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ISSN 1982 - 0283 TV e educação: capíTulos de uma hisTória Ano XXI Boletim 19 - Novembro / Dezembro 2011 2 Sumário TV e educação: capíTuloS de uma hiSTória Apresentação ......................................................................................................................... 3 Rosa Helena Mendonça Introdução ............................................................................................................................. 5 Laura Maria Coutinho e Rosa Helena Mendonça PGM 1/Texto 1: A TV educativa entra no ar História: entrando no ar ....................................................................................................... 19 Márcia Leite PGM 2/Texto 2: TV e público de educadores A TV na sala de aula: novo cenário, novos desafios ..............................................................25 Elicio Pontes PGM 3/Texto 3: TV e temas educativos Televisão, educação e multiculturalismo: ampliando questionamentos .............................34 Azoilda Loretto da Trindade 3 TV e educação: capíTuloS de uma hiSTória apreSenTação A narrativa é o gênero primordial dos seres humanos. Desde os tempos mais remotos, contar histórias tem sido a “sina” da espé- cie. E fazemos isso, cotidianamente, nas conversas entre amigos, familiares, no tra- balho, na escola... Até quando estamos so- zinhos, criamos enredos e dialogamos com o nosso pensamento. Nos livros, no cinema, na TV – esta ‘máquina de contar histórias’ tão presente em nossas vidas – potenciali- zamos essa capacidade, utilizando múltiplas linguagens. Cada ser humano tem as suas histórias e as- sim é, também, com as coisas, com os luga- res e com as instituições. E essas histórias são contadas por pessoas... Contar capítulos de uma história requer, então, escolhas: in- clusões e exclusões. Sendo assim, são sempre as versões que são narradas. E para termos uma visão crítica, é importante comparar diferentes fontes, ouvir ‘testemunhas oculares’, analisar do- cumentos, buscar nas pesquisas as mais di- versas abordagens, sem ter a pretensão de conhecer uma ‘verdade’. A série TV e educação: capítulos de uma his- tória, que a TV Escola apresenta, por meio do programa Salto para o Futuro, com a con- sultoria de Laura Coutinho (UnB) e a cola- boração da apresentadora desta publicação, busca recolher, entre tantas iniciativas nos campos da educação e da televisão, depoi- mentos que ajudam a tecer uma retrospec- tiva dessa relação. Busca também mostrar algumas experiências em curso na interface educação/comunicação. Vale registrar que pesquisas sobre TV e edu- cação, em especial sobre a TV Escola e o Sal- to para o Futuro, algumas das quais mencio- nadas na página do programa, podem nos ajudar a ampliar os temas aqui tratados. Es- ses estudos, com suas críticas e sinalizações, têm sido, sem dúvida, sugestivos no sentido de possibilitar reflexões a todos aqueles que se interessam pelo assunto. A bibliografia sobre esse campo de estudos também pos- sibilita incursões a partir de diferentes abor- dagens teóricas. O ano de 2011 é muito significativo para a exibição desta série, pois marca os 20 4 anos do Salto para o Futuro, consideran- do a fase experimental do programa, e os 15 anos da TV Escola que, ao incorporar o Salto à sua grade, possibilitou a sua con- tinuidade e capilarização nas escolas de todo o país. Os textos desta publicação complementam os programas televisivos e assim, com pano- râmicas e zooms sobre o tema, esperamos sensibilizar professores e professoras para intensificarem a utilização da TV nas escolas de forma crítica e reflexiva. Rosa Helena Mendonça1 1 Supervisora pedagógica do programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC). 5 TV e educação: capíTuloS de uma hiSTória Laura Maria Coutinho1 Rosa Helena Mendonça2 InTrodução Capítulos, no caso de livros e novelas, são partes de uma obra que se inter-relacionam, compondo o todo. Na maioria das vezes, os capítulos são sequenciais, mas há também casos em que podem ser cambiáveis, crian- do um jogo de significados complexos. Quando o termo é utilizado para designar episódios históricos, é importante demarcar que a história – ou as histórias – não pode ser contada ou entendida por meio de fa- tos isolados, independentes uns dos outros. Também é importante considerar que entre um fato e outro, uma situação e outra, exis- te um extenso e não menos importante in- tervalo de significação. Segundo Benjamin, nada do que aconteceu está perdido para a história. E também não está perdido para efeito do nosso propósito com esta série. Apenas destacaremos alguns episódios para conduzir a nossa reflexão. No caso da relação TV e educação, optamos por contar essa história recuperando algumas experiências pioneiras e apresentando algu- mas iniciativas em curso. O todo, nesses casos, é sempre inatingível, uma vez que as narrativas se dão por escolhas possíveis, pela tessitura de múltiplas vozes que participaram e muitas que ainda participam das experiências. Muitas vezes, de uma experiência, mesmo interrompida, ficam sementes que podem frutificar em outros espaços. E são as pesso- as, mais do que os documentos ou produtos dessas iniciativas, que carregam consigo os saberes acumulados ao longo das práticas, fazendo-os transitar de um espaço a outro. Em meio à profusão narrativa de que se compõe o universo da televisão educativa como instituição e dos muitos usos que a educação tem feito dessa mídia e dos audio- visuais, selecionamos alguns momentos e alguns aspectos para a nossa reflexão. O cinema, a televisão e outros produtos 1 Professora Associada da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília. Consultora da série. 2 Supervisora pedagógica do programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC). Doutoranda no PROPED- UERJ. Consultora da série. 6 audiovisuais sempre estiveram ligados à educação, de certa forma. O audiovisual na educação tem sido pensado, muitas vezes, apenas como ilustração de conteúdos curri- culares e essa talvez seja a primeira aproxi- mação do audiovisual com a educação. Mas existem outras. Milton José de Almeida, em seu livro Imagens e sons – a nova cultura oral, afirma que (...) a transmissão eletrônica de infor- mações em imagem-som propõe uma maneira diferente de inteligibilidade, sabedoria e conhecimento, como se de- vêssemos acordar algo adormecido em nosso cérebro para entendermos o mun- do atual, não só pelo conhecimento fo- nético-silábico das nossas línguas, mas pelas imagens-sons também. Se assim avaliamos essa etapa do desenvolvi- mento humano, vemos que a linguagem au- diovisual precisa ser compreendida para além dos produtos audiovisuais construídos a partir dessa sintaxe, ou seja, dessa justaposição de imagens e sons. E também melhor integrada aos processos e projetos pedagógicos. Muitas foram as experiências que buscaram associar a linguagem audiovisual com a edu- cação. Muitas dessas experiências ocorre- ram no Brasil e outras, como já destacamos, ainda estão em curso. Algumas delas foram apenas tentativas, tiveram começo e logo terminaram, não persistiram. A educação como prática social e a escola como o lugar onde a educação acontece de maneira sistematizada sempre buscaram nas tecnologias disponíveis – da lousa ao computador – recursos que pudessem ga- rantir certa qualidade e consistência. O uso de audiovisuais – câmeras, projetores, telas, computadores – configura uma hoje extensa área na educação: a tecnologia educacional. Essa área toma corpo em nosso país, a par- tir dos anos 1970, quando surgem inúmeras iniciativas, em diferentes acepções. Mesmo reconhecendo que o tecnicismo edu- cacional tangencia o tema abordado neste texto, não vamos aprofundá-lo aqui, embora as iniciativas às quais nos referiremos a se- guir tenham incorporado muito dele.Ainda assim, as experiências que incorporaram os recursos e as linguagens audiovisuais po- dem revelar, pelas lições que produziram, situações significativas da pedagogia e da política educacional brasileira. os AudIoVIsuAIs e A educAção A relação entre os audiovisuais e a educa- ção tem uma longa história no Brasil. Vamos aqui lembrar essa história, ainda que de forma breve. Na década de 1930, iniciativas como as de Canuto Mendes, em São Paulo, e Roquette-Pinto, no Rio de Janeiro, já apon- tavam para a importância do cinema como recurso pedagógico. E a televisão, logo após sua difusão no país nos anos 1950, também 7 se revelou instrumento imprescindível para a consolidação de projetos educativos, inspi- rada, de certo modo, nos resultados da utili- zação do rádio na educação. No entanto, essas iniciativas não lograram uma mudança significativa nas estruturas educacionais e, de certa forma, reprodu- ziram o mesmo esquema de comunicação unidirecional, então vigente também nas es- colas, reforçado pela própria forma de pro- dução da TV como veículo de comunicação de massa, centrada muito mais no emissor do que nos possíveis receptores. E com um modelo de mídia importado de outras cul- turas, claramente no Brasil dominado por grandes corporações em disputa pelo mer- cado (FERREIRA, 1991). O modelo de comunicação unidirecional vi- gorou, por mais de um século, na educação brasileira. Os processos educativos eram centrados na transmissividade: o professor “transmitia” os conteúdos que eram “assi- milados” pelos alunos. Esta concepção foi denominada por Paulo Freire de educação bancária. Tal modelo recebe hoje críticas em diversas partes do mundo, consideran- do que aquilo que pode ser transmitido é a informação apenas. Não se transmite o conhecimento, pois este pressupõe um processo dialógico, uma interação entre mestre e aprendiz e desses com seus pa- res. E, pressupõe, ainda, que conhecimen- to é apreensão de sentido e não somen- te a aquisição de dados e informações. No processo dialógico, todos aprendem, mes- clando conteúdos, ideias, ideais, visões de mundo... Sem essa interação, segundo esse processo, não há realmente uma aprendi- zagem significativa, por mais interessantes e diversificados que sejam os recursos uti- lizados pela escola ou pela TV. Nessa pers- pectiva, importa à escola e à educação que, além dos processos de transmissão de in- formações em larga escala que a televisão propicia, existam espaços de diálogo que possam significar o que é visto nas telas, integrando os mais diversos temas e assun- tos aos processos educacionais. A sala de aula é um espaço privilegiado para que isso possa ocorrer. É um espaço de visionamen- to e escuta. Para Jesús Martín-Barbero (2001, p. 28), teó- rico que se preocupa com a recepção e com a utilização que as pessoas fazem da TV, me- diação é uma palavra-chave: (...) a comunicação se tornou para nós questão de mediações mais do que de meios, questão de cultura e, portanto, não só de conhecimentos mas de re- conhecimento. Um reconhecimento que foi, de início, operação de deslocamen- to metodológico para re-ver o processo inteiro da comunicação, a partir de seu outro lado, o da recepção, o das resistên- cias que aí têm seu lugar, o da apropria- ção a partir de seus usos. 8 A educAção nA PAuTA dA TV A escola, quase que diariamente, está presente na mídia. Atos violentos, analfabetismo funcio- nal, baixos resultados nos exames de avaliação de alunos, falta de professores, entre outros problemas, são os assuntos mostrados na TV e nos jornais, com maior frequência. Em geral, as notícias se revestem de um caráter episódi- co e apontam resultados negativos, destacan- do aspectos como violência, fracasso escolar, discriminação. Via de regra, as reportagens não ultrapassam o chamado senso comum, refor- çando mitos como “antigamente a escola era boa, os professores eram mais bem formados, os alunos saíam com mais base”, sem analisar que um grande contingente de crianças sequer tinha acesso à escola e, ainda, muitas vezes, sem refletir sobre as causas da “evasão” e do “fracasso” escolar. Outras pautas referem-se a projetos do MEC e, sem problematizar questões significati- vas, restringem-se a aspectos quantitativos, tais como o preço de uma obra, quantos alu- nos serão beneficiados por um determinado programa, qual o resultado dos alunos nos exames nacionais e internacionais, qual o ranking do país nesses exames etc. Se as pesquisas apontam que, em média, 50% dos alunos têm resultados insatisfató- rios em exames como ENEM3 e PISA4, por exemplo, não é difícil concluir que a outra metade, a que obtém resultados satisfató- rios, precisa ter visibilidade para que haja também repercussão em torno de ações po- sitivas nos diferentes contextos escolares e sociais. As pautas, nos jornais televisivos, são cons- truídas segundo “um arsenal de operações semânticas (...). A essas operações somam- se, ou não, as distorções propositais, as in- terdições editoriais, as estratégias de mar- keting e de censura. A mídia, como todos percebem, produz um mundo de aconteci- mentos maquiados” (ARNT, 1991, p. 172). E não é diferente com a educação, as escolas, o sistema educacional. A TV 'fAz' educAção Na série TV e educação: capítulos de uma história, o que se busca problematizar é mais do que a cobertura que a mídia faz do tema educação. A proposta da série ultra- passa, ainda, os usos educativos que podem ser feitos da programação da TV nas escolas. A questão é discutir como a mídia em ge- ral, e mais especificamente a televisão, pode produzir uma programação educativa. 3 O ENEM - Exame Nacional de Ensino Médio é realizado anualmente pelo Governo Federal. Este exame é utilizado como critério classificatório para o ProUni – Programa Universidade para Todos e para diversas universidades, públicas e particulares. 4 O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA, na sigla em inglês) é promovido pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). 9 É essencial – e as TVs voltadas para a educa- ção têm condições de fazer isto – trazer para o debate, de forma reflexiva, com embasa- mento em pesquisas, sobretudo aquelas de- senvolvidas a partir de experiências em sala de aula, as características e especificidades do sistema escolar brasileiro e das muitas escolas que o compõem5. Por exemplo, ao problematizar aspectos relativos ao baixo desempenho escolar, à defasagem idade e série e tantos outros, é necessário correla- cionar esses fatos com a história social e po- lítica do país, possibilitando uma visão mais ampla e debatendo caminhos para possíveis ações e soluções. E, mais ainda, é necessário registrar iniciativas que apontem para a su- peração desses problemas, tanto no âmbito dos meios de comunicação e dos sistemas escolares, quanto no das iniciativas de esco- las. E é preciso aprender com elas. o InsTITuTo nAcIonAl do cIneMA educATIVo – Ince Para a pesquisadora Rosana Elisa Catelli, “desde a década de 1910, os anarquistas desenvolveram uma intensa reflexão sobre os usos do cinema, como um instrumento a serviço da educação do homem do povo e da transformação social, devendo este se converter em arte revolucionária”6. O pensa- mento católico também se dedicou à ques- tão do cinema educativo, preocupado com a questão moral dos filmes exibidos. A Igreja criou os Cineacs, salas de cinema nas paró- quias e associações católicas, que tinham por objetivo apreciar os filmes segundo as normas traçadas pela Igreja. Os educadores, por sua vez, combatiam o que eles chama- vam de “cinema mercantil” e propunham a criação do cinema educativo que poderia trazer benefícios pedagógicos aos alunos, ao mostrar, de forma mais real, diversos as- pectos da natureza eda geografia do Brasil. Para estes, o cinema educativo representa- va a luta contra o cinema “deseducador” e “portador de elementos nocivos e desagre- gadores da nacionalidade”. Assim, o Instituto Nacional do Cinema Edu- cativo - INCE, criado em 1936 por Edgard Roquette-Pinto, surge no momento em que o debate em torno das relações entre cine- ma e educação emergia e se consolidava em ações, em diferentes segmentos da socieda- de, no país e fora dele. Edgard Roquette-Pinto é considerado o pre- cursor da radiodifusão no Brasil. Antes de fundar o Instituto Nacional do Cinema Edu- cativo, já havia criado, em 1923, a primeira estação de rádio brasileira: a Rádio Socieda- 5 São diversas as redes de ensino – federal, estadual, municipal – e cada uma delas atende a etapas distintas de escolaridade. Para que esse sistema seja efetivo, a integração entre essas redes é necessária e urgente. 6 CATELLI, Rosana Elisa. Cinema e educação em John Grierson. http://www.mnemocine.com.br/aruanda/ cineducemgrierson.htm out.2003 10 de do Rio de Janeiro. As rádios sociedade ou rádios clube eram assim chamadas porque os ouvintes precisavam se associar e con- tribuíam com mensalidades para a manu- tenção da emissora. Havia, portanto, uma participação direta dos ouvintes. Isso era possível também porque o número de apa- relhos de recepção não era muito grande e, por consequência, o de ouvintes também. As publicidades, ou os comerciais, só viriam a sustentar as emissoras de rádio um pouco mais tarde. Em 1933, o governo de Getúlio Vargas autoriza a publicidade em rádio. A partir de então, os nomes dos patrocina- dores ficam de tal forma marcados que se confundem com o próprio programa como, por exemplo, o Repórter Esso, um dos pro- gramas de radiojornalismo mais famosos do país. O INCE funcionava em um edifício na Praça da República, no Rio de Janeiro, onde tam- bém passou a funcionar a Rádio Ministério da Educação. Não vimos, até hoje, nenhum texto sobre o Instituto Nacional do Cinema Educativo que não falasse também de Ro- quette-Pinto. Mas outros personagens, com maior ou menor expressão, também partici- param dessa história. É importante lembrar que o INCE surgiu em pleno Estado Novo, criado pelo Ministro da Educação do gover- no de Getúlio Vargas, Gustavo Capanema. No Catálogo da Mostra Humberto Mauro, patrocinada pela Embrafilme, Secretaria de Cultura, Ministério da Educação e Banco Nacional, em junho de 1984, encontramos o seguinte texto: “Em 1936, o antropólogo, cientista e professor Edgard Roquette-Pinto estava organizando o INCE (...) quando se aproximou Humberto Mauro, que já o co- nhecia pessoalmente, do seu tempo de dire- tor do Museu Nacional. Desde o início, hou- ve entre os dois uma identificação quanto à valorização da cultura brasileira, considera- da por ambos a manifestação de uma civili- zação nova que se autodesconhecia. Hum- berto tinha ideias sobre filmes educativos e isso lhe valeu um convite de Roquette- Pinto para que o ajudasse a fazer o cinema no Bra- sil, ‘a escola dos que não tinham escola’”. O que vem a ser essa afirmação – ou esse desejo – de que o cinema se transformasse nessa escola, talvez não possamos saber. Podemos, no entanto, pensar que desde há muito que o cinema – e depois a televisão e os computadores em rede – estão relacio- nados com a educação e com a escola. No Estado Novo, o cinema educativo foi utiliza- do como um meio de propaganda política, com o intuito de colaborar na construção da identidade nacional, na legitimação do governo e na formação do patriotismo. O ci- nema para Getúlio Vargas era como um livro de imagens luminosas. Pode parecer estranho que um governo se preocupasse tanto com o cinema para educar o povo, a ponto de criar um órgão 11 governamental para cuidar disso. Mas o cinema, talvez devido a essa forte relação com a realidade, seja ele ficcional ou do- cumentário, de alguma forma expressa a política, a sociedade. A produção cinema- tográfica americana é um exemplo disso. Além de divulgar o american way of life (o modo americano de viver) traz, em quase todos os seus filmes, uma cena em que tremulam, ainda que por poucos instan- tes, as listras brancas e vermelhas da ban- deira americana Voltando ao nosso cinema educativo dos anos 1930, nessa época um decreto pre- sidencial criou todas as facilidades para a produção cinematográfica como, por exemplo, a importação de negativos vir- gens. Um dos filmes importantes desse período do Instituto Nacional do Cinema Educativo é O Descobrimento do Brasil, di- rigido por Humberto Mauro, com música de Heitor Villa-Lobos7. A partir desse filme são criadas as condições que permitiram a Mauro rodar, nos anos seguintes, cerca de 300 documentários em curta-metragem, de caráter científico, histórico e da poética popular. Quase todos sob a orientação de Roquette-Pinto, que também escreveu o ro- teiro e narrou muitos deles. São inúmeros os títulos que traduzem uma associação primorosa da linguagem cinematográfica, dominada com perfeição por Humberto Mauro, e a intenção de educar o povo bra- sileiro com o que de mais moderno havia – o cinema. O cinema educativo do INCE passou a esti- mular o sentimento de amor à pátria atra- vés de filmes biográficos, onde os heróis na- cionais apareciam imbuídos de qualidades que o Estado Novo procurava inspirar nos jovens brasileiros. Estes heróis eram traba- lhadores, honestos, generosos e, acima de tudo, amavam o Brasil. Com isto, o gover- no procurava estabelecer uma relação entre ele e os heróis, apresentando-se como uma continuidade da obra dos grandes vultos na- cionais, fazendo assim a propaganda do go- verno junto ao povo. As informações disponíveis sobre o trabalho do Instituto Nacional do Cinema Educativo sugerem que esse projeto resultou em um trabalho que ficou mais centrado na produ- ção, carecendo de uma estratégia de veicu- lação dos filmes nos espaços culturais e edu- cacionais do país. Se isso de fato ocorreu, nos leva a pensar na falta de sintonia entre os projetos e a capacidade real da sociedade brasileira de absorvê-los, o que de certa for- ma, ainda persiste. Muitos projetos sequer saem do papel, ficam apenas na intenção, não se viabilizam completamente. 7 Descobrimento do Brasil, 1936. Longa metragem. Sonoro. Roteiro de Humberto Mauro. Argumento: Humberto Mauro e Affonso de Taunay, baseado na carta de Pero Vaz de Caminha. Fotografia de Manoel Ribeiro, Alberto Botelho. 12 o ProjeTo sAcI A primeira tentativa de integrar o sistema de educação nacional com o sistema de comu- nicação de massa via televisão com o uso de satélite foi o Projeto SACI – Sistema Avança- do de Comunicações Interdisciplinares8. Um dos motes do projeto de segurança nacional era a integração, na década de 1970. Muitos projetos de integração estavam em curso. Só para podermos nos localizar um pouco melhor, foi nesse período que os militares desencadearam a corrida à Amazônia com o slogan “integrar para não entregar”. Antes do SACI, já haviam sido criados o Mi- nistério das Comunicações e a Empresa Bra- sileira de Telecomunicações, a Embratel. No âmbito de um projeto político grandioso e bastante conturbado e, ainda, sustentado pelo regime militar que governava o país, o Satélite Avançado de Comunicações Inter- disciplinares tinha propósitos igualmente grandiosos, ou seja, visava integrar em es- cala nacional o ensino básico. No âmago de uma ditadura militar, esse projeto foi forja- do a partir da concepção de que começava a emergir, no sistema educacional brasileiro, a visão de educação como desenvolvimento, em estreita sintonia com a doutrina de segu- rança nacional9. O estudo de Laymert Garcia dos Santos, sua tese de doutorado, publicado com o títu- lo Desregulagens – educação, planejamento e tecnologiacomo ferramenta social, revela que, gerado no Instituto Nacional de Pes- quisas Espaciais (INPE), com sede em São José dos Campos, o projeto SACI, que lem- bra o moleque travesso e esperto da tradi- ção brasileira, não alcançou os resultados esperados e o sonho tecnológico de alcance nacional ficou restrito, e ainda assim com graves problemas, ao Rio Grande do Norte. Em relação aos objetivos educacionais, os resultados desse projeto seriam um fracas- so, não fossem as lições que dele puderam ser depreendidas. O Projeto SACI representa um exemplo de que as políticas públicas, às vezes, são formuladas sem o conhecimento profundo da realidade e das pessoas que, na prática, serão as responsáveis diretas pelas ações: nesse caso os professores das escolas públicas brasileiras e, mais especificamente, os professores das escolas públicas do ensi- no básico do Rio Grande do Norte. Coerente com as ideologias que o geraram, 8 Iniciativa conjunta do Ministério da Educação, do Centro Nacional de Pesquisas e Desenvolvimento Tecnológico (CNPq) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o projeto Saci utilizava o formato de telenovela. Inicialmente, fornecia aulas pré-gravadas, transmitidas via satélite, com suporte em material impresso, para alunos das séries iniciais e professores leigos, do então ensino primário no estado do Rio Grande do Norte - onde foi implantado um projeto piloto. Em 1976, registrou um total de 1.241 programas de rádio e TV. 9 A Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento tinha como meta criar condições para, através do fortalecimento do Estado, construir um modelo de desenvolvimento econômico favorável à consolidação do capitalismo, criando toda uma infraestrutura capaz de transformar o país em uma potência econômica. 13 o projeto SACI trabalhava segundo a lógica da racionalidade e propalava uma “modeli- zação onde os meios de comunicação ocu- pavam um lugar de honra, na medida em que o emprego da televisão, do rádio e dos fascículos elaborados segundo os princípios da instrução programada10 será o traço de- terminante para distinguir a tecnologia edu- cativa do ensino tradicional” (SANTOS, 1981, p. 216). A TVe enTrA no Ar No Rio de Janeiro, segundo Liana Milanez, em 1973, após “seis anos de operação como centro de produtor de programas educati- vos, o FCBTVE, Gilson Amado consegue do governo Médici a concessão do canal 2. Fi- nalmente, o sonho de Roquette-Pinto se concretizava com a criação de uma emisso- ra educativa no país. Depois de uma fase experimental, o canal vai ao ar de forma definitiva em 1977. O pro- grama de estreia é a novela João da Silva, um curso voltado para a educação de jovens e adultos que não tinham frequentado a es- cola regular ou tinham dela se ‘evadido’ por razões várias, ligadas sempre às difíceis con- dições de vida de uma parcela significativa da população, em geral migrantes, em bus- ca de condições mais favoráveis de trabalho. O personagem principal se inspirava justa- mente em um desses brasileiros; nordesti- no, trabalhador da construção civil, em um país que consolidava um modelo econômico desenvolvimentista em que o chamado êxo- do rural, já em curso desde o governo JK, se acelerava. A série, que era apresentada em algumas emissoras comerciais, contava ain- da com material impresso complementar e acompanhamento e avaliação organizados pela Secretaria de Educação do Estado. Em 1979, o projeto Conquista, ainda na pers- pectiva do ensino supletivo, visava ao públi- co das séries finais do então Ensino de Pri- meiro Grau, nomenclatura trazida pela Lei n° 5.692/71, que unia os antigos cursos pri- mário e ginasial em oito anos obrigatórios de escolaridade. Complementava, assim, o projeto João da Silva e contava também com a coordenação pedagógica do professor Ma- nuel Jairo Bezerra, com programas voltados para as diferentes áreas do conhecimento e a mesma estrutura de utilização e acompa- nhamento. O projeto Conquista foi desativa- do em 1981, ano em que a Fundação Roberto Marinho coloca no ar o Telecurso 1º grau, envolvendo diversas parcerias. 10 A instrução programada, um tipo de ensino centrado no aluno, estava muito em moda nessa época. Trata-se da aplicação dos estudos do psicólogo americano Burrhus Frederic Skinner, que propalava a eficiência do reforço positivo e de máquinas de ensinar, suas mais conhecidas aplicações educacionais. São muitas as espécies de máquinas de ensinar e embora seu custo e sua complexidade possam variar muito, a maioria das máquinas executa funções semelhantes. Skinner pregou a eficiência do reforço positivo, sendo, em princípio, contrário a punições e esquemas repressivos. 14 A TVE continuou desenvolvendo outros pro- jetos educativos, como é o caso do Onda Viva, com o apoio da OEA, entre outros. E em 1991 lança o programa destinado à for- mação de professores das séries iniciais do então Ensino Fundamental, denominado Jornal da Educação: edição do professor, que viria a se chamar no ano seguinte Um Salto para o Futuro. o sAlTo PArA o fuTuro Em 1991, foi ao ar pela TVE Brasil a primeira edição do “Jornal da Educação - Edição do Professor” uma experiência piloto de edu- cação a distância, com recepção organiza- da em seis estados do país. Em 1992, já com abrangência nacional, o programa passou a se chamar Um Salto para o Futuro. Em 1995, denominando-se Salto para o Futuro, foi in- corporado à grade da TV Escola (canal do Ministério da Educação). O Salto, como se tornou conhecido entre os professores, desde a sua concepção ini- cial teve como proposta ser mais do que um programa de televisão, conjugando recursos como textos de apoio (publicação eletrôni- ca) e canais de comunicação direta: caixa postal, telefone e página do Salto: www.tv- brasil.org.br/salto, tudo isto visando tornar possível a interatividade com os professores. Por meio do Salto, propostas pedagógicas da atualidade foram discutidas, em séries temáticas. O objetivo dos debates sempre foi trazer diferentes tendências no campo da educação e, assim, contribuir para a re- flexão da prática em sala de aula tanto nas áreas do conhecimento que integram o cur- rículo quanto nas questões que expressam a diversidade da sociedade. O programa teve, até 2008, uma especifici- dade: sendo diário e ao vivo, sua estrutura foi pensada para a participação, em tempo real, dos professores, organizados em teles- salas, nos mais diversos pontos do país. Tal estrutura permitia um diálogo permanente com outros programas do MEC, com a pró- pria programação do canal e com os mais variados projetos no campo da Educação contemporânea. A característica que mais se destacou no programa foi a de preservar a dimensão do diálogo como espaço de interações tão ricas quanto imprevisíveis. E foi justamente este aspecto – a interatividade – que tornou o Salto um programa que, a cada dia, era feito com a participação dos professores. Desde a sua criação, em 2000, a página do Salto tem mostrado seu potencial de se tor- nar um grande fórum de discussão. Enquan- to o programa de televisão destacou-se pelo registro de experiências em escolas e outras instituições, pelas entrevistas com renoma- dos educadores, pela atualidade na aborda- gem de temas considerados imprescindíveis 15 no cenário da educação brasileira, em sua diversidade e riqueza, o site firmou-se como mais um canal de diálogo. Em 2009, o Salto para o Futuro, sem se dis- tanciar da sua filosofia original, investiu em um novo conceito, incorporando as possibi- lidades que as tecnologias digitais interativas apresentam, assumindo um novo formato11. A TV escolA Nesta série, vamos também destacar um outro capítulo significativo da relação entre educação e televisão: a criação da TV Escola, um canal de educação pensado para a for- mação de professores e adifusão de progra- mação a ser utilizada em sala de aula, nas escolas de todo o país. Segundo Sylvia Magaldi (2001, p. 111): (…) temos presenciado no Brasil o cres- cimento do espaço reservado à televisão na área da educação pública. Levantan- do a bandeira de que a TV deve ser posta a serviço da melhoria do ensino básico, o Ministério da Educação criou um canal exclusivo para as escolas de todo o país. Em convênio com os órgãos estaduais e municipais, equipou a rede pública com antenas parabólicas, videocassetes e te- levisores, para assegurar a recepção do canal, a gravação e o posterior uso dos programas. Após 15 anos de existência, o site da TV Esco- la apresenta assim o canal: A TV Escola é o canal da educação. É a televisão pública do Ministério da Edu- cação destinada aos professores e edu- cadores brasileiros, aos alunos e a todos interessados em aprender. A TV Escola não é um canal de divulgação de polí- ticas públicas da educação. Ela é uma política pública em si, com o objetivo de subsidiar a escola e não de substituí-la12. A grade de programação inclui uma ampla diversidade de temas que contempla todas as áreas curriculares, em faixas específicas para a Educação Infantil, Ensino Fundamen- tal e Ensino Médio, ou seja, toda a educação básica. Inclui, ainda, Semanas Temáticas, além de produções nacionais e internacio- nais. Outras iniciativas em TV e educação estão em curso, como é o caso do Canal Futura, uma das áreas de atuação da Fundação Ro- berto Marinho, e da MultiRio, empresa Mu- nicipal de Multimeios da Prefeitura da Cida- de do Rio de Janeiro. 11 As informações sobre Salto para o Futuro foram extraídas, com algumas adaptações, da página do programa www.tvbrasil.org.br/salto 12 Site da TV Escola: http://tvescola.mec.gov.br 16 Com essa breve história, fruto de nossas escolhas ao contá-la, baseada já em outras pesquisas e narrativas, assumimos as lacu- nas e as possíveis versões aqui apresentadas nesses capítulos. A intenção foi contextua- lizar essa trajetória, ainda que de forma in- cipiente, para retomarmos as questões que priorizamos nessa série: as relações entre os audiovisuais, em especial a televisão, e a educação. TV e educAção: cAPíTulos de uMA HIsTórIA13 A série TV e Educação: capítulos de uma história tem como proposta abordar a relação entre os audiovisuais e a educação, que tem uma longa história no Brasil. Ainda na década de 1930, iniciativas já apontavam para a importância do cinema como recurso pedagógico. E a televi- são, logo após sua difusão no país nos anos 1950, também se revelou instrumento imprescin- dível para a consolidação de projetos educativos (inspirada, de certo modo, nos resultados da utilização do rádio na educação). E hoje, com algumas experiências já consolidadas, e outros desafios em curso com a chegada da TV digital, qual é o panorama da relação televisão e edu- cação no Brasil? PGM 1 /TexTo 1 – A TV educATIVA enTrA no Ar Neste primeiro programa, pretendemos refletir sobre TV e educação no sentido da utilização da TV para a veiculação de programas educativos, voltados em especial para o público escolar, entendido como professores, gestores, alunos e comunidade na sua relação com a escola. As possibilidades da TV para a educação; os primeiros programas educativos; a TV Escola e o Salto para o Futuro nesse contexto. A relação entre conteúdo educativo e formato televisivo: profissionais de educação fazendo TV e profissionais de TV fazendo educação. Dos telecursos aos programas de formação de professores; das teleaulas aos debates e revistas educacionais. As possibilidades e os limites da TV na EAD, objetivando a formação de professores. PGM 2/TexTo 2 – TV e PúblIco de educAdores Neste segundo programa, vamos tratar dos usos da TV na educação e falar de recepção e in- 13 Estes textos são complementares à série TV e Educação: capítulos de uma história, com veiculação no programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC) de 28/11/2011 a 02/12/2011. 17 teratividade. A repercussão da TV na formação de professores. A TV na sala de aula. As salas de aula na TV. Por meio de depoimentos e práticas de professores e alunos nas escolas, busca- remos entender a noção de mediação que, segundo Martín-Barbero (2001, p.28), é uma forma de relativizar a tão propalada passividade atribuída aos espectadores, diante de uma possível manipulação dos meios. No contexto das aceleradas mudanças tecnológicas, vamos abordar formas de utilização e de produção de programas de TV e de vídeos, tendo em vista a popularização de equipamentos como câmeras digitais e celulares. Vamos tratar, ainda, da convergência de mídias e dos espa- ços de circulação de imagens em sites e nas redes sociais e ouvir integrantes do GT de educa- ção e comunicação da ANPED, a Associação Nacional de Pesquisadores em Educação, sobre a TV e outras mídias como objeto de estudos educacionais. PGM 3/TexTo 3 – TV e TeMAs educATIVos A importância da TV se consolidando no debate de temas contemporâneos e de urgência so- cial. Questões de raça e etnia, de gênero, de diversidade cultural, entre outras, ganham espaço na programação. Como a TV pode potencializar as experiências em curso, veiculando imagens de vários pontos de país e iniciativas diversas que, em geral, não têm espaço na TV? No caso do Salto para o Futuro, a série Multiculturalismo e educação é um dos exemplos, por abordar a diversidade como temática. Muitos projetos que hoje têm repercussão nacional e internacio- nal foram captados pelas lentes da TV ainda em suas primeiras iniciativas. O que é pauta para uma TV que se pretende educativa? O que é educativo, desde a intencionalidade da produção, e o que pode ser, a partir dos usos? Os textos desta publicação eletrônica também são referenciais para as entrevistas e debates do PGM 4: Outros olhares sobre TV e educação e do PGM 5: TV e educação em debate. referêncIAs ALMEIDA, Milton José de. Imagens e sons – a nova cultura oral. Campinas: Cortez, 1994. BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e po- lítica. São Paulo: Brasiliense, 1994. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação a Distância. Mediatamente! Te- levisão, cultura e educação. Vera Maria Pal- meira de Paula et al. (org.) Série Estudos. Educação a Distância, v. 11, 1999. COUTINHO, Laura Maria. O estúdio de te- 18 levisão e a educação da memória. Brasília: Plano Editora, 2003. COUTINHO, Laura M. Pedagogia: aprendiza- gem, tecnologias e educação a distância. Bra- sília: Universidade de Brasília, 2006. COUTINHO, Laura M. Audiovisuais: arte, téc- nica e linguagem. Brasília: Universidade de Brasília, 2006. FERREIRA, Argemiro. “As redes de TV e os se- nhores da Aldeia Global”. In: NOVAES, Adalto (org.). Rede imaginária: televisão e democra- cia. São Paulo: Cia. das Letras – Secretaria Municipal de Cultura, 1991. ARNT, Ricardo. “A desordem do mundo e or- dem do jornal”. In: NOVAES, Adalto (org.). Rede imaginária: televisão e democracia. São Paulo: Cia. das Letras – Secretaria Municipal de Cultura, 1991. p. 172. MAGALDI, Sylvia. A TV como objeto de estu- do na educação: ideias e práticas. In: Televi- são & Educação: fruir e pensar a TV. FISCHER, Rosa Maria Bueno (org.). Belo Ho- rizonte: Autêntica, 2001. p. 111. MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às me- diações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2001. p. 28. MILANEZ, Liana. TVE: cenas de uma história. Rio de Janeiro: ACERP, 2007. SANTOS, Laymert Garcia. Desregulagens: educação, planejamento e tecnologia como ferramenta social. São Paulo: Brasiliense, 1981. p. 216. 19 pGm 1/TexTo 1: a TV educaTiVa enTra no ar hiSTória: enTrando no ar... Márcia Leite1 O desafio de trocar a experiência como alfa- betizadora de crianças, jovens e adultos com professores de todo país misturava-se com o medo de ocupar o outro lado da tela da TV,em um diálogo ao vivo, em tempo real. O apoio da equipe de educadores da TVE e dos professores participantes do projeto foi fundamental para quebrar a tensão de quem depositava na TV um lugar significativo de informação, entretenimento, construção de valores, mitos e ídolos. Ainda se conta- va com a competência dos profissionais da TVE, diretores, roteiristas, produtores, edi- tores, enfim, todos apaixonados e compro- metidos com a utilização de um poderoso meio de comunicação a serviço da educação brasileira2. A educação a distância, entendida como utilização de meios de comunicação para transmissão de conteúdos didáticos, ultra- passando distâncias temporais e espaciais, existe desde a invenção da escrita e das epís- tolas, mas adquire sistematização alguns séculos depois, configurando-se como mo- dalidade de ensino durante a Segunda Guer- ra Mundial, com os treinamentos militares americanos. Essas iniciativas, alimentadas pelas concepções epistemológicas compor- tamentistas, possibilitaram o surgimento de projetos em diversos países, com a utilização dos meios de comunicação existentes: cor- respondências, programas de rádio e de TV. No Brasil, destacam-se na história da EAD a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, criada em 1925 por Roquette Pinto, com uma pro- posta educativa de radiofusão, e o Instituto 1 Gerente de Cultura do Departamento Nacional do SESC. Mestre em Educação pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e professora da Universidade Cândido Mendes. Ex-diretora de Tecnologia Educacional da TV Educativa, Rede Brasil, e ex-coordenadora do projeto Salto para o Futuro, TV Escola. 2 O projeto contava com uma equipe de professores “conteudistas”,contratados para elaborarem os textos específicos das Disciplinas escolares, sob a direção da Prof. Terezinha Saraiva e coordenados inicialmente pelas professoras Regina de Assis e Cleide Ramos; uma equipe de teleducadores, professores funcionários da TVE, responsáveis pela formatação desses conteúdos. Lembramos com carinho de Virgínia Palermo, Vera Beraldo, Sonia Brandão, Yonne Polly, Ester Faller, Zilda Lenz, Marinete D´Angelo; do apresentador Milton Fernandes; do diretor Paulo Pálace; da coordenadora de produção Christina Maluhy; dos produtores Roberto Brandão; roteiristas Fernando Mozart, Eliezer, Faride Chaiber, João Motta, Karla Hansen; editores Adélia Duarte, Flavio Ferrato, entre outros. 20 Universal Brasileiro, criado em 1941, em São Paulo, oferecendo cursos de formação pro- fissional por correspondência e que existe até hoje. A partir dos anos 1960, são desen- volvidos projetos em âmbito governamental, quando é criado o PRONTEL, órgão do MEC responsável pela coordenação dos projetos de teleducação do país, como o Minerva, para educação de jovens e adultos, transmi- tido pela Rádio MEC; o LOGOS, para forma- ção de professores leigos; o projeto SACI, com transmissão via satélite de programas educativos vol- tados para o En- sino Fundamen- tal. Maranhão e Ceará desenvol- vem programas de televisão com conteúdos curri- culares para che- garem às salas de aula do inte- rior; São Paulo, através da Fundação Padre Anchieta, realiza durante muitos anos programas de apoio a alunos e professores das últimas séries do Ensino de Primeiro Grau. Destaca-se, neste cenário, a Fundação Ro- quette-Pinto, antigo Centro Brasileiro de Te- levisão Educativa Gilson Amado, instituição mantenedora da TVE e da Rádio MEC. Apesar de sediada no Rio de Janeiro, é “cabeça de rede” do SINRED, desenvolvendo projetos educativos em âmbito nacional para dife- rentes segmentos e graus de ensino, como as séries João da Silva e Conquista, que ino- varam no seu formato, como novelas didá- ticas, inaugurando um diálogo interessante, numa relação bastante conflituosa entre forma e conteúdo, televisão e educação. Apesar da abrangência do rádio, a televisão foi o meio de comunicação mais significati- vo na formação das gerações a partir da se- gunda metade do século XX. Ela era o grande instrumento da globa- lização, proporcionan- do a mundialização simbólica do poder econômico do capital. Assim, era fascinante a possibilidade de uti- lizar este instrumento para educar a socieda- de brasileira, apesar de não existirem, na épo- ca, profissionais espe- cializados para este trabalho. Os pedagogos e professores eram formados na perspectiva da sala de aula, da escola e do ensino for- mal. Os profissionais de comunicação ain- da estavam aprendendo a fazer, não existia uma formação específica para a atuação em televisão educativa. Desta forma, todas es- sas iniciativas serviram também de espaço de aprendizagens para seus idealizadores e realizadores, gerando muitos conhecimen- tos, mas também dificuldades e equívocos. Apesar da abrangência do rádio, a televisão foi o meio de comunicação mais significativo na formação das gerações a partir da segunda metade do século XX. 21 Inicialmente, acreditava-se que para fazer um “programa educativo” bastava gravar e trans- mitir a aula de um bom professor. Os alunos, após assisti-lo, poderiam tirar suas dúvidas e aprofundar seus conhecimentos, seguindo as orientações e preenchendo as lacunas dos módulos instrucionais. Esses recursos seriam suficientes para substituir a presença real dos professores do Primeiro Grau, especialmente nas regiões mais carentes, de difícil acesso. Apesar de esta concepção ainda existir até hoje, mesmo nos suportes digitais, devido aos resul- tados negativos relacionados às aprendizagens, ao desinteresse e à evasão dos alu- nos, começou-se a buscar novas estratégias, a partir de um diá- logo mais provei- toso com os profissionais de comunicação. Surgiram, então, os telejornais e as novelas radiofônicas e televisivas “educativas”. A no- vela era, e ainda é, o programa de maior audi- ência, por que não usá-la para a transmissão dos conteúdos escolares? Foi dessa época a construção do “pré-con- ceito” sobre a “chatice” dos programas edu- cativos, pois narravam histórias com textos e ações impregnados de textos didáticos, termos científicos, completamente distan- tes do cotidiano de uma proposta de entre- tenimento. Esse processo gerou aprendizagens funda- mentais para a televisão educativa e para os projetos de EAD no Brasil e do mundo. O diálogo contínuo entre educadores e co- municadores propiciou a formação de um novo profissional, tanto no campo da edu- cação quanto no da comunicação, capaz de transitar nos dois mundos. Não basta- va reproduzir a sala de aula nem reproduzir a novela, era necessário experimentar novos formatos e adequar os conteúdos educativos às características das mídias. Por outro lado, consta- tava-se a importância da presença do professor na sala de aula, especialmente nos primeiros anos da vida escolar, quando os aprendentes ainda não estão familiarizados com os procedimentos nem com as habilidades acadêmicas. O pa- pel do professor como mediador entre su- jeito e objeto de conhecimento é condição primordial nesse segmento de ensino. A re- lação presencial, afetiva, faz parte de qual- quer processo de aprendizagem e nos pri- meiros anos escolares precisa ser real, para O diálogo contínuo entre educadores e comunicadores propiciou a formação de um novo profissional, tanto no campo da educação quanto no da comunicação, capaz de transitar nos dois mundos 22 aos poucos se transformar em experiências mediadas e internalizadas. Mesmo assim, a EAD se fortalece no cenário educativo, especialmente no âmbito do en- sino superior, pós-graduação, formação pro- fissional e corporativa. São vários projetos bem sucedidos no Brasil e no mundo. Cita- mos alguns exemplos como a Universidade Aberta da UnB, o CEDERJ, o SENAC, o SENAI, e vários sistemas universitários privadosque expandem seus cursos com a modalidade. A Fundação Roberto Marinho contribuiu sig- nificativamente nessa discussão, tanto em relação ao formato quanto à recepção dos produtos, buscando parcerias com as se- cretarias de educação para garantir os mo- nitores (professores) e salas de aula. A FRM continua seu projeto didático com a criação do Canal Futura, no ano seguinte em que o MEC cria a TV Escola, momento em que a educação passa a ser pauta comum do em- presariado, como condição de desenvolvi- mento econômico e social. Também nesta época foi criada a MultiRio, fundação ligada à Secretaria Municipal de Educação do Mu- nicípio do Rio de Janeiro. Em 1995, o MEC delega à Fundação Roquette Pinto, que passa a pertencer à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da Repú- blica, a responsabilidade de colocar no ar a TV Escola, um canal, via satélite, exclusiva- mente voltado para a educação, disponibi- lizando para todas as escolas uma progra- mação qualificada com vídeos educativos e produções elaboradas para atualização dos educadores. Entretanto, é um pouco antes, em 1992, que o Salto para o Futuro revigora o papel da EAD na formação e atualização de educadores, imple- mentando um projeto pioneiro que possibilita um diálogo diário sobre educação, entre edu- cadores de todo o país, em canal aberto, no horário nobre da televisão brasileira3. O trabalho começa em 1991, em caráter ex- perimental, com o título de JORNAL DA EDU- CAÇÃO – EDIÇÃO DO PROFESSOR, a partir de um decreto da Presidência da República que institui um “grupo de trabalho interminis- terial com o objetivo de elaborar projeto- piloto para recepção de imagem via satélite a ser utilizado no processo educacional bra- sileiro4”. Eram 30 minutos diários, atingindo em recepção organizada 600 estudantes de cursos de formação de professores, de 6 es- tados. Ele foi concebido originalmente pelo jornalista Fernando Barbosa Lima e pela pro- fessora Terezinha Saraiva. Ele, presidente da TVE, e ela, diretora de tecnologia educacio- 3 De 1992 a 1996 o programa foi transmitido ao vivo pela TVE e pela rede de televisões educativas de todo o país, de segunda a sexta-feira, no horário das 19h às 20h. 4 Terezinha Saraiva. Caminhos Trilhados, Reflexões e Fazeres. Rio de Janeiro: Ed. e Livraria Espaço do Saber. p. 361. 23 nal, conseguiram integrar suas experiências em uma proposta arrojada. Em 1992, já como Salto para o Futuro, o pro- grama ganha uma hora de duração e um novo formato: o primeiro bloco transmitia um vídeo ilustrando o conteúdo didático, com a mediação de um ator/atriz, e o segun- do era o “tira-dúvidas”, quando os professo- res especializados respondiam ao público, ao vivo. A interatividade na época era ape- nas por telefone e fax. A partir de avaliações constantes, a propos- ta foi sendo aprimorada junto a uma equipe de profissionais tanto de educação como de televisão, que traziam uma rica experiência acumulada pelas ações anteriores da Funda- ção Roquette-Pinto. Em 1993, os atores do pri- meiro bloco são substituídos pelos próprios professores conteudistas, visando dar maior veracidade ao texto educativo transmitido pela TV. Esse dilema, ator ou professor, tam- bém ocorreu em 1996, quando Walter Avanci- ni foi convidado para cuidar dos projetos da TV Escola. Com a expectativa de “melhorar” os programas, o renomado diretor de novelas da televisão comercial propôs a contratação de atores famosos, o que foi descartado após os primeiros testes. Por mais que os atores fossem famosos e bons, a credibilidade de sua narração é fundamental para o resultado de sua apresentação. E uma coisa é falar de fatos e emoções da vida cotidiana, como nas novelas, outra coisa é falar sobre processos de ensino/aprendizagem. É preciso conhecer, transmitir segurança e credibilidade. Os pro- fessores continuam até hoje no ar! Como todo projeto de EAD, o produto veicu- lado, no caso pela televisão, é apenas o que aparece de um conjunto de estratégias e materiais cuidadosamente elaborados. Para cada programa existia um texto de aprofun- damento dos conteúdos, com sugestões de atividades e referências bibliográficas, elabo- rado por professores com experiência na sala de aula real. Os textos eram agrupados em boletins, pelo tema de cada série, e enviados para as Secretarias Estaduais de Educação, responsáveis pela organização e manutenção dos telepostos e telessalas. Espaços geral- mente cedidos pelas escolas estaduais, onde os cursistas assistiam aos programas sob a mediação de um monitor, professor respon- sável em promover a participação, integra- ção, interatividade e aprendizagem dos par- ticipantes. Podiam se inscrever professores da Educação Infantil e das primeiras séries do Ensino Fundamental, além de alunos de pedagogia e dos cursos de Ensino Médio de formação de professores. Em 1995, existiam 1.500 telessalas em todo o país, com 142.261 professores e estudantes de pedagogia inscritos5. Após a transmissão 5 Terezinha Saraiva, op.cit. 24 do programa, os professores ficavam dia- riamente, por mais uma hora, conversan- do com essas turmas, por telefone ou fax. Além dessa recepção organizada, o progra- ma também atingia a um público espontâ- neo, conversando com professores e mesmo mães e pais que buscavam orientações para educarem seus alunos ou filhos. Neste ano, ele também passou a ser transmitido pela Rádio MEC. Ao longo dessas duas décadas, acompanha- mos a chegada das novas tecnologias de informação, da telefonia móvel à internet, que causaram, e continuam causando, uma verdadeira revolução nas relações humanas, nos modos de ser, de fazer e de viver dos ha- bitantes do planeta. Esses, por sua vez, pas- saram a ter outras preocupações, anterior- mente inimagináveis, como, por exemplo, a questão da sustentabilidade, a finitude dos recursos naturais, o atentado terrorista de 11 de setembro, a segurança etc. Acompanhando a diversidade do seu con- texto histórico, 20 anos depois, o projeto viveu diferentes formatos, adaptando-se às demandas das políticas públicas, das esco- las, dos educadores e da sociedade. Hoje, a TV Escola consolida-se como protagonista de uma programação voltada para a forma- ção de professores do Ensino Fundamental e também como modelo para experiências similares em outros níveis de ensino. A interatividade do projeto foi sempre o seu grande diferencial e, ao mesmo tempo, sua grande conquista. Possibilitar que fossem ouvidas as vozes de educadores de todo o país, abordando a diversidade de temas que frequentam o cotidiano das salas de aula, é o “salto para o futuro” que o projeto se pro- pôs e conseguiu realizar. O diálogo continua sendo o grande desafio da educação contemporânea. As tecnologias di- gitais misturam produtores e consumidores, palco e plateia, professores e alunos. Os papéis se confundem. Todos que aprendem, ensinam. Todos sabem! Assim, pensar na parceria televi- são e educação exige, cada vez mais, ampliar os canais de comunicação entre quem faz e quem assiste, possibilitando a troca e aprendi- zagem de diferentes fazeres e saberes. 25 pGm 2/TexTo 2: TV e público de educadoreS a TV na Sala de aula: noVo cenário, noVoS deSafioS Elicio Pontes1 InTrodução A partir da segunda metade do século XX, durante muito tempo, a televisão reinou absoluta na condição de meio de comunica- ção audiovisual de massa mais importante e quase onipresente em todo o mundo. Em consequência desse status alcançado, a TV sempre gerou polêmicas sobre os diferentes papéis que exercia – ou lhe foram atribuídos – na sociedade e no comportamento dos in- divíduos, particularmente as crianças. Não é de admirar que por sua grande influência positiva ou negativa, a depender do ponto de vista de cada um, ela tenha se constitu- ído sempre uma preocupaçãopara os edu- cadores. Por um lado, como expectativa de uso de suas possibilidades como importante meio auxiliar na educação e, por outro, pre- ocupação com o seu incontestável poder de influenciar o comportamento das pessoas, quase sempre visto por um ângulo negati- vo. Mesmo ao se adotar a TV na educação, inclusive com redes de emissoras públicas com finalidade educativa e cultural, perma- neceram a desconfiança e as polêmicas rela- cionadas a vários aspectos da programação da TV comercial, como a violência, a banali- zação da sexualidade, o consumismo etc. Ou seja, em torno de valores sociais difundidos pela televisão, muitas vezes considerados em desacordo com aqueles que a educação escolar procura desenvolver. Atualmente, a televisão não tem mais essa predominância absoluta. Ela enfrenta a con- corrência dos meios virtuais, representada não só por aparelhos menores, portáteis, multifuncionais e cada vez mais baratos, mas também pelas novas formas de comu- nicação criadas a partir deles. E, não menos importante, porque esses aparelhos, desde o que poderíamos chamar de um “simples” celular até as câmeras – cada vez mais sofis- ticadas, miniaturizadas e de manuseio sim- ples – invadiram o terreno que representa a própria natureza da TV e que se constitui a sua grande força como meio de comunica- ção e informação: a imagem. Talvez não seja absurdo que o YouTube é a “televisão” mais barata e mais universalizada na atualidade, alimentada a toda hora por uma infinidade de pessoas que antes não passavam de es- pectadores e consumidores da informação 26 audiovisual, e acabaram se transformando em virtuais produtores de vídeo e repórte- res, com seus produtos registrando milhões de acessos de internautas em todo o mundo. Este cenário, que delineamos de forma sin- tética e simplificada, é uma realidade que podemos constatar em nosso país onde, apenas para exemplificar, o número de ce- lulares (quase sempre dotados de câmeras) já é superior ao número de habitantes, ao mesmo tempo em que os computadores se tornam mais acessíveis a pessoas até pouco tempo excluídas do mundo digital. Diante dessa nova realidade, que também se reflete na escola e na vida dos estudantes em geral, é necessário levantar algumas indagações sobre essas novas tecnologias e o papel que (ainda) cabe à televisão na educação, e par- ticularmente na sala de aula. Mais uma vez, o professor deve ser personagem central nessa reflexão. InforMAção e conHecIMenTo Quais os papéis que a televisão veio desem- penhar na escola, ao conquistar seu espaço na sala de aula? Vale lembrar que ela veio como “a grande atração” – para usar uma lin- guagem do próprio meio – com a promessa de modernizar e revolucionar o ensino, tra- zendo para dentro da escola, antes de tudo, uma nova fonte de conhecimento, o encanto e o dinamismo de um meio desde o início saudado como uma “janela para o mundo”. As limitações do currículo, a rigidez da or- ganização dos espaços e dos tempos das es- colas, a falta de bibliotecas, as dificuldades em se difundir o cinema são obstáculos po- deriam ser superados pelo uso de programas de TV educativos, ou não educativos stricto sensu, inclusive gravados de emissoras aber- tas, como fonte de conteúdos apresentados de forma atraente etc. A maioria das esco- las, no entanto, por falta de infraestrutura adequada para concretizar essa inovação, e considerando ainda que os professores, em geral, não têm formação adequada para utilizar de forma intencional e crítica todo o potencial informativo e de conhecimento veiculado pela TV, prescinde da contribui- ção desse importante recurso na educação. Às vezes, havia a dificuldade até em operar o videocassete, aparelho hoje praticamente extinto e substituído pelo DVD, que também já tem sua morte anunciada para dar lugar a tecnologias mais sofisticadas, que vão sendo criadas. Alguns projetos, entre eles o Salto para o Futuro e a TV Escola, buscaram alterar essa realidade, propiciando não só um acer- vo de programas conectados com o currícu- lo, mas orientação para seu uso didático. Esse papel da TV, como fonte de informação e conhecimento, não deve ser subestimado ou abandonado, mesmo com o crescimento das tecnologias digitais e, em especial, a demo- cratização da Internet, que facilitou a entra- da em cena dos sites de busca, entre eles o Google, disponíveis ao alcance de um clique. 27 o que escolHer As possibilidades são inúmeras, consideran- do-se a programação de emissoras educa- tivas, da rede de emissoras comerciais, do acervo da escola, de locadoras (que já estão em crise, perdendo espaço para os filmes que podem ser baixados da internet) etc. Seja utilizando-se de acervo disponível na es- cola – que pode ser a opção mais imediata – ou buscando outros programas ou filmes tanto nas redes educativas como nas emis- soras abertas ou por assinatura, o professor pode fazer da TV um uso diferenciado em relação aos outros meios e tecnologias que hoje repre- sentam maior atrativo para os alunos. Estes, ao usar os computadores da escola ou de sua casa, ao se comunicar atra- vés dos recursos técnicos de um celular, se envolvem de uma forma individualizada e, para muitos, individualizante, que estimu- laria o isolamento. Mesmo tal julgamento sendo questionável, não há dúvida de que a sala de aula é um espaço coletivo, e deve ser um lugar em que se promove e se exercita a socialização em função das aprendizagens que constituem a finalidade da escola. E a TV pode ser usada com esse objetivo, ao con- trário da ideia de que ela impõe, inevitavel- mente, uma atitude de passividade do espec- tador. O professor e os alunos não têm por que aceitar essa suposta imposição e se com- portarem como audiência passiva. Qualquer programa ou filme pode ter seus conteúdos explorados de forma a motivar a discussão, o debate, o diálogo em torno do tema, dos argumentos apresentados, do seu forma- to artístico (estética, beleza de imagens) e técnico (linguagem televisiva), entre muitas vertentes. Isso depende, evidentemente, da mediação do professor – e este não fará uma mediação produtiva sem um trabalho pré- vio de conhecimento do programa ou filme e da elaboração de um roteiro que mobilize os alunos e relacione seu tema com a parte do currículo em execução. Um programa de TV ou um vídeo não são apenas uma outra fonte de conteúdo, me- ros substitutos do livro ou de outros mate- riais didáticos. São outros meios que têm sua própria linguagem e outras possibilida- des de aproveitamento no processo ensino- aprendizagem. Assim como seu conteúdo deve ser problematizado, transformado numa discussão que não se limita ao que ele expõe literalmente, a própria natureza des- se rico material audiovisual deve constituir Um programa de TV ou um vídeo não são apenas uma outra fonte de conteúdo, meros substitutos do livro ou de outros materiais didáticos. 28 foco de interesse nas atividades planejadas pelo professor. A leitura da TV (e da imagem, de um modo geral) deve ser também um dos objetivos, visando ao domínio de uma lin- guagem que está presente em praticamente todos os processos de comunicação na atu- alidade. Como toda linguagem, ela tem seus códigos que precisam ser compreendidos, se queremos tirar dela todo o proveito que pre- tendemos, no processo educativo. InTeresses e dIfIculdAdes Usar a TV na sala de aula, alguns anos atrás, era praticamente o prolongamento daqui- lo que as crianças faziam todo dia em suas próprias casas: permanecer horas diante da telinha. Atualmente, é mais comum ver crianças e adolescentes diante de um com- putador ou manuseando um celular durante horas, que diante de um televisor. Não é di- ferente na escola; às vezes, professores são obrigados a “confiscar”celulares, que não são deixados de lado pelos alunos mesmo durante a aula. É claro, no entanto, que a te- levisão não desapareceu da vida de crianças, adolescentes e adultos. Há algumas diferenças nas condições de uso da TV escolar e da parafernália virtual que precisam ser compreendidas. Enquanto esses aparelhinhos pertencem aos alunos, que os utilizam para seu próprio interesse, a TV é parte do ambiente escolar e é utilizada para audiência coletiva. No primeiro caso, a atração é a conectividade, praticamente sinônimo de interatividade (estar conec- tado com tudo e com todos, durante todo o tempo); na sala de aula, o aluno deve se postar diante da TV na condição de receptor, permanecer em silêncio e prestar atenção compartilhada com os demais, por um tem- po determinado pela duração do programa. Essa situação pode parecer desestimulante. Atenção e interesse são dois elementos fun- damentais em uma atividade escolar; por- tanto, esse é um desafio em busca de solu- ções criativas e significativas do professor, para melhor aproveitar a TV num cenário em que despontam fortes concorrentes ao seu poder de atração. A TV é um meio de comunicação linear, uni- lateral (não consideramos aqui a TV digi- tal, com promessas de interatividade, pois ela ainda é uma realidade muito limitada.) Mas, num processo educativo, devemos dar maior atenção à intercomunicação, ao en- volvimento ativo do receptor. O diálogo, o debate, o questionamento devem ser exer- cícios intencionalmente voltados para o de- senvolvimento do espírito crítico. Observar, comparar, levantar outras perguntas são ações que devem ser entendidas pelos alu- nos como exercícios do seu aprender. O professor, além de usar a TV para sua própria formação, deve ser o mediador capaz de esta- belecer um diálogo com o material visto na TV, que ele programou e levou para a sala de aula. 29 Não é necessário fazer uma lista de questões que cubram todos os aspectos do programa/ filme, mas alguns questionamentos capazes de gerar novas perguntas feitas pelos próprios alunos. É importante partir do princípio de que é melhor ter uma boa pergunta do que receber uma resposta pronta, às vezes antes mesmo de saber o que deveria perguntar. Nem sempre os programas, em qualquer formato, privilegiam os questionamentos. Geralmente são mais expositivos, narrativos, ilustrativos, na maio- ria das vezes dão respostas mais do que estimulam a dúvida. Mas é inegável que qualquer progra- ma contém uma grande quanti- dade de informa- ções e ideias que podem e devem ser exploradas pela via do ques- tionamento. O professor pode estimular o diá- logo, onde a tendência é o monólogo. Entre as possibilidades de exploração da téc- nica e da linguagem, pode-se observar e dis- cutir a natureza das imagens, identificando e analisando, por exemplo: o que é reprodu- ção e registro da realidade; o que é recons- tituição histórica de cenários e seres; re- criação dramatizada de situações e eventos; observar e analisar os recursos técnicos de criação, ampliação ou redução de imagens, do infinitamente grande ao infinitamente pequeno (do universo ao átomo). Esses e muitos outros aspectos podem servir como elementos para compreensão da linguagem visual/audiovisual, como uma das várias ver- tentes no uso da TV na sala de aula. TV, Vídeo, fIlMe Em que medida esses meios se diferenciam ou se confundem, e que diferença faz ao serem usados na sala de aula? Em princípio, televisão é o que foi produzido especifica- mente para esse meio, veiculado segundo as características de emissoras ou redes: uma grade de progra- mação, variedade de gêneros, horários e du- ração dos programas, estrutura do progra- ma com intervalos para inserção de publici- dade etc. Programas educativos stricto sensu não estão submetidos a essa lógica da TV comercial, e por isso se adequam melhor ao uso escolar, uma vez que já foram elabora- dos e produzidos com esse finalidade. Víde- os de vários tipos, inclusive produzidos fora da grande indústria cultural – por institui- ções educativas, videomakers amadores ou semiprofissionais, realizados nas próprias O professor, além de usar a TV para sua própria formação, deve ser o mediador capaz de estabelecer um diálogo com o material visto na TV, que ele programou e levou para a sala de aula. 30 escolas ou pelos alunos – oferecem outros olhares e outras possibilidades de aproveita- mento na sala de aula, dentro do currículo ou como atividade cultural. Filmes, em sua forma comercial de longa metragem, e par- te do cinema como indústria cultural e de entretenimento também têm lugar na sala de aula, sobretudo como possibilidade de ampliação e diversificação das percepções culturais dos alunos. Estes exemplos se referem, evidentemente, a três formas de comunicação (arte e técnica) audiovisual, e entre eles há diferenças impor- tantes em termos de linguagem. Mas, inte- ressam mais aqui os aspectos comuns. Antes de tudo, são linguagens essencialmente ima- géticas e que podem ser tecnicamente redu- zidas a uma mesma forma de apresentação, através de um aparelho de TV (videocassetes, DVDs, conectados a um computador etc.). Na tela de um televisor, hoje com dimensões maiores, tela plana, alta definição e outros aperfeiçoamentos tecnológicos, o que vemos é televisão. Sem intenção de levantar uma discussão teórica sobre o tema, poderíamos dizer que, neste caso, “tudo é televisão”, ou “tudo vira televisão”, em termos práticos. Nossa referência é a sala de aula e as ativida- des didáticas que ali se desenvolvem e, nesse caso, as estratégias são semelhantes. O uso de filmes é menos comum, mas merece al- guns comentários à parte. Um filme (uma história de ficção, mesmo se baseada em fatos reais) é, antes de tudo, uma história, uma narrativa. Deve ser visto como um todo, não em fragmentos. A análi- se de partes (cenas, incidentes) pode e deve ser feita, mas fará mais sentido no contexto da história. O tempo do filme não é o mes- mo tempo da televisão. A linguagem se dife- rencia: sequências e planos longos e demo- rados, ao contrário da TV, que geralmente “corre contra o relógio”, mudando de cena, através de cortes, com muita frequência, em nome do dinamismo e da ação que, num efeito circular, tornou-se um padrão para os espectadores. Um filme narrado em ou- tro ritmo é considerado, principalmente por adolescentes, “monótono”, “chato”, “difícil de aguentar” por 90 minutos ou mais. Não estamos nos referindo a filmes “difíceis”, “intelectualizados”, mas à reação contra fil- mes que não sigam o padrão popularizado através de sua exibição na própria televisão: ação ininterrupta, perseguições em alta ve- locidade nos mais diversos veículos – carros, lanchas, helicópteros... tiroteios, explosões. Um filme fora desse modelo corre o risco de ser considerado desinteressante e esse é um problema real a enfrentar quando se opta por exibir um filme em sala de aula. conTexTuAlIzAndo, crITIcAndo, coMPreendendo Vamos dar alguns exemplos (reais) de uso em sala de aula. Filme: “Caminho para 31 casa”. A história de um jovem professor que vai lecionar numa pequena comuni- dade rural no interior da China, na década de 1950. Quarenta anos depois, quando de sua morte, o filho volta da cidade grande para providenciar o enterro, mas a mãe insiste que seu corpo deve ser conduzido pelas pessoas do povoado, uma tradição e um reconhecimento da comunidade que ele educou. É uma história de amor e, ao mes- mo tempo, de reflexão sobre a educação e o respeito à figura do professor. Discussão: a maioria dos alunos (jovens estudantes de Pedagogia) considerou o filme monótono. Outra compreensão resultou do debate e da contextualização da história (época e local), que não poderia ser contadano mesmo rit- mo de um filme de aventuras e ação numa metrópole moderna. A avaliação posterior foi radicalmente modificada a partir dessa compreensão. Vídeo: Desenho animado de Tom e Jerry. Produção antiga, mas continuamente repri- sada em canais de TV, abertos ou por assi- naturas. Um grupo de crianças, da geração que praticamente nasceu com um celular nas mãos, riu e estranhou aquele aparelho esquisito, pendurado na parede e que pre- cisava rodar um disco para fazer a ligação. Apesar de reconhecido como um telefone, evidente no seu modo de usar, era um apa- relho estranho às suas experiências. Uma atividade de aprendizagem foi desenvolvida sobre os meios de comunicação em diferen- tes épocas, e a forma como eles são usados e afetam a vida das pessoas. Uma ativida- de lúdica, com potencial de aprendizagem transversal. Vídeo: publicidade de televisão. Objetivo, discutir o próprio meio, suas mensagens e a linguagem audiovisual. Contraste entre a beleza e a sedução das imagens de um anún- cio de cerveja e a mensagem escrita ao final (obrigatória por lei): “Beba com moderação. Se for dirigir, não beba”. A discussão resul- tou numa conclusão que pareceu óbvia, aos participantes: a advertência, apenas com palavras, tem um poder muito menor de in- fluir no comportamento dos telespectadores do que a mensagem audiovisual. O mesmo pode ser feito com outros filmes publicitá- rios – uma área em que se usa com extrema competência a comunicação audiovisual. Estes exemplos pretendem mostrar a varie- dade de possibilidades que o meio TV ofe- rece ao seu uso na sala de aula. Aqui, en- fatizamos alguns aspectos, sobretudo a necessidade de contextualização e de expli- cações que podem ser acrescentadas, pelo professor, para orientar a crítica, a análise e a compreensão, além de relacionar o mate- rial com o tema em estudo, dentro do currí- culo ou de uma determinada disciplina. No entanto, há vários aspectos de ordem prática a considerar. O tempo de duração de um filme geralmente é maior do que o tempo 32 destinado a uma aula. O que fazer? Dividi-lo em partes, exibidas em dias diferentes, por exemplo, seria inadequado, desfigurando-o completamente. Encontrar uma solução... ou desistir? Os programas educativos de TV geralmente não apresentam esse problema, pois já foram produzidos considerando as características do meio e de sua forma de programação para o público. Além disso, é preciso certificar-se do bom funcionamento dos equipamentos, disponibilidade de espa- ços (caso não seja a própria sala de aula), apoio técnico, o eventual uso de material impresso complementar para a atividade, como roteiros, questionários etc. E, princi- palmente, que a atividade não se esgote em si mesma, mas que possa ser relacionada a outros momentos ou disciplinas do currícu- lo e da série em que se encontram os alunos. conclusões Neste texto, não tivemos o propósito de apresentar fórmulas prontas para o uso da TV na sala de aula; antes, procuramos suge- rir algumas questões para reflexão a partir da experiência de cada docente. Um aspecto que enfatizamos é a necessidade de relacio- nar esse meio com as novas tecnologias que fazem parte do dia a dia, às vezes mais dos alunos do que da escola. É um novo cená- rio, que propõe novos desafios, e um deles é transformar esses meios e tecnologias em aliados do processo educativo, apesar das dúvidas, críticas e desconfianças que eles suscitam. Muitas delas são justas, outras são resultantes do desconhecimento e de uma postura crítica superficial, apenas bem intencionada. Especialmente em relação à TV, é preciso repensar o seu papel e desmiti- ficar alguns de seus poderes e defeitos. A escola deve aproveitar todos os recursos que a tecnologia acrescenta, porque ela cada vez mais fará parte da vida das pessoas, con- tinuará criando novos meios e formas de co- municação e informação que precisam ser apreendidos e incorporados à experiência do professor e dos estudantes, sejam crianças, adolescentes ou adultos. Esse processo, no entanto, deve ser consciente, crítico, criati- vo e dentro de uma visão educativa que con- temple tanto o indivíduo e seu crescimento quanto o meio social em que ele se insere. A escola tem um papel fundamental na de- finição do significado e da atuação desses meios e tecnologias na sociedade atual, e o desempenhará melhor na medida em que desenvolver e compartilhar as competências necessárias com sua própria comunidade de professores e alunos. referêncIAs APARICI, Roberto; GARCÍA MATILLA, Agustín; VALDIVIA SANTIAGO, Manuel. La imagen. 2ª ed. Madrid: Universidad Nacional de Educa- ción a Distancia, 1998. APARICI, Roberto (coord.). Comunicación 33 educativa en la sociedad de la información. Madrid: Universidad Nacional de Educación a Distancia, 2003. FERRÉS, Joan. Televisão e Educação. Trad. Be- atriz Affonso Neves. Porto Alegre: Artes Mé- dicas, 1996. _____________. Vídeo e Educação. 2ª ed. Trad. Juan Acuña Llorens. Porto Alegre: Artes Mé- dicas, 1996. NAPOLITANO, Marcos. Como usar a televisão na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1999. PONTES, Elicio; COUTINHO, Laura Maria; SOUSA, Carlos Alberto Lopes de. Linguagem audiovisual e educação a distância. 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Além disso, uma mesma socieda- de, por ser temporal e histórica, passa por transformações culturais amplas e, sob esse aspecto, antropologia e Histó- ria se completam, ainda que os ritmos temporais das várias sociedades não se- jam os mesmos, algumas mudando mais lentamente e outras mais rapidamente. A esse sentido histórico-antropológico amplo, podemos acrescentar um outro, restrito, ligado ao antigo sentido de cul- tivo do espírito: a Cultura como criação de obras da sensibilidade e da imagina- ção, as obras de arte, e como criação de obras da inteligência e da reflexão, as obras do pensamento. É esse segun- do sentido que leva o senso comum a identificar cultura e escola (educação formal), de um lado, e, de outro lado, a identificar cultura e belas artes (música, pintura, escultura, dança, literatura, te- atro, cinema etc.). Se, porém, reunirmos o sentido amplo e o sentido restrito, compreenderemos que a cultura é a maneira pela qual os humanos se humanizam por meio de práticas que criam a existência social, econômica, política, religiosa, intelectu- al e artística. A religião, a culinária, o vestuário, o mobiliário, as formas de habitação, os hábitos à mesa, as cerimônias, o modo de relacionar-se com os mais velhos e os mais jovens, com os animais e com a ter- ra, os utensílios, as técnicas, as institui- ções sociais (como a família) e políticas 1 Professora, pedagoga e psicóloga. Doutora em Comunicação e Cultura -ECO-UFRJ. 35 (como o Estado), os costumes diante da morte, a guerra, o trabalho, as ciências, a filosofia, as artes, os jogos, as festas, os tribunais, as relações amorosas, as diferenças sexuais e étnicas, tudo isso constitui a Cultura como invenção da relação com o Outro"2. o conceITo de
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