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Nefrologia- Síndromes Renais

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Síndromes Renais 
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1. INTRODUÇÃO
O termo síndrome por definição, refere-se a um conjunto de sinais e sintomas que caracterizam uma determinada doença. 
Síndromes Clínicas compreende o conjunto de sintomas e sinais que, agrupados, apontam para um diagnóstico de lesão estrutural ou alteração funcional de um tecido ou órgão. As síndromes clínicas podem ser agrupadas, além de sintomas e sinais identificados por uma anamnese completa, alterações em exames complementares que apontam para alterações estruturais ou funcionais. 
As principais síndromes clínicas em Nefrologia são: Hematúria Assintomática, Síndrome Nefrótica, Síndrome Nefrítica e Glomerulonefrite rapidamente progressiva (GNRP), que são manifestações sindrômicas das doenças glomerulares; a Lesão Renal Aguda e a Doença Renal Crônica, que são síndromes relacionas às alterações na função renal. 
Na avaliação clínica, deve-se ter em mente que o direcionamento do diagnostico, agrupando-se sintomas, sinais e alterações laboratoriais iniciais sob o diagnóstico sindrômico, facilita o raciocínio diagnóstico e o direcionamento do diagnóstico etiológico. 
2. SINAIS E SINTOMAS NEFROLÓGICOS 
De uma maneira geral, os sinais e sintomas que compõem a maioria os síndromes nefrológicas são inespecíficas, podem estar presentes em diversas doenças, o que dificulta o diagnóstico clínico quando eles são analisados de forma isolada. Contudo, quando analisados em conjunto e associados a outros dados complementares (laboratoriais e imagem), podem estabelecer diagnóstico sindrômico exatos. 
Os principais sinais e sintomas relacionados às doenças renais são: 
Alterações na Micção 
Uma pessoa normal urina a cada 4 a 6 horas durante o dia e normalmente não urina à noite. Entre as alterações miccionais mais importantes, destacamos: 
· Polaciúria: consiste no aumento da necessidade de urinar e, com isso, da frequência urinária diurna, com o intervalo entre micções inferior a 2 horas, sem que haja concomitante aumento do volume urinário. As principais causas de polaciúria são: Urina residual; Processos Infecciosos; Tensão Nervosa; Fibrose Vesical; Queda da Complacência Vesical e Poliúria. 
· Noctúria/Nictúria: a noctúria define o aumento da frequência miccional durante a noite, enquanto que a nictúria define apenas a presença de micção noturna além do normal (mais que dois episódios por noite). Pode ocorrer na fase inicial da insuficiência renal, insuficiência cardíaca ou em hepatopatias. A presença de noctúria sem polaciúria é bastante sugestivo de falência do ventrículo esquerdo (devido ao retorno do líquido do terceiro espaço para o intravascular, que ocorre quando o paciente se deita para dormir, o que aumenta a taxa de filtração glomerular e a produção de urina). As principais causas são: Lesão renal grave, ICC, Obstrução infra-vesical, Diabetes Mellitus, Ingestão de irritantes vesicais próximo ao período de dormir. 
· Disúria: micção associada à sensação de dor, queimação ou desconforto. Ocorre na cistite, prostatite, uretrite, traumatismo geniturinário, irritantes uretrais, reações alérgicas. Consiste no primeiro sintoma de infecção do trato urinário; a disúria terminal é característica da cistite. 
· Urgência Miccional: a urgência urinária significa a necessidade súbita e imperiosa de urinar, podendo, mesmo, haver esvaziamento involuntário da bexiga. As principais causas são: Hiperatividade Neurogênica, Hiperatividade idiopática, Obstrução infra-vesical e Processos Inflamatórios Vesicais. 
· Incontinência Urinária: é a perda involuntária de urina por extravasamento, devido a retenção urinária crônica. As principais causas são: Hipertrofia prostática benigna, bexiga neurogênica. 
Alterações do volume urinário 
O volume urinário diário, no adulto, varia usualmente entre 700 e 2.000 ml. Toda vez que a diurese nas 24 horas é inferior a 400 ml nós podemos afirmar que há um comprometimento funcional ou orgânico do rim. Por outro lado, uma diurese normal não indica, de maneira alguma, uma função renal normal e integridade orgânica do rim.
· Oligúria: volume urinário inferior ou igual a 400 ml/dia. Principais causas: Estados hipovolêmicos; Insuficiência cardíaca congestiva; Cirrose hepática; Lesão glomerular (Glomerulonefrite difusa aguda, Necrose cortical bilateral), Lesão tubular (Necrose tubular) e Lesão obstrutiva. 
· Poliúria: consiste no aumento do volume urinário (volume urinário superior a 2500 mL por dia). Como o volume de cada micção está limitado pela capacidade vesical, verifica-se um maior número de micções. Inclusive à noite. Os dois mecanismos básicos de poliúria são por diurese osmótica (decorrente da excreção de um volume aumentado de solutos, determinando maior excreção de água, como na diabetes mellitus) ou por incapacidade de concentração urinária (diabetes insipidus, hipopotassemia). Principais causas: Polidipsia psicogênica; Diabetes Mellitus e Insipidus (Síndrome caracterizada por poliúria importante devido a uma insuficiência do sistema neuro-hipofisário em produzir ou liberar hormônio antidiurético- ADH) Insipidus nefrogênica (Falta de resposta dos túbulos renais ao ADH circulante); Insuficiência renal crônica; Anemia falciforme. 
· Anúria: diurese inferior a 100 mL/dia. Ocorre na obstrução bilateral das artérias renais ou dos ureteres e na necrose cortical bilateral.
Alterações na coloração da urina 
A coloração normal da urina pode variar desde um amarelo-claro, quando diluída, até um amarelo-escuro, quando concentrada. 
Quando o paciente não está tomando drogas e quando não pode ser atribuída aos alimentos ingeridos, uma alteração na coloração da urina é indício de uma enfermidade, que se traduz pela presença de certos pigmentos na urina. 
· Hematúria: a hematúria é um achado que, independente da manifestação associada, sempre deve ser valorizada. Significa a presença de sangue na urina, podendo ser micro ou macroscópica. A hematúria pode ser maciça, inclusive com o aparecimento de coágulos. É importante determinar se a hematúria é total (lesões renais ou ureterais), inicial (lesões da uretra distal ou cólon vesical ou terminal (lesões do trígono vesical). As causas mais importantes são: ITU, Cálculos, Hematúria silenciosa (até que prove o contrário é câncer), Doenças Hemolíticas, Pós-esforço. 
· Urina turva: é normal e pode ser diferenciada da piúria com a acidificação da urina, que determina o clareamento da turvação determinada pela fosfatúria. Principais causas: Piúria (Bactérias e leucócitos); Sais de fosfato amorfo em urina alcalina.
· Hemoglobinúria: Hemólise intravascular. 
· Mioglobinúria: Necrose ou queimaduras extensas. 
· Bilirrubinúria: Afecções hepatobiliares (Coloração amarelo-esverdeada).
Dor renal 
Situa-se no flanco ou na região lombar e, às vezes, pode irradiar-se anteriormente. Origina-se a partir de distensão da cápsula renal, quando há obstrução do fluxo urinário (litíase renal) ou em condições que causam edema do parênquima renal (pielonefrite aguda). Uma irritação da pélvis renal ou do ureter causa dor em flanco e hipocôndrio, com irradiação para a fossa ilíaca do mesmo lado e frequentemente para o testículo ou lábio genital. Deve ser diferenciada de outras patologias osteomusculares e neurológicas. 
Edema
O relato de edema constitui uma manifestação marcante nas doenças renais agudas e crônicas. O edema que surge nas doenças renais resulta de diferentes mecanismos patogênicos e tem características semiológicas próprias.
Qualquer que seja a causa do edema, ele implica um excesso de água e sal, o que causa um aumento do componente extravascular do volume extracelular. O edema é geralmente percebido nas extremidades inferiores mas isto se deve simplesmente a ação da gravidade pois no paciente em decúbito dorsal ele é facilmente percebido em outros sítios. 
· O edema da glomerulonefrite é generalizado, sendo mais intenso na região periorbitária pela manhã. No final do dia acomete os membros inferiores. Em crianças, o aparecimento de edema costuma ser súbito, podendo ser acompanhado de manifestações de ICC.
· Na glomerulonefrite crônica, a presença e a intensidade do edema são muito variáveis, podendo estar ausente ou manifestar-se apenas como edema periorbitário pela manhã. 
· O edema da síndrome nefrótica é generalizado, mais intenso que na glomerulonefrite, podendo chegar à anasarca, com intenso edema facial. Devido à glomerulopatia, ocorre um aumento da permeabilidade glomerular na síndrome nefrótica, gerando quadros de hipoalbuminemia. Isso reduz a pressão coloidosmótica do plasma, reduzindo o volume plasmático (o que faz, por meio do sistema renina angiotensina, uma maior retenção de água, reduzindo ainda mais a pressão coloidosmótica) e aumentando o líquido intersticial (gerando o edema). 
· O edema da insuficiência renal crônica é muito variável, na dependência da causa determinante. 
· Na insuficiência renal aguda, o edema decorre geralmente da hiper-hidratação. 
História Pregressa 
· Hipertensão arterial: A época da detecção da hipertensão arterial é importante na formulação da patogenia da nefropatia. Se a hipertensão já existia, é possível que ela tenha lesado o parênquima renal com o decorrer do tempo, causando uma nefropatia crônica. Por outro lado, o seu aparecimento mais recente pode indicar ser ela a consequência de uma nefropatia crônica que se tenha instalado lenta e progressivamente. 
· Diabetes mellitus: 30 a 50% dos diabéticos insulino-dependentes e 10 a 15% dos diabéticos não insulinodependentes vão apresentar nefropatia diabética, com um pico de incidência entre os 14 e os 16 anos de duração do diabetes. 
· Colagenoses: Lúpus Eritematoso Sistêmico,Esclerodermia, Poliartrite nodosa.
· Hipercalcemias e hiperuricemias: Podem levar a precipitação de cristais no parênquima renal ou no lume tubular, causando litíase renal ou nefrite intersticial. 
· Infecções: Estreptococos beta-hemolíticos - Infecções de orofaringe ou da pele causadas por estes agentes podem ter como complicação o desenvolvimento de glomerulonefrite aguda. 
· Traumatismo ou cirurgia prévia;
· Procedência do paciente.
 
História mórbida familiar 
· Síndrome de Alport;
· Rim em esponja;
· Rim policístico.
Exames Complementares 
Como forma de enriquecer ainda mais os dados coletados durante o exame clínico, devemos lançar mão de alguns exames complementares básicos, seja de urina ou de sangue. Contudo, nunca podemos desvencilhar a clínica dos exames laboratoriais. Os principais exames complementares em nefrologia são: Sumário de Urina, Hemograma, Bioquímica (Uréia, Creatinina, Cálcio, Fósforo, Ácido úrico, Sódio, Potássio, Cloro), USG renal (descreve apenas alterações anatômicas que podem reportar algum dado clínico). 
Exames laboratoriais 
· pH: O pH normal varia de 4,5 a 7,8. Contudo, o pH não identifica nem exclui doença renal. A urina alcalina (pH > 7) pode sugerir infecção por organismos que desdobram a uréia, mas também ocorre por contaminação de urina guardada por muito tempo, pela dieta vegetariana, diuréticos, vômitos, sucção gástrica e terapia com substâncias alcalinas. Uma maior ingestão de carne produz urina ácida devido a maior formação de uréia. 
· Bilirrubina e Urobilinogênio;
· Estase leucocitária e nitritos: A pesquisa de infecção urinária através do screening com o uso de fitas reativas é realizada através da detecção de granulócitos urinários que sofreram lise e da pesquisa de nitrito na urina. 
A esterase liberada pelos granulócitos reage com sais da fita resultando numa cor rosa ou roxa. Falso-positivos ocorrem quando há contaminação vaginal, e a reação pode ser inibida na presença de excesso de glicose, albumina, ácido ascórbico, tetraciclina, cefalexina, cefalotina ou ácido oxálico. 
Os nitritos são formados a partir da conversão de nitratos pelas bactérias da urina e reage com a fita resultando numa cor rosa. Resultados falso-negativos ocorrem quando a urina é armazenada por muito tempo e na presença de infecção por bactérias Streptococcus faecalis, Neisseria gonorrheae e Mycobacterium tuberculosis. 
· Glicose: Como o limiar renal de glicose é de 160 a 180 mg/dl, a presença de glicose na urina geralmente indica glicemia acima de 210 mg/dl. 
· Corpos cetônicos: Acetoacetato e acetona podem aparecer na urina em jejum prolongado e na presença de cetoacidose alcoólica ou diabética. 
· Hemoglobina e mioglobina; 
· Densidade urinária: A densidade urinária avalia a concentração de solutos na urina e normalmente varia de 1,003 a 1,030. 
· Proteinúria: Diariamente, menos de 150 mg de proteína são excretadas na urina, das quais a maior parte é composta por uma mucoproteína de alto peso molecular (Tamm-Horsfall) e o restante é composto por globulinas e muito pouca albumina. 
As proteínas que são filtradas pelos glomérulos, especialmente aquelas de baixo peso molecular, geralmente são absorvidas no túbulo distal. As moléculas do mesmo tamanho ou maiores que a albumina plasmática não atravessam o glomérulo normal.
Entre os mecanismos propostos para se explicar a proteinúria destacam-se o aumento da filtração glomerular de proteínas, a diminuição na remoção da proteína filtrada e a adição de proteínas por ductos tubulares ou linfáticos renais. 
Todavia, a proteinúria nem sempre indica patologia. Cerca de 3 a 5% dos jovens sadios podem apresentar uma proteinúria discreta (< 1,0 g/dia) durante o dia que desaparece durante a noite (proteinúria postural).
Da mesma maneira, a proteinúria funcional refere-se a proteinúria que aparece com exercício físico, febre, exposição ao frio ou calor e, provavelmente, insuficiência cardíaca congestiva. 
A determinação quantitativa pode ser feita através da avaliação da urina em 24 horas ou através da relação entre a quantidade de proteína e a quantidade de creatinina numa amostra de urina. Normalmente, a relação proteinúria/creatinina é menor que 0,1. Uma relação maior que 3,0 - 3,5 indica excreção proteica maior que 3,0 - 3,5 g/24 horas e uma relação menor que 0,2 indica menos de 0,2 g/24 horas. 
 
· Sedimento urinário: Normalmente, um pequeno número de células e outros elementos formados podem ser detectados na urina como, por exemplo: Células sanguíneas (Eritrócitos, Leucócitos, Linfócitos, Plasmócitos); Células do trato urinário (Células tubulares renais, Células transicionais ou escamosas da bexiga); Células estranhas (Bactérias, Fungos, Parasitas, Células neoplásicas); Cristais (Oxalato, Fosfatos, Uratos, Drogas). 
Na presença de uma enfermidade, o número desses elementos aumenta. Nas nefropatias, as células epiteliais degeneram e são excretadas em grande número, particularmente quanto há proteinúria intensa.
Os elementos do sedimento urinário de maior importância na distinção entre nefropatia primária e doenças do trato urinário baixo são os cilindros, que são massas alongadas (cilíndricas) e de material aglutinado formadas usualmente nas partes distais dos néfrons, onde a urina é concentrada. 
A desidratação e o aumento da concentração do líquido tubular favorece a formação de cilindros. 
Os cilindros podem ser classificados em cilindros simples (sem inclusões) e cilindros com inclusões. Dentre os cilindros simples nós temos o cilindro hialino, constituído pela mucoproteína de TammHorsfall; o cilindro epitelial, formado de células epiteliais tubulares sem muita matriz proteica; o cilindro leucocitário, contendo leucócitos; o cilindro eritrocitário, contendo hemácias; o cilindro graxo, que é um cilindro hialino impregnado com gotículas de gordura; e outros.
3. SÍNDROMES GLOMERULARES 
Constituem diversos processos patológicos que afetam principalmente o glomérulo, no entanto, não estão limitadas apenas às glomerulopatias.
As doenças glomerulares podem ser primárias ou secundárias a doenças sistêmicas. As principais categorias patogênicas são as inflamatórias (síndrome nefrítica) e as hemodinâmicas (síndrome nefrótica). A síndrome nefrítica aguda é utilizada como sinônimo da glomerulonefrite aguda. O exemplo mais frequente é o da glomerulonefrite pós-estreptocócica. Existem também as doenças nefríticas crônicas (por exemplo, síndrome nefrítica-proteinúrica crônica).
A síndrome nefrótica é um conjunto de sintomas, sinais e achados laboratoriais devido ao aumento da permeabilidade capilar glomerular. Muitas doenças renais podem levar à doença nefrótica, e as síndromes nefríticas e nefróticas podem ocorrer juntas.
Existem, em cada grupo de doenças, semelhanças estruturais, funcionais e clínicas, devido ao número limitado de maneiras pelas quais um tecido renal responde à lesão, e aos sintomas e sinais que uma doença renal poderá apresentar. Entretanto, apesar das diferenças patológicas poderem fornecer uma compreensão da doença glomerular, as correlações entre as alterações morfológicas e os achados clínicos não são fatores preditivos completamente confiáveis quanto ao prognóstico e a resposta ao tratamento.
Em alguns pacientes com glomerulopatia, as manifestações extra-renais podem ser sugestivas da doença de base (por exemplo, vasculite sistêmica, infecção). Os marcadores sorológicos, como os anticorpos antiestreptocóccico, anticorpos antiglomerulares da membrana basal, auto-anticorpos citoplasmáticos antineutrofílicos (ACAN), anticorpos antinúcleo, crioglobulinas, fator nefrítico C3, baixa dosagem de complementos, ou agregações de IgA-fibronectina, são sugestivas de doença glomerular específica ou pelo menos ajudam a reduzir os diagnósticos diferenciais.
3.1 SÍNDROME NEFRÍTICA
A síndrome nefrítica clássica inclui a presença de hematúria, hipertensão, insuficiência renal e edema. Frequentemente, os componentes individuais da síndrome estão ausentes. A síndrome nefrítica pode ser aguda e transitória (por exemplo, glomerulonefrite pós-infecciosa); fulminante com insuficiência renal de rápida progressão (por exemplo, glomerulonefrite rapidamente progressiva [GNRP]), ou de evolução lenta (por exemplo, nefropatia por IgA). As alterações patológicas, e portanto as manifestações clínicas, frequentemente variam com o tempo.
3.2 SÍNDROME NEFRÍTICA AGUDA - (Glomerulonefrite Aguda; Glomerulonefrite Pós-infecciosa)
É uma síndrome caracterizada patologicamente por alterações inflamatórias difusas no glomérulo, e clinicamente através de início abrupto de hematúria com cilindros hemáticos, proteinúria leve e, frequentemente, hipertensão, edema e uremia.
As doenças que produzem inflamação glomerular aguda são aquelas que se exteriorizam de forma mais exuberante com síndrome nefrítica, caracterizada por edema, hipertensão, hematúria e graus variáveis de insuficiência renal, além de proteinúria pouco intensa (< 3 g/dia). São chamadas de difusas quando o acometimento glomerular ocorre em mais de 50% do total de glomérulos da biópsia, e denominadas focais quando há menos de 50% de glomérulos acometidos. Neste grande grupo de doenças, as causas imunológicas são as mais comuns, como nefrite lúpica, nefropatia por IgA e glomerulonefrite difusa aguda pós-infecciosa. Para o diagnóstico das glomerulopatias mais comuns que se exteriorizam sob a forma nefrítica, alguns aspectos clínico-sorológicos mais importantes estão listados na Tabela 1.
A apresentação clássica da síndrome nefrítica é vista na glomerulonefrite difusa aguda pós-estreptocócica em crianças. Estas crianças geralmente apresentam-se com oligúria, ganho de peso e edema generalizado de apresentação aguda (poucos dias). O exame de urina revela proteinúria, hematúria e, comumente, a presença de cilindros hemáticos. A proteinúria ocorre habitualmente em valor não nefrótico e a albumina sérica é geralmente normal. O volume circulante está aumentado, causando hipertensão e, eventualmente, edema pulmonar sem evidência de doença cardíaca primária.
	Tabela 1 - Testes sorológicos e associações com Síndrome Nefrítica
	Doença
	Associação
	Teste Sorológico
	Glomerulonefrite pós-estreptocócica
	Faringite, impetigo
	ASLO
	Endocardite
	Sopro, febre
	Hemocultura, C3 diminuídos
	Shunt
	Hidrocefalia tratada
	Hemocultura, C3 diminuídos
	Abscesso
	História
	Hemocultura, C3 e C4 normais
	Glomerulopatia da IgA
	Infecções respiratórias
	IgA sérica aumentada
	Lúpus eritematoso sistêmico
	Artrite, rash malar
	FAN/Anti-DNA, C3 e C4diminuídos
3.2.1 Etiologia
O exemplo mais frequente da síndrome nefrítica aguda é a glomerulonefrite pós-estreptocócica (GNPE) devido à infecção por certas cepas nefritogênicas de estreptococos do grupo A e β-hemolítico, como o Tipo 12 (associado à faringite) e Tipo 49 (associado ao impetigo). A doença é mais frequente em crianças > 3 anos e em adultos jovens, porém 5% dos pacientes são > 50 anos. Um período de latência de 1 a 6 semanas (média, 2 semanas) ocorre entre a infecção e o início da glomerulonefrite.
3.2.2 Patologia e Patogênese
As lesões estão localizadas principalmente nos glomérulos, os quais tornam-se alargados e hipercelulares, inicialmente com neutrófilos ou eosinófilos e posteriormente com células mononucleares. A hiperplasia das células epiteliais é um achado frequente, precoce e transitório. Pode haver a microtrombose; se a lesão for grave, as alterações hemodinâmicas vão causar oligúria, frequentemente acompanhada pelo aparecimento de “crescentes” epiteliais (formados dentro do espaço de Bowman pela hiperplasia de células epiteliais, provavelmente mediado pelos fatores de crescimento a partir de macrófagos estimulados). Ocorre um aumento no número de células mesangiais e endoteliais, e as regiões mesangiais frequentemente tornam-se alargadas pelo edema e contêm neutrófilos, células mortas, restos celulares e depósitos subepiteliais de material eletrodenso.
A microscopia por imunofluorescência geralmente demonstra a presença de depósitos de imunocomplexos com IgG e C distribuídos num padrão granuliforme. À microscopia eletrônica estes depósitos são semilunares ou de forma arredondada e estão localizados na região subepitelial. A presença destes depósitos inicia uma resposta inflamatória mediada por C, que leva à lesão glomerular. Embora acredite-se que o complexo imune contenha um antígeno relacionado aos microrganismos estreptocócicos, nenhum destes antígenos foi encontrado.
3.2.3 Sintomas e Sinais
As manifestações clínicas variam desde a hematúria assintomática (em torno de 50%) e proteinúria leve até uma nefrite completa com hematúria macro ou microscópica (cor de “coca-cola”, marrom, esfumaçada, ou francamente hematúrico), proteinúria, oligúria, edema, hipertensão e insuficiência renal.
Em 10% dos adultos e 1% das crianças, a síndrome nefrítica aguda evolui para a glomerulonefrite rapidamente progressiva (GNRP). Nos pacientes com a doença em fase de remissão, a proliferação celular nos rins desaparece dentro de semanas, mas a intensidade da resposta inflamatória é bastante variável, e a esclerose residual é comum. A maioria das crianças (85 a 95%) mantêm ou readquirem uma função renal normal, principalmente se a doença foi adquirida durante uma infecção por estreptococos. Raramente, somente em alguns casos esporádicos e em adultos, ocorre apenas a recuperação parcial da função renal. A hematúria ou proteinúria detectadas ao exame de urina, podem persistir durante anos. 
3.2.4 Achados Laboratoriais e Diagnóstico
O sedimento urinário contém eritrócitos dismórficos, leucócitos e células tubulares renais; cilindros contendo hemácias e hemoglobina são característicos, e os cilindros leucocitários e granulosos (de proteína) são comuns.
O título de anticorpos contra o agente infeccioso causal geralmente eleva-se em 1 a 2 semanas. O aumento de anticorpos aos produtos antigênicos estreptocócicos pode ser dosado: a antiestreptolisina-O (ASO) é o melhor indicador de infecção do trato respiratório superior, e anti-hialuronidase e antidesoxirribonuclease-B, de piodermatites. C3 e C4 geralmente estão diminuídos durante a fase ativa da doença. Os níveis do complemento retornam ao normal dentro de 6 a 8 semanas em 80% das glomerulonefrite pós-estreptocócica (GNPE), mas em praticamente nenhum caso de glomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP). A crioglobulinemia geralmente persiste por vários meses, enquanto os imunocomplexos circulantes são detectáveis durante somente algumas semanas.
Frequentemente, a função tubular é modificada pelas alterações inflamatórias no interstício, levando a uma redução na capacidade de concentração urinária, excreção de ácidos e distúrbios variados da troca de solutos no néfron. Como existe alguma capacidade inerente de hipertrofia glomerular, tais defeitos na função tubular geralmente ocorrem antes que a TFG fique muito reduzida. Entretanto, à medida que ocorre a progressão do desarranjo glomerular, a superfície total de filtração é significativamente reduzida, há queda da TFG, e surge a uremia.
A TFG pode ser estimada pela concentração de creatinina sérica ou pelo “clearance” de creatinina urinária. Embora a TFG geralmente volte ao normal após 1 a 3 meses, a proteinúria poderá persistir por 6 a 12 meses e a hematúria microscópica por vários anos. Alterações transitórias do sedimento urinário podem recidivar na presença de pequenas infecções do trato respiratório superior.
Uma história de dor de garganta, impetigo, ou infecção estreptocóccica comprovada por cultura 1 a 6 semanas antes do início da síndrome, além de uma elevação no título sérico de anticorpos antiestreptocócicos, auxilia no diagnóstico. A presença de cilindros eritrocitários é patognomônico em qualquer glomerulonefrite porém, quando associada ao quadro clínico, é um forte indício de síndrome nefrítica aguda. A ultrassonografia poderá auxiliar a distinguir a doença aguda (geralmente rins normais ou discretamente aumentados) de uma exacerbação da doença crônica (rins pequenos).
3.2.5 Prognóstico 
O prognóstico depende da idade do paciente, se a infecção é do tipo esporádica ou epidêmica, e a fase de lesão renal quando ocorreu a remissão do estímulo inflamatório. O prognóstico geralmente é bom quando a lesão renal inicial não é grave e a origem antigênica pode ser reduzida ou removida. 
Na maioria dos pacientes, os sintomas e sinais vão reduzindo-se gradativamente. Nos casos graves, as complicações incluem hipertensão, com ou sem insuficiência cardíaca e encefalopatia hipertensiva. 
Uma redução acentuada na TFG ou o aparecimento de síndrome nefrótica (em aproximadamente 30% dos pacientes, principalmente aqueles com muitos depósitos subepiteliais) com formação extensa de crescentes e necrose, são indicativos de uma rápida progressão para insuficiência renal de fase terminal. Em alguns pacientes, o início da doença caracteriza-se por anúria, hipervolemia grave, e hipercalemia; podendo evoluir para o óbito, a não ser que sejam submetidos à diálise.
3.2.6 Tratamento
O tratamento antimicrobiano das infecções antes que ocorra o aparecimento da GNPE não parece prevenir a mesma. Se uma infecção bacteriana está presente ao diagnóstico, a terapia antimicrobiana deverá ser instituída, e quaisquer outras causas secundárias deverão ser tratadas. 
A utilização de drogas imunossupressoras é ineficaz, e o uso de corticosteroides pode piorar o quadro. Se há presença de uremia e acidose metabólica, deverá ser restrita à ingesta de proteínas. A restrição de Na2+ está indicada somente se houver sobrecarga circulatória, edema, ou hipertensão grave; o uso de diuréticos (por exemplo, tiazídicos, diuréticos de alça) poderá auxiliar no controle do volume de líquido extracelular expandido. A hipertensão requer um tratamento rigoroso. A insuficiência renal grave poderá necessitar de diálise.
Tabela 2- Terapia para Doença Glomerular
3.2.7 Causas secundárias não bacterianas da síndrome nefrítica aguda
A síndrome nefrítica aguda também pode ocorrer após infecções virais, parasitárias, e, ocasionalmente, após infecções fúngicas. As manifestações clínicas e de patologia renal destas outras formas de síndrome nefrítica podem ser semelhantes àquelas da GNPE (com as corcovas subepiteliais) ou à GNMP Tipo I (com os depósitos mesangiais ou subendoteliais). Pode haver um envolvimento renal de largo espectro; as manifestações sistêmicas frequentemente imitam outras doenças (por exemplo, poliarterite nodosa, êmbolos renais, nefrite intersticial aguda induzida por antibioticoterapia). A GN do LES pode ocorrer, porém é mais comum o seu aparecimento com a síndrome nefrótica.
Estas outras formas de síndrome nefrítica aguda geralmente são mais fáceis de diagnosticar do que a GNPE, pois elas apresentam um período de latência muito mais curto ou estão presentes quando a infecção é evidente. No entanto, a nefrite causada pela endocardite bacteriana subaguda (EBS) é difícil de diagnosticar, principalmente quando as hemoculturas são negativas.
A gravidade das manifestações clínicas está relacionada à duração da infecção; por exemplo, a síndrome nefrítica aguda secundária a uma prótese vascular infectada tem um bom prognóstico se a infecção (geralmente por Staphylococcus epidermidis) puder ser erradicada. Isto frequentemente requer a remoção da prótese e antibioticoterapia. No entanto, a insuficiência renal pode ser irreversível em pacientes com doença renal pregressa ou quando o tratamento foi tardio e a lesão extensa (presença de crescentes, necrose).
3.3 GLOMERULONEFRITE RAPIDAMENTE PROGRESSIVA - (Glomerulonefrite em Forma de Crescente)
É uma síndrome caracterizada patologicamente por necrose focal e segmentar, e proliferação celular epitelial (crescentes) na maioria dos glomérulos, e clinicamente por insuficiência renal fulminante associada à proteinúria, hematúria e cilindros hemáticos.
Aqui as manifestações são as de síndrome nefrítica, mas associadas à perda rápida da função renal (dias ou semanas). A lesão histológica responsável pela natureza agressiva da lesão é a crescente glomerular. A crescente decorre da proliferação das células epiteliais da cápsula de Bowman, promovida pelo intenso processo inflamatório que ocorre no glomérulo, sendo o macrófago uma célula particularmente importante em sua gênese. Quando há mais de 50% de glomérulos acometidos por crescentes, o diagnóstico histopatológico é de glomerulonefrite crescêntica, que se expressa clinicamente por perda rápida e intensa da função renal. Portanto, existe correlação clínica entre número de crescentes e gravidade da doença. Assim, doenças com mais de 80% de crescentes se exteriorizam, geralmente, por insuficiência renal dialítica. A causa mais comum desta forma de glomerulonefrite crescêntica é a vasculite. Doenças de imunocomplexos, como nefropatia de IgA e nefrite lúpica, expressam-se mais comumente com número menor de crescentes e, portanto, quadro clínico renal mais brando. A resolução (involução) dos crescentes depende, entre outros fatores, da sua idade histológica, ou seja, sua natureza epitelial ou fibroblástica. No entanto, outros fatores também participam deste processo, já que crescentes da mesma “idade” histológica em nefrite lúpica revertem mais facilmente ao tratamento do que os de nefropatia por IgA.
São três os grupos mais frequentes de doenças que se apresentam como glomerulonefrite rapidamente progressiva: glomerulonefrite antimembrana basal glomerular, glomerulonefrite de imunocomplexos e glomerulonefrite relacionada a ANCA. As formas relacionadas a ANCA podem se apresentar com manifestações sistêmicas de Wegener, poliangeíte microscópica e Churg-Strauss, ou ter manifestação exclusivamente renal. A forma relacionada ao anticorpo antimembrana basal glomerular pode se apresentar como doença de Goodpasture ou sem sinais de comprometimento pulmonar. As doenças de imunocomplexos mais comumente encontradas são a nefrite lúpica, a crioglobulinemia (sendo a forma mais comum à secundária ao vírus da hepatite C) e a nefropatia da IgA. Para o diagnóstico das doenças glomerulares que se apresentam sob a forma rapidamente progressiva, os aspectos clínico e sorológico mais importantes estão na Tabela 3.
	Tabela 3 - Doenças glomerulares que se apresentam como GN rapidamente progressiva
	Doença
	Associação
	Teste Sorológico
	Doença de Goodpasture
	Hemorragia alveolar
	Anticorpo antimembrana basal (anti-MBG)
	Granulomatose de Wegener
	Sinusite, perfuração de septo
	ANCA C (citoplasmático)
	Poliangeíte microscópica
	Envolvimento multissistêmico
ANCA P (perinuclear)
	Vasculite pauci-imune
	Somente envolvimento renal
	ANCA P (perinuclear)
	Lúpus eritematoso sistêmico
	Envolvimento sistêmico
	FAN/Anti-DNA, C3 e C4 diminuídos
	GN pós-estreptocócica
	Faringite/impetigo
	C3 diminuído, C4 normal e ASLO elevado
	Nefropatia IgA/púrpura de Henoch-Schönlein
	Dor abdominal/púrpura
	IgA sérica aumentada, C3 e C4 normais
	Endocardite
	Sopro/bacteriemia
	Hemocultura, C3 diminuído, C4 normal
3.3.1 Etiologia, Incidência e Classificação
A glomerulonefrite rapidamente progressiva (GNRP) não é comum. A patogênese é geralmente desconhecida, e as causas imediatas são variadas.
A microscopia por imunofluorescência e a biópsia podem classificar a GNRP, embora em alguns casos os achados laboratoriais indicam a presença de mais de uma síndrome.
A GNRP pauci-imune constitui 50% de todos os casos de GNRP e é caracterizada pela ausência de depósitos de imunocomplexo ou C no tecido glomerular. A presença de anticorpos citoplasmáticos antineutrofílicos (ACAN) é um marcador sorológico da GNRP pauci-imune, e vem associada à vasculite sistêmica ou à falta de evidências de doença extra-renal. Os pacientes apresentam anticorpos direcionados contra leucócitos da proteinase 3 (ACAN-C ou citoplasmático), anticorpos antimieloperoxidase (ACAN-P ou perinuclear), ou contra ambos.
O imunocomplexo da GNRP está presente em 40% dos casos de GNRP e aparentemente é idiopático, mas a penicilamina, sífilis e doenças malignas têm sido associadas em alguns pacientes. Geralmente há evidências de doenças sistêmicas, como o LES, púrpura de Henoch-Schönlein e crioglobulinemia mista. Em alguns pacientes, a GNRP pode estar sobreposta em outras doenças renais primárias (por exemplo, GNMP, nefropatia por IgA, nefropatia membranosa).
A doença de anticorpo anti-MBG auto-imune ocorre em 10% dos casos de GNRP e é idiopática. O antígeno primário é um componente do colágeno do Tipo IV. As células T auto-reativas também podem contribuir com o desenvolvimento dos anticorpos anti-MBG nos glomérulos e alvéolos. Anticorpos contra a MBG estão presentes no sangue e podem ser vistas na MBG através da microscopia com imunofluorescência. Em 60 a 90% dos pacientes, os anticorpos apresentam uma reação cruzada com a membrana basal alveolar pulmonar, produzindo uma alveolite que leva à hemorragia pulmonar. A presença de lesão renal com envolvimento pulmonar (por exemplo, influenza, exposição a hidrocarbonetos, tabagismo crônico) sugere uma lesão pulmonar concomitante, permitindo com que os anticorpos circulantes atinjam os alvéolos.
3.3.2 Patologia
A proliferação focal de células epiteliais glomerulares, em alguns casos entremeadas por numerosos neutrófilos, formam uma massa celular em crescente, preenchendo o espaço de Bowman em 50 a 100% dos glomérulos renais. O tufo glomerular geralmente torna-se hipocelular e colaba. A necrose no interior do tufo ou envolvendo o crescente não é incomum e pode ser a anormalidade mais proeminente. Em tais pacientes, deve-se procurar evidências histológicas de vasculite.
O edema intersticial geralmente é um achado precoce evidente. É do tipo difuso e associado à infiltração de diversos tipos de células inflamatórias; quando o edema é extenso, há predomínio de células mononucleares. As alterações iniciais nos túbulos incluem a formação de vacúolos e gotículas hialinas, além de cilindros hemáticos e hialinos ocasionais nos túbulos distais. Conforme a doença progride, há atrofia e espessamento da MBG. Posteriormente, o interstício torna-se difusamente fibrosado e há redução no número de células inflamatórias.
A deposição linear de IgG (geralmente associada ao arranjo segmentar de C3) ao longo da MBG é a anormalidade mais proeminente observada na microscopia de fluorescência, mas este padrão é inconstante e inespecífico, ocorrendo também na nefropatia diabética e GN fibrilar. No entanto, nestas doenças, a deposição de IgG é inespecífica e com crescentes, há ausência de anticorpos anti-MBG circulantes, e outros achados histológicos são dignos de nota (glomeruloesclerose, presença de fibrilas à microscopia eletrônica na GN fibrilar).
Na GNRP grave por imunocomplexo, existem depósitos irregulares difusos de IgG e C3, comumente com proliferação de células intraglomerulares e formação de crescentes. Em outros casos, não se detectam depósitos de Ig ou complemento. Entretanto, observa-se a presença de fibrina nos crescentes, independentemente do padrão de fluorescência.
3.3.3 Sintomas e Sinais
	A apresentação clínica pode ser semelhante à da doença aguda não progressiva, mas o início é geralmente mais insidioso. Fraqueza, fadiga e febre são os sintomas mais proeminentes; náuseas, vômitos, anorexia, artralgias e dor abdominal também são comuns. Aproximadamente 50% dos casos apresentam edema e uma história de doença aguda tipo influenza nas 4 semanas anteriores ao início da insuficiência renal; esta geralmente é seguida de oligúria intensa. Alguns pacientes apresentam uma história de proteinúria. A hipertensão é incomum e raramente grave. Ocasionalmente, a GNRP está associada a manifestações pulmonares.
3.3.4 Achados Laboratoriais e Diagnóstico
É típica a presença de uremia em graus variados. A hematúria, geralmente macroscópica, sempre está presente. Os cilindros hemáticos são invariáveis, e é comum a presença de um sedimento “telescópico” (cilindros leucocitários, granulares, céreos e densos). A anemia, algumas vezes grave, é um achado constante e a leucocitose é comum.
A GNRP pauci-imune é sugestiva naqueles pacientes com títulos elevados de ACAN. A granulomatose de Wegener está associada com ACAN-C em 90% dos casos, sendo que a GN necrosante idiopática está associada com a ACAN-P em cerca de 80% dos casos. A poliarterite microscópica apresenta uma distribuição relativamente igual entre a ACAN-C e a ACAN-P.
A presença de imunocomplexo da GNRP é sugerida pela elevação do título de anticorpos ao estreptococo, imunocomplexos circulantes, ou crioglobulinemia. A hipocomplementemia é incomum na nefrite por anticorpo anti-MBG, mas é comum na GNRP por imunocomplexo. A análise sérica de anticorpos circulantes anti-MBG é útil, quando positiva; os anticorpos tendem a desaparecer dentro de 3 a 6 meses. À ultra-sonografia ou exame radiológico (sem contraste), os rins podem inicialmente parecer grandes, porém tornam-se progressivamente menores.
A biópsia renal feita no início do quadro suspeito de GNRP é essencial para a definição no diagnóstico, estimar-se o prognóstico, e planejar um tratamento. A realização de sorologias e a investigação para doenças infecciosas também devem ser realizadas.
3.3.5 Prognóstico e Tratamento
Se a síndrome é idiopática, a remissão espontânea é rara; 80% dos pacientes não tratados progridem para um estágio terminal de insuficiência renal dentro de 6 meses. A anúria irreversível é comum e, sem a diálise, a morte ocorre em algumas semanas. No entanto, a função renal poderá melhorar com o tratamento, se a GN pós-infecciosa, LES, granulomatose de Wegener ou poliarterite nodosa forem as causas. Os pacientes que acabam se restabelecendo, voltando a apresentar função renal normal, apresentam alterações histológicas, principalmente nos glomérulos, consistindo principalmente de hipercelularidade, com pouca ou nenhuma esclerose nos tufos glomerulares ou nas células epiteliais e fibrose mínima do interstício. O prognóstico é precário nos pacientes > 60 anos de idade com insuficiência renal oligúrica, ou naqueles onde >75% dos glomérulos contêm crescentes circunferenciais.
Quando se encontra doença grave com crescentes na biópsia sem perda glomerular extensa, lesões túbulo-intersticiais, ou doenças infecciosas ou multissistêmicas, o tratamento medicamentoso deverá ser iniciado o mais precocemente possível (creatinina sérica < 5mg/dL [< 440μmol/L]), quando a eficácia é máxima. Em pacientes não portadores de doença com anticorpo anti-MBG, que inicialmente necessitam de diálise também podem beneficiar-se desta terapia. A terapia de pulso com metilprednisolona (1g ao
dia IV por 30min durante 3 a 5 dias, seguida de prednisona oral 1mg/kg ao dia) poderá reduzir os níveis de creatinina sérica ou adiar a necessidade de diálise por > 3 a em 50% dos pacientes com GN pauci-imune ou GN por imunocomplexos. Pacientes ACAN-positivo poderão beneficiar-se com a introdução de ciclofosfamida oral na dosagem 1,5 a 2mg/kg ao dia. A ciclofosfamida mensal em pulsos poderá reduzir os efeitos colaterais, mas o seu papel ainda não está bem definido.
Quando a resposta à terapia medicamentosa é ineficaz ou incompleta, a plasmaferese é utilizada para remover anticorpos livres, imunocomplexos intactos, e mediadores da inflamação (por exemplo, fibrinogênio, complemento). A realização de plasmaferese utilizando trocas de 4L diários durante 14 dias é considerada como o tratamento de escolha na nefrite por anticorpos anti-MBG. Geralmente, trocas com 3 a 4L são realizadas diariamente durante 4 a 6 dias na GNRP pauci-imune ou por imunocomplexos. A utilização de prednisona e ciclofosfamida minimiza a formação de novos anticorpos. Uma monitoração cuidadosa deve ser realizada durante a plasmaferese, devido à chance de ocorrerem infecções potencialmente letais e efeitos colaterais das drogas.
A diálise de manutenção deve ser substituída posteriormente pelo tratamento da doença renal primária. O transplante renal apresenta o risco de desenvolvimento da doença de base no rim transplantado.
3.4 SÍNDROME RENAL HEMATÚRICA-PROTEINÚRICA PRIMÁRIA
É um grupo de distúrbios geralmente caracterizado por episódios recorrentes de hematúria macroscópica, proteinúria leve, e alterações glomerulares.
A nefropatia por IgA, a mais importante do grupo renal primário, ocorre em todas as idades, porém é mais comum em crianças e adultos jovens. Afeta 6 vezes mais o sexo masculino do que o feminino e é rara em negros. Sua prevalência comparada com todas as doenças glomerulares primárias é de 5% nos EUA, 10 a 20% no sul da Europa e Austrália e 30 a 40% na Ásia. 
3.4.1 Patogênese
Aproximadamente 50% dos pacientes com hematúria renal recorrente demonstram depósitos mesangiais proeminentes de IgA, e aproximadamente a metade destes pacientes apresenta IgA sérica aumentada. Têm sido relatadas também alterações em subgrupos de células T. Evidências sugerem que a nefropatia por IgA ocorra devido a uma produção aumentada ou por um “clearance” diminuído de complexos de antígeno-polimérico por IgA, que estão no interior do mesângio, e ativam a via clássica do complemento. A IgA polimérica, supostamente é derivada de superfícies mucosas ricas em IgA.
3.4.2 Sintomas, Sinais e Achados Laboratoriais
A forma mais comum de apresentação é a hematúria macroscópica recorrente ou persistente (90% das crianças acometidas) ou hematúria microscópica assintomática com proteinúria (não nefrótica) leve. A hematúria pode ser leve ou grave, mas geralmente é dismórfica. Às vezes, pode haver a proteinúria sem a hematúria. Embora muitos pacientes não sejam realmente assintomáticos quando a anormalidade urinária é detectada pela primeira vez, poucos sintomas podem ser prontamente atribuídos ao rim.
A função renal é inicialmente normal, mas a doença renal sintomática poderá intervir. Alguns pacientes podem apresentar insuficiência renal aguda ou crônica, hipertensão grave ou síndrome nefrótica (SN). A síndrome hematúrica-proteinúrica renal primária geralmente começa 1 ou 2 dias após uma doença febril (trato respiratório alto, sinusal, enteral), simulando, assim, a síndrome nefrítica aguda, exceto pelo fato de o início da hematúria ser coincidente com a doença febril e pode estar acompanhado por uma dor lombar. 
A proteinúria leve (< 1g ao dia) é típica, mas a SN pode se desenvolver em < 20% dos pacientes com nefropatia por IgA. A hematúria microscópica, geralmente com eritrócitos dismórficos, está sempre presente, mas os cilindros eritrocitários são infrequentes, pelo menos inicialmente. Há um aumento na excreção urinária de repligen e interleucina-6. Os níveis séricos de creatinina e complemento C geralmente são normais, mas a concentração de IgA está comumente aumentada. Os complexos séricos de IgA fibronectina podem estar aumentados, mas este achado é de valor duvidoso. A hipertensão é rara no momento do diagnóstico.
3.4.3 Diagnóstico
A hematúria macroscópica é o sintoma usual da nefropatia por IgA e síndrome de Alport, sendo que a hematúria microscópica persistente é mais comum na nefropatia de membrana basal fina. A GN mesangial proliferativa está associada a um padrão de lesão glomerular caracterizado por diferentes graus de hipercelularidade mesangial ou expansão de matriz mesangial; frequentemente, depósitos mesangiais de imunocomplexos são detectados. 
Existem ainda, muitas outras alterações heredofamiliais, imunológicas, e infecciosas bem caracterizadas que se encaixam nesta descrição morfológica.
A nefropatia por IgA pode ser diferenciada das outras causas de hematúria renal primária através de estudo por imunofluorescência de biópsia de tecido renal demonstrando a presença de depósitos granulares de IgA e C3 no mesângio expandido com focos de proliferação segmentar ou lesões necrosantes. No entanto, os depósitos mesangiais de IgA também podem ocorrer em outras doenças (por exemplo, púrpura de Henoch-Schönlein, cirrose hepática alcoólica crônica).
3.4.4 Prognóstico e Tratamento
A nefropatia por IgA geralmente progride lentamente; ocorre o desenvolvimento de insuficiência renal e hipertensão dentro de 10 anos em 15 a 20% dos casos. A evolução para a insuficiência renal de fase terminal ocorre em 25% dos pacientes após 20 anos. Quando a nefropatia por IgA é diagnosticada durante a infância, o prognóstico geralmente é bom. No entanto, a hematúria persistente invariavelmente leva à hipertensão, proteinúria e insuficiência renal. 
O início da doença em idade mais avançada, hipertensão, proteinúria maciça persistente, ausência de hematúria macroscópica recorrente, níveis elevados de creatinina sérica, glomeruloesclerose avançada ou formação de crescentes e doença túbulo-intersticial são achados de prognóstico desfavoráveis.
O tratamento não é muito eficaz, devendo ser reservado apenas para aqueles pacientes com prognóstico ruim. A utilização de gorduras de peixe em altas doses, combinação em baixas doses de dicumarínicos com dipiridamol e uso de inibidores da ECA na dose máxima tolerada, podem retardar o aparecimento da insuficiência renal. 
Outros tratamentos com possíveis efeitos benéficos incluem a utilização de prednisona em baixas doses, por um longo prazo, em dias alternados, em crianças e adultos jovens com função renal inicial normal e a administração de imunoglobulinas IV ou plasmaferese naqueles pacientes com GNRP. A utilização de ciclosporina, combinações entre drogas citotóxicas-prednisona e antibióticos não têm demonstrado benefícios.
O transplante renal tem obtido êxito, embora não seja infrequente a evidência imunológica de recidiva da nefropatia por IgA. O acompanhamento nefrológico a longo prazo é essencial.
3.5 SÍNDROME NEFRÓTICA
É uma síndrome complexa e previsível que ocorre após um aumento grave e prolongado da permeabilidade glomerular às proteínas. O principal achado é a proteinúria (> 2g/m2 ao dia ou uma proporção de proteína/ creatinina > 2 em uma amostra de urina), mas também estão presentes, hipoalbuminemia (< 3g/dL), edema generalizado, lipidúria e hiperlipidemia.
Essas anormalidades são consequência de uma filtração glomerular deficiente, que pode ser causada por uma variedade de processos patológicos, incluindo doenças imunológicas, intoxicação, anormalidades metabólicas, defeitos bioquímicos e distúrbios vasculares. 
Assim a síndrome nefrótica é o desfecho comum de uma variedade de processos patológicos que alteram as propriedades de permeabilidade da parede capilar glomerular.
3.5.1 Etiologia e Classificação
A síndrome nefrótica (SN) ocorre em qualquer idade, mas tem maior prevalência em crianças do que nos adultos; nas crianças, é mais comum entre as idades de 1,5 e 4 anos. Existe uma predileção
pelo sexo masculino nos jovens, mas há uma distribuição mais equilibrada entre os sexos nos pacientes mais velhos. 
Acredita-se que a proteinúria ocorra através do desarranjo funcional de dois mecanismos: a barreira tamanho-seletiva deixa escapar grandes moléculas proteicas, e a barreira carga-seletiva apresenta falha na retenção de proteínas de baixo peso molecular.
Dentro das causas primárias estão inclusas a doença com alterações mínimas, glomeruloesclerose segmentar focal (GSSF), glomerulonefrite membranosa (GNM), glomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP), e a glomerulonefrite (GN) mesangial proliferativa. A síndrome nefrótica também pode ser devido a causas secundárias.
	Tabela 4- Principais causas de Síndrome Nefrótica 
	
· Idiopáticas
- Doença de alterações mínimas 
- Glomerulonefrite mesangioproliferativa
- Glomeruloesclerose segmentar e focal com hialinose
- Glomerulonefrite membranosa 
- Glomerulonefrite membranoproliferativa (Tipo I, Tipo II e Outras variantes) 
Outras lesões incomuns:
-Glomerulonefrite crescente
-Glomerulonefrite proliferativa segmentar e focal
- Glomerulonefrite fibrilar 
- Glomerulopatia imunotactóide
	
· Doenças sistêmicas 
- Infecções 
- Glomerulonefrite pós-estreptocóccica 
- Endocardite
- Nefrite por shunt 
- Sífilis secundária
- Lepra 
- Hepatite B e C 
- HIV 
- Mononucleose
- Malária 
- Esquistossomíase
- Filariose 
 
· Neoplasia 
- Doença de Hodgkin 
- Linfomas 
- Leucemia 
- Carcinomas (Pulmão, Mama, Cólon) 
- Melanoma 
- Tumor de Wilms 
 
· Doenças multisistêmicas 
- Diabetes mellitus 
- Lupus Eritematoso Sistêmico 
- Púrpura de Henoch-Schönlein 
- Vasculite 
- Dermatomiosite 
- Dermatite herpetiforme 
- Amiloidose 
- Sarcoidose 
- Síndrome de Sjögren 
- Artrite Reumatóide 
- Doenças mistas de tecido conectivo 
 
· Heredofamiliar 
- Diabetes Mellitus 
- Síndrome de Alport 
- Doença falciforme 
- Doença de Fabry 
- Lipodistrofia 
- Síndrome nefrótica congênita 
 
· Miscelânea 
- Toxemia pré-eclâmptica 
- Glomerulopatia de transplante 
- Tireoidite 
- Mixedema 
- Obesidade maligna 
	· Drogas 
- Ouro orgânico 
- Mercúrio orgânico, inorgânico e elementar 
- Penicilamina 
- Heroína 
- Agentes antiinflamatórios não-esteroidais 
- Probenecide 
- Captopril 
-Tridione 
- Mesantoína 
- Perclorato
A etiologia da síndrome nefrótica inclui praticamente todos os distúrbios que podem afetar o glomérulo. Aproximadamente um terço dos adultos e um décimo das crianças apresentam a síndrome nefrótica como manifestação de alguma doença sistêmica. No restante dos adultos e na maioria das crianças a síndrome nefrótica é idiopática.
3.5.2 Sintomas e Sinais
Um sinal precoce da SN é a presença de urina espumosa. Outros aspectos incluem a anorexia, mal-estar, pálpebras edemaciadas, retinas brilhantes, dor abdominal, perda de musculatura e edema. A presença de anasarca com ascite e derrames pleurais pode ocorrer.
O edema localizado pode ser a razão da consulta ao médico que inclui queixas variadas como dificuldade à respiração (derrame pleural ou edema laríngeo), dor torácica subesternal (derrame pericárdico), edema escrotal, edema nos joelhos (hidroartrose), aumento abdominal (ascite) e em crianças, dor abdominal pode ocorrer em virtude do edema de mesentério. Mais frequentemente, o edema é móvel (por exemplo, detectado nas pálpebras pela manhã e nos tornozelos após a deambulação). A presença do edema pode mascarar a perda de massa muscular. O achado de linhas brancas paralelas ao leito ungueal, pode ser devido ao edema subungueal.
Os adultos podem ser hipotensos, normotensos ou hipertensos dependendo do grau de produção de angiotensina II. A oligúria ou mesmo insuficiência renal aguda podem se desenvolver devido à hipovolemia e perfusão renal diminuída. Pode ocorrer hipotensão ortostática ou até mesmo choque hipovolêmico em crianças.
3.5.3 Complicações
As consequências bioquímicas da proteinúria grave são o principal problema clínico. A SN prolongada pode resultar no aparecimento de deficiências nutricionais, incluindo a desnutrição proteica semelhante ao kwashiorkor; cabelos e unhas quebradiços; alopecia; retardo no crescimento; desmineralização óssea; glicosúria; hiperaminoacidúria de diversos tipos, síndromes de depleção de potássio; miopatias; Ca total diminuído; tetania e hipometabolismo. 
Pode ocorrer a peritonite primária e infecções oportunistas são prevalentes. A alta incidência de infecções parece ser devido à perda urinária de imunoglobulinas. As alterações da coagulação, juntamente com atividade fibrinolítica diminuída e hipovolemia episódica, predispõem a um sério risco trombótico (principalmente, a trombose da veia renal). A hipertensão com complicações cardíacas e cerebrais ocorre geralmente em diabéticos e em pacientes com doença vascular do colágeno.
3.5.4 Achados Laboratoriais
· Urina – O exame inicial de urina mostra uma proteinúria acentuada, com uma excreção > 2g/m2 ao dia ou, simplesmente, uma proporção de proteína/creatinina urinária > 2 em amostra de urina. O sedimento urinário geralmente contém cilindros hialinos, granulares, gordurosos, céreos e de células epiteliais. A lipidúria é detectada através da coloração com Sudan, pela presença de cilindros contendo grânulos lipídicos, identificação de macrófagos e células tubulares renais contendo gotículas de gordura (corpúsculos ovais de gordura), e visualização de cristais anisotrópicos (corpúsculos de gordura com dupla refração) através da microscopia óptica polarizada. Também podem estar presentes, hematúria microscópica e cilindros eritrocitários, dependendo da etiologia da doença glomerular. Os leucócitos são proeminentes nas doenças exsudativas e no LES. Fibrilas de amilóide podem ser observadas à microscopia eletrônica, junto com a nefropatia por amiloidose. O potássio urinário geralmente está elevado na fase acumulativa do edema nefrótico; a concentração do Na urinário frequentemente é < 1mmol/L (proporção K+/Na+ > 1). Ocorre aumento na secreção de aldosterona durante esta fase, podendo estar normal em outras fases apesar do edema constante. As concentrações séricas de nitrogênio ureico ou de creatinina, variam de acordo com o grau de insuficiência renal.
· Sangue – A hipoalbuminemia é detectada através de dosagens químicas ou através da eletroforese quantitativa. A albumina geralmente é < 2,5g/dL e em crianças, é às vezes < 1g/dL. Certas proteínas carreadoras são perdidas na urina de pacientes com nefrose. Geralmente, também estão baixos os níveis de α e γ-globulinas, outras imunoglobulinas, hormônios adrenocortical e tireóideos, assim como os de ceruloplasmina, transferrina, proteína ASO e complemento. A lipemia é detectada através de um aumento dos níveis totais de colesterol e triglicerídeos. Níveis lipêmicos > 10 vezes o valor normal estão associados a uma hipoalbuminemia grave devido ao aumento da produção de lipídeos e redução da sua eliminação.
As coagulopatias são frequentes, talvez devido à perda urinária dos fatores de coagulação IX e XII e fatores trombolíticos (uroquinase e antitrombina III) além do aumento dos níveis séricos de fator VIII, fibrinogênio e plaquetas.
3.5.5 Diagnóstico
O diagnóstico da SN baseia-se nos achados clínicos e laboratoriais, mas a etiologia é confirmada através da biópsia renal. A presença de proteinúria grave é essencial para o diagnóstico. A separação de valores numéricos para proteinúria do tipo nefrótico e não nefrótico é arbitrária. No entanto, as doenças que afetam principalmente a vascularização extraglomerular ou as áreas túbulo-intersticiais geralmente não causam uma proteinúria desta magnitude.
A insuficiência renal raramente é um achado inicial do quadro de SN, porém pode estar presente na SN primária após uma doença prolongada. No entanto, os pacientes portadores de SN secundária frequentemente apresentam a insuficiência renal como quadro inicial ou logo após o início do quadro. Assim, a presença de proteinúria maciça em pacientes nefríticos geralmente indica que a doença está numa fase muito avançada e é, portanto, um sinal desfavorável
da doença.
Os pacientes devem ser triados para detectar doenças sistêmicas de base comuns na SN (por exemplo, diabetes mellitus, amiloidose, mieloma múltiplo, LES). Em pacientes que apresentaram emagrecimento e nos pacientes mais idosos, devem ser pesquisadas as causas neoplásicas e as causas relacionadas ao uso de medicamentos. 
3.5.6 Prognóstico
O prognóstico varia de acordo com a etiologia específica. Pode haver remissões completas se a SN for secundária a distúrbios tratáveis, que ocorrem em cerca de 50% dos casos na infância, mas numa proporção menor em adultos. O prognóstico geralmente é favorável nas alterações com boa resposta ao uso de corticosteroides. Algumas destas doenças causadoras de SN regridem espontaneamente, mesmo após cinco anos.
Em todos os casos de SN, o prognóstico pode ser piorado pela presença de infecção, hipertensão, azotemia significativa, hematúria ou trombose nas veias cerebral, pulmonar, periférica ou renal. Observa-se alta taxa de recidivas de SN em rins transplantados de pacientes com LES, GSSF, nefropatia por IgA, e especialmente com GNMP do Tipo II, porém, menos frequentemente, no Tipo I. A recidiva também ocorre em alguns pacientes transplantados portadores de GNM e GN mesangial proliferativa.
3.5.7 Tratamento
O tratamento da SN é dirigido para o processo patogenético de base e depende da patologia renal determinada pela biópsia tecidual.
A terapia de suporte inclui uma orientação nutricional para o fornecimento de uma dieta que contenha cerca de 1g/kg ao dia de proteínas biológicas de alta qualidade e que seja baixa em gorduras saturadas e colesterol, porém rica em fibras. A suplementação proteica somente é necessária se o paciente apresentar desnutrição, e a restrição proteica estaria indicada na presença de níveis elevados de creatinina sérica e quando a ingesta excessiva de proteínas piora a proteinúria. A utilização de drogas hipolipidêmicas (por exemplo, pravastatina, lovastatina, sinvastatina, atorvastatina) pode ser necessária para o controle da hipercolesterolemia; estes pacientes apresentam uma maior incidência de rabdomiólise, a qual impõe a realização do controle da creatinina fosfoquinase (CPK). As ECA geralmente reduzem o grau de proteinúria e lipemia, porém podem exacerbar a hipercalemia em pacientes com disfunção renal moderada a grave. Deve-se instituir exercícios gradativos.
O aporte de K+ deve ser em torno de 1mmol/kg ao dia. Na presença de hiponatremia, restringe-se a ingestão de líquidos. Caso ocorra uma diurese rápida e regressão do edema, a restrição de Na poderá ser menos rigorosa. Caso exista ascite, pode ser útil a administração de freqüentes refeições fracionadas. No controle do edema sintomático, a restrição de Na (< 100mmol ao dia) é recomendada. Os diuréticos tiazídicos ou diuréticos de alça podem ser utilizados, mas podem comprometer a função renal e predisporem à trombose. Caso a hipovolemia seja grave e com risco de vida, pode-se justificar a infusão de plasma ou albumina. A hipertensão deve ser tratada, geralmente com inibidores da ECA e com diuréticos ou ocasionalmente, com outros medicamentos. A trombose é frequente e deve ser cuidadosamente pesquisada (principalmente a trombose venosa profunda e embolia pulmonar); o uso profilático de anticoagulantes pode ser útil, se a albumina sérica for < 2,5g/dL ou há presença de tromboembolismo.
As infecções (especialmente bacteriúria, endocardite e peritonite) têm risco de vida; devendo ser avaliados cuidadosamente e havendo a sua presença, serem tratados de imediato. A eliminação de antígenos infecciosos (por exemplo, endocardites por estafilococos e Streptococcus viridans, nefrite por prótese vascular, malária, sífilis, esquistomosse) pode curar a SN. Uma dessensibilização cuidadosa pode reverter a SN devido a “nefroalérgenos” (por exemplo, hera venenosa, antígenos de insetos). A remoção de nefrotoxinas (por exemplo, ouro, penicilamina, DAINE) pode ser seguida de remissão da doença.
3.6 LESÃO RENAL AGUDA 
Lesão renal aguda (LRA) é a diminuição rápida da função renal ao longo de dias a semanas, causando acúmulo de produtos nitrogenados no sangue (azotemia) com ou sem redução na quantidade de débito urinário. Em geral, resulta de perfusão renal inadequada devido a traumas graves, doenças ou cirurgias, mas em alguns casos é provocada por doença renal intrínseca rapidamente progressiva. Os sintomas podem incluir anorexia, náusea e vômito. Convulsões e coma podem ocorrer se a doença não for tratada. Distúrbios de líquidos, de eletrólitos e ácido-básicos desenvolvem-se de modo rápido. O diagnóstico baseia-se em exames laboratoriais da função renal, incluindo creatinina sérica. Índices urinários, exame de sedimento urinário e, com frequência, exames de imagem e outros testes (algumas vezes incluindo biópsia renal) são necessários para determinar a causa. O tratamento é direcionado para a causa, mas também é feito pelo restabelecimento do equilíbrio hidroeletrolítico e, algumas vezes, por diálise.
Em todos os casos de LRA, ocorre aumento de ureia e de creatinina no sangue ao longo de vários dias e desenvolvimento de distúrbios de líquidos e eletrólitos. Dentre esses distúrbios, os mais graves são hiperpotassemia e sobrecarga de líquidos (possivelmente provocando edema pulmonar). A retenção de fosfato provoca hiperfosfatemia. A hipocalcemia parece decorrer da perda da produção de calcitriol pelas células renais lesionadas, assim como da precipitação de fosfato de cálcio nos tecidos em decorrência da hiperfosfatemia. O desenvolvimento da acidose decorre da incapacidade de excretar íons hidrogênio. Caso exista uremia significativa, pode haver alteração de coagulação e desenvolvimento de pericardite. O débito urinário varia com o tipo e a causa da LRA.
3.6.1 Etiologia 
Causas da LRA podem ser classificadas como: 
· Pré-renal
· Renal
· Pós-renal
LRA pré-renal decorre de perfusão renal inadequada. As principais causas são
· Depleção do volume de líquido extracelular (p. ex., decorrente de ingestão inadequada de líquidos, doença diarreica, sepse)
· Doença cardiovascular (p. ex., insuficiência cardíaca, choque cardiogênico)
· Doença hepática descompensada
Condições pré-renais geralmente não causam lesão renal permanente (e assim são potencialmente reversíveis), a menos que a hipoperfusão seja grave o suficiente para causar isquemia tubular. Hipoperfusão do rim do contralateral funcional provoca aumento da reabsorção de sódio e água, resultando em oligúria (débito urinário < 500 mL/dia) com alta osmolalidade urinária e baixo sódio urinário.
Causas renais da LRA incluem doenças ou lesões renais intrínsecas. As doenças podem envolver vasos sanguíneos, glomérulos, túbulos ou interstício. As causas mais comuns são
· Necrose tubular aguda
· Glomerulonefrite aguda
· Nefrotoxinas (incluindo fármacos com e sem prescrição médica—Nefropatia analgésica)
Doenças glomerulares reduzem a taxa de filtração glomerular (TFG) e aumentam a permeabilidade capilar glomerular a proteínas e eritrócitos; podem ser inflamatórias (glomerulonefrites) ou resultar de lesão vascular por isquemia ou vasculites.
Os túbulos também são lesionados por isquemia e podem ser obstruídos por debris celulares, proteínas, ou deposição de cristais e edema celular e intersticial.
A inflamação intersticial (nefrite) em geral envolve um fenômeno alérgico ou imunológico. Esses fatores são complexos e interdependentes, o que faz com que o termo anteriormente popular de necrose tubular aguda seja uma descrição inadequada.
LRA pós-renal (nefropatia obstrutiva) decorre de vários tipos de obstrução nas áreas do sistema urinário relacionadas à micção e às áreas coletoras. Obstrução também pode ocorrer no nível microscópico dentro dos túbulos quando material cristalino ou proteico se precipita.
A obstrução do ultrafiltrado nos túbulos ou mais distalmente aumenta a pressão no espaço urinário do glomérulo, reduzindo o RFG. A obstrução também afeta o fluxo sanguíneo renal, inicialmente aumentando o fluxo e a pressão nos capilares glomerulares
mediante a redução da resistência arteriolar aferente. Ma em 3 a 4 h, o fluxo sanguíneo renal é reduzido e, em 24 h, cai para < 50% em relação ao normal por causa do aumento da resistência da vasculatura renal. A resistência renovascular pode levar até 1 semana para voltar ao normal após a resolução de uma obstrução de 24 h.
Para produzir LRA significativa, a obstrução no nível do ureter requer o envolvimento de ambos os ureteres, a menos que o paciente tenha apenas um rim funcional.
Obstrução do colo vesical decorrente de aumento da próstata é provavelmente a causa mais comum da interrupção súbita e, em geral, total do debito urinário em homens.
3.6.2 Sinais e Sintomas 
Inicialmente, ganho de peso e edema periférico podem ser os únicos resultados. Em geral, os sintomas predominantes são aqueles da doença subjacente ou aqueles causados pela complicação cirúrgica que precipitou a deterioração renal.
Os sintomas de uremia podem se desenvolver mais tarde à medida que os produtos nitrogenados se acumulam. Esses sintomas incluem:
· Anorexia
· Náuseas
· Vômitos
· Fraqueza
· Movimentos mioclônicos
· Convulsões
· Confusão
· Coma
Asterixe e hiperreflexia podem estar presente no exame. A dor torácica (tipicamente pior com a inspiração ou quando reclinado), o atrito pericárdico e os achados de tamponamento cardíaco podem acontecer se a pericardite urêmica estiver presente. O acúmulo de líquido nos pulmões pode causar dispneia e estertores na ausculta.
Outros achados dependem da causa. A urina pode ter cor de bebida de cola nas glomerulonefrites ou na mioglobinúria. Pode haver bexiga palpável na obstrução do colo vesical. O ângulo costovertebral pode ser sensível se o rim está severamente aumentado.
Alterações no débito urinário
A quantidade de débito urinário durante a LRA não diferencia claramente entre causas pré-renais, renais ou pós-renais.
Na lesão tubular aguda, o débito urinário pode ter 3 fases:
· Em geral, a fase prodrômica tem débito urinário normal e sua duração varia dependendo dos fatores etiológicos (p. ex., quantidade de toxina ingerida, duração e gravidade da hipotensão)
· A fase oligúrica tem débito urinário tipicamente entre 50 e 500 mL/dia. A duração da fase oligúrica é imprevisível, dependendo da etiologia da LRA e do tempo de tratamento. Entretanto, vários pacientes nunca apresentam oligúria. Pacientes não oligúricos apresentam mortalidade, morbidade e necessidade de diálise menores.
· Na fase pós-oligúrica, o débito urinário gradualmente retorna ao normal, mas as concentrações séricas de ureia e creatinina podem não se reduzir por vários dias. A disfunção tubular pode persistir por dias ou semanas e se manifesta pela perda de sódio, poliúria (possivelmente maciça) não responsiva à vasopressina, ou acidose metabólica hiperclorêmica.
3.6.3 Diagnóstico 
· Avaliação clínica, incluindo revisão dos fármacos com e sem prescrição e exposição ao contraste IV iodado
· Creatinina sérica
· Sedimento urinário
· Índices diagnósticos urinários
· Exame de urina e avaliação da proteína na urina
· Volume vesical residual pós-micção, se houver suspeita de causa pós-renal
Suspeita-se de lesão renal aguda quando o débito urinário cai e a ureia e creatinina séricas aumentam.
De acordo com a KDIGO Clinical Practice Guideline for Acute Kidney Injury (1), LRA é definida como:
· Aumento do valor da creatinina sérica de ≥ 0,3 mg/dL em 48 horas
· Aumento da creatinina sérica de ≥ 1,5 vezes em relação à linha de base nos sete dias anteriores
· Volume de urina < 0,5 mL/kg/h por 6 horas
A avaliação deve determinar a presença e o tipo de LRA e buscar a causa. Exames de sangue geralmente incluem hemograma completo, ureia, creatinina, eletrólitos (incluindo cálcio e fosfato). Exames de urina incluem concentração de sódio, ureia e creatinina; e análise microscópica do sedimento. Detecção e tratamento precoces aumentam a probabilidade de reversão da lesão renal e, em alguns casos, previnem a necessidade de diálise.
A elevação diária e progressiva da creatinina sérica é diagnóstico de LRA. A creatinina sérica pode aumentar até cerca de 2 mg/dL/dia (180 μmol/L/dia), dependendo da quantidade de produção de creatinina (que varia de acordo com a massa corporal magra) e de água corporal total. Uma elevação > 2 mg/dL/dia sugere produção excessiva decorrente de rabdomiólise.
A ureia pode aumentar em 10 a 20 mg/dL/dia (3,6 a 7,1 mmol de ureia/L/dia), mas a ureia pode ser enganadora porque com frequência está elevada em resposta ao aumento do catabolismo proteico resultante de cirurgia, trauma, corticoides, queimaduras, reações transfusionais, alimentação parental ou sangramentos GI ou outros internos.
Quando a creatinina está se elevando, a coleta de urina de 24 h para determinação do clearance de creatinina e as várias fórmulas utilizadas para cálculo deste clearance a partir da creatinina sérica são imprecisas e não devem ser utilizadas para estimar o RFG (eRFG), já que a elevação da concentração de creatinina sérica é uma função atrasada do declínio do RFG.
Outros achados laboratoriais são:
· Acidose progressiva
· Hiperpotassemia
· Hiponatremia
· Anemia
Acidose, em geral, é moderada, com teor plasmático de bicarbonato de 15 a 20 mmol/L; entretanto, a acidose pode ser grave se houver sepse ou isquemia tecidual adjacente.
O aumento do nível sérico de potássio depende do metabolismo geral, ingestão dietética, fármacos e possível necrose tecidual ou lise celular.
A hiponatremia costuma ser moderada (sódio sérico, 125 a 135 mmol/L) e correlaciona-se ao excesso de ingestão alimentar ou intravenosa de água.
Anemia normocítico-normocrômica com hematócrito (Hct) de 25 a 30% é comum.
Hiperfosfatemia e hipocalcemia são comuns na LRA e podem ser profundas em pacientes com rabdomiólise ou síndrome de lise tumoral. Hipocalcemia profunda na rabdomiólise aparentemente resulta dos efeitos combinados da deposição de cálcio no músculo necrótico, redução da produção de calcitriol e resistência óssea ao paratormônio (PTH) e hiperfosfatemia. Durante a fase de recuperação da LRA depois de necrose tubular aguda induzida por rabdomiólise, a hipercalcemia pode surgir à medida que a produção de calcitriol aumenta, o osso se torna mais responsivo ao PTH e os depósitos de cálcio são mobilizados pelo tecido lesionado. Hipercalcemia durante a recuperação da LRA é ao contrário incomum.
Determinação da causa
Primeiro é necessário excluir causas pré-renais e pós-renais imediatamente reversíveis da lesão renal aguda. Depleção do volume do líquido extracelular e obstrução são consideradas em todos os pacientes. A história de fármacos deve ser revista com precisão e todos os fármacos potencialmente tóxicas para os rins devem ser suspensas. Índices diagnósticos urinários (Índices diagnósticos urinários na lesão renal aguda e lesão tubular aguda) são particularmente úteis para diferenciar entre LRA pré-renal e lesão tubular aguda, as quais são as duas causas mais comuns da LRA em pacientes hospitalizados.
As causas pré-renais em geral são aparentes clinicamente. Se for o caso, a correção da anormalidade hemodinâmica subjacente deve ser tentada. Por exemplo, na hipovolemia, pode-se tentar infusão de volume; na insuficiência cardíaca, pode-se experimentar diuréticos e fármacos que reduzem a pós-carga. Redução da LRA confirma a causa pré-renal.
As causas pós-renais devem ser pesquisadas na maioria dos casos de LRA. Imediatamente após o paciente urinar, ultrassonografia da bexiga à beira do leito é feita (ou, alternativamente, um cateter urinário é inserido) para determinar o volume residual da bexiga. O volume urinário residual > 200 mL sugere obstrução do colo vesical, apesar de fraqueza do músculo detrusor e bexiga neurogênica também serem causas. O cateter, se inserido, pode ser mantido para monitorar o débito urinário de maneira precisa em resposta a terapias, mas remove-se o cateter em pacientes anúricos (se não houver obstrução do colo vesical) para reduzir o risco de infecção.
Faz-se então uma ultrassonografia renal para diagnóstico de obstrução
mais proximal. Entretanto, a sensibilidade da ultrassonografia para obstrução é apenas de 80 a 85% porque o sistema coletor nem sempre está dilatado, em especial quando o quadro é agudo, o ureter está encarcerado (p. ex., na fibrose do retroperitônio ou neoplasia), ou se o paciente apresentar hipovolemia concomitante. Se houver forte suspeita de obstrução, TC sem contraste pode estabelecer o local da obstrução e orientar a terapia.
O sedimento urinário pode fornecer pistas etiológicas. Sedimento urinário normal ocorre na LRA pré-renal e algumas vezes na uropatia obstrutiva. Na lesão tubular renal, o sedimento urinário caracteristicamente contém células tubulares, cilindros celulares tubulares e muitos cilindros granulares (frequentemente com pigmento marrom). Eosinófilos urinários podem indicar nefrite tubulointersticial alérgica, mas a precisão do diagnóstico desse resultado é limitada. Cilindros hemáticos e eritrócitos dismórficos indicam glomerulonefrite ou vasculite, mas raramente podem ocorrer na necrose tubular aguda.
Causas renais às vezes são sugeridas pelos achados clínicos. Pacientes com glomerulonefrite em geral apresentam edema, proteinúria significativa (síndrome nefrótica), ou sinais de arterite na pele e na retina, em geral sem história de doença renal intrínseca. Hemoptise pode resultar de granulomatose com poliangeíte ou de doença anti-MBG (síndrome de Goodpasture). Certos exantemas (p. ex., eritema nodoso, vasculite cutânea, lúpus discoide) podem indicar crioglobulinemia, LES ou vasculite associada à imunoglobulina A. Nefrite tubulointersticial, alergia a fármacos e possivelmente poliangiite microscópica são sugeridas por história de ingestão de fármacos e exantema maculopapular ou purpúrico.
Para diferenciação adicional das causas renais, obtêm-se títulos de antiestreptolisina-O e complemento, anticorpos antinucleares e anticorpos citoplasmáticos antineutrofilicos.
Pode-se realizar biópsia renal se o diagnóstico ainda permanecer incerto.
Exames de imagem
Além da ultrassonografia renal, outros exames de imagem ocasionalmente são utilizados. Para avaliação de obstrução ureteral, uma tomografia computadorizada sem contraste é preferível à urografia anterógrada e retrógrada. Além de sua capacidade de delinear estruturas das partes moles e cálculos contendo cálcio, a TC pode detectar cálculos não radiopacos.
Se possível, deve-se evitar agentes de contraste iodados. Entretanto, às vezes pode-se indicar arteriografia ou venografia renais se clinicamente forem sugeridas causas macrovasculares. Angiografia por ressonância magnética tem sido cada vez mais utilizada para o diagnóstico de estenose da artéria renal, bem como trombose tanto de artérias como de veias porque a RM usava gadolínio, que acreditava-se ter menor risco de LRA do que os agentes de contraste iodados utilizados na angiografia e TC com contraste. Entretanto, evidências recentes sugerem que o gadolínio pode estar envolvido na patogênese da fibrose sistêmica nefrogênica, uma complicação séria que ocorre em pacientes com LRA e também doença renal crônica. Assim, se possível deve-se evitar o gadolínio em pacientes com função renal abaixo de 30 mL/min/1,73m2 do eRFG.
O tamanho do rim, determinado por exames de imagem, é útil porque rins normais ou aumentados favorecem a reversibilidade, ao passo que um rim pequeno sugere insuficiência renal crônica. Entretanto, algumas doenças renais crônicas tendem a cursar com aumento do rim, como:
· Doença policística renal
· Nefropatia associada ao HIV
· Nefropatia diabética
· Sarcoidose
· Linfoma infiltrativo
Estadiamento da LRA
Depois que o estado volumétrico do paciente está otimizado e a obstrução geniturinária é excluída, a LRA pode ser classificada em 3 estágios com base no nível de creatinina sérica ou na quantidade de débito urinário.
3.6.4 Prognóstico
O prognóstico para recuperação da função renal após a lesão renal aguda correlaciona-se com a função renal pré-mórbida. Pacientes com doença renal crônica (DRC) subjacente têm maior risco de desenvolver LRA, exigindo diálise para o tratamento da LRA, e progredindo para doença renal em estágio terminal (DRET).
O prognóstico da LRA não oligúrica (débito urinário > 500 mL/dia) é melhor do que para LRA oligúrica ou anúrica. O aumento do débito urinário com ou sem o auxílio de um diurético sugere recuperação da função renal ou LRA menos grave. A recuperação da LRA, porém, é um fator de risco para DRC e DRET futuras. 
3.6.5 Tratamento 
· Tratamento imediato do edema pulmonar e da hiperpotassemia
· Diálise, conforme necessária, para controlar a hiperpotassemia, o edema pulmonar, a acidose metabólica e os sintomas urêmicos.
· Ajuste da administração de fármacos ao grau da disfunção renal
· Em geral, restrição da ingestão de água, sódio, fostato e potássio, mas provisão adequada de proteínas
· Possivelmente, ligantes de fosfato (na hiperfosfatemia) e sulfonato de poliestireno de sódio (na hiperpotassemia)
Tratamento de emergência
As complicações com risco à vida são abordadas de preferência em uma unidade de tratamento intensivo. O edema pulmonar é tratado com oxigênio, vasodilatadores IV (p. ex., nitroglicerina) e diuréticos (em geral, ineficazes na LRA) ou diálise.
A hiperpotassemia é tratada com infusão intravenosa de 10 mL a 10% de gluconato de cálcio; 50 g de dextrose; e 5 a 10 unidades de insulina. Esses fármacos não reduzem o potássio corporal total e, portanto, tratamento adicional (mas de ação mais lenta) é necessário (p. ex., sulfonato de poliestireno de sódio, diuréticos, diálise).
Embora a correção da acidose metabólica por anion gap com bicarbonato de sódio seja controversa, a correção da acidose metabólica grave não anion gap (pH < 7,20) é menos controversa. A porção não anion gap pode ser tratada com bicarbonato de sódio IV na forma de infusão lenta (≤ 150 mEq de bicarbonato de sódio em 1 L de glicose 5% em uma taxa de 50 a 100 mL/h). Usando o cálculo de gradiente delta, a acidose metabólica com intervalo aniônico normal mais acidose metabólica com intervalo aniônico alto produz um gradiente delta negativo; administra-se bicarbonato de sódio para elevar o bicarbonato sérico até o gradiente delta alcançar zero. Por cauda da dificuldade de se preverem variações nos sistemas-tampão do corpo e na taxa de produção de ácido, não costuma ser recomendado o cálculo da quantidade de bicarbonato necessária para alcançar a correção total. Em vez disso, administra-se bicarbonato via infusão contínua e o ânion gap é monitorado periodicamente.
Hemodiálise ou hemofiltração é iniciada quando:
· Não se conseguir controlar anormalidades graves de eletrólitos por outras medidas (p. ex., potássio > 6 mmol/L)
· Edema pulmonar persiste apesar do tratamento medicamentoso
· Acidose metabólica não é responsiva ao tratamento
· Sintomas urêmicos ocorrem (p. ex., vômitos atribuídos a uremia, asterixe, encefalopatia, pericardite, ou convulsões)
As concentrações de ureia e creatinina provavelmente não são os melhores indicadores para o uso de diálise na LRA. Em pacientes assintomáticos que não estão gravemente enfermos, em particular aqueles em que a volta da função renal é considerada provável, a diálise pode ser adiada até o surgimento de sintomas, evitando assim a necessidade de um acesso venoso central e suas complicações associadas.
Medidas gerais
Devem ser suspensos os fármacos nefrotóxicos e são ajustadas todos os fármacos excretados pelos rins (p. ex., digoxina, alguns antibióticos); as concentrações séricas são úteis.
A ingestão diária de água é restrita a um volume igual ao débito urinário do dia anterior somado a perdas extrarrenais (p. ex., vômitos) mais 500 a 1.000 mL/dia de perdas insensíveis. A ingestão de água pode ser ainda mais restrita em razão da hiponatremia, ou aumentada em decorrência da hipernatremia. Embora o ganho de peso indique excesso de líquidos, a ingestão de água não é diminuída se o sódio sérico permanecer normal; ao contrário, restringe-se o sódio alimentar.
Minimiza-se a ingestão de sódio e potássio, exceto

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