Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
FILOSOFIA FILOSOFIA DA MENTE Júlio Di Santi Sebastião Donizetti Bazon UNIDADE 01 - O QUE É FILOSOFIA DA MENTE? CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivo: Introduzir o campo de estudo da filosofia da mente. ESTUDANDO E REFLETINDO Apesar de antiga, a filosofia da mente sofreu seus maiores avanços a partir da segunda metade do século XX. Em aproximadamente cinquenta anos, o progresso neste campo foi maior do que aquele dos últimos dois mil anos. A obra que estabelece este marco divisório é O Conceito de Mente, de Gilbert Ryle. Esta aceleração brusca se deu por causa do desenvolvimento de novos campos científicos como a neurofisiologia e a psicologia cognitiva – até mesmo o surgimento dos computadores fez com que se iniciassem novas reflexões sobre a natureza da mente. Nesta primeira unidade, veremos em que consiste a filosofia da mente. A filosofia da mente consiste em reflexões sobre o estado mental, que juntos chamamos de mente – alguns deles exemplificados abaixo: 1) Sensações - como dores, calor, frio. 2) Percepções- como ver, ouvir, tocar. 3) Estados quase-perceptuais são os imaginativos – sonhar, imaginar. 4) Emoções - como ódio, amor, medo. 5) Cognições - processos racionais como compreender, aprender, pensar. 6) Estados conativos - os de intenção, como querer e desejar. A partir desta separação, nos surgem inúmeros questionamentos, como: Qual é a natureza destes estados? São biológicos? Os computadores são também capazes de tê-los? O que é o eu? E tais questões, por sua vez, trazem reflexões que vão além da mente, como, por exemplo: O que é uma pessoa? Qual é a natureza da ação humana? O ser humano, e isso é claro, não é apenas mente, mas possui um corpo – mas suas ações são calculadas pela mente. Então, ao iniciarmos um estudo sobre a filosofia da mente, temos que, antes de tudo, investigar um de seus conceitos mais importantes: a consciência. Tal conceito é importante, pois ele é paralelo ao da mente – já que todo ser que possui uma mente é consciente. Vejamos a definição de consciência dada por Costa: “Podemos definir consciência? Embora ouça um coro a dizer que não, creio que sim, posto que todos nós sabemos perfeitamente o que queremos dizer com a palavra. Minha vaga e esquemática definição é a seguinte: consciência é a experiência integrada que a mente tem da realidade externa e interna. O conceito chave aqui é o de experiência, pois não há consciência sem experiência. Mas não se trata de qualquer produto experimental: nos sonhos, temos experiência sem chegarmos a ter consciência. E a razão disso é que a experiência no sonho não é das coisas que admitimos que realmente sejam; ela não é verídica, mas deceptiva, ilusória. Além disso, para ser do que realmente é o caso, a experiência precisa vir coerentemente unificada, integrada a outras.” (Costa, p. 10) Costa, então, cita D. M. Armstrong (1926 – x), que separa a consciência em duas modalidades: a externa e a interna. BUSCANDO CONHECIMENTO As duas modalidades de consciência defendidas pelo filósofo australiano D. M. Armstrong são as seguintes: há duas modalidades, a perceptual, que se relaciona com o externo, e a introspectiva, que trata do lado subjetivo. A parte perceptual é usada quando usamos nossos sentidos – sempre que estamos acordados ela está ativa. Assim, quando uma pessoa dorme ou desmaia, ela está sem consciência. Dessa forma, ela é definida como a experiência que temos da realidade externa – de tudo que está à nossa volta. A parte introspectiva é a reflexão e a autoconsciência. E é definida inversamente: é a experiência da mente sobre a sua realidade interna: de seus próprios estados mentais. Ela é constituída por pensamentos, cognições de ordens superiores – como, por exemplo – quando uma pessoa está com raiva e sabe que está com raiva, ela tem uma cognição de segunda ordem sobre seu estado mental de raiva. É a consciência introspectiva que monitora, planeja e prevê ações. Uma forma de expressão importante da consciência introspectiva é a do eu, pois o homem adquire consciência de si mesmo através da percepção de seus estados mentais, que se repetem em situações, formando seu temperamento e personalidade. Para melhor refletir sobre o assunto, trago um excerto sobre o conceito de consciência.1 Função mental de perscrutar o mundo, conforme afirma Steven Pinker, a consciência é a faculdade de segundo momento – ninguém pode ter consciência de alguma coisa (objeto, processo ou situação) no primeiro contato com essa coisa; no máximo se pode referenciá-la com algum registro próximo, o que permite afirmar que a coisa é parecida com essa ou com aquela outra coisa, de domínio. A consciência, provavelmente, é a estrutura mais complexa que se pode imaginar atualmente. Na obra a mente humana, a consciência é instanciada, tecnicamente, em sete camadas: do nível zero, factual (onde as coisas acontecem), até uma atividade ômega, dois pontos acima do nível que experimentamos hoje (consciência padrão); aquele estado conhecedor que conhece, e que seria alcançado apenas pelo ser humano. António Damásio, em O Mistério da consciência, divide a consciência em dois tipos: consciência central e consciência ampliada. Inspirados na tese 1 Disponível: <pt.wikipedia.org/wiki/Consciência>, acesso em: 20/10/2014. damasiana, entende-se que a faculdade em pauta é constituída com uma espécie de anatomia, que pode ser dividida, didaticamente, em três partes: 1. Dimensão fonte - onde as coisas acontecem de fato, o aqui agora: o meu ato de escrever e dominar o ambiente e os equipamentos dos quais faço uso, o ato do internauta de ler, compreender a leitura e o ambiente que o envolve a todos os instantes, etc. Essa dimensão da consciência não retrocede muito ao passado e, da mesma forma, não avança para o futuro; ela se limita a registrar os atos presentes, com um espaço-tempo (passado/futuro) suficiente para que os momentos (presentes) tenham continuidade. 2. Dimensão processual - amplitude de sistema que abriga expectativas, perspectivas, planos e qualquer registro mental em aberto; aquelas questões que causam ruídos e impulsionam o ser humano à busca de soluções. Essa amplitude de consciência permite observar questões do passado e investigar também um pouco do futuro. 3. Dimensão ampla - região de sistema que, sem ser um dispositivo de memória, alberga os conhecimentos e experiências que uma pessoa incorpora na existência. Todos os conhecimentos do passado e experimentações pela qual o ser atravessou na vida: uma antiga profissão que não se tem mais qualquer habilidade para exercer, guarda registros importantes que servirão como experiência em outras práticas. Qual dimensão processual, esse amplitude da consciência permite examinar o passado e avançar no futuro - tudo dentro de limites impostos pelo próprio desenvolvimento mental do indivíduo. Além da anatomia de constituição, listada acima, a consciência humana também guarda alguns estados: Condições de consciência (vigília normal, vigília alterada e sono com sonhos), modos de consciência (passivo, ativo e ausente) e focos de consciência (central, periférico e distante). UNIDADE 02 - PROBLEMA DO DUALISMO: A MENTE E O CORPO CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender alguns dos principais aspectos da relação mente-corpo discutidos em filosofia da mente. ESTUDANDO E REFLETINDO O Dualismo – A visão de René Descartes René Descartes nasceu em 1596 em La Haye. Foi um dos principais pensadores do século XVII. Em sua obra filosófica – sendo as principais O Discurso do Método e Meditações Metafísicas-, ele tenta provar o dualismo e entre seus inúmeros argumentos, encontramos o seguinte: pode-se pôr em dúvida a existência do corpoe da realidade, mas não a própria existência, pois para se duvidar de algo, é preciso existir. Portanto, o “eu” é indistinto do corpo material. (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ren%C3%A9_Descartes). O filósofo também chega a uma outra conclusão a respeito da mente: se ela existe independentemente do mundo material, ela existe sem depender de mais nada para existir – é a definição de substância. Para Descartes, há dois tipos de substância – a material e a mente. O atributo principal da primeira é chamado René Descartes de extensão, o da segunda é o próprio pensar. Notemos que, para Descartes, esta substância pensante é o equivalente à ideia de alma defendida pela religião. Esta visão racionalista de Descartes encontra inúmeros problemas: apenas o fato de duvidar não significa que mente e corpo são separados, por exemplo. Mas o maior problema de todos surge com o desenvolvimento científico – pois a razão não consegue dar conta de inúmeros mistérios: quando teria surgido a alma? Como explicar o funcionamento do cérebro? Qual é o papel do cérebro. Quanto mais se desenvolve o cientificismo, mais a visão dualista de Descartes se isola. Behaviorismo Analítico Contra a tradição dualista, a discussão entre o problema mente-corpo criou o chamado Behaviorismo Analítico, defendido principalmente por Gilbert Ryle (1900-1976). A ideia principal desta linha de pensamento é a de que o mental – toda a subjetividade – não possui função. Tudo que é um processo mental precisa ser analisado em termos de comportamento – ou “disposição para se comportar”. Ao transformar todos os reflexos mentais em um comportamento ou demonstração de comportamento, o Behaviorismo tenta superar a visão dualista cartesiana. Porém, há inúmeras falhas nesta teoria. Ao “erradicar” a subjetividade, é quase que instintivo os seres humanos aceitarem esta teoria: a dor, uma das características comuns a todos os seres humanos – todos a sentem – segundo o behaviorismo, ela não existe se não traduzida em comportamento. Ora, isso é contraditório, pois ele rejeita a subjetividade humana. Eliminacionismo Outra solução para o problema da relação entre mente e corpo foi levantada por Paul Feyerabend (1924-1994) – o eliminacionismo. Esta é uma solução radical que defende que o entendimento comum que o homem pensa ter da mente é falso. Assim, para os filósofos, que defendem tal teoria, todo o vocabulário usado sobre estados mentais é falso, e a psicologia popular precisaria desaparecer e ser substituída pela neurofisiologia. Feyerabend defendeu que a visão popular que o ser humano tinha da mente era altamente incompatível com a visão do pensamento científico. Assim, a psicologia precisa ser revista a partir de uma nova investigação da mente e do cérebro. Esta teoria também ganha inúmeros críticos, pois a presença da mente e dos estados psicológicos é inquestionável. Os eliminacionistas então respondem que estas intuições são falsas, assim como o homem achava que o sol girava ao redor da terra. Teoria da Identidade A partir da segunda metade do século vinte, a teoria da identidade começou a substituir o behaviorismo analítico, e a ideia é bastante simples: estados mentais correspondem a estados cerebrais. Então, estímulos no cérebro criariam as sensações físicas. Há algumas identificações (como, por exemplo a ansiedade, que seria causada por efeitos corticais, causados por descargas neuronais nos sistema límbico), mas a neurociência ainda está engatinhando. Se um dia essa teoria for provada – a relação entre mente e corpo seria resolvida de uma maneira simples – e tudo seria reduzido a acontecimentos físicos. Esta teoria também foi com o tempo abandonada pelos filósofos, principalmente porque o cérebro é capaz de uma múltipla realização: ele é plástico em suas funções – quando uma pessoa sofre um dano cerebral e perde, por exemplo, a fala, outras partes do cérebro podem aprender a desempenhar essa função. BUSCANDO CONHECIMENTO Funcionalismo A teoria da identidade fez um breve sucesso, pois, a partir da capacidade de múltiplas realizações do cérebro, os filósofos surgiram com a ideia do funcionalismo, que é a seguinte: há coisas que se definem pela sua materialidade – como um grão de areia, uma árvore, etc. E há outras que se definem pela função que têm. Uma cadeira é considerada pela sua função, e não pelo seu material, por exemplo. Importante é o cumprimento da função. Assim, a mente se define não pela sua função. Por exemplo, um fenômeno como a dor tem um papel funcional definido dentro do sistema funcionalista – quase como um computador – em que há uma relação de input e output, que estabelecem a ligação com o meio. A configuração física ou o que causou a dor são apenas aspectos deste evento. É feita inclusive uma analogia entre o cérebro e o computador – em que há o hardware, que é o sistema físico, e o software, que é o que se instala no sistema. No caso, o cérebro seria o hardware e a mente, o software. Quando pensamos no funcionalismo como um caso extremo, chegamos inclusive na questão da imortalidade: há quem acredite que, quando a inteligência artificial estiver completamente desenvolvida, poderemos implantar uma mente humana em um computador – e é nessa estranheza extrema que se começa a suspeitar do funcionalismo: se pensamos, por exemplo, na dor ou no prazer – todos sabemos que ambos têm um valor, que são estados de qualidade que vão além de uma simples qualidade funcional. Quando pensamos na mente sendo “carregada” em um computador, onde entrariam esses estados qualitativos? Um robô simula dor, raiva, mas não as sente. Assim, um dos grandes empecilhos para o funcionalismo é o fato de que apenas um cérebro biológico poderia sentir e reproduzir esses estados mentais tão sutis, complexos e profundos. As qualidades sensoriais são sentidas apenas por seres vivos, biológicos. UNIDADE 03 - INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Conhecer a proposta das inteligências múltiplas ESTUDANDO E REFLETINDO Howard Gardner (1943 – x) é um dos psicólogos cognitivos mais importantes da atualidade, que contribuiu fortemente para a filosofia da mente com sua obra “Estruturas da Mente”, em que ele propõe sete tipos de inteligência com sua teoria das inteligências múltiplas. Iremos abordar nesta unidade a visão que o psicólogo tem sobre inteligência. No mundo inteiro sempre se tentou medir a inteligência de maneira quantitativa. Em um teste de Q.I. (quantidade de inteligência), sempre nos deparamos com inúmeras perguntas sobre inúmeros assuntos, para depois chegarmos a um número que traduziria nossa inteligência. Mas como poderia ser possível medir uma inteligência? Peguemos exemplos diferentes para clarear essa pergunta: um jovem de quinze anos que dominou a língua árabe, outro de quinze anos que compõe canções e outro que dominou a arte da navegação. São três comportamentos completamente diferentes, mas altamente inteligentes. Este exemplo serve para mostrar que os métodos de avaliação da inteligência são incompletos. Não se trata de uma questão para melhorar a maneira como são realizados estes testes, mas, sim, de mudar a percepção que nós mesmos temos sobre o que é de fato inteligência. A visão ocidental sobre a inteligência começou a ser moldada há mais de dois mil anos, na civilização grega. Desde aquela época, notava-se e enfatizava-se a importância dos poderes mentais como a razão, a mente... Temos desenhadas na história frases que foram costurando o apreço ao conhecimento: o conhece-se a ti mesmo de Sócrates, o penso logo existo de Descartes e assim por diante. Outras funções, porém, ao longo da história também foram valorizadas: sentimento, fé coragem, por exemplo, mas sempre em contraste com o conhecimento. Quandoum era valorizado, o outro era deixado de lado. Entretanto, razão, inteligência, lógica, conhecimento não são a mesma coisa e o que Howard Gardner propõe é uma maneira de separar estes conceitos como “mentais”. Durante muito tempo, foi comum dar valor a inúmeras partes da mente – por exemplo, na época clássica, ela era separada em razão, vontade e sentimento. Com o surgimento da psicologia, a mente foi dividida por alguns pensadores, que criaram dezenas de competências mentais – alguma áreas progrediram e outras não (como o debate entre fé e razão). Mas quando comparados os avanços como o de Darwin, Kepler, Copérnico – o progresso, às vezes, surge por mostrar um erro lógico ou simplesmente quando inúmeras evidências são agrupadas (como no caso de Darwin). BUSCANDO CONHECIMENTO Para estabelecer e justificar a elaboração dos sete tipos de inteligência, Howard Gardner estabeleceu alguns critérios e requisitos que, antes de tudo, estabelecem uma “inteligência”. Uma competência intelectual precisa apresentar habilidades para resolver problemas e também para criar problemas, pois assim permite a aquisição de novos conhecimentos. Ele apresenta oito “sinais” que caracterizam uma inteligência: a) isolamento potencial por dano cerebral Se uma faculdade particular pode ser destruída através de um dano cerebral, fica mais aparentada sua provável “autonomia” de outras inteligências. Assim, a partir de uma lesão cerebral, pode-se notar que as diferentes estruturas da mente podem existir. b) a existência de idiots savants A existência de savants é outro indício das inteligências múltiplas. A partir de um dano cerebral, há pessoas que desenvolvem fortemente apenas uma única capacidade, de maneira extrema. Assim, podemos observar a inteligência humana isolada em apenas uma capacidade. Assim, a alegação de uma existência específica pode ser mais plausível. c) uma operação central ou conjunto de operações identificáveis Gardner considera central para suas concepções de inteligência a existência de operações ou mecanismos de processamentos de informações que possam lidar com tipos específicos de input. Assim, pode-se inclusive pensar em uma inteligência humana como “um mecanismo neural ou sistema computacional geneticamente programado para ser ativado ou “disparado” por determinados tipos de informação interna ou externamente apresentados.” A partir desta definição, precisa-se, então, localizar estas operações centrais para mostrar que tais centros são separados. d) uma história desenvolvimentista distintiva, aliada a um conjunto definível de desempenhos proficientes de expert “estado final” Uma inteligência deve ter uma história desenvolvimentista identificável – pois, a não ser em casos específicos, ela não se desenvolve isoladamente, então, é preciso localizar as situações onde ela encontrar um papel central. E também dever-se-ia “provar ser possível identificar níveis discrepantes de inteligência, variando dos inícios universais, através dos quais todo novato passa, até níveis de competência cada vez mais elevados que podem estar visíveis apenas em indivíduos com talento incomum ou em formas especiais de treinamento. e) uma história evolutiva e a plausibilidade evolutiva Uma inteligência fica ainda mais plausível quando se podem localizar seus antecedentes evolutivos – desde períodos de crescimento rápido na pré-história e até mesmo nas vias evolutivas, que não floresceram podem acrescentar ao assunto. f) apoio de tarefas psicológicas experimentais Muitos testes experimentais explicam melhor o funcionamento de experiências separadas. Os estudos mais sugestivos são os de tarefas que interferem umas nas outras e que se transferem a diferentes contextos. g) apoio de achados psicométricos Além de experiências psicológicas, testes padronizados também colaboram com o estudo das inteligências múltiplas (testes como o de Q.I.). Apesar de Gardner ser contra a definição de inteligência a partir de um teste, eles o ajudam muito na definição de uma inteligência. O que ele diz é que normalmente tais testes não avaliam o que propõem testar. h) suscetibilidade à codificação em um sistema simbólico Segundo Gardner, “grande parte da representação e da comunicação humana de conhecimento ocorre através de sistemas de símbolos – sistemas de significados culturalmente projetados que captam formas importantes de informação. Linguagem, desenhos, matemática são apenas três dos sistemas de símbolos que se tornaram importantes no mundo inteiro para a sobrevivência e a produtividade humana. Embora possa ser possível que uma inteligência prossiga sem seu próprio sistema especial de símbolos, ou sem alguma outra arena culturalmente delineada, é bem possível também que uma característica principal da inteligência humana seja sua gravitação natural em direção à incorporação em um sistema simbólico. Para Gardner, antes de entrarmos nas inteligências específicas, falta atentar que as inteligências não são equivalentes a sistemas sensoriais. Não dependem de nenhum sistema também. Precisam ser consideradas como entidades com sistemas e regras próprios: “Embora o olho, o coração e os rins sejam órgãos do corpo, é um erro tentar comparar estes órgãos em cada detalhe, a mesma restrição deveria ser observada o caso das inteligências.” UNIDADE 04 - INTELIGÊNCIA LINGUÍSTICA/MUSICAL CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender mais profundamente as características das inteligências linguística e musical descritas por Howard Gardner. ESTUDANDO E REFLETINDO Inteligência Linguística A competência linguística para Gardner é a mais abrangente e espalhada das inteligências – afinal de contas, toda a comunicação humana é baseada em linguagem. Para ele, o poeta ou o escritor têm essas qualidades desenvolvidas muito acima da média, mas todo ser humano apresenta essa competência também. E tal inteligência apresenta algumas funções claras para os indivíduos “normais”: 1) aspecto retórico da linguagem – a capacidade de usar a linguagem para convencer o outro de algo – desde um político até mesmo uma criança de cinco anos trabalham este aspecto da linguagem. 2) potencial mnemônico da linguagem – que é a capacidade de usar a linguagem para lembrar de informações – desde um mero número de telefone até as regras de um jogo ou de uma empresa. 3) papel da explicação – o ensino e a aprendizagem, em sua maior parte, ocorrem através da explicação: em sua história, o ser humano sempre depende dela para trocar informações, explicar, ensinar – seja através do texto oral, ou no texto escrito. A linguagem sempre está presente. 4) o seu potencial metalinguístico – que é o potencial da linguagem, pode explicar e refletir sobre suas próprias atividades. Desde uma simples pergunta: Você quis dizer X ou Y? O que faz com que a pessoa reflita sobre o que acabou de dizer e até mesmo sobre a própria filosofia da linguagem e da linguística. As habilidades linguísticas O desenvolvimento das habilidades linguísticas de uma criança é um fenômeno inexplicável e até mesmo assustador para alguns programadores de linguagem de computador. Segundo o linguista Noam Chomsky, as crianças nascem com um dom inato sobre regras e formas de linguagem que devem possuir como parte de seu direito de nascimento hipóteses sobre como decodificar e falar a língua ou qualquer linguagem natural – assim, uma criança que nasce na China, aprende a falar chinês. Mesmo assim, não é possível explicar a rapidez com que isso acontece. As crianças dominam as regras gramaticais muito rapidamente e cada uma à sua maneira – desde o tipo de palavra que elas pronunciam – algumas exclamam coisas, outras evitam substantivos e assim por diante. O desenvolvimento do escritor O escritore filósofo Jean Paul Sartre era um prodígio em suas capacidades linguísticas – ao exercitar sua inteligência linguística, ele descobriu seus potenciais: “Ao escrever eu estava existindo... minha caneta corria tão rápido que era comum que meu punho doesse. Eu jogava os cadernos preenchidos no chão e, enfim, esquecia deles, eles desapareciam... Eu escrevia para escrever. Não me arrependo disso; se eu tivesse lido, teria tentado agradar. Eu teria me tornado um prodígio de novo. Sendo clandestino, eu era verdadeiro.” Sartre. Como muitos escritores preconizam, a prática é o segredo para o sucesso. Como um músculo, a habilidade de escrever precisa ser exercitada, dizem os escritores. Ao menos, muitos deles. E, assim, ao refletirem sobre o próprio processo criativo, eles esclarecem inúmeros fatores sobre ele. O desenvolvimento através da prática faz com que o escritor domine seu “mestre poético” e encontreo caminho correto para expressar suas palavras e ideias – ele desenvolve quase ao máximo sua competência linguística. A linguagem como ferramenta Na maioria dos casos, porém, a linguagem não é usada como um foco, mas como um meio – uma ferramenta para que as pessoas consigam executar o que querem. Mesmo cientistas, eles usam da linguagem para explicar suas descobertas, através de metáforas ou ensaios. O uso desta ferramenta difere de um poeta ou de um escritor, que escolheu a dedo palavras – um ensaísta, antes de tudo, quer transmitir um conteúdo e usa a linguagem para isso. BUSCANDO CONHECIMENTO A Inteligência Musical Quando pensamos em inteligência musical, podemos visualizar logo aqueles jovens prodígios que desde cedo já demonstram um talento altamente desenvolvido. Desde um que tenha o chamado “ouvido absoluto” e saiba reconhecer qualquer nota, até outro que domine com facilidade qualquer instrumento, e também outro que possa reproduzir com precisão qualquer sinfonia tocada. Este tipo de inteligência desenvolvida está para o âmbito musical assim como a poeta está para a linguística. O compositor americano Roger Sessions relatou que o compositor pode ser claramente identificado como um homem que tem sons na mente – está sempre reconhecendo sons e padrões musicais na superfície de sua consciência. A composição vale dizer, uma música começa com esta “ideia musical” que paira na mente do músico. Outros compositores fazem coro a Sessions, dizendo que a arte de compor é como uma macieira produzindo maçãs. A mente musical é marcada por uma memória tonal e quando ela assimila inúmeras experiências de tom é que começa a funcionar criativamente. Já Stravinsky indicou que “compor é fazer e não pensar.” Componentes da inteligência musical Os dois componentes principais da inteligência musical são tom e ritmo. O primeiro seria a própria melodia, enquanto que o segundo seria a maneira como tais sons se agrupam. Parte da organização do som é horizontal – os tons se desenrolam no tempo, e parte da organização é vertical – os sons podem ser emitidos ao mesmo tempo. Após som e ritmo, o timbre é a próxima qualidade fundamental. No trecho acima, a música está relacionada a afeto e prazer, o que configura um dos seus enigmas principais. Vejamos: a ciência ao longo dos séculos vem tentando transformar a música em matemática, o que ressalta a racionalidade da música. Mas não se deve esquecer que ela também se atém ao efeito que causa nos indivíduos. Para Sessions, a música não pode expressar medo, mas seus movimentos poder ser agitados, violentos e repletos de suspense. “A música se expressa a si mesma.”, diz Stravinsky. Mas até então falamos apenas de compositores – e de pessoas que desenvolveram fortemente este talento musical. Mas em indivíduos que não são músicos e compositores, esta inteligência também se manifesta. Em pesquisa feita notou-se que todos os sujeitos reconhecem estruturas musicais – sabem julgar qual delas é adequada ou não a uma música, sabem reconhecer escalas e ritmos. E também os relacionamentos entre as tonalidades. Sabem, ainda, completar segmentos de música sem que o sentido musical se perca. O mesmo acontece no nível linguístico: nem todos são poetas, mas ainda assim expressam sua competência linguística, cada um a sua maneira. Quanto ao desenvolvimento da competência musical, pouco se pode dizer. Mas alguns estudos mostram um retrato humilde de como isso acontece: os bebês já cantam e balbuciam, emitem sons e até mesmo brincam com eles. Alguns estudiosos defendem que há bebês que são mais sensíveis a sons do que a palavras. Nos dois anos de idade, há um marco neste desenvolvimento: as crianças começam pela primeira vez, por conta própria, a emitir sons em intervalos pontilhados e inventam músicas espontâneas – a ponto de dizer que as crianças de nossa cultura assimilam e descobrem cedo como é a estrutura de uma canção e do que ela precisa. Na sabedoria popular, a área mais ligada à música é a matemática. Desde Pitágoras, esta relação vem sendo elaborada e estabelecida. UNIDADE 05 - INTELIGÊNCIA LÓGICO/ESPACIAL CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender o funcionamento das Inteligências lógico e espacial. ESTUDANDO E REFLETINDO Inteligência Lógico / Matemática Até então, estudamos duas inteligências que têm origem na esfera auditiva e oral (a musical e a linguística). Ao contrário, esta forma de pensamento se origina a partir do confronto com o mundo físico – dos objetos. Pois é ordenando-os, classificando-os e avaliando-os que a criança começa a adquirir domínio e conhecimento sobre o mundo lógico-matemático. Isto preliminarmente – depois de confrontar os objetos, invariavelmente, com o curso do desenvolvimento da razão, o indivíduo torna-se mais capaz de apreciar as ações que pode desempenhar. Neste ponto, as relações prevalecem sobre as ações e, assim, de certa maneira, as ações sobre os objetos se tornam apenas abstrações mentais – o ápice da lógica e ciência. Para entender de que maneira se desenvolve o pensamento lógico-matemático, Gardner se baseia no pensamento do psicólogo Jean Piaget. Para Piaget, todo conhecimento (racional) deriva antes de tudo, das ações do homem sobre o mundo. E, assim, o estudo do pensamento começaria com recém-nascidos. No berço, o bebê mantém relações causais com objetos, explora todos eles. Mas em uma experiência - momento-a-momento - ou seja, quando o objeto some, ele também some da consciência da criança. Após dezoito meses de vida, ele começa a perceber que os objetos não desaparecem quando somem – mas que eles ainda existem. É o estado chamado de permanência do objeto. Assim que o bebê reconhece tal permanência, pode, então, se referir a eles, reconhecer similaridades, diferenças – até mesmo agrupar objetos. Ao agrupá-los, ela mostra que reconhece classes e conjuntos diferentes. Porém, não há um aspecto quantitativo – elas não reconhecem números nem quantidades – como mostra a dificuldade que elas têm em fazer contas. E esta inabilidade de contar dura até por volta dos quatro, cinco anos. Mesmo que a criança aprenda a contar antes, seria apenas uma repetição mecânica dos números. Ocorre que, nesta idade, ela aprende que esta série de números abstratos pode ser relacionada com números, ou seja, aprende concretamente e começa realmente a dar valor para os números. Por volta dos seis, sete anos, ela já pode contar e comparar esses números – já aprendeu com segurança a noção de quantidade. Para Piaget, este processo é extremamente importante porque a criança aprende a igualar com base em números de dois conjuntos mentais – ou seja, é capaz de comparar o número em um conjunto com o número em outro, mesmo quando não são conjuntos idênticos. E, a partir disso, ela começa a realizar novas operações, mais complexas – ela aprende as quatro operações básicas:somar, subtrair, dividir e multiplicar. Mas ela aprende para manusear coisas no mundo concreto – ou seja, todas essas operações dependem inicialmente de um manuseio de objetos. Tais ações, porém, podem ser realizadas mentalmente – e, após um tempo, elas são realmente internalizadas. O manuseio torna-se desnecessário. A necessidade lógica vem para dar conta das operações básicas. É o período de sete a dez anos, que Piaget chamou de operações concretas. Cabe ressaltar que neste período a criança ainda realiza essas operações com ações restritas a objetos físicos que possam ser manipulados. O próximo passo, que é essencial para Piaget, e também o considerado estágio final do desenvolvimento mental. Durante os primeiros anos de adolescência, a criança normal torna-se capaz de realizar operações mentais formais. Ela pode operar não apenas sobre os próprios objetos, mas também sobre palavras, símbolos ou sequência de símbolos. Ela pode inferir hipóteses e prever consequências. Gardner observa, porém, que apesar de ter esboçado a trajetória defendida por Piaget apenas no âmbito matemático, ela se estende a outras áreas. Limitá-la ao âmbito numérico seria grosseiro. Assim, para Piaget, esta sequência desenvolvimental se estabelece em todos os domínios do desenvolvimento, inclusive o tempo, espaço e causalidade. O trabalho do matemático “Se a matemática envolve apenas as regras da lógica supostamente aceitas por todas as mentes normais, por que alguém deveria sentir dificuldades para entender matemática?” Esta pergunta foi levantada pelo matemático Poincaré e faz bastante sentido: enquanto que na música ou na poesia conseguimos desfrutar o trabalho de uma inteligência desenvolvida, quanto mais avança a matemática, mais nos distanciamos dela. E não através da memória que o matemático consegue reter as novas teorias e ideias – já foi visto em inúmeros testes que eles não apresentam os melhores índices da qualidade mnemônica. Poincaré distingue então duas habilidades: uma é a memória para etapas numa cadeia de raciocínio, o que poderia ser eficiente para a recordação de determinadas demonstrações. A outra, e de longe a mais importante, é o reconhecimento da natureza das ligações entre as proposições. Pois se tais ligações são reconhecidas, elas podem ser reestruturadas e reinventadas. Mas, para Poincaré, e também para outros matemáticos, apenas seguir a lógica é mais fácil – e é quase impossível de se fazer uma “boa matemática”. O que caracteriza um bom matemático, então? Segundo o matemático Adler, a verdadeira matemática quase nunca ultrapassa sua própria disciplina, ou seja, eles raramente são talentosos em economia, por exemplo. O que o define é o amor por tratar com a abstração, a “exploração, sob a pressão de poderosas forças implosivas, de problemas de difíceis por cuja validade e importância o explorador, enfim, é considerado responsável pela sua realidade.” Assim, há uma liberdade de especulação do matemático que significa uma vontade de mudar a maneira de se estruturar o mundo – o matemático é um criador de padrões, mas as características especiais dos padrões matemáticos são que eles tendem mais a ser permanentes porque eles são feitos por ideias. BUSCANDO CONHECIMENTO A inteligência espacial Tome por exemplo um pedaço de papel quadrado. Dobre-o no meio e então dobre-o novamente duas vezes no meio. Quantos quadrados existem após esta dobradura final? Este é um dos exemplos de problemas que testam nossa inteligência espacial. Ou, por exemplo, considere alguns problemas que exigem a construção de uma imagem mental: que torneira controla a água quente? O que é mais alto: o zênite da cauda de um cavalo ou a sua cabeça? Vejamos a definição de Gardner sobre a inteligência espacial: “Estão centrais à inteligência espacial as capacidades de perceber o mundo visual com precisão, efetuar transformações e modificações sobre as percepções iniciais e ser capaz de recriar aspectos da experiência visual, mesmo a ausência de estímulos físicos relevantes. Pode-se ser solicitado a produzir formas ou simplesmente manipular as que foram fornecidas. Estas capacidades são claramente não idênticas: um indivíduo pode ser arguto, digamos, em percepção visual, embora tenha pouca capacidade para desenhar, imaginar ou transformar um mundo ausente. Assim como a inteligência musical consiste de capacidades rítmicas e de afinação que são às vezes dissociadas entre si e que a inteligência linguística consiste em capacidades sintáticas e pragmáticas que podem também tornar-se desacopladas, do mesmo modo a inteligência espacial emerge como um amálgama de capacidades (...) De alguns pontos de vista seria adequado propor o descritivo visual porque nos seres humanos normais a inteligência espacial encontra-se intimamente ligada e parte mais diretamente da observação que a pessoa faz do mundo visual. (...) Mas parece preferível falar da inteligência espacial sem liga-la inextricavelmente a qualquer modalidade sensorial específica.” (GARDNER, p. 135) UNIDADE 06 - INTELIGÊNCIA CORPORAL CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender as inteligências corporal e pessoal. ESTUDANDO E REFLETINDO A Inteligência Corporal-Sinestésica Para explicar a natureza da inteligência corporal, Gardner descreve uma cena do trabalho do mímico Marcel Marceau. O mímico é um performer, dos raros. Para realizar suas simples ações, ele se utiliza de uma inteligência que não é cultivada pela nossa sociedade – a corporal-sinestésica. É característica desta inteligência usar o corpo de maneiras diferenciadas e hábeis para propósitos expressivos assim como voltados a objetivos. É também característico dela usar objetos de maneira motora e hábil. Assim, essas duas capacidades são objeto principal do estudo de Gardner: controlar os movimentos do próprio corpo e a capacidade de manusear objetos com habilidade. Assim, quando buscamos imaginar que tipos de pessoas têm essa capacidade desenvolvida, pensamos em dançarinos, nadadores, jogadores de bola, instrumentistas, artesãos, atores, inventores. Apesar disso, não se deve confundir com outros tipos de inteligência – pois é impossível que se exerça apenas uma delas. Quando pensamos em uso hábil do corpo, podemos voltar inclusive para a Grécia antiga, cujos artistas reverenciavam as formas perfeitas do corpo. Através de atividades artísticas e atléticas, esse ideal era cultivado. Eles buscavam, e isso vale ressaltar, uma harmonia entre mente e corpo – pois com a mente treinada, seria mais fácil de utilizar o corpo. A inteligência do corpo possuía outros propósitos, inclusive como mostra o escritor Normal Mailer: “Há linguagens além das palavras, linguagens de símbolos e linguagens da natureza. Há as linguagens do corpo. E o pugilismo é uma delas. O pugilista... fala com um domínio do corpo que é tão desprendido, sutil e abrangente em sua inteligência quanto qualquer exército da mente. Ele se expressa com graça, estilo e um instinto estético surpreendente quando boxeia com seu corpo. O boxe é um diálogo entre corpos, é um rápido debate entre dois conjuntos de inteligências.” MAILER, p. 163 A princípio, definir o corpo como algo inteligente por si só pode ser chocante. Isso se dá porque em nossa sociedade os trabalhos do corpo são vistos com muito menos valor que os trabalhos racionais. Mas, de certa forma, nosso centro motor muitas vezes é até mais rápido que a mente. O exemplo perfeito disso é que nosso corpo, quando dirigimos um carro, por exemplo, age sem que pensemos. A mente está livre para outras atividades, enquanto o corpo realiza as inúmeras tarefas para o carro ir para a frente. Mas, se parássemos para pensar em cada tarefa, nós nos confundiríamos ou inclusive dirigiríamos mais devagar. BUSCANDO CONHECIMENTO Quando pensamosna inteligência corporal e nas suas capacidades e possibilidades, notamos que o desenvolvimento dessa habilidade no performer, por exemplo, faz com que se possa traduzir a intenção em ação, e com uma suavidade geral de desempenho. Um performer perito realiza sua tarefa com tanta maestria que parece que ele tem o tempo todo do mundo para fazer o que deseja. A dança como forma madura de expressão corporal Exemplificando casos em que a inteligência corporal pode ser bastante desenvolvida, podemos falar sobre a dança. É o uso mais desenvolvido e refinado do corpo, de inúmeras maneiras diferentes, ao redor do mundo. A dança, segundo Judith Hanna, seria então sequências culturalmente padronizadas de movimentos corporais não verbais, propositados, intencionalmente rítmicos e que apresentam valor estético aos olhos daquele para quem o dançarino está se apresentando. A dança, então, pode ser uma forma de comunicação e expressão, mesmo que seja difícil que bailarinos descrevam seu trabalho de maneira concreta – ou lógica: “Muitas vezes tenho comentado sobre a extrema dificuldade de manter, com a maioria dos dançarinos, qualquer tipo de conversação que tenha coesão lógica – as mentes deles apenas parecem ficar pulando – a lógica ocorre no nível da atividade motora.” GRAHAM, p. 174 Tal visão só nos reforça a ideia de que a inteligência corporal vai além da inteligência racional, a ponto de conseguir transformar movimento não só em linguagem, mas em sistema simbólico. Para refletir sobre o assunto, apresento um excerto da dissertação de mestrado da pesquisadora Fernanda Castro Manhães que analisa a inteligência corporal.2 Inteligência Corporal Cinestésica Características: o núcleo desta inteligência é o controle dos movimentos do corpo e o manejo hábil dos objetos, com fins expressivos ou para atingir metas. É a capacidade de trabalhar habilmente com objetos, tanto os que envolvem a motricidade dos dedos quanto os que exploram o uso integral do corpo. O valor desta inteligência é estimado de forma diferente em diversas culturas. A inteligência corporal completa um trio de inteligências relacionadas a objetos manipulados ou transformados, como a inteligência lógico-matemática, que cresce. A partir da padronização de objetos em conjuntos numéricos; a inteligência espacial, que focaliza na capacidade do indivíduo de transformar objetos dentro do seu meio e de orientar-se em meio a um mundo de objetos no espaço; e a inteligência corporal que, focalizando internamente, é limitada ao exercício que leva a ações físicas sobre os objetos no mundo (GARDNER, 1995). 2 Disponível: <http://www.pgcl.uenf.br/2013/pdf/cognicao_6587_1240934073.pdf>, acesso em: 22/10/2014. Habilidades: controle de partes específicas do corpo com o objetivo de resolver problemas ou criar produtos, movimentos atléticos, criativos (incluindo a capacidade de resposta física ao ritmo da música), coordenação motora e controle corporal, criação de coreografias. Estados Finais ou Domínios: É evidente em atletas, dançarinos, cirurgiões, artesãos, mímicos, inventores, atores, intérprete de linguagem dos sinais, escultores, os quais não elaboram previamente cadeias de raciocínios para realizar seus movimentos e, na maior parte das vezes, não conseguem explicá-los verbalmente. Estratégias ou Produtos que enfatizam a Inteligência Corporal-Cinestésica: dançar, fazer mímica, atuar em uma peça de teatro, pintar ou produzir uma obra de arte, praticar esportes. Uso diário da Inteligência: escovar os dentes e passar fio dental neles, fazer um penteado, consertar alguma coisa em casa, praticar esportes, ‘falar’ com o corpo ou usar o corpo enquanto fala para expressar as ideias. O que esta inteligência não é: é comum se pensar que crianças hiperativas tenham essa inteligência desenvolvida, mas não há relação entre esses fatos. Movimentação corporal sem uma intenção específica, como por exemplo, pedir para que as crianças façam um movimento com seu corpo sem que haja um objetivo para tal não é desenvolver a inteligência corporal cinestésica. Devemos lembrar sempre que uma atividade que estimule a inteligência em questão deve propor uma solução de problema em que, neste caso, o uso que se faz do corpo possa ser a solução para o mesmo (GARDNER, 1995). Bibliografia Básica GARDNER, H. A estrutura da mente: teorias das inteligências múltiplas. 2.ed. São Paulo: Edusp, 1996. 454p. NIETZSCHE, Além do bem e do mal, São Paulo, Hemus, 1995. ECO, Humberto, A estrutura ausente, São Paulo, Perspectiva, 2003. Bibliografia Complementar ECO, Humberto. As formas do conteúdo, São Paulo, Perspectiva 1974. GONZALES, M.E.Q.L. et alii (orgs.), Encontro com as ciências cognitivas, Marília, Fac de Filosofia e Ciências, 1997. CASSIRER, E. Ensaio sobre o Homem, São Paulo, Martins Fontes, 2001. ARANHA, M. L. & MARTINS, Maria H. Temas de Filosofia. SP: Ed. Moderna, 1998. GONZALES, M.E.Q.L. et alli (orgs.), Encontro com as ciências cognitivas, Marília, Fac. de Filosofia e Ciências, 1997. Av. Ernani Lacerda de Oliveira, 100 Parque Santa Cândida CEP: 13603-112 Araras / SP (19) 3321-8000 ead@unar.edu.br www.unar.edu.br 0800-772-8030 POLO MATRIZ http://www.unar.edu.br http://www.unar.edu.br Página 1 Página 2
Compartilhar