e de acordo com as exigências da competição que embala a discussão pela aprovação de “novos padrões comportamentais” para as empresas e seus administradores. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 105 Bem, até aqui apresentamos a você os pressupostos fundamentais da ética aplicada aos negócios. A partir de agora, iremos discutir as questões pertinentes ao código de ética. Você sabe o que é um código de ética? Quais são os seus atributos e funções? Não se desespere se não souber, apresentaremos a você estas questões de forma detalhada e bastante didática. Vamos lá! O código de ética profissional: funções e limites De uma forma geral, um código de ética profissional é um acordo explícito entre membros de um grupo social, isto é, de uma categoria profissional, de um partido político ou de uma associação civil. Por sua vez, o objetivo de um código de ética é explicitar como o “grupo social” — que o constitui — pensa e define sua própria identidade política e social. Por outro lado, como o “grupo social” — que o constitui — compromete-se a realizar, moralmente e eticamente, seus objetivos particulares. Podemos conceber ainda o código de ética profissional como um instrumento de realização dos princípios, visão e missão da empresa. Neste contexto, serve para orientar as ações de seus colaboradores e explicitar a postura social da empresa em face dos diferentes públicos com os quais interage. É da máxima importância que seu conteúdo seja refletido nas atitudes daqueles a que se dirige e encontre respaldo na alta administração da empresa, que tanto quanto o último empregado contratado tem a responsabilidade de vivenciá-lo na prática (Cf. TOFFLER, 1993). Segundo Arruda (2002), a elaboração de um código de ética profissional se dá a partir da definição da base de princípios e valores esperados dos funcionários de uma determinada organização ou empresa. Para se chegar a isso, o ideal é que se proceda a um relatório que irá agregar as práticas e políticas específicas da organização, o qual deverá ser discutido e criticado por todos os funcionários em todos os níveis. Este relatório, aprimorado pelas críticase sugestões, irá servir de suporte para a definição de “padrões de comportamento e responsabilidades” que nortearão a elaboração dos artigos constitutivos e definitivos do código de ética profissional. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 106 Entre estes podemos citar: antes de mais nada, a necessidade que a empresa possui como instituição, de responder à nobre função de ajudar ao desenvolvimento humano e profissional dos seus membros. Se os empresários e diretivos se esquecem desta função e não fazem o possível por incentivá-la, falha no mais nobre dos aspectos da sua profissão: o (auto) aperfeiçoamento dos membros da organização; toda empresa que no futuro objetiva ter bons profissionais não pode prescindir do desenvolvimento ético dos mesmos. Um profissional, tecnicamente bem preparado, pode ser perigoso se seu nível ético, por desconhecimento ou má fé, for reduzido ou limitado. o interesse no cumprimento do código de ética deve ser compreendido como um interesse geral e não de interesse particular. Ou seja, o exercício de uma “virtude obrigatória” somente torna-se exigível se for considerada como proveito de todos; todo código de ética deve possuir uma base ou uma orientação filosófica na sua estrutura. Esta estrutura terá sempre a orientação de estabelecer qual a forma de um profissional se conduzir no exercício da sua profissão de maneira a não prejudicar os seus semelhantes e garantir a qualidade do seu trabalho e dos outros. A autora destaca a importância de um código de ética profissional ser bem estruturado para a empresa ou organização. Segundo esta: “os códigos tornam claro o que a organização entende por conduta ética. Procuram especificar o comportamento esperado dos empregados e ajudam a definir marcos básicos de atuação” (ARRUDA, 2002, p. 5). Como exemplo disso, citaremos um estudo realizado por Rob Van Tulder e Ans Kolk, professores universitários na Holanda, onde analisaram os códigos de 17 empresas brasileiras. Este estudo evidenciou alguns pontos relevantes na conduta profissional dos empregados e as decisões éticas apresentadas pelos empregadores. A pesquisadora Arruda (2002) apresenta no seu livro Código de Ética: Um instrumento que adiciona valor os tópicos que mais predominaram nestes códigos, que podem ser considerados como elementos necessários a qualquer formulação correta de um código de ética profissional: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 107 Analisando as 17 organizações brasileiras, parece predominar a preocupação com a Ética como comportamento correto com as pessoas, manutenção dos valores éticos fundamentais e o esforço por abolir práticas como o suborno e as facilidades de pagamentos. Quase com o mesmo nível de consciência, os códigos parecem indicar a obediência às leis, especialmente no tocante à sociedade e às relações de trabalho. A seguir, fica patente também o respeito aos interesses do consumidor, voltado para a atenção à necessidade de consumo, a revelação de informação e a prática respeitosa de marketing. Na mesma linha, boa parte das organizações registra os interesses comunitários como de importância, a ponto de consubstanciá-los no seu Código de Ética (ARRUDA, 2002, p. 24-26). Pode-se verificar, com isso, que a preocupação com os aspectos éticos fundamentais é premente em todas as empresas integrantes do universo pesquisado, assim como o compromisso com o cumprimento das leis e a necessidade de um bom relacionamento com os consumidores, fornecedores e até com os concorrentes. Além disso, fica patente, na pesquisa, que as empresas têm participado mais ativamente na discussão e resolução dos problemas da comunidade em que estão inseridas, o que representa um avanço de relevada importância e magnitude. De acordo com Sá (2001, p. 119): As peculiaridades em um código de ética de conduta profissional dependem de diversos fatores, todos ligados à forma como a profissão se desempenha, ao nível de conhecimentos que exige, ao ambiente em que é executada etc. Isto significa que não pode existir um padrão universal que seja aplicado com eficácia a todos os casos, embora as linhas mestras sejam comuns, pois comuns são as principais virtudes de todas as profissões exigíveis. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 108 Por conta disso, o conteúdo do código de ética deve ser necessariamente formado de um conjunto de políticas e práticas específicas, abrangendo os campos mais vulneráveis das ações profissionais. Tal material é reunido em um relatório de fácil compreensão para que possa circular adequadamente entre todos os interessados. Uma vez aprimorado com sugestões e críticas de todos os envolvidos o relatório dará origem a um documento que servirá de parâmetro para determinados comportamentos, deixando visíveis as responsabilidades fundamentais. Entre os inúmeros tópicos abordados no código de ética profissional, predominam alguns como respeito às leis do país, conflitos de interesse, proteção do patrimônio da instituição, transparência nas comunicações internas e com os stakeholders da organização, denúncia, prática de suborno e corrupção em geral. Por outro lado, abordam-se as relações com os funcionários, desde o processo de contratação, desenvolvimento profissional, lealdade entre os funcionários, respeito entre chefes e subordinados, saúde e segurança, comportamento da empresa nas demissões, entretenimento e viagem, propriedade da informação, assédio profissional e sexual, alcoolismo, uso de drogas, entre outros. Dentre os problemas éticos de maior conhecimento público, estão aqueles referentes às relações com os consumidores, e aqueles sujeitos aos enquadramentos da lei de defesa do consumidor, incluindo as práticas de marketing, propaganda e comunicação, qualidade do atendimento e reparações de danos. Quanto à “cadeia produtiva”, envolvendo fornecedores e empresas terceirizadas, o código de ética pode estabelecer condutas de responsabilidade social, respeito à legislação, eventual conduta restritiva, bem como estimular a melhoria dos parceiros visando a um crescimento profissional e mercadológico conjunto. O código de ética profissional pode também fazer referência à participação da empresa na comunidade, fornecendo diretrizes sobre as relações com os sindicatos, órgãos da esfera pública, relações com o governo, entre outros (Cf. SÁ, 2001). Stakeholders: o termo “stakeholders” designa todos os segmentos que influenciam ou são influenciados pelas ações de uma organização, fugindo do entendimento de que o público alvo de uma organização é o consumidor. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 109 Cabe lembrar que a implementação do código de ética profissional envolve o trabalho de comunicar a sua necessidade e o seu valor a todos na empresa, com o objetivo de garantir a sua efetivação e aprovação. Sem o apoio dos funcionários e diretores da empresa, o código de ética não surtirá efeito nenhum no cotidiano da empresa. Neste caso, o segredo do sucesso do código de ética está na sua comunicação e na sua divulgação. A implementação do código de ética profissional exige, portanto: divulgação do código a todos na empresa em uma forma clara e concisa; divulgação a todos na empresa do apoio incondicional da direção e da gerencia da empresa; divulgação a todos na empresa da maneira pela qual cada um deve aplicar o código de ética; divulgar e disponibilizar ao público externo, tais como fornecedores e clientes o código de ética da empresa. Diante dessas considerações, não se esqueça: IMPORTANTE O código de ética profissional deve ser entendido como uma relação das práticas de comportamento que se espera ser observada no exercício da profissão. As normas do código de ética visam ao bem-estar da sociedade, de forma a assegurar a lisura de procedimentos de seusmembros dentro e fora da instituição. Um dos objetivos de um código de ética profissional é a formação de consciência profissional sobre os padrões de conduta. Um código de ética profissional deve asserções sobre princípios éticos gerais e regras particulares sobre problemas específicos que surgem na prática da profissão. O objetivo primordial do código de ética profissional é expressar e encorajar no sentido da justiça e decência em cada membro do grupo organizado, deve indicar um novo padrão de conduta interpessoal na vida de cada profissional que esteja exercendo qualquer cargo na organização. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 110 Enfim, do ponto de vista da empresa, a função principal do código de ética consiste em proporcionar critérios de atuação para resolver conflitos de interesses e, de preferência, resolvê-los antes ou no momento em que eles surjam. Não é interessante esta discussão sobre o código de ética profissional? Toda empresa séria e comprometida com a ética possui o seu “código”. Você já consultou o código de ética da sua empresa ou da sua profissão? Se não consultou ainda, consulte-o, pois lá estão as diretrizes principais da sua empresa. SUGESTÃO DE FILME Pegue seu caderno de anotações, sente-se e assista ao filme Fora de controle (2002) de Roger Michell. Ele contextualizará melhor ainda o conteúdo que você acabou de estudar. LEITURA COMPLEMENTAR Visando enriquecer seu processo de aprendizagem procure efetuar a leitura complementar dos seguintes textos: ARRUDA, M.C.C. Código de Ética: Um instrumento que adiciona valor. 1ª. ed. São Paulo: Negócio, 2002. 390p. CAMARGO, M. Fundamentos de ética geral e profissional. 3ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. 118p. DISKIN, L.; MARTINELLI, M.; MIGLIORI, R.F.; SANTO, R.C.E. Ética, Valores humanos e Transformação. 1ª. ed. São Paulo: Fundação Petrópolis, 1998. 200p. JACOMINO, D. Você é um profissional ético? Revista Você. São Paulo, n.25, p.28-39, jul.2000. MOREIRA, J. M. A Ética empresarial no Brasil. São Paulo: Pioneira, 2002. 389p. NASH, L. Ética nas empresas: boas intenções à parte. São Paulo: Makron Books, 2001. 359p. SROUR, H.S. Ética Empresarial. 8ª. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000. 389p. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 111 VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. 304p. SÁ, A. L. de. Ética profissional. 4 ª edição: São Paulo: Ed. Atlas, 2001. 296p. TOFFLER, B. L. Ética no trabalho. São Paulo: Makron Books, 1993. 125p. Aproveite e visite os sites abaixo. Todos eles foram amplamente consultados em nossa pesquisa. Bom proveito! Disponível em <http://www.eticaempresarial.com.br>. Acesso em 28 maio 08. Disponível em <http://www.ethos.org.br>. Acesso em 28 maio 08. É HORA DE SE AVALIAR! Lembre-se de realizar as atividades propostas no caderno de exercícios! Elas são fundamentais para ajudá-lo a fixar o conteúdo teórico trabalhado, a sistematizar as ideias e os conceitos apresentados, além de proporcionar a sua autonomia no processo ensino-aprendizagem. Caso prefira, redija suas respostas no caderno de exercícios e depois as envie através do nosso ambiente virtual de aprendizagem (AVA). Procure interagir permanentemente conosco e utilize todos os recursos didáticos e pedagógicos disponibilizados com o objetivo de aprimorar a sua formação acadêmica. Nesta unidade, você estudou a aplicação prática dos fundamentos da ética. Ressaltaremos a aplicação da ética no plano das empresas e dos negócios. Para tanto, seguimos um percurso que se iniciou com a discussão sobre os pressupostos teóricos da ética empresarial e seus fundamentos, em seguida, vimos os aspectos éticos presentes nas relações comerciais ou nos negócios. Por fim, discutimos o código de ética e seus principais fundamentos. Na próxima unidade, apresentaremos a você os pressupostos da ética profissional. Para tanto, discutiremos os valores sociais predominantes nas profissões em geral, em seguida, abordaremos a questão da ambiência e relações pessoais, ou seja, o desempenho ético-profissional. Por fim, discutiremos os princípios fundamentais das decisões morais racionais. Bons estudos! Te espero na próxima unidade! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 112 Exercícios - unidade 3 1ª QUESTÃO: Assinale a letra correspondente à alternativa que preenche CORRETAMENTE as lacunas do texto a seguir: “A tarefa principal da ética empresarial consiste em elucidar o sentido e o fim da _________ e propor orientações e _______ para alcançá-los. Com efeito, as decisões concretas ficam nas mãos dos sujeitos que são responsáveis por elas e, portanto não “podem tomá-las sem considerar o fim que se persegue, os valores éticos orientadores, a _______ socialmente alcançada e os contextos e consequências de cada decisão” (TOFFLER, 1993, p. 34). a) atividade empresarial - valores éticos específicos - consciência ética. b) atividade sub empresarial - valores éticos específicos - consciência mítica. c) atividade lúdica - valores éticos específicos - consciência normal. d) atividade forte - valores éticos específicos - consciência ética. e) atividade extracurricular - valores éticos específicos - consciência mítica. 2ª QUESTÃO: Todo empresário utiliza os três fatores técnicos em relação à sua produção. Qual das alternativas abaixo apresenta estes fatores corretamente? a) A natureza, o capital e o trabalho. b) A guerra, a falência e o trabalho. c) A força, a expectativa e o comércio. d) A natureza, a falência e o capital. e) A falência, o capital e o sacrifício. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 113 3ª QUESTÃO: Segundo o conteúdo da disciplina, qual das alternativas abaixo diz respeito ao objetivo principal da empresa? a) A falência. b) A guerra. c) O lucro. d) O sacrifício. e) A glória. 4ª QUESTÃO: Assinale a alternativa que confere CORRETAMENTE o objetivo proposto pela ética empresarial. a) A ética empresarial objetiva avaliar ou investigar as consequências psicológicas do comportamento de uma empresa. b) A ética empresarial objetiva destruir e investigar as consequências do comportamento de uma empresa. c) A ética empresarial objetiva avaliar ou investigar as consequências do comportamento de uma empresa, isto é, de uma “unidade econômica” quando a sua ação está ou não em conformidade com os princípios morais e as regras do bem proceder aceitas pela coletividade no qual está inserida. d) A ética empresarial objetiva avaliar ou investigar as consequências neurológicas do comportamento de uma empresa. e) A ética empresarial objetiva avaliar ou investigar as consequências cientificas e sociológicas do comportamento de uma empresa. 5ª QUESTÃO: Em 1977, o congresso norte-americano aprovou uma lei relativa à ética empresarial, que chamou a atenção do mundo. Qual é esta lei? a) Pratical Ethics. b) The Power of Ethical Management . c) Foreign Corrupt Practices Act (FCPA). d) Wall Street Law. e) Securities and Exchange Commission (SEC). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 114 6ª QUESTÃO: Assinale a letra correspondente à alternativa que preenche CORRETAMENTE as lacunas do texto a seguir: “O _________ é regido em um ambiente hostil e as organizações se movimentam mostrando suas forças e presença nos negócios e, se não fizer, certamente será dominada por outras ou mesmo padecer diante do _______”. a) meio socialista - mercado b) meio comunista - mercado c) meio capitalista - mercado d) meio anarquista - mercado e) meio sindicalista - mercado 7ª QUESTÃO: Ser ético nos negócios significa: a) fraudar documentos e investir em práticas ilícitas. b) ser desleal. c) omitir informações relevantes nos negócios. d) obedecer a regras implícitas e desleais a favor da concorrência. e) obedecer a regras relativasà ocupação territorial, costumes e expectativas da comunidade, princípios de moralidade, políticas da organização, atender à necessidade de todos por um tratamento adequado e justo. 8ª QUESTÃO: O conteúdo do código de ética deve ser necessariamente formado de um conjunto de políticas e práticas específicas, abrangendo os campos mais vulneráveis das ações profissionais. Diante disso, podemos afirmar: a) este conjunto de políticas e práticas específicas é reunido em um relatório de difícil compreensão para que possa circular adequadamente entre todos os interessados. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 115 b) este conjunto de políticas e práticas específicas é reunido em um relatório de fácil compreensão para que possa circular adequadamente entre alguns membros interessados. c) este conjunto de políticas e práticas específicas é reunido em um relatório de fácil compreensão para que possa circular adequadamente entre alguns membros desinteressados. d) este conjunto de políticas e práticas específicas é reunido em um relatório de difícil leitura para que possa circular adequadamente fora do circulo empresarial. e) este conjunto de políticas e práticas específicas é reunido em um relatório de fácil compreensão para que possa circular adequadamente entre todos os interessados. 9ª QUESTÃO: O que é um código de ética? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 10ª QUESTÃO: Qual é o objetivo primordial do código de ética? __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 116 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 117 Ética profissional e responsabilidade social Ética profissional: os valores sociais da profissão. O desempenho ético-profissional: ambiência e relações pessoais. Ética e responsabilidade social nos negócios. Decisões morais racionais. 4 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 118 Caro aluno, bem-vindo à nossa quarta unidade de estudo. Na unidade anterior, discutirmos a aplicação efetiva dos fundamentos da ética. Ressaltamos a prática da ética no plano das empresas e dos negócios e os princípios norteadores do código de ética profissional. Nesta última unidade de estudo, apresentaremos a você os pressupostos da ética profissional. Para tanto, discutiremos os valores sociais predominantes nas profissões em geral, em seguida, abordaremos a questão da ambiência e relações pessoais, ou seja, o desempenho ético- profissional. Por fim, discutiremos os princípios fundamentais das decisões morais racionais. Bom estudo! Objetivos da unidade Apresentar a problemática relativa à distinção aos valores sociais da profissão. Discutir a essência da ética profissional. Expor os conceitos de ambiência e relações pessoais no campo ético- profissional. Mostrar os conceitos capitais da ética e da responsabilidade social nos negócios. Abordar os princípios norteadores das decisões morais racionais. Plano da unidade Ética profissional: os valores sociais da profissão. O desempenho ético-profissional: ambiência e relações pessoais. Ética e responsabilidade social nos negócios. Decisões morais racionais. Bons estudos! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 119 Ética profissional: os valores sociais da profissão Você tem ideia do que significa ética profissional? Bem, antes de discutirmos o que é efetivamente ética profissional começaremos definindo o que é uma ‘profissão’ e o seu significado intrínseco. Vamos lá! O termo ‘profissão’ origina-se do latim professione, mais especificamente do substantivo professio, que teve diversas acepções ao longo dos tempos. O conceito de profissão, na época atual, diz respeito ao trabalho que se pratica com habilidade a serviço de terceiros, isto é, “uma prática constante de um ofício” (Cf. SÁ, 2001). Toda profissão possui, além de sua utilidade para o indivíduo, uma expressão moral e social. De fato, se acompanharmos a vida de um profissional, desde a sua formação escolar, percebemos, claramente, o quanto ele produz e recebe de utilidade da sua profissão. Citemos alguns exemplos: é pela profissão que o indivíduo se destaca e se realiza plenamente, provando a sua capacidade, habilidade e inteligência comprovando a sua personalidade em relação aos obstáculos encontrados; mediante o exercício profissional, todos conseguem elevar o seu nível moral e ético; pela profissão que todo indivíduo pode ser útil a sua comunidade e nela elevar-se e destacar-se na prática pelos seus valores e reconhecimentos. De acordo com Sá (2001, p. 34), “como a prática habitual de um trabalho, a profissão oferece uma relação entre necessidade e utilidade. Esta relação exige uma conduta específica para o desempenho eficaz das atividades exercidas pelo profissional”. Com efeito, todas as capacidades necessárias ou exigíveis para o bom desempenho de qualquer profissão devem passar essencialmente pelos deveres éticos. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 120 Sendo o propósito do exercício profissional a prestação de uma utilidade a terceiros, todas as qualidades pertinentes à satisfação das necessidades passam a ser uma obrigação perante o desempenho do profissional. Neste sentido, é fato que um complexo de deveres envolve a vida profissional sob as formas de conduta a ser seguida para a execução de uma atividade ou trabalho. Nas empresas, os indivíduos conscientes desse esforço ético têm maior probabilidade de tomar decisões corretas, sendo certo que ao tomá-las, estarão crescendo na virtude almejada. Decorre daí ser a ética uma ciência também prática, e as virtudes, o resultado de ações repetidas no intuito de solucionar certos dilemas. Cabe notar que os deveres mencionados impõem-se e passam a governar as ações dos indivíduos perante seus clientes, seu grupo, seus colegas, o Estado e sua própria conformação ética e espiritual. Diante disso, fica fácil entender como os deveres profissionais aliam-se ao conceito de dignidade e respeito à pessoa em sua conduta profissional. Você deve estar se perguntando: como assim? O que uma coisa tem a ver com outra? Ora, a conduta do profissional aliada aos deveres básicos de todo profissional expõe uma relação intrínseca entre valores sociais e a profissão. Ou seja, esta relação indica uma correspondência entre a sociedade e os valores profissionais. Uma das estratégias oferecidas para realçar esta relação está em abordar tal assunto sob o prisma da “dignidade da pessoa”. Para tanto, faz-se necessário explorar o que se entende por ‘pessoa’, ‘dignidade’ e ‘respeito’. O que é uma ‘pessoa’ do ponto de vista filosófico? O termo latino persona possui, entre outros, o mesmo sentido da voz grega prósopon, que significa máscara. Trata-se da máscara que cobria o rosto de um ator, enquanto atuava nas tragédias. Neste sentido, pessoa designa o personagem, e os personagens de uma peça teatro são designados de dramatis personae. Deve ao filósofo Boécio (480-524), o emprego, pela primeira vez, do termo pessoa fora dos sentidos restritos que lhe eram fornecidos pelo teatro. Inspirando- se no teatro, onde os atores usavam máscaras para representarfiguras importantes da vida social e política, Boécio usou o termo pessoa para referir-se a todo ser humano. Para este, o ser humano é a pessoa por causa de sua importância e de sua autonomia. Autonomia e dignidade são, portanto, a característica fundamental da pessoa humana. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 121 Assim, respeitar o outro como alteridade significa entendê-lo como pessoa, como diverso e, portanto, reconhecê-lo como autônomo ou livre. Por outro lado, há uma correspondência mútua entre reconhecer a alteridade do outro e ter sua alteridade reconhecida. Respeitar o outro como centro de dignidade consiste na difícil tarefa de tratá-lo, efetivamente, como pessoa e não como uma coisa. Tratar alguém como pessoa e não como coisa significa percebê-la e tratá-la como um valor próprio, que não pode ser avaliado segundo princípios de ordem material ou econômica. Pois, a pessoa e os seus bens relevam- se de várias formas para a organização da comunidade. Na sua dimensão pessoal e irredutível, como ser que se assiste a si próprio, a pessoa é essencialmente liberdade, ou atividade livre, um valor, ou uma fonte de valores, que não se deixa objetivar ou substanciar para além do seu próprio corpo e atitude moral. A esta dimensão mais íntima corresponde, no plano profissional, à afirmação da dignidade da “pessoa humana”, além de outros valores pessoais. Dignidade da pessoa é a de todo o ser humano individual e concreto, não a de uma humanidade universal e abstrata ou do homem como parcela de qualquer agrupamento social. De igual modo, a dignidade refere-se ao reconhecimento do valor intrínseco e soberano da pessoa perante quaisquer condições externas, valor que se impõe por igual a todos os membros da sociedade e vai muito para além da dignidade ligada à honra, ao prestígio profissional ou ao mérito social de qualquer cidadão em particular. Cada pessoa, só pelo fato de o ser, é merecedora do máximo respeito e proteção sociais, sobretudo em contextos que tornam evidente a fragilidade da condição humana. Este valor postula a existência de garantias que assegurem uma respectiva proteção, seja no plano subjetivo, como bem ou conjunto de bens jurídicos atribuídos e titulados pelas pessoas individualmente consideradas; seja no plano objetivo, como algo a integrar nos bens comuns da coletividade e a proteger, preventiva ou sucessivamente, sempre que for questionada ou posta em perigo a dignidade da “pessoa humana”. Alteridade: relativo ao outro. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 122 IMPORTANTE: Portanto, a ética profissional deve estar em sintonia com os pressupostos que incidem na “pessoa humana” e a sua dignidade. Respeitar a “pessoa humana” implica também combater toda a prática que a diminua. A “pessoa humana”, em sua totalidade, é muito mais que um simples corpo ou uma simples “máquina”, que pretende ter suas peças trocadas ou desmontadas. A pessoa é, sobretudo, uma interseção de valores e de relações. Ela é um fim em si mesmo, um centro de autonomia e complexidade que lhe torna única, indivisível e não-intercambiável. Por essas razões, a pessoa possui dignidade e respeito. Bem, compreendeu como é relevante a valorização da pessoa. Agora, veremos como este conceito de pessoa relaciona-se diretamente à questão das relações pessoais no ambiente profissional. Trata-se de apresentarmos a você o problema da ambiência e das relações pessoais no âmbito empresarial. Vamos lá? O desempenho ético-profissional: ambiência e relações pessoais É inegável que há ambientes distintos onde as condutas humanas se processam no trabalho. Todo profissional convive com diversas e específicas formas de relacionamento conforme a ambiência onde realiza suas tarefas. Diversas são as condições ambientais sob as quais se pode observar a atuação do profissional em seus respectivos espaços e relações de trabalho. Basicamente, podemos citar: empregado particular ou público; participante de uma empresa multinacional ou nacional; sócio de uma empresa consorciada ou associada; autônomo individual ou coletivo. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 123 Cada um desses desempenhos processa-se em um ambiente próprio, com relações definidas, exigindo condutas também definidas. Como afirmamos anteriormente, o modo de atuação da personalidade do profissional varia conforme os ambientes, neste caso, a tendência é de que quanto mais impessoal tornar-se o ambiente profissional tanto menos ética é possível que venha a ser a conduta, se um sistema rígido de práticas de normas não obrigar efetivamente à prática virtuosa do profissional. Certamente, quanto mais a “pessoa humana” venha a perder o seu grau de importância numa empresa, tanto menos ética poderá ser a sua atuação, pois enfraquecer a condição de uma pessoa autônoma e portadora de vontade, menos esta assume um compromisso real com a sua atividade profissional. Contudo, não se pode negar que os conflitos de consciência entre as práticas éticas e virtuosas e as que devem seguir a determinações e imperativos de natureza superior possam contribuir para certas turbulências profissionais. Também, não se pode omitir que a variedade de condutas exigíveis em relação a alguns aspectos de comportamento na empresa é o que atende realmente aos interesses particulares de um profissional. Em nenhuma dessas posições exemplificadas, é possível alterar a condição real de trabalho de um bom profissional. Na atualidade, as grandes mudanças que o avanço tecnológico, as comunicações, a globalização e outros fenômenos vêm acarretando com certeza têm impacto negativo, numa perspectiva ética, sobre o trabalho, a economia e as empresas. Como parte integrante desse processo, os indivíduos não estão à margem do turbilhão de ideias, conceitos e movimentos novos que aparecem com intensidade a sua volta. Seu interesse pela informação, por conhecer e saber é o mais válido possível, ou melhor, é algo imprescindível. Ora, as considerações propostas acima nos conduzem diretamente ao âmago do processo de “sociabilidade na empresa”. Em que consiste a sociabilidade? A complexidade do mundo contemporâneo se apresenta como o fato da não existência de consenso, já que a vida é posição plural de pretensões de relações e de satisfações (Cf. SÁ, 2001). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 124 IMPORTANTE: Cada forma de vida possui uma pretensão de sociabilidade, ou seja, uma pretensão de como se relacionar com outras formas e uma pretensão de satisfação. Com efeito, a satisfação pessoal só se dá a partir de um sistema de regras e de valores proveniente de uma determinada comunidade. Cada forma de vida se pauta nas pretensões de satisfação de uma instituição, além de exprimir uma forma de sociabilidade própria. A sociabilidade é a coexistência de formas de vida que se pautam nas mesmas regras e normas sociais. Coexistir é estar junto. Dessa forma, sociabilidade significa uma maneira ou uma forma de organizar relações, sejam sociais, sejam no âmbito do trabalho. Portanto, as empresas que se pautam pela ética devem levar em conta a noção de “estarmos juntos”, isto é, da convivência e da sociabilidade, pois na sociedade existem relações que se articulam em diferentes grupos sociais. Como cada pessoa elege uma forma de sociabilidade, existem lógicas diferentes na articulação das relações sociais. Sendo assim, a empresa ou a organização torna-se o espaço de confrontação entre as várias pretensões de sociabilidade. Nessa perspectiva, a “intenção da pessoa” para agir eticamente ou conforme as normas estabelecidas pela empresa e a sua atuação profissional constituem a força propulsora básica do seu comportamento. As “intenções pessoais” dependem das crenças e atitudes que definem a maneira de um indivíduo ver o mundo e agir sobre ele, ou seja, as suas percepções.Portanto, as “intenções pessoais” são as causas imediatas e principais do comportamento ético- profissional, e as crenças e atitudes são apenas “causas remotas”. Segundo essa perspectiva, as pessoas têm objetivos e expectativas e agem intencionalmente para concretizá-los. A finalidade dá o impulso e mobiliza as energias e gera a intenção de realizar algo de “bom” ou de “ruim”. Desse modo, segundo Camargo (2001), compete ao indivíduo avaliar as alternativas de comportamento segundo sua capacidade de desempenhar e conforme as exigências da tarefa proposta (a probabilidade de se motivar aumenta à medida que o indivíduo se julga capaz de cumprir a tarefa e diminui quando ele se julga incapaz) e, ainda, a sua crença de que o desempenho o levará ao resultado desejado (a probabilidade de agir aumenta quando o indivíduo acredita que a alternativa e os instrumentos escolhidos levam ao fim predeterminado). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 125 Na perspectiva da “intencionalidade pessoal”, como principal fator motivador para um indivíduo dedicar-se a sua atividade profissional é o grau de satisfação esperado em relação a sua atividade e não a satisfação realmente obtida na execução de uma tarefa específica. No sentido de aplicação prática, assim se resumem às dimensões básicas dessa perspectiva: as pessoas dirigem seu comportamento de forma a alcançar resultados que julgam serem os mais atraentes; logo, a maior motivação para o trabalho estará ligada à capacidade de cada serviço satisfazer expectativas individuais; os objetivos específicos definidos em conjunto com os subordinados são bons instrumentos para melhorar a motivação e o desempenho; objetivos vagos ou definidos unilateralmente, sem a incorporação de expectativas individuais têm pouca força motivadora; a perspectiva da intencionalidade concentra-se no conhecimento do indivíduo sobre os objetivos a alcançar. Mostra como objetivos bem definidos e que constituem desafios resultam em melhor desempenho, ao contrário de objetivos abstratos, pouco desafiantes e sem levar em conta interesses individuais; a existência de uma política de relações humanas é decisiva para a ética e o profissionalismo. Sua ausência compromete qualquer padrão ético ou modelo de gestão responsável porque dissocia a interação e o comportamento cotidiano das pessoas. Na atuação profissional, tanto os deveres quanto as qualidades pessoais de um profissional, devem ser levados em conta para a atuação virtuosa e ética do profissional. A “ética da virtude” ensina que o exercício contínuo de bons hábitos conduz à aquisição da virtude, mesmo que seja árduo o caminho para conquistá-la. Da mesma forma, o atleta que almeja atingir recordes necessita treinar inúmeras vezes e por longo tempo, antes de alcançar seu intento (Cf. CAMARGO, 2001). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 126 Em toda empresa, as pessoas conscientes desse esforço ético têm maior probabilidade de tomar decisões corretas, sendo certo que, ao tomá-las, estarão crescendo na virtude almejada. Decorre daí ser a ética uma ciência também prática, e as virtudes, o resultado de ações repetidas no intuito de solucionar os dilemas. Você deve estar se perguntando: quais são as virtudes que um profissional precisa ter para que desenvolva com eficácia seu trabalho. Na verdade, múltiplas exigências existem, mas entre elas, destacam-se algumas básicas, a qual impossibilita a consecução do êxito moral. Quase sempre, na maioria dos casos, o sucesso profissional se faz acompanhar de condutas fundamentais corretas. Tais virtudes básicas são comuns a quase todas as profissões: virtudes são qualidades que capacitam as pessoas a encontrar motivos para agir bem. Sem coação, exercitando sua liberdade, a pessoa virtuosa sempre procura escolher o que é bom, certo e correto. As virtudes básicas profissionais, segundo Sá (2001), são aquelas indispensáveis, sem a qual não se consegue a realização de um exercício ético competente, seja qual for a natureza do serviço prestado. Estas virtudes devem formar a consciência ética estrutural, os alicerces do caráter e, em conjunto, habilitarem o profissional ao êxito em seu desempenho. Ainda, na visão de Sá (2001, p. 34): O senso de responsabilidade é o elemento fundamental da empregabilidade. Sem responsabilidade a pessoa não pode demonstrar lealdade, nem espírito de iniciativa (...). Uma pessoa que se sinta responsável pelos resultados da equipe terá maior probabilidade de agir de maneira mais favorável aos interesses da equipe e de seus clientes, dentro e fora da organização (...). A consciência de que se possui uma influência real constitui uma experiência pessoal muito importante. É algo que fortalece a autoestima de cada pessoa. Só pessoas que tenham autoestima e um sentimento de poder próprio são capazes de assumir responsabilidade. Elas sentem um sentido na vida, alcançando metas sobre as quais concordam Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 127 previamente e pelas quais assumiram responsabilidade real, de maneira consciente. As pessoas que optam por não assumir responsabilidades podem ter dificuldades em encontrar significado em suas vidas. Seu comportamento é regido pelas recompensas e sanções de outras pessoas - chefes e pares (...). Pessoas desse tipo jamais serão boas integrantes de equipes. Por esse motivo, a ética profissional visa também fundamentar ou justificar um comportamento moral virtuoso. Mas com que propósito? Reprovando aqueles comportamentos morais que não tomam o partido de justiça e do que é socialmente bom para o homem ou refletindo sobre as amarras que fazemos agentes sociais ficarem presos ao egoísmo ou àquilo que faz com que o indivíduo não se importe com os outros. Podemos então mostrar que o contexto da “ética dos negócios” segue os mesmos pressupostos da questão teórica da ética como evidenciamos acima: sabemos que o objeto da ética empresarial visa estudar, a partir de contextos sociais bem demarcados e distintos, aquelas formas de comportamentos morais que pautam as regras morais empresariais. A importância dessa preocupação, surgida nos últimos anos sobre a necessidade da ética dentro do mundo empresarial, seja no modo de formação de funcionários ou na forma presencial de palestras e de reprovações a atitudes inconcebíveis e danosas, reporta-nos à questão no qual já assinalamos: a preocupação com a repercussão social e moral que certos problemas de decisões acarretam na administração de bens e negócios. Por essa razão, o “empresário líder”, ciente da realidade do mundo, dispõe-se a modificar o rumo daquilo que muitos consideram imutável, motivando seus empregados a segui-lo, incentivando outros líderes e empresários ou diretores a tomarem decisões visando ao bem comum, mostrando- se mais flexíveis e menos doutrinários. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 128 Para a “ética da responsabilidade”, o que importa é que os agentes possam avaliar os efeitos e as consequências previsíveis de suas ações, buscando conciliar os objetivos da empresa para fins que sejam vistos como bons. Todavia, a finalidade de agir em função do que é visto como “bom” pode justificar que os indivíduos realizem ações e recursos que não são sempre éticos. IMPORTANTE: A “ética da responsabilidade” não converte princípios ou ideais em práticas do cotidiano, nem aplica normas ou crenças sobre virtudes filosóficas, religiosas ou máximas morais aplicando-as nos termos da ética dos negócios. Os valores do mundo econômico só podem ser compreendidos como instrumentais e de acordo com as práticas empresariais aos quais são requeridos. A lógica dessa ética, particularmente a da “responsabilidade”, é própria do capitalismo em suas fases de complexidade, como diz Weberapud SROUR (2000, p. 50): (...) toda atividade orientada pela ética pode subordinar-se a duas máximas totalmente diferentes e irredutivelmente opostas. Ela pode orientar-se pela ética da responsabilidade ou pela ética da convicção. Isso não quer dizer que a ética da convicção seja idêntica à ausência de responsabilidade e a ética da responsabilidade à ausência de convicção. Não se trata evidentemente disso. Todavia, há uma oposição abissal entre a atitude de quem age segundo as máximas da ética da convicção — em linguagem religiosa, diremos: ‘O cristão faz seu dever, e no que diz respeito ao resultado da ação remete-se a Deus’ — e a atitude de quem age segundo a ética da responsabilidade que diz: ‘Devemos responder pelas consequências previsíveis de nossos atos’. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 129 Não obstante, diante dos deveres de um profissional, devem ser levadas em conta as qualidades pessoais que também concorrem para o enriquecimento de sua atuação profissional, algumas delas facilitando o exercício da profissão. Muitas destas qualidades são adquiridas com esforço e boa vontade, aumentando neste caso o mérito do profissional que, no decorrer de sua atividade profissional, consegue incorporá-las à sua personalidade, procurando vivenciá-las ao lado dos seus deveres profissionais. Por fim, segundo Srour (2000, p. 46): Agir eticamente dentro (ou fora) da empresa sempre foi e será uma decisão pessoal. Uma vez que você tenha despertado para o assunto, mais e mais ele tende a ser considerado nas decisões, num processo permanente, sem fim. É claro que sempre estamos sujeitos a deslizes e equívocos. Nunca se esqueça, porém, de que esse costuma ser um caminho sem volta. Para o bem ou para o mal. Bem, as considerações apresentadas sobre a ambiência e o desempenho ético- profissional são altamente relevantes para entendermos os conceitos principais da responsabilidade social nos negócios. Veremos a partir de agora como este fato é incorporado pelas empresas. Ética e responsabilidade social nos negócios As discussões sobre a responsabilidade social das empresas cada vez mais ocupa espaço tanto no ambiente empresarial como nas discussões acadêmicas. Todavia, não há unanimidade quanto a qual deva ser o procedimento social das empresas, pois existem vários autores que a conceituam com grandes variações terminológicas. Mas como assim? O que significa uma empresa ser socialmente responsável? Há aqueles que advogam que a empresa é socialmente responsável se cumpre meramente a sua função de gerar empregos, pagar impostos e proporcionar lucros aos acionistas. De outro lado, há aqueles que defendem a ideia de que as empresas devem assumir um papel mais relevante do que o comportamento empresarial clássico. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 130 Para Ashley (2002, p. 173): Ser socialmente responsável implica, para a empresa, valorizar seus empregados, respeitar os direitos dos acionistas, manter relações de boa conduta com seus clientes e fornecedores, manter ou apoiar programas de preservação ambiental, atender à legislação pertinente à sua atividade, recolher impostos, apoiar ou manter ações que visem diminuir ou eliminar problemas sociais nas áreas de saúde e educação e fornecer informações sobre sua atividade. De uma forma geral, entende-se por responsabilidade social o comprometimento e o compromisso de uma empresa com relação à sociedade, a partir de todas as ações que afetam os indivíduos e organizações, envolvendo também e, principalmente, a prestação de contas para essa mesma sociedade. A postura ética da organização, que envolve de forma ampla o crescimento econômico com sustentabilidade, são componentes fundamentais da estratégia de uma empresa socialmente responsável (Cf. ASHLEY, 2002). Dentro desta linha de raciocínio, temos que na evolução da humanidade sempre houve uma ligação entre o conceito de responsabilidade relacionado à vida em sociedade. O homem sempre teve a guiar suas ações o comprometimento de, ao desempenhar suas atividades, não esquecer caráter social e em como poderia afetar de forma positiva ou negativa a sociedade em que vivia. Todavia, na concepção de Fischer (2002), o termo responsabilidade social surge no século XX, como uma forma de buscar ampliar o papel das organizações em suas relações com a sociedade, demonstrando que é inevitável sua interação com o sistema social. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 131 Para a autora, o conceito de responsabilidade social foi extraído dos estudos da “teoria das organizações” sendo uma das funções organizacionais a serem administradas tanto nas relações internas quanto nas externas do sistema organizacional. Essa visão, conforme afirma Fischer, foi o motivo pelo qual o conceito não foi totalmente absorvido na gestão organizacional e gerencial. As organizações ou empresas, muitas vezes, escolhiam cumprir com sua função social através de um modo mais abrangente. No entanto, limitavam-se a desenvolver pequenas ações em curto prazo de tempo ou apenas assumiam um caráter “paternalista”, visando somente a resolver manifestações de conflito entre os setores. Mas qual é a relação entre a responsabilidade social da empresa com a ética? Antes de prosseguirmos, cabe, portanto, fazer uma distinção entre responsabilidade social e filantropia. Como já definimos responsabilidade social, podemos dizer que na filantropia o foco é a ação social da empresa que tem como beneficiária direta a comunidade. Na filantropia, as motivações são humanitárias, a participação é reativa e as ações são isoladas, a relação com o público-alvo é de demandante / doador, a ação social decorre de uma opção pessoal dos dirigentes, os resultados resumem-se na gratificação pessoal de poder ajudar não havendo preocupação em associar a imagem da empresa à ação social. No sentido etimológico, a palavra responsabilidade deriva do latim respondere, responder. Segundo o dicionário Aurélio, responsabilidade é “a qualidade de responsável”, que “responde por atos próprios ou de outrem”, que “deve satisfazer os seus compromissos ou de outrem” (HOLANDA, 1999, p. 578). As diferentes significações percebidas para o termo suscitam questões ligadas à área do dever, da obrigação legal ou moral que, por sua vez, nos faz adentrar o campo da ética. Não obstante, o conceito de responsabilidade social empresarial surge dessa forma como um “dilema ético”. Sabemos que a ética é definida como um sistema de regras que governa a ordenação de valores. Como pessoas possuem códigos de ética pessoais diferenciados, as organizações devem ser explícitas com relação aos seus padrões éticos. Neste sentido, falar sobre ética e sua relação com responsabilidade social nos conduzem diretamente ao problema do costume e hábitos ligados às manifestações de cada sociedade através de sua cultura, vivência e crenças (Cf. ASHLEY, 2002). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 132 Sendo assim, as responsabilidades éticas correspondem a atividades, práticas, políticas e comportamentos esperados por membros da sociedade apesar de não codificado em leis que envolvem uma série de normas, padrões e expectativas de comportamento para entender o que os diversos públicos (stakeholders) com as quais a empresa se relaciona consideram legítimo, correto, justo ou de acordo com seus direitos morais e expectativas. Com efeito, na atualidade, a discussão acerca do papel social das empresas assume novas vertentes. Com a forma de fundamentação contra ou a favor da responsabilidade social das empresas, existe no meio empresarial e acadêmico uma busca por conhecer a relação entre o desempenho financeiro e o desempenho social. Esta busca por conhecer tal relação se ampliou até o momento de escolher as empresas nas quais o capital está aplicado,fazendo com que a responsabilidade social não se insira nas considerações de mercado somente na hora de uma compra ou uma venda de produtos ou na contratação de fornecedores. Um aspecto que reforça a relação do valor da empresa com práticas sociais é o posicionamento dos maiores fundos de pensão da atualidade que, na condição de investidores institucionais, estão exigindo cada vez mais responsabilidade social das empresas aos quais investem: Em encontro realizado em Haia, na Holanda, em 2001, representantes de cerca de 300 entidades, que somam patrimônio de mais de US$ 5 bilhões, elaboraram uma “lista negra” das empresas nas quais não se deve investir por motivos que vão desde as agressões ao meio ambiente até a exploração de crianças. Além dos comentários sobre a corrupção no Brasil, forma citados no encontro os acidentes ambientais da Petrobrás – um fundo dinamarquês sugeriu até que não se investe mais na petrolífera brasileira por causa de acidentes (Ashley, 2002, p. 180). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 133 Diante do exposto a respeito das conceituações sobre a responsabilidade social das empresas, ficou-nos patente que uma empresa socialmente responsável é aquela que responde às expectativas de seus consumidores e acionistas. Com base nisso, chegamos à conclusão de que a empresa socialmente e eticamente responsável diz respeito à empresa que está atenta para lidar com as expectativas de seus stakeholders atuais e futuros, na visão mais radical de sociedade sustentável. Por outro lado, podemos afirmar que o conceito de “responsabilidade social” agrupa, em seu núcleo central, as seguintes ideias: consciência maior sobre as questões culturais, ambientais e de gênero; antecipação, evitando regulações restritivas à ação empresarial pelo governo; diferenciação de seus produtos diante de seus competidores menos responsáveis socialmente; promoção de valores e comportamentos morais que respeitem os padrões universais de direitos humanos e de cidadania e participação da sociedade. A empresa socialmente responsável sempre agrega mais valores para si, diferenciando-se de suas concorrentes numa ótica positiva, ainda que do ponto de vista estritamente empresarial. De acordo com Mattar (2001, p. 15): Pesquisa do Instituto Ethos/Jornal Valor sobre a percepção dos consumidores, realizada em 2000, mostra que, no Brasil, 57% deles julgam se uma empresa é boa ou ruim tendo por base a responsabilidade social. E o que eles querem dizer com isso? Os primeiros elementos citados são tratamento de funcionários e a ética nos negócios. Adicionalmente, os consumidores querem que a empresa melhore a Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 134 sociedade: é o que pedem 35% deles. E não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. Em quase todos os países onde a mesma pesquisa foi feita o resultado neste item foi o mesmo: 35%. Além disso, os consumidores recompensam e punem as empresas pela sua responsabilidade social. Recompensam ao comprar os produtos e recomendar a empresa a seus conhecidos. Punem ao não comprar os produtos e não recomendar a empresa. Trinta e um por cento dos consumidores no Brasil e 49% nos consumidores nos Estados Unidos comportam-se desta forma. Por outro viés, nas palavras de Boff (2003, p. 9), “responsabilidade é dar-se conta das consequências que advêm de nossos atos”. Sabendo-se que a ética está presente em todos e quaisquer relacionamentos que envolvem o ser humano, levá-la em consideração é uma necessidade também nos negócios. Desse modo, age eticamente e com responsabilidade social a empresa que: respeita a dignidade de seus empregados, não os vendo como meros recursos; não agride o meio ambiente; não infringe os direitos do consumidor; não compromete as necessidades, as utilidades e os interesses públicos quando objetiva usufruir benefícios fiscais; valoriza verdadeiramente o seu quadro de pessoal, promovendo o seu desenvolvimento; não coloca a busca do lucro acima da legitimidade e justiça dos interesses do homem e da sociedade. Gostou das considerações a respeito da relação entre ética e responsabilidade social? Compreendeu como estes dois conceitos estão alinhados na prática nas empresas? A seguir discutiremos o tema das decisões morais racionais. Trata-se de uma questão importante no âmbito empresarial: como tomar decisões? O que é certo decidir? Como decidir? Estas são algumas indagações que vamos lhe responder. Preparado? Vamos lá? Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 135 Decisões morais racionais Você já se deparou em uma situação em que precisava tomar uma decisão rapidamente? O que você fez? Ah, não lembra né? Todos nós tomamos decisões, elas estão presentes em todo momento da nossa vida. Você saberia definir o que é uma decisão? O que significa “tomar uma decisão”? Bem, primeiramente é preciso dizer que toda “tomada de decisão” envolve escolhas. Por sua vez, as escolhas envolvem critérios gerais ou particulares aos quais são determinados por nossa vontade. Neste sentido, é fácil perceber que o processo de decisão moral está intimamente associado ao tema da vontade. Mas o que é vontade? A vontade é a capacidade que o ser humano possui de deliberar e escolher as ações que irá realizar, pois tão somente o ser humano possui a capacidade de deliberar e escolher as ações que irá realizar. Por conseguinte, a vontade diferencia-se do instinto, dos desejos e do apetite, que se dão de forma mais ou menos pré-programada e fortemente vinculada à estrutura corpórea. Na medida em que a intervenção resulta de uma atividade refletida, as ações dela oriundas estão muito além das ações inconscientes e predeterminadas. Podemos conceituar a vontade como “a faculdade de perseguir o bem, conhecido pela razão”. Neste sentido, a vontade não pode não querer buscar aquilo que lhe é indicado pelo intelecto como bem naquele momento. Quando se faz a opção por algo que a moral vigente condena, o problema não está na vontade, mas na informação inadequada que lhe foi fornecida a partir da qual foi feita a escolha. Costuma-se caracterizar a vontade sob os seguintes princípios: princípio de atividade inteligente: não atua cegamente, pois conhece o fim a que tende; sabe dos meios de que necessita para atingir o fim; tem noção das consequências que resultarão da decisão tomada; pode ser orientada; Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 136 princípio de atividade livre: é capaz de conduzir a si mesma (autônoma); escolhe entre as diferentes possibilidades que a razão lhe oferece. princípio de atividade ordenada: é o objeto próprio da vontade; a liberdade nasce da escolha que o homem deve fazer entre os diferentes bens que se lhe apresentam. Diante da definição de vontade referida acima, podemos notar que esta refere- se tão-somente ao ato moral e racional praticado em vistas ao bem. Por conseguinte, a noção de bem deve ser sempre acompanhada pela noção de mal. Desse modo, o bem e o mal se encontram em uma relação recíproca e constituem um par de conceitos axiológicos inseparáveis e opostos. Toda concepção de bom implicará na definição de mal. Contudo, atualmente, em função da pluralidade de formas de vida, de sociabilidade e das formações culturais é difícil constatar um consenso sobre o que é bem e o que é mal. Na verdade, nem na Antiguidade clássica houve um consenso a respeito dos critérios para se avaliar o que é bem e o que mal. Vejamos brevemente algumas destas concepções a respeito do que é bem e do que mau ao longo da história da filosofia: o hedonismo: doutrina que foi pregada desde a Grécia Antiga por filósofos como Górgias, Cálicles e Arístipo. Defende que o bem é tudo aquilo capaz de oferecer prazer imediato. Por sua vez, o mal é aquiloque gera sofrimento; o epicurismo: doutrina elaborada por Epicuro, que procurava aperfeiçoar o hedonismo. Defendia que o bem não era qualquer prazer, mas os prazeres devidamente selecionados. Assim, Epicuro construiu uma espécie de hierarquia dos prazeres, considerando superiores, por exemplo, os prazeres naturais em vez dos artificiais; os prazeres calmos, em vez dos violentos. O supremo prazer era, entretanto, o prazer intelectual, obtido mediante o domínio das paixões pela razão; Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 137 o estoicismo: o filósofo Zenão é considerado o fundador da escola estoica, que pregava um espírito de total renúncia aos desejos, considerados como a fonte de todo sofrimento humano. O bem consistia na aceitação da ordem universal, que deve ser compreendida pela razão; o formalismo kantiano: o filósofo alemão Kant defende a concepção moral que identifica o bem ao cumprimento puro e simples do dever. A fonte do dever é a razão humana que elabora normas orientadoras de nossa conduta moral; o tomismo: o filósofo cristão Santo Tomás de Aquino postula que o bem consiste nas ações capazes de aproximar o homem de Deus. Tomás de Aquino reconhece que a razão humana possui condições de estabelecer deveres morais, mas procura harmonizar esses deveres à ordem de Deus, revelada ao homem pela fé cristã; o humanismo: Os pensadores contemporâneos da tradição humanística defendem que somente o homem deve determinar, para si próprio, o que seja bem ou mal. E o que é bem? É tudo o que é bom para a natureza humana; tudo o que impulsiona a vida dessa natureza; tudo o que colabora para a realização das potencialidades humanas. Assim, para determinarmos o bem, devemos estudar e conhecer a natureza humana em profundidade, tarefa da qual se ocupam ciências como a Psicologia, a Antropologia, a História, etc. Diante do exposto, verifica-se que as doutrinas elencadas oferecem uma tentativa de resposta ao que é bom no sentido geral ou o bom em absoluto, ou seja, em todas as circunstâncias, independente do ato moral que se trate ou da situação concreta que se efetue. No caminho inverso a estas concepções doutrinárias originadas ao longo da histórica da filosofia, as decisões morais racionais partem de situações concretas e específicas. Segundo Chiavenato (2004), a tomada de decisão é tarefa mais comum de todo bom administrador. Porém, os gestores ou administradores não são os únicos a decidir, pois o trabalho do executivo consiste não apenas em tomar decisões próprias, mas também em providenciar para que toda a empresa que dirige, ou parte dela, tome-as também de maneira efetiva. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 138 Mas o que é uma decisão? A decisão é um processo de análise e escolha entre várias alternativas disponíveis em relação a uma ação que deverá ser seguida ou não de acordo com a nossa vontade. Em outras palavras, a decisão é um julgamento, uma escolha estabelecida entre alternativas, incluindo todos os “o que”, “quando”, “quem”, “por que” e “como”, que aparecem nos processos de decisão. Com o objetivo de evitar problemas futuros, os administradores devem se basear em decisões cuidadosamente formuladas. As principais condições de decisão são: decisão em condições de certeza: ocorre quando a decisão é feita com pleno conhecimento de todos os estados da natureza do processo decisório. Existe a certeza do que irá ocorrer durante o período em que a decisão é tomada. É possível atribuir probabilidade 100% a um estado específico da natureza da decisão. A probabilidade estatística e pragmática do processo decisório pode indicar que a posição de 0% será a completa incerteza e a posição de 100% ou 1 indica a certeza da tomada de decisão; decisão em condições de risco: ocorre quando não são conhecidas as probabilidades associadas a cada um dos estados da natureza do processo decisório. Ao contrário do item anterior, que dispunha de quase 100% de certeza no resultado final, aqui essa certeza irá variar entre 0% e 100%; decisão em condições de incerteza ou em condições de ignorância: ocorre quando não se obteve informações e dados sobre o estados da natureza do processo decisório, ou mesmo em relação à parcela desses estados. A empresa possui dados e informações parciais, obtidos com probabilidade incerta ou é desconhecida a probabilidade associada aos eventos que estão provocando a decisão; decisão em condições de competição ou em condições de conflito: ocorre quando estratégia e estados da natureza do processo decisório são determinados pela ação de competidores. Existem, obrigatoriamente, dois ou mais gestores externos — outras empresas concorrentes — envolvidos e o resultado vai depender da escolha de cada um dos decisores nesse ambiente competitivo. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 139 O ato de tomar decisões faz parte do cotidiano da vida e está presente em todos os seus aspectos, indo desde tópicos pessoais até decisões mais abrangentes, como no planejamento de grandes projetos que envolvem as organizações privadas e públicas. As decisões têm frequentemente um impacto muito além do resultado imediato. Em geral, as decisões tomadas no âmbito organizacional estão direcionadas para o futuro, que é fruto das idealizações nas quais as decisões são baseadas. De acordo com Gomes (2002), numa empresa, uma decisão precisa ser tomada sempre que está diante de um problema que apresenta mais de uma alternativa de solução. Mesmo quando, para solucioná-lo, possuí uma única opção a seguir, podendo ter a alternativa de adotar ou não essa opção, ou seja, alternativa para deliberar. Este processo de escolher o caminho mais adequado à empresa, naquela circunstância, também é conhecido como “tomada de decisão”. Toda escolha que fazemos envolve um fim ao qual visamos. Para realizar uma ação, é preciso competência e coragem para realizá-la. A essência das atividades administrativas é, fundamentalmente, um processo de tomada de decisão e este, por sua vez, o ato de decidir é essencialmente uma ação humana e comportamental. Ela envolve a seleção consciente de determinadas ações entre aquelas que são fisicamente, moralmente e racionalmente possíveis para o agente e para aquelas pessoas sobre as quais ele exerce influência e autoridade. Como vimos, a tomada de decisão no interior das organizações contemporâneas envolve vários estilos de enfrentamento de decisões e problemas. Tanto aquele que evita, como aquele que soluciona, bem como aquele que soluciona o problema possui um papel a desempenhar dentro da mesma empresa. Embora um tipo e estilo em particular possa ser mais eficaz que os outros, em uma situação específica, todas as organizações ou empresas são confrontadas com uma variedade bastante complexa de desafios que exigem uma gama de estilos e soluções (Cf. GOMES, 2002). Podemos apontar seis elementos fundamentais no processo de decisão moralmente racional: A “Teoria das Decisões” nasceu de Herbert Simon, que a utilizou para explicar o comportamento humano nas organizações. O autor, no seu livro O Comportamento Administrativo (1970), diz que a Teoria Comportamental concebe a organização como um “sistema de decisões”. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 140 o tomador de decisão: é a pessoa que faz uma escolha ou opção entre várias alternativas de ação; os objetivos: aquele em que o tomador de decisão pretende alcançar com suas ações; as preferências: os critérios que o tomador de decisão usa para fazer sua escolha; a estratégia: o curso da ação que o tomador de decisão escolhe para atingir os objetivos, dependendo dos recursos que venha a dispor; a situação: os aspectos do ambiente que envolvem o tomador de decisão, muitos dos quais se encontram fora do seu controle, conhecimento ou compreensão e que afetam sua escolha; o resultado: refere-se à consequência ou resultante de uma dada estratégia de decisão. Com efeito, a tomada de decisão dentro das empresas ou organizações contemporâneas de negócios envolve todos os tipos e estilos de solução de problemas. Tanto aquele que evita como aquele que soluciona, bem como aquele que antecipa os problemas, tem um papel a desempenhar dentro da mesma empresa. Embora um tipo e estilo em particular possa ser mais eficaz do que outros, em uma situação específica, todas as empresas são confrontadas com uma variedade bastante complexa de desafios que exigem uma gama de estilos de solução de problemas (Cf. GOMES, 2002). No interior da empresa, em razão da busca das metas, existem níveis diferentes de tomada de decisão. São os níveis estratégico, tático e operacional de tomada de decisão que vão mobilizar todos os recursos de uma empresa para a concretização dos seus objetivos. Vejamos alguns exemplos: as decisões estratégicas são aquelas que determinam os objetivos da organização como um todo, seus propósitos e direção, sendo uma função exclusiva da alta administração. A direção da empresa tem o “quadro geral” de todos os elementos de seu negócio e precisa ser capaz de integrá-los em um todo coerente no ambiente da organização. As decisões tomadas nesse âmbito também determinarão como a empresa se relacionará com os Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 141 ambientes externos. Já que as políticas estratégicas afetam a empresa como um todo, elas são mais adequadas quando tomadas no nível mais alto. Essas políticas e metas não são muito específicas, porque precisam ser aplicadas em todos os níveis e departamentos; em relação às decisões táticas (ou administrativas), elas são tomadas em um nível abaixo das decisões estratégicas. Normalmente são tomadas pela gerência intermediária, como gerentes de divisão ou de departamentos. Essas decisões envolvem o desenvolvimento de táticas para realizar as metas estratégicas definidas pela alta gerência. Decisões táticas são mais específicas e concretas do que decisões estratégicas e mais voltadas para a ação. Por exemplo, decisões sobre compras, execução de uma política de redução de custos, definição do fluxo produtivo ou treinamento do pessoal, entre outras. e por último, as decisões operacionais, que são tomadas no nível mais baixo da estrutura organizacional, no campo da supervisão ou operacional de uma empresa e se referem ao curso de operações diárias. Essas decisões determinam a maneira como as operações devem ser conduzidas — operações desenhadas a partir de decisões táticas tomadas pela gerência intermediária — e referem-se à maneira mais eficiente e eficaz de realizar as metas estabelecidas no nível médio. Cabe ressaltar que as decisões tomadas nas empresas frequentemente afetam todo o seu contexto, influenciam uma determinada política ou até mesmo uma parcela da sociedade onde elas estão inseridas. Por isso, ao longo do tempo, o estudo sobre a decisão vem se apoiando em diversos fatores para que o “tomador de decisão” tenha mais segurança diante dos possíveis problemas surgidos (Cf. GOMES, 2002). Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 142 Com efeito, as decisões administrativas se referem a problemas mais complexos, exigem maior quantidade de informações, envolvem maior número de pessoas e geram mais impacto na comunidade. Nesse tipo de decisão, a própria caracterização do problema foge às possibilidades normais do senso comum. Não se esqueça: uma decisão é uma opção clara pela prática de algo diferente, pela tomada de um novo curso de ação. Toda decisão impõe uma escolha, gera uma possibilidade de mudança. Escolhas — profissionais ou não — provocam dilemas. Dilemas que muitas das vezes implicam o abandono de opções também valiosas que envolvem a consciência de riscos e incertezas e o sentimento de responsabilidade. Em se tratando de decisões administrativas, esperam-se justificativas ou razões que fundamentem as escolhas. A razão é parte da causa da decisão: se há razões para se escolher e agir, a decisão se impõe aos decisores. Normalmente, presume-se que as organizações desenvolvem intenções de mudar suas relações com o mundo exterior, ou seja, suas intenções estratégicas, de acordo com as variações percebidas no contexto em que se inserem. Na tentativa de responder a essas provocações externas, dirigentes e gestores procuram ser racionais e eticamente coerentes — procuram saber por que decidem da maneira como o fazem. Para tanto, necessitam, além de conhecer suas razões, saber como serão responsabilizados, ou seja, conhecer as razões de outros. Para Gomes (2002), a todo instante o administrador sofre o desafio das mudanças constantes, das transformações rápidas e da convivência com situações nem sempre muito claras. Estes pressupostos levam-no a decidir de forma rápida e coerente com os anseios da empresa. Vejamos um pequeno exemplo de decisão racional ética envolvendo uma empresa particular: o caso Granite Rock. Granite Rock é uma empresa de 99 anos, sediada em Watsonville, Califórnia nos Estados Unidos, especializada no ramo de venda de cascalho triturado, concreto, asfalto e areia. Há alguns anos, os irmãos herdeiros, Bruce e Steve Woolpert, tomaram a decisão de lançar o que chamaram de MEGAA – “Metas Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 143 Grandiosas, Arriscadas e Audaciosas”. A proposta dos irmãos Woolpert era garantir a total satisfação do cliente e tornar a empresa tão ou mais bem posicionada que a Nordstrom, empresa conhecida em todo o mundo por encantar seus clientes. Tratava-se de um objetivo nada simples para uma empresa que atua em um setor árido e enfadonho, com empregados com qualificação relativamente baixa e, em geral, bastante rudes. Por um lado, os irmãos Woolpert queriam tornar sua empresa parecida com a Nordstrom em eficiência e simpatia no atendimento aos clientes, contudo não pretendiam seguir o mesmo caminho que a maioria das empresas faz quando lança um programa desse porte — nada de liderança empolgante, patrocínio de eventos extravagantes ou grandes programas de serviços aos clientes. Eles pensavam em algo mais discreto, de acordo com o perfil relativamente conservador da família. Optaram por implementar uma política radical chamada pagamento a menor. Essa política estava enunciada na parte inferior da nota fiscal da Granite Rock: “Se você não estiver satisfeito por qualquer razão, não nos pague pela mercadoria em questão. Basta riscar a linha a ele correspondente, escrever uma breve nota sobre o problema e devolver-nos uma cópia da fatura com seu cheque no valor do saldo remanescente”. A política do pagamento a menor não é, simplesmente, restituição de pagamento. É bem mais do que isso. Os clientes não precisam devolver a mercadoria. Eles decidem se e quanto devem pagar, de acordo com o nível de satisfação total. Os impactos causados pela política do pagamento a menor foram extraordinários, tanto em âmbito externo quanto interno. Externamente, significou uma clara demonstração de que qualidade no atendimento não era somente um slogan. Por outro lado, internamente, passou a exigir dos funcionários um real empenho no bom atendimento à clientela. O raciocínio ético se fez fartamente presente na decisão do caso Granite Rock. Por que isto aconteceu? Ora, os irmãos queriam implantar, em sua empresa, um sistema de atendimento ao cliente similar ao da Nordstrom. No entanto, para fugir dos padrões convencionais de implementação de novas políticas dentro da empresa, os irmãos Woolpert adotaram eticamente caminhos diferentes. Dessa forma, tiveram a oportunidade do insight criativo do “pagamento a menor”. Realmente, esta forma de pagamento foi impactante nos negócios da empresa. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade144 Compreendeu através do exemplo como as decisões são tomadas na prática em uma empresa? Continue lendo e se aprofundando no assunto, pois a literatura sobre este tema é vastíssima. SUGESTÃO DE FILME Pegue seu caderno de anotações, sente-se e assista ao filme A Firma (1993) dirigido por Sydney Pollack. Ele contextualizará melhor ainda o conteúdo que você acabou de estudar. LEITURA COMPLEMENTAR Visando enriquecer seu processo de aprendizagem procure efetuar a leitura complementar dos seguintes textos: MATTAR, J. A. Filosofia e Ética na Administração. São Paulo: Saraiva, 2004. 408p. ASHLEY, P. A. (coord.). Ética e Responsabilidade Social nos Negócios. São Paulo: Saraiva, 2002. 340p. BOFF, L. A ética e a formação de valores na sociedade. Reflexão, São Paulo: Instituto Ethos, ano 4, nº. 11, p. 3-20, out. 2003. Disponível em: <http://www.ethos.org.br>. Acesso em: 29 out. 2004. FISCHER, R. M. O desafio da colaboração: práticas de Responsabilidade social entre empresas e terceiro Setor. São Paulo: Editora Gente, 2002. 234p. CAMARGO, M. Fundamentos de ética geral e profissional. 3ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. 89p. CHIAVENATO, I. Introdução à teoria geral da administração. 7ª. Ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 280p. DISKIN, L.; MARTINELLI, M.; MIGLIORI, R.F.; SANTO, R.C.E. Ética, Valores humanos e Transformação. 1ª. ed. São Paulo: Fundação Petrópolis, 1998, p. 66 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 145 GOMES, L. F. A. M.; GOMES, C. F. S.; ALMEIDA, A. T. Tomada de decisão gerencial: enfoque multicritério. São Paulo: Atlas, 2002. 296p. SROUR, H.S. Ética Empresarial. 8ª. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000. 389p. VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. 304p. SÁ, A. L. de. Ética profissional. 4ª edição: São Paulo: Ed. Atlas, 2001. 296p. TOFFLER, B. L. Ética no trabalho. São Paulo: Makron Books, 1993. 125p. Aproveite e visite os sites abaixo. Todos eles foram amplamente consultados em nossa pesquisa. Bom proveito! Responsabilidade social: Disponível em: <http://www.responsabilidadesocial.com/>. Acesso em 16 maio 2008. GIFE: Disponível em: <http://www.gife.org.br/>. Acesso em 16 maio 2008. IBASE: Disponível em: <http://www.ibase.org.br/>. Acesso em 16 maio 2008. É HORA DE SE AVALIAR! Lembre-se de realizar as atividades propostas no caderno de exercícios! Elas são fundamentais para ajudá-lo a fixar o conteúdo teórico trabalhado, a sistematizar as ideias e os conceitos apresentados, além de proporcionar a sua autonomia no processo ensino-aprendizagem. Caso prefira, redija suas respostas no caderno de exercícios e depois as envie através do nosso ambiente virtual de aprendizagem (AVA). Procure interagir permanentemente conosco e utilize todos os recursos didáticos e pedagógicos disponibilizados com o objetivo de aprimorar a sua formação acadêmica. Nesta unidade, você estudou os pressupostos da ética profissional. Para tanto, discutimos os valores sociais predominantes nas profissões em geral, em seguida, abordamos a questão da ambiência e relações pessoais, ou seja, o desempenho ético-profissional. Por fim, discutimos os princípios fundamentais das decisões morais racionais. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 146 Como esta é nossa última unidade de estudo, gostaria de registrar que foi um imenso prazer tê-lo como aluno. Esperamos, sinceramente, que a perspectiva aberta pela ética possa contribuir para o sucesso da sua prática profissional e para um relacionamento pessoal e existencial mais tolerante e aberto, com a difícil e, ao mesmo tempo, fascinante oportunidade que a vida nos oferece de conviver e de aprender com a diferença e os múltiplos valores sociais com os quais nos relacionamos constantemente. Sucesso nos estudos! Estamos torcendo por você! Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 147 Exercício – unidade 4 1ª QUESTÃO: Assinale a letra correspondente à alternativa que preenche CORRETAMENTE as lacunas do texto a seguir: “A ética profissional deve estar em sintonia com os pressupostos que incidem na _______ e a sua dignidade. Respeitar a “pessoa humana” implica também combater toda a prática que a diminua. A “pessoa humana”, em sua ________, é muito mais que um simples corpo ou uma simples “máquina”, que pretende ter suas peças trocadas ou desmontadas”. a) conduta desumana - heterogeneidade b) conduta humana - totalidade c) mentalidade humana - homogeneidade d) “pessoa humana” - totalidade e) conduta humana - totalidade 2ª QUESTÃO: O emprego, pela primeira vez, do termo pessoa fora dos sentidos restritos que lhe eram fornecidos pelo teatro se deve a: a) Kant. b) Foucault. c) Sartre. d) Boécio. e) Maquiavel. 3ª QUESTÃO: Diversas são as condições ambientais sob as quais se pode observar a atuação do profissional em seus respectivos espaços e relações de trabalho. Entres estas, podemos citar: Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 148 a) demissões e permissões. b) comissão de qualidade e grupo inconstante. c) empresa falida e empresa secreta. d) sociedade secreta e ambiente exposto. e) sócio de uma empresa consorciada ou associada. 4ª QUESTÃO: Em que consiste as decisões táticas (ou administrativas)? a) As decisões táticas (ou administrativas) são aquelas tomadas fora do ambiente empresarial. b) As decisões táticas (ou administrativas) são aquelas tomadas por um grupo minoritário e fora de controle. c) As decisões táticas (ou administrativas) são aquelas tomadas em um nível abaixo das decisões estratégicas. Normalmente são tomadas pela gerência intermediária, como gerentes de divisão ou de departamentos. d) As decisões táticas (ou administrativas) são aquelas tomadas em um nível mais alto das decisões funcionais. e) As decisões táticas (ou administrativas) são aquelas tomadas longe das decisões específicas que permitem o empresário decidir como e onde sonegar impostos. 5ª QUESTÃO: Cada forma de vida possui uma pretensão de sociabilidade, ou seja, uma pretensão de como se relacionar com outras formas e uma pretensão de satisfação. Com efeito, a satisfação pessoal só se dá a partir de um sistema de regras e de valores proveniente de uma determinada comunidade. Cada forma de vida se pauta nas pretensões de satisfação de uma instituição, além de exprimir uma forma de sociabilidade própria. De acordo como isso, assinale a única questão que apresenta corretamente o conceito de “coexistir”. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 149 a) Coexistir é viver além da existência. b) Coexistir é existir solitariamente. c) Coexistir é estar junto. d) Coexistir é não existir. e) Coexistir é conviver sem o próximo. 6ª QUESTÃO: No sentido etimológico, a palavra responsabilidade deriva do latim respondere, responder. Com este sentido etimológico, assinale a alternativa que indica o que entende-se por ‘responsabilidade’. a) Responsabilidade é “a qualidade de responsável”, que “responde por atos próprios ou de outrem”, que “deve satisfazer os seus compromissos ou de outrem”. b) Responsabilidade é o fato de responder socialmente as exigências transfiguradas. c) Responsabilidade significa ser irresponsável consigo mesmo. d) Responsabilidade é qualidade de estar aquém ao outro. e) Responsabilidade é o mesmo que coexistir. 7ª QUESTÃO: Toda “tomada de decisão” envolve escolhas. Por sua vez, as escolhas envolvem critérios gerais ou particulares os quais são determinados pela nossa vontade. Neste sentido, é fácil perceber que o processo de decisão moral está intimamente associado ao tema da vontade. Por vontade, entende-se: a) a capacidade que o ser humano possui de formular decisões. b) a capacidade que o ser humano possui de impor regras a si mesmo. c) a capacidade que o ser humano possui de formularindecisões. d) a capacidade que o ser humano possui de incidir momentos especiais na sua mente. e) a capacidade que o ser humano possui de deliberar e escolher as ações que irá realizar, pois tão-somente o ser humano possui a capacidade de deliberar e escolher as ações que irá realizar. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 150 8ª QUESTÃO: Assinale a letra correspondente à alternativa que preenche CORRETAMENTE as lacunas do texto a seguir: “A decisão é um ______ de análise e escolha entre _________ disponíveis em relação a uma ação que deverá ser seguida ou não de acordo com a nossa _______”. a) acaso - várias alternativas - vontade b) processo - poucas alternativas - deliberação c) acaso - nenhuma alternativa - deliberação d) processo - várias alternativas - vontade e) processo - várias alternativas - indexação 9ª QUESTÃO: O ato de tomar decisões faz parte do cotidiano da vida e está presente em todos os seus aspectos, indo desde tópicos pessoais até decisões mais abrangentes, como no planejamento de grandes projetos que envolvem as organizações privadas e públicas. Com base nisso, explique o que caracteriza a decisão em condições de incerteza ou em condições de ignorância. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 151 10ª QUESTÃO: Costuma-se caracterizar a vontade sob os seguintes princípios. Caracterize o princípio de “atividade inteligente”. __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 152 Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 153 Considerações finais Caro aluno, chegamos ao término da disciplina Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade. As discussões que nortearam esta disciplina objetivaram esclarecer que a preocupação com a ética é fundamental para a manutenção da nossa vida social e dos direitos dos cidadãos, pois a democracia é alinhada à cidadania e à consciência ética. Nunca a história da humanidade se deparou com tamanho interesse acerca da ética, dos valores morais e das normas sociais como nos tempos atuais. O que se verifica nisso é que o cidadão de hoje despertou para o conhecimento de seus direitos e deveres primordiais. Aprendeu evolutivamente a distinguir o que é certo do que é errado, aprendeu a exigir e a fundamentar as suas decisões em preceitos puramente racionais. Em contrapartida, também passou a ser cobrado em suas respectivas obrigações, deveres sociais ou profissionais. Com efeito, o cultivo dos valores da cidadania e da responsabilidade social, profissional, ética e moral tornou-se fundamental para o bom convívio dos indivíduos no ambiente profissional e na esfera social. Sem o devido respeito às garantias individuais e às diferenças culturais, nunca poderemos obter conquistas e avanços sólidos em nossa sociedade contemporânea. Ao aprender a respeitar o outro, aprendemos a respeitar a nós mesmos, pois o direito do outro começa onde termina o nosso. Para tanto, precisamos perpetuar estes elementos estabelecendo regras claras e objetivas capazes de delinear uma conduta segura, válida e socialmente aceita entre os indivíduos. Enfim, uma vida melhor depende de uma vida com ética e responsabilidade social. A Universo Virtual parabeniza-o por ter concluído seus estudos, aumentando a sua bagagem com conhecimentos e habilidades que irão beneficiá-lo por toda a vida. Mas a sua aprendizagem não pára por aqui. Mantenha sempre o hábito da leitura e da pesquisa: atualize-se e não se esqueça de praticar o que foi aprendido. Sucesso! Equipe Universo Virtual. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 154 Conhecendo o autor O professor Delmo Mattos é Bacharel, Mestre e Doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atua como professor universitário e tutor em EaD na Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO), além disso, desenvolve pesquisas acadêmicas na área de Ética e Filosofia Política Moderna e Contemporânea. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 155 Referências ASHLEY, P. A. (Coord.). Ética e Responsabilidade Social nos Negócios. São Paulo: Saraiva, 2002. 340p. Escrita por 12 importantes pesquisadores sobre o assunto no Brasil esta obra é totalmente voltada à realidade brasileira. Fugindo da visão tradicionalista, mercantil ou puramente filantrópica, o livro utiliza-se de abordagem inovadora para mostrar o papel estratégico da responsabilidade social nos negócios. Além de apresentar os conceitos fundamentais, a obra dedica uma parte a exemplos e casos reais ocorridos nos mais diversos tipos de organizações no Brasil. ARRUDA, M.C.C. Código de Ética: Um instrumento que adiciona valor. 1ª. ed. São Paulo: Negócio, 2002. 390p. Nesta obra, o leitor terá acesso a um conjunto de informações para construir um novo código de ética, sintonizado com uma postura mais consciente. Nesta publicação, a autora traz exemplos concretos de código de ética de indústrias, associações, empresas multinacionais, bancos e serviços. CAMARGO, M. Fundamentos de ética geral e profissional. 3ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. 118p. Hoje se fala muito em ética: ética na política, nas relações compre entre pessoas, grupos e povos. Mas, o que seria propriamente a ética? O que a distingue de outras ciências humanas? Ética nas empresas: o que é? Como, entretanto, a ética vê o premiado ser humano? Este pequeno e denso livro propõe-se a responder estes questionamentos aos estudantes que dão os primeiros passos no Fundamentos da Ética Geral e Profissional. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 156 CHIAVENATO, I. Introdução à teoria geral da administração. 7ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 280p. A “Introdução à teoria geral da administração” oferece uma visão das organizações e do seu contexto, traz novidades da teoria administrativa, bem como indicações das tendências do moderno mundo organizacional. A idéia é manter o ITGA como a bíblia do administrador em um mundo em constante mudança e inovação. Como a TGA é ampla e mutável, as teorias tradicionais estão cedendo gradativamente mais espaço no livro para as teorias mais recentes e modernas. A idéia é preparar o leitor para o mundo novo que virá, sem deixar de lado o conhecimento sobre o mundo organizacional que está sendo superado gradativamente pelas inovações. DISKIN, L.; MARTINELLI, M.; MIGLIORI, R.F.; SANTO, R.C.E. Ética, Valores humanos e Transformação. 1ª. ed. São Paulo: Fundação Petrópolis, 1998, 200p. Com esse volume, dedicado ao potencial humano, ao autoconhecimento, à ética e aos valores humanos, os profissionais empenhados numa atuação mais integrada e flexível terão excelentes oportunidades para refletir sobre temas que vêm sendo ilustrados no Programa de Educação para a Paz, realizado pela Fundação Petrópolis e pelo Instituto de Estudos do Futuro. FISCHER, R. M. O desafio da colaboração: práticas de Responsabilidade social entre empresas e terceiro Setor. São Paulo: Editora Gente, 2002. 234p. Este livro aborda a questão da responsabilidade social comoum processo, não como mais um modismo corporativo. Apresenta os condicionantes que explicam o crescente engajamento de empresas em ações que buscam minimizar a exclusão social. Também demonstra a implementação de uma conduta socialmente responsável no dia-a-dia das atividades das empresas no mercado em relação aos impactos das ações empresariais na comunidade, com seus funcionários, clientes, fornecedores, etc. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 157 GOMES, L. F. A. M.; GOMES, C. F. S.; ALMEIDA, A. T. Tomada de decisão gerencial: enfoque multicritério. São Paulo: Atlas, 2002. 296p. Este livro é pioneiro no tratamento dos princípios e métodos analíticos do Apoio Multicritério à Decisão, técnica que permite a estruturação dos problemas decisórios e viabiliza sua análise, conduzindo à recomendação de soluções. O objetivo dos autores é tornar acessível à língua portuguesa um conjunto de conceitos que caracterizam o vasto campo da Administração e da Pesquisa Operacional, usualmente denominado em nosso idioma de “Apoio Multicritério à Decisão” ou, do ponto de vista essencial de suas aplicações, “Tomada de Decisão Gerencial”. Eles demonstram como os processos complexos de tomada de decisão podem ser facilitados quando se utiliza o enfoque multicritério. MACHADO, R. Nietzsche e a verdade. São Paulo: Brochura, 1999. 116p. Ao apresentar os aspectos crítico e afirmativo do pensamento nietszcheano, que vai ao passado para diagnosticar o presente, o autor focaliza sua análise da racionalidade científico-filosófica de Nietszche e explicita suas relações com a arte e a moral, além de fornecer instrumentos conceituais indispensáveis para uma crítica radical aos valores da sociedade contemporânea. MATTAR, J. A. Filosofia e Ética na Administração. São Paulo: Saraiva, 2004. 408p. Na obra, Filosofia e ética na administração o autor busca explorar os pontos de comunicação entre os universos da filosofia, da ética e da administração. Um de seus grandes destaques é a aplicação da filosofia e da ética na vida das organizações de forma clara, didática e completa. O livro aprofunda-se em algumas questões mais complexas, levando o leitor a refletir e a compreender melhor não só o mundo dos negócios, mas também a sociedade que o cerca e a si próprio. O livro traz para o debate e introduz as idéias de Chester Barnard e Mary Parker Follett, 'filósofos da administração' importantíssimos, mas que foram esquecidos e ignorados na história das idéias e da administração. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 158 MOREIRA, J. M. A Ética empresarial no Brasil. São Paulo: Pioneira, 2002. 389p. Neste livro, o autor desvenda muitos aspectos da ética das empresas e apresenta conceitos e temas de reflexão aplicáveis aos relacionamentos dessas organizações com seus clientes, fornecedores, concorrentes, empregados, autoridades e a sociedade em geral. STANLEY J. GRENZ & JAY T. SMITH . Dicionário de Ética. 1ª Edição. São Paulo: Brochura, 2005. 184p. Este dicionário de ética tem por objetivo ajudar o leitor a se tornar um bom eticista. Os autores desejam contribuir com esse objetivo grandioso fornecendo ao leitor um instrumento para que venha a ser um eticista mais bem informado. Para isso, apresentam definições ou descrições breves de alguns dos termos e nomes mais importantes encontrados em livros e em debates no vasto domínio da ética. Apesar de não serem exaustivas, essas definições visam a fornecer um conhecimento funcional básico dos conceitos fundamentais que se ligam a conversas em torno de ética. Entre os mais de 300 definições, você encontrará - termos, como altruísmo e virtude; Assuntos controversos, como eutanásia e guerra; Cosmovisão, como aristotelismo e utilitalismo; áreas de competição de valores e idéias, como ética publicitária e tecnológica. VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. 304p. Ao elaborar este volume, o grande objetivo de Adolfo Sánchez Vásquez foi introduzir o leitor nos problemas fundamentais da Ética nos dias de hoje. Além de abordar temas clássicos como 'o objetivo da ética', ' a essência da moral', 'o determinismo e liberdade' e ' a avaliação moral', o autor discute questões cruciais e pouco exploradas como moral e história, e forma lógica e justificação dos juízos morais. Usando uma linguagem clara e acessível, mas mantendo o rigor teórico e observando as exigências de fundamentação e investigação sistemática, Sánchez Vázquez examina os diversos fatores sociais que contribuem para a prática da moral. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 159 ARANHA, M. L. de A., MARTINS, M. H. P. FILOSOFANDO - Introdução à Filosofia. 3ª edição. São Paulo: Editora Moderna, 2001. 439p. Neste livro, as autoras propõem uma introdução à Filosofia tanto para alunos do Ensino Médio e dos ciclos básicos universitários, quanto para aqueles que desejam um conhecimento mais sistemático dos variados pensamentos filosóficos. O livro possui trinta e três capítulos distribuídos em seis unidades. Cada capítulo inicia-se com um texto básico contando ainda, a maioria deles, com leituras complementares que visam ampliar o conhecimento de textos de outros autores. No final de cada capítulo, há questões de interpretação para aprofundamento. O livro traz também projetos de trabalhos, filmografia, quadro cronológico, vocabulário dos principais conceitos filosóficos utilizados, orientação bibliográfica e índice de nomes. VALLS, Á. L.M. O que é ética. 9a edição. São Paulo: Ed.Brasiliense, 1996. 84p. Não existe povo ou lugar que não tenha noções de bem e mal, de certo e errado. Da Grécia Antiga aos nossos dias, a ética é um conceito que sempre esteve presente em todas as sociedades. Mas apesar disso, as dúvidas são muitas. Seria a ética apenas um conjunto de convenções sociais? Teria ela um princípio supremo que atravessa toda a história da humanidade? E numa sociedade capitalista, qual a relação entre ética e lucro? SROUR, H.S. Ética Empresarial. 8ª. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000. 389p. Nas empresas inseridas em mercados competitivos, as relações de trabalho passaram por radicais mudanças - os trabalhadores deixaram de ser descartáveis e desqualificados, para tornar-se trabalhadores qualificados e polivalentes. Ao operário clássico contrapôs-se uma nova espécie de operador, profissional sem uniforme, escolarizado e capacitado, portador de qualificações técnicas sujeitas à permanente reciclagem. Ao uso físico que se fazia da força de trabalho do primeiro, opôs-se a utilização das faculdades mentais do segundo. Todas essas transformações, no entanto, não resultaram de algum voluntarismo altruísta. Decorreram das inúmeras pressões que a cidadania organizada exerceu no cotidiano das empresas e das ruas. E o processo de intervenção política da sociedade civil veio testando as suas forças e veio redefinindo as relações capitalistas desde o período entre as duas guerras mundiais. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 160 HAMLYN, D.W. Uma história da filosofia ocidental. Rio de Janeiro: Jorge Zahar ed., 1990. 416p. Uma história dos grandes pensadores filosóficos, desde os pré-socráticos até as principais correntes da filosofia contemporânea, e suas respostas aos profundos problemas envolvidos na tentativa de entender o mundo e nosso lugar nele. ARISTÓTELES (Tradução de Mário da Gama Kury). Ética a Nicômacos. 4ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília - UNB, 2001. 240p. Ética Nicômaco é a principal obra ética de Aristóteles. Nela se expõe sua concepção teleológica e eudaimonista de racionalidade prática, sua concepção da virtude como mediania e suas considerações acerca do papel do hábito e da prudência na ética. É considerada a mais amadurecida e representativa do pensamento aristotélico. ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. 5ªed. São Paulo: Perspectiva, 2003. 350p. Entre o passado e o futuro é, entre os livros de Hannah Arendt, aquele que pulsa simultaneamente o conjunto de inquietações a partir do qual esta admirável representante da cultura de Weimar ilumina o discurso político do século XX. Ele contém praticamente todo o temário de sua obra, constituindo-se, portanto, num ponto de partida por excelência de toda a tentativa de interpretação e organização do seu pensamento. BORHEIM, G. A. Sartre. São Paulo: Editora Perspectiva, 2000. 320p. Autor busca as implicações metafísicas do pensamento sartriano a fim de elucidar as raízes e o alcance de seus dois conceitos básicos; o Ser e o Nada. Integram o volume dois textos suplementares que abordam a concepção sartriana da linguagem e o problema de Deus. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 161 PEREIRA, O. O que é moral? Sao paulo: Brasiliense, 1996. 90p. 'Eu crio a minha própria moral e o mundo que se dane!' Quem define assim a própria 'liberdade' de agir e pensar desconhece que a moral carrega uma contradição - ela nasce da interação dialética entre seu caráter social (herança preservada pela comunidade) e a convicção pessoal, alimentada por todos nós, de que o 'bom' para uns pode não ser bom para outros, e vice-versa. A moral tem, portanto, duas faces - pode servir à reação conservadora ou a postura revolucionária. LA BOÉTIE, E. Discurso da Servidão Voluntária. 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2001. 240p. Nesse livro, La Boétie analisou, com grande profundidade, o problema da tirania e da liberdade, concluindo que o maior bem do cidadão é a liberdade. O livro teve grande repercussão na Europa e foi amplamente analisado por Montaigne. O autor joga, intencionalmente, com o termo tirano, no decorrer da obra, confundindo-o, como na Antigüidade, com a acepção de rei. NASH, L. Ética nas empresas: boas intenções à parte. São Paulo: Makron Books, 2001. 359p. Este livro fornece informações para a implantação de um conceito de Ética nas empresas, além de descrever situações em que a falta de ética resulta em problemas graves internos nas organizações, em interrupções da rotina normal de trabalho e outras ocorrências danosas às empresas. Este livro consegue, ao lado de uma rica conceituação teórica, transmitir reflexões e conselhos eminentemente práticos aos que diariamente se confrontam com os dilemas éticos do mundo dos negócios. A autora fornece informações para a solução de problemas como - implantar conceitos éticos nas empresas; restabelecer os conceitos de integridade e bom senso; enxergar situações de ângulos diversos; formar condutas responsáveis nos negócios e também no âmbito individual. Este é um livro de Ética que, acima de tudo, enfatiza o fator liderança. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 162 MARRUS, M. R. A assustadora história do Holocausto. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. 436p. Esta obra estuda a gênese da ideologia anti-judaica dos nazistas, e em que medida esse pensamento existia no povo alemão ou fora inculcado por seus líderes. Analisa também, o surgimento da Endlösung, da Solução Final, e seu significado. Haveria uma intencionalidade central, vinda dos líderes do Reich, ou uma ação interminante, influenciada pelas mudanças de cenário de guerra, por explosões de ódio, ou, até mesmo, pela fria máquina dos burocratas? ROOS, Sir D. Aristóteles. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1987. 395p. Aristóteles é, com certeza, o pensador mais estudado e interpretado da história da Filosofia. Sua obra tem despertado interesse crescente, principalmente nas últimas décadas, o que fez com que o número de estudos sobre os aspectos da sua filosofia se multiplicasse. No entanto, nem sempre essas novidades e trabalhos recentes conseguem atingir a complexidade e excelência de conteúdo que estudos antigos preservam. Este livro, escrito há mais de cem anos, conserva a atualidade e a qualidade dos argumentos, tamanha é a afinidade entre os espíritos do intérprete e o do autor interpretado. É uma introdução valiosa a toda essa tradição em cujo renascimento recaem hoje as melhores esperanças de uma ciência que não seja inimiga da sabedoria. SÁ, A. L. de. Ética profissional. 4 ª edição. São Paulo: Ed. Atlas, 2001. 296p. Seguindo a tendência das ciências de se embasarem não só na lógica, mas também na metafísica, o livro estuda a consciência ética e o dever ético sempre com base em filósofos clássicos e modernos significativos no que diz respeito à ética profissional na sociedade contemporânea. Embora direcionado preferencialmente às Ciências Contábeis, curso em que a disciplina Ética é obrigatória, o livro propicia uma fonte de referência sobre o tema para professores, estudantes e profissionais das mais diversas áreas. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 163 SAVATER, F. Ética para meu filho. São Paulo: Martins Fontes, 2002. 189p. Como falar de ética a adolescentes sem cair na simples crônica das idéias morais ou na doutrinação casuística sobre questões práticas? Este livro não pretende resolver este problema nem ser um manual escolar de moralidade. Procura contribuir, filosófica e literalmente, para colocar da melhor maneira essa preocupação. Dirige-se especialmente aos leitores entre quatorze e dezesseis anos e nem tanto aos professores deles. SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. São Paulo: Nova Brochura, 2004. 257p. O texto O Existencialismo é um humanismo, foi escrito por Sartre para explicar o existencialismo e defender-se de críticas feitas por leigos. Nele, Sartre afirma que a existência precede a essência. Isto significa que não há uma receita para se fazer um ser humani, que Deus não é um artífice superior que antes de criar o homem já tinha seu rascunho em mente. Ou seja, temos que partir da subjetividade. Não há uma essência igual em todas as pessoas, explica Sartre, uma natureza humana, portanto não há uma lista de regras estabelecidas antes de o ser humano existir; então, ele as tem que criar por si mesmo. Não pode existir nada a priori, para Sartre, já que ele não acredita em Deus, em uma consciência perfeita que pudesse conceituar as coisas. TOFFLER, B. L. Ética no trabalho. São Paulo: Makron Books, 1993. 125p. Este livro contribui para a implantação de posturas comportamentais nas organizações, oferecendo uma detalhada visão dos principais códigos existentes na iniciativa privada e no serviço público, além de incluir um capítulo específico sobre 'como instituir uma ética de qualidade' e um questionário para 'auditoria ética'. A obra mostra ao leitor que as exigências do cidadão contemporâneo não recaem apenas em produtos ou serviços de qualidade, mas também de natureza ética. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 164 TUNGENDHAT, E. Lições sobre ética. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1997. 432p. Tugendhat iniciou seus trabalhos sobre filosofia prática após quinze anos de trabalho teórico. Dessa nova fase já resultaram suas dezoito "Lições sobre ética", que compõem, segundo o autor, sua obra mais expressiva. Nela ele aplica toda a sua capacidade em debates da ética contemporânea, com uma vitalidade empolgante. SILVA, F. L. Ética e Literatura em Sartre: ensaios introdutórios. São Paulo: UNESP, 2004. 264p. Este livro integra a Coleção Biblioteca de Filosofia, cujo objetivo é a publicação de trabalhos dos mais jovens e dos mais velhos, na busca de dar visibilidade ao que Antonio Candido (referindo-se à literatura brasileira) chama de 'um sistema de obras' capaz de suscitar debate, constituir referência bibliográfica nacional para os pesquisadores e despertar novas questões no intuito de alimentar uma tradição filosófica no Brasil, além de ampliar, com outros leitores, o interesse pela filosofia e suas enigmáticas questões. Mostra como a questão da éticaé relevante na obra de Sartre, considerada a abordagem concreta de delineamentos presentes nas reflexões do pensador francês sobre conceitos como a má-fé, o ser-para-si e o ser- para-outro. VERNANT, Jean-Pierre. Mito e Pensamento entre os gregos. 28ª ed. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 2005. 400p. Mito e pensamento entre os gregos é uma pesquisa sobre a Grécia antiga. Jean-Pierre Vernant oferece um sugestivo estudo das transformações psicológicas que a experiência grega preparou e da viragem que ela operou na história interior do homem Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 165 Anexos Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 166 Gabaritos Unidade 1 1. c 2. d 3. a 4. e 5. a 6. e 7 a 8 c 9 R: A moral refere-se ao conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada. 10 R: Para o autor, a ética relaciona-se com qualquer teoria científica. Sendo assim, seu papel é de explicar esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando os conceitos correspondentes. Unidade 2 1. b 2. a 3. b 4. b 5. c 6. a 7 e 8 a 9 R: O ato normativo é constituído pelas normas ou regras de ação e pelos imperativos que enunciam algo que deve ser. 10 R: Estes juízos que enunciam obrigações e avaliam intenções e ações segundo o critério do correto e do incorreto. Os juízos éticos de valor nos dizem o que são o bem, o mal e a felicidade. Ética, Valores Humanos e Transdisciplinaridade 167 Unidade 3 1. a 2. a 3. c 4. c 5. c 6. c 7 e 8 e 9 R: Um código de ética profissional é um acordo explícito entre membros de um grupo social, isto é, de uma categoria profissional, de um partido político ou de uma associação civil. 10 R: O objetivo primordial do código de ética profissional é expressar e encorajar no sentido da justiça e decência em cada membro do grupo organizado, deve indicar um novo padrão de conduta interpessoal na vida de cada profissional que esteja exercendo qualquer cargo na organização. Unidade 4 1. d 2. d 3. e 4. c 5. c 6. a 7 e 8 d 9 R: Decisão em condições de incerteza ou em condições de ignorância ocorre quando não se obteve informações e dados sobre os estados da natureza do processo decisório, ou mesmo em relação à parcela desses estados. A empresa possui dados e informações parciais, obtidos com probabilidade incerta ou é desconhecida a probabilidade associada aos eventos que estão provocando a decisão. 10 R: Este princípio pressupõe que não se deve atuar cegamente, pois conhece o fim a que tende; sabe dos meios de que necessita para atingir o fim; tem noção das consequências que resultarão da decisão tomada; pode ser orientada.