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Mulher Enfrentamento à violência doméstica e familiar contra MulherMulherMulher Enfrentamento à violência doméstica e familiar contra Mídia e Violência Doméstica 11 RAÍSSA VELOSO GRATUITA Essa publicação não pode ser comercializada Todos os direitos desta edição reservados à: Fundação Demócrito Rocha Av. Aguanambi, 282/A - Joaquim Távora Cep 60.055-402 - Fortaleza-Ceará Tel.: (85) 3255.6037 - 3255.6148 fdr.org.br | fundacao@fdr.org.br FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA Luciana Dummar Presidente André Avelino de Azevedo Diretor Administrativo-Financeiro Raymundo Netto Gerente Editorial e de Projetos Aurelino Freitas, Emanuela Fernandes e Fabrícia Góis Analistas de Projetos UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE (Uane) Viviane Pereira Gerente Pedagógica Marisa Ferreira Coordenadora de Cursos Joel Bruno Designer Instrucional CURSO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER Valéria Xavier Concepção e Coordenadora Geral Leila Paiva Coordenadora de Conteúdo Raymundo Netto Coordenador Editorial Andrea Araujo Editora de Design e Projeto Gráfi co Miqueias Mesquita Designer Daniela Nogueira Revisora Carlus Campos Ilustrador Luísa Duavy Produtora Fernando Diego Analista de Marketing Copyright © 2020 by Fundação Demócrito Rocha Este fascículo é parte integrante do Projeto “Programa de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher”, em atendimento do Contrato Nº 74/2020 fi rmado entre a Fundação Demócrito Rocha e a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e do Termo de Fomento Nº 02/2020 fi rmado entre Fundação Demócrito Rocha e Câmara Municipal de Fortaleza. 1. Apresentação 2. O papel da mídia 3. A Invisibilização do fenômeno na Imprensa 4. O retrato da violência contra a mulher na televisão 5. Educação midiática para enfrentamento ao fenômeno Referências 164 166 169 172 173 175 SU M Á RI O SU M Á RI O SU M Á RI O 1 APRESENTAÇÃO Nos fascículos anteriores você pôde entender como o enfrentamento aos diferentes tipos de violência do-méstica e familiar contra a mulher está inserido na luta pela defesa dos direitos humanos. Conheceu melhor como a questão de gênero determina, no mundo inteiro, as condi- ções de vida para as mulheres e as violações mais comuns a essa população. Além disso, aprendeu sobre os direitos assegurados, as políticas e diretrizes nacionais para investigar, processar e jul- gar crimes com recorte de gênero e como o racismo é uma ques- tão estrutural que compromete de formas específi cas a vida das mulheres negras. Mesmo não sendo um fenômeno novo, a violên- cia doméstica e familiar contra a mulher exige refl exões e atitudes atualizadas para o seu enfrentamento. 164 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste Nos últimos anos, passos importantes foram dados no Brasil para a criação de le- gislações que criminalizam a violência mo- tivada por discriminação de gênero, como a Lei Maria da Penha (lei no 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (lei no 13.104/2015). Mes- mo assim, os índices de agressões contra as mulheres não diminuíram, pelo contrário: dados do Atlas da Violência de 2019 apon- tam, por exemplo, que entre 2007 e 2017 os casos de feminicídio ocorridos no Brasil aumentaram em 30,7%1. Por isso, devemos questionar: o que legitima tanta agressi- vidade? Para responder a essa pergunta, este curso tem tentando explicar como a violência de gênero está fundamentada em determinantes culturais responsáveis pela conservação da desigualdade de po- der entre homens e mulheres – e que são eles que devemos transformar. Para avaliar a percepção social em re- lação à tolerância à violência contra as mulheres, levantamento divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em março de 2014 mostrou que um quarto da população brasileira acreditava que mulheres que usam roupa que mostra o corpo merecem ser atacadas2. Outro dado do mesmo estudo evidenciou que a maior 1 “Atlas da Violência: Brasil registra mais de 65 mil homicídios em 2017”. Portal do Ipea. 5 de junho de 2019. Disponível em <https://www. ipea.gov.br/portal/index.php?option%3Dcom_ content%26view%3Darticle%26id%3D34786>. Acesso em 3 out 2020. 2 Sistema de Indicadores de Percepção Social – Tolerância social à violência contra as mulheres. Portal do Ipea. 4 de abril de 2014. Disponível em <https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/ PDFs/SIPS/140327_sips_violencia_mulheres. pdf>. Acesso em 3 out 2020. parte dos brasileiros e das brasileiras acre- ditava que o número de estupros seria me- nor “se as mulheres soubessem se compor- tar”. Como parte da cultura, o machismo é uma ideologia que está nas raízes da formação de nossa sociedade patriarcal e heteronormativa (o poder é concentra- do na fi gura masculina e a norma social é heterossexual) e em maior ou menor grau na mente de todos e todas. Nesse sentido, para ir além do avanço na possibilidade de responsabilização de agressores, é necessá- rio também investir em processos de trans- formação cultural. Como dimensão fundamental na cons- trução da realidade social há mais de um século, a produção industrial da cultura veiculada pelos meios de comunicação de massa também infl uencia na repro- dução de comportamentos que afetam a vida das mulheres. Por isso, neste módulo 11 você compreenderá qual é o papel da mídia no enfrentamento à violência do- méstica e familiar com recorte de gênero. Aqui veremos como as representações em produções midiáticas podem reforçar ou problematizar a visão cultural acerca dos papéis sociais construídos historicamente para homens e mulheres e que experiências contribuem para a construção de um mun- do como aquele imaginado pela fi lósofa Rosa Luxemburgo, em que sejamos “social- mente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”. ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 165165 O PAPEL DA MÍDIA Todos os dias temos acesso a inú-meros conteúdos produzidos por outras pessoas. Por meio de mensagens no celular, anúncios estampados pela cidade, vídeos na internet ou músicas no rádio, a verdade é que no sé- culo XXI quase a totalidade da população mundial tem algum tipo de contato diário com produtos midiáticos. Com a expansão da cultura de conexão e o crescimento do número de pessoas com acesso à internet, passamos cada vez mais a ser não ape- nas consumidores de conteúdos, mas também produtores deles. Nesse sentido, aos estudos sobre os efeitos da comunica- ção de massa – que já eram muito recentes na história da humanidade – foram adicio- nados novos desafi os: ao mesmo tempo do sistema moderno de mídia (de transmis- são em massa) passou a existir o sistema de comunicação em rede. Aqui vamos nos referir à produção midi- ática como todo o processo que articula a execução de uma atividade humana com um dispositivo de comunicação. Não se trata apenas do uso de uma mídia ou do que as mídias “causam”, mas, sim, de um proces- so de interação, “(...) pelo qual atividades e práticas humanas passam a ser articuladas com a lógica das mídias digitais que, por sua vez, altera a maneira como essas atividades eram feitas” (MARTINO, 2009, p. 271). Nesse sentido, vamos incluir na nossa discussão tanto gêneros tradicionais de conteúdos mi- diáticos (como notícias de jornais impressos e telenovelas) quanto os novos gêneros po- pularizados com a expansão das redes so- ciais na internet, como os microtextos com hashtags – que são rótulos que demarcam o conteúdo com uma palavra-chave prece- dida de # – e os vídeos com alta efi cácia de compartilhamento (efeito viral). Para ter uma visão mais nítida de como funciona atualmente o chamado regime 166 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste 2 SAIBA MAIS Ao destrinchar a Teoria da Midiatização da Sociedade do teórico dinamarquês Stig Hjarvard, o professor brasileiro Luiz Mauro Sá Martino explica: “Um dos conceitos recentes trazidos para o campo da Comunicação, o conceito demidiatização oferece uma perspectiva de análise que supera algumas antigas dualidades – por exemplo, pensar que a mídia é parte integrante da sociedade e, por conta disso, talvez não faça mais sentido falar nas relações entre ‘mídia e sociedade’, mas seja importante dedicar tempo a compreender os elementos de uma ‘sociedade midiatizada’, na qual as práticas mais simples, como ler um texto, ouvir música ou falar com amigos, ganha dimensões inesperadas” (2009, p. 274). “Em linhas gerais, a ideia de midiatização refere-se ao processo pelo qual as mídias, especialmente as digitais, se articulam com a vida cotidiana, alterando o modo como as pessoas, as instituições e a sociedade, de um modo geral, vivem. Trata-se, a rigor, de um conjunto de fenômenos que mostram uma articulação profunda entre as mídias e o cotidiano”. (2009, p. 271) híbrido de comunicação, um ponto de partida interessante para nossa discussão pode ser o reality show Big Brother Brasil (BBB), da Rede Globo de Televisão. Depois de anos amargando queda na audiência televisiva, o formato de entretenimento que confi na participantes em uma casa com câ- meras ligadas durante 24 horas percebeu o crescimento do engajamento do público por meio da repercussão nas redes sociais dos casos de machismo e violência sexual ocorridos durante o programa realizado em 2020. A importunação sexual contra as par- ticipantes em uma das edições de um pro- grama de reality show (quando participan- tes homens foram fl agrados praticando atos sexuais sem o consentimento de mulheres) chamou atenção do público e mobilizou o engajamento para além da transmissão. O programa ganhou espaço com os co- mentários nas redes sociais na internet, e fi zeram sucesso hashtags que pediam a saída dos agressores. O retorno do investi- mento da produção em comportamentos polêmicos foi percebido ao vivo, quando o reality show entrou para o livro Guinness World Records por receber 1,5 bilhão de votos durante a janela de eliminação que excluiu da casa um dos participantes mais criticados no Twitter por falas machistas. Twitter Rede social que permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos em formato de microblog, com textos de até 280 caracteres. ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 167 #FICAADICA#FICAADICA Desde agosto de 2020 está no ar a plataforma de vídeos “180play”. Desenvolvida pelo Instituto Maria da Penha com apoio da ONU Mulheres, o serviço de streaming totalmente gratuito atua como uma plataforma educativa que utiliza trechos de séries, fi lmes e novelas para mostrar e alertar sobre os tipos de violência doméstica e familiar contra a mulher. Após selecionar e assistir a uma cena, a espectadora é alertada sobre o tipo de violência que foi retratado e pode conhecer outros exemplos de agressão. Com a mensagem “Se você está passando por algo parecido, saiba que você não está sozinha”, o site recomenda a denúncia ao Disque 180 (serviço telefônico disponibilizado pelo Governo Federal que funciona 24 horas por dia em todos os dias da semana) e aponta formas de saber mais informações sobre o ciclo da violência para buscar ajuda. 168 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste Ainda que seja muito recente o sistema híbrido de comunicação, não é de hoje que os meios de comunicação de mas- sa obtêm vantagens com a exibição de violência. Organizada empresarialmente, a mídia se insere no mercado a partir da ma- neira como trabalha os próprios produtos e, dentre os temas preferíveis para comercia- lização no mundo da comunicação, a vio- lência é considerada uma moeda de troca com alto valor: nas palavras de Porto (2002) “uma mercadoria que vende e vende bem”. Longe de ser espelho da realidade, a mídia atua como agente na construção das re- presentações sobre o mundo e infl uen- cia as práticas sociais (THOMPSON, 1998) e, da forma como tem representado o tema aqui em discussão, pode ser caracterizada como um espaço de estruturação de socia- bilidades violentas (PORTO, 2002). Por isso, mais do que falar sobre, a produção midiática deve ser analisada em relação a maneira como falar sobre o tema da violência e, no caso específi co aqui discutido, como abordar o tema da violência doméstica e familiar contra mulheres. No contexto em que a midia- tização é o processo central de visibiliza- ção e produção dos fatos sociais na esfera pública, o enquadramento midiático é a operação principal pela qual se sele- ciona, enfatiza e apresenta o aconteci- mento (SODRÉ, 2009). O enquadramento midiático pode ser entendido como um sistema de referências (regras e esquemas interpretativos) que organiza a experiência social ao dar sentido a uma situação. “Seja de natureza política, ética ou estética, o enquadre afi na-se evidente- mente com a cultura de um grupo espe- cífi co, permitindo ao ator social descrever, interpretar ou categorizar as situações que se lhe afi guram como problemáticas. Por meio dele, um problema social é suscetí- vel de converter-se em problema público, dando margem ao surgimento de ações coletivas” (SODRÉ, 2009, p. 38). A INVISIBILIZAÇÃO DO FENÔMENO NA IMPRENSA Transformar a violência domés-tica e familiar em uma questão pública faz parte da luta his-tórica das mulheres. Por muito tempo (e infelizmente para muita gente até hoje), o fenômeno da violência com recor- te de gênero foi tratado como uma ques- tão de âmbito íntimo e privado. Quem tem em mente o ditado que diz que “em briga de marido e mulher não se mete a colher” internalizou uma das ferramentas para ma- nutenção da dominação masculina, que é a tentativa de preservar em foro íntimo ques- tões relativas à esfera doméstica e familiar. Como discutimos anteriormente, não basta que o tema da violência doméstica e familiar esteja na pauta dos conteúdos midiáticos: é preciso que o enquadra- mento dado ao fenômeno coloque em xeque a reprodução do machismo em nossa sociedade. Nesse sentido, o Ins- tituto Patrícia Galvão – Mídia e Direitos produziu importante monitoramento da cobertura dos principais jornais brasilei- ros sobre o assassinato de mulheres e os crimes de violência sexual com recorte de gênero após a aprovação da Lei do Femini- cídio (lei nº 13.104/2015). Realizado entre 2015 e 2016, o relatório analisou mais de uma centena de portais e sites noticiosos para, ao fi m, selecionar 71 veículos repre- sentativos das cinco regiões do país. A amostra foi composta por 1.583 matérias sobre homicídios de mulheres e 478 sobre crimes de estupro. Entre as principais críti- cas apontadas pelo documento, estão: • Em relação à cobertura dos assassi- natos de mulheres, prevaleceram matérias sobre a morte em si, sem informações sobre quem era aque- la mulher, se já havia buscado ajuda, recorrido ao Estado para se defender de violências anteriores ou se tinha medida protetiva, entre outras ques- tões que podem apontar falhas nas políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres. • A cobertura privilegiou uma abor- dagem romantizada e a desres- ponsabilização do autor pelo cri- me. A maioria absoluta dos textos não aborda as reais motivações para o crime; nos que tentam apresentar um motivo, a maioria aponta como causas do assassinato: “ciúmes”, “violenta emoção”, “defesa da honra”, “inconformidade com a separação”, autor “fora de si”, “transtornado” ou “sob efeito de álcool”. O padrão fre- quentemente adotado pela impren- sa transfere a culpa para a vítima. ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 169 A INVISIBILIZAÇÃO DO FENÔMENO NA IMPRENSA A INVISIBILIZAÇÃO DO FENÔMENO NA IMPRENSA A INVISIBILIZAÇÃO DO 3 PUXANDO PROSA O jornalismo brasileiro não é feito apenas por grandes empresas de comunicação. Por muito tempo, a chamada “imprensa alternativa” foi responsável, ainda que com menor alcance, por pautar temas importantes no debate público. Para conhecera agenda dos movimentos e dos jornais feministas nos últimos 40 anos, o livro “Feminismos na imprensa alternativa brasileira” (Editora Paco, 2018) traz a análise de Viviane Gonçalves Freitas sobre quatro jornais: Nós Mulheres (1976-1978); Mulherio (1981-1988); Nzinga Informativo (1985-1989) e Fêmea (1992-2014). Ao apresentar os resultados da pesquisa de doutorado no livro, a autora mostra que estavam presentes na agenda das mulheres organizadas não apenas a crítica à divisão sexual do trabalho, mas também temas relacionados a direitos sexuais e reprodutivos, família, igualdade de direitos entre homens e mulheres, custo de vida, violências contra as mulheres, numa perspectiva interseccional, isto é, articulando gênero, raça e classe. PARA REFLETIR The clit test (teste do clitóris, em tradução livre) é um projeto criado pelas britânicas Frances Rayner e Irene Tortajada para avaliar a representação do prazer sexual de mulheres em cenas de fi lmes, trechos de músicas e de obras literárias. • Em 15% das matérias analisadas que continham imagens de víti- mas de feminicídio, houve exibi- ção de corpos – em sua maioria de mulheres negras – sem qualquer tratamento. Nesses casos, além da crueldade da morte, há a revitimiza- ção pela exposição midiática. • Outro ponto verifi cado também foi a baixa atenção à condição racial das vítimas nos textos, embora as estatísticas ofi ciais demons- trem que as mulheres negras são 60% das mortes por feminicídio e que o assassinato delas cresceu 54% de 2003 a 2013. • No caso das mulheres lésbicas, mes- mo quando a orientação é mencio- nada na matéria, nem sempre há o questionamento se o crime estaria associado à lesbofobia. Pelo relatório produzido pelo Instituto Pa- trícia Galvão, fi ca perceptível como a cober- tura noticiosa sobre os crimes de feminicídio e violência sexual ainda precisa avançar para romper preconceitos relacionados às mu- lheres, que ocorrem ao representá-las sem respeito à identidade, ao sugerir que os com- portamentos da vítima contribuíram para a violência, ao revitimizá-las e criar mais constrangimentos para mulheres negras, trans e travestis. Além de evidenciar a repro- dução de preconceitos de gênero, a análise da cobertura dos jornais brasileiros aponta a reafi rmação de preconceitos de raça e classe. Nesse sentido, ao ser responsável por mobilizar avaliações e julgamentos sobre os outros, a mídia é capaz de construir en- quadramentos diferenciais para apreensão daquelas que sofrem violência. As represen- tações compartilhadas socialmente têm o poder tanto de favorecer o reconheci- mento de algumas pessoas como sujeitos de direitos quanto de invisibilizar outras. Em 2011 o Instituto Patrícia Galvão já havia realizado, em parceria com a Andi – Comunicação e Direitos, um trabalho de monitoramento e análise da cobertura da imprensa sobre violência contra as mulhe- res. No relatório daquele ano, constatou-se que uma das principais lacunas da cobertu- ra de violência doméstica era justamente a ausência de análise junto ao fato jorna- lístico. No período analisado, as reporta- gens sobre as mortes violentas de mulheres tiveram destaque (84% do material avalia- 170 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste PUXANDO PROSA O jornalismo brasileiro não é feito apenas por grandes empresas de comunicação. do), mas o conteúdo fi cou muito restrito às características policiais do fato, sem haver maior contextualização, individualizando o problema e com grande ausência de infor- mações sobre serviços (96%), sobre as po- líticas de prevenção e acerca das conven- ções internacionais que o Brasil assinou e tem obrigação de cumprir. Por isso é importante entender que não se trata apenas de colocar a violência do- méstica e familiar contra a mulher na pauta da imprensa. É preciso que o tema passe a ser abordado por um enquadramento que favoreça o enfrentamento ao fenômeno, de- fenda os direitos das mulheres e, principal- mente, desnaturalize a violência de gênero. Um exercício interessante que você pode fazer para entender como o enqua- dramento dado pela imprensa sugere pon- tos de interpretação sobre os fatos está na escuta atenta do podcast “Praia dos Ossos”. Em oito episódios, a minissérie em áudio percorre os detalhes do feminicídio da so- cialite Ângela Diniz pelo próprio namorado, em 1976, crime que repercutiu em todo o país e mobilizou o movimento de mulheres. Nele é possível perceber como a não obe- diência aos padrões sexuais fez da vítima culpada pelo próprio assassinato. Nas pa- lavras da idealizadora do projeto, Branca Vianna, é “uma história sobre a imprensa, o sistema judiciário brasileiro, como nasce uma mobilização, como as mulheres viviam e morriam nesse país, e como elas continu- am vivendo e morrendo”. Um exercício interessante que você pode fazer para entender como o enqua- dramento dado pela imprensa sugere pon- tos de interpretação sobre os fatos está na “Praia dos Ossos”. Em oito episódios, a minissérie em áudio so- Ângela Diniz pelo próprio namorado, em 1976, crime que repercutiu em todo o país e mobilizou o movimento de mulheres. Nele é possível perceber como a não obe- diência aos padrões sexuais fez da vítima culpada pelo próprio assassinato. Nas pa- lavras da idealizadora do projeto, Branca Vianna, é “uma história sobre a imprensa, o sistema judiciário brasileiro, como nasce uma mobilização, como as mulheres viviam e morriam nesse país, e como elas continu- ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 171 O RETRATO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NA TELEVISÃO Outro produto midiático impor-tante para analisarmos são as telenovelas, que no Brasil são vistas todos os dias por milhões de pessoas. Por isso, vamos discutir breve- mente o poder que esse formato de entre- tenimento tem ao colocar temas no deba- te público e a possibilidade de despertar consciências para a transformação social. Um exemplo disso foi a novela “A Favorita”, de autoria de Aguinaldo Silva e produzida pela Rede Globo em 2008, dois anos após a aprovação da Lei Maria da Penha. Naque- le mesmo ano, a Central de Atendimento à Mulher – Disque 180 registrou 269 mil de- núncias, relatos de violência e pedidos de informação em todo o país, o que represen- tou um aumento de 32% em comparação com o ano anterior. Uma das hipóteses é de SAIBA MAIS PARA REFLETIR Acesse: “Cenas de violência contra mulher em novelas aumentam denúncias de agressões”. Disponível em <https://televisao.uol.com.br/novelas/ fi na-estampa/2011/09/13/cenas-de- violencia-contra-mulher-em-novelas- aumentam-denuncias-de-agressoes. jhtm>. Acesso em 11 out 2020. Enquanto novelas como “Mulheres Apaixonadas” (Manoel Carlos, 2003) e “Fina Estampa” (Aguinaldo Silva, 2011) foram marcos na dramaturgia por inserir o tema da violência de gênero na produção televisiva, nove outras narrativas exibidas também em horário nobre não ganharam o debate público ao apresentar cenas de violência doméstica e familiar contra mulheres. Isso porque, enquanto as personagens Raquel (Helena Ranaldi) e Celeste (Dira Paes) das novelas de 2003 e 2011 eram construídas como “honestas”, com “comportamento exemplar” e “relacionamentos estáveis”, as vilãs agredidas apresentavam desvios morais e desacordo com os padrões normativos previstos para o papel social de mulher. que a exposição do tema pela telenovela possa ter contribuído para o crescimen- to na busca do serviço. Por outro lado, quando se trata de vio- lência contra personagens femininas que não atendem aos padrões sexuais estabe- lecidos, as telenovelas prestaram um desfa- vor ao debate público. Ao analisar 17 anos de produção de uma grande emissora de TV, a pesquisadora Lorena Rúbia Pereira Caminhas concluiu que a violência perpe- trada contra as vilãs por seus pais, maridos e amantes são justifi cadas na trama como um “corretivo necessário”: “Elas só pude- ram apanhar sem gerar uma onda deques- tionamentos e inquietações porque tiveram o destino que mereciam dentro da trama, e estariam apenas pagando por ter transgre- dido fronteiras morais e de gênero”. 172 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste 4 SAIBA MAIS Desnaturalizar o enquadramen-to machista dado à mulher na mídia é uma meta necessária que também representa um de- safi o enorme em um país como o Brasil. Na história nacional da publicidade, por exemplo, campanhas com abordagens machistas ganharam notoriedade pela for- ma como trataram a mulher. Ao lembrar da representação do feminino nas propagan- das de cerveja, por exemplo, podemos en- tender como a publicidade voltada para o público masculino tem posicionado a ima- gem da mulher a partir de uma posição de subordinação. E por que isso é problemáti- co? Nas palavras de Flávia Biroli: “Representações das relações de gênero nas quais a mulher é humilhada e objetifi cada, isto é, tratada como menos humana porque é defi nida como instrumento para satisfa- ção dos desejos do outro, podem contribuir, ainda que de maneira difusa, para a violên- cia contra as mulheres e para aceitação da violência” (MIGUEL; BIROLI, 2014, p. 138). EDUCAÇÃO MIDIÁTICA PARA ENFRENTAMENTO AO FENÔMENO Além da produção publicitária não ter um controle público no Brasil, já que te- mos um Conselho Nacional de Autorre- gulamentação Publicitária (Conar) com- posto por membros vinculados à própria indústria da publicidade, outra limitação para avançarmos na representação da mulher nesse universo diz respeito à pró- pria estruturação dos espaços de trabalho: pesquisa realizada em 2016 mostrou que, nas 30 maiores agências de publicidade do país, apenas 20% de profi ssionais da área de criação eram mulheres, que tam- bém ocupavam apenas 6% dos cargos de liderança nesses departamentos3. Ou seja, é necessário que, para além da regulação do conteúdo com base em interesses pú- blicos, a própria indústria da publicidade alcance uma igualdade de participação entre gêneros e raças que permita avançar- mos nas representações sociais. O jornalismo é um campo de comunica- ção que funciona de outra forma: diferente- mente da atuação publicitária, jornalistas devem seguir um código de ética que, para 3 Pesquisa realizada por Meio & Mensagem em dezembro de 2015 disponível em <https:// www.meioemensagem.com.br/home/ comunicacao/2016/01/12/mulheres-sao-20- porcento-da-criacao-das-agencias.html>. além do interesse público e da liberdade de imprensa, defi ne atribuições específi cas. No Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros4 há previsão de “compromisso com a res- ponsabilidade social inerente à profi ssão” (Art. 2º, parágrafo III); dever de “opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos” (Art. 6º, I); “respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cida- dão” (Art. 6º, VIII); “defender os direitos do cidadão, contribuindo para a promoção das garantias individuais e coletivas, em especial as das crianças, adolescentes, mulheres, ido- sos, negros e minorias” (Art. 6º, XI); “combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza” (Art. 6º, XIV); e ain- da proibição: “o jornalista não pode divulgar informações de caráter mórbido, sensacio- nalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e aci- dentes” (Art. 11, II) e obrigação de “tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar” (Art. 12, II). Um importante instrumento para pro- fi ssionais da imprensa é o relatório que discutimos anteriormente “Imprensa e Direitos das Mulheres: Papel social e desa- fi os da cobertura sobre feminicídio e vio- lência sexual”, do Instituto Patrícia Galvão. 4 Disponível em <https://fenaj.org.br/wp- content/uploads/2014/06/04-codigo_de_etica_ dos_jornalistas_brasileiros.pdf>. ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 173 EDUCAÇÃO MIDIÁTICA PARA ENFRENTAMENTO além do interesse público e da liberdade de imprensa, defi ne atribuições específi cas. No Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros4 há previsão de “compromisso com a res- ponsabilidade social inerente à profi ssão” (Art. 2º, parágrafo III); dever de “opor-se ao 5 Lá é possível conferir as leis relacionadas a esses crimes, perguntas que devem nor- tear o trabalho jornalístico de cobertura dos casos de violência contra a mulher e elementos que não deveriam faltar nos textos, como: (1) informações sobre servi- ços de denúncia e acolhimento existentes na região; (2) informações sobre serviços de orientação e denúncia que podem ser acionados à distância (190, Ligue 180, Dis- que 100, portais e aplicativos); (3) breve explicação do contexto afetivo em que a violência se manifesta (o chamado ciclo da violência) e (4) dicas de como as mulheres podem se prevenir e romper o ciclo. “Para contribuir no enfrentamento à má- xima violação às mulheres e desconstruir as culturas na quais o feminicídio se insere, é importante incorporar efetivamente a dis- cussão sobre o contexto desse crime no dia a dia da cobertura, não o restringindo ao ‘calendário das mulheres’. Como se tra- ta de desigualdades impostas socialmente aos papéis de gênero masculino e feminino, é importante debater esse assunto cotidia- namente, associar os crimes com os dados disponíveis sobre a violência letal contra as mulheres e fornecer informações que pos- sam ajudar na prevenção da violência e na preservação de vidas (INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO, 2019, p. 25)”. Um novo desafi o diz respeito à educa- ção voltada para o uso das novas mídias no atual ambiente de hiperconexão. Ao viver- mos em uma sociedade em que a produ- ção midiática em larga escala não diz mais respeito apenas aos meios de comunicação tradicionais, precisamos pensar como a educação midiática se insere na agenda pú- blica e quais práticas podem favorecer uma cultura de não violência à mulher. Como dis- cutimos no início do módulo, a forma como as pessoas usam as novas tecnologias de comunicação está completamente articu- lada às atividades humanas cotidianas, o que signifi ca que o ambiente on-line tam- bém está permeado pelas desigualdades de gênero que colocam homens e mulheres em posições sociais diferentes e é capaz de infl uenciar a construção da realidade social. elementos que não deveriam faltar nos textos, como: (1) informações sobre servi- ços de denúncia e acolhimento existentes na região; (2) informações sobre serviços Um novo desafi o diz respeito à educa- ção voltada para o uso das novas mídias no atual ambiente de hiperconexão. Ao viver- mos em uma sociedade em que a produ- No dossiê “Violência contra as Mulheres”, também produzido pelo Instituto Patrícia Galvão, há um tópico específi co para dis- cutir a violência de gênero na internet, que inclui debates fundamentais para a educa- ção midiática. Para Marai Larasi, diretora executiva da ONG britânica End Violence Against Women Coalition (Coalizão de Com- bate à Violência contra Mulheres, em tradu- ção livre), o problema é: “Não educamos as pessoas a se comportarem no ambiente virtual. Temos uma área cinzenta e precisa- mos conversar sobre isso. (...) Eu acho que 174 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste REFERÊNCIAS ANDI. Imprensa e agenda de direitos das mulheres: uma análise das tendências da cobertura jornalística. Brasília: Andi; Instituto Patrícia Galvão, 2011. CAMINHAS, Lorena Rúbia Pereira. Imagens de violência de gênero em telenovelas brasileiras. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 27, n. 1. Disponível em < https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104- 026X2019000100208>. Acesso em 3 out. 2020. FREITAS, Viviane Gonçalves. Os temas da imprensa feministano Brasil desde os anos 1970. Nexo Jornal, 2 out de 2019. 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Nos dois casos, as práticas não necessariamente ocorrem com recorte de gênero, mas cada vez mais casos assim contra mulheres têm chegado às delegacias e aos tribunais. De acordo com o material produzido pelo Instituto Patrícia Galvão, isso ocorre porque essas formas de violên- cia mobilizam sistemas discriminatórios, como o sexismo, o preconceito de classe, o racismo e a homofobia. Assim como no ambiente off -line, bus- car que as vítimas conheçam os próprios direitos na rede de conexão e saibam como responsabilizar os autores das agressões é necessário, mas não sufi ciente. É impor- tante que existam ações de enfrentamento à cultura machista também nos espaços on-line. Nesse contexto, o caminho que se apresenta como mais necessário a ser per- corrido nos dias atuais é a promoção de uma educação midiática associada à edu- cação para igualdade de gênero. 5 Dossiê Violência contra as Mulheres. Site do Instituto Patrícia Galvão. Disponível em <https:// dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/ violencias/violencia-de-genero-na-internet/>. um dos pontos importantes nesse sentido é educarmos as pessoas para entender que o espaço virtual é real. Não há espaço virtual que seja desconectado” lheres no ambiente on-line, o dossiê des- ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 175 AUTORA RAÍSSA VELOSO É jornalista formada pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e mestre em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Tem experiência com assessoria parlamentar na Câmara Municipal de Fortaleza e na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e com produção de conteúdo sobre o Sistema Único de Saúde (SUS) para organizações, como o Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems). Como assessora de comunicação, atua em projetos relacionados às áreas de direitos humanos, cultura e meio ambiente. ILUSTRADOR CARLUS CAMPOS Artista gráfi co, pintor e gravador, começou a carreira em 1987 como ilustrador no jornal O POVO. Na construção do seu trabalho, aborda várias técnicas como: xilogravura, pintura, infogravura, aquarelas e desenho. Ilustrou revistas nacionais importantes como a Caros Amigos e a Bravo. Dentro da produção gráfi ca ganhou prêmios em salões de Recife, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. ganhou prêmios em salões de Recife, São Paulo, ganhou prêmios em salões de Recife, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. É jornalista formada pela Universidade Federal Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Tem experiência com Estado do Ceará e com produção de conteúdo REALIZAÇÃO APOIO PATROCÍNIO
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