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COLETÂNEA CARTAS DE AMOR - completa - Junho 2006

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Setor de Formação Nacional – MST 
Julho 2007. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
01 – À organização 
02 – Noite companheira 
03 – Ao destino 
04 – A flor e o militante 
05 – À imagem 
06 – Aos dentes 
07 – Á cooperação 
08 – Ao suor 
09 – Aos sonhos 
10 - À terra 
11- A democracia 
12 - Ao tempo 
13 - Ao perfume 
14- À solidariedade 
15 - Para sermos iguais 
16 - Ao Socialismo 
17 - O nosso Afeganistão. 
18 - A Cuba 
19 - Ao Che 
20 - Ás verdades já aprendidas 
21 – Ao Natal na Reforma Agrária 
22 – À poesia sertaneja 
23 – Ao ano novo 
24 - Às palavras 
25 – Às ilusões 
26 - Ao Josué de Castro 
27 - À Mulher 
28 – À Palestina 
29 - Ao mês de Abril 
30 – Às Sementes 
31 – Á Utopia 
32 - À Verdade 
33 – A Ética e a Moral 
34 – Aos filhos da Guerra Fria 
35 – Ás vítimas da ALCA 
36 - Ao passarinho do sertão 
37 – À Juventude 
38 – Às Eleições 
39 – Aos que educam 
40 – Ao Estudo 
41 – Ao José Gomes 
42 – Às Crianças Palestinas 
43 – Ao Presidente 
44 – Ao ano do alimento 
45 - Aos despejados 
46 – Ao Jornal Brasil de Fato 
47 - Pela Paz 
48 – À indignação 
49 – Às vítimas das Drogas 
50 - Aos que resistem 
51 – Às vítimas da liberdade 
52 – À autodeterminação 
53 – À felicidade 
54 – À beira da estrada 
 
 
 
 
55 - Ao aniversário 
56 – Aos festejos juninos 
57 – Ao Boné do MST 
58 – À cordialidade 
59 – Ao Estado de Direito 
60 – À Consciência 
61 – À Organicidade 
62 – A quem lavra 
63 - Ao Ânimo 
64 – À irreverência 
65 – Aos Pais sem terra 
66 – À Pátria 
67 – Ao dia da Árvore 
68 – À Obediência 
69 – À Primavera 
70 – Às vítimas de injustiças 
71 – Às semelhanças 
72 – Aos Presos da Terra 
73 - À Soberania 
74 – Ao Senso Moral 
75 – À Biodiversidade 
76 – Ao direito de existir 
77 – A quem serve 
78 – Às crianças brasileiras 
79 – Ao Livro 
80 – Aos Finados 
81 – Às condolências 
82 – A Palmares de Zumbi 
83 – Aos 20 Anos 
84 – À alegria 
85 – À Ética órfã da Política 
86 – Ao Oito de Março 
87 – Aos críticos 
88 – Ao óbvio 
89 – Aos desatentos 
90 – Às Famílias Sem Terra 
91 - À herança 
92 – Ao Dia do Livro 
93 - Às cores 
94 – Ao desrespeito 
95 - À Militância 
96 – À Educação 
97 – Ao cultivo da Base 
98 – À Justiça 
99 – Á Política 
100 – À Devolução 
101 – Aos Dilemas da Humanidade 
102 – Aos Partidos Políticos 
103 – Às Sesmarias 
104 – À Olga 
105 – Ao Trabalho Voluntário 
106 – Às Eleições 
107 – Às Escolas 
108 – Ao Marighella 
109 – A quem constrói 
 
 
 
110 – Ao Jequitinhonha 
111 – Às Vitórias 
112 - À Formação 
113 – À Mística 
114 – Às Marchas 
115 – Às lutas 
116 – À Sutileza 
117 – Às Jornadas 
118 – À Agroecologia 
119 – Aos que Marcharam 
120 – Ao Futuro 
121 – Ao Comportamento 
122 – À Salvação da Alma 
123 – Às Mensalidades 
124 – À Franqueza 
125 – À Generosidade 
126 – À Firmeza das Idéias 
127 – Ao Calcanhar de Aquiles 
128 – Ao Termo Inteiro 
129 – Às Causas e os Efeitos 
130 – Aos Provérbios Populares 
131 – Às Décadas 
132 – Às Jornadas Socialistas 
133 – À Pátria de Caveiras 
134 – Às Bandeiras 
135 – A Nós 
136 – A Grande Política 
137 – À Confiança 
138 – Ao Desarmamento 
139 – Ao Rio São Francisco 
140 – Ao Reconhecimento 
141 – Aos Desaparecidos 
142 – Aos amigos e amigas do MST 
143 – Ao Fogo 
144 – Às Afrontas 
145 – Ao Combate 
146 – Ao Papai Noel 
147 – À Imaginação 
148 – Ao Ano Novo 
149 – À Continuidade 
150 – Aos Desejos 
151 – À Dor 
152 – À Reflexão 
153- À Paixão 
154 – Às Seqüências 
155 – Ao Carnaval 
156 – À Revitalização 
157 – Aos Imortais 
158 – Às Inocentes 
159 – Ao Êxito 
160 – À Existência 
161 – A quem Zela 
162 – Às mudas 
163 – Ao Viver 
164 - Ao 1º de Maio 
 
 
 
 
165 - À Tecnologia 
166 – Aos Sem Lugar 
167 – Aos Filhos Da Barbárie 
168 – Às Modas e os Modelos 
169 – Aos Dias Normais 
170 – À Dialética do Futebol 
171 – À Cultura Popular 
172 – À Legítima Defesa 
173 – Às Viagens 
174 – Às Sementes Humanas 
175 – Ao Gênero 
176 – Ao Saber Popular 
177 – À Espera 
178 – Aos lados 
179 – À Ironia 
180 – Ao Aprendizado 
181 – Aos Eleitores 
182 – Às Crianças Sonhadoras 
183 – Aos Movimentos Sociais 
184 – Ao Arrependimento 
185 – Aos Tempos Imortais 
186 – Aos Enigmas 
187 – À Esperança 
188 – Ao Pensar 
189 – À Atualidade 
190 – À Conjuntura 
191 – Ao Ascenso 
192 – Ao criador 
193 – Ao Projeto 
194 - Feliz Ano Novo 
195 – Ao Estorvo 
196 – Aos Ancestrais 
197 – Ao Luto 
198 – À Poesia 
199 – Às mães camponesas 
200 – Ao Congresso 
201 – Aos Olhares 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de amor 
 Nº 01 
 
 À ORGANIZAÇÃO 
 
 
 Corre o tempo mansamente, como as águas dos riachos, a procura do que o destino lhes 
prometeu: desafiar o infinito para ser eterno. 
 O tempo vive a contradição de ser velho e novo ao mesmo tempo. Quando uma saudade o 
torna saudosista, surge uma vontade de fazer algo que ainda não existe, e, como criança, engatinha 
em busca das condições de provocar a nova travessura. Iniciar mais um passo, pela corcunda da 
velha história. 
 Uma organização também tem os seus tempos: velhos e novos. Desliza sobre eles pelas 
colunas de gente, como se fossem trilhos, que levam os vagões da história, carregados de saudades 
e sonhos. 
 O caminho feito precisa ser cuidado, para que as fezes do inimigo não venham tirar o 
perfume das flores já floridas. A história tem esta preciosidade, de guardar oxigênio, escondido nos 
pulmões das gerações que nascem, com pena e saudade das que já foram. 
 Os corpos são canais que se encostam para deixar passar o sangue e os sonhos produzidos. 
Os que se enterram, formam o canal já pronto; os que se movem, cavam ainda o lugar onde se 
deitarão para envelhecer. Envelhecer é ficar parado. Novo é o que se realiza. 
 Orgulhosa é a história. Tem o cuidado de não se repetir, pelo simples fato de que não pode 
voltar atrás. Voltar significa pisar sobre o próprio corpo. Por isso segue em frente. A cada dia 
aparece com um novo vestido. Mais triste, quando seus filhos não pensam nada novo. Mais florido, 
quando os sonhos se transformam em passos e desafiam todos os limites. 
 Quando pára, uma organização envelhece. Quando a poesia não se transforma em canto, 
quando a vitória não se transforma em pranto. 
 Quando repete e pisa o próprio peito, tentando caminhar o passo feito. Anda para trás; 
quando os pulmões não sentem os aromas das manhãs. 
 Se as gerações de quadros não se multiplicam, são pedaços do canal não feito que para trás 
ficam; por onde vazará a energia, perdida, que tira da organização a própria vida. 
 Quando as relações entre as pessoas não evoluíram, as mulheres ainda têm o seu senhor, é 
sinal que o coração bate, mas já não tem amor. 
 Onde o jovem no campo em tenra idade, diverte-se atraído pelas luzes da cidade. E a criança 
cansada já de andar, ainda não aprendeu a soletrar, a palavra liberdade. 
 Se o veneno é jogado sobre a terra, é porque foi declarada a guerra, contra inimigos 
“inferiores”, que nada podem, a não ser, ajudar os humanos a desenvolver valores. 
 Quando a teoria se torna escassa, é porque apenas se percebe a força que vem da massa; mas 
se a força tem pouca consistência, falta aí um bocado de ciência. 
 Se as instâncias já não são tão ativas, se tornaram pouco representativas e correm o risco de 
andar a esmo é preciso incentivar, todos a participar, e cada um representar-se a si mesmo. 
 Cada passo em cada tempo. Criar um pouco por dia. Avançar com humildade. Banhar-se de 
rebeldia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de amor 
 Nº 02 
 NOITE COMPANHEIRA 
 
Há como tradição em nossa cultura, de usar o preto como sinal de luto e respeito pelos que 
já foram se plantar, na terra conquistada e, preparar naeternidade o lugar para nós que ainda aqui 
penamos. 
 Mas o vermelho é a cor dos lutadores! Ele deve simbolizar como no nascimento, o sangue 
que traz à vida, este acontecimento. E o que é a morte senão um novo renascer? A não ser que este 
que se vai, viveu apenas a vida do corpo, por isso, apenas devolve à terra o que dela recebeu. 
 O preto da noite nada tem de tristeza! Como uma barraca de lona preta armada, nos faz 
nascer para um novo dia cheio de luzes, repleto de belezas. 
 É isso que diz nossa bandeira. Em suas cores predomina o vermelho que acalora, mas tem lá 
o preto, porque a noite não quis ficar de fora. 
 Um Sem Terra é filho da noite que os caminhões transportam em busca do amanhecer. O 
ronco que causa medo também anuncia a liberdade, mostrando que o balançar é parte deste jeito 
novo de nascer. 
 Caminhos estreitos não diminuem as distâncias, porque a hora é a barra do dia. Se correr 
demais, tem que parar, se atrasar um pouco, precisa andar mais ligeiro, a hora de nascer não espera 
por ninguém, porque ninguém segura do nascer a rebeldia. 
 É bom viajar à noite, cada coisa quer ficar perto da gente para não se perder. Ao mesmo 
tempo em que tememos; nos escondemos. É o jeito de saber acontecer. 
 Dizem que à noite, “todos os gatos são pardos”, ninguém se diferencia quando carrega os 
fardos. Seguimos alinhados na longa penitência, mas quem faz a estrada não é a força, mas sim a 
persistência. 
 E o preto da noite se mistura ao carvão das fogueiras, ao bramido das lonas estiradas, às 
letras da bandeira. Também alcança o fundo das panelas que, envergonhadas, já não vão às 
prateleiras. 
 A fumaça das lenhas encharcadas, quando teimam em não queimar, sai preta. As roçadas 
aceradas ficam escuras, a espera do plantar que irá abraçar a colheita. 
 O feijão preto, o caldo fresco, o pão queimado. Tudo se combina. A cor dos olhos que 
descobre a terra por debaixo da neblina. 
 O Assum Preto tem o canto mais lindo e sertanejo. No temporal que engole sem dó cada 
lampejo. E nos olhos que se fecham, para provar o calor de cada beijo. 
 A semente germina em cada cova, aberta em plena luz, tapada se escurece. Para lembrar do 
tempo; fecham-se os olhos para que a escuridão revele em plena prece; o que diz o coração que bate 
em sua caixa escura e assim se aquece. 
 Enfim, o escuro da noite, na bandeira vira cor, não é dor, não é pranto ou sentimento. É 
apenas um jeito diferente de dizer, que um Sem Terra precisa pra nascer, um abraço apertado vindo 
do firmamento. 
 Noite, amiga e companheira, quantos latifúndios já dobrastes sob os pés descalços deste 
heróico povo? Fazei de nós eternos caminhantes, para que, em um tempo, não tão distante, 
possamos ver de suas entranhas, nascer também um mundo novo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de amor 
 Nº 03 
 
 AO DESTINO 
 
 Aprendemos na filosofia que, “A história não é se não a luta do ser humano para alcançar 
seus objetivos”. Sendo assim, deveríamos entender que, nos movemos em torno de sonhos 
individuais e coletivos que estabelecemos. 
 Somos então, se quisermos, responsáveis pelo nosso destino, ou pelo que podemos ser no 
futuro. 
 Laio, antigo senhor de Tebas, soube pelo oráculo que seu filho Édipo recém nascido, 
haveria um dia de assassiná-lo, e, se casaria em seguida com a própria mãe. Antecipa-se ao destino 
e manda matar o próprio filho. Mas suas ordens não são cumpridas e o menino abandonado, 
crescerá com outra família em um lugar distante. 
 Um dia ao consultar o oráculo, Édipo, toma conhecimento do destino que lhe fora 
reservado, e para não matar o suposto pai que o criou, foge de casa. No caminho encontra um 
desconhecido, desentende-se com ele e o mata, sem saber que é Laio, seu pai verdadeiro. Foge para 
a cidade de Tebas e encontra Jocasta, viúva de Laio. Ignorando ser sua mãe verdadeira, casa-se 
com ela e assim se cumpre a ordem do destino. 
 Esta história poderia ter outro final, se Laio tivesse assumido e resolvido o problema de 
outra forma, ficando junto ao filho e estabelecido um novo objetivo a ser alcançado com ele para 
mudar o próprio destino. 
 Existem muitas coisas a nosso redor que, fingimos não ser conosco, ou tentamos nos livrar 
das responsabilidades como fez Laio com Édipo, mas como tal, um dia as conseqüências cairão 
sobre nós mesmos ou sobre as futuras gerações. 
 Tomemos como exemplo a destruição da natureza. Há dezenas de anos vêm-se derrubando 
árvores, aplicando-se inseticidas, adubos químicos, provocando erosão, e tantos outros males. 
Lentamente secam os rios, extinguem-se os pássaros e insetos, não chove mais regularmente, 
reproduzem-se com maior facilidade as formigas e os cupins, e cada vez fica mais difícil produzir e 
permanecer na agricultura. 
Se há 100 anos atrás, alguém escrevesse: chegará o dia em que o filho, Ignorante, matará a 
própria mãe, casará com a Fome sua irmã; terão muitos filhos, magros, doentes e analfabetos. 
Morrerão de calor, de sede, sem comida e envenenados. Quem acreditaria? 
 Novamente o destino apresentaria duas alternativas: matar o filho logo ao nascesse ou 
educá-lo para que soubesse medir as conseqüências de seus atos, colocando em sua consciência, 
valores como objetivos a serem alcançados. 
 Nossos descendentes daqui há muitos anos, poderão contar outra história, se agirmos 
diferente. Dirão eles: Houve um Movimento que decidiu imitar o criador. Ao mesmo tempo em que 
fazia nascer as criancinhas, as educava para que conhecessem e respeitassem os pais, os irmãos e a 
natureza. 
 Preparava jardins, reconstruía as florestas, fazia renascer os rios através do plantio de 
árvores em suas margens, não usava venenos nem adubos químicos e respeitava todas as espécies 
de vida, pois sabia que nenhuma era menos importante que a vida humana. 
 Tinha claro que sua tarefa era preparar o ambiente onde viveriam as futuras gerações, 
tornando-as arquitetas de seus próprios sonhos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 04 
 
 A FLOR E O MILITANTE 
 
 As plantas forjam sua descendência, preparando com paciência o botão, depois a flor, de 
onde saem as sementes e se espalham como gente. 
 Presa ao galho a flor serve às abelhas, que procuram através de seu quartel a matéria para 
fazer o mel; por isso se deixa penetrar, sem medo de se machucar. 
 Saciadas, as abelhas vão embora. Levam a doçura repartida para manter a vida da colméia. 
Voltam noutro dia para completar a ceia. 
 A flor em seu balanço fica para cumprir o destino sem descanso: perfumar o ambiente e 
fazer no silêncio aparecer cada semente. Bela missão é essa de servir: exalar perfume e produzir. 
O militante não é a abelha que vai de flor em flor, mas a própria flor que atrai para si a 
responsabilidade, de responder a cada uma com doçura e verdade que, lutar e vencer é saber 
perfumar de amor à humanidade. Envolver cada pessoa num grande abraço e, depois, andar juntos 
os outros passos. 
 Para avisar as abelhas, a flor, usa o perfume e sua cor; sinais que orientam também o lutador. 
 Passado os dias a flor madura e satisfeita, deixa murchar as pétalas de seu brilho, para fazer 
nascer de si os próprios filhos. E como uma caverna que abre suas portas, deixa sair contentes as 
sementes que transparecem mortas. 
 Mas é engano. A semente quer o tempo de germinação para, em silêncio levantar-se 
lentamente do chão; imitar a sua espécie com as cores; crescer e também se encher de flores. 
 A planta da semente busca entrar por cada fresta, puxada pelo sol, ajuda a construir e a 
expandir a floresta. 
 Militantes: mulheres e homens em cada ação fazem-se a si próprios e a organização. Tem 
ela o jeito de seus passos, o carinho de seus gestos e a acolhida de seusbraços. Confundem-se em 
suas identidades, que ao não poder vê-los a sociedade, procura seu perfume em cada marca de 
saudade. 
 Militante, é aquele que se comporta como a flor exuberante, não como as estrelas que 
brilham mas estão muito distantes. Flor é como gente, nasce em toda parte, e por saber o seu lugar, 
transforma-se em semente. Estrela não! Nasce uma vez só e vive de seu brilho, sem nunca poder 
dizer que teve um filho. 
 A flor perfuma o jardim e a mesa do auditório. Murcha de pressa na sala do escritório. Se 
não houver cuidado, o ar ali ventila mais pesado e a flor perde o encanto e a alegria. Como o 
perfume é um tanto destemido, quer espaço para circular e se livrar da poeira da burocracia. 
 As flores se multiplicam com o vento. Por que não crescem em quantidade nos 
acampamentos e assentamentos? Será por causa da fumaça ou por que o brilho das estrelas inibe o 
seu crescimento? 
 É no formar da flor que com a militância se encontra a semelhança. Quanto mais flor, mais 
perfume, mais semente. Quanto mais gente, mais força e mais esperança. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 05 
 À IMAGEM 
 
 Narciso, um menino na antiga Grécia, nasceu muito bonito. Cresceu sendo admirado por 
todos, principalmente pelas mulheres; mas ele não sabia e não ligava para isso. 
Seus pais guardavam o segredo e temiam pelo futuro do rapaz. Ao consultar o oráculo, uma 
espécie de “consulta aos deuses”, o sacerdote lhes dissera que ele teria vida longa e feliz, desde que 
nunca visse sua própria imagem. 
 Um dia seus pais se descuidaram e ele debruçou-se sobre um lago para beber água, viu sua 
imagem e apaixonou-se por ela. Não suportando a paixão, atirou-se na água para pegar a imagem e 
morreu. Compadecida, a deusa do amor o transformou numa bela flor, que ao florir, se debruça 
sobre as águas, para refletir e admirar a própria imagem. 
 Nascemos e crescemos também nós como Narciso. Já não podíamos nos apaixonar pela 
liberdade porque as cercas tapavam a face da terra bela, e, não conseguíamos ver nossa beleza 
refletida na beleza dela. 
Quem não vê a imagem de sua face refletida em outro alguém, não se apaixona nunca nem 
amará ninguém. 
 Vivemos muitos anos sem saber que a beleza e a força dos Sem Terra, somente eram vistas 
pelo temor da classe dominante. Estes evitavam que chegássemos perto das cercas para não 
acordarmos o latifúndio massacrante. 
 Um dia, porém, ao debruçar-nos sobre o lago do latifúndio, vimos nosso esqueleto refletido, 
como a rosa na pintura do vestido. Mergulhamos por entre os fios de arame farpados, levantamos 
barracos e bandeiras e, na canseira, morremos como seres explorados. Renascemos na história 
como seus construtores e sujeitos para formarmos com as faces rosadas, um jardim de um novo 
jeito. 
 Com a força de todas as raças nos reunimos, para formar uma só imagem feita com todas as 
cores. Resgatamos o que tinham tomado das gerações passadas: os sonhos e a auto-estima, e 
escrevemos em cada alma, um canto de amor à vida. 
 Descobrirmos a beleza contida em cada gesto de solidariedade. Percebemos que ela é a 
sinfonia nascida da ansiedade que, existe em todos os corpos, impulsiona a formação e sustenta a 
ousadia, de quem sonhou um dia, construir com as próprias mãos a liberdade. 
 Assim fizemos despertar a primavera nas consciências. Nascemos de passos firmes movidos 
com paciência. Descobrimos que é possível negar a imagem distorcida pela miséria e reconstruí-la 
com as cores, sons, perfumes e conhecimentos, sem mágoa, dor ou arrependimento. 
 Assim, nos igualamos à flor que desabrocha para deixar ver a sua beleza . Fechar-se é 
sufocar o perfume, inibir as cores e violentar a natureza. 
 Narcisos Sem Terra somos. Tossindo entre a fumaça no meio dos latifúndios ou na beira das 
estradas, como flores vermelhas já desabrochadas. 
 Ao balanço do vento resistimos. Mas um dia as pétalas cairão devagarinho. Não será o final, 
apenas um sinal para os que vierem, para que enxerguem o caminho. 
 A cada passo mais certeza nasce das entranhas do vencer. Como as flores de Narciso, 
gritamos aos quatro ventos: para renascer é preciso ter a coragem de morrer. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 06 
AOS DENTES 
 
 Quem já parou para pensar onde fica o lugar de cada dente? Sentimos falta ao sorrir quando 
deixam de existir, estes que deveriam estar bem na frente. 
 Se não sorrimos a boca fica pequena e a face carrancuda. Por isso é que precisamos ter 
cuidado, porque uma vez só podem ser trocados; a natureza só nos deu uma muda. 
 Quando nascemos o leite materno traz os dentes em separado, e nos entrega quando nos 
deitamos para mamar. A outra muda vem no “bolso”, que fica a nosso gosto o dia de se plantar. 
 Como uma roça que amadurece pouco a pouco, vamos colhendo e replantando cada um, até 
que um dia em uma avaliação, nos damos conta que, da velha geração dos dentes, já não sobrou 
nenhum. 
 Aí o fogo do açúcar desfila suas chamas e come o tronco esburacando o caule de cada 
arvorezinha, que aos poucos deixa de ser branquinha e, como um tição preto fumegante, dói 
entristecendo ainda mais a gente. 
Então o que fazer para aliviar a tal “queimura”?- pensa triste a pobre criatura, se debatendo 
segurando o toco. Vai enraivecido procurar socorro, quando alguém puxando o dente adoecido, 
enaltecido ali lhe deixa um grande oco. 
 Fica, portanto um vazio na fileira. Por que será que nasceram em carreiras, como soldados à 
espera do combate? Mas não tem jeito, assim é que foram feitos. 
 E lá se vai o desdentado levando um vazio em cada pelotão. Todos notam sua ausência, mas 
ninguém fala, pois, soldado lembra repressão! 
 A marcha segue em frente em seu destino, mas os lábios escondem algo clandestino, por não 
sorrir abertamente e bem feliz. 
 É que, como as florestas a golpes de machado se deitaram, os ricos sem vergonha 
desdentaram, grande parte dos pobres de meu país. 
 E os lábios tapando essa caverna, se contorcem toda vez que alguém palpita e, expõe em 
outra boca bonita, os danados enfileirados bem certinho. ‘Como fica bem você de dentes’, diz ele 
escondendo a janela um tanto envergonhado. ‘É pena que não são meus, são emprestados!’. 
 Quando sem dentes a gente não é nada, fugimos até de quem gosta de contar piadas, porque 
inevitavelmente teremos que sorrir. É um sacrifício ter que conversar, principalmente quando a 
prosa demorar, cansa o lábio superior para não deixar a boca abrir. 
 Mas, o sacrifício não é apenas ao lábio de cima! Morre com os dentes arrancados também a 
auto-estima, que cada qual com ela nasceu. 
Por isso, dente não é só dente, é mais! É aquilo que faz da gente um ser social altivo, 
sorridente e feliz. Sem eles também se derrota um gigante país. 
Que mais dizer aos militantes, que lutam e labutam na linha de frente? Pouco precisa dizer 
mais; preocupar-se com quem vem atrás, porque, nessa história há uma só verdade. Para se 
conquistar totalmente a liberdade, os lutadores precisam ter os dentes. 
Não é por nada não, (mais um aviso): é que um ser humano mesmo valente e bravo, somente 
deixará de ser escravo, quando puder soltar livre o sorriso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de amor 
 Nº 07 
 
A COOPERAÇÃO 
 
Vamos falar da morte como algo natural. Na vida e na morte da convivência social. 
 A princípio, só há morte de algo já formado, que com o tempo em outros elementos vai 
sendo transformado. 
 Até aqui nada de especial, pois a transformação concreta também é natural. Cada coisa vai 
crescendo em pleno movimento, como se em toda massa existisse um bom fermento. 
 Cresce então em quantidade, e quando alguém percebe e impõe seu jeito, aparece ali a 
qualidade. Isso ganha importância quando passa pelas mãos da militância.Assim podemos formular uma questão: é possível morrer em nós o espírito da cooperação? 
 Vejamos pela história, onde foi que ela apareceu? No inicio da formação humana quando 
um só macaco não podia carregar um cacho de bananas. Assim sustentavam em vários o peso sobre 
as pernas e levavam o alimento até as cavernas. 
 Mais adiante, a roda em movimento, fez do ofício profissão e os instrumentos passavam de 
mão em mão, até que um dia a máquina a vapor, engoliu um a um cada trabalhador. Sobraram os 
mais experientes, que foram levando a cooperação em frente. 
 Assim a história deu seu giro, as mudanças foram transformando-se em suspiros e 
alcançaram a informática e a genética. Os que não acompanharam, impressionados, ficaram com a 
sua aparência ainda mais patética. 
 Este veloz desenvolvimento chegou arrastando-se até a porta de nossos assentamentos. - O 
que quer? – perguntam os mais preocupados - Transformar cada Sem Terra em um cooperado? 
 Assim se tentou dar vida a algo que nasceu sobre a terra repartida. 
Porque morre então a cooperação, se é ela a principal força de produção? 
 O campo é diferente da cidade companheiro. Lá, para organizá-la basta ter um patrão “com 
bom” dinheiro. Na agricultura é diferente, para cooperação viver e ir em frente, deve nascer 
primeiro no coração da gente. 
 Ainda falta algo para esta tese ser verdade. No campo a cooperação deve ter germes de nova 
sociedade. Sobrevive, quando as pessoas aprendem a ser livres, firmes, como os pilares de uma 
comunidade. 
 Um pouco mais talvez ainda resta, é difícil diferenciar ao longe como na floresta, algo que 
pelo jeito não se diferencia. A árvore só pode ser diferente se aprender a espalhar sementes e fazê-
las nascer apesar da sombra fria. 
 Por isso cooperar entre os arames dos lotes é difícil como buscar água no deserto, no campo 
esta idéia só dá certo, quando se misturar trabalho com ideologia. Aí, cooperar, lutar e amar, 
rimarão nos versos da mesma poesia. 
 Para isso precisa formação. A consciência substitui o patrão. A força organizada constrói a 
utopia. Uma coisa apenas ainda falta, é manter a velocidade sempre alta, nas rodas que transportam 
a alegria. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de amor 
 Nº 08 
 
 AO SUOR 
 
 Quando o suor nasce da pele nua, anuncia que o trabalho e a luta continuam a moldar o 
corpo dos guerreiros. Mas é sinal também que sobre a terra, colocada como esteira, há espaço para o 
abraço da guerreira. 
 Os tempos ficam difíceis de viver, principalmente porque o suor deixa de verter. Fica no 
corpo procurando atalho, porque o capital elimina os postos de trabalho. 
 Sem trabalho os córregos não descem pelo couro e o ser humano deixa no país de ser o 
principal tesouro. 
 Fala-se em indigência quando o trabalho deixa de ser consciência e o ser social mendiga 
pelas ruas. Dorme estirado em pleno chão, mesmo no frio aparenta ser verão, deixando as costas e 
as pernas todas nuas. 
 Sem suar o corpo está na ociosidade, por ter saído do campo e migrado para a cidade. Ali, 
sem trabalho não há vida, não há renda, enquanto a terra adormece por debaixo das fazendas. 
 O retorno é inevitável para quem quer renascer. Se, é de terra que foi feito o homem e terra 
voltará a ser! Só há duas formas para isso poder acontecer: suar ou se deixar morrer. 
 Na terra conquistada o ser humano torna-se semente que rompe como o fogo o elo das 
correntes. A fome vai embora quando se tem algo para ocupar os dentes. 
 Quando os elos na terra conquistada não abrem de verdade, estão congelados sob o frio da 
propriedade, fazendo os lutadores, da terra, tornar-se proprietários e senhores. Esta friagem 
corrosiva mata toda a energia criativa e impede a prática de valores. 
 Não somente por falta de valores morrem as sementes, também das flores que não nascem 
livremente, no meio da terra conquistada, ressequida. Se apenas do egoísmo o suor brota, a 
liberdade ainda é tão remota, quanto a uva não plantada: nunca se tornará bebida. 
 O suor do retirante é frio. Parte silencioso como as águas do rio, que choram lambendo a 
raiz da castanheira. Passo a passo sem pressa de chegar, pois não tem tempo e nem lugar, onde 
depositar sua canseira. 
 Mas o suor que faz o passo faz também o militante. Caminha como a sombra se esgueirando 
entre as frestas retorcidas da utopia. Sabe que no lombo desnudo das montanhas, descansa o 
despertar de um novo dia. 
 O parasita não sua, porque bebe o suor do condutor que com ardor a causa então provoca. 
Ao contrário, o danado acomodado nada oferece em troca. 
 Pior ainda, quando atacado o parasita, procura mil recursos e passa a defender-se com 
discursos. Bate forte com a mão direita sobre o peito, acha ter mais importância e, na sua 
ignorância, pensa também ter mais direitos. 
 O suor faz o caráter, ajeita a conduta e da história alinha a construção. Faz o militante 
aprender, a tomar o fio da liberdade e tecer a esteira da própria libertação. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de amor 
 Nº 09 
AOS SONHOS 
 
 É proibido sonhar quando a alma não quer sentir e, nem sequer imaginar os passos que deve 
dar, teimando em se acomodar pra não ver a flor florir. 
 Há sonhos que dão errado. Há sonhos de desespero. Há sonhos de pesadelos e, alguns de 
solidão. Há sonhos egoístas, fatalistas, entreguistas que alimentam a exploração. 
 Os sonhos verdadeiros são coerentes; espalham em cada passo um bocado de sementes, para 
fazer o jardim do amanhecer. São os que movem as mãos e os braços, para oferecer o corpo, aos 
abraços de prazer. 
 Sonhar que se está sozinho é não ser nada. Os sonhos são a madrugada que espera o dia se 
fazer. Pesadelo não existe para quem sonha ao lado de alguém que também sonha. Que não se 
envergonha de sonhar com outro alguém, que busca o mesmo destino, como o menino que chama 
pela mãe. 
 Sonhar é não querer ir só para um lugar melhor. É ver em cada olhar um pedaço do lugar 
onde descansa a esperança. Quem sonha sempre é criança; tem energia, tem alegria, tem 
confiança... 
 É duro sonhar perto dos desanimados. É como ver a flor se abrir às margens de um rochedo: 
o sonho é engolido pela indecisão e o medo. 
 É preciso sonhar com as montanhas de onde vem o guerrilheiro ao lado da companheira, 
trazendo uma bandeira embrulhando o coração. Trazendo a revolução organizada em fileiras, 
desfazendo-se em brincadeiras de roda, de São João; que se misturam à poeira dos passos de cada 
irmão. 
 É preciso sonhar com a floresta que se empresta para cada geração. Que pede proteção, dá o 
fruto e a raiz, cura a dor e a cicatriz feita na pele queimada. Dá sombra, terra molhada e faz a gente 
feliz. 
 Sonhar com a água doce na cacimba e no açude. Sonhar com a juventude; as margens do rio 
perfeitas. Sonhar com as boas colheitas das lavouras irrigadas; com a água à beira da estrada, que 
nos leva até ao futuro. Sonhar também com ar puro, e o beijo da namorada. 
 É preciso sonhar mais: sentir de perto o distante, aproximar o horizonte e surpreender a 
utopia, que chega um pouco por dia em cada passo caminhado. Sonhar com o céu nublado 
prometendo água nova, com as sementes nas covas; nascendo um povo mudado. 
 Sonhar com os passarinhos cantando sobre as escolas. Sonhar com jogos de bola, com 
danças e cantorias. Sonhar com a alegria que se dá até de esmola. 
 Sonhar com muitos valores, com uma nova cultura e, também com a ternura e a 
generosidade. Com a solidariedade na palma da mão aberta; cama, colchão e coberta e uma mesa 
com fartura. 
 Sonhar enfim com a vida, com respeito e igualdade. Sonhar com dignidade e um mundo não 
dividido. Com um povo tão sabido que chega até ser medonho. Sonhar em fazer do sonho um 
grande acontecimento; onde os dedos se cruzando, segurem a delicadeza e, acalentem a pureza de 
quem sonha, mas lutando.Cartas de Amor 
 Nº 10 
À TERRA 
 
 Disse o velho índio à tribo, mantendo no olhar o brilho: “O que acontecer à terra, acontecerá 
a seus filhos”. 
 É a sentença dada pela própria natureza, que mostra aos homens tão “fortes” a sua grande 
fraqueza; por não saber conviver, destroem só para fazer, da morte surgir riqueza. 
 E assim despem a terra, de toda sua cobertura, deixando à mostra as feridas em sua carne 
batida, veias secas, sem poder levar a vida. 
 Parece uma chapa quente expulsando os animais, os pássaros e os insetos; povos perdem os 
direitos, deixando de ser sujeitos, e vão se amontoando em alguns poucos locais. 
 Em seu ventre machucado jogam os fortes venenos, como se fosse remédio. Os filhos que 
nela vivem misturando a dor e o tédio, procuram sem resultado, o ar puro, que vinha de trás da 
encosta. Hoje a chuva cai e lava deixando os ossos à mostra. 
 Como a careca do homem se descabela a montanha, luzindo ao calor do sol que bate em sua 
crosta dura, onde as unhas dos arados passam, mas já não arranham. 
 Folhas secas já não caem. A terra morre de fome. E se ela nada produz, nada os seus filhos 
comem. Sem água a terra endurece. O peixe some, e então no homem, a fome cresce. 
 Quando a lua surge no alto, já não tem o que fazer. Olha acanhada e não vê aquele 
trabalhador que, banhado de suor, parava pra adormecer. 
 As fases da lua não vogam, crescente, cheia ou minguante, isso ficou tão distante, esquecido 
na memória, porque hoje a grande glória, das modernas invenções é cuidar das plantações com água 
que queima o abrigo, como se milhões de insetos fossem todos inimigos. 
 Muita contaminação, muita fome, muita sede. Não há canto de cigarras nem gente que arma 
redes. Já não se espalham sementes, nem há vizinhos e visitas, falta pomares floridos, danças, 
vestidos de chita. 
 Os pobres tocos das árvores, abraçados às cicatrizes, olham tristes para os troncos que 
arrastados vão embora. Igual à população que um dia deixou o sertão; sem raízes vive agora. 
 Terra escura, vermelha ou matizada, deixou de sorrir porque se aposentaram as enxadas. Em 
cada cabo havia gente, com os pés espalhando o mato e que produziam canções naquele mundo 
pacato. 
 O silêncio das enxadas calou o braço sofrido que ficou sem serventia, como o dia de chuva 
forte. A terra perdeu aos poucos milhões de seus habitantes, as empresas transformaram sábios em 
ignorantes. 
 Não se sabe o que se planta, o que se colhe e o que se come. Hoje nos laboratórios sementes 
mudam de nome, que depois vão lá pra terra como se fosse uma guerra onde há duas partes lutando. 
A cada palmo plantado, tanques, em tratores traçados, vão a vida bombardeando. 
 A terra boa, mas queimada, perde sua vitalidade, enquanto os braços balançam na total 
ociosidade. Sempre é tempo de alertar, com a sã filosofia; que um povo não será livre e nem terá 
alegria, enquanto seu alimento e todas as sementeiras, forem, produzidas e trazidas, de fora de suas 
fronteiras. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de amor 
 Nº 11 
 
 À DEMOCRACIA 
 
 
 É de fato uma loucura, gente de alta cultura e de moral tão tacanha, pregar a democracia, 
agarrados ao poder, mas que de tanto esbanjar, decidiram se fartar de coisas bastante estranhas. 
 Primeiro comeram o espaço e nossa população, sem ter lugar pra ficar abandonou o sertão. 
Veio morar na cidade, onde as imobiliárias, já tinham se precavido e o povo foi espremido nas 
encostas sedentárias. 
 Aí comeram as florestas para fazer mais fortuna. Todos os animais silvestres e as espécies 
mais comuns foram todas dizimadas, porque para esta camada já não há limite algum. 
 Comeram o conhecimento e os bancos das escolas, o povo ficou sem ter o direito de estudar 
e nem casa pra morar neste mundo traiçoeiro, porque esta minoria, com toda a sabedoria, comeu 
também o dinheiro. 
 Foram avançando mais e comeram a saúde. Os dentes da juventude, sem ficarem intrigados, 
é por isso que dizemos de modo pouco feliz que somos enquanto país, os campeões dos 
desdentados. 
 Comeram a voz do povo e este deixou de falar, só tem direito de ver o que alguns podem 
fazer de forma impopular, sentindo grande emoção, na voz da televisão e nas letras do jornal. 
 Ainda comeram os empregos não há onde trabalhar. As pernas de nosso povo para não poder 
andar. Dos braços, comeram o esquerdo e os dedos da mão direita, deixando o indicador, para usá-
lo com temor e aliviar as tensões, nas máquinas eletrônicas, no tempo das eleições. 
 Democracia de um dedo só? Faz dó, faz dó, faz dó... 
 Desta forma acreditam que existem iguais direitos, porque todos os políticos de fato são 
sempre eleitos e, esta é uma verdade que não há quem não aceite. Mas de que vale apertar os botões 
em um só dia, é isto democracia se em casa falta até o leite? 
Muitos até se convencem e a farsa, ajudam a montar. Fecham um olho ao Tio Sam, mas não 
é para piscar. É apenas para dizer que o dedo só dá prazer, pra aquele que se eleger, e que nada irá 
fazer para lhes desagradar. 
A democracia do medo é feita por um só dedo, que tira o que deu de tarde, já no outro dia 
cedo. 
 Mas a história é muito sábia, pouco a pouco nos ensina, que a pobreza não é feita por 
orientação divina e nem a democracia, usando apenas um dedo, onde gente até por medo, vota em 
quem lhe domina. 
 Pouco a pouco a consciência vai ocupando o vazio, resgatando todo o brio deste povo 
brasileiro. Do sono vai acordando, para fazer vomitar tudo o que os ricos comeram, e se eles nunca 
entenderam entenderão num só dia: que o dedo indicador mesmo se erguendo sozinho, pode apontar 
o caminho da nova democracia. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 12 
 AO TEMPO 
 
 
 Um povo desenvolvido, sentia-se protegido por um pássaro veloz. Uma águia na verdade, 
que comia as liberdades, impondo pesadas ordens, com a força de sua voz. 
 Seu ninho, uma atração. Levava com a força de suas pernas, as riquezas que encontrava, e 
quando alguém a contestava, usava a “palmatória”, uma nota promissória, de certa dívida externa. 
 Seus vôos não tinham divisas nem fronteiras. Seus produtos deviam estar em todas as 
prateleiras. Sua língua? Uma imposição. A moeda? Uma lei: a dolarização. 
 Armamentos? Sempre produziu. Poluía o planeta com gases e fumaça, e se alguém a 
contestasse, saia das reuniões fazendo ameaças. 
 Suas relíquias? Preservadas. Forças altamente preparadas, delas tomavam conta. Constava: 
uma casa branca, dois prédios de 122 andares, e um conjunto de cinco pontas. 
 Um dia a águia e seus filhos adormeceram. Três penas de sua cauda desprenderam e velozes 
voaram para o ar. Por azar, foram se chocar contra as torres alvissareiras, e lá desceram elas 
mergulhadas na poeira. 
 A águia triste e desmoralizada, por ter levado tal rasteira, procurava os culpados, com olhar 
desconfiado, pois, as penas tinham se desgarrado de sua própria sambiqueira. 
 Quem provocou as penas a voarem? Quem instigou de longe e de bem perto? Quem 
bombardeou nas selvas e no deserto? Quem matou com chumbo e de fome a céu aberto milhões de 
inocentes? Pois, as penas que caíram, eram frutos bem maduros que jogaram suas sementes. Bem 
entendido: “Quem com unhas fere, com unhas será ferido”. 
 E o que faziam os “vitimados” quando a águia ciscava e abatia, durante anos, meses e dias, 
outros Estados? Por acaso não era terrorismo, jogar bombas, durante a madrugada, quando dormiam 
as crianças desde de Granada? A seguir os milhões que morreram de emboscadas, em outros 
pontos, vítimas da triste sina, como até hoje na extinta Palestina, sem direito a gritar, e muito menos 
a se mostrar na tela da televisão? Dizem que: “Quem vê cara não vê coração”, mas muito 
sentimento pode esconder um grande fingimento. 
 Pedir clemência a quem, se és poderosa? Pedir ajuda a quem, se tensautonomia? Não há 
coisa mais hipócrita e ilegítima, quando o carrasco se coloca como vítima. 
 Enfim, o tempo venceu mais uma vez. A eternidade não existe para um reinado! Todo poder 
pode ser contestado. Ninguém é tão sabido que não aprenda uma lição. Se um povo pode ter a sua 
nação. Um país a sua soberania. A prepotência tem limites e se deita diante de quem aprendeu a 
olhar o tempo com os olhos marejados de utopia. 
 Terrorismo é o que vivemos aqui, marcados e mandados pelos silvos do FMI. Viver 
sobressaltados em permanente insônia, vendo as garras da águia depredar a Amazônia. Ser 
obrigados a engolir a Coca-Cola e ver nossas crianças e jovens sem escola. 
 Terrorismo não é apenas bombardear, se chocar e matar seres altivos. É mais! É fingir que 
mata de repente, no entanto deixa a penar, vivos. Ter que tirar da boca a comida e engolir em seco 
uma ferida, enquanto o império mantém-se na orgia, bebendo a hemorragia de nossa carne 
ressequida. 
 Salve o tempo! Salve o tempo! É o único instrumento que ninguém cala, nem derrota, nem 
impede de existir. É ele quem faz o amanhecer, e deitado na linha do horizonte deixa o sol nascer 
para fazer sorrir. Seca o orvalho, e no galho, faz a flor se abrir. 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 13 
 
 AO PERFUME 
 
O ódio é um péssimo companheiro. Filho do descontrole emocional. É quase irracional. 
Com ele o império vira bicho: se retrai, se contrai, se destrói. Não se faz herói da prepotência nem 
da indecência, pois a conseqüência é o lixo. 
 A indignação não é ódio. É razão misturada a sentimentos. Sem momentos de avalanches, 
que desmanchem a consciência. É clemência, paciência e generosidade. É não aceitar pela metade 
algo que deve ser inteiro. É ver no desconhecido um companheiro, quando luta pela mesma 
liberdade. 
 O ódio do império esconde um grande medo: ser surpreendido por segredos. Por isso 
alimenta a mágoa, que lhe cega a esperança. Fica com a desconfiança de beber a própria água. 
Repetindo: de que vale a prepotência, a ganância, a intolerância e a mágoa, se, quem se diz dono do 
mundo, no fundo, tem medo de beber a própria água? 
 É bom ver a opulência desmanchando-se em poeira. É como se uma espessa cabeleira fosse 
varrida pela ventania, pagando em um só dia, o que fez o tempo inteiro. Sentindo de perto o cheiro 
da vergonha do Rei que ficou nu. Sem ninguém que o conforte, como um chicote em sua mão, 
batendo sem perdão, no próprio couro cru. 
 Satisfação; é um sentimento onde se mistura suspiro com sorriso. Onde o juízo acalenta a 
utopia. Vê, prevê e guia, a arte de edificar ternura.; um renascer em cada criatura que se alimenta de 
eterna rebeldia. 
 Chega o dia em que os tiranos ficam como os cães idosos que perderam os dentes e já não 
mordem, mesmo mantendo nos velhos olhos a sanguinária ira. Suas causas são feitas de mentiras e 
não servem para animar a liberdade. Nem a noite que amedronta, controla a eternidade. Ela não 
detém a ousadia da luz, que arrebata seu capuz, com gestos de solidariedade. 
 A mesma força que obriga os tiranos a se unirem, pode levá-los à destruição. A força dos 
povos nutre-se de indignação. Pode acordar em luta após a longa pausa, e unir-se ao redor de uma 
só causa: pisar sobre os tiranos e resgatar em dias todos os anos, que se perderam por debaixo da 
opressão. 
 Como as florestas incendiadas, clamando pela chuva se parecem as nações. Devem aos 
tiranos, o que já não podem mais pagar. Como o fogo que queima devagar até chegar ao lago da 
revolta. Ali o grande encontro guarda uma saída: voltar, e numa festa, fazer como a floresta: em 
cada galho, vê um atalho para deixar brotar a nova vida. 
 As mãos dos lutadores estão ligadas aos braços que distribuem abraços, e não à violência e 
ao terror, estas são as armas do imperador, que faz da dor a sua missão. Põe a culpa de seus atos em 
quem canta uma canção, condenando a harmoniosa melodia. Esconde-se por trás da economia como 
um rato a espreitar o queijo, e não sabe o calor que tem um beijo, pois sua boca é amarga e cheia de 
covardia. 
 É por tanto, conveniente, espalhar a semente do amor como um costume. Pois, por mais que 
o ódio provoque muita dor e, leve o tirano em sua ira até pisar a flor, terá sempre primeiro que, 
passar pelo canteiro e respirar o seu perfume. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 14 
 À SOLIDARIEDADE 
 
 Somos como os brotos das sementes espalhados campo a fora, em busca de uma fresta na 
terra para respirar a liberdade. O canto da verdade pertence ao que chamamos vida; semente é como 
gente, não pode ser comida. 
 A aurora do nascimento avisa pela dor quando a semente quer deixar de ser flor. Fecundar é 
sua vontade. Procura por isso resvalar pela umidade, por um canal que lhe instigue o olho a abrir-se 
feito a força de um vulcão, para romper a crosta, que se prostra, diante da marcha desta revolução. 
 Se a crosta é dura os ombros do broto forçam sua abertura. Assim, com força e com ternura, 
desponta aquilo que procura forma, não é uma reforma, é nascimento de algo terno e puro, que quer 
espaço, para ligar-se por um laço, do passado ao futuro. Onde se vê, por antecedência, o fruto já 
maduro. 
 A chuva como lágrimas refrescantes, lava os olhos nas cascas das sementes, enfileiradas nos 
canteiros, que sobem com uma boina na cabeça como um novo guerrilheiro que, envergonhado com 
matizes indefinidos, põe força para ser reconhecido, é o lutador se fazendo em cada um de seus 
gemidos. 
 E o horizonte se estende como uma bandeira à espera pelos passos de quem caminha. 
Engatinha preguiçoso na garupa das montanhas a espera do aceno do raiar do novo dia, 
desvendando os segredos e aproximando a utopia. 
 Os brotos temerosos nascem enrolados. Os destemidos buscam desde cedo seguir o seu 
caminho. Os que olham para cima, já tomaram em suas mãos a auto-estima. O queixo levantado em 
constantes movimentos, como um tornado sendo o acontecimento. 
 O universo é o invólucro da semente humana, nele se encontram os povos para lutar contra 
os senhores, dando força e vida aos valores. 
 A castanha tem a casca dura, mas o broto teimoso sempre fura a sua rudeza. Nenhum 
império com sua fúria incontida, pode deter um nascimento, pois dentro dele apesar do sofrimento, 
existe vida, força da natureza. 
 A casca da semente em sua triste fadiga, cumpre o papel de ser barriga. Por mais dura que 
seja por fora, guarda dentro de si a aurora do dia que se avizinha. A utopia é uma arvorezinha, que 
dorme e quer nascer, depende do querer de quem os seus passos alinha. 
 É justo que existam diferenças. Sementes de todas as qualidades, cada qual com sua 
identidade. Delas, vêm os brotos com suas cores: operários, camponeses, professores, como na 
floresta, cheia de silenciosos construtores. 
 Há sementes em todos os continentes, África, Antártida, Ásia, Europa, Oceania e América, 
algumas com fuzis em punho buscam abrir a terra, é a rebeldia dizendo ser capaz, de lutar contra a 
vontade dos impérios e fazer nascer a paz. 
 O imperialismo é um inseto que come o olho da semente. É preciso combatê-lo ferozmente, 
não importa com que roupa se apresente. Sua perversidade se combate de verdade com a 
solidariedade de todos os continentes. 
As potências perderão sua arrogância, no dia em que a sua ganância tiver a sentença escrita 
em uma lauda: A vida é para se viver, mas quem quiser estuprar os outros para com isso ter prazer, 
terá que comer, se quiser, a própria cauda. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 15 
 
PARA SERMOS IGUAIS 
 
 
 Para ver-nos nas flores, façamos os jardins. Eles crescerão na alma das futuras gerações, que 
repetirão em canções as intenções plantadas; como as rosas rosadas que espelham as paixões. 
 Para ver-nos nas águas, preservemos os rios. Eles são os trilhos que multiplicarão os filhosde todas as espécies. Com os bens naturais é preciso fazer mais, assumir o seu cuidado. As 
empresas multinacionais entram cada vez mais, no coração das águas para controlarem os passos da 
vida. Com sofisticadas redes, prendem os direitos, fazendo de quem da terra é sujeito, beber a 
própria sede. 
 Para ver-nos nas árvores, preservemos as florestas. Elas garantirão para cada geração a 
recompensa: cuidar de suas doenças e purificar o ar. Ajudarão a molhar e a evitar os desertos que já 
estão bem perto. Só no Brasil, ficamos envergonhados, de saber, que já chegam a 574 Km². 
 Para termos o pão, preservemos a terra. Ela é a mão que alimenta oferecendo a cada boca 
suas colheitas. A erosão, a contaminação o fogo e a má utilização dos recursos naturais, já fazem a 
cada hora, uma espécie ir embora, de flores, ervas, insetos ou de animais. E para nunca mais. 
 Para ouvirmos um canto, preservemos os passarinhos. Eles sempre dizem do seu jeito, que o 
maior tesouro do homem ou do touro, está no próprio peito. Não é o coração, mas a força da paixão 
que move a tempestade da vontade de voar, e ao mesmo tempo de cantar. O pássaro não engana; 
por ser qualificado, aplica o ditado de “assobiar e, ao mesmo tempo, chupar cana”. 
 Para ganharmos um beijo, preservemos o homem e a mulher. É a única possibilidade de 
dizer que a vontade de amar triunfará. Preservemos o olhar para poder andar. Preservemos o amor 
para zelar da flor. E preservemos a verdade para que vingue a solidariedade. 
 Como é difícil provar que o futuro se constrói pelo presente! Que, quem aqui está, nada mais 
fará que lutar para preservar o que se tem, que tomamos emprestado das gerações que vêm. Todas 
nascem pacíficas e controladas, mas se obrigam a lutar para consertar o que, os que passam 
primeiro, como em fim de festa, sujam o espaço inteiro. 
 Quem nasce achará seu espaço já virado, por aqueles que não souberam comportar-se no 
presente ou no passado. 
 O imperialismo destrói e impõe normas para que as sobras dos rios se tornem grandes 
negócios. Já não se coloca como sócio, quer ser proprietário, da água onde ela estiver. Por isso 
dizem que o FMI, recomenda às nações que acelerem as privatizações de todos os mananciais. Isso 
é demais! 
 Dizem que estratégico é investir na indústria, no petróleo e em tecnologias. Mas as 
conseqüências por todos conhecidas é que: uma nação sem água e sem comida, não terá sua 
descendência repetida. Estratégico mesmo é investir na vida. 
 “Quem semeia ventos, colhe tempestades”. Ainda falta revelar-se totalmente esta verdade. 
Façamos alguma coisa! Ainda sobra da vida, pelo menos a metade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 16 
 
 AO SOCIALISMO 
 
 É preciso despertar enquanto é cedo. Perder o medo de dizer de que lado se está. Como a 
chuva que também cai devagar, e não deixa de cumprir com sua sina; molha todas as plantas com 
neblina e lava a poeira do calor. Beija a boca doce de cada flor e limpa as impurezas do ar que o 
império contamina. Por isso, desperta América Latina! 
 É verdade que tivemos no passado erros cometidos pelo “socialismo de Estado”, que nos 
jogou para a periferia da história. Que negou quase um século de memória e de sonhos 
interrompidos por canhões, mas jamais tantos povos e nações, conseguiram juntamente tanta glória. 
 Um vazio pode-se dizer. Um vazio nasceu no lugar das frustrações. Mas quem é o império 
para querer dar lições, qual chicote querendo acariciar? Sopra onde não pode beijar, qual dragão 
sem sorrir mostrando os dentes, faz da mídia um chocalho de correntes, tripudiando sobre alguém 
que não morreu. Se de um lado se agarra aos judeus, de outro devora os palestinos, e oprime 
africanos e latinos, pondo a culpa no tempo que não cedeu. 
 É verdade que há uma confusão que engole as utopias. Desmontou-se a ideologia na 
maioria das cabeças congeladas. Que tinham aprendido a marteladas, pela ordem dos partidos 
comunistas, mas então não eram marxistas? Pois, a ciência não pode ser acorrentada. 
 Dois pólos continuam a se enfrentar, mesmo tendo caído o muro de Berlim. Aquilo não 
significou o fim da briga entre a ética e a opulência. Acontece que, quando se tira da história a 
ciência, os sentimentos é que tomam conta, por isso um dos pólos virou o islamismo e se defronta, 
no vácuo deixado pelo socialismo. 
 É isso que precisamos decifrar. Caso contrário ficaremos sobre o muro. A guerra não é entre 
puros e impuros, mas entre ricos e desfavorecidos. Os Talibãs por mais erros que tenham cometido, 
influídos por sua religião, mas por trás de seus atos existe uma nação, que há anos luta contra 
impérios intrometidos. 
 O imperialismo é o inimigo da humanidade. Ele faz o terror entrar pelas janelas. Milhões e 
milhões morrem asfixiados, sem poder dizer sequer um não. Já foram ao Vietnã e perderam para 
nossa alegria, preparemo-nos pois, chegará o nosso dia, de lutar cantando uma canção. 
 Pátria ou morte! Pátria ou morte! Viva a solidariedade. É a guerra do míssil contra a carta 
que leva até a casa do império o pó que envenena o ar, para ele saber como é ruim morrer sem 
respirar, como faz morrer nosso planeta. Morte ao boi, “ao boi da cara preta” que não pega 
ninguém, pois as crianças já não têm mais medo de careta. 
 Religião é religião e não ciência, passou a ocupar este lugar depois que a ideologia dos 
pobres falhou em sua experiência, mas terá que se reabilitar. Não existe tempo e nem lugar, pois 
esta profecia não se supera não! Somos a última classe em ascensão, para chegarmos à nova 
sociedade; onde o pão se servirá repartido em metades; as pessoas se abraçarão mas sem cinismo; 
não haverá paz na terra nem perdão, enquanto a humanidade numa só revolução, não implantar 
amplamente o socialismo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 17 
 
 O NOSSO AFEGANISTÃO 
 
 
 O nosso Afeganistão é aqui com guerra e tudo, governado também por cabeçudos, com 
apenas uma diferença: lá o povo reage à sentença imposta pela crueldade, aqui apesar da fome 
imensa, ainda se prega a passividade. 
 Há um “novo” vocábulo criado pelo imperialismo, descrito em todas páginas de jornais, 
chamam de bioterrorismo e nada mais, aos ataques sofridos com um pó, mas quem primeiro 
inventou este arsenal que agora não consegue controlar? 
 A ciência a serviço do mal, ligada à área da biologia, já na guerra da Coréia no século 
passado, os americanos têm usado sem se quer prever os requisitos e explodiram uma bomba com 
mosquitos, eliminando milhares de vidas, e assim se forçou um armistício e as coréias ficaram 
dividas. 
 No Vietnã não foi tão diferente, um agente poderoso foi usado, para secar as florestas e 
facilitar o combate aos guerrilheiros, a guerra terminou muito ligeiro, sem o império ter chegado ao 
seu intento, mas o veneno ficou e com o vento, foi entrando após a guerra em todos os pulmões, por 
isso por várias gerações, ali se suporta o sofrimento. 
 Na guerra do Irã contra o Iraque, onde o império em detrimento da miséria, ensinou o 
segundo a produzir as bactérias que hoje são usadas nesta fúria insana, comendo as narinas da nação 
americana, que queimam igual ferro envolto em brasa, o medo chegou às portas de sua casa, e olha 
que faz apenas uma semana! 
 Mas a arma mais potente em andamento, que ataca primeiro a legislação, são os trangênicos, 
meu amigo, meu irmão, que comem as vísceras no atacado. Nos shoppings e nos supermercados, se 
disparam os mísseis contra a vida, é o bioterrorismo então legalizado, que o povo enganado leva 
como comida. 
 Ao contrário do que faziam no passado, onde as ameaça aos humanos eram feitas em 
segredo, todas as espécies hoje estão com medo a espera de que lhes roubem os seus genes, como os 
órgãos de crianças que também pelo império econômico traficados, é o terrorismo mais 
qualificado,que apenas ao império só faz bem. 
 E o terror da dívida externa? É a ciência econômica a serviço do mal, que dá plenos direitos 
ao capital, usando siglas para disfarçar o nome, enquanto 50 milhões de brasileiros já não comem, é 
terror ou não morrer de fome? Por que isto o império ignora? Uma dúzia de crianças morre a cada 
hora, é o presente e o futuro do Brasil que se consome. 
 Bioterrorismo, é o termo, pois surgido, criado, alimentado e desenvolvido, pela ganância e a 
elevada ignorância dos Estados Unidos, que inventaram através de sua ciência, mísseis que valem 
milhões. Os pobres fazem das cartas seus canhões, e as enviam com cuidado e muito zelo, tendo 
como custo apenas um simples selo, é o troco dos cordeiros dados aos leões. 
 Por último, é preciso destacar que, a tecnologia dia a dia foi poluindo o ar. O tratado de 
Kioto o império não assinou. De que vale o ar condicionado e o computador, se o dono do mundo 
tem medo de respirar? 
 Bioterrorismo é quando os inventos saem dos laboratórios pelas mãos dos professores e vão 
comer os intestinos de seus próprios inventores. Então por que reclamar? Deve saber morrer, quem 
ensinou a matar! 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 18 
 
 A CUBA 
 
 Estivemos em Cuba em busca de alento para nossos sentimentos. Era verdade o que se dizia; 
lá povo é um composto de coragem e ousadia. Não se entrega nem desanima, anda de cabeça 
erguida demonstrando auto-estima. 
 A quem vai, a princípio a surpresa é instigante, pergunta-se sobre o grande comandante que, 
embora o tempo lhe tenha tirado das faces a juventude, comporta-se como um guerrilheiro, move-se 
o tempo inteiro e aparenta boa saúde. 
 O que vimos ali, com o que temos aqui, não se compara. O povo segue fielmente os 
ensinamentos de Martí e Che Guevara. Convencido, não pensa o contrário. Empenha-se no trabalho 
voluntário. 
 Os camponeses têm consciência da missão e produzem alimentos para toda a nação. 
Misturam ideologia e sentimento; há uma estátua de Martí em cada assentamento. Exposto, em uma 
praça florida. Ali se percebe que a ideologia tem vida. 
 Como um menino, Fidel passeia entre o povo. É o velho guerrilheiro que encarna as 
qualidades sonhadas do homem novo. Com sua farda verde oliva, demonstra confiança, não 
descansa. Anda e abraça com simplicidade, apesar de sua idade. 
 Perdeu a maciez da pele e a robustez das pernas que o fazem andar mais lento, mas não 
demonstra fraqueza nem temor. É querido pelo povo por ser este lutador, que, não pára de falar do 
socialismo, enquanto, sem trégua combate o imperialismo. 
 Não há propagandas de mercadorias. Nas ruas se respira ar puro e ideologia. Todos sabem, 
em qualquer idade, o que é a revolução e a ela se dedicam com paixão. 
 Em Santa Clara está o Che, descansando no memorial com mais 38 guerrilheiros postos em 
forma, onde ele é o comandante. A arquitetura é feita como se eles descansassem para seguir 
adiante. 
 Os valores estão em toda parte. Comprova-se de fato que a revolução é uma arte. As 
proporções entre nós são diferentes e mudam a consistência. Lá o país é pequeno, mas o povo é a 
potência. Aqui o país é imenso, mas pequena é a consciência. 
 O que dizer para aqueles que criticam? Que o socialismo de lá é cheio de defeitos? Para 
quem quer mordomias, de fato em Cuba não tem jeito. Não cabe lá a “democracia” daqui com suas 
injustiças astronômicas. Lá o povo tem o básico e não vota em máquinas eletrônicas. Nem por isso 
deixa de ser feliz, participa ativamente da defesa do país. Quem assim procede é bem visto. Quer 
mais democracia que isto? 
 Aos que lá vão e voltam magoados e criticando, é sinal que estão se petrificando. 
Quanto a nós, dizemos sem constrangimento, que Cuba representa um farol neste momento. 
Aceso no meio do oceano, nas barbas do Tio Sam, expondo sua ousadia. É sinal que aquele povo se 
alimenta de utopia. 
Resumindo, pode-se dizer livremente sem apertos: fomos a Cuba, não vimos erro algum; 
estavam escondidos atrás dos acertos. 
Pátria ou morte! Venceremos! Não são palavras vazias, são atitudes e valores em construção 
que somente as entende quem vive em uma revolução. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 19 
 
 AO CHE 
 
 Em Santa Clara de longe se avista, o grande comandante comunista. Jovem e esbelto na 
estátua que o moldura, parecendo ser viva a criatura. 
 Não há quem não se emocione ao ver o retrato tão fiel, talvez mais do que ficar frente a 
frente com Fidel. 
 Em outro ponto, é outra a situação. Pode-se descer e pegá-lo pela mão. Está logo à frente de 
onde, na batalha decisiva, o trem saiu dos trilhos. Sem o fuzil. Olhar de confiança. Nos braços 
carrega uma criança como se fosse um filho. Assim também nós nos sentimos, descendentes do 
comandante que seguimos. 
 No memorial estão os guerrilheiros, enfileirados como companheiros, a espera da voz do 
comandante, dando-lhes ordens para seguir adiante. Ali se encontram objetos deformados que 
foram tão preciosos quando por eles usados. 
 Mas o Che não está apenas neste velho mostruário. Está no coração do povo, no trabalho 
voluntário. Na moral, nos valores e nos sentimentos. Na defesa do país e no comportamento. 
 As crianças têm orgulho de serem socialistas. Defendem a revolução e todas as suas 
conquistas. Tem no olhar uma chama de esperança. Percebe-se apenas pela voz que são crianças. 
 A juventude está à disposição, para cumprir socialmente a sua função. Em suas faces já não 
se vê as velhas cicatrizes, buscam manter da cultura suas raízes e vão, em massa, prestar ajuda 
solidária a outros países. 
 Ali se vê que o Che não foi apenas um comandante militar. Mas um ser inquestionável que 
sentia e sabia amar. Que tinha um pensamento em cada mão, na boca, uma sing ela canção, que 
atraia os ouvidos de seu povo e ouvindo cada qual se tornou novo. 
 Este artista arquiteto de um só sonho, que enfrentava o perigo tão risonho, pois sabia o valor 
que tinha a vida. Como pode sua voz ser esquecida, se suas ordens eram cantos nas trincheiras? 
Seus planos eram como brincadeiras, de crianças tentando moldar o mundo, por isso era seu 
carisma tão profundo de enfrentar limites e desrespeitar fronteiras. 
 Poeta do fuzil que não podia caber só em uma ilha. Seguiu pelas Américas abrindo trilhas, 
como um raio de luz penetrando nas florestas. Com suas idéias foi rasgando frestas, nas velhas 
teorias petrificadas. Fez dos passos, teses elaboradas que, a seu ver sempre foram modestas. 
 Guerreiro da consciência. Lutador para extirpar a ignorância. Deu aos humanos a máxima 
importância, porque acreditava na ciência. Transformou o conformismo em impaciência. Os limites 
em degraus entre as batalhas. Colocou os acertos sobre as falhas. Combateu em si mesmo as 
deficiências. 
 Como podemos esquecer ou fingir estar distante? deste ser que nos chama ardentemente. 
Nas batalhas estará sempre em nossa frente. Sendo assim o nosso eterno comandante. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de amor 
Nº 20 
ÀS VERDADES JÁ APRENDIDAS 
 
Não diga que é preciso organizar o povo 
 Nem que os Bancos exploram o cidadão 
Que a água não pode ser privatizada 
E o caminho é a revolução. 
Que a terra está entregue ao latifúndio 
A renda está muito concentrada 
 O governo é conivente com o império 
 Que as idéias socialistas não estão superadas. 
 Que a soberania está quase perdida 
 O desemprego é irreversível 
 O homem está irreconhecível 
 Porque o consumismo já o venceu. 
 Que há milhões de indigentes pelas ruas 
 A fome come a vida das crianças 
 O povo perdeu as referências 
 A mídia atenta contra a inteligência 
 E a “esquerda” se rendeu. 
 Não diga que a globalização não é coisa do presente 
 Que a “elite” é inconseqüente 
 Os governos de “esquerda” são incoerentes 
 E o império já domina a humanidade. 
 Que o problema do povo é apropriedade 
 Que a riqueza é a fonte da violência 
 E que é preciso elevar a consciência. 
 São verdades talvez muito batidas 
 Que sem ação podem perder a própria vida. 
 Não. Não diga nada! 
Pergunte se há um caminho... uma estrada? 
 Se está disposto a alinhar os passos 
 E convencido a descruzar os braços 
 Para agarrar com força a solução? 
 Pergunte o que é a revolução? 
 Porque é chegado o momento 
Onde as palavras já não servem como exemplo. 
Entenda de uma vez: 
 Que a dominação e a liberdade podem ter a mesma idade. 
 Há momentos em que uma só olhada 
 Organiza uma longa caminhada 
 E incendeia o coração dos que já não se queixam. 
 Acredite, que tudo guarda uma força interna 
 Que as injustiças não conseguem ser eternas 
 Simplesmente, porque os revolucionários não deixam. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 21 
 
AO NATAL NA REFORMA AGRÁRIA 
 
 Neste ano, no natal, não ouviremos sinos, porque as risadas dos “meninos”, que passeiam 
livres e contentes, já podem mostrar e exibir os seus presentes. Ao contrário de seus pais quando 
crianças, onde o natal servia apenas de frustrações das esperanças. 
 Agora nos pés cansados pode-se ver que estão todos calçados. As camas deixaram de ser 
giraus e a comida melhora sempre mais. 
 Nas cozinhas fervem as panelas. A energia substitui a luz das velas. Nos terreiros passeiam 
as galinhas, é a prova de que a lona nunca abandona aquele que com luta o passo alinha. 
 As lágrimas agora são de emoção. Escorrem pelas faces qual perfume em formação 
limitando a fonte que do rio e a nascente. Com a alegria de receber e dar presentes, gotejam sem 
envergonhar o rosto. O pão é comido com mais gosto. Nos berços já não morrem os descendentes. 
 O natal na reforma agrária tem gosto de vitórias, como se um canto nascesse em cada dia. A 
ocupação enfim se fez poesia, a decisão também se fez destino, e o homem velho renasceu, se fez 
menino. 
 A mãe consegue se deitar mais cedo. Nas noites já não sopra mais o medo de não se ter 
futuro. O fruto pende dos galhos já maduro. O leite como nas cachoeiras penetra borbulhante em 
cada mamadeira. 
 O fogo aceso no terreiro, espera a visita de um guerreiro que partiu e não viu cada vitória. 
Vive, em todo caso, na memória e festeja soprando as labaredas, que se movem como se fossem de 
seda. 
 O mugir dos animais completa os sons da harmonia, que faz do latifúndio um tempo antigo, 
onde vegetava só capim, agora, enfim, amadurece o trigo. 
 Violas e violeiros; vultos de outrora renascendo. Roupas que não têm mais os remendos. 
Chapéus que não estão mais esgaçados. Lembranças que contam o passado. Lágrimas que secam 
sem surgir. É o tempo de se permitir; viver, sonhar e ser sonhado. 
 Porteiras escancaradas dormem silenciosas, quietas. Roseiras orvalhadas se emprestam aos 
poetas que deitam nos jardins para poder amar; sem medo de que alguém venha chamar, ou pedir o 
lugar destes casais, já há tantos lugares tão iguais, que falta gente para os ocupar. 
 Neste natal, há mil coisas sendo ditas. Há mil faces rosadas, mais bonitas, há mil beijos 
saindo em cada boca. Há mil coisas sendo repartidas, há mil desejos a realizar na vida que é tão boa 
que parece curta e pouca. 
 Será assim: todos os natais sem sinos, porque as gargalhadas das meninas e meninos 
penetrarão na alma dos adultos, expulsarão dali a cada ano os desânimos e os defuntos. Renascerá 
assim sempre a certeza, de que, reforma agrária é gente e natureza, que se encontraram para viver 
juntos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Cartas de amor 
 Nº 22 
 À POESIA SERTANEJA 
 
Sem a terra repartida, que prazer que tem a vida? 
Pensava o sertanejo sem um prato de comida. 
 Só um punhado de terra daria conta de sua lida? 
Onde plantaria seus pés todos cheios de feridas? 
Se por tudo onde passava, a cerca estava estendida 
Ia mais rápida do que ele caminhando nas subidas. 
Com pernas feitas de estacas e a espinha retorcida 
De arames com seus grampos, margeando a estrada sem vida. 
Deitou-se para morrer sob a lona ressequida 
Mas teve sorte o poeta de sonhar com a saída 
E ao acordar divulgou a mensagem recebida 
E contou aos seus vizinhos, o que vira em sua dormida. 
Sonhei com terras plantadas, sonhei com flores floridas 
Sonhei com casas pintadas... frutas amadurecidas. 
Sonhei com jovens cantando em escolas construídas 
Com mulheres liderando as batalhas tão sofridas. 
Sonhei com árvores grossas e matas verdes crescidas 
Sonhei com água corrente despencando das descidas. 
Sonhei com trabalho feito com as minhas mãos despidas 
Cereais e plantações se transformando em comida 
Abraços dados com força em cada espécie de vida. 
Sonhei com ocupações, marchas e estradas compridas 
Sonhei com a revolução, multidões vendo saídas 
Riquezas acumuladas de uma só vez repartidas. 
Sonhei puxar com as mãos, todas as idéias retidas 
Em levar conhecimento a consciências adormecidas. 
A levantar a bandeira de todas causas perdidas 
Sonhei com grandes vitórias e a dominação vencida. 
Sonhei com minha cabeça, levantada e bem erguida 
Sonhei em fazer a história sem coisas dadas escondidas 
A buscar com minhas forças as coisas oferecidas. 
 Sonhei em fazer do campo de minha pátria querida 
Um lugar de gente livre se amando em terras carpidas 
Um espaço de prazer sem ter vontades contidas. 
E todos os que ouviram, sentiram as forças retidas 
A moverem devagar as pernas enfraquecidas 
E levantaram os corpos feito uma água fervida 
Borbulhando contra as cercas que fácil foram rompidas 
E os arames gotejaram toda maldade contida 
Ali nasceu uma estrada... nunca mais interrompida. 
Hoje a terra repartida, dá gosto viver a vida. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 23 
AO ANO NOVO 
 
 Este ano vai ser bom, choveu em todo o país. Prenuncia a fecundação de um sonho que tem 
raiz. Se chove na agricultura, a nossa velha cultura diz que o tempo vai ser bom. Com a semente na 
mão perfura-se todo o chão pra se fazer o plantio, mas, se isso não se fizer, sobre a terra despida 
ficam marcas e feridas da água que vai pro rio. 
 O “bem” tem sua aspereza, semelhante à rapadura, que oferece doçura extraída da dureza. 
Assim é a natureza e a vida que segue em frente, quando o “bem” fica doente é preciso ter cuidado, 
porque o sonho plantado pode morrer com a semente! 
 Mas o ano vai ser bom também para quem lutar, é preciso semear nesta terra preparada. É 
preciso resgatar (isto é uma grande verdade), a nossa privacidade duramente escrafunchada. Onde 
os nossos inimigos semearam muito medo, descobriram alguns segredos de nossa germinação, por 
isso com as próprias mãos, torturam os brotos nascendo. 
 Recompor nossos segredos é a tarefa imediata. Sem eles, as velhas chibatas baterão sem 
resistência, porque toda persistência vem de segredos mantidos. Mas, quando são descobertos, os 
inimigos ficam certos, de nos terem demolido. 
 Muitas forças de esquerda se queimaram com a luz, já são brotos de bambus num caule oco 
grudados, iludidos, mascarados, já sem criatividade, pensam que sem germinar podem crescer e 
chegar a ter própria identidade. 
 A identidade do broto é a do caule que o sustenta, enquanto o caule agüenta o broto segue 
com vida. Mas quando há epidemias, ou fortes crises de vento, o mesmo comportamento tem o 
broto infeliz, porque da velha matriz vem sua profissão de fé, pois é a mesma raiz que os faz ficar 
em pé. 
 As sementes não são brotos, têm raízes independentes, crescem e são resistentes, tendo a 
própria identidade. Germinam no campo certo, fazem surgir o projeto de uma nova sociedade. 
 Isso é que dá garantia aos segredos preservados, os brotos domesticados já não querem ter 
segredos, para não se surpreenderem por isso tremem de medo, sempreque o caule balança, como 
se fossem crianças querendo adormecer, e na sua ilusão louca, levam o dedo até a boca e fingem 
sentir prazer. 
 Se no país chove bem, bem a semente germina, renasce a auto-estima e passa a ser o 
fenômeno, é este o grande termômetro que mede a germinação, quando com o coração rega-se a 
força dos passos e sustenta-se com os braços o projeto em formação. 
 Ser fenômeno das mudanças com suas mil inovações. Fazer nossas plantações com sementes 
naturais. Reproduzir nos quintais, hortaliças e pomares; plantar em todos os lugares vontade de lutar 
mais. 
 Ser fenômeno político que atrai a juventude. Mostrar, tomar atitudes frente a degeneração. 
Dar ao jovem condição de ser também dirigente; colocá-lo frente a frente com a própria libertação. 
 Construir novas consciências em milhões de estrategistas; fazer das forças ociosas e das 
massas submissas, potenciais de enfrentamento, e assim, massa e fermento, farão a revolução. Por 
tudo o que relatamos é que enfim acreditamos, que o novo ano vai ser bom. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 24 
ÀS PALAVRAS 
 
 
 Falar a verdade é importante; mas não deve haver nada mais atormentante que a alma dos 
políticos. Usam a boca como arma para disparar palavras sem prudência, fazem isto para se 
garantir, mas não deixam de ferir de morte as suas próprias consciências. 
 Quando o político é eleito, só elogios se vêm sair da caixa de seu peito. Quando perde, fica 
retrancado: não fala de imediato; analisa os fatos para depois emitir o seu “achado”. 
 Quando perde uma, duas, três e vai tentar a quarta vez, no desespero, começa a elencar os 
erros. Rebela-se de um jeito bem primário e aventureiro; acha que os adversários o derrotaram não 
pelas virtudes, mas pelas palavras rudes usadas pelos companheiros. 
 Assim expõe a sua sentença: “Quereis vós, que vosso candidato vença com esse palavreado? 
Que iremos re-estatizar as empresas já privatizadas, resgatar o dinheiro, não pagar a dívida externa 
e estatizar o sistema financeiro? Isto não se diz mais não senhor, nem mesmo em campanhas para 
vereador! Muito menos para presidente. As palavras devem ser bem diferentes!”. 
 Dizem que o peixe morre pela boca, isto é verdadeiro? Quem morre pela boca é o político 
interesseiro; com uma advertência: morre em sua consciência por primeiro. 
 Com belas falações, questiona os companheiros em suas razões: “Porque é que perdemos 
tantas eleições?” E dispara a resposta desta vez sem emissários: “Não pode ser pelas virtudes de 
nossos adversários!” 
 Vejamos então. Se há doze anos a esquerda não ganha a eleição por ter a língua afiada, 
significa que seus erros estão nas palavras “mal” faladas? Esta é a lógica da reflexão: falando 
“bem”, a direita ganhou cada eleição! 
 Então o jeito é se “desmanchar”. Deixar de falar tão diferente, engrenar um discurso 
eloqüente que não diga nada, mas que engane muita gente. 
 Na verdade o que está sendo dito, há muito tempo na memória vem escrito. Pelos ternos bem 
cortados já transparecia. Para alguns porém era bobagem, mas de fato, nesta tenção imensa, a 
linguagem era ainda o que fazia a diferença. 
 Por isso é preciso prestar sentido: Neste país, de esquerda ainda há algum partido? Se pelo 
sim, responda com ações. Se pelo não, poupe o ar de seus pulmões. 
 Não é virtude ao errado se igualar. Mudar o discurso e rastejar para ver se a elite o aceita. A 
verdade é dizer sem emoção, a “esquerda” já perdeu a próxima eleição, e não é por capricho nem 
vingança, é que na elite há pessoas de inteira confiança e não será mudando de discurso nem de 
jeito, que um candidato de fora desta classe será aceito. A não ser que seja por acidente, mas aí o 
candidato já estará bem diferente. 
 É uma pena ver os sonhos desfolhados, mas os passos haviam denunciado, que, por falta de 
formação e militância, os combates perderam a importância. Por isto sobraram as palavras para 
modificar neste arsenal. Isto frustra quem ainda da revolução é um devoto, mas o segredo está em 
que, para caçar votos, é inútil um quadro formador, precisa-se em cada esquina de um bom 
“atirador” (de palavras afinal), conhecido como cabo eleitoral. Há milhares no Brasil com nome e 
endereço, o que diferencia um do outro, é apenas o preço. 
 Só há um jeito de chegar a vencer e governar: não deixar nenhuma palavra se render e com 
elas organizar aqueles que precisam do poder. Somente assim e deste jeito, não se perde a vergonha 
e o respeito. 
 
 
 
 
 
 Cartas de Amor 
 Nº 25 
ÀS ILUSÕES 
 
 
 Por que será que a elite após quinhentos anos de poder, deixaria alguém que não é de sua 
classe se exceder, e o país por ele governar? Isto é o que se deve perguntar àqueles que mansamente 
se aproximam, principalmente quando as pesquisas os animam. 
 A democracia burguesa é como um carro rodando estrada a fora. Nele há um motorista 
treinado pela tradição. Mesmo cansado e sonolento, deixa o carro andar mais lento, mas não entrega 
nem por um momento o controle do regime que leva a multidão. 
 Este carro a dirigir pode ser dado, se um dia estiver muito atolado e iniciar as rebeliões de 
passageiros. Aí o motorista de mansinho, chama um ajudante, se afasta, e finge ir embora, mas fica 
controlando os movimentos lá de fora. 
 Sabendo que o carro fácil não sairá; ajuda os passageiros a reclamar para poder ir de volta ao 
volante. Por isso se posta mais adiante e espera a hora certa de dar o golpe certeiro, taxando o 
ajudante de barbeiro, vendo o carro patinando no atoleiro. 
 Se por acaso houver reações das multidões, enlameadas pelo barro, o “fugitivo” muito 
esperto e cheio de confiança, chama os seguranças e manda descer todos do carro. 
 Aí impõe as ordens até o dia que bem quiser. Como não foi previsto outro carro, a multidão 
tem de seguir a pé, prometendo vingar-se mais adiante, quando houver alguma eleição mais 
importante. 
 Assim a chuva passa, seca a estrada; o carro sai em disparada, rumo ao destino repensado. O 
motorista já não tem o mesmo brilho, aí passa o volante, não ao ajudante, mas a um de seus filhos; 
e lá ficam os ajudantes enciumados a protestar, e o carro segue devagar, carregando as multidões 
para lugares pintados de ilusões. 
 Os ajudantes, todos de cara feia, a cada quatro anos são chamados a uma ceia. Num grande 
parlamento para discutirem porque o carro anda lento. Passam as horas, a ceia termina, aí 
descobrem que o carro anda lento por não ter buzina. Então convocam uma eleição para o povo 
(que até então nada pôde opinar), decidir que tipo de buzina colocar. E assim procedem, mas o carro 
continua andando devagar. 
 Passa-se o tempo, ceias vão e ceias vêm, e o carro já não atrai mais ninguém, apenas os que 
vão para ceiar. Xingam-se novamente em mesas regadas de champanhe e caviar, culpando-se uns 
aos outros, porque o carro anda devagar. 
 Trocam o motorista e nada modifica. Os ajudantes se revoltam porque novamente ele 
pertence à classe rica e nada de bom pode surgir. Propõe-se na próxima ceia, tomar o carro e 
começar a dirigir. 
 Vem a próxima ceia convocada pela elite. E a direita distribui todos os convites como se 
fosse uma grande brincadeira. E novamente, ocupa a maior parte das cadeiras. 
 Os ajudantes revoltados ameaçam não comer. “Que nada”, diz a elite, “ganhamos foi por 
pouco até”. A multidão iludida renova sua fé e continua a andar a pé. 
 Os ajudantes fingem não compreender, mas gostam de estar ali, mesmo sem dirigir, 
aproveitam todos os dias as muitas regalias, por viajarem (mesmo como ajudantes), no sistema da 
classe dominante. 
 Assim é. A multidão composta pelo povo. Se quiser viajar e ter prazer, deve lutar para ter 
um carro novo; onde não haja privilégios de ceias e bacanais de doutores ou de turistas, e que 
todos, de algum jeito, tenham o direito, de serem motoristas. 
 
 
 
 
 
 
Cartas de Amor 
 Nº 26

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