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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – UFMG LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO (FAE) THAÍS DE SOUZA COSTA ANÁLISE DA TRAJETÓRIA DE ESCOLARIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA AO ENSINO SUPERIOR BELO HORIZONTE 2019 2 THAÍS DE SOUZA COSTA ANÁLISE DA TRAJETÓRIA DE ESCOLARIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA AO ENSINO SUPERIOR Trabalho de Análise da Trajetória de Escolarização, apresentado à Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, na Faculdade de Educação (FAE) como parte da disciplina Sociologia da Educação, do curso Ciências Biológicas (licenciatura), no segundo semestre de 2019. Professora: Priscila Coutinho BELO HORIZONTE 2019 3 SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................ ...............04 PERFIL SOCIOLÓGICO.............................................................................................05 ENSINO INFANTIL................................................................................ .....................06 ENSINO FUNDAMENTAL..........................................................................................07 ENSINO MÉDIO.........................................................................................................10 DEPOIS DO ENSINO MÉDIO.....................................................................................10 CONCLUSÃO.............................................................................................................12 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................................14 4 INTRODUÇÃO Desde os princípios da história da humanidade há uma infinidade de eventos marcantes que englobam tanto as divisões sociais, bem como os conflitos resultantes dessas. Isso ocorre devido a diversas modificações no meio social, juntamente com as respostas que os seres humanos têm a essas mudanças, que, em geral, os atinge de grande maneira. No entanto, é possível observar essas respostas de forma semelhante ou totalmente diferente nos mesmos ou em distintos grupos sociais. Diante dessa circunstância, é necessário entender a importância da socialização, que pode ser apresentada como o processo em que um ser humano se insere à sociedade e, assim, se torna um importante ator como um membro da mesma. Com isso, já no início da vida há uma soma de influências do meio externo à uma criança, que se inspira nesse conjunto de padrões sociais observados. Assim, é possível também analisar, que diante dessas observações sociológicas somadas com as experiências pessoais, a socialização é um processo mútuo, pois tanto o homem é influenciado pelo meio social, quanto a sociedade é influenciada pelo homem. (Berger e Berger, 1994). No século XXI, o jovem já se encontra em uma realidade histórico/sociológica de grandes avanços tecnológicos e científicos em que há cada vez mais dificuldade para realização de sonhos, principalmente no âmbito de estudos, a tão sonhada faculdade, e de trabalho. Segundo Raitz e Petters, 2008, a partir disso, os jovens são cada vez mais atingidos pelo processo de socialização em que diante de tantos novos conceitos e modernidades, acabam se perdendo e tendo dificuldades para realização dos objetivos sonhados. Portanto, é evidente a necessidade de entender os processos sociológicos bem como a trajetória do jovem na atualidade. Assim, este trabalho tem como objetivo analisar a trajetória escolar (desde o ensino fundamental ao superior) de uma jovem que está na graduação. Também foca em analisar e identificar os principais fatores e influências externas que contribuíram para esse trajeto. A trajetória escolhida foi de uma jovem que, desde a infância, estudou em escolas públicas consideradas medianas, mas mesmo com alguns empecilhos sociais conseguiu alcançar seu grande objetivo de entrar na universidade sonhada. Como 5 metodologia de estudo foram analisadas as descrições da história pessoal feitas pela estudante. Para que se sentisse mais à vontade, também foram escolhidos por ela mesma pseudônimos para todos os familiares citados. PERFIL SOCIOLÓGICO De acordo com Talcott Parsons, tanto a classe, quanto a família são importantes fatores de socialização que influenciam diretamente no desenvolvimento de capacidade bem como no de responsabilidade do indivíduo. É possível diante disso, analisar como que pessoas de uma mesma classe escolar podem ter ou não sucessos, sendo de diferentes ou de iguais classes sociais. Para entender o perfil da jovem analisada faz-se necessário entender o meio de convivência (classe social) e o meio familiar da mesma. Identificação: Luara, possui 21 anos. Estuda Ciências Biológicas na Universidade Federal de sua cidade, que foi exatamente o curso que ela sonhou e precisou se esforçar muito para conseguir essa vaga. Mora em um grande aglomerado de sua cidade desde o seu nascimento. Vive com seus pais e sua irmã mais nova Solara. As coisas que Luara mais gosta de fazer são: estar com os amigos, em especial sua mãe e sua irmã; dançar; estudar (em especial, fazer trabalhos que tenham bons resultados); e refletir sobre a vida em geral. Luara costuma procurar entender sobre si mesma desde criança, e sempre foi em busca de análises pessoais como testes de personalidade e também como mapa astral. Ela já foi membro de igrejas católica e evangélica e atualmente se dedica a estudar o espiritismo, mas gosta muito de conhecer outros pontos de vista. Na comunidade em que vive, já participou de oficinas sociais como aulas de violão, aulas de dança, fotografia e oficinas de vídeo. A mãe, Luciene, é a pessoa que Luara mais admira e, assim, se espelha muito na personalidade e nas atitudes dela. Luciene teve muitas dificuldades na vida, mas, apesar disso, sempre foi muito batalhadora e independentemente da situação, ela procura ter pensamento positivo. Concluiu a quarta série, mas precisou parar de estudar para ajudar a família e, já na infância, trabalhava com pequenos afazeres domésticos em casas de pessoas com maiores condições financeiras. É natural de uma cidade no interior do seu estado, mas foi para a capital na adolescência para trabalhar em casas de família, pois na sua cidade natal não havia muitas 6 oportunidades de emprego. Ela é empregada doméstica em uma mesma casa há 18 anos. Atualmente, Luciene tem 43 anos. A irmã, Solara, é dois anos mais nova que Luara. É também uma pessoa que Luara admira muito e se espelha no cotidiano. Solara, apesar de ser muito nova, 19 anos, já passou por muitas situações pessoais complexas. Aos 12 anos desenvolveu uma grande depressão associada a anorexia, e posteriormente com bulimia. Hoje, tem conseguido passar por esses problemas aos poucos e já consegue ver o quão forte ela é, como Luara sempre a havia visto. Solara é uma jovem sensível, focada, batalhadora e muito inteligente. É realmente uma ótima melhor amiga e uma pessoa inspiradora. O pai, Walter, apesar de morar junto com elas, nunca foi próximo de Luara ou de sua irmã, porque a seu ver, os pais precisam manter um distanciamento dos filhos para haver respeito. Luara, sua irmã e sua mãe discordam muito disso, afinal, elas se respeitam muito e são melhores amigas. Walter, apesar de novo, 43, anos também possui muitas dificuldades em entender o ponto de vista de outras pessoas, além de ter certos preconceitos. Também tem mudado muito e Luara fica feliz em hoje ter uma relação mais compreensiva com o pai. A observação de características familiares é importante para entender como Luara conseguiu lidar com diferentes situações escolares. Desde criança sempre teve o incentivo dos pais, principalmente da mãe, que a acompanhava deperto. Além de que sempre se sentiu na obrigação de ser responsável por ser a irmã mais velha, e sempre tentava dar exemplos se espelhando nas atitudes dos adultos, em especial, da mãe. Isso se trata da identificação do mecanismo fundamental da socialização em que a criança passa a interagir e a se identificar com os outros. Significa que ocorre esse processo a partir da observação e compreensão de certas atitudes, de modo que a criança a absorve e a toma para si mesma. (Berger e Berger, 1994). ENSINO INFANTIL De acordo com Pierre Bourdieu,1979, sociedade pode ser analisada entorno de três tipos de capitais: capital econômico, social e cultural. Os três serão apresentados nesse trabalho, afinal, estão bastante conectados, mas como o foco principal é no âmbito escolar, será focado no último. 7 O capital cultural trata da hipótese de diferença no desempenho escolar entre crianças de classes sociais distintas em que o fator econômico tem um peso bastante complexo e importante. Aborda principalmente os benefícios das diferenças sociais refletindo nos sucessos escolares e profissionais, em que o capital cultural é muito mais facilitado quando o econômico possui grande influência positiva. Esse tipo de capital pode ser incorporado, quando possui relação com hábitos familiares; objetivado, a partir de uso de instrumentos como livros ou museus; e institucionalizado a partir dos diplomas conquistados (Pierre Bourdieu,1979). Do âmbito familiar, Luara recebeu um grande capital cultural de forma incorporada, que demonstra em disposições como sentimentos e modo de agir. No entanto, em se tratando do capital cultural objetivado, o incentivo ao uso de instrumentos foi maior a partir da escolarização, que ocorreu desde o ensino primário (creches) e, a partir da influência desses o capital cultural institucionalizado tem sido possibilitado. Devido à fatores relacionados a condições familiares, como, por exemplo, os pais terem que trabalhar e não conseguirem ficar com Luara e com a irmã quando eram crianças, elas foram matriculas em creches muito cedo. Com isso, já tiveram incentivos lúdicos desde muito novas e, ainda na creche, aprenderam a escrever seus nomes e a ler o básico. Luara se lembra que toda semana uma criança da sua turma escolhia um livro e treinava a leitura em casa, para então em um dia específico ler para o restante da turma. Eram livros infantis bem pequenos e com muitas imagens. A mãe de Luara a ajudava a treinar a leitura em casa e sempre estava interessada pelo dia a dia de suas filhas na creche. Com a creche também havia passeios em museus e parques. Percebe-se então a influência direta do uso de instrumentos culturais e do incentivo familiar, que permaneceu forte em toda a trajetória escolar da jovem. ENSINO FUNDAMENTAL A ingresso de Luara no ensino fundamental foi um pouco atrasado devido à sua data de aniversário. Como faz aniversário em julho, a direção da escola que os pais dela queriam colocá-la, informou que só seria possível a entrada aos seis anos ou se a criança fizesse seis anos no início do ano. Dessa forma, ela entrou no primeiro ano do ensino fundamental com seis anos e meio e no mesmo ano, completou 7 anos. Os pais escolheram essa escola, pois além de ser considerada a melhor escola de ensino 8 fundamental da região, está localizada na rua de cima da casa deles, sendo mais seguro e não havendo a necessidade de investir dinheiro em transporte. Na primeira série, Luara e outros colegas, foram transferidos para a outra turma de primeiro ano (a escola sempre manteve duas turmas para cada ano). Luara ficou muito triste, pois havia gostado muito da professora, mas essa situação se decorreu do fato de a professora ter percebido que alguns alunos eram mais “adiantados” do que outros. Luara permaneceu nas turmas dos alunos “mais adiantados” até sua saída dessa escola. Essa situação pode ser analisada segundo observações descritas por Talcott Parsons, das quais o principal ponto de diferenciação dentro de uma sala de aula, se envolve entorno de aproveitamento. Esse aproveitamento pode ser tratado como uma competição entre os melhores desempenhos dos alunos e também da perspectiva escolar, que foca em uma base seletiva para o futuro status social, como um agente classificador. É de fato inspirador para alguns alunos serem reconhecidos de acordo com seus desempenhos, mas sabe-se que também para os que não conseguiram alcançar tais resultados devido a diversos fatores (ponto de vista familiar, convivência com diferentes pessoas, problemas pessoais, entre outros) se trata de uma situação desestimulante. Diante disso, é provável que o sistema de classificação escolar atual, principalmente em escolas públicas, não tenha demais sucessos devido a essa diferenciação, que, muitas das vezes, não considera os efeitos geradores e nem mesmo as consequências dessas divisões. Luara relata exatamente essa situação ao lembrar que as pessoas que estudaram com ela no ensino fundamental nas turmas dos mais adiantados foram mais à frente em questões de estudo, de modo que concluíram o ensino médio e uma parte considerável ingressou em ensino superior. No entanto, uma boa parte dos alunos que estavam nas turmas mais atrasadas, nem mesmo ingressaram no ensino médio. Em todos os anos do ensino fundamental Luara foi destaque em suas turmas, sendo muito elogiada pelos professores. Duas professoras de ciências e de biologia ficavam impressionadas e até mesmo comentavam com a direção da escola sobre o interesse e disposição da estudante em aprender o conteúdo, principalmente quando tinha relação com natureza. Também havia uma professora de matemática, que via a facilidade de aprendizagem de Luara e agilidade em fazer os exercícios, que a pedia para ajudar a tirar as dúvidas dos colegas. Ela ficava muito empolgada em ajudar a professora e a explicar a matéria para os colegas. Essa foi com certeza a professora 9 que mais marcou a vida de Luara, pois ela a incentivava muito e também se tornou uma amiga para ela. Já era da vontade de Luara fazer uma graduação, mas com o incentivo dos professores parecia cada vez mais ser um sonho palpável. Novamente exemplificando a conexão escola-família tem-se a grande relação entre as formas familiares da cultura escrita descritas por Bernard Lahire, 1997, que trata do contato com a leitura em maior ou menor grau no ambiente familiar como um fator de adaptação ao ambiente escolar. Tem-se que a leitura desde a infância, o reconhecimento de histórias também orais, o costume ao ver os pais lendo mesmo que jornais ou pequenas revistas, os hábitos como os bilhetes, as anotações de informações importantes e de compromissos, a organização do caderno de receitas, dentre outras atividades, são práticas da escrita de organização doméstica que auxiliam na habitualidade em organizar e estruturar o aprendizado. Das atividades domésticas citadas, todas eram observadas em casa por Luara em sua infância, que, juntamente com o capital cultural objetivado, facilitaram a boa adaptação dela ao meio escolar. Aos 11 anos, Luara, ao estudar as áreas da biologia, se interessou muito por ecologia e por educação ambiental e então teve a ideia de formar um grupo educativo nas escolas do bairro. Falou muito empolgada sobre a ideia com sua irmã e com uma amiga, que também se empolgaram. A partir disso, Luara agendou uma reunião com um vereador, que gostou muito da iniciativa das meninas e disse que precisaria de um projeto. No entanto, tiveram dificuldades para montar um projeto e os pais das garotas acharam perigoso que elas andassem pelas escolas do aglomerado e, a partir disso, Luara teve que deixar a ideia para um outro momento. Também aos 11 anos, Luara leu um livro muito instigante chamado “Eu sou o Mensageiro”. Esse livro despertou nela uma imensa vontade ler romances e, depois disso,ela se tornou uma verdadeira “devoradora” de livros. Nesse ano, Luara leu 3 livros e, no ano seguinte, leu 11 novos romances. Um desses outros livros foi o livro do Augusto Cury chamado “O Colecionador de Lágrimas”. Esse livro fez Luara se sensibilizar e refletir muito sobre diversas áreas da vida, mas o que mais a marcou foi sobre a importância de um representante/lider para um povo. O livro trata de uma análise da Segunda Guerra Mundial e da mente de Ritler, focando em como uma situação desesperadora pode levar uma sociedade culta a colocar no poder um 10 ditador desumano e ainda a não questionar esses atos de crueldade praticados por esse ditador. Além disso, esse livro passa uma forte mensagem de que caso uma sociedade não estiver mentalmente saudável e atenta, esse grande erro histórico pode se repetir. A partir de então, o papel dos professores é mais do que reconhecido, pois são eles os atores principais no auxílio necessário para que as pessoas tenham mentes livres e senso crítico. Diante de tudo isso, Luara conseguiu imaginar-se radiantemente atuando no futuro como professora. ENSINO MÉDIO No ensino médio, Luara foi estudar na escola pública em que seu pai trabalha desde que ela era criança. Ter o pai na escola não fez muita diferença para Luara, apesar de que em todos os lugares que ela estava, alguém da escola a conhecia. Quando estava cursando o segundo ano do ensino médio, uma oportunidade de fazer iniciação científica júnior na Fiocruz – Centro de Pesquisa Renné Rachou pelo programa Provoc (Programa de Vocação Científica Junior) foi divulgada na escola. Luara se interessou na hora pela oportunidade de conhecer mais de perto o ramo científico. Assim, começou na Fiocruz auxiliando na divulgação da VII Olimpíada Brasileira de Saúde e de Meio Ambiente (OBSMA) e participou na pesquisa de doutorado intitulada “As políticas de educação profissional e as redes sociais no contexto da dengue” com o desenvolvimento do subprojeto denominado “Análise das políticas de formação dos agentes de combate às endemias (ACE) nas redes sociais”. Com esse projeto, Luara foi premiada na Reunião Anual de Iniciação Científica (RAIC 2016, 16 a 20 de maio) na categoria “MELHOR APRESENTAÇÃO DE PÔSTER’’ com o trabalho desenvolvido no Centro de Pesquisa René Rachou. Antes da experiência na Fiocruz, Luara ainda tinha dúvidas sobre qual profissão gostaria de seguir. Suas dúvidas eram entre Ciências Biológicas, Engenharia Ambiental, Psicologia. No final, percebeu que biologia, principalmente no âmbito ambiental, sempre foi a área que mais a atraiu e teve certeza que se sentiria muito feliz nessa profissão, sem contar que poderia ser professora de jovens e quem sabe inspirar muitos jovens. 11 DEPOIS DO ENSINO MÉDIO Ao terminar o ensino médio, Luara fez o Enem e então surgiu a dúvida com relação ao futuro. O que fazer depois do ensino médio se não passasse na faculdade? Logo, Luara foi em busca de um emprego, que a possibilitasse um horário flexível para poder estudar, caso não tivesse uma boa nota no Enem, e guardar um dinheiro para fazer um cursinho preparatório para garantir uma boa nota no próximo ano. O que encontrou foi o emprego de telemarketing, em que permaneceu por sete meses. Foi bom ter planejado tudo, afinal, sua nota não foi boa. Com essa situação percebeu que não conseguiria passar em nenhum dos cursos que tinha interesse, afinal, mesmo sendo sempre uma aluna aplicada, não teve a oportunidade de estudar em escolas excelentes e, assim colocou seus planos em prática: Estudava pela internet de manhã e de 15 às 21h trabalhava como telemarketing. No entanto, o trabalho estava muito estressante e Luara ainda planejava fazer o curso intensivo para o Enem. Quando surgiu a oportunidade de estudar no Senai o curso Aprendizagem Industrial em Processos administrativos como jovem aprendiz, Luara saiu do emprego de telemarketing e passou a investir nos estudos. Segundo Pierre Bourdieu, os investimentos escolares são variáveis em função da reprodução social de cada grupo e também do sucesso escolar dos membros. Dessa forma, as classes mais favorecidas, não necessitam investir tanto na escolarização dos filhos, afinal, esses, já se encontram em uma situação privilegiada com relação aos capitais social, econômico e cultural. Já nas classes populares, há a necessidade de investimento, que ocorre de maneira relativamente baixa no sistema de ensino. Fazer um cursinho preparatório por três meses, em comparação com todo o ensino básico em escolas particulares, ainda não é um investimento garantido, de modo que dependeria ainda mais do esforço da estudante. Pensou muito e foi crescendo o medo de mesmo fazendo cursinho não conseguir entrar na universidade federal, pois sua família não tinha condições de pagar uma graduação e nem mesmo seu emprego como telemarketing seria suficiente. Sua outra opção seria tentar ingressar em uma boa universidade particular (com o PROUNI ou FIES), mas também não eram opções que se adequariam à vida de Luara. Então lembrou-se de que quando estava cursando o ensino médio, sua irmã, que também se sobressaia sendo uma aluna “adiantada” e muito aplicada, havia sido contemplada com uma bolsa, que 12 sua atual escola (antiga escola de Luara do ensino fundamental) ganhou em um cursinho preparatório para o ensino médio no Centro Federal de Educação Tecnológica de sua cidade. Com isso, ela soube dos cursos subsequentes, em que não há a necessidade de integração com o ensino médio, sendo também noturno. Luara teve muito incentivo da irmã para fazer a prova de seleção para o curso referente ao Técnico em Meio Ambiente e ficou ansiosa pensando na possibilidade de passar, afinal, nesse momento teria mais uma opção na área que gostaria de seguir. Houve então uma grande surpresa, Luara foi bem nas duas provas (ENEM e no Processo Seletivo do curso técnico do CEFET) e decidiu, juntamente com o apoio de sua família, fazer os dois cursos. Seria bem complicado, afinal, além de ser muito conteúdo para estudar, gastaria muito dinheiro com passagem e não teria como fazer nenhum estágio nesses dois anos, mas tanto Luara, como sua família, acreditam que foi um ótimo investimento. Isso demonstra o que Bourdieu chama de “super-seleção”, que os indivíduos de classes sociais menos favorecidas já passaram quando alcançam um elevado nível do sistema de ensino como o acesso a graduação. Atualmente, Luara está finalizando o curso Técnico em Meio Ambiente e, já está procurando um estágio em sua área de atuação. Ela pretende já poder trabalhar como técnica em Meio Ambiente enquanto finaliza a graduação e, posteriormente, fazer pós-graduação em área ambiental. CONCLUSÃO Diante do perfil analisado, foi possível observar uma grande atuação de diversos fatores como a socialização, as influências pessoais e as formas culturais apresentadas na trajetória de escolarização da jovem. Apesar das dificuldades enfrentadas a partir do nível escolar possibilitado, o apoio familiar foi extremamente determinante para o foco no alcance de objetivos, bem como a familiaridade com os instrumentos culturais desde a infância. Também foi comentado por Luara, que se sente muito realizada e muito grata por ter tido professores que a inspiraram e incentivaram. E, apesar de ter alcançado o seu maior objetivo até o dia de hoje, se sente muito triste ao ver ainda em sua comunidade, que a maioria das pessoas que fizeram ensino fundamental nos mesmos anos que ela, não seguiram pelo mesmo caminho. Ela diz acreditar que isso ocorre principalmente por questão econômico-social, afinal, ela teve a oportunidade de 13 escolher estudar e compreensão familiar para isso, enquanto que outras pessoas, quando têm a oportunidade, necessitam trabalhar para ajudar a família. Sem contar, que, além disso, um grande número de colegas quefazia parte das turmas dos “menos adiantados” não formaram nem mesmo no ensino fundamental, como citado anteriormente. Segue então uma grande reflexão que foi possibilitada a partir desse estudo: o meio social é ainda muito influente nos sucessos escolares, mas existem também outros fatores que podem amenizar essa influência nas classes sociais como o papel das famílias, das escolas, do governo e dos professores como grandes incentivadores. Isso pode acontecer com o incremento de instrumentos culturais diversificados e maiores interações da relação escola/vizinhança. Já os professores, além de passar um determinado conteúdo, se relacionam com jovens que possuem realidades distintas em que, diante disso, é indispensável a sensibilização dos mesmos. Assim, é importante acreditar e incentivar todos os alunos, em especial aos que tiverem maiores dificuldades, o que realmente pode ser um fator determinante para a diminuição das desigualdades escolares. 14 REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS ________. Os três estados do capital cultural. In: BOURDIEU, Pierre. Escritos de educação. Org. Maria Alice Nogueira e Afrânio Catani. 5ª ed. Petrópolis: Vozes, 2003B. BERGER, Peter L.; BERGER, Brigitte. Capítulo 13 - Socialização: Como ser um membro da sociedade. SOCIOLOGIA E SOCIEDADE (Leituras de introdução à Sociologia). Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/667298/mod_resource/content/1/Co mo%20ser%20um%20Membro%20da%20Sociedade%20Berger.pdf>. Acesso em: 19 nov. 2019. BRITTO, Sulamita (org.). A classe como sistema social. Compilado de PARSONS, Talcott. 1959. Organização da Juventude III. Rio de Janeiro CRUZ, Silvia Helena Vieira. Representação de escola e trajetória escolar. 1997. Faculdade de Educação - UFCeará Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 65641997000100006>. Acesso em: 18 nov. 2019. LAHIRE, Bernard. Sucesso escolar nos meios populares – as razões do improvável. São Paulo: Ática 1997. NOGUEIRA, Maria Alice e NOGUEIRA, Cláudio M. Martins. A sociologia da educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições. Educação e Sociedade, n. 78, ano XXIII, abril 2002. Disponível em: www.scielo.br RAITZ, Tânia Regina; PETTERS, Luciane Carmem Figueredo. Novos desafios dos jovens na atualidade: trabalho, educação e família. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 71822008000300011>. Acesso em: 18 nov. 2019. http://www.scielo.br/
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