Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
! Sumário Apresentações Observações sobre os Textos de Gustavo Giovannoni Traduzidos nesta Edição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 Beatriz Mugayar Kühl Atualidade de Gustavo Giovannoni . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 Andrea Pane O “Velhas Cidades” de Gustavo Giovannoni: Algumas Notas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 Renata Campello Cabral e Carlos Roberto M. de Andrade Gustavo Giovannoni e o Restauro Urbano . . . . . . . . . . . . 63 Manoela Rossinetti Rufinoni Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos Velhas Cidades e Nova Construção Urbana . . . . . . . . . . . 91 O “Desbastamento” de Construções nos Velhos Centros. O Bairro do Renascimento em Roma . . . . . . 137 A Restauração dos Monumentos na Itália . . . . . . . . . . . 179 Verbete: Restauro dos Monumentos . . . . . . . . . . . . . . . . . 191 Gustavo Giovannoni. Textos E scolhidos Artes&Ofícios 9 NUC LEOOfAPOIO A PESQUiSA SAO PAULO cidade tspa~o memóri01 Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos Beatriz Mugayar Kühl ( org.) 'l't ' tlllli(,'ÍÍO IC••nula Campello Cabral C :nl'lol-l Hoherto M. de Andrade ll••nll"iY. Mngayar Kühl '"'' ~ · 111 11\' 111'~ Jl, 11 1111 Mup;nyar Kühl \ uclt ••u I '11n•· ltt·ll n lu ( :nmt"·llo Cabral e Carlos Roberto M. dt• \ "' lt·ntl•· '\lulluc·lll HoKHitti'LLÍ Rufinoni \t t ll I•IHo ·tlt l Direi tos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19.02.98. É proibida a reprodução total ou parcial sem autorização, por esc1i to, da editora. l ' edição. 2013/1• reimpressão, 2017 Dados Internacionais de Catalogação na Publ icação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Giovannoni, Gustavo, 1873-1947. Gustavo Ciovannoni: Textos Escolhidos I Gustavo Giovannoni; tradução Renata Campello Cabral, Carlos Roberto M. de Andrade, Beatriz Mugayar Kllhl. - Cotia, SP: Ateliíl Editorial, 2013. TSBN: 978-85-7480-601-3 Vá1ios apresentadores 1. Arqui tetura- Conservação e restauração 2. Giovannoni, Gustavo, 1873-1947 - Crflica e interpretação J. Título. 13-01322 CDD-720.288 Índices para catálogo sistemático: I . Restauração: Arquitetura 720.288 Di rei los reservados à A TI'LIÊ EDITOIU!Il. Estrada da Aldeia de Carapicufba. 897 06709-300 - Cotia- SP - Brasil Telefax: (11) 4612-9666 www.atelie.com.br I contato@atelie.com.br Foi fei to o depósito legal Printed in Brazil 2017 Sumário Apresentações ! >hs('rvações sobre os Textos de Gustavo Giovannoni Tmduzidos nesta Edição ............................. . . ll /Jt•rttriz Muga)'ar Kühl \tuu liclmk de Gustavo Giovannoni .................. . 31 l !lfht•n flane ! l " \wlhnH Cidades" de Gus tavo Gi ovannoni: \IKIIIl lUS olas ............... . .......................... 53 Rt•Jutla Campello Cabral e Cal'lo.~ Roberto M. de Andrade I :11"111vo C iovnnnoni e o Restauro Urbano ............ 63 Ma mwlrt Uossinetli Rufinoni l:l • Gu~tavo Giovannoni. Tex tos Es<·olhidos Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos Velhas Cidades e Nova Construção Urbana .. .... ..... 91 O "Desbastamento" de Construções nos Velhos Centros. O Bairro do Renascimento em Roma .... .. 137 A Restauração dos Monumentos na Itália .. . . . ... . . . 179 Verbete: Restauro dos Monumentos ...... . .......... 191 Apresentações ()bservações sobre os Textos de Gustavo Giovannoni Traduzidos nesta Edição Bt·H triz Mugayar Kühl ( :nsl.avo Giovannoni (1873-1947) teve atuação de • .tptt.d importância em variados campos, enlre el es o ntlutlliHnto, que aj udou a consolidar como disciplin a na lt tltu, 11 l't•s ta uração, em geral, e o "restauro urbano" • '" (llllllf·ular. Dando sequência às publicações na co- Ir'·"'' \t'lt·s & Ofícios da A teliê Editorial, pareceu de • I" t'lld iniPresse publicar al guns dos textos do autor I'" 1 olf' tt ·<·t•r uma visão, mesmo que limitada, de el e- uu 11111 1 1111porta ni PS que compõem seu raciocínio sobre I I'IIIHH . ( ""' 11 1111olli fo i autor muito prolífico, com produção '""ltlf11t ' ' '""" ,. uhundanle, Le nd o escrito centenas de 12 • Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos Lexlos 1• F oram escolhidos para esta publicação quatro deles2: • "Vecchie Città ed Edilizia Nuova", Nuova An- tologia, 1913, vol. CLXV, fascículo 995 (1 !l de junho), pp. 449-472. • "Il 'Diradamento' Edilizio dei Vecchi Centri. Il Quartiere della Rinascenza in Roma", Nuova AntoLogia, 1913, vol. C LXVI, fascículo 997 (1 n de julho), pp. 53-76. • "La Restauration des Monuments en Italie", em La Conservation des Monuments d'Art et d'Histoire, Paris, Institut de la Coopération lnLellecLuelle, Office International eles Musées, 1933, pp. 60-66. • "Restauro dei Monumenti", em Enciclopedia Ita- liana, Milano, Istituto della Enciclopedia Italia- na (Treccani), 1936, vol. 29, pp. 127-130. Os dois primeiros- publicados na revista quinzenal Nuova Antologia\ voltada a várias temáticas, com ênfase em letras, ciências e artes- estão intimamente re lacio- 1. Contam-se mais de quinhentos lflulos na produvão de Gionmnoni, e ntre livros e ar tigos. Alessandro dei Bufalo. em estudo de 1982. apontava 476 tftulos (Alessandro del Bufa lo, Gustavo GiovaiiiiOIIi. Roma. Kappa, 1982. pp. 221-237). enquanto a bibliogmfia elaborada por Giuscppc Bonaccor- so, de 1997. chega a 719 publicações, sem contar os artigos publicados em jornais (Giuseppe Bonaccorso, "Gl i scr itti di Gustavo Ciovannoni'". <"111 Cuido Zucconi {org.), Gustavo Giovamwni. Dal Capitello ala Citt.à, Milano. Jaca, 1997). 2. O primeiro foi traduzido por Renata Campello CaiJral e Ca rlos Roberto M. ue Andrade e os t res últimos por Beatriz Mugaym· Kühl. .1. Existe versão d igitalizada da !Vuova Antologia no e ndereço www.archi ve. org. Obsen ações sobre os 'f.,xtos de Gustavo Giovannoni... • 13 nados; "Vecchie Città ed Edilizia uova" é dirigido às teorias relacionadas ao urbanismo, abrangendo temas como a transformação da cidade exis tente, ampliação, adensamento, circulação, coordenação entre "cidade velha" e "c idade nova", trabalhando também com os conflitos entre as exigências de modernização e expansão e a necessidade de preservar (e mostrando ser possível e viável trabalhar através de uma chave conservativa); o segundo, valendo-se da fundamentação teórica exposta 110 primeiro, é o estabelecimento de uma metodologia para intervenções em áreas urbanas de interesse para a preservação. Foram escolhidos por serem uma primeira I'Xposição sistematizada de um modo de encarar a cidade d1 · maneira orgânica- Giovannoni retorna à temática de rttudo mais extenso num livro, que re toma o título do pri- rtwiro artigo Vecchie Città ed Edilizia Nuova, publicado 1•111 1931 pela Ulet de Turim -, dando passos primordiais 1111 consolidação do urbanismo como campo disciplinar ttu It ália. Os doi s últimos referem-se à fundamentação teó1ica ' l''llulwlecimento de mé todo para o restauro de obras u rpt tlt'l ônicas; foram escolhidos por Lerem grande re- I" 11 lt'l-.í"io internacional, dando a conhecer aspectos do I" ll••il llli ' lli O giovannoniano em outros ambientes cultu- t 11 qtw níio o ital iano. l.Jm deles é o texto apresentado 1 111 1 lltt~n·..,so que deu origem ao documento conhecido , 1111111 ( .n1l u dC' Atf'na , de restaw·ação, de 1931, em que a I' ttl ll qut\'lio dt• Ciovannoni foi essencial; o outro, um ver- lu I• dt " lli'ÍI·Ioprdia prestigiosa, de enorme difusão. Os Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 14 • Gustavo Giovannoni. Textos E scolhidos preceitos teórico-metodológicos para a restauração estão nesses textos expostos de maneira concisa e sistematizada. Três ensaios precedem as traduções. No primeiro deles, Andrea Pane, professor da Faculdade de Arqui- tetura da Università degli Studi di Napoli Federico II, faz uma abrangente análise da atuação de Giovannoni, evidenciando sua atuação articuladaem distintos cam- pos disciplinares, sua relevante ação para uma formação mais ampla dos arquitetos, a forma como suas proposi- ções foram recebidas ao longo do tempo, os aspectos de sua elaboração teórica que permanecem atuais e pros- pectivos. Carlos Roberto M. de Andrade, professor do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP-São Carlos e Renata Campello Cabral, doutoranda na mesma insti- tuição, abordam questões relacionadas à fundamentação teórica de Giovannoni, suas relações com proposições do período, e perscrutam a estmturação do artigo "Vec- chie Città". Manoela Rossinetti Rufinoni, professora da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Paulo, por sua vez, analisa as colocações do autor no que respeita ao restauro, tanto na escala da edificação, quanto na escala urbana, e suas repercussões. Giovannoni formou-se em engenharia c ivil em 1895; fez especialização em história da arte com Adol- fo Venturi de 1897 até 1899, ano em que começou a atuar como assistente da cátedra de arquitetura técnica na atual Faculdade de Engenharia da Universidade de Roma. Desenvolveu atividades profissionais no campo da Observações sobre os Textos de Gustavo Giovannoni... • 15 produção ele novos edifícios (a partir ele 1898), entre eles o complexo para a fábrica de cerveja Peroni, em Roma, t> também da restauração, tema que começou a abordar P ITI seus escritos a parti r de 1903, com artigo sobre o Congresso Internacional de Ciências Históricas realiza- do naquele mesmo ano4• Seus interesses e seus escritos 1·stendiam-se a variadas questões, como historiografia du arquitetura e produção arquitetônica contemporânea; ~ulLaram-se também, com muita ênfase, às questões de 11 ri mnismo e ele restauro urbano. Teve, ainda, atuação preponderante nas discussões 1 ,.] acionadas ao ensino da arquitetura e à formação do 111 qui teto, buscando uma fi gura profissional - a do "ar- qui te to integral"- que possuísse não apenas o domínio dn., questões técnicas e das ciências envolvidas, mas 111111bé m preparação teórica, histórica e artística, e em qtu•..; Jões urbanas e de restauração, abordando, em parte, l11111hé rn aspectos econômicos e jurídicos. Trabalhava ' ' 111 ..;intonia com o pensamento de Camillo Boito, ampli- lh li ndo-o, e dava vazão a uma ampla discussão sobre o p11!J' ' I dos arquitetos, debate muito vivo na Itália de final d" lWIIl o XIX e início do século XX. Boito, em suas pro- , ... In~ ~obre o ensino de arquitetura, buscou afastar a ar- l , ld<>I .OII I I<Hii, " li Restauro dei Monumenti e I! Recente Congresso lutt• n", 1/ollt•tino de/la Società degli lngegneri e degl i Architetti ltalia- ' 1 I 'lO I. l' m·u u uuálisc das restaurações de Giovannoni, ver: Claudio \ u ,,,.,J., "Sut Ht•,lnmi di Guslavo Giovannoni'', em Maria Piera Selte (• o1 I '·'"''"o r;,, ,.a, , tmi. Rijlessini agli Albori del XXI Secolo, Roma, li '" 1 Unll, :.!IKln, pp. 2 1-:l!). Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 16 Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos quitetura do empirismo das Escolas de Belas-Artes, para integrá-la às ciências e ao pensamento crítico, propondo a filiação dos cursos ao ensino Univers itário. Giovannoni buscou, ainda, autonomia em relação às escolas de en- genharia, em que a arquitetura era considerada apenas um dos ramos da construção. Giovannoni considerava a formação dos arquitetos insuficiente, pois lhes faltava preparação teórica e humanística, domínio de aspectos científicos ligados ao campo e preparo para trabalhar com restauro, corno pode ser visto em seus parágrafos finais do texto sobre o "desbastamento" nos velhos cen- tros aqui traduzido. Pelas deficiências que verificava na formação dos profissionais, Giovannoni empenhou-se em implementar esse projeto e foi um dos principais promotores da criação da Escola Superior de Arquitetura em Roma- criada por decreto de 1919, publicado em 1920, posteriormente transformada em Faculdade ligada à Universidade e Roma-, sendo seu diretor entre 1927 e 1935, e na qual o ensino elo restauro como disciplina obrigatória foi instituído desde seus inícios5. S. A Escola foi fundada como Escola Superior de Arquitetura de Roma. passando depois a Real Escola Superior de Arquitetura até se consti- tuir na Facu ldade de Arquitetura de Roma, ligada à Universidade La Sapienza. Sobre os desdobramentos da ins tituição ao longo do tempo. regimentos, d isciplinas e ta mbém sobre o ensino do restauro na Escola, ver as importantíssimas contribuições presentes no livro organizado por Vi ttorio Franchetti Pardo, Le Facoltà di Archilettura llell'Università di Roma "La Sapienza" dalle Origini al Duemilla, Roma, Gangemi , 2001. Sobre o ensino de restauro, em especial, são de grande interesse os textos do próprio Pardo (pp. 11-41) de Giovanni Carbonara (pp. 113-131). e de Caetano Mim·elli Mariani (pp. 143-167). Müu·elli mostra que a primeira Observações sobre os Textos d e Gustavo Giovannoni. .. 17 Além disso, a ação de Giovannoni foi também no- tável como consultor e no serviço público, tendo papPl in tportanlíssimo no Conselho Superior das Antiguidades r· Belas-Artes6, e em variadas associações culturais, em t·Kpecial o atual Centro de Estudos para a His tória da A rqui tetura7, e, ainda, em conselhos editori ais ele re- v Í'll as, algumas das quai s ele ajudou a fundar (como a ,.~cola na Itália a oferecer a disciplina H.estauro não fo i a de Roma pois , 11 rigor. havia sido instituída a ntes em ambiente lombanlo, talvez por 111fl uên<:ia de Boi to; no entanto, em Roma a disciplina atinge tal consis- lllnt•ia que transfonnou a escola numa referência incontornável no campo. lltt<'rnacionalmente reconhecida, tanto no ensino de grad uação, quanto .J,. pós-graduação (a partir da fundação da e~ cola de espec ial iza<;iíu, o'Jtl 1957). As pesquisas conduzidas por Miarelli Mariani mostram que " primeiro curso de restauração foi oferecido, em .Roma, j,{ no biGn io 11120·1921. por Sebastiano Giuseppe Locati, que fora aluno de Boi to na \, ·,ul,•mia de Brera, através da discipl ina de " Levantamento e Restauro du-t Monumentos'': no biGnio sucessivo. o levantamento é separado da rll•l· ipliHu de "H.estauro dos Monumentos" , que passa a ser oferec ida por t o~n1 ,umoni. que se manteve no ensino da matéria até 1943. 11 t un"i11liu Superiore delle Antichitil e Belle Arti, ligado ao Minis tero della l'uhl ol io·a lstruzione (Ministério da Educação). 11 t Pnlro de Estudos descende de uma associação, criada em 1890, a As- •M ""iuut· Artis tica trai Cultori di Architettura, na qual Ciovannoni viria ' d• PniJll'tlhar papel de extrema importância, assumindo o enca rgo de "' • l '" '~idt·n te em 1906. A associa~ão teve importância crescente ao lon- 1 ,, <!11 h •IIIJIU. ('Oill especia l empenho de Giovannoni, e, a partir de 1939, •til uulu ~t· transferiu para a sua atual sede na Casa de i Crescenzi em lf.,utl, Jlll''ttll a ~e chamar Centro di Studi per la Storia dell'Architettura, ""' 1 tolu I~walizadoti os arquivos de Giovannoni, com numerosíssimos ,1, • ultu,, o' unos 1980, Cianfranco Spagnesi, então presidente do I • nh11, 1 II IJ II< 'I'tldt·n a tarefa de realizar uma primeira fase de organização • • tlthof• '\ ''" du urqnivo Ginvannoni e da Associação, trabalho que foi 1· I .,. "'" díut" cl(•vudus depois, através da colaboração de vários profis- 1•" 11 '111< ' , umplt•IH<' agrupa numa única obra a catalogação de todos os I ul1o • \ ptd,l u·,~ilu . f,·itu pela equipe que capitaneou os trabalhos. foi I 1111 ui'""'' c; tt ll'f(ltl :Sintotl(' ini. Calogero Bellanca, Ciuseppe Bonac - 1 , lullllllll "Muufrl'lli. Muriu Olimpia Zander e é intitulada, Centro Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano DestacarCristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Máquina de escrever vice-presidente da associação artística 18 • Gustavo Giovanuoni. Textos Escolhidos prestigiosa Palladio). Teve, como mencionado, atuação preponderante no urbanismo (a ser apresentada de modo mais adequado nos textos introdutórios que se seguem), lembrando-se de seu ativo papel em defesa do centro ele Roma, em especial do Bairro do Renascimento, tema do segundo dos m1igos aqui traduzidos, de 1913, para o qual coordenaria ainda o plano de salvaguarda, elaborado no final daquela década e efetivamente implementado. Sua figura, de extrema importância no panorama cultural italiano da primeira metade do século XX, multi- facetada, quase tentacular, espraiava-se por várias áreas e temas e acabou por, em alguns aspectos, ser mal rece- bida, com críticas, por vezes, exacerbadas. Um dos as- pectos que mais polêmicas despertou foi sua dificuldade em entender manifestações arquitetônicas do modernis- mo, como apontado por vários de seus contemporâneos, a exemplo de Marcello Piacentini e Bruno Zevi. Após seu falecimento, passa por certo período de ostracismo, mas seu papel começou a ser reavaliado, de maneira mais isenta11, a partir do final dos anos 1960, mas em especial di Struli per la Storia dell:4rchitettura. Cattalogo Gene rale dei Discgni di Architcttura, 1890-1947, Roma, Gangemi, 2002. 8. Parte da vimlência endereçada a Giovannoni vinham de suas crrticas à arquitetura do modern ismo, de seu an aigamento em relação às tradições do classicismo, e sua postura que foi percebida, d urante mu ito tempo como a rnbivalente e m relação ao fascismo; as revisões historiográfica~ recentes, a través de leituras como as de Françoise Choay e de Zucconi, por exemplo, mostram que, apesar das Joas que tece a Mussolini no livro ~ecchie Cittcl, ele nilo pode ser confundido com os ar·quitetos a serviço do regime. devendo ser encarado como um profissional competente que enxerga a possibilidade de realizar sua visão sobre o urba nismo através Obset·vaçõcs sobre os Textos de Custavo Giovannoni ... 19 nos 1970, com os estudos de Alessandro Curuni, volta- dos à reordenação do material de arquivo e ao projeto rlt> Giovannoni para a cervejaria Peroni, tema também abordado por Alberto Maria Racheli, e, já nos anos 1980, c·om o resultado da reordenação dos desenhos conserva- elos no Centro de Estudos pm·a a História da Arquitetura, promovida por Gianfi·anco Spagnesi, com as pesquisas ele• M. Centofanti , G. Cifani9 e Alessandro del Bufalo, no-. quais se seguiram outros estudos monog1·áficos- que l'trwuram oferecer uma visão historiográfica mais atua- ltt. tda, e matizada, de sua figura - que se têm tornado 1 ,relu vez mais numerosos e aprofundados nos últimos lltu,. 111, através dos trabalhos de variados autores, além ol•<JI<lVt·rno fnsciBta, e. nuo, ser considerado uma figura pol ítica do fascis- 11111 r ;i11vannoni , no entanto, jamais apreciou de fato as manifestações do ,. ... ,J,.I ni, mu, tlaudo prova s d i s~o em variados textos, como ao eriticar o uo.u lnmcli"mo de obras de Lc Corbusier e sua falta de preparo técnico, 1l• 111 ele·. 110 defender a arquitetura na Alemanha, em plena Segunda Guer- 1 c ~l lnulíu l . eou~iderar "até q ue uma arquitetura nacional se afirme tle I• llll"ll ol >ll'f(llnt , é melhor recorrer à Arquitetura clássica, do que àquela ol1huulttln ltá uté poucos ano pelas cotTentes democráticas internacio- 1•" , , llurulu. t•m se u apoio. Mein Kcw rpf de Adolf Hitler (ver Gustavo 1 1"''"" '"" ' · " llt''luuro dei Monumenti e Urbanfstica", Le Arti, 1942, pp. I 111, \1"1 o'llll"•Jlt'CÍal. pp. !16: 39). \l1 " " ' '" Cttnmi. 1/iordino delle Carte di Gustaw Giovamwni, Roma. I r 11 \ ~1. lltU'hl'li, " I;Opificio de lia BitTa Peroni nel Qua11icre Sala rio '" 11 .. ,,1 ·. u,.,.,rf~t• di Sturia dell'.4rte, 1978-79, n. 7, pp. 61-68; M. 1 "'"'"1111, C, C:rfuui. A. Del Bufalo, Catalogo dei Disegni di Gustavo """'" ' C111t\t'rt a ti 11ellllrchit"io del Centro di Studi per la Storia I• '"''"'"" , llnlltll, I 985: A. Del Bufalo, Gustavo Giovannoni, up. 1 11 1 , 1 1 1olt•1 1• n t\uu 11uulu Farah pelo levantame nto das referências ll1 1 Ih• .c' onln1• Ci,vu llllUil i uprcticntatlas nas notas deste tex to e I "'I"'" 1 11tllnl11 t'lll ll And n•n Pnn!' c cópia de seus textos . Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Máquina de escrever ostracismo - punição em Atenas Cristiano Destacar Cristiano Destacar 20 Gustavo Giovanuoni. Textos Escolhidos dos supracitados (e dos autores citados nas notas), como Gianfranco Spagnesi, Françoise Choay, Giusppe Bonac - corso, Cuido Zucconi, Claudio Varagnoli (em especial para os temas de restauro) e Andrea Paneu, que escreve ensaio introdutório neste volume. O interesse estendeu-se também pelo âmbito in- ternacional com a tradução francesa de trechos do livro Vecchie Città ed Edilizia Nzwva12, publicada em 1998, ou de estudiosos brasileiros, caso dos autores que escrevem para este volume, por exemplo. A introdução da edição francesa foi escrita por Françoise Choay, que evidencia o papel capital de Giovannoni para as teorias urbanís- ti cas, em especial p ara as relações entre urbanismo, arquite tura e preservação do patrimônio, mostrando sua contribuição para estabelecer a fundamentação teórico- -metodológica da atuação prática, para estruturação da ll. Andrea Pane tem dedicado parte significativa de seus estudos à reava· liação da obra, e da fortuna crítica, de Gustavo Giovannoni, tema de sua tese de doutorado, intitulada Fortuna Critica di Gustavo Giovannoni e del suo Contributo alia 'Questione dei Vecchi Centri" (orientadora: Profa. Dra. S. Casiello), Napoli, Università degli Studi di Napoli 'Federico Il', Tese de Doutorado (XIV ciclo), novembro 2002. O autor publicou também uma relação bibliográfica de escritos que tem por tema Giovannoni (em M. P. Sette (org.), op. cit., pp. 261-279). Sobre os temas tratados neste volume, ver, por exemplo, do autor: "Quartiere del Rinascimento a Roma; Sistemazioni Viarie, Diradamenti, Ricostruzioni, 1925-1940", em C. Di Biase, Jl Restauro e i Monwnenti. tHateriali per la Storia del Restauro, Milano, Clup, 2003, pp. 239-257; ''Dal Monumento all'Ambiente Urbano: La Teoria del Diradamento Edilizio ", em S. Casiello (org.), La Cultura del Restauro. Teorie e Fondatori, Venezia, Marsilio, 2005. Entre seus textos mais recentes, ver: "Da Boito a Giovannoni: Una Oifficile Eredità'', 'ANAFKH, 2009, n. 57, pp. 144-153. 12. G. Giovannoni, L'Urbanisme Face aux Villes Anciennes, Paris, Seuil, 1998. Observações sobre os Textos de Gustavo Giovannoni... • 21 profissão do arquiteto e do urbanista, e para questões legislativas. Giovannoni, com efeito, entendia a cidade como um organismo complexo, a ser trabalhado em sua inteireza, abordando a relação entre cidade existente, novas áreas de expansão e zonas d e interesse para a preservação de maneira articulada, e não como mera oposição13• O 1 ratamento dessas zonas é o tema abordado no segundo dos textos aqui traduzidos "Il 'Diradamento' Edili zio Dei Veechi Centrí. 11 quartiere della Rinascenza in Roma", n tt seja, o "desbastamento" de edificações. Giovannoni f''itabelece uma proposta articulada para a sobrevivên- t·iu das áreas urbanas de interesse para a preservação, l''''·c·onizando seu estudo minucioso, rua por rua, edi- lkio por edifício, para, então, chegar a soluções não- IIIHHH ificadas, estudadas ponto a ponto, para melhorar as ' nndições de salubridade, habitabilidade e circulação. l'tupõ<· não a ter-se a vias retilíneas de largura cons- 1111111' , f', através de demolições p ontuais Qustificáveis , ltt MI i1il'adas do ponto de vista da arte e da his tória), 1111 •wj fl,o "desbastamento" 1\ é possível , por exemplo, 1 11111 IH'fiU<"nos largos, que permitem uma melhor inso- r tt,Jlll l' ven ti lação das edificações existentes, além de '"' llwllll' a vis ibilidade de alguns edifícios notáveis e as I I \. 1 1 111 1 l"'1•inl G. Giovannoni, Vecchie Cittc"i ed Edilizia Nuova , Torino, I iol 1'1 \1 I 1 I 1 11" ""' "" p<'II'Untento giovannoniano a comparação com ações re- • " ul,l • "" tmto de plantações ou áreas naturais, como desbastamento " , ' '" I"" ~ ~""·""<e~ termo~ foram traduzidos tal e qual neste volume. Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Máquina de escrever desbastamento - demolições pontuais 22 Gustavo Giovannoni. Textos Escollüdos condições de tráfego. Propõe, ainda, que determinados trechos sejam recompostos através de novas edificações, q ue não deveriam, porém, destoar por cor ou volume, aconselhando que se faça recurso a formas simples com raízes na tradição arquitetônica local. Manifes tou-se contra a arquitetura pseudomedieval, assim como tam- bém se contrapôs às "fachadas da moda" e aos "ornatos artificiosos"; se o arquite to não sabe fazer uma arqui- tetura contemporânea que possa inserir-se de maneira apropriada num ambiente historicizado, é melhor que não o faça e que recorra a formas simples mais próximas da tradição15 • Desse modo, nessas áreas, preserva-se a grande maioria das edifi cações, seguindo o mesmo rigor de aproximação me todológica para o tratamento tanto das "grandes eminências", quanto das demais edificações que, por serem mais modestas, poderiam parecer admi- 15. Lembre-se que Giovannoni era bastante reticente quan to 11 arquitetura moderna, algo que não é extensível a lodos os profi ssionais que traba- lhavam com lemas de restauração no período. Por causa das <Juestõcs colocadas no segundo pós-guerra, em especial. por conta das de~lruições maciças geradas pelo conflito. esse foi lema muito debatido a partir da década de 1940. Verificou-se a impropriedade de trabalhar com "neu- tros"' (como propu nha Giovannoni) em âmbito arquitetônico (e também pictórico), ou o "moderno ambientado··, por resultar numa a rquitetura desprovida de q ualidades intrínsecas e que acabava por deteriorar a qualidade do ambiente como um todo. Muito se discutiu no perfodo sobre a l icitude da presença de manifestações arquitetônicas contemporâneas em a mbientes historicizados. Para referências bibliográficas sobre esses temas ver: Beatri?. Mugayar Kühl, Preservaçii.o do Patrimônio Arquit.etôni- co da lndustrializaçao: Problemas Te6ricos de Restauro. Cotia (SP), Atelie, 2009,pp. l 51-175. Obset·vaçõcs sobre os Textos de Gustavo Giovan noni... • 23 tir maior liberdade de ação; mas, justamente pela sua importância para a composição do ambiente16 urbano, c lr mandam acurados es tudos. Concomitantemente , são propostas algumas demolições pontuais e também novas c·onstruções, restritas ao mínimo necessário. Giovannoni c">Labelece, assim, a fundamentação teórica para gui ar os u lo s não-conservativos, que estão presentes nas ações ele• preservação, seja na escala urbana, seja na escala do l'di ffcio, e que devem, sempre, ser baseados num pensa- nwulo de cunho cultural {as questões que dizem respeito 11 urte e à his tória), também para resolver questões prá- l t~ •us, como a salubridade de edificações e os problemas d,• r·irculação. Ou seja, as questões práticas devem ser encaradas ,,,. uwneira ar ticulada , sendo subordinadas às razões .J, c·unho cultural. Demonstrou isso também na atuação , lllll'l't'la, ao participar de comissões de planos diretores ,j, . di versas cidades e ao se tornar consultor para as I• '"~formações do Bairro do Renascimento, colocando • 11t c t~·tlo algumas das propostas esboçadas nesse texto de IIJ I J. u implementação, porém, alguns aspectos foram ,, c dlr'ndos em nome de soluções de compromisso (da- .t c 111 <'\ Ígf-ncias do regi me fascista), como evidenciado cuc 1t lo de· ndrea Pane que se segue. ApesaT da ambi- \, d • ''"' •' "''"" palavra-chave nas propostas de Giovannoni e também I 1 ••• lltholu 1111 lrwluçiíu neste 'livro. É algo mu ito mais amplo do que a 1 , • '" ••ltru 111 ti•• 11111 n1onumento ou de simplesmente preservar as pe rs- 111 ' f' ''" '' '~• ·u•. n·ferindf>·Sc à composição do arnbienle urbano como •<I 1 .I' .J,, '"""'''rtl nrli euluJa. Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Máquina de escrever atos não - conservativos Cristiano Destacar 2'1· Gustavo Giovunnoni. Textos E scolhldos guidade dos resultados, a empreitada comprova, na prá- tica, que uma ação fundamentada em aspectos culturais pode ser viável também do ponto de vista econômico e dá conta dos problemas práticos, sendo possível opor-se às ações meramente especulativas. Os dois últimos textos apresentados neste volume são posteriores, da década de 1930, e voltados à res- tauração de obras arquite tônicas. Dentre a numerosa produção do autor sobre o tema, são escritos de enorme interesse pela sua difusão em âmbito internacional. A começar pelo texto sobre a restauração dos monumentos da Itália, que foi apresentado no Congresso de Atenas de 1931, do qual resultou a Carta de Atenas de restauração. O congresso - organizado pelo Escritório Internacional de Museus da Sociedade das ações17 - foi o primeiro 17. A~ coop<>ra<;iies internacionais e m âmbito cultural tinham também como objetivo um maior conhec ime nto recíproco q ue pmlesse auxi liar na manutenção da paz. como evidenciou Rosal ia Varoli-Piazza ("'Brandi e riccrom: t:na Stretta Collaborazione per la Conservazione del Patrimonio Culturale lnternazionale", em Caterina Bon Valsassina (org.), Omaggio a Cesare Brandi nel Centenario del/a sua Nascita, Firenze. Edifir, 2008, pp. 83-34). No en tanto. contraditoriamente. ao ser criada, e m 1920, a Sociedade das 1nções não tinha entre suas atribuições a cooperação intelectual. Léon Bou rgeois (membro da Academia de Ciências Morais e Pol íticas da França. prêmio Nobel da paz em 1920) propôs, em 1921. que a organização tivesse também a missão de colaborar no iimbito da cultura e da educação. Sua propos ta não foi levada adiante, pois a lguns pafses consideravam. então, a questão da educação como um problema de sober.m ia nacional. omente em 1922 foi criada a Comissão de Coo- peração Intelectual (que criou o Escritório Internacional de Museus), também para tratar d e pr·ohlemas de países que tiveram seu pa trimOnio cu ltural atingido pela Guerra. Henri Bergson foi designado para dirigir essa Comissão e, por sua iniciativa, foi cr iado e m 1924, em Pa ris. o Instituto Internacional de Cooperação Intelectual (\•er Jean Sirinelli , "La Obset·vações sobrt> os Textos de Gustavo Giovannoni... • 25 ~ntnde evento internacionaP8 que teve por resultado um dot'umento de tamanha significância. O papel de Giovan- tltlllÍ fo i impmtantíssimo e é possível ver, nas conclusões do Congresso, o quanto suas propostas foram relevantes ttH !'onformação fina l da Carta de Atenas. Giovannoni, expressamente, reafirma as proposi- r;o•·s teóricas de Camillo Boilo, formu ladas desde as duas 11 l1i mas décadas do século XIX, consolidando uma linha ri,· pl•nsamento que seria conhecida como "restauro cien- ll fi, ·n " ou, mas apropriadamente, "restauro fil ológico" . "'··~~u corrente era dada grande atenção aos aspectos rltwt tJttentais das obras e às marcas d~ sua passagem ao 1'11•hi'-loi re de l 'Unesco", em Jacques Fontaine (org.), Bicentenaire de 11111/Ítut de France, Paris, Fayard. 1995, pp . 490-493). 1'1 ll nu\1'. porém. tentativas anteriores, como o Congresso Internacional so- '"''" Pmteção de Obras de A1te e dos Monumentos (realizado na época da 1 'l""'içilo Universal em Paris, de 24 a 28 de junho de 1889). Foi evento '"ll"'rtuntl' para intercâmbio de dados c paraverificar o estado em que , 1 " '' n ~ul,aguarda e as leis de proteção dos bens culturais nos \ários I 11 I ... su~('itou especial interesse a lei francesa, de 1887, que autorizava "\1mr~t rll du Educação a expropriar, em favo r do Es tado, caso estiv .. ~se , '" 1"'111(11 11m bem que pertencesse a um particular. Foi anolisada ainda ""' r ltu 11111 ""Jlecffica de vandalismo, a dos restauradores. Os participan- ,, \ttlilhll ll n moção q ue, ao lidar com uma obra de a rte (arquiteturu, ultlllol •til pintura). o autor da intervenção deveria ser assistido por '"' 111 mult id isciplinar e ela!Jorar relatório pormen01izado do estado I ,.),,, llltlt·•. durante e depois da restauração. Foram a inda abordados 1 ,, •• , 0111111 11 prr>~erva~ão do e ntorno dos monumentos públicos e a pro- ',,,., lflullllf l ll'tllo~ em tempos de gue1Ta. Recomendou-se a criação "" 11\.lu fll ll'l'fl!t(' ional e que, para cada país, uma comissão de!'ig- ' drll• "'" n sc·rem protegidos em caso de conflito. E<se congre sso 1 ,, j, ''"'I•· p1m l o inte rcâmbio entre pa íses c balão de ensaio para I"' t"IIUf't''· l'omo a de Atenas (ver Paul aintenoy, "Le Congr1)s ,, ti ••1 rlpum la l'mteclion eles CEuHes d'Art et eles Monuments tenu 1 11 '" 11111'l'', J:Jimulaüon, Bruxelles, 1889, n. lO, col. 149). Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 26 • Gustavo Giovannoni. Textos E scolhidos longo do tempo, respeitando as várias fases e não mais, como fora comum na prática do século XIX, tentar impor na obra um estado completo idealizado, desconsiderando mu itas de suas etapas; afas ta-se, portanto, das recom- posições mimé ti cas, evidenciando, na intervenção, o momento em que foi realizada. A denominação "restauro filológico" vem justamente do fato de a ação assemelhar- -se a edições críticas de textos, pois, ao tra tar as lacunas do documento, as interpolações e interpretações são feitas através de elementos diferenciados: tipo e cor da letra, notas à margem do escri to. No texto para a conferência, Giovannoni coloca uma série de pontos que seriam reafirmados na Carta: a importância da manutenção constante para a conserva- ção dos bens, assim como dos trabalhos de consolidação estrutural, fazendo uso de técnicas modernas; realizar o mínimo possível de obras e de acréscimos, respeitando a solução estrutural do bem; respeito pelas várias fases da obra; ao tratar lacunas e completar elementos, utilizar materiais diferenc iados e adotar linhas simplificadas; inserção de datas e epígrafes nos trabalhos realizados; documentação precisa das obras executadas. Ou seja, o programa que Boi to vinha propondo desde 188319, acres- 19. Camillo Doito teve papel de enorme relevGncia no campo da restauração, inclusive com repercussões normativas; durante o Congresso dos Enge- nheiros e Arquitetos Italianos realizado e m Roma e m 1883, propôs crité- rios (muito semelhantes a os retomados por Giovannoni na cotúcrência de Atenas) que depois seriam adotados pelo Ministério da Educação da Itál ia (cf. Atti del Quarto Congresso degli lngegneri ed Architetti ltaliani Radu- llalo in Roma nel Ce11rwio de/1 883, Roma, Centena ri , 18B4). VPr ainda, Olost•t·vações sobt·c os Textos d!' Gustavo Giova nnoni .. . • 27 'ttlo, ainda, do respeito pelas condi ções de ambien tação .1 .... monumento. Giovannoni, no verbete Restauro dos Monumentos ' d11 l~'nciclopedia Italiana, reafirma esses princfpios e, rul• ·rnais, reitera a cons trução historiográ.fica, sugerida por· Boi to e por ele consolidada, de que ambos, no campo d.r t'I'Stauração, abriram caminho para uma teoria "in- lt•rttrediária" entre as visões antitéticas de res tauro de lolrn l{uskin e de Eugene Viollet-le-Duc20, constru ção • 'ltl que teria grande repercussão na historiografia da " luuração. Giovannoni evidencia, desse modo, os dois I'"'""' r,xtremos do restauro oitocentista e constrói a noção .J, llttttt trilha intermediária entre eles, não mencionando, m ~· ·-; Iextos, as posições mais matizadas que existiram '" lo ttgo do século XIX e no início o século XX. Salienta uttdn, nos dois textos, a importânc ia ele se ater, de ma- "' '" ' r·i ~orosa, ao método, baseado nos princípios acima • JntHioti, para poder enfrentar as questões particulares ,J, • 1ula obra e os imprevistos que sempre surgem numa '' lntt tt~· ilo, mantendo a unidade de critéri os. ti lluo tu: 0 < Uestauradores, Cotia (SP), Ateliê Editorial , 2002; Questioni I ''" J,. dt 1/l'ile Arti. Milano, Hoepli, 189'1; ou, ainda, o artigo " I Nostri \ • lu ~1""'" ' 11" nt i . Consetvare o Restaurare··. La .'Vuova Antologia, 1885, I ll l,pp. M0-662; vol. 82. pp. S8-73; 1886, vol. 87, pp. 480-506. Para ''"' • "' tl•••· cl•• lemu e referências bibliográficas complementa res, ver B. M ~ othl, "()" Hestauradores e o Pensamento de Carnillo Boito sobre a I ' '"' '\lu"', <'111 C. Boi to, Os Restauradores, op. cit .. 2002, pp. 9-28. I • • · ,J, l1111~''l"' antit~ticas dos autores ver: Jolm Ruskin,A Lampada da ~I '''· c ut iu (~P) , Atelie Editorial , 2008; Eugene Emmanuel Viollet- 1 ''"' ll••w ru·açflo, Cotia (SP), Ateliê E{litorial, 2000. Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 28 • Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos ão esses princípios enunciados por Boito e reite- rados por Giovannoni que conformam o primeiro grande documento internacional sobre a resta uração, a Carta de Atenas, e também, logo a seguir, a Carta Italiana de Restauração, do Conselho Superior das Antiguidades e das Belas-Artes (de de zembro de 1931 e efetivada a partir de 1932), cujos principais pontos Giovannoni retoma no verbete da Enciclopedia ItaLiana. A visão de Giovannoni sobre o restauro teria repercussão normativa ainda maior no final da década, através das Instruções para a Restauração de Monumentos, da Direção Geral das Antiguidades e das Belas-Artes; todo esse empenho de construção norma tiva resultaria não apenas nessas recomendações, mas repercutiria na nova lei de tutela, incentivada pelo ministro Giuseppe Bottai, a le i n. 1089 de junho de 1939, sobre a tutela dos bens de interesse histórico-artfstico21• O restauro fi lológico, apesar de ter muitos de seus princípios ainda válidos , mostrou ce11os limites, que fica- ram evidentes com as devastações geradas pela Segunda Guerra Mundial; dada a vastidão das des truições, mos- trou-se a insuficiência de considerar apenas as questões documentais da obra, não trabalhando, concomitante- mente, com meios conceituais mais elaborados para lidar com seus aspectos figurativos. Desse modo, a corrente 21. Segundo as informações de Pa ne, no texto a seguir, a lei permaneceu em vigor até 1999, sendo absorvida, eom a lgumas a lterações, no atual Código dos Bens Cultura is e Paisagísticos. Obset·vações sob t·e os Textos d e Gustavo Giovan noni... • 29 •(til' se seguiu, conhecida como "restauro crítico", ao ll ll' '<tno tempo em que acolhe os princípios fundamentais do rPstauro filológico- de respeito pelas várias estratifi- r·n\·ões do bem e de diferenciar a ação contemporânea-, ltn11bt'm os associa ao tratamento da dimensão formal das nl•ms, introduzindo, no processo metodológico, teorias •"* "ti cas e questões relacionadas à percepção, como rlt ''<l'nvolvidas já na p1imeira metade elo século XX. Essa l'"'~ l ma, que considera as dimensões -formal e docu- llll'lllal -da obra de maneira concomitante, interagindo tll .tH'-s duma relação dialética, foi consolidada em outra • 111 11 de restauro, a Carta de Veneza, de 1964, adotada pr•lo leomos (International Council on Monuments anel 11 •''"· c ri ado em 1965 e acolhido como órgão consultor 1 dr• eolaboração pela Unesco) que permanece em vigor • 1111 111 documento-base da ins ti tuição22• A Carta de Ve-'" 111 , apesar ele se colocar como uma superação da de \ lr'lllt'<, reconhece o seu papel essencial ao oferecer um 1 "1111 111lo coerente e rigoroso de critérios, incorporando 1111111u.; deles - como a ênfase na manutenção constante • "tr '"JII'i to pelas várias fases de uma mesma obra - que I' tiiiiiiH'<'em como pilares fundamentais para a interven- '" •' ltt Pdiffcios de interesse cultural até os dias de hoje. I'" • '""'~ ruformu\·ucs e bibliografia complementar sobre as formas "' • • lo'"""'"~ da Carta de Atenas, que é considerado um d ocumento ''"''I" uln, fo rmn rcinlerpretaclos na Carla de Veneza, que continua a • "''' ""' llllllllltH IIÜO-su peraclo, ver: n. M. Kühl, "Notas sobre a Carta I \, 11• ' r" , 1nni• do Museu Paulista, São Paulo, 2010, vol. 18, n. 2, pp. 1111 f• 111 vo•ntflnt•lr• trônica através de www.scielo.br). Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Máquina de escrever lei Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Máquina de escrever retauro filológico \ Lualidade de Gustavo ( ;jovannoni * \ udrea Pane "Jn cultura arquite tônica italiana do século XX, a h tllll d" Gustavo Giovannoni (1873-1947) ocupa, sem tl•1111 1i t, tun lugar de primeiro plano. Essa asserção é con- '""' ulu por numerosos aspectos, relacionados a diversos '"'I"'~ disc iplinares; mas, acima de tudo, desponta o 1 '1'' I t t tll' itt l de Giovannoni no processo de formação da 1 '11111 1111 l·>·wola Superior de Arquitetura, ins tituída em li "' • • 111 I Y20, a partir da qual surgiriam sucessivamen- t lll lliH Faculdades de arquitetura italianas1• Esse ho 1 • Jl , olriz Mugn)llf Kiihl. o "''' '" ncl lltn it•o 1930-31 estavam ativas, além da Escola de Ar- 1 I " 1 oi•• llumu, us t'scolas tlt! Florença, Nápoles, Veneza e Turim. A I '"' ''• In tlu• t·:•ctllm; Superiores em Faculdades ligadas a universi- 1 o Of1111\o!clll 1' 111 1935 (cf. P. Nicoloso, Gli Architetti di Mussolini. '"''"'' ata, Arl'lliterti e Ma.ssoni, Professori e Politici Negli anni Cristiano Destacar ::!2 Gustuvo Giovannoni. Textos E scolhidos resultado- que assinalava o desfecho de um debate bem mais longo, iniciado desde meados do século XIX, com a contribuição fundamental de Camillo Boito2 - marcava, de fato, a definit iva separação do percurso de formação do arquiteto daquele do engenheiro. Nas raízes da atualidade de Giovannoni deve, por- tanto, ser colocado o papel de protagonis ta por ele assu- mido na defesa dos estudos de arq uitetura, entendidos como síntese en tre a formação técnica do engenheiro e a artística do diplomado pela Academia de Belas-Artes~. É possível, com efeito, afirmar que Giovannoni - pro- veniente de uma graduação em engenharia c ivil (1895), enriquec ida por um aperfeiçoamento em saneamento público, no ano sucessivo, e, depois, por uma espe- cialização em his tória da arte com Adolfo Venturi em 1897-1899- foi o principal fautor e promotor da fi gura do arquiteto, na acepção mais ampla possível, por ele del Regime, Milnno, franco Angcli, 1999, pp. 99 e ss. c 160 c ~s.). Sobre o longo debate que marca o na cimento das escolas de arquitetura na Itália, remete-se a: L. de Stefani, Le Scuole di .4rcltitettllm in l talia. Il Dibattito da/1860 all933, Milano, Franco Angeli. 2. Sobre as rdaçües entre Boito e Giovannoni ver també m: A. Pane, ''Da Boito a Giovannoni: Una Difficile Eretliti:l", 'ANAFK!J, 2009, n. 57 , pp. 144-153. 3. A tenaz batalha travada por Giovannoni em defesa da figura do arquite to é ev idente ta mbém na atividade por ele desenvolvida no âmbito das associações profissionais. Cf. A. Pane. ''Pe r unn Storia della Socie tà degli lngegneri e Architetti Italiani: l'attività di Gustavo Giovannoni nel Sodalizio. 1896-1924", em S. D'Agostinu (org.). Storia dell'l ngegneria, Atti dei 3• Convegno Nazionale (Napoli. 19-20-21 aprile 2010), Napoli, Cuzzolin, 2010, vol. 2, pp. 1015-1027. Atualidade ele Gustavo Giovannoni • 33 .t, lt•rtdiua com a feliz expressão "arquiteto integral"4 • I Ir um modo mais geral, é possível dizer que toda a tHrpnH Lação do ensino da arquitetura na Itália ao longo do o.;{>('ulo XX é derivada dessa visão inicial devida a I .rnvunnoni, ainda que essa influência tenha sido, em t'f~ tli da, percebida de modo pouco consciente, quando 11 ht como veremos mais adiante - omitida e negada. É 11 ndi<·ati vo, nesse sentido, recordar a célebre aprecia- '" rll' '\1anfredo Tafuri que, ainda em 1968, denunciava ' • ,,·essiva dependência da cultura arquite tônica dos ""'" 1950, no que respeita ao problema dos centros ltr lóri cos, em relação à fig ura de Giovannoni , subli- ulr. t~~do, ao mesmo tempo, a ausência ele uma "clara • "'~'·wiencia'' elas suas teorias5, l ~m suma, à figura de Giovan noni é possível atribuir " pnpd de "pai fundador" dos estudos de arquitetura na lt,tlin. É oportuno evidenciar esse aspecto, consideran- do que exatamente agora, à lu z de uma radical- e, em I .un.mnoni manifesta-se sobre o tema da formação do arquiteto desde I '107 (Gu~tavo Giovannoni, " Relaúone de lia Commissione per le Scuole d1 1\rdt itcttura'', em Associazione .4rtisticafra i Cultori di Architellltra., /loll /11. Annuario, \ICMVI-MCM\'11, 1908. parcialmente republicado t-m: L r ;iovannoni, Dal Capitello a/l(t Ciuà, Milano, Jaca Book, 1997, pp. I :!7- 128). retomando depois, de modo a inda mais incisivo, em 1916 (G. (' """""uni. ' 'Gii Architetti e gli Studi d i Architettura in ltalia", Rivista .1'/tnlill , '<IX, febbraio 1916, vol. l, fase. 11; com o mesmo título, Roma, I '""'H' Editrice. 1916, de onde fo i tirada a c itação. pp. 11-12). 'oure 1 h l(ll nt du arqui teto "integral", ver também, G. Ciucci, Gli Architetti ' d Fmrismo. Architettura e Città 1922-1944, Torino, Einaudi, 1989, 1'1' ' l- I :~; C. Zucconi, La Città Contesa. Dagli lngegneri Sanitari agli I t!uumti I JRR.S-1942), Mil ano, Jaca Book, 1989, pp. 123-128. \1 lllf'11l'i. 'liwic e Storia dell'/trchitettllm, Uari, Laterza, 1968, p. 73. Cristiano Destacar 34 • Gustavo Giovannoni. Tf'xlos Escollúdos muitos sentidos, irracional - reestruturação do sis tema universitário, algumas faculdades de arquitetura correm o risco de desaparecer, acabando por ser reabsorvidas na órbita das escolas de engenharia, negando, portanto, um processo que, com mais de um século e meio de história, fundou e deu substância à cultura arquitetônica na Itália . Mas a herança ele Giovannoni é bem mais ampla e diversificada do que aquela ligada aos aspectos exclusi- vamente didáticos e se refere a pelo menos três campos disciplinares diversos, que hoje estão bastante distantes entre s i (ainda que ameaçados por prováveis fusões, em decorrência da citada rees truturação das universidades), a saber: a his tória ela arquitetura, o restauro e o urbanis- mo. Na época de Giovannoni, em realidade, os três âmbi- tos citados eram bem mais próximos, com inter-relações bas tante significativas, a ponto de Cuido Zucconi ler observado como a contribuição de s íntese traúda por Giovannoni nos três setores pode parecer "algo similar àquilo que hoje é definido como 'conservação dos bens arquitetônicos e ambientais''6• Por esse motivo, separar a a tividade ele Giovannoni nos três âmbitos - ela história da arq uitetura , elo restauro e do urbanismo - pode ser enga- noso, e o próprio Zucconi, desde 1997, evidenciou como essa tendência a fragmentar a herança do estudioso pode ser danosa ao unitarismo de sua visão7• Conscientes des- 6. G. Zucconi, "Giovannoni Gustavo" , em Diziorwrio Biografico degli ltaliani, vol. LVI, Roma, Is tituto Enc iclopedia I taliana C. Treccani, 2001 , p. 395. 7. G. Zucconi, "Dal Capitello alla Città'. li Profilo dell'Architelto Totalc", em C. Giovannoni, Dal Capitello alia Città, op. cit. , p. 14.Atua lidade d e Gustavo Giovannoni • 35 '{t ' risco, consideramos, no entanto, oportuno evidenciar , 1 atualidade do pensamento ele Giovannoni entrando no mérito de cada um dos três setores, detendo-nos, em par- licular, na res tauração e no urbanismo, de modo coerente c·orn os argumentos dos textos aqui apresentados nesta untologia, traduzidos pela primeira vez para o português . Mesmo se procedermos seguindo simplesmente uma ordem cronológica, a restauração aparece como um do primeiros campos de interesse do jovem engenheiro C ;iovannoni, que, em 1903 - enquanto colabora assidua- ll ll'nte com o periódico da Sociedade elos Engenheiros e dos Arquitetos Italianos, potente agremiação profissional romana, da qual passou a fazer parte logo a seguir à gra- duação - publica uma primeira breve reflexão sobre o lr·ma, originada no Segundo Congresso Internacional de C i r~ nci as Históricas, realizado em Roma naquele mesmo 11 11 0 8• }á nessa primeira ocasião afl ora a abordagem prag- ntática de Giovannoni , que, seguindo a herança de Boito, lrnsca superar as antinomias entre o restauro es tilístico ,. u conservação pura, professada por Ruskin, através do r·,uninho "intermediário", fundamentada numa imposta- r;1io taxonômica9• Em 1912, por ocasião do I Congresso 11 ( ;. Giovan noni. '' I Reslauri de i Monumenti e il Recente Congresso Storico" , em Annali della. SocieUt degli lngegneri e degli Arch itetti ltaliani. Bolleuino. 10 de maio de 1903, ano XI, n. 19, pp. 253-259. C:f. A. Curuni, "Gustavo Giovannoni. Pensieri e Principi di Restauro \ n·hilellonico'', em S. Casiello (org.), La Cultura del Restauro. Teorie e Fmrrlatori, Venezia, Marsilio, 1996, pp. 282-284. 11 C. ~urugnu l i. "Sui Re luuri d i Gustavo Giovannoni", em M. P. Setle (org.). r;u~lfll'" Giovw111oni: R iflessioni agli Albori del XXI secolo, Aui de lla Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 36 • Gustavo Giovannoni. Textos E scolhidos dos Inspetores Honorários, no entanto, Giovannoni será alçado - através de uma significativa passagem de bastão entre ele e Boito10 - a um papel de protagonista no campo do restauro dos monumentos na Itália, com uma longa apresentação, publicada no ano seguinte no Bollettino d'Arte, em que enfrentará tanto o desenvolvimento his- tórico quanto as ques tões operacionais da disciplina 11 • A partir desses anos, graças também à sua assídua presença no máximo organismo consultivo de tutela e restauro do Ministério da Educação - o Conselho Supe- rior das Antiguidades e Belas-Artes, de que Giovannoni será membro a partir de 1915 - , sua influência torna-se progressivamente mais ampla. Esse processo levará o es- tudioso a representar a Itália na conferência internacio- nal de Atenas, organizada em 1931 pela Sociedade das Nações e dedicada ao tema da proteção e conservação dos monumentos artísticos e his tóricos, com uma apre- sentação traduzida e publicada neste volume12, a lém de participar da redação da relativa Carta, que será seguida Giornata di Studio Dedicata a Caetano Miarclli Ma riani (1928-2002). Roma, Bonsignori, 2005, pp. 21-35. 10. Cf. A. Pane, " Da Boito a Giovannoni", op. cit. , p. 145. 11. G. Giovannoni, "11 Restauro dei Monumenti' ', em IA Tutela delle Opere d'Arte in lt.alia, Atti del I Convegno degli lspettori Onorari dei Monumenti e Scavi (Roma. 22-25 ottobre 1912), Roma 1913, publicado depois em Bollcttino d'Arte, 1913, vol. VII, n. 1-2, pp. l -42. 12. G. Giovannoni. " La Res tauration des Monuments en Italic. Príncipes Gi! néraux", Mouseion , 1932, n. l-Jt , pp. 39-45. Um pormenorizado relato da co1úerênc ia es tá em G. Giovannoni, "La Confcrenza lnternazionale di Atene pel Res tauro dei Monumenti", Bolleuirw d'Arte, 1932, vol. XXV, série 111, fase. IX, pp. 408-420. Atua lidade de Gustavo Giovannoni • 37 Jll' la Carta Italiana de Restauro de 1932, redigida pelo próprio Giovannoni, adotada pelo Ministério da Educa- r, do e difundida para as Superintendências em lodo o lo'ITÍtório italiano13• Com essas premissas - passando pela redação do 1 o·rbete "Restauro" da Enciclopedia Italiana, publicada rtrt presente antologia- a influência de Giovannoni nas qtwstões relacionadas ao restauro na Itália será absolu- t.uuente essencial, pelo menos até 1945, data em que tpu recerá seu volume de síntese Il Restauro dei Mo- 1111 1/lenti, utilizado ainda no pós-guerra como manual du liitico para os cursos universitários de Restaurot4• Essa l r r ·~emonia, no entanto, parece colocar-se em contras te Jutreial com o número de restamos seguidos diretamente pnr Giovannoni e com a qualidade dos resultados obti- do.;, constituindo - como observou Claudio Varagnoli - IIIII U ' 'incontornável aporia" em relação ao res to da pr ndução científica do estudioso. Em suma, segundo \ nntgnoli, exatamente as restaurações de Giovannoni 1• tll'eem demonstrar o quanto o debate italiano sobre o " '"luuro- renovado profundamente com os aportes do 'r• luuro crítico do pós-gue rra- evoluiu de modo notável • 111 r<' lação às teorias do mestre romano, a ponto de " ter I I ( :uu, i~l io Superiore per le Antichità e BeiJe Arti, ' 'Norme per i! Restauro .t,., Monumenti", Bollettino d'Arte, 1932. vol. XXV, série lll, fase . VIl. pp. :t25-:l27. A paternidade das normas será rei vindicada pelo próprio c,.,~u unoni em seu a rtigo " Res tauro dei Monumenti e Urbanística" , l'al/arlio, 1943. vol. VIl, fa se. 11-111, p . . 33. I I I; I :uwnnnuni, /I Restauro dei Monnmenti, Roma. Cremonese, s.d. (1945). Cristiano Destacar 38 • Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos limitado a contribuição de Giovannoni a uma dimensão quase unicamente histórica" 15• É certo que os limites da filologia giovannoniana em matéria de restauro serão evidenciados com clareza desde os anos imediatamente sucessivos à sua morte, concomitantemente à crescente difusão do pensamen- to de Benedetto Croce no campo das artes figurativas, através dos escritos de Roberto Pane, Carlo Ludovico RagghianLi e Renato Bonelli, além do dramático quadro das destruições da guerra, que colocarão questões de restauro muito mais graves do que a taxonomia propos ta por Giovannoni teria podido contemplar 16• A isso logo se acrescentará a definitiva superação do preconceito de Giovannoni em relação à arquitetura moderna17, que o estudioso tendia a excluir de qualquer intervenção de restauro, preferindo soluções miméticas. Alguns de seus próprios estudantes, como Guglielmo De Angelis d'Ossat, destacarão os limites da abordagem do mestre nesse campo específico18 , enquanto Roberto Pane con- testará abertamente essa posição em 1952, observando 15. C. Varagnoli. "Sui Restalll·i di Gustavo Giovannoni", op. cit .. p. 21. 16. Cf. A. Pane. ''La fortuna Cri tica di Gus tavo Giovannoni: Spunti e Rülessioni dagli Scritti Pubblicati in Occasione della sua Scomparsa", em M. P. ette (org.). op. cit., pp. 207-216. 17. Sobre esse aspecto específico ver A. Pane,"[] Vecchio e il Nuovo nelle Citlà ltaliane: Gustavo Giovannoni c l"Archite ttura Moderna". em A. Ferlenga, E. Yassallo, F. Schellino (orgs.), Antico e Nuovo. Architettnre e Architell!Lm, Atti dei Convegno (Venezia. 31 marzo - :3 aprile 2004). Venezia, Poligrafo, 2007, pp. 215-231. 18. Cf. G. CariJonam, " Cugl ielmo De Angelis ci'Ossat Restauratore", Palladio, 1994. vol. VII, 14-. pp. iH1-~ l 8. Atualidade de Gustavo Giovannoni • 39 , 11 11111 "em nome de uma concepção mais progressis ta, 1 111lo esté tica quanto moral, é somente através de formas ""~ n., que todos os problemas mencionados poderão ser 11 nlvidos"19. Se esses aspectos podem fazer parecer decidida- •w •nle pouco atual a contribuição de Giovannoni para o 1 r lattro arquite tônico, deve ser, contudo, evidenciado , 111110 alguns conceitos por ele tenazmente defendidos, , frt tindo aquilo que já havia feito Boito - comoa "mí- lltttt.t intervenção" e a ''distinguibilidade" - constituem, IIIH iu hoje, princípios geralmente compartilhados entre , '" ic'ntações atua is da disciplina na Itália. Mas é so- '"' tudo ampliando a visão do monumento singular ao uu l,ic ·nte urbano que a herança ele Giovannoni parece .11 , 1cl idamente mais atual e estimulante, entrelaçando " doi s campos disciplinares do restauro e do urbanismo. O papel de Giovannoni como protagonista deve , 1 Jt•con hecido não apenas na progressiva aquisição do dou dos ambi entes urbanos, mas, sobretudo, no empe- "'"' •·m definir uma nova estratégia de intervenção na r ul,uh ... velha", elaborada como uma síntese original •h ' ' l ~~'riênc ias diversas e saberes disciplinares até en- lln , nulrapos tos. O objetivo de Giovannoni, coerente , 1111t , , 'l tta abordagem " intermediária" j á manifestada '"' ~~ ·~ lut t ro arquite tônico, é o de conciliar as instâncias I 1 11 I' '"' '• "l'1w~u!Q1i o c Ambiente' ', em La Pianificazione Regionale, Atti 1. I!\ I "111(11'"~" 'iuzionnlc di Urbanística (Venezia, 18-21 ottobre 1952). li " ' ' 1'1.,;1. PP· IJ4-%. Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 40 • Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos da conservação do caráter dos ambientes antigos com as exigência de renovação e modernização próprias da cultura contemporânea. A aproximação de Giovannoni a esses temas se desenvolve através de sua presença assídua na Asso- ciação Artística dos Cultores de Arquitetura, da qual se torna membro a pmtir de 1904, e tem um foco especffico nas vicissitudes construtivas da cidade de Roma20• Em 1913, com os dois escritos publicados na revista Nuova Antologia, traduzidos no presente volume21, Giovannoni assume uma posição oficial sobre esses temas, apesar de seu interesse se manifestar claramente desde 1905, com uma notável abertura em relação às contribuições européias sobre os temas art public e edilizia cittadina22 • Graças ao seu domínio de variadas línguas, em particular J o alemão, Giovannoni estuda - antes mes- mo de serem traduzidos na Itália - os textos de Sitte, Buls, Stübben, Goecke, Nussbaum, integrando-os com 20. V. Fontana. ·•11 Caso di Roma··. em G. Zuceoni (org.), CamilloSitte e isuoi lnterpreli, Alli Jel Convegno Omonimo (Venezia, 7-10 novembre 1990), Milanu, Fmncu Angeli, 1992, pp. 145-155. 21. G. Giuvannoni, "Vecchie Ciuà ed Edilizia Nuova", Nuova Antologia. 1 de junho de 1913, ano 413, fase. 995, pp. 449-4-72; G. Giovannuni , "11 'Dirauamcnto' Ed ilizio uei Vecchi Cenll·i. 11 Quartiere della Rinascenza in Roma", Nuova Antologia, 1 de julho de 1913, ano 43, fase. 997, pp. 53-76. 22. Cf. C. Varagnol i, " Dal Piano ai Restauro: Teotie c lnteiTe nt i sul Qum1icrc dei Ri nascimento (1870-1923)"", em G. Spagnesi (org.), ll Quartiere ed il Corso del Rinascimento, Roma. lstitulu de lia Enciclopedia Italiana, 1994, pp. 64-65; A. Pane, .. Dal Monumento all'Ambienle Urbano: la Teoria del Diradamento Edilizio", em S. Casiello (org.). ÚL Cultura del Restauro, op. cit. , pp. 301-302. Atualidade clt' Gustavo Ginvan non i • 41 " c•ontribuições italianas de :figuras como Caetano Mo- " lli <"Alfonso Rubbiani , todos amplamente citados nos dui -< ensaios de 191323• Deriva disso uma abordagem lt l'·wada em duas escalas diversas: por um lado, a visão , uut pletiva do organismo urbano, através da qual é pos - 1\ c•l resolver os problemas do velho núcleo, desviando " flu xo princ ipai s de tráfego e afas tando as fu nções t•llll'< invasivas; por outro, a intervenção pontual , em- J, 1 cttda no "desbastamento" de cons truções. Este últi- 111" ut f- todo é pormenorizadamente descrito no segundo ,j,, dois artigos, enfocado no "bairro do Renascimento" • 111 Homa, definido pela primeira vez por Giovannoni '•1111 c•ssa denominação e correspondente às zonas Ponte ' l'.trione. Partindo de uma leitura do tecido urbano • 11111 hase numa analogia botânica, que vê a habitação "" tntligos bairros "ser assemelhadas às árvores de um J, .. c p u···~ ~. Giovannoni evidencia o valor dos traçados ·••l•fl lctíri os como expressão de uma "persistência do l'ltttn", sobre a qual, alguns anos mais tarde, escreverão l'11 til' l.uvedan e Mareei Poete. essa visão, o "desbas- 1 """nln" de construções configura-se como um conjunto .J, l"illl ttU is alargamentos de ruas e parciais demolições ,J, ' JII II I'lc·irões, propostos seguindo a "fibra" do bairro • I lt c .cluhi. "'Edilizia Ciuadina: Note in Forma di Quesito". em G. 1 ill cu 1 (•H I(.). L'Associazione Artistica trct i Cultori di .1\rchitettura 1 ' " " ' (;Wifl ll llo lli, Alli del Seminario Internazionale (Roma, 19- '11 11"" 111l11 ,. l1JI:I7}, Bollettino del Centro di Stucli per la Storia 1/ ltr /u/ol/11/ ol, l 1)<JO, n. 36, pp. 13-15. c c o' ' lltllllll l, " 11 'Diruda111ento' Edilizio'', op. cit., p . 53. Cristiano Destacar 42 • Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos antigo, com o duplo objetivo de melhorar as condições de salubridade, restituindo "ar e luz" , e de "liberar" os testemunhos arquitetônicos mais importantes, previa- mente identificados23• A partir dos dois artigos de 1913, Giovannoni inicia uma intensa atividade de consultoria no campo urbanís - tico, que o leva a redigir, coordenar, ou simplesmente orientar, grande parte dos planos diretores das cidades italianas por mais de duas décadas , a começar pela pró- pria Roma, onde toma parte de todas as comissões que enfrentam o tema do plano dire tor, de 1918 ao início dos anos 1940. No entanto, a despeito desse empenho, as concretas aplicações do "desbas tamento" de cons- truções foram bastante exíguas e devem ser atribuídas prevalentemente aos alunos d e Giovannoni, como nos casos de Bari velha e Bergamo alta26, enquanto a vicis- situde do baino do Renascimento - levada adiante com a consultoria de Giovannoni a partir da segunda metade dos anos 1930 - traduziu-se num resultado ambíguo, em que parte dos princípios teóricos foi sàcrificada em nome das exigências do regime27 • Este último aspecto, como 25. Cf. A. Belli, /mmag ini e Concetti nel Piano. /nizi dell'Urbrwistica in ltal ia, Milano, 1996, p. 99; F. Choay, "lntroduction", em G. Giovannoni, L'Urbani.sme Face awc Villes Anciennes (tradu<,:ão francesa de Vecchie Città ed Edilizia Nuova, Torino, Utet, 19~1 . 1995 2• ed.), Paris, Seuil, 1998, pp. 14, 19. 26. A. Pane, "Dal Monumento all'Arnbiente Urbano'', op. cit., pp. 311-312. 27. Cf. M. Capema, "Progra mmi Urbanistici e lntervento Sulla Ciltà Storica: la Questione dei Quartiere de i Rinasc imento dai 1925 a lia Seconda Guerra Mondiale", em G. Spagnesi (org.), ll Qwtrliere ed il Corso del Rirwscimento, op. cit., pp. 97-131; A. Pa ne, ''Quartiere dei Rinascimento Atualidade de Gustavo Giovannoni • 43 tl1 tdn, t:onstituirá um dos principais limites da con- '' d.uu: lio operacional de Giovannoni nesse campo: com uht•tJ io do fascismo, com efeito, o estudioso acabará 1 "' f'j.ttt i r uma lógica de compromisso, avalizando demo- lu '" 1 t' alargamentos não muito distantes daqueles tão lf l' l <~tndos desventramentos oitocentistas , contanto que "" "~~11isse salvar partes limitadas dos núcleos antigos l t f trl udes italianas . Exatamente seu envolvimento am- 1 t ttfl r·om o regime, constituirá no segundo pós-guerra 11111 • tlu ~ principais sombras sobre sua fortuna crítica I' '' r·omo será mencionado mais adiante - começará a 1 dt.,"'ol vida apenas no final dos anos 1960. \demais, é possível afirmar que a contribuição de 1 111\.t llt toni no campo da tutela do ambiente urbano, I"' lw jto confluiu na problemática mais ampla dos cen- "" lti"' lóricos, seja ainda de notável atualidade. Isso é f td.ulr•, antes de mais n ada, pela grande repercussão lo ttlt "~ l<'orias, ainda que de maneira pouco consciente tt lltltl tl <·darada, na cultura arquitetônica italiana do tit ulo pós-guerra. Bas ta pensar, a esse respeito,na 1 fi, " '" de Roberto Pane sobre o tema do ambiente, ou 11 • dt• Saverio Muratori sobre a leitura histórica "ope - ' 1111t " t io~ l€'cidos urbanos que - mesmo tendo profundas lll f • •·ll ~' ll 'i c·om as teorias de Giovannoni - podem, no tt l '"'"· Ht'r consideradas em boa parte devedoras da sua ' ll·•lltl, Si~1t ·11mzioni Via rie, Diradamenti, Ricostmzioni, 1925-194·0" , 1 1 llt lltusc (org.), ll Restauro e i Monumenti. Materiali per la Storia /i, ' '"'"' · Milano, Clup, 2003; Maggioli, Sant'Arcangelo di Romagna IH III ... ,f,). pp. 219-237. Cristiano Destacar Cristiano Destacar 44 • Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos abordagem28• De modo mais geral, é possível observar como a própria disciplina do urbanismo, na época de Giovannoni apenas em formação- para a qual ele se em- penhará ativamente, participando, em 1933, de um pro- jeto de lei pioneiro, jamais aprovado29, e instituindo uma escola de aperfeiçoamento em 1934, suprimida quatro anos depois30 - sofreu a sua influência por longo período. É testemunho disso o célebre volume Vecchie Città ed Edilizia Nuova, publicado pelo estudioso em 1931 como uma síntese das próprias reflexões e experiências que, mesmo não tendo a pretensão de um tratado, constituirá por um longo tempo a única referência bibliográfica so- bre o tema na Itália31 • 28. Cf. G. Zucconi, "Pane e la Nozionc di Ambiente, Ira Primo e Secundo Novccenlo", em S. Casiello, A. Pane, V. Russo (orgs.), Roberto Pane tm Storia e Restauro. ArchiteUum, Ciuà, Paesnggio, Alli dei Convegno Nazionalc di Studi (Napoli, 27-28 oltobrc 2008), Venezia, Marsilio, 2010, pp. 308-311. 29. Cf. F. Ventura, L'lstituzione dell'Urbanistica. Cli Esordi ltaliani, Firenze, Libreria Alfani, 1999, pp. 213-253; F. Bottini, ''Da ll 'U topiu a lia Normativa. La Formazione de lia Legge Urbanística ncl Oiballito Teorico: 1926-1942", e m G. Ernesti (org.). La Costruzionc dell'Utopia. Architetti e L'rbanisti nell'ltalia Fascista, Roma, Lavoro, 1988, pp. 214-215. 30. P. icoloso, Cli Architetti di Mussolini, op. cit. , p. 144. 31. G. Giovannoni. ~ecchie Città ed Edilizia Nuova, Torino, Utct, 1931: Cittàstud i, Milano 1995 (2• ed.). Ve r a esse propós ito as d iversas inte rpretações de Choay, que denuncia uma grande ocultação do volume no pós-guerra (F. Choay, ''Prefazione" , em G. Giovannoni, ~ecchie Città ed Edilizia Nuoua, 1995, op. cit. , p. VIl), e de Rucheli, que considera, de modo diverso, a sua leitura uma "ininterrupta aplicação de estudo, do mome nto em que foi editado até os nossos dias" (A. M. Racheli, ' 'Recensione a G. Giovannoni Vecchie Città ed Edilizia Nuova", Ricerche di Storia dell'Arte, 1996, n. 60, p. 99) e de Zuccon i, que o define como um "manual malogrado" (G. Zucconi, "Gustavo Giovannoni, ~ecchie Ciuà Atual idade de G ustavo Giovannoni • 45 ão deve ser esquecida, por fim, a importante con- '' dmição de Giovannoni para a tutela das "belezas natu- ' ' ti o.;", que tem hoje uma substancial continuidade com o ttpurato normativo vigente na Itália em relação aos "bens puiHagfsticos". Depois de ter parti cipado na redação da p• inteira lei "sobre a proteção das belezas naturais e pa- unt'âmicas", aprovada em junho de 1922, Giovannoni pre- ulirá a comissão que redigirá ao texto da lei n. 1497 de 1'1:39, que permaneceu em vigor até 1999 e que confluiu , nuo.; ideravelmente, mesmo se com modificações signifi- ' ot livas, no atual Código dos Bens Culturais e Paisagís- ll• ·o~32. Entre as principais contribuições de Giovannoni w · o.;e âmbito específico, deve ser citada a introdução do pl.t nejamento "paisagístico" (paesistico em italiano), por • I•· defendida desde 1938 - através de algumas experiên- ' ut.; pioneiras feitas na ilha de Capri e na área das colinas \lbutti , perto de Roma33 - hoje integrada e emiquecida no tlllul instrumento dos "planos paisagísticos" (paesaggisti- '" c•tll italiano), tornado obrigatório pelo Código. Paralelamente aos âmbitos do restauro e do urba- 111 uun, Giovannoni desenvolve uma significativa pro- ,.//<.'r/dizia Nuova. 1931. Un Manuale Mancato'' , em P. Di Biagi (org.), I t ltt"ll'i dell'Urbanistica Moderna, Roma, Donzelli, 2002, pp. 57 -69). I I ~1 . St'rio, "La Riforma Bottai delle Antichità e Belle Arti: Leggi di lut<•lu l'd Organi zzazione", em L. Barroero, A. Conti, A. M. Racheli, M. ' '"· I ia dei Fori fmperiali. La Zona. Archeologica di Roma: lirbaniJtica, n '" lui•tici e Politica Cultura/e, Roma, Banco di Roma - Marsi1io, 1•1111. I'· 216 e nota 27. I loiii\Hctuoni, ''Piani Regolalori Paesistici", Urbanística, 1938, vol. VIl, 11 ' · Jll'· 27ó-280. Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 46 Gustavo Giovannoni. Textos Escolhidos clução científica no campo ela história ela arquitetura, disciplina também em formação na Itália das primeiras décadas do século XX, que deve ao estudioso grande parte de seu estatuto autônomo em relação à história da arte. É exatamente pela visão "técnica" ele Giovannoni - justamente definido por Bonelli como "engenh eiro- -historiador"34- que toma forma uma característica bem italiana da historiografia arquitetônica, ou seja, a de ser um apanágio quase exclusivo dos arquitetos. Preconiza- dor firme de que o contato direto com os monumentos é imprescindível, assim como o estudo de suas condições materiais e as "causas permanentes do ambiente":l:i que o geraram, Giovannoni empenha-se ativamente para a defi- nição de um método na história da arquitetura, entrando em polêmica com seu antigo mestre Adolfo Venturi36• :\11.. H. Bnru•lli, "Prnlu~ ione" , em F. Colonna, S. Costantini (or~.). Principie Metodi della Storia dell'Architettura e l'Ereditil della "Smolrt Nomanrt ", A tti dei Convegno J nternazionale (Roma, 26-28 marzo 1992), Roma 1994, p. 24. :\5. Giovannnni desenvolve as suas primeiras considerações d~ método sobre a his tória da arquitetura a partir de 1 90'~. em refert;ncia ao e>tudo dos mosteiros de Subiaco. Cf. G. Giovannoni, '·L'architettura dei Monastcri ublaccnsi", em P. Egidi, G. Giovannoni, F. He nnanin, V. Federici, I Monasteri di Su.biaco . 2 vols ., Roma, Ministero deUa Pubblica Is truzione. 1904, vol. I, pp. 287-288. parcialme nte republicado em G. Giovannoni, Dal Capitello alla Cittil, op. cit.., pp. 73-74. 36. Sobre a conhecidíssima polemica, surgida em 1938, a partir da resenha de Giovannoni ao volume di Venturi L'Architettum del Cinquecento (G. Ciovannoni, "[;Architcttura de! Cinquecento", Palladio, 1938, ano 11, fa se. 111. pp. 107-114), à qual Venluri replica pontualmente na sua revis ta L'Arte (A. Venturi, "Sul Metoclo della Storia dell'Architettura", L'Arte, 19:\8, vol. IX, fase. IV, pp. 370-375), ver B. Zevi, "Adolfo Ventmi e la Moderna Storiografia Archite ttonica ", L'Architettum. Cronaclte e Storia, 1957, vol. 11, 11. l ú, pp. 700-701; B. Zevi, Architectnra in Nuce, Venezia- Atualidade d e Gus tavo Giovannoni • 47 atividade de Giovannoni nesse campo é vasta e rltlc •n ·nciada, indo desde uma cm·posa produção ensaís- ltc 11 - concentrada sobretudo na arquitetura do Renas- ' tttwnto e nas figuras de Bramante e elos Sangallo- até 1ttttH ação militante em favor da difusão dos estudos de l11• Lória da arquitetura. Neste último âmbito devem ser 1 tJ ,ulos pelo menos três projetos fortemente apoiados Jlltt' Ciovannoni, e por ele levados a termo com sucesso: 1 •ttlllf' Í ro, a revista Architettura e Arti Decorative, fund ada 1 cl Jrip;ida por Giovannoni com Marcello Piacentini em I 'I'! I - concomitantemente com o início dos cursos da I l'nla Superior de Arquitetura em Roma-; depois, a 1 lt.tç·ão da revista Palladio, em 1937, primeira revista 11111·immente dedicada à história da arquitetura na Itá- lt, c· no mundo, ainda ativa, e, por fim, a instituição do 1 1 ttlro de Estudos de História da Arquitetura em Roma, .. nele· ltoje está guardado o arquivo de Giovannoni. 1\ história da arquitetura é talvezum dos campos , ut qnc• se encontra uma maior continuidade da herança ,f, I :iovannoni . Ainda que a his toriografia da arquitetura I• ttlt.t sofrido impulsos muito inovadores no pós-guerra 1 111 grande parte derivados, como para o restauro, da ll unm 1960 , Firenze , ansoni. 1979 (2• ed.) . pp. 115-119 , e o mais , , , , nto- \ . l'r.~cchi. La Logica degli Occhi: gli Storici dell'Arte, la Traela , ,/ U•·•t•fllf'O dell'Archit.ettura tra Positivismo e Neoidealismo, Como, I oh " '"' ~o ·w Pre~s, 2001, em particular pp. 155-187, que propõe - à luz .1. ' "'~ ' ' donunentação- uma pmticular interpretação do caso: por trús 11 , nunturu do vd ho Adolfo se esconderia, com efeito, o filho Lionello, , "I'"''''' 11110~ ativo colaborador da revis ta L'Arte e decididamente mais H oi• , , 11dn do que u pai nos aspectos metodológicos da his tória da arte. Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar Cristiano Destacar 48 • Gustavo Giovaunoni. Textos E scolhidos estética crociana {basta pensm· em figuras como Pane, Bonelli, Zevi, Argan) - é possível, com efeito, retraçar uma explfcita continuidade de mé todos, mesmo com as devidas transformações, no âmbito da chamada "escola romana" de história da arquitetura. Essa continuida- de foi evidenciada várias vezes pelos atuais expoentes da escola romana em diversos congressos - a partir de 1987 até a mais recente jornada de estudos dedicada a Giovannoni em 2005 - e pode ser definida, de modo ex- tremamente s intético, numa prevalente atenção à le itura direta do objeto arquitetônico37• Definitivamente, mesmo com os inevitáveis de- senvolvime ntos disciplinares, o legado multiforme ele Ciovannoni nos campos do res tauro, do urbanismo e da história da arquite tura parece ainda hoje de notável atualidade. A despeito de tudo isso, a sua fortuna crfti ca, no entanto, foi marcada por um longo perfodo por pre - conceitos e silêncios - devidos em grande par~e ao seu controvertido envolvimento com o regime fascista e à sua 37. O tema foi objeto de um congresso específico realizado em Roma eml992 (Principi e i'rletodi de/la Storia dell'Architettura e l 'Ere<litl'l delta "Scuola Romana''. op. cit.). Cf. Também G. Simoncini (org.), "L' Intiegnamcnto de lia . toria dell'Architettura", Atti dei Seminario (Roma, 4·6 novembre 1993), Bollettino del Centro di Stucli per la Storia dell'Architeltltm. 1995, n. 37; V. Franchetti Pardo (org.), La Facoltà di Architettura dell'Uniuersità di Rom(t "La Sapienza" dalle Origini al Duemila. DiscLjJline, Docenti, Stu- denti, Roma, Gangemi, 2001 . Ver também as reflexões de A. Bruschi , C. Bozzoni, G. Carbonara, P. Fancelli, F. P. Fiore na mesa redonda da jornada de estudos sobre Giovannoni de 2003, e ainda o posfácio ao volume das atas de V. Franchetti Pardo (Gustavo Giouannoni: Riflessioni agli Alho ri del XXI secolo , op. cit., pp. 223-259) . Atualidade dc Gu stavo Giovannoni • 49 opos ição à arquitetura moderna - bem evidentes desde "" unos que imediatamente sucederam à sua morte33, qtH' atingiram em particular a parte mais inovadora de 111a contribuição, ou seja, a referente à conservação do nnbiente urbano. É somente a partir do final dos anos IIJ(,() que o nome ele Giovannoni começou a aparecer ttoHtmente nas histórias ela arquitetura do século XX e 1111" textos de restauro e de urbanismo. Esse processo, ''""Lante lento, acelerou-se a partir de 1987, ano em •ptl' o Centro de Estudos de His tória da Arquite tura l""n1oveu um prime iro congresso sobre Giovannoni e ' \ o.;sociação Artística dos Cultores de Arquitetura39• A I ' ui i r dessa data apareceram numerosos escritos sobre a nltJ 11 do estudioso- entre as quais a citada antologia Dal r •ttJitello alla Città, organizada por Zucconi e publicada , ttt 19<)7 - enquanto era reimpresso, com prefácio de I • • tlt ~·oise Ch oay e um ensaio e Francesco Ventura, o , " ''lttt(' Vecchie Città ed Edilizia Nuova40• 1-:m anos mais recentes, em junho de 2003 , foi •, d t/ uda uma jornada de estudos dedicada a Giovan- tll• tll - para a qual Cae tano Miarelli Mariani, morto '"' 11 11o precedente, havia ins istido muitíssimo -, no f, , 11 t n ·r da qual diversos estudiosos evidenciaram o \ l'oll l<', " I Jt F01tuna Critica di Gustavo Giovannoni'' , op. cit., pp. 207- ' 11> I •• t•tztone Artística trai Cultori di Architettura e Gustavo Giova111wni, ,, t • 1 " " ' u"'"'ui, J!ecchie Città ed Edilizia NtLova , Torino, Utet, 1931; 'I li "'"• r:tt t ~stud i , 199.'i (2• ed.). Cristiano Destacar Cristiano Destacar 50 • G us tavo Giovannoni. Textos Escolhidos estado dos estudos, trazendo também pesquisas inéditas provenientes da consulta de seu arquivo no Cen tro de Estudos, objeto de uma longa reorganização a partir do final dos anos 1970. Por ocasião da publicação das a las do encontro, redigi uma bibliografia dos escritos sobre Ciovannoni, a tualizada em 2005, que mostra o notável despertar do interesse pela personagem, desenvolvido a partir do final dos anos 19804t . Ainda mais recente- mente, apareceram alguns aprofundamentos específicos da contribuição ele Ciovannoni, no âmbito de algumas peculiares realidades locais na Itália, fruto ele pesquisas tópicas em seu arquivo, como para a cidade de ápoles, onde a influência do estudioso marcou por pelo menos duas décadas os campos do restauro, do urbanismo e da hi stória da arquitetura42• No todo, porém, a vastidão ela obra de Giovannoni ainda está longe de ser perscrutada de modo exaus tivo e a possibilidade ele, no futuro , con- sultar seus arquivos sistematicamente cons tituirá uma passagem imprescindível para uma real evoiução dos estudos sobre sua obra. De resto, como bem testemunha o presente volume, a figura ele Giovannoni já há certo tempo transpôs as 41. A. Pane (org.), "Bibliografia degli Scrilli su Gustavo Giovannoni'', in M. P. c llc (org.), op. cit. , pp. 261-2í 9. 42. A. Pa ne, "I.:Infiuenza di Gustavo Giovannoni a Napoli tra Restauro dei Monumenti e Urbanis tica. 11 Piano dell926 e la Questione cJella ' vecchia città"', em R. Amore, A. Pane, C. Vitagliano, Restallro, Monllmerrti e Citul. Teorie ed Esperienze del Novecento in ltalia, Quaderni di Restauro dei Dipmtimento di Storia deli 'Architettura e Restauro dell'Università di N!lpoli "Fedcrico li", 4, Napoli, Elec ta Napoli, 2008, pp. 13-93. At uuliducJe de Gustavo Giovannoni • 51 ftnHit• iras italianas. Esse processo teve início antes de 111.lo na França, graças aos estudos ele Françoise Choay, '1111' t ' ll t 1992, em seu célebre A Alegoria do Patrimônio, 111 dlllfa a Giovannoni o papel fundamental de figura lu >~ lo rial" para o patrimônio urbano43• O interesse ele I ltntty pelo estudioso romano prosseguiu, depois, com 1 publicação da primeira tradução francesa do volume I. , •ltit• Città ed Edilizia Nuom - aparecida em 1998 11111 um longo ensaio introdutório da estudiosa, qu e 11 1! <' li IH também o controverso " infortúnio" crítico de t In\ 1111 non i H - e ainda com a antologia Le Patrimoine ,, (ltll'slions. Antlwlogie pour un Combat, publicada por 1 ''""~ ,.m 2009 com uma explícita intenção militante, 111 •JI It• aparecem alguns trechos de Giovannoni sobre o •· 111.1 du eonservação das velhas c idades45• Nesse meio r. '"I"'• lambém em ambiente an glo-saxão a figura de 1 lo t\ ltl lllotti passou por um primeiro aprofundamento, 111 'I"'' Hobressai certamente o volume Modemism in I ""'" lrf'lâtecture, 1890-1940, publicado por Richard I I ltu "· I '11/t<gorie dn Putrimoine, Pari•, Seuil, 1992 , 1999 (3 • ed.). pp. I I 1 I , I I "'u lmduçJo brasileira de Luciano Vieira Machado: F. Choay, I 1/ '"'' do Patrimúnia. São Paulo, t.Jnesp, 2001, pp. 186-203. N. da l i I f h1 " ''luttudllt tion". t'nt G. Giovannoni, L'L'rbanisme Face au.t Filies I ""• ''/'·r it .. pp. 7-32. I 11 1 • • 11 1 puo·lieulur. de trechos retirados dos dois artigos de 1913 1 I lo
Compartilhar