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KENNEDY, Paul Ascensão e queda das grandes potências

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ASCENSÃO E QUEDA DAS GRANDES POTÊNCIAS 
Fernando Alcoforado* 
O livro de Paul Keynnedy, Ascensão e queda das grandes potências: Transformação 
econômica e conflito militar de 1500 a 2000 (Rio de Janeiro: Editora Campus, 1989. 
675 páginas), tornou-se clássico da geopolítica, desde sua publicação, há duas décadas. 
No fim da década de 1980, depois do crash do mercado de ações, em 1987, quando 
havia preocupação com os déficits fiscais e do balanço de pagamentos em conta 
corrente dos Estados Unidos, antes da queda do Muro de Berlim, em 1989, Keynnedy 
chocou o mundo com sua afirmação de que “a única resposta à questão cada vez mais 
discutida da capacidade dos Estados Unidos de preservar ou não sua atual posição é 
‘não”. 
Segundo Kennedy, os Estados Unidos havia se tornado país devedor internacional pela 
primeira vez e dependia crescentemente da entrada de capital europeu e japonês. O 
Japão estava em ascensão. O sentimento de decadência chegou perto da histeria nos 
Estados Unidos quando empresas japonesas compraram ativos simbólicos da antiga 
pujança do capitalismo norte-americano. Hoje, além de depender da entrada de capital 
europeu e japonês, os Estados Unidos dependem significativamente de capitais oriundos 
da China. A tese do professor inglês da Yale University está sendo confirmada inclusive 
na era contemporânea. 
A tese de Paul Kennedy, resumidamente, dizia que a força relativa das principais nações 
no cenário mundial nunca permanece constante, principalmente em virtude, primeiro, da 
taxa de crescimento desigual entre as diferentes sociedades e, segundo, das inovações 
tecnológicas e organizacionais que proporcionam a determinada sociedade maior 
vantagem do que a outra. Quando sua capacidade produtiva aumentava, os países 
tinham, normalmente, maior facilidade de arcar com os ônus dos armamentos em 
grande escala, em tempo de paz, e manter e abastecer grandes exércitos e armadas 
durante a guerra. A riqueza é, geralmente, necessária ao poderio militar. Este, por sua 
vez, é, geralmente, necessário à aquisição e proteção da riqueza. Se, porém, proporção 
demasiado grande dos recursos do país é desviada da criação de riqueza e atribuída a 
fins militares, torna-se então provável que isso leve ao enfraquecimento do poderio 
nacional, em longo prazo. 
Paul Kennedy afirma ainda que, se o país excede estrategicamente, por exemplo, pela 
conquista de territórios extensos ou em guerras onerosas, corre o risco de ver as 
vantagens potenciais da expansão externa superadas pelas grandes despesas exigidas. 
Este dilema se torna agudo se o país em questão tiver entrado em período de declínio 
econômico relativo. A história da ascensão e queda dos países líderes do sistema de 
grandes potências, desde o avanço da Europa ocidental no século XVI, isto é, de nações 
como Espanha, Holanda, França, Império Britânico e, atualmente, Estados Unidos, 
mostra correlação muito significativa, em prazo mais longo, entre sua capacidade de 
produzir e gerar receitas, de um lado, e a força militar, do outro. 
A Holanda, por exemplo, potência hegemônica do planeta no século XVII, abandonou 
sua exploração da cana de açúcar no Brasil em 1654 porque esta atividade passou a 
representar um ônus para mantê-la. Examinando os registros históricos da ascensão e 
queda das grandes potências, no decorrer dos últimos 500 anos, Kennedy chegou a 
algumas conclusões de validade geral, embora reconhecendo, obviamente, a 
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possibilidade de algumas exceções. Há, por exemplo, relação causal concreta entre as 
variações ocorridas ao longo do tempo nos equilíbrios gerais econômicos e produtivos e 
a posição ocupada pelas potências individuais no sistema internacional. As mudanças 
econômicas pronunciadas anunciavam a ascensão de novas grandes potências que em 
algum dia teriam certo impacto decisivo na ordem militar ou territorial. 
Para Kennedy, a história sugere a existência de ligação muito clara, em longo prazo, 
entre a ascensão e queda econômica de grande potência militar ou império mundial. Isso 
resulta de dois fatos correlatos. O primeiro é que os recursos econômicos são 
necessários para apoiar a estrutura militar em grande escala. O segundo é que, no que 
concerne ao sistema internacional, tanto a riqueza como o poder são sempre relativos e 
como tal devem ser vistos. Se alguma nação é atualmente poderosa e rica, não depende, 
absolutamente, da abundância ou segurança de seu poder e riqueza, mas principalmente 
de terem os seus rivais menos desse poder e riqueza. Esta situação ocorreu durante o 
domínio do império britânico e, também, com os Estados Unidos após 1990 quando se 
tornou potência hegemônica no mundo. Isso não significa, porém, que o poder 
econômico e militar relativo de alguma nação crescerá ou decairá paralelamente ao de 
outra, segundo Kennedy. 
Kennedy deixa claro haver um intervalo temporal entre a trajetória da força econômica 
relativa de determinado Estado e sua trajetória de sua influência militar ou territorial. A 
potência em expansão econômica bem pode preferir ser mais rica do que investir, 
pesadamente, em armas. Meio século depois, as prioridades podem ter-se modificado. A 
expansão econômica trouxe consigo outras obrigações, isto é, fazer frente à dependência 
de mercados e matérias primas estrangeiros, alianças militares e, talvez bases e colônias. 
Outras potências rivais que estejam se expandindo em ritmo mais rápido, logo, querem, 
por sua vez, estender sua influência ao exterior. O mundo torna-se espaço mais 
disputado com as grandes potências competindo entre si arduamente por fatias de 
mercado. Nessas circunstâncias, a maior potência entre as demais perturbada, pode ver-
se gastando mais com a defesa do que antes. O mundo se tornou mais hostil 
simplesmente porque outras potências cresceram mais depressa e se estão tornando mais 
fortes. A grande potência em declínio relativo reage, instintivamente, gastando ainda 
mais com a “segurança” e, com isso, deixa de usar recursos potenciais em “investimento 
produtivo”. Agrava ainda mais seu dilema em longo prazo. Esta é a situação dos 
Estados Unidos que, no momento atual, não tem mais condições de assumir seus gastos 
militares como antes. Isto explica o posicionamento do governo Donald Trump de 
exigir que seus aliados da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) 
aumentem seus gastos. 
Kennedy faz tais generalizações, porém, sem cair na armadilha do determinismo 
econômico. Ele não está argumentando que a economia determina todos os fatos, ou 
constitui a única razão do sucesso ou fracasso das nações. Simplesmente, há provas 
demais, indicando outros elementos: geografia, organização militar, moral nacional, 
sistema de alianças e muitos outros fatores que podem afetar o poder relativo dos 
membros dos sistemas de Estado. O que lhe parece incontestável, porém, é que, em 
longa e arrastada guerra de grandes potências, geralmente, em coalizão, a vitória coube 
repetidas vezes ao lado com base produtiva mais florescente. A posição de poder de 
nações importantes acompanhou de perto sua posição econômica relativa nos últimos 
cinco séculos. Isso não é negar que “os homens fazem a sua própria história”, mas a 
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fazem dentro de circunstância históricas que podem limitar, assim como ampliar, as 
possibilidades. 
Evidentemente, ao examinar as “perspectivas” de cada uma das grandes potências, hoje, 
existe a tentação de afastar-se do ofício de historiador que busca explicar os fatos do 
passado para se aproximar do mundo incerto da especulação sobre o futuro. Mas muitos 
analistas não se furtam a essa futurologia. Muitos analistas afirmam que, com a China, a 
Índia e os outros países emergentes alcançando o mesmo patamar dos países do mundo 
desenvolvido, os Estados Unidos deverão sofrer declínio econômico relativo, ao 
produzirem parcela menor do PIB mundial, mesmo com o país crescendo mais do que a 
maioria das grandes economias desenvolvidas e ainda sendo a maior economia do 
mundo em termos absolutos.Vários países emergentes estão obtendo participação cada 
vez maior no PIB mundial. Pela previsão do Goldman Sachs, a China terá, em 2050, 
superado os Estados Unidos, com PIB de US$ 45 trilhões, contra os US$ 35 trilhões dos 
Estados Unidos. 
Em estudo sobre as maiores economias do mundo, Angus Maddison, da Universidade 
de Groningen, afirma em Chinese Economic Performance In The Long Run, que a 
participação da China no PIB mundial, em 1820, antes de a Revolução Industrial na 
Europa se expandir, era de mais de 30%, que é bem maior do que a participação atual 
dos Estados Unidos. Assim, de acordo com essa visão de longa onda histórica, a China 
está simplesmente retornando ao posto já alcançado no passado. A China, embora vista 
por muitos como a principal beneficiária da potencial exaustão dos Estados Unidos, já 
passou por experiência própria de declínio. Até a metade do milênio anterior, ela era 
tecnologicamente mais avançada do que a Europa, com agricultura mais eficiente, e a 
classe dos mandarins não tinha rivais em seu profissionalismo. Mesmo depois que o 
Ocidente a superou, econômica e tecnologicamente, entre os séculos XVI e XVIII, a 
economia da China ainda era a maior do mundo, quando a revolução industrial inglesa 
começou. 
No entanto, entre 1820 e 1952, quando a Europa experimentou taxas de crescimento 
econômico sem precedentes na história, a produtividade per capita da China caiu, 
enquanto sua participação no PIB mundial despencou de um terço para um vigésimo. A 
renda per capital caiu para um quarto da média mundial, no período, de acordo com 
Angus Maddison. Esse desempenho declinante tem sido atribuído a várias causas, 
incluindo a intervenção colonial estrangeira, os distúrbios internos e a inflexibilidade da 
burocracia chinesa diante dos desafios apresentados pelo renascimento do Ocidente. 
Quando o livro de Kennedy foi publicado, sua tese sobre o declínio dos Estados Unidos 
parecia errada para muitos analistas da geopolítica mundial, ao sugerir que os Estados 
Unidos talvez tivessem ampliado demais o seu império, ao ponto de não conseguirem 
mais administrá-lo, como aconteceu com a Espanha no século XVII e o Reino Unido no 
século XX. Na realidade, quem primeiro demonstrou incapacidade de administração, na 
década de 1980, foi a União Soviética, que entrou em colapso, enquanto os Estados 
Unidos foram bem-sucedidos, logo depois, no restabelecimento de seu equilíbrio 
orçamentário, durante o governo Clinton, sem haver recuo substancial em seus 
compromissos internacionais. A partir de 2001, o governo George W. Bush põe tudo a 
perder na área fiscal, com crescentes gastos bélicos. Em paralelo, o desafio econômico 
japonês perdeu o passo com o estouro das bolhas imobiliária e acionária, e o país se viu 
ameaçado pela deflação. O pânico da mídia americana com a invasão japonesa se 
mostrou vazio. 
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A questão em debate agora é se a tese de Paul Kennedy da incapacidade de 
administração do Império estava errada ou era simplesmente prematura. Prever os 
períodos de ascensão e queda de nações e economias é futurologia notoriamente difícil. 
O livro de Paul Kennedy preencheu uma lacuna crítica na história da ascensão e queda 
das grandes potências com rara erudição e profundidade. As previsões sobre o futuro 
dos Estados Unidos, demonstram indiscutivelmente a decadência dos Estados Unidos. 
Paul Keynnedy chocou o mundo com sua afirmação de que “a única resposta à questão 
cada vez mais discutida da capacidade dos Estados Unidos de preservar ou não sua atual 
posição é ‘não’”. Kennedy afirma que a riqueza é, geralmente, necessária ao poderio 
militar. Este, por sua vez, é, geralmente, necessário à aquisição e proteção da riqueza. 
Se, porém, proporção demasiado grande dos recursos do país é desviada da criação de 
riqueza e utilizada para fins militares, como vem ocorrendo com os Estados Unidos, 
torna-se então provável que isso leve ao enfraquecimento do poderio nacional, em longo 
prazo. 
O mundo se tornou mais hostil para os Estados Unidos simplesmente porque outras 
potências cresceram mais depressa e se estão tornando mais fortes, como é o caso da 
China. A grande potência em declínio relativo reage, instintivamente, gastando ainda 
mais com a “segurança” e, com isso, afastando do “investimento produtivo” recursos 
potenciais. Agrava ainda mais seu dilema em longo prazo. Pela previsão do Goldman 
Sachs, a China terá, em 2050, superado economicamente os Estados Unidos. Um fato é 
evidente: os Estados Unidos ampliaram demais o seu império, ao ponto de não 
conseguirem mais administrá-lo, como aconteceu com a Espanha no século XVII e o 
Reino Unido no século XX. Outro império, o soviético, foi quem primeiro demonstrou 
incapacidade de administração, na década de 1980, porque os gastos bélicos 
ultrapassaram todos os limites que levaram a União Soviética ao colapso. Os crescentes 
gastos bélicos dos Estados Unidos poderão levar ao mesmo desfecho. 
Chama a atenção uma das observações apresentadas por Donald Trump após seu 
encontro com Kim Jon Un ao afirmar que haveria redução substancial dos gastos 
militares com a suspensão dos exercícios militares com a Coreia do Sul. Isto acentua a 
preocupação de Trump no sentido de reduzir os gastos militares que estão afetando a 
economia dos Estados Unidos. O acordo de paz na península coreana pode significar, 
sem sombra de dúvidas, a realização de menores gastos bélicos em geral por parte dos 
Estados Unidos. Fica bastante evidente que os Estados Unidos não poderão manter sua 
hegemonia no mundo apoiado no poder militar cujos gastos são crescentes. Kennedy 
afirma que a riqueza é, geralmente, necessária ao poderio militar. Este, por sua vez, é, 
geralmente, necessário à aquisição e proteção da riqueza. O mundo se tornou mais hostil 
para os Estados Unidos simplesmente porque outras potências cresceram mais depressa 
e se estão tornando mais fortes, como é o caso da China e da Rússia que passou a ser 
protagonista na geopolítica mundial. A resposta da grande potência em declínio relativo, 
como os Estados Unidos, seria a de reagir, instintivamente, gastando ainda mais com a 
“segurança” e, com isso, afastando do “investimento produtivo” recursos potenciais. 
Agravaria, assim, ainda mais seu dilema em longo prazo. 
*Fernando Alcoforado, 78, membro da Academia Baiana de Educação e doutor em Planejamento 
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e 
consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e 
planejamento de sistemas energéticos, é autor de 13 livros que tratam de questões relativas à Economia 
Brasileira, Energia, Desenvolvimento Econômico e Social, Meio Ambiente, Aquecimento Global e 
Globalização.

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