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! ! Defesa&Jurídica& do& Meio&Ambiente&e&Políticas& Públicas&Ambientais& & & & Ana&Paula&de&Castro& & & & & & & & & & Editora 1a Edição / Janeiro / 2013 Impressão em São Paulo - SP ! ! Defesa&Jurídica&do&Meio&Ambiente& e&&Politicas&Públicas&Ambientais& Coordenação&Geral& Nelson Boni Coordenação&de& Projetos& Leandro Lousada Professor&Responsável& Ana Paula de Castro Projeto&Gráfico,&Capa& e&Diagramação& Vitor Bioni Bertollini Revisão&Ortográfica& Vanessa Almeida Coordenadora&PedagógiE& ca&de&Cursos&EaD& Eleonora Altruda de Faria 1ª!Edição:!Janeiro! de!2013! Impressão em São Paulo/SP Copyright © EaD KnowHow 2011 Nenhuma parte dessa publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição. Catalogação elaborada por Glaucy dos Santos Silva - CRB8/6353 C355d Castro, Ana Paula. Defesa jurídica do meio ambiente e políticas públicas ambientais. / Ana Paula de Castro. – São Paulo : Know How, 2013. 235 p.: 21 cm. Inclui bibliografia ISBN: 978-85-8065-181-2 1.Defesa jurídica. 2. Meio ambiente. 3. Políticas públicas Ambientais. 4. Crime ambiental. I. Título. CDD 363.7 ! ! Sumário& & & 5& & & & & & & & & 47& & & & 105& & & & 203& & & & 223& & & & 235& & & & & & 253& Capítulo&1& Regime Jurídico Aplicável aos Direitos Sociais à Luz da Constituição Federal: Fundamento, Obje- to, Titularidade, Classificação, Estrutura Normati- va e Condições de Eficácia. Capítulo&2& Os Danos Causados ao Meio Ambiente Capítulo&3& Crimes Ambientais Capítulo&4& Parâmetros Internacionais e a Legislação Interna Capítulo&5& Instrumentos de Defesa do Meio Ambiente Capítulo&6& A Lei de Ação Civil Pública e a Lei Nº 7347/ 85 e seus Aspectos Processuais Específicos Referências&Bibliográficas& ! ! ! ! Capítulo& 2& & & Os&Danos&Causados& ao&Meio&Ambiente& & & & & & & & & & & & ! ! ! ! Com o advento da Constituição Federal de 1988, a responsabilidade pelos danos causa- dos ao meio ambiente passou a ser disciplinada da seguinte forma: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presen- tes e futuras gerações. (...) § 3.º - As condutas e atividades consideradas le- sivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obriga- ção de reparar os danos causados. Nos termos do texto constitucional res- tou estabelecido que o dever de proteger e pre- servar o meio ambiente é do Poder Público e da coletividade, e que as pessoas, físicas ou jurídi- cas, são responsáveis civil, administrativa e pe- nalmente pelas condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. 49& & ! ! & & & & & & & Conforme a natureza dos ilícitos pratica- dos e do objeto jurídico tutelado, a responsabili- dade pelos danos causados ao meio ambiente su- jeita seus infratores às sanções de natureza civil, administrativa e penal. Segundo aponta Celso Antônio Pacheco Fiorilloa Constituição Federal de 1988 “consagrou aregradacumulatividadedassanções”,poisassan- ções civis, administrativas e penais, “além de prote- geremobjetosdistintos,estãosujeitasaregimesjurídicos diversos22”. Na medida em que tutelam objetos dis- tintos e sujeitam-se a regimes jurídicos diversos, podem ser cumuladas sem violar o princípio do “non bis in idem”, isto é, de que ninguém deve ser punido duas vezes pelo mesmo fato. Uma determinada pessoa que causa dano ao meio ambiente pode ser responsabilizada, si- multaneamente, nas esferas civil, administrativa e penal pela conduta ou atividade lesiva praticada. Em caso análogo, no julgamento do Re- cuso Especial nº 677.585/RS, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, ressaltou o seguinte: 22 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Bra- sileiro. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 50. 50& & ! ! & & & & & & & & RECURSO ESPECIAL EM AGRAVO DE INSTRU- MENTO. TUTELA ANTECIPADA. TRANSPOR- TADORAS DE VEÍCULOS. “CEGONHEIROS”. INDÍCIOS DE ABUSO DE PODER ECONÔMI- CO E FORMAÇÃO DE CARTÉIS. (...) 16. Inexiste violação ao princípio do ne bis in idem, tendo em vista a possibilidade de instau- ração concomitante de ação civil pública e de processo administrativo, in casu, perante a SDE - Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Ministério da Justiça, para investigação e punição de um mesmo fato, porquanto as esferas de res- ponsabilização civil, penal e administrativa são independentes. (REsp 677.585/RS. Min. Luiz Fux. Primeira Turma. 06/12/2005) Da análise da doutrina e da jurisprudên- cia, verifica-se, pois, que o artigo 225, §3.º, con- sagrou em nível constitucional o princípio da au- tonomia e independência entre os três sistemas de responsabilidade civil, administrativa e penal. Em atenção ao texto constitucional, a Lei nº 9.638 de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e meca- 51& & ! ! & & & & & & & nismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, disciplina a responsabilidade por danos causados ao meio ambiente. Diante da cumulatividade de sanções cada uma das responsabilidades será analisada individualmente. Porém, antes de tecer conside- rações sobre a responsabilidade civil, administra- tiva e penal, cumpre trazer à baila alguns concei- tos sobre o dano ambiental. 2.1. O&Dano&Ambiental& & O dano, ou seja, as lesões que resultam das atividades degradantes ou que causam im- pacto ao meio ambiente em todas as suas for- mas de acepção (natural, artificial ou cultural, e também do trabalho), e que dá ensejo à respon- sabilização civil, administrativa e penal, quanto ao objeto jurídico tutelado, pode ser material ou patrimonial e imaterial ou extrapatrimonial, e, quanto à titularidade do bem lesado, pode ser individual ou coletivo. O artigo 1.º, “caput” da Lei nº 7.347 de 1985, que disciplina a ação civil pública por da- nos causados ao meio ambiente, entre outros, 52& & ! ! & & & & & & & dispõe que: Art. 1.º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabi- lidade por danos morais e patrimoniais causados: l - ao meio-ambiente; Nos termos do artigo 81, incisos I e II, da Lei nº 8.078 de 1990, o dano ambiental cole- tivo afeta (i) interesses ou direitos difusos, assim entendidos, os transindividuais, de natureza in- divisível, de que sejam titulares pessoas indeter- minadas e ligadas por circunstâncias de fato; e (ii) interesses ou direitos coletivos propriamente ditos, tais como os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. De acordo com Édis Milaré, o dano am- biental individual afeta, de forma reflexa, a esfera de interesses patrimoniais ou extrapatrimoniais de determinada pessoa23. 23 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 869. 53& & ! ! & & & & & & & Aponta, ainda, referido autor que, em certos casos, o dano ambiental pode “refletir-se, material ou moralmente, sobre o patrimônio, os interesses ou a saúde de uma determinada pes- soa ou de um grupo de pessoas determinadas ou determináveis”: o dano ambiental, embora sempre recaia direta- mente sobre o ambiente e os recursos e elemen- tos que o compõem, em prejuízo da coletividade, pode, em certos casos, refletir-se, material ou mo- ralmente, sobre o patrimônio, os interesses ou a saúde de umadeterminada pessoa ou de um gru- po de pessoas determinadas ou determináveis. (...) A doutrina leciona que os danos ambientais coleti- vos ‘dizem respeito aos sinistros causados ao meio ambiente lato sensu, repercutindo em interesses difusos, pois lesam diretamente uma coletividade indeterminada ou indeterminável de titulares. Os direitos decorrentes dessas agressões caracteri- zam-se pela inexistência de uma relação jurídica base, no aspecto subjetivo, e pela indivisibilidade (ao contrário dos danos ambientais pessoais) do bem jurídico, diante do aspecto objetivo’. 54& & ! ! & & & & & & & & (...) Quando, ao lado da coletividade, é possível iden- tificar um ou alguns lesados em seu patrimônio particular, tem-se o dano ambiental individual, também chamado dano ricochete ou reflexo (...). A vítima do dano ambiental reflexo pode buscar a reparação do dano sofrido, no âmbito de uma ação indenizatória de cunho individual, fundada nas regras gerais que regem o direito de vizinhan- ça. (Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª Edição. Editora Revista dos Tribunais: São Pau- lo, 2009. p. 868/869) Helita Barreira Custódio ensina que o dano ambiental decorre da poluição do ar, da água, do solo, dos alimentos, e das bebidas em geral, da degradação da flora, da fauna, dos re- cursos hídricos e da destruição progressiva dos recursos naturais e culturais, caracterizada pelo uso nocivo e irracional da propriedade imobiliá- ria e demais condutas lesivas ao meio ambiente, que colocam em perigo a própria sobrevivência humana, bem como de atos contrários à moral e 55& & ! ! & & & & & & & aos bons costumes24. 2.2. O&Dano&Moral& & Diz-se que o dano ambiental pode ser material ou patrimonial e, imaterial ou extrapa- trimonial, e ainda, individual ou coletivo. O dano material, conforme visto, ocor- re quando um bem ambiental, isto é, os recursos naturais, artificiais e culturais são degradados, ou, quando é colocada em risco a saúde das presentes e futuras gerações, e o moral, quando lesado direi- tos inerentes à personalidade da pessoa humana. Por sua vez, o dano ambiental material é coletivo quando afeta diretamente uma coleti- vidade indeterminada ou indeterminável de titu- lares, mas também pode ser individual, quando recai reflexamente sobre o patrimônio, os inte- resses ou a saúde de uma determinada pessoa25. 24 CUSTÓDIO, Helita Barreira. Uma Introdução à Responsabilidade Civil por Dano Ambiental. Disponível em: <http://www.mp.ba.gov.br/atuacao/ceama/material/doutrinas/esgota- mento/uma_introducao_a_r esponsabilidade_civil_por_dano_ambiental. pdf> Acesso em: 12/12/2011. 25 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 868/869. 56& & ! ! & & & & & & & Diante do caráter transindividual e in- divisível dos direitos difusos e coletivos, há dis- cussão acerca da existência de um dano moral coletivo. Para a doutrina o dano moral pode ser individual e ainda coletivo. Na jurisprudência há divergência. No julgamento do recurso especial in- terposto em sede de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Gran- de do Sul, autos nº 1.057274/RS, objetivando re- paração de dano moral coletivo, “assim entendido aquelequeviolauminteressecoletivoedifuso”,aMinis- tra Eliana Calmon aponta a existência de prece- dentes da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que seria inadmissível a ocorrência de dano moral coletivo, e refuta a tese de que não há um dano moral coletivo. Ao discordar do entendimento firmado pela Primeira Turma, transcreve as duas emen- tas exaradas nos recursos especiais nº 598.281/ MG e n.º 821.891/RS, e destaca o voto proferido pelo Ministro Luiz Fux, cujo texto ora se copia: Sobre a indenizabilidade do dano moral coletivo destaque-se, pela juridicidade de suas razões, os fundamentos desenvolvidos pelo Ministro Teori 57& & ! ! & & & & & & & & Zavascki, no voto-vencedor do RESP 598.281/ MG, perfeitamente aplicáveis à hipótese in foco: ‘2. O dano ambiental ou ecológico pode, em tese, acarretar também dano moral — como, por exemplo, na hipótese de destruição de árvore plantada por antepassado de determinado indi- víduo, para quem a planta teria, por essa razão, grande valor afetivo. Todavia, a vítima do dano moral é, necessaria- mente, uma pessoa. Não parece ser compatível com o dano moral a idéia da “transindividualida- de” (= da indeterminabilidade do sujeito passivo e da indivisibilidade da ofensa e da reparação) da lesão. É que o dano moral envolve, necessaria- mente, dor, sentimento, lesão psíquica, afetando “a parte sensitiva do ser humano, como a intimi- dade, a vida privada, a honra e a imagem das pes- soas” (Clayton Reis, Os Novos Rumos da Inde- nização do Dano Moral, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 236), “tudo aquilo que molesta grave- mente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua perso- nalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado” (Yussef Said Cahali, Dano Moral, 2ª ed., São Paulo: RT, 1998, p. 20, apud Clayton Reis, op. cit., p. 237). 58& & ! ! & & & & & & & & Nesse sentido é a lição de Rui Stoco, em seu Tra- tado de Responsabilidade Civil, 6ª ed., São Paulo: RT, que refuta a assertiva segundo a qual ‘sempre que houver um prejuízo ambiental objeto de co- moção popular, com ofensa ao sentimento co- letivo, estará presente o dano moral ambiental’ (José Rubens Morato Leite, Dano Ambiental: do individual ao extrapatrimonial, 1ª ed., São Paulo: RT, 2000, p. 300, apud Rui Stoco, op. cit., p. 854): ‘No que pertine ao tema central do estudo, o pri- meiro reparo que se impõe é no sentido de que não existe ‘dano moral ao meio ambiente’. Muito menos ofensa moral aos mares, rios, à Mata Atlântica ou mesmo agressão moral a uma coletivi- dade ou a um grupo de pessoas não identificadas. A ofensa moral sempre se dirige à pessoa en- quanto portadora de individualidade própria; de um vultus singular e único. Os danos morais são ofensas aos direitos da per- sonalidade, assim como o direito à imagem cons- titui um direito de personalidade, ou seja, àqueles direitos da pessoa sobre ela mesma. (...) A Constituição Federal, ao consagrar o direito de reparação por dano moral, não deixou margem à dúvida, mostrando-se escorreita sob o aspec- 59& & ! ! & & & & & & & & to técnico-jurídico, ao deixar evidente que esse dever de reparar surge quando descumprido o preceito que assegura o direito de resposta nos casos de calúnia, injúria ou difamação ou quan- do o sujeito viola a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (art. 5.º, incisos V e X), todos estes atributos da personalidade. Ressuma claro que o dano moral é personalís- simo e somente visualiza a pessoa, enquanto detentora de características e atributos próprios e invioláveis. Os danos morais dizem respeito ao foro íntimo do lesado, pois os bens morais são inerentes à pessoa, incapazes, por isso, de subsistir sozinhos. Seu patrimônio ideal é marcadamente individual, e seu campo de incidência, o mundo interior de cada um de nós, de modo que desaparece com o próprio indivíduo. (...) Dúvida, portanto, não pode ressumir de que a natureza e o meio ambiente podem ser degra- dados e danificados. Esse dano é único e não se confunde com seus efeitos, (...). Do que se conclui mostrar-se impróprio, tanto no plano fático como sob o aspecto lógico-ju- rídico, falar em dano moral ao ambiente, sendo 60& & ! ! & & & & & & & & insustentável a tese de que a degradação do meio ambiente por ação do homem conduza, através da mesma ação judicial, à obrigação de reconsti- tuí-lo, e, ainda, de recompor o dano moral hipo- teticamentesuportado por um número indeter- minado de pessoas. Se para a Primeira Turma, “o dano moral deveservinculadoànoçãodedor,desofrimentopsíquico, decaráterindividual”,eportanto,“éincompatívelcom anoçãodetransindividualidade(indeterminabilidade dosujeitopassivoeindivisibilidadedaofensaedare- paração)”, para a Ministra Eliana Calmon, não é “essencialàcaracterizaçãododanomoralcoletivoprova dequeftouvedor,sentimento,lesãopsíquica,afetando‘a partesensitivadoserftumano,comoaintimidade,avida privada, a ftonra e a imagem das pessoas’”. Sustenta a tese de que o dano moral deve ser averiguado de acordo com as caracterís- ticas próprias aos interesses difusos e coletivos, distanciando-se quanto aos caracteres próprios das pessoas físicas que compõe determinada co- letividade ou grupo determinado ou indetermi- nado de pessoas, sem olvidar que é a confluência 61& & ! ! & & & & & & & & dos valores individuais que dão singularidade ao valor coletivo. As relações jurídicas caminham para uma massificação e a lesão aos interesses de massa não podem ficar sem reparação. Para refutar a tese de que não há dano moral coletivo, a Ministra também colaciona far- ta doutrina acerca do tema, cujo texto para fins didáticos se aproveita e se transcreve: Na doutrina, já há vários pronunciamentos pela pertinência e necessidade de reparação do dano moral coletivo. José Antônio Remédio, José Fer- nando Seifarth e José Júlio Lozano Júnior infor- mam a evolução doutrinária: Diversos são os doutrinadores que sufragam a essência da existência e reparabilidade do dano moral coletivo: Limongi França sustenta que é possível afirmar a existência de dano moral ‘à coletividade, como sucederia na hipótese de se destruir algum ele- mento do seu patrimônio histórico ou cultural, sem que se deva excluir, de outra parte, o refe- rente ao seu patrimônio ecológico’. Carlos Augusto de Assis também corrobora a 62& & ! ! & & & & & & & & posição de que é possível a existência de dano moral em relação à tutela de interesses difusos, indicando hipótese em que se poderia cogitar de pessoa jurídica pleiteando indenização por dano moral, como no caso de ser atingida toda uma categoria profissional, coletivamente falando, sem que fosse possível individualizar os lesados, caso em que se ria conferida legitimidade ativa para a entidade representativa de classe pleitear indenização por dano moral. A sustentar e esclarecer seu posicionamen- to, aponta Carlos Augusto de Assis, a título de exemplo: ‘Imagine-se o caso de a classe dos ad- vogados sofrer vigorosa campanha difamatória. Independente dos danos patrimoniais que po- dem se verificar (e que também seriam de difícil individualização) é quase certo que os advoga- dos, de uma maneira geral, experimentariam pe- nosa sensação de desgosto, por ver a profissão a que se dedicam desprestigiada. Seria de admitir que a entidade de classe (no caso, a Ordem dos Advogados do Brasil) pedisse indenização pelo dano moral sofrido pelos advogados considera- dos como um todo, a fim de evitar que este fique sem qualquer reparação em face da indetermina- ção das pessoas lesadas. 63& & ! ! & & & & & & & & Carlos Alterto Bittar Filho leciona: ‘quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absoluta- mente injustificável do ponto de vista jurídico’. Assim, tanto o dano moral coletivo indivisível (gerado por ofensa aos interesses difusos e co- letivos de uma comunidade) como o divisível (gerado por ofensa aos interesses individuais ho- mogêneos) ensejam reparação. Doutrinariamente, citam-se como exemplos de dano moral coletivo aqueles lesivos a interesses difusos ou coletivos: “dano ambiental (que con- siste na lesão ao equilíbrio ecológico, à qualidade de vida e à saúde da coletividade), a violação da honra de determinada comunidade (a negra, a judaica etc.) através de publicidade abusiva e o desrespeito à bandeira do País (o qual corporifica a bandeira nacional). (in Dano moral. Doutrina, jurisprudência e legislação. São Paulo: Saraiva, 2000, pp. 34-5). Pela doutrina e pela tese defendida pela Ministra Eliana Calmon, parece que o dano mo- 64& & ! ! & & & & & & & ral deve ser reparado quando em razão de um dano ambiental houver ofensa aos interesses de uma coletividade. 2.3. A&Responsabilidade&Civil& & & No ordenamento jurídico pátrio há três princípios que orientam a responsabilização ci- vil por danos ambientais. Na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desen- volvimento, no Rio de Janeiro (ECO 92), restou estabelecido o seguinte: Os Estados devem desenvolver legislação nacional relativa à responsabilidade e indenização das vítimas de poluição e outros danos ambientais. (Princípio da responsabilidade ambiental – princípio nº 13) Tendo em vista que o poluidor deve, em princí- pio, arcar com o custo decorrente da poluição, as autoridades nacionais, devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, levando na devida conta o interesse público, sem distorcer o comér- cio e os investimentos internacionais. (Princípio 65& & ! ! & & & & & & & & do poluidor pagador – princípio nº 16) De modo a proteger o meio ambiente, o prin- cípio da precaução deve ser amplamente obser- vado pelos Estados, de acordo com suas capaci- dades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não dever ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental (Princípio da Precaução – princípio nº 15) A responsabilidade civil tem como pres- supostos os princípios da precaução ou preven- ção, do poluidor-pagador, e da responsabilidade integral pelos danos causados ao meio ambiente. Como um dos objetivos fundamentais do Direito Ambiental é prevenir a atividade da- nosa aos bens jurídicos tutelados, o princípio da prevenção ou precaução objetiva coibir práticas potencialmente lesivas ao meio ambiente, para que os riscos inerentes às determinadas ativida- des sejam mitigados26. 26 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 956. 66& & ! ! & & & & & & & Por sua vez, o princípio do poluidor- -pagador objetiva assegurar que o beneficiário da atividade responda pelo risco ou pelas desvan- tagens dela resultantes, para evitar que o dano ambiental fique sem reparação27. Por força do §3.º, do artigo 225, da Cons- tituição Federal, e do §1.º, do artigo 14, da Lei nº 6.938 de 1981, a lesão causado ao meio ambiente deve ser reparada na sua integralidade. Ainda que não seja possível a reparação do dano, será sem- pre devida a indenização pecuniária correlata ao evento danoso28. São dois os tipos de reparação do dano ambiental. A reparação específica ou in natura e a indenização. O dever de indenizar no Direito Ambiental, não excluir a reparação específica do dano ambiental29. 27 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 956-957. 28 Idem. p. 957. 29 FIORILLO, Celso Antônio Pachecco. Curso de Direito Ambiental Bra- sileiro. Editora Saraiva: São Paulo, 2007. p. 35/36. 67& & ! ! & & & & & & 2.4. Responsabilidade&Civil& Objetiva&&e& Solidária& & A responsabilidade civil pelos danos causados ao meio ambiente é objetiva e solidária. Objetiva, pois o artigo 225, §3.º, da Constituição Federal, ao impor a obrigação de reparar o dano, não exige elemento subjetivo para configuração da conduta lesiva, e, solidária, poisalém do “ca- put” de referido dispositivo dispor que é atribuí- do tanto ao Poder Público quanto à coletividade o dever jurídico de tutelar o meio ambiente, o artigo 3.º, inciso I, do diploma constitucional, elenca como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, a construção de uma socie- dade livre, justa e solidária30. À propósito ensina Édis Milaré o seguinte: A responsabilidade civil pressupõe prejuízo a ter- ceiro, ensejando pedido de reparação do dano, consistente na recomposição do status quo ante (repristinação = obrigação de fazer) ou numa im- portância em dinheiro (indenização = obrigação de dar). 30 FIORILLO, Celso Antônio Pachecco. Curso de Direito Ambiental Bra- sileiro. Editora Saraiva: São Paulo, 2007. p. 35/36. 68& & ! ! & & & & & & & & (...) O Código Civil de 2002, atento à crescente com- plexidade das relações presentes na moderna sociedade brasileira, introduziu importantes mo- dificações nas normas que disciplinam a respon- sabilidade civil. Migrou de um sistema único do Código de 1916, de exclusiva consagração da regra da responsabili- dade fundada na culpa (art.159), para um sistema dualista que, sem prejuízo desse princípio básico, reproduzido agora no art. 186, agregou, com igual força de incidência, a responsabilidade sem culpa, esteada no risco da atividade (art. 927, § único). (...) Imaginou-se, no início da preocupação com o meio ambiente, que seria possível resolver os problemas relacionados com o dano a ele infli- gido nos limites estreitos da teoria da culpa. Mas, rapidamente a doutrina, a jurisprudência e o le- gislador perceberam que as regras clássicas de responsabilidade, contidas na legislação civil de então, não ofereciam proteção suficiente e ade- quada às vítimas do dano ambiental, relegando- -as, no mais das vezes, ao completo desamparo. (...) Coube à Lei nº 6.938, de 31.08.1981, instituido- 69& & ! ! & & & & & & & & ra da Política Nacional do Meio Ambiente (...) dar adequado tratamento à matéria, substituindo, decididamente, o princípio da responsabilidade objetiva, fundamentado no risco da atividade.31 Para o referido autor a Carta de 1988 fez com que a responsabilidade civil objetiva do po- luidoreinclusiveadoEstado,“commaisrazãoain- daemmatériaambiental”,fosseconstitucionaliza- da, e fortaleceu o princípio do poluidor-pagador, “quefazrecairsobreoautordodanooônusdecorrente dos custos sociais de sua atividade”32. Conforme aponta, em tema de tutela am- biental, a responsabilidade objetiva foi então vin- culada à teoria do risco integral. Para que haja res- ponsabilidade civil, basta a prova da ocorrência do dano e o nexo causal deste com a prática de uma determinada conduta ou atividade humana33. Tratando-se de responsabilidade objetiva, 31 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 952-954. 32 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 952-954. 33 Idem, p. 954-955. 70& & ! ! & & & & & & & o dever de reparar o dano independe de culpa, da licitude da atividade e da presença de excludentes e de cláusulas de não indenizar. Com efeito, dispõe o §1.º, do artigo 14, da Lei nº 6.938 de 1981 o seguinte: § 1.º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos cau- sados ao meio ambiente. Em atenção à teoria do risco integral, a legislação ordinária atribuiu ao causador do dano o dever da reparação independentemente da in- vestigação da culpa ou da contribuição do agente poluidor para a produção do dano. 71& & ! ! & & & & & & 2.5. Responsabilidade& Administrativa& & O artigo 225 da Constituição Federal conforme dito dispõe que as pessoas, físicas ou jurídicas, sujeitam-se às sanções administrativas pela prática de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Celso Antônio Bandeira de Mello34 en- sinaque“InfraçãoAdministrativaéodescumprimento voluntáriodeumanormaadministrativa”,e“Sanção administrativaéaprovidênciagravosaprevistaemcaso deincursãodealguémemumainfraçãoadministrativa (...)”,e, também, que“arazãopelaqualaleiqualifi- cacertoscomportamentoscomoinfraçõesadministrativas, eprevêsançõesparaquemnelasincorra,éadedesestimu- larapráticadaquelascondutascensuradasouconstranger ao cumprimento das obrigatórias.” Celso Antônio Pacheco Fiorillo, por sua vez, afirma o seguinte: Sanções administrativas são penalidades impos- tas por órgãos vinculados de forma direta ou in- direta aos entes estatais (União, Estados, Muni- 34 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Adminis- trativo. 18ª ed. Malheiros. São Paulo, 2005. pg. 777. 72& & ! ! & & & & & & & & cípios e mesmo Distrito Federal), nos limites de competências estabelecidas em lei, com o objeti- vo de impor regras de conduta àqueles que tam- bém estão ligados à Administração no âmbito do Estado Democrático de Direito35. Segundo a doutrina, as sanções adminis- trativas estão ligadas ao poder de polícia, isto é, à atividade da administração pública que, limi- tando ou disciplinando direito, interesse ou li- berdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exer- cício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à proprieda- de e aos direitos individuais ou coletivos (artigo 78, do Código Tributário Nacional). O poder de polícia, segundo afirma Édis Milaré, é prerrogativa do Poder Público, e é dota- do dos atributos da discricionariedade, da auto- executoriedade e da coercibilidade, inerentes aos 35 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Bra- sileiro. Editora Saraiva: São Paulo, 2007. p. 52-53. 73& & ! ! & & & & & & & atos administrativos36. Em matéria ambiental, o poder de polícia que justifica a incidência de sanções administrati- vas, e tem por objetivo desestimular a prática de condutas lesivas ao meio ambiente e constranger ao cumprimento das obrigatórias, encontra fun- damento no artigo 225 da Constituição Federal: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presen- tes e futuras gerações. De acordo com o comando normativo constitucional destacado, a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal devem assegurar a defesa dos bens de uso comum do povo re- putados essenciais à sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações. Esse dever é exercido por todos os en- 36 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. 6ª ed. Editora Revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p.878. 74& & ! ! & & & & & & & tes federativos por meio de ações fiscalizadoras e medidas corretivas. São deveres específicos do Poder Público na tutela do ambiente a preser- vação e restauração dos processos ecológicos essenciais, promoção do manejo ecológico das espécies e ecossistemas, preservação da biodi- versidade e controle das entidades de pesquisa e manipulação de material genético, definição de espaçosterritoriais especialmente protegidos, re- alização de Estudo Préviode Impacto Ambien- tal, controle da produção, comercialização e utili- zação de técnicas, métodos e substâncias nocivas à vida, à qualidade de vida e ao meio ambiente, educação ambiental, e proteção à fauna e flora. Como por força do princípio da legali- dade a imposição de penalidades depende da ocorrência concreta no mundo dos fatos das condutas descritas nos antecedentes das normas jurídicas, a atividade administrativa que tem por finalidade inibir e punir a prática das condutas lesivas em razão da defesa e proteção dos bens é plenamente vinculada. O artigo 37, “caput”, da Constituição Fe- deral, dispõe que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios 75& & ! ! & & & & & & & obedecerá aos princípios de legalidade, impesso- alidade, moralidade, publicidade e eficiência. Celso Antônio Bandeira de Mello37 res- salta que o princípio da legalidade: é o princípio basilar do regime jurídico-adminis- trativo, já que o Direito Administrativo (...) nasce com o Estado de Direito: é uma consequência dele. É o fruto da submissão do Estado à lei (...) a consagração da idéia de que a Administração Pú- blica só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na ex- pedição de comandos complementares à lei. (...) a atividade de todos os seus agentes (...) só pode ser a de dóceis (...) cumpridores das dis- posições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no Di- reito brasileiro. Ainda que, o princípio da legalidade, radicado nos artigos 5.º, inciso II, 37, “caput”, e 84, inciso IV, da Carta Maior, está assentado 37 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Adminis- trativo. 18ª ed. Malheiros: São Paulo, 2005. p. 92-93. 76& & ! ! & & & & & & & na própria estrutura do Estado Democrático de Direito, e que os dispositivos constitucionais lhe atribuem “uma compostura muito estrita e rigo- rosa, não deixando válvula para que o Executivo se evada de seus grilhões”38. No julgamento do Recurso Especial nº 1137314/MG, o Superior Tribunal de Justiça de- cidiu que: (...) 2. A multa aplicada pela autoridade administrativa é autônoma e distinta das sanções criminais co- minadas à mesma conduta, estando respaldada no poder de polícia ambiental. 3. Sanção administrativa, como a própria expres- são já indica, deve ser imposta pela Administração, e não pelo Poder Judiciário, porquanto difere dos crimes e contravenções. 4. A Lei 9.605/1998, embora conhecida popular e imprecisamente por Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente, a rigor trata, de maneira simultânea e em partes diferentes do seu texto, de infrações pe- nais e infrações administrativas. 5. No campo das infrações administrativas, exige- 38 MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 18ª ed. Malheiros: São Paulo, 2005. p. 92-93. 77& & ! ! & & & & & & & & -se do legislador ordinário apenas que estabeleça as condutas genéricas (ou tipo genérico) consideradas ilegais, bem como o rol e limites das sanções pre- vistas, deixando-se a especificação daquelas e des- tas para a regulamentação, por meio de Decreto. 6. De forma legalmente adequada, embora ge- nérica, o art. 70 da Lei 9.605/1998 prevê, como infração administrativa ambiental, “toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio am- biente”. É o que basta para, com a complementa- ção do Decreto regulamentador, cumprir o princí- pio da legalidade, que, no Direito Administrativo, não pode ser interpretado mais rigorosamente que no Direito Penal, campo em que se admitem tipos abertos e até em branco. 7. O transporte de carvão vegetal sem prévia licen- ça da autoridade competente caracteriza, a um só tempo, crime ambiental (art. 46 da Lei 9.605/1998) e infração administrativa, nos termos do art. 70 da Lei 9.605/1998 c/c o art. 32, parágrafo único, do Decreto 3.179/1999, revogado pelo Decreto 6.514/2008, que contém dispositivo semelhante. 8. As normas em comento conferem sustentação legal à imposição de sanção administrativa. Pre- cedentes do STJ. (...)” (REsp 1137314/MG. Mi- 78& & ! ! & & & & & & & & nistro HERMAN BENJAMIN. Segunda Turma. 17/11/2009) Em que pese o quanto aduzido pelo Superior Tribunal de Justiça, parece que, assim como no Direito Penal, ante a necessidade de as- segurar um mínimo de segurança jurídica aos ad- ministrados, a atividade administrativa ambiental depende da previsão legal e da tipicidade das con- dutas consideradas lesivas ao meio ambiente39. 2.6. Processo& Administrativo&Ambiental& & & Em atenção ao texto constitucional, e ao 39 Édis Milaré, embora reconheça que “A Administração Pública e, por conseguinte, a aplicação de sanções administrativas pelos entes federativos pautam-se pelo princípio da legalidade, certo que ‘ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei’.”, sustenta que “a incidência princípio da legalidade, salvo disposição de lei em con- trário, não implica o rigor de se exigir que as condutas infracionais sejam previamente tipificadas, uma a uma, em lei, tal como ocorre no Direito Penal”. Para o autor, “basta a violação de preceito inserto em lei ou em normas regulamentares, configurando o ato como ilícito, para que incidam sobre o caso as sanções prescritas, estas sim, em texto legal formal”. (MI- LARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p.892-893). 79& & ! ! & & & & & & & princípio do devido processo legal, consagrado no artigo 5.º, incisos LIV e LV da Carta Maior, segundo o qual é assegurado aos administrados em geral o direito ao contraditório e à ampla de- fesa, com todos os meios e recursos a ela ine- rentes, a Lei nº 9.605 de 1998, e, o Decreto nº 6.514 de 2008, que a regulamenta, dispõe sobre normas gerais relativas às infrações administra- tivas, configurando-se atualmente, sem prejuízo das demais normas previstas no ordenamento jurídico reservadas à disciplina da responsabi- lidade administrativa no âmbito do patrimônio genético, do meio ambiente cultural, artificial, do trabalho e natural, importante instrumento40 de defesa e preservação dos bens ambientais. Segundo aponta a doutrina, a lei aplica-se a todo poluidor, pessoa física ou jurídica, de di- reito público ou privado, que por ação ou omis- são viola a tutela jurídica dos bens ambientais41. A lei define a infração administrativa am- biental como toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente (artigo 70, “caput”). 40 Ao lado da Lei nº 9.605 de 1998, imperioso observar que a Lei nº 9.784 de 1999 elencou diversos critérios que objetivam garantir o pleno exercício do direito à ampla defesa. 41 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Bra- sileiro. Editora Saraiva: São Paulo, 2007. p.57. 80& & ! ! & & & & & & & Disciplina que as infrações devem ser apuradas pela autoridade competente, em pro- cesso administrativo próprio, assegurado o direito de ampla defesa e o contraditório, ou ainda, por intermédio de qualquer pessoa que, constatando a infração ambiental, formule re- presentação para efeito do poder de polícia (ar- tigo 70, §§ 1.º e 2.º). 42 E elenca as sanções administrativas de ín- dole preventiva, reparatória e predominantemente repressiva, quais sejam, a advertência, multa sim- ples, multa diária, apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petre- chos, equipamentos ou veículos de qualquer nature- za utilizados na infração, destruição ou inutilização do produto, suspensão de venda ou fabricação do produto, embargode obra ou atividade, demolição de obra, suspensão parcial ou total de atividade, e restrição de direitos tais como suspensão ou cance- lamento de registro, licença ou autorização, perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais, perda ou suspensão da participação em linhas de finan- ciamento em estabelecimentos oficiais de crédito, e proibição de contratar com a Administração Públi- 42 Isto é, de ofício pela autoridade administrativa, ou por representação de qualquer pessoa do povo. 81& & ! ! & & & & & & & ca, pelo período de até três anos. Por fim, estabelece regras voltadas ao procedimento administrativo43, prazos, defesas, recursos, julgamentos, e que os valores arreca- dados em pagamento de multas por infração ambiental destinam-se ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, criado pela Lei nº 7.797 de 1989, Fundo Naval, criado pelo Decreto nº 20.923 de 1932, fundos estaduais ou municipais de meio ambiente, ou correlatos, conforme dis- posto pelo órgão arrecadador (artigo 73). 2.7. Pressupostos&da& Responsabilidade& Administrativa& Ambiental& & & O artigo 70 da Lei nº 9.605 de 1998 dis- põeque:“Art.70.Considera-seinfraçãoadministra- 43 Édis Milaré pondera que, “Na apuração de infrações administrativas, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, em regra sua legislação própria nessa matéria, editada cm base na competência concor- rente para legislar sobre proteção ambiental, bem como, supletivamente, a legislação federal.”, bem como que o artigo 71, da lei nº 9.605 de 1998 só é aplicável à Administração Pública Federal (Direito do Ambiente. A Ges- tão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 923 e 931) 82& & ! ! & & & & & & & tivaambientaltodaaçãoouomissãoquevioleasregras jurídicasdeuso,gozo,promoção,proteçãoerecuperação do meio ambiente.” De acordo com o comendo normativo mencionado, qualquer pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, que tenha concor- rido, por ação ou omissão, para a prática da infra- ção, responde perante a Administração pela le- são ou risco de lesão causados ao meio ambiente. A infração administração envolve a prática de uma conduta ilícita, contra legem. En- quanto na reparação civil basta a verificação do dano, a essência da infração consiste no com- portamento que se caracteriza pela desobediên- cia às normas jurídicas de tutela ambiental44. O dano ambiental, isoladamente, não é gerador de responsabilidade administrativa; contrario sensu, o dano que enseja responsabilidade administrativa é aquele enquadrável como o resultado descrito em um tipo infracional ou o provocado por uma conduta omissiva ou comissiva violadora de re- gras jurídicas. danoso causado por outra45. 44 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p.886. 45 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p.885. 83& & ! ! & & & & & & & A responsabilidade administrativa ca- racteriza-se, ainda, pela inversão do ônus da prova. Como se sabe, o auto de infração é o ato administrativo que dá início ao processo admi- nistrativo ambiental. Por se tratar de ato admi- nistrativo goza de presunção de legitimidade e veracidade. Assim, instaurado o processo com- pete ao interessado apresentar defesa no prazo legal para desconstituir o auto de infração46. 2.8. A&Natureza&da& Responsabilidade&Administrativa& & Conforme disciplina Celso Antônio Bandeira de Mello as infrações administrativas para serem válidas e atribuídas a quem nelas in- cidiu, devem atender a determinados princípios básicos consagrados pelo ordenamento jurídico pátrio. Além do princípio de que a sanção não pode ultrapassar a pessoa do infrator, para apli- cação da pena, a incursão na infração deve ser voluntária47. 46 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p.890. 47 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Adminis- trativo. 18ª ed. Malheiros: São Paulo, 2005. p. 777. 84& & ! ! & & & & & & & Se a incursão na infração depende da vontade do agente, não se pode deixar de ol- vidar que a incidência da sanção administrativa depende do dolo ou culpa de quem deu causa ou concorreu, ainda que de qualquer forma, para a prática da infração administrativa ambiental. A doutrina e a jurisprudência divergem quanto à natureza da responsabilidade administrativa ambiental, ora sustentando que ela é objetiva, ora que é subjetiva. No julgamento do recurso de apelação nº 359.129-5/00-0, cujo voto exarado ora se destaca, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu que a responsabilidade adminis- trativa ambiental não se confunde com a res- ponsabilidade pela reparação do dano causado ao meio ambiente para concluir que a responsa- bilidade administrativa é subjetiva: O autor foi autuado (fls. 20) por infração tipifi- cada no art. 2.º, 3.º, V e 26 do Regulamento da LEI n° 997/76, aprovado pelo DE n° 8.468/76. O art. 2o proíbe o lançamento ou liberação de poluentes nas águas, no ar ou no solo; o art. 3o considera poluente toda e qualquer forma de matéria ou energia lançada nas águas, no ar ou 85& & ! ! & & & & & & & & no solo; o art. 26 proíbe a queima ao ar livre de resíduos sólidos, líquidos ou de qualquer outro material combustível, exceto mediante autoriza- ção da Cetesb. O art. 80 § único do Regulamento estabelece que ‘responderá pela infração quem por qualquer modo a cometer, concorrer para sua prática ou dela se beneficiar’. ‘Cometer’ e ‘concorrer para sua prática’ são con- dutas comissivas, ainda que ‘por qualquer modo’; ‘dela se beneficiar’ é responsabilidade objetiva, cuja adequação à sanção é mais complexa mas que, nestes autos e ante a demonstração que ne- nhum benefício teve o autor, dispensa análise. Os autos não demonstram relação entre a con- duta tipificada e a conduta do autor; ao contrário, tudo indica que o autor não causou o fogo que parece ter tido início na propriedade vizinha e que nenhuma atividade potencialmente degra- dante foi por ele exercida. Não se pode confundir a responsabilidade pela infração administrativa, que é pessoal e imposta nos termos descritos na lei, com a responsabili- dade pela recomposição do dano, objetiva e que decorre da propriedade ou da atividade desen- volvida. Por tais razões, e não por aquelas deli- neadas na sentença, a autuação foge ao disposto 86& & ! ! & & & & & & & & no § único do art. 80 do DE b° 8,468/76 e não pode subsistir. Não há relação entre a conduta da autora e as condutas tipificadas no auto de infração. A igual conclusão chegou a Câmara Ambiental no caso Fazenda Estadual vs Amira Kyrillos Derani, AC n° 321.674.5/4- 00, 2007, por mim relatado (voto AC-282). Analisando o recurso nº 0025849- 04.2005.8.26.0000, a Câmara Reservada ao Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo também asseverou o seguinte: 4. Responsabilidade. Não se pode confundir a responsabilidade administrativa pela infração com a responsabilidade pela recomposição, ain- da que em matéria ambiental a diferença seja atenuada de acordo com as circunstâncias espe- cíficas do caso. A responsabilidade pela infração administrativa, que resulta na autuação pelo ór- gão competente, é responsabilidade subjetiva, diferente da responsabilidade objetiva de repara- ção ao dano ambiental. 87& & ! ! & & & & & & & Enquanto parte da Câmara refuta a idéia de que a responsabilidade administrativa prescin- de da culpa, parte sustenta que a responsabilida- de administrativa é objetiva. Na mesma Câmara, em outubro de 2011, no julgamento da apelação cível que objetivava afastar incidência de multa administrativa, restou estabelecido o seguinte: Embargos à execução fiscalpor multa ambiental queima de palha de cana-de-açúcar infringên- cia do art. 26 Do regulamento da lei nº 997/76, aprovado pelo decreto nº 8.468/76 Alegada a inexistência de nexo de causalidade descabimen- to haveria no mínimo culpa in vigilando da em- presa, embora tanto não fosse necessário, diante da objetivação da responsabilidade fundada na teoria dorisco integral interpretação do art. 14, § 1.º, da lei 6.938/81 E do art. 225, § 2.º, da cf, o qual impôs ao poder público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações presunção de legitimidade e veracidade da autuação propor- cionalidade da multa aplicada, diante da manifes- ta nocividade para o ambiente, a saúde pública e agricultura mantida a sentença em sua integrali- dade honorários que remuneram condignamen- 88& & ! ! & & & & & & & & te o patrono da parte contrária apelo. O voto conduzido pelo relator Renato Nalini fundamentou que a responsabilidade ad- ministrativa ambiental prescinde de culpa ante a teoria do risco integral que justifica a pres- cindibilidade da culpa na reparação do dano na esfera cível: A infração foi enquadrada nos artigos 26 e 80, todos do Regulamento da Lei nº 997/76, apro- vado pelo Decreto nº 8.468/76, e a autuada pe- nalizada com uma multa correspondente a 5.001 vezes o valor da UFESP, nos termos dos artigos 81, inciso II, 84, inciso III e 94, todos do citado regulamento. A empresa não estava autorizada a proceder à queima de palha de cana-de-açúcar e por isso teve incidência na espécie o artigo 26 do Regula- mento da Lei nº 997/76, aprovado pelo Decreto nº 8.468/76. (...) Descabida a alegada inexistência de nexo de cau- salidade entre o dano ambiental e a atitude da apelante. O fato de não ter sido ela a autora da 89& & ! ! & & & & & & & & queima o que não se comprovou não a beneficia. É que atendeu aos seus intuitos receber a colhei- ta da cana previamente submetida ao tratamento rudimentar. Todo agente causador de dano ecológico é res- ponsável por suas consequências. O imóvel rural extraiu benefícios dessa conduta nefasta que é a queimada de palha de cana-de-açúcar. Seus titu- lares são objetivamente responsáveis pelos efei- tos da agressão ecológica. Está totalmente superada a questão procedimen- tal estéril de se eximir alguém da responsabilida- de, sob argumento de que não foi o causador da queimada. A jurisprudência segue o caminho mais sensato: todo aquele que tirar proveito da conduta lesiva, poderá ser chamado a responder por ela. Parceiro, arrendatário, titular, promitente com- prador, meeiro, seja qual for a natureza jurídica da avença ou a situação que se pretenda fazer configurar, a resposta do Estado-juiz deverá ser a mesma. Já não é possível invocar descomprome- timento para se eximir de obrigações assumidas perante as atuais e as futuras gerações. A responsabilidade é solidária e objetiva. Inci- de na espécie o velhíssimo brocardo romano de que o ônus deve ser suportado por quem se be- 90& & ! ! & & & & & & & & neficia da prática. Todos os réus devem responder pela nociva atu- ação em relação à natureza. O que é relevante é o fato do fogo ter ocorrido em terreno de propriedade destinada ao cultivo de cana-de-açúcar a ser empregada na atividade de SÃO MARTINHO S/A (Atual denominação da COMPANHIA INDUSTRIAL E AGRÍCO- LA OMETTO). Há se falar, no mínimo, em cul- pa in vigilando da requerida, embora a demons- tração da culpabilidade, na hipótese sub judice, seja desnecessária. Ao criar um futuro sujeito de direitos, ainda não nascido, e ao responsabilizar indiscriminadamen- te Poder Público, sociedade e indivíduos pela proteção à natureza, o constituinte evidenciou o apreço a ser conferido a esse novíssimo ramo do direito. Aliás, o Direito Ambiental é produção típica de direito de crise, resposta criativa e au- daciosa para os riscos infligidos pela insensatez humana ao maltratado ambiente terrestre. Bem por isso, toda apreciação judicial pertinen- te à natureza haverá de ter presente a intenção do Legislador Constituinte. Dentre eles, adquire relevância para a espécie dos autos o do polui- dor pagador. Não significa a possibilidade de se 91& & ! ! & & & & & & & & poder pagar para poluir, mas a responsabilidade civil que se objetiva a cada dia, de reparar o dano causado ao meio ambiente, seja com fundamen- to no § 3.º do artigo 225 da Constituição Fede- ral5, seja com fundamento no § 1.º do artigo 14 da Lei nº 6.938/816. Não se trata, conforme entendem alguns juristas, da objetivação da responsabilidade civil fundada na teoria do risco criado, modalidade que admiti- ria excludentes fundadas na culpa exclusiva da ví- tima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior. Na verdade, está se diante de uma objetivação com a adoção da teoria do risco integral, pois, se o porvir depende de cautela extrema das atuais gera- ções, para que possa existir qualidade de vida e até mesmo condições mínimas de subsistência num planeta submetido a intenso maltrato, é evidente que toda norma ambiental há de ser interpretada de modo a se atingir os desígnios constitucionais. Para a teoria do risco integral basta que se com- prove a ocorrência do dano, e o nexo de causa- lidade com a atividade desenvolvida. Ou seja, o dever de reparar é fundamentado pela só existên- cia da atividade da qual adveio o prejuízo. Não se cogita das causas do infausto. Não se investiga a culpa do dono da atividade. 92& & ! ! & & & & & & & & Não são invocáveis as tradicionais excludentes da responsabilidade civil. Não se isenta a apelante, portanto, de sua res- ponsabilidade objetiva. A infratora poderia até responder solidariamente com os supostos pi- romaníacos, mas nunca poderia restar incólume e desvinculada do incêndio, ocorrida em cultura destinada ao desenvolvimento de suas atividades. No mais, adequada a multa aplicada. (...) Eduardo Fortunato Bonin defende que “paraserpossívelaaplicaçãodapenaadministrativa, asemelftançadoqueocorrenasearapenal,énecessário ftavernegligência,imprudência,imperíciaoudolo;semal- gunsdesseselementosnãosejustificaapuniçãoadminis- trativa,aindaquesejanasearaambiental48”.Aponta referido autor, ao citar doutrina acerca da maté- ria, o seguinte: A norma constitucional reforça a proteção ao meio ambiente na medida em que separa os cam- pos de atuação dos sistemas que o protegem: ad- 48 BONIN, Eduardo Fortunato. Mito da Responsabilidade Objetiva no Direito Ambiental Sancionador: Imprescindibilidade da Culpa nas In- frações Ambientais. Revista de Direito Ambiental. vl. 57. Jan/2010. DTR\2010\16, p. 33. 93& & ! ! & & & & & & & & ministrativo, penal e o civil. O que preceitua o dispositivo constitucional é que a reparação do dano não é causa suficiente para obstar a apli- cação das sanções penais ou administrativas, sancionatórias ou não. Não diz que a responsa- bilidade em relação às sanções administrativas é objetiva; caso fosse esse o móvel do dispositivo, as sanções penais também seriam objetivas, fato notoriamente inexistente. O texto constitucional apenas consagra a vedação de que reparar o dano seria suficiente para o poluidor. (...) A leitura do § 1.º do art. 14 da Lei 6.938/1981 confirma tal teoria ao preceituar que a indeniza- ção ou reparação dos danos causados ao meio ambiente não obsta a aplicação das sanções ad- ministrativa. Não são as sanções administrativas que prescindem da culpa, mas a indenização ou reparação do dano segundo clara previsão do dispositivo: “(...) é o poluidor obrigado, indepen- dentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambien- te e a terceiros, afetados por sua atividade” (art. 14, §1.º, da Lei 6.938/1981). Com razão, Ricardo Carneiro doutrina que não há “em nosso direi- to positivo nenhum espaço para a imposiçãode 94& & ! ! & & & & & & & & sanções pelo mero resultado ou à margem da re- ferência ao elemento subjetivo. O dispositivo também cita a indenização a ter- ceiros, deixando claro que não apenas o dano causado ao meio ambiente é indenizado objeti- vamente, mas o dano a terceiros também, seja particular, seja público. Não faria sentido punir com multas ambientais os danos causados a ter- ceiros; o direito ambiental sancionador se refere a ilícitos administrativos, não a civis. A respon- sabilidade civil prevista nesse artigo somente diz que a indenização não exclui as penalidades ad- ministrativas, como também o faz o § 3.º do art. 225 da CF/1988 ( LGL 1988\3)49. Analisando as decisões da Câmara Reser- vada ao Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo e a doutrina, parece que a melhor disciplina é a de que a responsabilidade adminis- trativa depende de culpa, tal como ocorre no Di- reito Penal, já que a sanção administrativa não se confunde com a sanção civil e vice-versa. 49 BONIN, Eduardo Fortunato. Mito da Responsabilidade Objetiva no Direito Ambiental Sancionador: Imprescindibilidade da Culpa nas In- frações Ambientais. Revista de Direito Ambiental. vl. 57. Jan/2010. DTR\2010\16, p. 33. 95& & ! ! & & & & & & 2.9. Excludentes&da& Responsabilidade&Administrativa& & Diante do fato de que a prova da culpa é imprescindível à responsabilidade administra- tiva, a força maior, o caso fortuito e o fato de terceiro, são causas que excluem a tipicidade e afastam a responsabilidade administrativa. Como o ato administrativo goza de pre- sunção de legitimidade e veracidade, parte da doutrina sustenta que compete ao interessado demonstrar que sua conduta não concorreu para a prática da infração. Eduardo Fortunato Bonin, que defende que a responsabilidade administrativa é subjetiva, afirma todavia o seguinte: O ônus da prova da culpa ou do dolo é de quem afirma a sua existência. Assim como no processo penal o ônus da prova é da acusação, no proces- so administrativo sancionatório é de quem impôs ou imporá a sanção. A Administração deve provar que o infrator agiu com dolo ou culpa: “somente ficando demonstrado que a infração ambiental foi praticada por dolo ou culpa é que deve o infrator ser responsabilizado administrativamente”. 96& & ! ! & & & & & & & & Ocorre que ao contrário do que poderia parecer, tal entendimento não enfraquece o jus puniendi administrativo. A prova que a acusação faz do dolo é indireta, uma vez que é muito difícil con- seguir a direta, como seria o caso de uma con- fissão. Pelas circunstâncias é que se comprova indiciariamente o dolo; no caso da culpa, a com- provação ocorre com a descrição do dever de cuidado violado. Em ambos os casos não existe prova conclusiva, apenas indiciária, porque ca- berá ao acusado comprovar a falta do elemento subjetivo ou pelo menos infirmar o raciocínio indiciário da acusação. Por isso Marcelo Madureira Prates é enfático ao defender que é o administrado que deverá apre- sentar “motivos suficientes a justificar a inob- servância do seu dever administrativo”,porque também entende que a presença de culpa “não estará, nem poderia estar, cabalmente provada pela Administração logo na peça de acusação50. De fato, o auto de infração goza de pre- 50 BONIN, Eduardo Fortunato. Mito da Responsabilidade Objetiva no Direito Ambiental Sancionador: Imprescindibilidade da Culpa nas In- frações Ambientais. Revista de Direito Ambiental. vl. 57. Jan/2010. DTR\2010\16, p. 33. 97& & ! ! & & & & & & & sunção de legitimidade e veracidade, contudo, sob pena de nulidade, deve descreve a conduta ilícita e demonstrar que o autuado agiu de forma contrária à legislação administrativa ambiental, possibilitando o pleno exercício do contraditó- rio e da ampla defesa. O agente fiscal ambiental deve agir com diligência e prudência e verificar por meio dos instrumentos cabíveis à prática do ilícito administrativo ambiental. 2.10. A&Responsabilidade& Administrativa&&Ambiental&&e&&a& Ação&de& Improbidade& & & Édis Milaré aponta que a Constituição Federal de 1988 consagrou os princípios para reger as atividades da Administração Pública Di- reta e Indireta (artigo 37), impondo ao Poder Pú- blico o dever de desenvolver seus trabalhos com probidade, razoabilidade, proporcionalidade, le- galidade, lealdade, moralidade e publicidade51. Afirma, também, referido autor, que os 51 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p. 939-940. 98& & ! ! & & & & & & & entes da Administração Pública, “incumbidos da gestãoedaadministraçãodosrecursosambientaiseda qualidadepositivadomeio,estãointerligadosatravésdo SistemaNacionaldoMeioAmbiente–SISNAMA”, e devem exercer suas atividades de forma coo- perativa e harmônica “em atenção ao papel pri- mordial que assumem na missão de proteger o meio ambiente e de sempre garantir ou restaurar o equilíbrio dos ecossistemas52”. Como medida adequada e eficaz à con- secução dos interesses da coletividade, a Lei nº 6.938 de 1981 arrolou os instrumentos de imple- mentação da Política Nacional do Meio Ambien- te. Tais instrumentos não excluem, no entanto, o controle da probidade administrativa por meio da Ação Civil Pública, mas conjuntamente visa a garantir a efetividade do direito ao meio ambien- te ecologicamente equilibrado. Como ensina Édis Milaré, o ato admi- nistrativo ambiental submete-se à fiscalização do Poder Judiciário, mediante provocação do cidadão por meio dos remédios constitucionais do mandado de segurança e da ação popular, ou ainda, do Ministério Público e demais pessoas ju- rídicas legitimadas pela lei para propor ação civil 52 Idem, p. 939. 99& & ! ! & & & & & & & de improbidade administrativa53. Com o advento da Lei n.º 8.429 de 1992, tanto o erário quanto a moralidade administrati- va passaram a ser tutelados pelo Poder Judiciário. Aludido comando normativo, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na admi- nistração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências, preocupou-se com o combate contra a corrupção administrativa, isto, contra os atos que afrontam os princípios basila- res da ordem jurídica. O artigo 37, §4.º, da Constituição Fe- deral, dispõe que os atos de improbidade admi- nistrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponi- bilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. De acordo com a doutrina, para apurar e punir a prática de atos dessa natureza, foi editada a Lei nº 8.429 de 1992, que se tornou o veículo de proteção da moralidade administrativa54. 53 Ibidem, p. 942 54 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em Foco. Editora revista dos Tribunais: São Paulo, 2009. p.944. 100& & ! ! & & & & & & & Nos termos do artigo 1.º, estão sujeitos aos ditames da lei, os atos de improbidade pra- ticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patri- mônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concor- ra com mais de cinquenta por cento do patri- mônio ou da receita anual, bem como os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com me- nos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos,a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a con- tribuição dos cofres públicos (parágrafo único). Para efeitos da lei, considera-se agente público, todo aquele que exerce, ainda que tran- sitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades men- 101& & ! ! & & & & & & & cionadas no artigo anterior (artigo 2.º). De acordo com o artigo 3.º a lei aplica- -se àquele que, mesmo não sendo agente públi- co, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta. Os atos de improbidade administrativa são classificados como atos que importam enrique- cimento ilícito (artigo 9); como atos que causam prejuízo ao erário (artigo 10); e atos que atentam contra os princípios da Administração Pública. As penas cominadas na Lei nº 8.429 de 1992 são aplicadas sem prejuízos às demais san- ções civis, penais e administrativas previstas em legislação específica (artigo 12). O artigo 14 da lei dispõe que qualquer pessoa poderá representar à autoridade adminis- trativa competente para que seja instaurada in- vestigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade, e o 17, que a ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Pú- blico ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar. Consoante disciplina o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal, são funções institu- cionais do Ministério Público promover o inqué- 102& & ! ! & & & & & & & rito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. 2.11. Responsabilidade& Penal&Ambiental& & Segundo Celso Antônio Pacheco Fio- rillo, diante da repercussão social e da necessi- dade de uma intervenção estatal mais severa, de- terminadas condutas são erigidas à categoria de tipos penais, dando ensejo a aplicação de sanções mais rigorosas e de maior eficácia social55. (Curso de Direito Ambiental. 8ª Edição. Editora saraiva: São Paulo, 2007. p. 58) Ao citar Nelson Hungria, aponta o autor que“oilícitopenaléaviolaçãodoordenamentojurídico contraaqual,pelasuaintensidadeougravidade,aúnica sanção adequada é a pena”. Nos termos do artigo 225, §3.º, da Cons- tituição Federal, as condutas criminosas pratica- das contra o meio ambiente serão punidas pelo Direito Penal Ambiental. 55 FIORILLO, Celso Antônio Pacheo. Curso de Direito Ambiental. 8ª ed. Editora Saraiva: São Paulo, 2007. p. 58. 103& & ! ! & & & & & & & Em atenção ao texto constitucional, foi editada a Lei n.º 9.605 de 1998. Referido diplo- ma normativo trata das sanções penais e admi- nistrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e será estudada no item a seguir. 104& & ! ! & & & & & & & & & & & & Capítulo& 3& & & Crimes&Ambientais& ! ! ! ! Como se sabe, um dos objetivos do Di- reito Positivo, isto é, do complexo de normas que formam o nosso ordenamento jurídico, é regular e disciplinar a vida em sociedade e o con- vívio dos indivíduos que a compõe. Quando os preceitos previstos nesse or- denamento não são obedecidos ou cumpridos pelos membros da sociedade, e as sanções civis não são suficientes para coibir a prática de ilícitos jurídicos graves que atingem além de interesses in- dividuais bens jurídicos relevantes, o conjunto de regras reúne normas jurídicas que proíbem deter- minadas condutas, sob pena de sanção penal. Segundo o Professor e Doutor Júlio Fa- bbriniMirabete56 “Ofatoquecontrariaanormade Direito,ofendendooupondoemperigoumbemalfteioou aprópriaexistênciadasociedade,éumilícitojurídico,que podeterconsequênciasmeramentecivisoupossibilitara aplicaçãodesançõespenais.”.Quandoos“meiosmenos incisivos,comoosdeDireitoCivilouDireitoPúblico, nãobastamaointeressedeeficienteproteçãoaosbensju- rídicos.”, justificam-se as disposições penais. A conduta profundamente lesiva à socie- dade dá ensejo, então, à intervenção do Estado e 56 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. Parte Geral. 21ª ed. Editora Jurídico Atlas: São Paulo, 2004, v. I, p. 22. 107& & ! ! & & & & & & & justifica a adoção de medidas coercitivas contra os indivíduos por meio do Direito Penal. Os ilícitos ou infrações dessa natureza, embora não sejam definidos pela legislação pe- nal, de acordo com a gravidade do fato são clas- sificados em crimes e contravenções penais. De acordo com o artigo 1.º do Decreto- -Lei nº 3.914 de 1941, considera- se crime a in- fração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alterna- tiva ou cumulativamente com a pena de multa, e, contravenção, a infração penal que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de mul- ta, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. Objetivando assegurar a tutela jurídica do meio ambiente de relevante alcance social, algu- mas normas jurídicas passaram a coibir a prática de condutas lesivas mediante aplicação de penas de prisão simples ou de multa. O antigo Código Florestal (Lei nº 4.771/65) elencava as condutas consideradas como contravenções penais, que eram punidas com pena de 03 (três) meses a 1 (um) ano de prisão simples ou multa de 1 (uma) a 100 (cem) vezes o salário- mínimo mensal, do lugar e da data da infração ou ambas as penas cumulativamente. Mas, o novo Código Florestal 108& & ! ! & & & & & & & (Lei n.º 12.651/12) não menciona qualquer tipo de contravenção penal, fazendo referência em seu art. 60 apenas a três crimes previstos na Lei de crimes ambientais (arts. 38, 39 e 48). Com o advento da Constituição Federal de 1988, contudo, o meio ambiente ecologica- mente equilibrado foi elevado à categoria de di- reito fundamental e bem jurídico essencial à saú- de e bem estar das presentes e futuras gerações, e determinadas condutas começaram a ser repre- endidas de forma mais rigorosa. Inicialmente, a Lei nº 7.803 de 1989 incluiu o artigo 45, §3.º, ao Código Florestal, para punir com pena de deten- ção de 1 (um) a 03 (três) meses e multa de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos de referência, a co- mercialização ou utilização de motosserras sem a devida licença expedida por autoridade compe- tente. Posteriormente, a Lei n.º 7.804, também, de 1989, alterou o artigo 15 da Lei nº 6.938 de 1981, para sujeitar o poluidor que expor a perigo a incolumidade humana, animal ou vegetal, ou tornar mais grave situação de perigo existente, à pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa, assim como, a autoridade competente que deixar de promover as medidas tendentes a im- pedir a prática das condutas descritas. 109& & ! ! & & & & & & & Como a maioria das condutas e praticas lesivas ao meio ambiente eram punidas como contravenções penais, ou seja, tinham por con- sequência uma pena mais branda e de menor eficácia social, em 1998, foi editada e publicada a Lei nº 9.605. Diante da criminalização consti- tucional, parte das condutas, dantes punidas com pena de prisão simples ou multa, ficou sujeita às penas de detenção, ou reclusão e multa. A Lei n.º 9.605 de 1998 é divida em Par- te Geral e Parte Especial. A Parte Geral que vai do artigo 2.º ao artigo 28 é composta por qua- tro capítulos que tem por finalidade disciplinar a aplicação da pena, a apreensão do produto e do instrumento de infração administrativa ou de crime, a ação e o processo penal, garantindo a aplicação subsidiária à lei tanto as disposições do Código Penal quanto do Código de Processo Pe- nal (artigo 79), e ainda da Lei dos Juizados Espe- ciais Criminais, quando a infração for de menor potencial ofensivo. A Parte Especial, por sua vez, é destinadaàs espécies de crimes contra o meio ambiente. A primeira Seção, que vai do artigo 29 ao 37, dedica- -se aos Crimes contra a Fauna, a segunda que vai do artigo 38 ao 53, aos Crimes contra a Flora, a 110& & ! ! & & & & & & & terceira que vai do artigo 54 ao 61, à Poluição a aos outros Crimes contra o Meio Ambiente, a quarta que compreende os artigos 62 aos 65 dedica-se aos Crimes contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural, e a quinta e última Seção, aos Crimes contra a Administração Ambiental. Por força do princípio do poluidor-pa- gador, e do dever de reparar o dano ambiental ser um dos objetivos principais perseguidos pelo artigo 225, §3.º, da Constituição Federal, a lei ambiental visa à punição, mas, sobretudo, a repa- ração ou compensação do dano ambiental. 3.1.&Parte& Geral& & Apesar de repetir dispositivos da Parte Geral do Código Penal ou do Código de Pro- cesso Penal, a Lei de Crimes Ambientais possui suas particularidades, da qual se destacam algu- mas delas. 111& & ! ! & & & & & & & 3.1.1. Concurso&de&Pessoas&nos&Crimes& Ambientais& & Art. 2.º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administra- dor, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta crimi- nosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la. Logo na primeira parte do artigo 2.º da Lei nº 9.605, verifica-se a preocupação do legisla- dor ordinário em responsabilizar não só o autor direto da conduta lesiva, mas todo aquele que de qualquer forma contribuiu ou concorreu para a prática do crime, como co-autor ou partícipe, por ação ou omissão57. 57 JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz (coord.). Legislação Penal Es- pecial. 2ª ed. Editora Premier: São Paulo, 2008, v. 2, p. 273 112& & ! ! & & & & & & & 3.1.2. Omissão&Penalmente&Relevante& & Na segunda parte, o artigo 2.º, dispõe que o diretor, administrador, conselheiro, audi- tor, gerente, preposto e mandatário de pessoas jurídicas têm o dever jurídico de agir e de evitar crimes ambientais, tornando a omissão dessas pessoas penalmente relevantes, nos termos do artigo 13, parágrafo 2.º, alínea “a”, do Código Penal. 3.1.3. Participação& de& Menor& ImporE& tância& e& Cooperação& Dolosamente& DisE& tinta& & Na Lei n.º 9.605 de 1998 não há previsão quanto aos institutos da participação de menor importância e da cooperação dolosamente dis- tinta, motivo pelo qual se aplicam subsidiaria- mente os parágrafos 1.º e 2.º, do artigo 29, do Código Penal, com a consequente diminuição da pena de um sexto a um terço no primeiro caso, e da aplicação distinta de pena no segundo. 113& & ! ! & & & & & & & 3.1.4. Vedação&à&Denúncia&Genérica& & Segundo o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal é vedada a denúncia genérica, mediante simples inclusão de diretor, administrador, conselheiro, auditor, gerente, pre- posto e mandatário de pessoas jurídicas, no pólo passivo, sem exposição individualizada do fato criminoso praticado. No julgamento do HC nº 83301/RS, o Supremo Tribunal Federal decidiu que os com- portamentos típicos que concretizam a partici- pação dos réus nos fatos criminosos devem ser descritos na inicial acusatória sob pena de ofensa ao devido processo legal: EMENTAS: 1. AÇÃO PENAL. Denúncia. De- ficiência. Omissão dos comportamentos típicos que teriam concretizado a participação dos réus nos fatos criminosos descritos. Sacrifício do con- traditório e da ampla defesa. Ofensa a garantias constitucionais do devido processo legal (due process of law). Nulidade absoluta e insanável. Superveniência da sentença condenatória. Irre- levância. Preclusão temporal inocorrente. Co- nhecimento da arguição em HC. Aplicação do 114& & ! ! & & & & & & & & art. 5.º, incs. LIV e LV, da CF. Votos vencidos. A denúncia que, eivada de narração deficiente ou insuficiente, dificulte ou impeça o pleno exercí- cio dos poderes da defesa, é causa de nulidade absoluta e insanável do processo e da sentença condenatória e, como tal, não é coberta por pre- clusão. 2. AÇÃO PENAL. Delitos contra o siste- ma financeiro nacional. Crimes ditos societários. Tipos previstos nos arts. 21, § único, e 22, caput, da Lei 7.492/86. De- núncia genérica. Peça que omite a descrição de comportamentos típicos e sua atribuição a au- tor individualizado, na qualidade de administra- dor de empresas. Inadmissibilidade. Imputação às pessoas jurídicas. Caso de responsabilidade penal objetiva. Inépcia reconhecida. Processo anulado a partir da denúncia, inclusive. HC con- cedido para esse fim. Extensão da ordem ao co- -réu. Inteligência do art. 5.º, incs. XLV e XLVI, da CF, dos arts. 13, 18, 20 e 26 do CP e 25 da Lei 7.492/86. Aplicação do art. 41 do CPP. Vo- tos vencidos. No caso de crime contra o sistema financeiro nacional ou de outro dito “crime so- cietário”, é inepta a denúncia genérica, que omite descrição de comportamento típico e sua atri- buição a autor individualizado, na condição de 115& & ! ! & & & & & & & & diretor ou administrador de empresa. (STF. HC 83301/RS. Min. Marco Aurélio. Primeira Turma. 16/03/2004) Nesse sentido, no Superior Tribunal de Justiça restou estabelecido que: PROCESSUAL PENAL – RECURSO EM HABEAS CORPUS – CRIME AMBIENTAL – DESMATAMENTO DE FLORESTA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – NULI- DADE DO INQUÉRITO POLICIAL – MA- TÉRIA NÃO LEVADA AO CRIVO DA COR- TE A QUO – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – INÉPCIA DA DENÚNCIA – PEÇA GENÉ- RICA QUE NÃO NARRA SATISFATORIA- MENTE AS CONDUTAS DO AGENTE – ACUSAÇÃO EMBASADA TÃO- SOMENTE NO FATO DE SER ELE PROPRIETÁRIO DA FAZENDA ONDE TERIA OCORRIDO, EM TESE, O DESMATAMENTO ILEGAL – IM- POSSIBILIDADE – RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA REPUDIADA PELO OR- DENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO – INE- XISTÊNCIA, ADEMAIS, DE QUALQUER 116& & ! ! & & & & & & & & CONDUTA NARRADA NA DENÚNCIA – TIPO PENAL QUE ADMITE A MODA- LIDADE CULPOSA – DENÚNCIA QUE SE EXIMIU DE NARRAR QUAL TERIA SIDO O ANIMUS DO AGENTE – NECESSIDADE DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL – RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO. De nada adiantam os princípios constitucionais e processuais do contraditório, da ampla defe- sa, em suma, do devido processo legal na face substantiva e processual, das próprias regras do estado democrático de direito, se permitido for à acusação oferecer denúncia genérica, vaga, se não se permitir a individualização da conduta de cada réu, em crimes plurissubjetivos. É vedado a este Superior Tribunal de Justiça o exame ori- ginário de matéria não apreciada pelo Tribunal a quo (irregularidades do inquérito policial), sob pena de indevida supressão de instância, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. Precedentes. A denúncia formalmente correta e capaz de en- sejar o efetivo exercício da ampla defesa deve in- dividualizar os atos praticados pelo denunciado e que contribuíram para o resultado criminoso. O simples fato de uma pessoa ser proprietária 117& & ! ! & & & & & & & & de uma área rural, por si só, não significa que ela deva ser responsabilizada por qualquer crime indistintamente ali praticado, sob pena de con- sagração da responsabilidade penal objetiva, re- pudiada pelo nosso Direito Penal. Precedentes. É inadmissível a imputação de um fato delitivo a um acusado sem demonstrar, nem sequer em tese, sua contribuição (ação ou omissão) para seu resultado. Por outro lado, admitindo o tipo penal imputado ao recorrente a modalidade culposa (artigo 38 da Lei 9.605/1998), mister a elucida- ção, na denúncia, do animus que lhe moveu. Re- curso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido para trancar
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