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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E POLÍTICAS “A TERCEIRA ONDA DO MOVIMENTO FEMINISTA E O NEOLIBERALISMO NO CONTEXTO INTERNACIONAL " ANA BEATRIZ DE ARAUJO LIMA LARA DOS SANTOS COSTA PROFESSORA MARIA VILARREAL RIO DE JANEIRO, DEZEMBRO DE 2020 RESUMO Com o surgimento da globalização, o movimento feminista passa por diversas fases em todo globo. A primeira Onda do Movimento tinha como sua principal preocupação a garantia do direito ao voto universal. A partir de 1960 com advento da Segunda Onda, o feminismo se preocupa em ocupar espaços antes jamais ocupados, no campo legislativo, jurídico e institucional trazendo à tona, a união entre todas as mulheres no mundo conhecido popularmente com feminismo raiz, enquanto a Terceira Onda se preocupava com o ser individualista em um mundo global. Esse trabalho tem como objetivo retratar como a Terceira Onda do Movimento Feminista está atrelada a agenda Neoliberal em todo o mundo, os desafios impostos para a mulher em uma perspectiva individualizada. Qual é a relação entre o Movimento Feminista em sua Terceira Onda e o Neoliberalismo? Uma revisão bibliográfica atualizada no campo das Relações Internacionais. 1. INTRODUÇÃO Desde os primórdios as mulheres foram retratadas como seres compreensivos, pacificadores de conflitos e associados com a manutenção da paz. Com as grandes guerras a imagem do homem foi reforçada como o grande causador do conflito, detentor de todo o poder sendo o dever da mulher manter a calma e a moralidade da família patriarcal. O homem sempre foi imaginado e criado para ser dono de sua própria história enquanto as mulheres se tornavam meras espectadoras de sua própria vida, uma trajetória baseada em assistir as conquistas masculinas. Desde de pequenas foram ensinadas a perder para os meninos, estarem sempre arrumadas e bonitas, a serem “boas meninas” pois a mulher nunca foi considerada no âmbito social, político e econômico como algo relativamente bom. Ser mulher nunca foi fácil em meio há tantos discursos vazios. Nos anos 60 era normal se ter aula de economia doméstica. Meninas eram ensinadas como serem boas esposas, capazes de cozinhar, cuidar do bebê e não atrapalhar o marido com os problemas da casa. Séries foram escritas e dirigidas baseadas nesse ideal da mulher perfeita do lar. Afinal, por que mulheres gostariam de aprender sobre história e matemática, não é mesmo? O movimento feminista surge para reivindicar os direitos das mulheres como cidadãs, no campo político, econômico e social. Pela igualdade de direitos e condições. Em suma, o feminismo luta contra a situação de inferioridade em que as mulheres ainda vivem na sociedade. 1. O FEMINISMO O feminismo nasce a partir da necessidade da valorização do gênero feminino que apesar das diferenças biológicas e naturais visam a busca de seus direitos. A ausência de representatividade fez com que mulheres fossem à luta para garantir sua liberdade e seus direitos, sendo alguns conquistados e outros em determinadas ocasiões pagos com a vida. É Possível afirmar que no âmbito político, mulheres com cargos representativos contribuem para a legitimidade da igualdade de gênero. Apesar do direito à igualdade entre homens e mulheres ser assegurado por tratados e declarações internacionais, a desigualdade ainda é um fator existente na vida das mulheres. Atualmente, o movimento feminista se vinculou a ONG’s para poder intervir junto ao Estado e poder garantir direitos e proteção as mulheres. No âmbito das Relações Internacionais, o tema levou um tempo para ser incorporado na agenda internacional, visto que priorizavam por temas de mais relevância e acreditavam que o assunto não contribuía muito com a política externa de forma geral. Apesar do estudo ter ganhado espaço dentro das Relações Internacionais, ainda existe preocupação sobre o estudo e inserir alguns temas na agenda. A teoria política feminista foi inserida na década de 1990, a partir dos enfoques alternativos, conhecidos como pós positivistas. Com o passar do tempo, o tema foi ganhando destaque e foi avançando em todas as áreas, sendo elas: política externa, economia, política internacional, entre outros. O avanço ocasionou na primeira onda do feminismo. A primeira onda do feminismo, foi impulsionada pelo liberalismo e ocorreu entre o fim do século XIX e início do século XX, foi liderado por Marie Gouze, que escreveu a Declaração dos direitos da mulher cidadã, após a revolução francesa. A primeira onda feminista, buscava ampliar a democracia e buscar igualdade de direitos em relação ao homem. Além de igualdade, buscavam por liberdade, dignidade, autonomia e individualidade. A evolução das teorias feministas foram reconhecidas pelos impactos causados nos estudos das ciências sociais. A luta diante a sociedade que busca pelo fim dos abusos, dominação e discriminações foram importantes para o crescimento do movimento. Para contrapor a teoria feminista liberal, surgiu a teoria feminista socialista. As teorias marxistas, afirmam que a desigualdade sexual está vinculada a desigualdade socioeconômica. A fusão criada pela teoria marxista, vincula a estrutura capitalista às opressões, sendo o poder financeiro o fator principal para a opressão de homens e mulheres. Na década de 1960, surgiu a teoria feminista radical, alinhado ao movimento de direitos humanos nos Estados Unidos, esta teoria é responsável pela propagação do conceito de gênero. De acordo com o feminismo radical, a intervenção do Estado ou das instituições não soluciona o problema, a opressão só tem solução diante a construção da sexualidade Atualmente, o feminismo passa por diversas abordagens, podendo elas ser: marxistas, liberais e estruturalistas. 2. FEMINISMO NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS O feminismo nas relações internacionais, se deu como resposta ao patriarcado buscando pela emancipação feminina na estrutura de opressão. A teoria feminista, tinha o objetivo de conceituar e justificar o movimento. O movimento feminista entra na agenda das relações internacionais através da comparação de fenômenos abordados sob o espectro de gênero. Nas relações internacionais, a segurança ocupa grande atenção. O assunto é integrado na posição de homens e mulheres nas negociações de paz, contudo, varia do ator político inserido na narrativa. Em Guerras ou invasões, mulheres são violentadas pelos invasores. Reivindicações de movimentos feministas fizeram com que a Organização das Nações Unidas (ONU), aprovando resoluções e medidas para proteger as mulheres nessas determinadas situações. A política nacional tem relação com política externa, podendo interagir com as relações internacionais ou não. A perspectiva de gênero é defendida por agências internacionais e defendem sua influência para relações mais igualitárias. Apesar de ter ganhado destaque no cenário internacional, a luta feminista segue sendo um grande obstáculo nas relações internacionais. 3. A SEGUNDA ONDA DO FEMINISMO - MULHERES COMO SUJEITOS GLOBAIS. Com o avanço da globalização e os milhares de homens mortos nas grandes guerras, as mulheres tiveram que encarar o mercado de trabalho para sustentar seus filhos e prover as necessidades financeiras do lar. O feminismo ganha mais espaço na década de 60 juntamente com outros movimentos que reivindicam outras formas de exercício de poder. A luta das mulheres finalmente estava entrando na área legislativa, tomando forma no campo jurídico e institucional. A primeira Onda do Feminismo já havia garantido o direito ao voto graças às sufragistas. A segunda onda do Movimento feminista surgecomo um marco da reivindicação sobre o papel da mulher na sociedade pós Guerra, conhecido como feminismo raiz, aborda a questão da exploração da mulher devido as suas capacidades reprodutivas. Na teoria, as feministas da segunda onda buscam identificar a origem da condição feminina, tendo como resposta o próprio sexo e suas funções reprodutivas atrelados a exploração da capacidade de procriação na sociedade capitalista, sendo o feminismo da segunda onda o responsável pela ideia central de que independente do que separa as mulheres no mundo, a opressão as une. Com base nessas formulações teóricas e políticas, os anos 70 foram marcantes para o movimento feminista internacional. O fortalecimento das lutas das mulheres permitiu que 1975 fosse declarado o Ano Internacional das Mulheres, quando a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas organizou a Primeira Conferência Mundial sobre as Mulheres, na Cidade do México. Tal foi o impacto desse encontro que os anos de 1976 a 1985 compreenderam um período denominado “A década da mulher”.(O Sujeito nas Ondas do Feminismo e o lugar do corpo na Contemporaneidade,2015,p.5) 4. O NEOLIBERALISMO E A TERCEIRA ONDA DO FEMINISMO A vertente liberal das Relações Internacionais, tem como uma de suas características a defesa do direito natural do indivíduo, isso é, a preocupação pela manutenção do direito à vida, à liberdade e à propriedade. Nela, começa a se discutir sobre o lugar do indivíduo na sociedade, sobre a natureza do estado e sobre a legitimidade das instituições governamentais. Tal preocupação é tão forte que passa a ser um dos fundamentos filosóficos mais essenciais da corrente liberal. Existe, também, a atenção para a garantia de igualdade entre os seres humanos, de modo a construir uma sociedade bem-ordenada. A terceira onda do feminismo surge com a necessidade de mudanças extremas no cenário internacional na década de 90, a queda da União Soviética, a dissolução das ditaduras na América Latina e o crescimento do Neoliberalismo em todo o mundo são fatores que contribuem para a adoção de uma postura mais individualista, enfraquecendo o movimento e o transformando em mais capitalizado de modo geral. A relação entre feminismo e neoliberalismo, a partir da década de 1970, coexistem como movimentos intelectuais, sociais e político. Dessa maneira, sofrem influência um do outro e vivem uma relação complexa, com pontos de intersecção e pontos de discordância. (Feminismo e neoliberalismo na contemporaneidade: uma “nova razão” para o movimento de liberação das mulheres? 2017, p.160) O individualismo e o carreirismo são exemplos da influência da agenda Neoliberal dentro do Movimento feminista, causando um efeito elitista voltado para as grandes empresárias com alto nível de escolaridade em um mundo meritocrático, sem um recorde de raças necessário devido as condições diferentes que cada mulher se encontra dentro da sociedade no geral, inclusive pelo separação causada pela escravidão mercantilista que só foi abolida no Séc. XIX . A autora Angela McRobbie disserta sobre a ideia da “ feminilidade competitiva”, um ideal de perfeição feminino, que causa uma rivalidade não-saudável entre todas as mulheres no mundo “Hoje lhe é exigido que seja boa mãe, boa dona de casa, bonita, bem-arrumada, com uma carreira de sucesso e com dois ou três hobbies interessantes”, um conceito exigido para todas as mulheres, em filmes, séries e livros, como se toda mulher tivesse que ser uma heroína, feita para dar conta de tudo, sem pestanejar. 5. A CONTRIBUIÇÃO FEMINISTA PARA A AGENDA NEOLIBERAL O feminismo começou como crítica ao capitalista, baseado na emancipação de mulheres, buscando uma sociedade com mais equidade de gênero, contudo, sua atual estrutura faz com que o movimento contribua com o neoliberalismo inserido na lógica capitalista. O enredo feminista tem contribuído com os esforços neoliberais e a sociedade de livre mercado, tornando o movimento uma luta mais individual. Um exemplo disso, é o incentivo da mulher a ter uma carreira promissora, o movimento que começou como libertação talvez tenha se vinculado à meritocracia, tendo virado refém do capitalismo após a Segunda Guerra Mundial. Segundo Nancy Fraser, teriam dois caminhos a serem seguidos dentro do sistema, na primeira hipótese, haveria emancipação de gênero alinhada a democracia representativa e solidariedade social. Na segunda hipótese, as mulheres teriam mais autonomia e estariam alinhadas com sociedade meritocrática neoliberal. Os caminhos levaram à segunda hipótese colocada pela autora. A crítica colocada por Nancy, é baseada na afirmação de que além das mulheres serem mal remuneradas pelos seus serviços e ter que fazer dupla jornada, tendo em vista que mulheres trabalham em seus locais de trabalho e devem fazer suas obrigações domésticas. Acredita-se que a crise seria capaz de retomar essa solidariedade ideal para o rompimento dessa narrativa neoliberal. O Feminismo teria perdido o seu foco de crescimento das mulheres como um coletivo ao longo do processo das ondas feministas. O feminismo teria perdido parte de sua essência durante o processo, teria saído de uma luta coletiva para uma luta individual e a crítica teria se acoplado ao sistema. Deve-se retomar o fio da solidariedade, lutar para além da luta de posições de poder, valorizar atividades não-assalariadas, lutar a partir da base hierárquica, para melhorar o viés econômico. Deve-se utilizar da democracia para fortalecer as instituições, não enfatizar o livre mercado. 6. CONCLUSÃO O movimento feminista, incialmente criado para se opor ao Estado e trazer liberdade e igualdade para a vida das mulheres sofre transformações durante os processos de mudanças no Mundo. A Segunda Onda que representa o momento mais radical entre os anos 60 e 70 se transforma em algo individualizado e utilizado pelo próprio Sistema para justificar os problemas centrais e ressaltar a competição feminina. Antes um movimento de união central entre todas mulheres, se transforma em um movimento que utiliza da meritocracia para definir o papel da mulher como sujeito global. O feminismo é enfraquecido pelo neoliberalismo, passando a incorporar uma narrativa de expansão capitalista perante a sociedade global, perdendo o espaço entre as mulheres e potencializando toda uma narrativa de perfeição feminina, uma mulher capaz de resolver todos os problemas e mantendo sua então chamada feminilidade, se afastando da realidade das mulheres e não levando em conta as clivagens sociais. 8. REFERENCIAIS BIBLIOGRÁFICOS FRASER, Nancy. COMO O FEMINISMO SE TORNOU A EMPREGADA DO CAPITALISMO - E COMO RESGATÁ-LO. 2017. Disponível em: https://iela.ufsc.br/noticia/como-o-feminismo-se-tornou-empregada-do-capitalismo-e-como- resgata-lo OLIVEIRA, Ian. MERCHER, Leonardo. O MOVIMENTO FEMINISTA NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS . Disponível em: https://repositorio.uninter.com/bitstream/handle/1/275/1340697%20- %20IAN%20OLIVEIRA.pdf?sequence=1&isAllowed=y MEDEIROS, Fernanda. Feminismo e neoliberalismo na contemporaneidade: uma “nova razão” para o movimento de liberação das mulheres?. 2017. Disponível em: http://www.teoriaepesquisa.ufscar.br/index.php/tp/article/view/613/371 MCROBBIE, ANGELA.. Notes on the perfect: competitive femininity in neoliberal times. Australian feminist studies, empowerment organizations. Continuum: journal of media & cultural studies; 2015 KRITSCH, R.; VENTURA, R. Relações internacionais, teorias feministas e produção de conhecimento: um balanço das contribuições recentes; Revista de Relações Internacionais da UFGD, Dourados, v.6. N.11, jan./jun. Disponível em: http://ojs.ufgd.edu.br/index.php/moncoesMAXWELL. Globalização e feminismo – a reconstrução do social Cap 3 Disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/4045/4045_4.PDF https://iela.ufsc.br/noticia/como-o-feminismo-se-tornou-empregada-do-capitalismo-e-como-resgata-lo https://iela.ufsc.br/noticia/como-o-feminismo-se-tornou-empregada-do-capitalismo-e-como-resgata-lo https://repositorio.uninter.com/bitstream/handle/1/275/1340697%20-%20IAN%20OLIVEIRA.pdf?sequence=1&isAllowed=y https://repositorio.uninter.com/bitstream/handle/1/275/1340697%20-%20IAN%20OLIVEIRA.pdf?sequence=1&isAllowed=y http://www.teoriaepesquisa.ufscar.br/index.php/tp/article/view/613/371 https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/4045/4045_4.PDF
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