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CULTURA E IDENTIDADE Profa. Maria das Graças Dias Pereira Departamento de Letras - PUC-Rio LET1832 - Linguagem e sociedade 6ª aula – 10/09/2020 – 5ª feira ABORDAGENS E CONCEPÇÕES 1. Cultura nas ciências sociais (Cuche [1999] 2002) 2. Cultura na antropologia linguística (Duranti, 1997) 3. Cultura na comunicação intercultural (Ting-Toomey, 1999) ▪ exame e comparação do discurso de pessoas de backgrounds culturais e linguísticos diferentes interagindo em uma língua comum (língua veicular) ou em uma das línguas dos interlocutores (Clyne, [1994]1996 ) 4. Cultura no ensino de segunda língua (Roberts, 1991) Abordagem Interlinguagem – exame do discurso de falantes não- nativos em uma segunda língua. (Clyne, [1994]1996 ) Abordagem Contrastiva – comparação do discurso de falantes nativos entre culturas diferentes (Clyne, [1994]1996 ) 5. Cultura no pós-estruturalismo: entre-lugares culturais - teoria crítica e prática política (Bhabha [1998] 2005) CULTURA NAS CIÊNCIAS SOCIAIS (CUCHE [1999] 2002) Gênese da palavra e da ideia de cultura ✓ As palavras têm uma história e (...) fazem a história (p. 17) ✓ Cultura na língua francesa Século XVIII – cultura das artes, das letras, das ciências (p. 20) Cultura no singular – universalismo e humanismo dos filósofos – associada a progresso, evolução, educação, razão (p. 21) Cultura e civilização (p. 23) ✓ O debate franco-alemão sobre a cultura ou a antítese cultura-civilização (p. 23) - CULTURA NAS CIÊNCIAS SOCIAIS (CUCHE [1999] 2002) A invenção do conceito científico de cultura ✓ Tylor e a concepção universalista da cultura: cultura e civilização (p. 35) ✓ Franz Boas e a concepção particularista de cultura: o inventor da etnografia – estudo das culturas 1886 – América do Norte – pesquisa de campo com os índios Kwakiutl, Chinook e Tsimshian (p. 40) Concepção antropológica do relativismo cultural ✓ Malinowski e a análise funcionalista de cultura Método etnográfico em campo e observação participante CULTURA NA ANTROPOLOGIA LINGUÍSTICA CONCEPÇÕES DE CULTURA (DURANTI, 1997) A premissa da antropologia linguística é a de que a linguagem deve ser entendida como prática cultural. Crítica: cultura como noção muito abrangente que pode reduzir complexidades socio- históricas a simples caracterizações, ocultando as contradições morais e sociais que existem dentro e através das comunidades; dicotomias ingênuas e enganadoras: “nós” e “eles”, “civilizados” e “primitivos”, “racional” e “irracional”, “alfabetizado”, “analfabeto” e assim por diante. CONCEPÇÕES SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) A palavra “cultura” é muitas vezes usada para explicar por que minorias e grupos marginalizados não aprendem facilmente ou porque não se incorporam à corrente principal da sociedade. Devemos ou não tentar caracterizar/ entender o que é cultura, ou como são as culturas? É possível termos uma concepção do que é uma dada cultura? Se há problemas com os primeiros conceitos de cultura, podem ser pequenos de comparados aos danos em se evitar o conceito, que pode nos ajudar a entender similaridades e diferenças na maneira em que as pessoas de todo o mundo constituem a si mesmas e se agregam de várias maneiras. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) Proposta do autor: discutir teorias sobre cultura nas quais a linguagem desempenha um papel particularmente importante. (i) cultura distinta da natureza: “é aprendida, transmitida de geração a geração, através de ações humanas, freqüentemente em interações face a face.”(Duranti, 1997:24). ➢ Essa visão da cultura pretende explicar por que qualquer criança humana, independentemente de sua herança genética, crescerá seguindo os modelos das pessoas que a educaram. ➢ Esta noção de cultura como algo aprendido contrasta com a visão de comportamento humano como um produto da natureza. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (i) Cultura distinta da natureza A partir dessa perspectiva, a língua é parte da cultura. Mais especificamente, as línguas categorizam o mundo natural e cultural de maneiras úteis. São sistemas ricos de classificação (taxonomias) que podem dar pistas importantes sobre como estudar práticas e crenças culturais particulares. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (ii) Cultura como conhecimento: Se a cultura é aprendida, então ela pode ser pensada em termos do conhecimento de mundo. Isso não significa apenas que os membros de uma cultura têm que conhecer determinados fatos ou têm que ser capazes de reconhecer objetos, lugares e pessoas. Significa também que eles têm que compartilhar de determinados padrões de pensamento, maneiras de compreender o mundo, fazer inferências e previsões. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (iii) Cultura como conhecimento socialmente distribuído: Dizer que o conhecimento cultural está socialmente distribuído significa reconhecer que (i) o indivíduo não é o fim da linha do processo de aquisição, e (ii) nem todo mundo tem acesso à mesma informação ou utiliza as mesmas técnicas para atingir determinadas metas. O primeiro ponto implica que o conhecimento nem sempre é tudo na mente do indivíduo. Ele está também nas ferramentas que a pessoa usa, no ambiente que permite que certas soluções se tornem possíveis, na atividade conjunta de muitas mentes e corpos mirarem o mesmo alvo, nas instituições que regulam as funções do indivíduo e suas interações. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) . Essa diversidade na distribuição de conhecimento entre os participantes e as ferramentas não trata apenas dos campos mais esotéricos, técnicos ou especializados (por exemplo, medicina, navegação, artes e ofícios, discursos públicos); mas também permeia os domínios e as atividades cotidianas. Essa perspectiva do conhecimento e do aprendizado implica que o que uma pessoa necessita saber ou fazer para ser um membro competente de um dado grupo não pode ser facilmente representado por uma série de proposições. . O trabalho realizado por John Gumperz e seus colegas sobre o uso de uma língua em comunidades multilinguais enfatiza as formas específicas em que a língua pode ser uma barreira na integração social (Gumperz 1982a, 1982b, Jupp, Roberts e Cook- Gumperz 1982). TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (iv) Cultura como comunicação Dizer que cultura é comunicação significa ver a cultura como um sistema de signos. Essa é a teoria semiótica da cultura. Na versão mais básica, essa visão sustenta que a cultura é uma representação do mundo, uma maneira de ver sentido na realidade objetivando-a em histórias, mitos, descrições, teorias, provérbios, produtos e apresentações artísticas. Nessa perspectiva, os produtos culturais de um povo; por exemplo, mitos, rituais, classificações do mundo natural e social; também podem ser vistos como exemplos da apropriação da natureza pelos homens através de sua habilidade de estabelecer relações simbólicas entre indivíduos, grupos ou espécies. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (iv) Cultura como comunicação Lévi-Strauss e a abordagem semiótica Segundo ele, todas as culturas são sistemas que expressam predisposições cognitivas profundamente sustentadas para categorizar o mundo em termos de oposições binárias (Leach 1970; Lévi-Strauss 1963a, 1963b, 1978; Pace 1983). Lévi-Strauss parte do princípio de que a mente humana é igual em todos os lugares e as culturas são implementações diferentes das propriedades de pensamento lógicas, abstratas e básicas; implementações essas que são compartilhadas por todos os humanos e adaptadas a condições de vida específicas. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (iv) Cultura como comunicação Clifford Geertz e a abordagem interpretativa Cultura é comunicação também para Clifford Geertz, que, em contraste com Lévi-Strauss, não vê as diferenças culturais como variações da mesma capacidadeinconsciente dos humanos para o pensamento abstrato. “O conceito de cultura que eu adoto... é essencialmente semiótico. Acreditando, como Max Weber, que o homem é um animal suspenso em redes de significações que ele mesmo teceu, eu tomo a cultura como essas redes, e a análise dela , portanto, não como uma ciência experimental em busca de uma lei, mas uma ciência interpretativa em busca de significado.” (Geertz 1973: 5) TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (iv) Cultura como comunicação Clifford Geertz e a abordagem interpretativa ✓ Para Geertz, as “redes” das quais a cultura é feita devem ser desveladas através de cuidadosas investigações e reflexões etnográficas, o que pode trazer diferentes pontos de vista sobre o que parece ser o mesmo acontecimento. ✓ O conceito de (descrição densa) – emprestada de Gilbert Ryle – é uma das principais metáforas na teoria da cultura de Geertz: um etnógrafo retorna para os mesmos materiais e acrescenta “camadas” – esse seria o sentido de “densa”, como em pilha densa – também densidade, concentração – como em sopa concentrada. A visão de Geertz sobre cultura focaliza a cultura como produto da interação humana – “a cultura...é pública... não existe na cabeça de alguém...” (ibid.).Os seres humanos têm que criar a cultura e interpretá-la. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (iv) Cultura como comunicação Metáforas como teorias do povo a respeito do mundo Estudos sobre metáforas também podem ser considerados como um outro caso no qual as culturas são vistas como transmitidas através de formas lingüísticas e, daí, como comunicação, apesar de o estudo de metáforas ter sido particularmente atraente aos antropólogos que contribuíram para a visão cognitiva da cultura (Keesing 1974). Da visão funcional de metáforas como formas de controlar nosso meio social e natural (Sapir e Crocker 1977) às teorias cognitivas mais recentes que vêem a metáfora como processos “pelos quais entendemos e estruturamos um domínio de experiência em termos de outro domínio de um tipo diferente” (Johnson 1987: 15), a linguagem figurativa sempre atraiu antropólogos, linguistas e filósofos interessados em como a forma específica e o conteúdo de nossa fala podem ser vistos como um guia para a nossa experiência do mundo. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (v) Cultura como um sistema de mediação Ferramentas são, por definição, objetos de mediação. São objetos que se encontram entre o usuário e o objeto de seu trabalho. Essa visão das ferramentas nos remete à noção de Marx de “instrumento de trabalho”, como mostrado na seguinte citação: O instrumento de trabalho é uma coisa, ou um complexo de coisas, que o trabalhador interpõe entre ele mesmo e o objeto de seu trabalho, e que serve como condutor de sua atividade. Ele usa as propriedades mecânicas, físicas e químicas de algumas substâncias a fim de produzir outras substâncias subservientes às suas metas. (...) A própria terra é um instrumento de trabalho, mas, quando usada dessa maneira na agricultura, implica uma série de outros instrumentos e um desenvolvimento de trabalho comparativamente alto. (Marx 1906: 199) a habilidade de as pessoas ajustarem, explorarem ou controlarem a natureza ou suas ações com outros seres humanos aumenta ou simplesmente se modifica pelo uso de ferramentas. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (v) Cultura como um sistema de mediação Nessa visão, “instrumentos de trabalho” são quaisquer coisas que os humanos usam para controlar o meio e produzir recursos. Por definição, esses instrumentos estão sempre “entre”. Eles estão sempre entre as pessoas e a comida (por exemplo, um garfo), pessoas e o clima (por exemplo, um guarda-chuva), pessoas e uma matéria física (um machado, por exemplo), pessoas e outras pessoas (gestos, declarações) pessoas e seus próprios pensamentos (conversas privadas, representações mentais). A cultura organiza o uso de ferramentas em atividades específicas, como na caça, na cozinha, na construção, na luta, lembrando o passado e planejando o futuro. Em cada caso, a habilidade de as pessoas ajustarem, explorarem ou controlarem a natureza ou suas ações com outros seres humanos aumenta ou simplesmente se modifica pelo uso de ferramentas. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (vi) Cultura como um sistema de práticas A noção de cultura como um sistema de práticas deve muito ao movimento intelectual conhecido como pós-estruturalismo. No fim dos anos 1960 e início dos 1970, o interesse nos aspectos estáveis dos sistemas culturais foi substituído pelo retorno da diacronia e da historicidade. Generalizações sobre culturas inteiras e abstrações baseadas em oposições simbólicas – como as usadas por Lévi-Strauss foram criticadas como “essencialistas” ou “metafísicas”. O pós-estruturalismo se origina na França, sobretudo nos trabalhos de estudiosos como Lacan, Foucault e Derrida (Sarup 1989). Os intelectuais da França pós-guerra haviam sido fortemente influenciados pela filosofia de Martin Heidegger. Heidegger (1962, 1985,1988, 1992) sustentava que aquilo que os cientistas e filósofos identificavam tão facilmente como os “objetos” de seus estudos não são as entidades mais básicas de nossas experiências. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (vi) Cultura como um sistema de práticas O sujeito de pensamento racional identificado pelos grandes filósofos da Modernidade – Descartes, Kant e Husserl – não é a fonte exclusiva ou privilegiada de nossa compreensão do mundo. Nosso entendimento abstrato, conceitual e teórico do mundo não é primário, mas derivado de outras premissas existenciais incluindo o nosso ser imerso em um meio, onde os objetos são considerados pragmaticamente úteis, situações são experimentadas no contexto de atitudes particulares ou “humores”, e pessoas são seres para se conviver. Essas reflexões são importantes porque elas ligam atos individuais a estruturas de referência maiores, incluindo a noção de comunidade, um conceito que tem sido o centro de muito debate na antropologia sociolingüística e lingüística. TEORIAS SOBRE A CULTURA (DURANTI, 1997) (vi) Cultura como um sistema de práticas Bourdieu enfatiza a relação entre conhecimento e ação no mundo, entre condições passadas e presentes (Bourdieu 1977, 1990). Para ele, os atores sociais não são nem completamente o produto de condições materiais externas (econômico e ecológico), nem tópicos intencionais, conscientes e sociais, cujas representações mentais são auto-suficientes: “A teoria da prática como prática insiste, em oposição ao materialismo positivista, que os objetos de conhecimento são construídos, e não passivamente registrados. E, em oposição ao idealismo intelectual, que os princípios dessa construção é o sistema de disposições estruturadas e estruturantes, o habitus, que é constituído em prática e é sempre orientada na direção das funções práticas.” (Bourdieu 1990:52) IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 1. Relações cultura e identidade: - “Há o desejo de se ver cultura em tudo, de encontrar identidade para todos.” (p. 175) - “Vêem-se crises culturais como crises de identidade.” (p. 175) - “Não se pode, pura e simplesmente confundir as noções de cultura e de identidade cultural ainda que as duas tenham uma grande ligação.” (p. 176) - “... a cultura pode existir sem consciência de identidade, ao passo que as estratégias de identidade podem manipular e até modificar uma cultura que não terá então quase nada em comum com o que ela era anteriormente.” (p. 176) - “A cultura depende em grande parte de processos inconscientes. A identidade remete a uma norma de vinculação, necessariamente consciente, baseada em oposições simbólicas.”(p. 176) IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 2. O conceito de identidade culturalnas ciências sociais: a) Questionamento à concepção de identidade cultural como algo imutável e determinante da conduta dos indivíduos: a identidade depende do contexto relacional. b) Identidade cultural – um dos componentes da identidade social. c) Psicologia social: identidade como instrumento que permite a articulação entre o elemento psicológico e o fator social de um indivíduo. d) Identidade social e o indivíduo – vinculações em um sistema social: classe social, nação, etc.; permite que o indivíduo se localize em um sistema social e seja localizado socialmente. IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 2. O conceito de identidade cultural nas ciências sociais: e) Identidade social e grupos: “Todo grupo é dotado de uma identidade que corresponde à sua definição social, definição que permite situá-lo no conjunto social.” (p. 177) ❑ “A identidade social é ao mesmo tempo inclusão e exclusão: ela identifica o grupo (são membros do grupo os que são idênticos sob um certo ponto de vista) e o distingue de outros grupos (cujos membros são diferentes dos primeiros sob o mesmo ponto de vista).” (p. 177) ❑ Identidade cultural como modalidade de categorização da distinção nós/eles, baseada na diferença cultural. Comentar: Dissertação de Mestrado de Maria Luiza Oliveira “A construção de identidades em bate-papos virtuais em um canal da Internet no Brasil”. Departamento de Letras da PUC-Rio, 22 de abril de 2002. IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 3. A concepção objetivista da identidade cultural - Cultura como herança: identidade que define e marca o indivíduo; identidade cultural remeteria ao grupo original de vinculação do indivíduo; raízes como o fundamento da identidade cultural. - Representação quase genética da identidade – apoio para as ideologias do enraizamento; naturalização da vinculação cultural. - Identidade preexistente ao indivíduo – essência impossibilitada de evoluir, sobre a qual o indivíduo ou o grupo não têm nenhuma influência. IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 3. A concepção objetivista da identidade cultural Abordagens: - Genética: herança biológica - o indivíduo nasce com os elementos constitutivos da identidade étnica e cultural - Culturalista: ligada à socialização do indivíduo no interior de seu grupo cultural. Resultado: quase o mesmo; o indivíduo é levado a interiorizar os modelos culturais que lhe são impostos. “É no grupo étnico que se partilham as emoções e as solidariedades mais profundas e mais estruturantes.” (p. 180) - Concepção objetivista da identidade cultural – a mesma origem comum, a língua, a cultura, a religião, o vínculo a um território. IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 4. A concepção subjetivista da identidade cultural - Faz a crítica à concepção objetiva: a identidade cultural não pode ser reduzida à sua dimensão atributiva, não é uma identidade recebida definitivamente. - Para os subjetivistas, “a identidade etnocultural não é nada além de um sentimento de vinculação ou uma identificação a uma coletividade imaginária em maior ou menor grau.” (p. 181) - O importante são as representações que os indivíduos fazem da realidade social e de suas divisões. - Riscos: redução da identidade a uma questão de escolha individual arbitrária; elaboração fantasiosa, nascida da imaginação. - Méritos: considerar o caráter variável da identidade. Ver: Bertholdo, Ernesto Sérgio. O contato-confronto com uma língua estrangeira: a subjetividade do sujeito bilíngüe. In: Coracini, Maria José (org.). Identidade & Discurso: (dês)construindo subjetividades. Campinas: Editora da UNICAMP; Chapecó: Argos Editora Univ. , 2003 p. 83-117 IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 5. A concepção relacional e situacional de identidade - Somente o contexto pode explicar porque, em um dado momento, uma dada identidade é afirmada ou reprimida. a) Identidade como construção social - Se faz no interior de contextos sociais que determinam a posição dos agentes e orientam as representações e escolhas. b) Concepção relacional - Ë uma construção que se elabora em uma relação que opõe um grupo aos outros grupos com os quais está em contato. Ver Barth (1969): - deve-se entender o fenômeno da identidade através das relações entre os grupos sociais; identidade é um modo de categorização utilizado pelos grupos para organizar suas trocas. - Os membros de um grupo não são vistos como definitivamente determinados por sua vinculação etno- cultural, pois eles são os próprios atores que atribuem uma significação a esta vinculação, em função da situação relacional em que se encontram. (p. 183) IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 5. A concepção relacional e situacional de identidade b) Concepção relacional - “Não há identidade em si, nem mesmo unicamente para si. A identidade existe sempre em relação a uma outra. Ou seja, identidade e alteridade são ligadas e estão em uma relação dialética.” (p. 183) c) Identidade como identificação - Identidade como processo de identificação em uma situação relacional (ver Galissot, 1987). - A identificação pode funcionar como afirmação ou como imposição de identidade. Ver: PEREIRA, M. G. D. ; SILVEIRA, S. B. . Entre velhas e novas identidades na pós-modernidade:a construção de identidade de clientes de regiões do interior do país em uma Central de Atendimento Telefônico. In: Maria José Coracini; Izabel Magalhaes; Marisa Grigoletto. (Org.). Praticas Identitarias na Linguistica Aplicada. São Paulo: Editora Claraluz Ltda, 2006. p. 120-129 IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 5. A concepção relacional e situacional de identidade c) Identidade como identificação - A identidade é sempre uma concessão, uma negociação entre uma “auto-identidade” definida por si mesmo e uma “exo-identidade” definida pelos outros”(p. 183-4). Exemplos: - hetero-identidade com idenficações pardoxais – imigrantes sírio-libaneses na América Latina, no final do séc. XIX e começo do séc. XX Cristãos que fugiam do Império Otomano – foram chamados de turcos, porque chegavam com passaportes turcos.; não desejavam se reconhecer como turcos. IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 5. A concepção relacional e situacional de identidade c) Identidade como identificação - A auto-identidade terá maior ou menor legitimidade que a hetero-identidade, dependendo da situação relacional – por ex. da relação de força entre os grupos de contato – relação de forças simbólicas. - Situação de dominação – hetero-identidade traduzida pela estigmatização dos grupos minoritários – identidade negativa (v. p. 184 e 185) - Mudanças na imagem negativa nas relações interétnicas (p. 185) IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 5. A concepção relacional e situacional de identidade c) Identidade como identificação - A identidade é então o que está em jogo nas lutas sociais. “Nem todos os grupos têm o mesmo “poder de identificação”, pois este poder depende da posição que se ocupa no sistema de relações que liga os grupos.” (p. 185- 186) - “Nem todos os grupos têm o poder de nomear e de se nomear” (p. 186) Exemplos: classe baixa/ classes populares, emergentes Ver Bourdieu (1980) – artigo “A identidade e a representação” - Compreendida como um motivo de lutas, não é possível ter uma definição exata de identidade – nem pela sociologia, nem pela antropologia (p.187) - Papel do cientista: explicar os processos de identificação sem julgá-los – elucidar as lógicas sociais (p. 187-188). IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 5. A concepção relacional e situacional de identidade c) Situação de estigmatização – identidade negativa Ver livro de Goffman Exemplos: DE FINA, Anna. Identity in narrative: a study of immigrant discourse. Amsterdam/ Philadelphia: John Benjamins Company, 2003. Tatiana Barros Chapter 5 – Identity as categorization: identificationstrategies – p. 139-180 Chapter 6 – Identity as social representation: negotiating affiliations – p. 181-216 Tese de Sonia Rosas Entrevistas com o assistente social – identidade, doença e estigma em uma enfermaria de adolescentes . Departamento de Letras da PUC-Rio. Rio de Janeiro, 18 de março de 2006.Orientadora: Dra. Liliana Cabral Bastos IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 6. A identidade como assunto de Estado - O Estado torna-se o gerente da identidade – instaura regulamentos e controles. - Estado Moderno – tende à mono-identificação – reconhecimento de apenas uma identidade cultural para definir a identidade nacional, apesar de admitir um certo pluralismo cultural no interior da nação (p. 188). - A ideologia nacionalista é uma ideologia de exclusão das diferenças culturais. Sua lógica radical é a da “purificação étnica”. (p. 188) - Estado-nação moderno – mais rígido de que as sociedades tradicionais. (v. p. 188-192) Exemplo: Rebelo, Aldo. Projeto de lei no 1676 de 1999. In: FARACO, Carlos Alberto (org.). Estrangeirismos. Guerras em torno da língua. São Paulo: Parábola, 2004. IDENTIDADES CULTURAIS E ÉTNICAS CUCHE (2002) 6. A identidade como assunto de Estado - Formas pelas quais o Estado registra a identidade dos cidadãos. Exemplos: Brasil – carteira de identidade, título de eleitor, CPF, certidão de nascimento, certidão de casamento, carteira de motorista Estados Unidos – ver o papel da carteira de motorista para os imigrantes - Minorias – reapropriação de meios de definir sua identidade, segundo seus próprios critérios; transformação da hetero-identidade negativa em uma identidade positiva Black is beautilful – identidade ‘afro-americana’ CULTURAS NACIONAIS HALL (2000) 7. As culturas nacionais como comunidades imaginadas - O que está acontecendo à identidade cultural na modernidade tardia? Como as identidades culturais nacionais estão sendo afetadas ou deslocadas pelo processo de globalização? (p. 47) ➢ Mundo moderno – culturas nacionais em que nascemos se constituem em das principais fontes de identidade cultural – nos definimos como ingleses, indianos, jamaicanos, brasileiros. ➢ Gellner (1983): sem um sentimento de identificação nacional, o sujeito moderno experimentaria um profundo sentimento de perda subjetiva (p. 48). ➢ Argumento de Hall: as identidades nacionais não são coisas com as quais nós nascemos, mas são formadas e transformadas no interior da representação. - Sabemos o que significa ser “inglês” devido ao modo como a “inglesidade” veio a ser representada (p. 49) - A nação não é apenas uma entidade política mas algo que produz sentidos – um sistema de representação cultural (p. 49) CULTURAS NACIONAIS HALL (2000) 7. As culturas nacionais como comunidades imaginadas - Como se forma uma cultura nacional? (p. 49) Padrões de alfabetização em uma única língua vernacular Cultura homogênea e instituições culturais Sistema educacional nacional - Direção diferente – ambivalência que assombra a idéia de nação (Bhabha, 1990, p.1) - Hall 1. Discussão de como uma cultura nacional funciona como um sistema de representação 2. Identidades nacionais são unificadas e homogêneas? Conclusão: as identidades nacionais foram uma vez centradas, coerentes e inteiras – estão agora deslocadas pelos processos de globalização. CULTURAS NACIONAIS HALL (2000) 7. As culturas nacionais como comunidades imaginadas 7.1 Discussão de como uma cultura nacional funciona como um sistema de representação ‘Narrando a nação: uma comunidade imaginada” - Culturas nacionais são compostas não apenas de instituições culturais, mas também de símbolos e representações. - Uma cultura nacional é um discurso – um modo de construir sentidos (p. 50) – presentes em estórias contadas sobre a nação, em memórias que conectam presente/ passado – uma comunidade imaginada (Benedict Anderson, 1983). - As diferenças entre as nações residem nas formas diferentes pelas quais são imaginadas (Benedict Anderson, 1983). Ver comunicação Simpósio – sobre o sonho americano. - Como é contada a narrativa da cultura nacional? V. p. 52 a 57 CULTURAS NACIONAIS HALL (2000) 7. As culturas nacionais como comunidades imaginadas 7.2. Identidades nacionais são unificadas e homogêneas? - Uma cultura nacional nunca foi um simples ponto de lealdade, união e identificação simbólica. - Ela é também uma estrutura de poder cultural. Pontos 1. Na maioria das nações - culturas separadas que só foram unificadas por longo processo de conquista violenta – supressão forçada da diferença cultural. 2. As nações são sempre compostas de diferentes classes sociais e diferentes grupos étnicos e de gênero. As nações ocidentais modernas foram também centros de impérios ou de esferas neoimperiais de influência, exercendo hegemonia cultural sobre as culturas dos colonizados. IDENTIDADES: LEGITIMADORA, DE RESISTÊNCIA E DE PROJETO Castells ([1997] 1999), ao tratar de identidades como sendo aquelas que definem grupos, estabelece três tipos: a) legitimadora; b) de resistência; e c) de projeto. ▪ A primeira refere-se a instituições sociais como igrejas, partidos. ▪ A segunda é aquela “criada por atores que se encontram em posições/condições desvalorizadas e/ou estigmatizadas pela lógica da dominação. ▪ Já a identidade de projeto se define “quando os atores sociais (...) constroem uma nova identidade capaz de redefinir sua posição na sociedade” e também de toda a estrutura social (p.24). Ele enfatiza, portanto, as relações entre indivíduo e sociedade e o poder de transformação social. IDENTIDADES DE PROJETO A concepção de projeto é tratada por Velho ([1981] 1991: 106-107), na antropologia social, em sua discussão sobre as sociedades complexas e as fronteiras culturais, em grupos de indivíduos. Velho elabora a concepção de projeto a partir dos estudos de Schutz (1970 [1971]; 1979)[1], que desenvolveu a noção de projeto como “conduta organizada para atingir finalidades específicas” (Velho [1994] 2003: 101). Velho indica que o projeto pode ser de um indívíduo, de um grupo social, um partido, e ressalta que “...a noção de projeto está indissoluvelmente imbricada à idéia de indivíduo-sujeito“ (p. 101). Ele ressalta, ainda, a consciência na elaboração do projeto, o fato de dar significado à vida, a relação com a construção de identidade, as relações com a memória. [1] Schutz, Alfred. Collected papers: the problem of social reality. The Hague, Martinus Nijhoff, [1970] 1971. v.1 Schutz, Alfred. Fenomenologia e relações sociais. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. IDENTIDADES DE PROJETO Para Velho, “... é indivíduo-sujeito aquele que faz projetos (...) a consistência do projeto depende da memória que fornece os indicadores básicos de um passado que produziu as circunstâncias do presente, sem a consciência das quais seria impossível ter ou elaborar projetos. (...) O projeto e a memória associam-se e articulam-se ao dar significado à vida e às ações dos indivíduos, em outros termos, à própria identidade.” ([1994] 2003: 101) Por outro lado, em outras afirmativas, a questão do grupo, da coletividade é mais enfatizada. “... o projeto existe no mundo da intersubjetividade. (...) Mas, sobretudo, o projeto é o instrumento básico de negociação da realidade com outros atores, indivíduos ou coletivos. Assim ele existe, fundamentalmente, como meio de comunicação, como maneira de expressar, articular interesses, objetivos, sentimentos, aspirações para o mundo.” ([1994] 2003: 103) IDENTIDADES DE PROJETO A identidade, segundo Velho, depende, sobretudo, da “relação do projeto do seu sujeito com a sociedade”; “em uma sociedade complexa e heterogênea”, a fragmentação sociocultural tanto produz a necessidade de projetos quanto traz a possibilidade de contradição e conflito ([1994] 2003: 104). IDENTIDADES DE PROJETO Castells ([1997] 1999), ao tratarde identidades como sendo aquelas que definem grupos, estabelece três tipos: a) legitimadora; b) de resistência; e c) de projeto. ▪ A primeira refere-se a instituições sociais como igrejas, partidos. ▪ A segunda é aquela “criada por atores que se encontram em posições/condições desvalorizadas e/ou estigmatizadas pela lógica da dominação. ▪ Já a identidade de projeto se define “quando os atores sociais (...) constroem uma nova identidade capaz de redefinir sua posição na sociedade” e também de toda a estrutura social (p.24). Ele enfatiza, portanto, as relações entre indivíduo e sociedade e o poder de transformação social. IDENTIDADES COLETIVAS O conceito de identidades coletivas é discutido por Snow (2001), junto a outras questões sobre política de identidade, identidades de projeto, identidades de contestação, identidades nacionalistas, comunidades imaginárias. Snow considera que a última parte do século XX pode ser vista como um período de identidades coletivas efervescentes, como Castells ([1997] 1999). Identidades coletivas, para Snow (2001), emergem na observação e interação entre dois ou mais atores, que estejam minimamente situados como objetos sociais. Para Snow, embora não haja consenso na definição de identidade coletiva, as discussões conduzem ao sentido partilhado de nós e de agência coletiva, na relação com os ‘outros’. O conceito pode estar relacionado a construtos sociológicos clássicos como ‘a consciência coletiva’ de Durkheim e ‘a consciência de classe’ de Marx, mas está mais claramente implicado com as discussões sobre identidades coletivas como em Castells ([1997] 1999). IDENTIDADES COLETIVAS Na concepção do autor, identidades coletivas são inventadas, criadas, reconstruídas, mais do que estrutural e culturalmente determinadas. Elas podem ser modificadas e transformadas. Não teriam uma base histórica contínua; sua emergência e vitalidade pode estar associada a condições de mudança sociocultural, de exclusão socioeconômica e política. Podem também ser parte do multiculturalismo e das políticas de identidade. Snow trata também das relações entre as identidades coletivas e as identidades pessoais e sociais. Identidades coletivas podem ou não estar encaixadas em identidades sociais, como no curso dinâmico de protestos sociais. O sentimento de nós pode assim ser mobilizado cognitiva, emocional e moralmente, em percepções e sentimentos partilhados de causa comum que motiva as pessoas a agirem em conjunto em nome de interesses coletivos. Identidades coletivas e pessoais, embora sejam obviamente diferentes, estão relacionadas pelo sentimento de self (Gamson, 1991[1]). [1] Gamson, W. A. Commitment and agency in social movements. Sociological Forum 6:27-50, 1991. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. S.P.: Paz e Terra, [1997] 1999. v. II A construção da identidade – p. 22-28 CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 2002. capítulo 6 – cultura e identidade – p. 175—202 DURANTI, Alessandro. Theories of culture. IN: ___ Linguistic anthropology. Cambridge, Cambridge University Press, 1997.p.23-50 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2000. (comprar o livro) A identidade em questão - p.7-22 As culturas nacionais como comunidades imaginadas – p. 47-65 Globalização – p. 67-76 O global, o local e o retorno da etnia – p. 77-89
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