Buscar

Modernismo Português

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 10 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 10 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 10 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

CAPITULO 
2 
MODERNISMO PORTUGUES. 
4 MULTIPUCIDADE 
DE UM POET4 
PERCURSO DO CAPÍTULO 
Milhares de sites são 
criados e desativados 
diariamente. Por essa
razão, é possivel que os 
endereços indicados nes- 
te capítulo não estejam 
mais disponiveis. 
Os heterônimos: Alberto 
Caeiro, Ricardo Reis e Älvaro 
de Campos 
Fernando Pessoa, ortônimo 
llustração de Fernando Pessoa, 
feita por Indio San, para a revista 
Bravo! n. 185, ed. jan. 2013. 
Editora Abril. A multiplicidade de 
personalidades poéticas marcou 
a obra de um dos maiores poetas 
do século XX: Fernando Pessoa. 
26 
PRa começar mciiild 
Você lerá versos de um longo poema escrito por Fernando Pessoa e atribuido por 
ele a Alvaro de Campos, uma de suas personalidades literárias, que conheceremos 
adiante. Esse poema foi publicado originalmente na primeira ediç�o da revista literária 
Orpheu, em março de 1915. 
Ode triunfal 
A dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábrica 
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto, 
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos. 
O rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno! 
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto! 
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos, 
De vos ouvir demasiadamente de perto, 
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso 
De expressão de todas as minhas sensações, 
Com um excesso contemporäneo de vós, ó máquinas! 
Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime! 
Ser completo como uma máquina! 
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo! 
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto, 
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento 
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões 
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável! 
CAMPOS, Álvaro de. Ode triunfal. In: GALHOz, Maria Aliete (Org.). 
Fernando Pessoa: obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar,
1999. p. 306. (Fragmento). 
Papilas: pequenas saliências 
da pele. 
Passento: que absorve 
líquidos facilmente. 
PensanDO SOBRe TExToairili}. 
1 Ode é uma composição poética de tom solene por 
meio da qual se exaltam
atributos de figuras ilustres. Quem ou o que está sendo exaltado nos versos 
de "Ode triunfal"? 
LemBRa?
Onomatopeia: figura 
de linguagem que con- 
siste na representação 
de um ruido ou som por 
uma palavra ou conjunto 
de palavras. 
2A que vanguarda europeia (estudada por você no capítulo anterior) os 
versos 
de Alvaro de Campos podem ser associados ? Justifique sua resposta. 
3No primeiro verso da segunda estrofe,
ocorre uma onomatopeia. Localize essa 
figura de linguagem e explique que efeito de sentido
ela tem no texto, tendo 
em vista sua resposta à quest�o
anterior. 
27 
NO poema, há quase uma fusão entre 
o eu lirico e o que ele 
denomina "fl0 
ra estupenda, negra, artificial e insaciável", 
ou seja, o ambiente 
da fábrica. 
Explique essa afirmação. 
Os longos versos livres e brancos de "Ode 
triunfal" exemplificamo empenho 
dos artistas portugueses em atualizar a arte do país, incorporando 
as referências 
aos "maquinismos em füria" e ao mundo novo que já 
caracterizava parte das naçoes 
europeias nas primeiras décadas do século
XX. O eu lirico do poema que 
você leu 
deseja manifestar-se "como um motor se exprime", sugerindo que 
é necessário buscar 
novas formas de expressão, que dialoguem com a velocidade, 
os ruídos, as massas 
das grandes cidades. Eo inicio do Modernismo português. 
NaQueLe TemPo... 
Marcos literários 
Nas primeiras décadas do século passado, Portugal viveu uma 
série de difi-
culdades.O rei Carlos I foi assassinado em 1908, com o príncipe herdeiro, o que 
revoltou a Europa. Seu sucessor, D. Manuel I, manteve a monarquia por mais dois 
anos, mas foi derrubado por um golpe militar que, com apoio popular, instaurou 
a República no país em 1910. Seguiram-se anos de instabilidade politica e enfra- 
quecimento económico, aprofundado, entre outros fatores, pela participação da 
Primeira Guerra Mundial. 
o Modernismo 
português tem iníicio
com a publicação da 
revista literária Or 
pheu, em 1915. Nesse 
mesmo ano, ocorre a 
Em 1926, o exército tomou o poder, e o pais passou a ser comandado por Anto-
nio de Oliveira Salazar (1889-1970), que instituiu um governo autoritário, finalizado 
somente em 1974, com a chamada Revolução dos Cravos.
exposição "Humoris- 
tas e Modernistas", na 
cidade do Porto. 
Fernando Pessoa 
A partir de 1914, realizou-se em terras lusitanas uma série de discussões em 
torno do Futurismo de Marinetti. Um ano depois, foi publicada a revista Orpheu,
considerada marco do Modernismo português. Os orfistas almejavam ser por- 
tugueses escrevendo para a Europa e tinham como proposta criar uma poesia 
"desnacionalizada", irreverente, indignada, original, anárquica e antiburguesa, em 
diálogo com os tempos modernos. 
Embora a revista Orpheu tenha contado com nomes de peso da poesia por- 
tuguesa (como Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros), destaca-se nela a 
produção de Fernando Pessoa. 
Fernando Pessoa "ele-mesmo" 
A poesia ortônima- aquela assinada pelo próprio Fernando Pessoa- e escrita em lingua portuguesa (o poeta publicou poemas também em inglês) apresenta um conjunto de caracteristicas que permite sua divisão em duas categorias: saudosista- -nacionalista e lirica. 
Fernando Pessoa 
(1888-1935) nasceu em 
Lisboa, mas realizou seus 
primeiros estudos na Afri-
ca do Sul, onde a familia 
fixou residência. Em 1905 
Poesia saudosista-nacionalista 
Grande parte da poesia saudosista-nacionalista de Fernando Pessoa está reunida em Mensagem. Nessa obra curta, composta de 44 poemas, predominam o "misti- cismo nacionalista" (fortalecido pelo contexto da crise republicana e da Renascença portuguesa) e a retomada do passado glorioso lusitano (a expansão maritima, o sebastianisrmo, as grandes figuras históricas). Muitos dos poemas que compõem a co-letânea apresentam tom épico, e alguns deles dialogam com Os lusiadas, de Camões. 
voltou para Lisboa. Com 
amigos como o poeta 
Mário de 5á-Carneiro eo 
pintor e escritor Almada 
Negreiros, impulsionouo 
Modernismo portugues. 
28 
"O mito é o nada que é tudo" 
Fernando Pessoa defendia que seu sebastianismo era "racional", ou seja, tinha consciência da "mentira" do mito. Seu sebastianismo consistia em proclamar o 
surgimento de um "Super-Camões" (ele mesmo?) e de um "homem forte" que 
fariam Portugal retomar sua importância econômica e política na Europa. 
GnvesTiGue em 
LiTeRATURA 
O que é o "Super- 
-Camões"? 
A coletânea Mensagem (1934) é dividida em três partes, duas que tratam da história 
de Portugal e uma terceira, que remete ao futuro. E desta última parte o poema a seguir. Grécia, Roma, a 
Cristandade e a Europa 
pós-renascentista 
seriam os outros quatro 
impérios, grandiosos por 
possuírem significativa 
força cultural e 
espiritual. O mito do 
"Quinto Império" foi 
assunto de História do 
futuro, obra de um dos 
expoentes do Barroco 
em lingua portuguesa, 
o padre Antônio Vieira. 
Leitura 
0 Quinto Império_ 
Triste de quem vive em casa, 
Contente com o seu lar, 
Sem que um sonho, no erguer 
[de asa, 
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar! 
E assim, passados os quatro
Tempos do ser que sonhou,
A terra será theatro 
Do dia claro, que no atro 
Da erma noite começou. Triste de quem é feliz! BiBLiOTeca 
CULTURaVive porque a vida dura. 
Nada na alma lhe diz Grecia, Roma, Cristandade, 
Europa os quatro se vão 
Para onde vae toda edade. 
Em seu disco Indivis-
Mais que a lição da raiz 
Ter por vida a sepultura. 
vel, José Miguel Wisnik
musicou um poema de 
Fernando Pessoa: "Tenho 
dó das estrelas". Ouça 
a canção em: <http:// 
zemiguelwisnik.band 
camp.com/album/--2>. 
Quem vem viver a verdade 
Que morreu D. Sebastião? Eras sobre eras se somem 
No tempo que em eras vêm. 
Ser descontenteé ser homem. 
Que as forças cegas se domem 
Pela visão que a alma tem! 
Atro: escuro. 
PESSOA, Fernando. O Quinto Império. In: GALHOz, Maria Aliete (Org). 
Fernando Pessoa: obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1999. p. 84-85. Erma: solitária, deserta. 
PensanDe soSRe TexToRTOIA. 
Reúna-se com seus colegas e, com o auxilio do professor, discutam a afirmação 
a seguir, a partir da análise geral do poema. 
A leitura do poema "O Quinto Império" nos permite interpretá-lo de duas 
maneiras: no âmbito individual, humano, desvinculado do objetivo geral de 
Mensageme do contexto histórico português, e no âmbito histórico, coletivo, 
relacionado ao objetivo geral da coletânea e do contexto português da época 
de Fernando Pessoa. 
Bi8LiOTeca 
GULTURat 
A Biblioteca Nacional 
de Portugal digitalizou 
Os manuscritos de Pes- 
soa e disponibilizou-os 
on-line: <http://purl. 
pt/1000/1/>. 
Que atitudes o eu lírico identifica como "Ter por vida a sepultura"? 
Que desafio ele lança ao povo português? 
29 
Poesia lírica 
A poesia lirica de Fernando Pessoa está reunida nas obras póstumas Quadras ao 
gosto popular e Cancioneiro (titulo que remete às coletâneas de poemas medievais) 
Por meio dela, o poeta resgata ritmos e formas tradicionais do lirismo lusitano. 
Perpassa o Cancioneiro um principio poético segundo 
o qual um poema deve 
representar, simultaneamente, "paisagens interiores" (mundo interior) e "paisagens 
exteriores" (mundo real, concreto) do sujeito lírico, pois cada sensação vivida pelo 
homem é constituída de uma série de "sensações mescladas", e não isoladas. 
Leitura 
Pobre velha música 
Com que ånsia tão raiva 
Quero aquele outrora! 
E eu era feliz? Não sei: 
Pobre velha música! 
Não sei por que agrado, 
Enche-se de lágrimas 
Meu olhar parado. Fui-o outrora agora. 
Recordo outro ouvir-te, 
Não sei se te ouvi 
PESSOA, Fernando. Pobre velha música. 
In: GALHOz, Maria Aliete (Org.). 
Fernando Pessoa: obra poética. 
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1999. p. 140-141. 
Nessa minha infåncia 
Que me lembra em ti. 
Pensanpe soBRe TexTo ilL. 
Como você já sabe, forma e conteúdo são componentes que caminham juntos 
na construção de sentido de um poema. 
a) Do ponto de vista da métrica, que tipo de versos há em "Pobre velha música"? 
b) Agora, relacione a forma à referência que o eu lirico faz, logo no primeiro 
verso, à "velha música".
2O que a música evoca no eu lirico e que constitui o tema central do poema? 
Analise dois versos bastante conhecidos da poesia lirica de Pessoa, em que o poeta 
cria um efeito baseado no contraste entre presente e passado, felicidade e infeli-
cidade. (Entre colchetes estão inseridos os elementos suprimidos pelo poeta.) 
"E eu era feliz? Não sei: 
eu Fui-o feliz| outrora [na infância agora [hoje]." 
FaLa a 
No poema"Pobre velha música", há uma representação simultânea da "paisagem 
interior" (rememoração da infáncia) e da "exterior" (audição de uma música "pobre" 
e "velha"). Você acha que a música tem o poder de reviver passagens da vida e de 
transformá-las? Que música traz sua infância de volta e a faz parecer mágica e feliz? 
30 
Um poeta múltiplo 
Retome o que você sabe sobre Romeu eJulieta. Habitam essa peça inglesa, além dos 
protagonistas, os Capuleto (pais de Julieta), os Montecchio (pais de Romeu), Teobaldo
(primo de Julieta), a Ama (confidente de Julieta), Frei Lourenço, etc. Agora imagine que 
cada um desses seres ficcionais represente uma das facetas do autor, William Shakes- 
peare, e pudessem escrever sua própria vers�o de RomeueJulieta. Como seria a versão 
de cada um? Certamente, haveria vários pontos de vista, estilos de escrita diversos e 
uso de gêneros diterentes para contar a famosa história de amor do casal de Verona. 
Fernando Pessoa exercitou essa possibilidade com a criação de seus heterônimos. 
Como você viu, o poema que abre este capitulo, embora tenha sido escrito por 
Fernando Pessoa, leva a assinatura de Álvaro de Campos, que não é simplesmente 
um pseudônimo usado por Pessoa para ocultar a autoria de seus textos, mas um 
Segundo Antônio José Saraivae 
Oscar Lopes, "os heterônimos são, 
pode dizer-se, uma invenção nova na 
lirica europeia, embora já inerente 
à tradição dramática. Podemos 
talvez compreendê-los supondo 
que cada heterönimo corresponde 
ao ciclo de uma atitude de aparência 
implausivel, mas experimentada até 
às últimas consequëncias .;cada
heterônimo parece apostado em 
invalidar uma tese consagrada-e 
acaba por também se invalidar (em 
teoria) como antítese". In: SARAIVA, 
António José; LOPES, Oscar. História 
da literatura portuguesa. 17. ed. 
Lisboa: Porto Editora, s.d., P. 997 
Fragmento) 
Nome fictício adotado 
por quem não quer revelar
sua verdadeira identidade. 
heterônimo. 
Fernando Pessoa inventou personalidades dotadas de nomes, biografias, indi-
vidualidades, estilos e caracteristicas fisicas próprias. Esses heterônimos não são 
personagens, ja que também se expressam artisticamente escrevendo poemas, 
assim como seu criador (ortônimo). 
Multiplicando-se em vários, o poeta português mergulha numa apreensão mais 
complexa da realidade, pois se permite investigar diferentes pontos de vista sobre 
o mundo, em lugar de apenas um. 
Entre os mais de setenta nomes, Pessoa desenvolveu completamente apenas 
três: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Você vai conhecer alguns 
aspectos da poesia desses heterônimos. 
invesTiGUe em 
.LiTeRATURa 
Que autores compu- 
nham a biblioteca cultu- 
ral de Pessoa? 
Alberto Caeiro: o mestre do ver e ouvir 
Leitura 
O guardador de rebanhos IX 
Sou um guardador de rebanhos 
O rebanho é os meus pensamentos 
E os meus pensamentos são todos sensações. 
Penso com os olhos e com os ouvidos 
E com as mãos e os pés 
E com o nariz e a boca. 
Pensar uma flor é v�-la e cheirá-la 
E comer um fruto ésaber-lhe o sentido. 
Por isso quando num dia de calor 
Me sinto triste de gozá-lo tanto, 
E me deito ao comprido na erva, 
E fecho os olhos quentes, 
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade, 
Sei a verdade e sou feliz. Desenho de Alberto 
Caeiro por Almada 
Negreiros. 1958. CAEIRO, Alberto. O guardador de rebanhos. In: GALHOZ, Maria Aliete (Org). 
Fernando Pessoa: obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1999. p. 212-213 
31 
PensanDe sosRe TexTO 
ElLAK.. 
O eu lirico do poema expõe 
uma determinada concepção 
de realidade e de 
verdade. Atente 
para o percurso 
claro, simples e lógico presente 
no texto: primeiro o sujeito poético 
se apresenta 
(ele é um homem do campo, que 
tem como função guardar rebanhos); depois, 
explica o que 
são seus pensamentose 
dá exemplos. Infira: o que seriam 
realidade e verdade para 
o eu lírico? 
Como você pôde constatar, Alberto 
Caeiro tem como principio de 
vida a simplicidade e a 
valorização do contato (físico) com a 
natureza. Esse heterônimo supervaloriza 
a sensação, pois 
entende que o conhecimento 
do mundo é dado pelos órgãos dos 
sentidos e não por sistemas 
de pensamento já constituidos, como as 
teorias filosóficas ou 
cientificas ou, ainda, as religiões. 
Caeiro deseja abolir o pensar, substituindo-o pelo 
ver e pelo ouvir. O poeta prefere 
o verso livree 
branco e vale-se de uma linguagem simples, 
condizente coma expressão de um 
homem do campo. 
Ricardo Reis: o clássico 
Leitura 
Não só quem nos odeia ou 
nos inveja 
Dos píncaros sem nada. 
Quem quer pouco, tem tudo; quem quer 
nada 
Elivre; quem não tem, e não deseja, 
Homem, éigual aos deuses. 
Não só quem nos odeia ou nos inveja 
Nos limita e oprime; quem nos ama 
Não menos nos limita. 
Que os deuses me concedam que, despido 
De afetos, tenha a fria liberdade 
REIS, Ricardo. Não só quem nos odeia ou nos inveja. 
In: GALH0Z, 
Maria Aliete (Org.). Fernando Pessoa: obra poética. Rio de 
Janeiro: Nova Aguilar, 1999. p. 285.
Pincaros: pontos mais 
elevados; cumes. 
PensanDe seBRe TexTO neiill. 
Nesse poema, o que o eu lirico pede aos deuses? 
FaLa ai 
Ricardo Reis cultuao paganismo greco-latino (os deuses da mitologia) e valoriza 
a forma, pois acredita que um pensamento claro-como o que ele almeja- deve 
ser traduzido por uma forma correspondente, isto é, cuidadosa. 
Outro princípio clássico defendido por Reis é a valorização do momento presente 
(carpe diem). Para ele, são tão condenáveis os que olham para o passado vendo "'o que 
não veem" quanto aqueles que se apegam ao futuro, "vendoo que näão se pode ver". Por 
isso, argumenta ele, o hormem precisa se apegar à "interminável hora", que é o presente.
No poema, o eu lirico 
coloca no mesmo pata 
mar o ódio, a inveja eo 
amor como sentimen 
tos que aprisionamo
homem. Você concorda 
com essa visão? Explique. 
Álvaro de Campos: o engenheiro 
invesTiGve em 
.LiTeRATURA Os versos que você analisouna abertura deste capitulo, retirados de "Ode triunfal", 
apresentam, por si, um dos aspectos mais importantes da poesia de Alvaro de Cam- 
pos: a exaltação do Futurismo. Mas é também desse contato com a vida frenética da 
cidade grande que decorrem outras facetas de sua poesia: sensação de inadaptação 
diante do mundo, sensacionismo ("Sentir tudo de todas as maneiras"), melancolia,
agressividade, pessimismo, frustração e uma quase obsessão do poeta pela construção 
de longos versos livres e brancos (Campos considerava a métrica e a rima "gaiolas") 
Que dados biográficoS 
dos heterônimos sao 
revelados na carta que 
Pessoa enviou a Adol 
fo Casais Monteiro em 
1937? 
32 
Afividade TeXtos em CONVersa 
Apresentamos, a seguir, dois textos. O primeiro é um poema de Alvaro de Campos; 
o segundo, a letra da canção "O vencedor", que faz parte do álbum Ventura (2003), da banda carioca Los Hermanos. 
Bi8LiOTeca 
CULTURaL 
Em relaç�o ao texto 1, faça, primeiramente, uma leitura silenciosa, observando a 
sinceridade contida nos versos. Depois, divida-o em partes, distribua-as entre seus 
colegas e leiam o poema em voz alta. Procurem imprimir à leitura os sentimentos necessários para reforçar o sentido dos versos. 
Assista a um episódio 
do programa Provocações 
sobre Fernando Pessoa e 
sobre Portugal: <http:// 
tvcultura.cmais.com. 
Texto 1 
br/provocacoes/progra 
ma-046-com-antonio- 
-abujamra-em-portu 
gal-0107-2001-galeria>, Poema em linha reta 
Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. 
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, 
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, 
Indesculpavelmente sujo, 
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, 
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, 
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, 
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante, 
Que tenho sofrido enxovalhos e calado, 
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; 
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel, 
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes, 
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar, 
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco; 
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
M 
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo 
Nunca teve um ato ridiículo, nunca sofreu enxovalho, 
Nunca foi senão príncipe- todos eles príncipes na vida..
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse n�o um pecado, mas uma infâmia; 
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! 
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam. 
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? 
O príncipes, meus irm�os, 
Vil: desprezível. 
Arre, estou farto de semideuses 
Onde é que há gente no mundo?
Enxovalhos: afrontas. 
Infâmia: ato vergonhoso. 
Cobardia: covardia. 
Então sou só eu que é vile errône0 nesta terra? 
Oiço: ouço.
33 
Poderão as mulheres não os terem amado, 
Podem ter sido traídos- mas ridículos nunca! 
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído, 
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear? 
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil, 
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza. 
CAMPOS, Álvaro de. Poema em linha reta. In: GALHOZ, Maria Aliete (Org). 
Fernando Pessoa: obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1999. p. 418-419. Titubear: vacilar. 
1O poema todo é construido a partir da oposição entre o eu (lirico) e os outros. 
Explique essa afirmativa. 
2 Explique a estratégia usada pelo eu lirico para reconhecer e reforçar sua "vileza". 
3 Relacionando os versos "Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mun- 
do."/ "Então sou só eu que évil e errôneo nesta terra?", o que podemos inferir 
sobre os sentimentos do eu lirico? 
4Que ironia está implicita no "Poema em linha reta"? 
Texto 2 
O vencedor 
Olha lá quem vem do lado oposto 
e vem sem gosto de viver 
Olha lá, que os bravos são escravos 
sãos e salvos de sofrer 
Olha lá quem acha que perder 
é ser menor na vida 
Olha lá quem sempre quer vitória 
e perde a glória de chorar 
Não faz isso, amigo 
J se sabe que você 
só procura abrigo 
mas não deixa ninguém ver 
Por que será? 
A FARUELO, Jorge. Batgirl 
chorando. 2013. Acrilico sobre 
tela,113 x 73 cm. Faruelo admite 
a possibilidade do fracasso 
nos super-heróis que retrata. 
Eu que já não quero mais ser um vencedor, 
levo a vida devagar pra não faltar amor 
Eu que já n�o sou assim 
muito de ganhar 
junto às mãos ao meu redor 
Faço o melhor que sou capaz
só pra viver em paz. 
Olha você e diz que n�o 
vive a esconder o coração 
CAMELO, Marcelo. O vencedor. In: LOS HERMANOs. Ventura. 
Sony Music, 2003. 1 CD. Faixa 2. Disponível em: <http://www2.uol.com.br/ 
loshermanos/ventura/letras/ventural.htm>. Acesso em: 6 mar. 2016. 
BiBLiOTeca 
CULTURaL 5Na letra da canção, o compositor subverte a ideia de que o vencedor tem sempre 
as coisas mais preciosas da vida. Você concorda com essa análise? Justifique 
sua resposta. 
Acesse o site da banda 
Los Herman os: <www2. 
Sob que aspectos é possivel relacionar a canção contemporânea da banda Los 
Hermanos ao "Poema em linha reta", de Álvaro de Campos?
uol.com.br/losherma
nos/>.
34 
EXpressoes 
Nesta unidade, por meio do estudo da literatura de Fernando Pessoa, você teve acesso 
não a um poeta, mas a quatro. Agora, terá a oportunidade de expressar-se artisticamente 
O poema a seguir foi escrito pelo paulista José Paulo Paes (1926-1998). Leia-o. 
Falso diálogo entre Pessoa e Caeiro 
Pessoa: A chuva me deixa triste.. 
Caeiro: A mim me deixa molhado. 
Prosas, seguidas de odes minimas.
São Paulo: Companhia das Letras, 1992. 
Certa vez, Fernando Pessoa afirmou que era, na verdade, um dramaturgo. Observe
como José Paulo Paes entra no universo teatral do poeta, imaginando um diálogo entre 
o português (poeta saudosista, melancólico, confessional) e Alberto Caeiro (heterônimo 
guiado pelos sentidos e pelo contato direto com a natureza). Agora, você também deverá 
entrar no jogo pessoano e propor diálogos entre o ortônimo e um heterônimo ou entre 
os heterônimos. Para isso, oriente-se pelos passos a seguir
Escolha quem participará de seu diálogo (Pessoa, Caeiro, Reis, Campos). 
Retome o capítulo 2 e atente para as caracteristicas do poeta que você escolheu 
Imagine que diálogo os poetas poderiam estabelecer (construa falas coerentes com 
a postura do poeta escolhido). 
Faça um rascunho de seu diálogo e troque-o com um colega. 
Leia o diálogo escrito por seu colega, sugerindo ajustes, quando necessário. Observe 
a coerência entre o que os poetas falam e a postura deles em suas obras, além da 
ortografia e da coesão. 
Escreva em um papel
seu "falso diálogo e 
publique-o no mural da 
escola ou crie um blog 
para a divulgação dos 
trabalhos. 
Se possivel, ilustre seu 
texto, desenhando os 
poetas que foram perso-
nagens do diálogo criado 
por você. 
NEGREIROs, Almada. 
Retrato de Fernando Pessoa. 
1954. Oleo sobre tela,
201x 201 cm. 
35

Continue navegando