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desafio urbano

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MISAEL BATISTA DO NASCIMENTO 
O CRISTIANISMO DIANTE DA NOVA CIVILIZAÇÃO 
SÃO PAULO, 2004 
 
 
MISAEL BATISTA DO NASCIMENTO 
O CRISTIANISMO DIANTE DA NOVA CIVILIZAÇÃO 
Trabalho apresentado para atendimento 
das exigências do módulo Ministério 
Pastoral num Mundo Globalizado do 
Programa de Doutorado em Ministério do 
CPAJ — Centro Presbiteriano de Pós-
Graduação Andrew Jumper. 
SÃO PAULO, 2004 
ii 
 
Ainda que um estado de desolação pareça afirmar que nada mais 
restou da igreja, saibamos que a morte de Cristo é frutífera. Deus 
preserva sua igreja maravilhosamente, como que em esconderijos. 
João Calvino. Institutas. iv.i.2. 
 
iii 
 
DEDICATÓRIA 
Ao Senhor, digno de toda a glória. 
À Roberta, mãe valiosa, Mirian, esposa muito amada, Ana Carolina e Bruna, 
filhas preciosas. 
Ao Alain Paul, amigo, irmão e gentil tradutor. 
À Igreja Presbiteriana Central do Gama; lugar de gente querida, seara 
frutífera do Deus bendito. 
 
 
iv 
 
RESUMO 
Este trabalho desenvolve a tese de que aquilo que se denomina 
globalização ou mundialização é a manifestação operativa de uma nova 
civilização que desafia o modelo tradicional de igreja — que coloca o 
cristianismo diante de novos problemas e o confronta com uma nova visão 
de mundo, idéias, atitudes e comportamentos. Primeiramente, a globalização 
é conceituada e são relatados alguns de seus aspectos positivos e negativos. 
Em seguida, verifica-se de que forma tais construtos afetam ou desafiam a 
religião, de modo geral, e a fé cristã, em particular. Por último, propõe-se 
uma caminhada esperançosa para a igreja, baseada nas revelações 
fornecidas pela Bíblia Sagrada, pela teologia pastoral, eclesiologia e 
missiologia. 
PALAVRAS-CHAVE 
Globalização; Mundialização; Nova Civilização; Economia Global; 
Missão da Igreja; Missões Urbanas; Renovação da Igreja; Filosofia de 
Ministério; Teologia Pastoral. 
v 
 
ENGLISH ABSTRACT 
This dissertation defends that the so-called globalization epitomizes a 
new civilization challenging the traditional pattern of church. Such a 
challenge not only causes Christianity to address a new range of problems, 
but faces it with a new world vision, as well as with new ideas, attitudes and 
behaviors. In its first part, this dissertation characterizes what is 
globalization, besides listing both some positive and negative sides of it. 
Then, such constructs are regarded as alternately impacting and challenging 
religion and the Christian Faith particularly. Finally, a hopeful development 
for the church is put forward on the basis of the Holy Bible Revelations, 
jointly with pastoral theology, ecclesiology and missiology. 
KEYWORDS 
Globalization; New Civilization; Global Economy; Church’s Mission; 
Urban Missionary Work; Church Renewal; Philosophy of Ministry; Pastoral 
Theology. 
vi 
 
SUMÁRIO 
 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1 
I — A GLOBALIZAÇÃO E A ENCRUZILHADA HISTÓRICA...................................2 
1. Compreendendo a globalização ..................................................................2 
1. Olhando positivamente ...............................................................................5 
2. Aspectos preocupantes ................................................................................6 
3. Globalização e nova civilização ................................................................. 13 
3.1. Ondas de mudanças .......................................................................... 13 
3.2. Rumo à encruzilhada ........................................................................ 15 
II — DESAFIOS E OPORTUNIDADES ..................................................................... 17 
1. Obsolescência ou relevância...................................................................... 18 
1.1. Perigo à esquerda: pragmatismo ......................................................26 
1.2. Perigo à direita: alienação.................................................................29 
2. O fim das perguntas religiosas? ................................................................30 
3. A era do individualismo?...........................................................................34 
4. O cristianismo está agonizando?...............................................................35 
4.1. Desafios teológicos e práticos ...........................................................35 
4.2. A graça de Deus e a restauração do cristianismo.............................37 
4.3. A globalização e a “plenitude do tempo”: A nova era da missão .... 40 
III — PROPOSTAS TEOLÓGICAS, ESTRATÉGICAS E ESTRUTURAIS..................42 
1. Fé e obras ...................................................................................................43 
2. A nova teologia...........................................................................................44 
3. O desenvolvimento integral ......................................................................47 
3.1. Liderança íntegra e capacitada .........................................................48 
3.2. Seguidores maduros..........................................................................53 
3.3. Organismos saudáveis....................................................................... 57 
3.4. Comunidades que funcionam biblicamente.................................... 60 
 CONCLUSÃO......................................................................................................67 
 BIBLIOGRAFIA..................................................................................................69 
 
 
1 
 
INTRODUÇÃO 
 “Estejamos prontos para uma nova verdade, desde que seja verdade.” 
Charles H. Spurgeon. 
Este trabalho desenvolve a tese de que aquilo que se denomina globa-
lização, mundialização ou nova ordem mundial é a manifestação operativa 
de uma nova civilização que desafia o modelo tradicional de igreja. A globali-
zação abrange muito mais do que um modelo econômico; ela coloca o cristia-
nismo diante de novos problemas e o confronta com uma nova visão de 
mundo, idéias, atitudes e comportamentos. 
O objetivo do autor é examinar alguns desses construtos propostos 
pela globalização, confrontando-os com a teologia pastoral, eclesiologia e 
missiologia. A partir de então, pretende-se elaborar algumas proposições de 
ordem prática, relacionadas à contextualização e inculturação. O resultado é 
meramente introdutório, uma sugestão para maiores e melhores pesquisas 
posteriores. 
As omissões e falhas são minhas, a glória é unicamente de Deus. 
 
2 
 
A GLOBALIZAÇÃO E A ENCRUZILHADA HISTÓRICA 
O capitalismo dinâmico tem seus aspectos impiedosos: o novo torna-se 
inimigo do velho, os filhotes devoram os pais. William Greider. 
Desde os seus primórdios, o cristianismo teve de lidar com a questão 
da adequação da igreja ao ambiente cultural. Tensões provenientes do desejo 
de fidelidade às origens judaicas e a expansão em terreno gentílico são regis-
tradas em todo o Novo Testamento. Os cristãos compreenderam que não 
podiam permanecer cerceados nos limites do judaísmo e ultrapassaram 
barreiras correspondendo “à lógica do ministério do próprio Jesus”.1 Tal 
desafio repetiu-se em todas as eras subseqüentes e mostra-se destacado no 
momento atual. Harms-Wiebe2 considera o presente muito semelhante ao 
passado, notadamente ao período da Reforma do Século XVI. 
Os desdobramentos atuais são tão poderosos quanto as mudanças 
radicais do século XVI, que levaram os povos da Europa a participarem 
da Reforma. Foi uma época tumultuada de abertura de novos horizontes 
e busca de respostas contextualizadas para questões profundas. 
COMPREENDENDO A GLOBALIZAÇÃO 
O que pode ser afirmado sobre esse novo ambiente? Quais as suas 
características e desafios? 
Estamos rapidamente entrando numa sociedade global em que Saddam 
Husseinvê diariamente a CNN, 90% dos computadores do mundo usam 
programas da Microsoft e em Sarajevo vendem-se camisetas do Hard 
Rock Cafe com buracos de bala estampados. Presenciamos uma verdadei-
 
1 David J. BOSCH, Missão transformadora, p. 70. 
2 Raymond Peter HARMS-WIEBE. Estrutura Criativa no Contexto Metropolitano. In: 
J. Scott HORREL (ed.). Ultrapassando Barreiras, p. 30. 
3 
 
ra transformação global. Fomos tragados por uma roda-viva atordoante, e 
a transformação súbita pode ser muito perturbadora, inquietante e deso-
rientadora.3 
O mundo no qual a igreja existe, tornou-se uno. São compartilhados 
modelos econômicos, filosóficos, religiosos e comportamentais. São mescla-
dos valores, consciências e modus vivendi. Estruturas e pessoas estão imer-
sas nesta conjuntura denominada globalização. 
O termo globalização tem sentidos diferentes, dependendo do contexto 
no qual é utilizado. De modo geral, trata-se do “processo típico da segunda 
metade do séc. XX que conduz a crescente integração das economias e das 
sociedades dos vários países, especialmente no que toca à produção de 
mercadorias e serviços, aos mercados financeiros, e à difusão de informa-
ções.”4 É sinônimo de mundialização ou nova ordem mundial, sendo que esta 
última designação é a mais inadequada, uma vez que não se pode afirmar 
que, estritamente, a globalização seja algo organizado. Uma boa idéia sobre o 
que seja a globalização, tanto em seus aspectos positivos quanto negativos e 
caóticos, é transmitida por Greider:5 
Imaginem uma máquina nova, forte e flexível, uma máquina que colhe ao 
mesmo tempo em que destrói. É imensa e muito móvel, semelhante às 
modernas máquinas agrícolas, mas muito mais complicada e poderosa. 
Pensem nessa máquina espantosa correndo em campo aberto e ignorando 
as fronteiras familiares, enquanto sulca os terrenos e derruba as cercas 
num ritmo avassalador, ao mesmo tempo fascinante e assustador. À me-
dida que avança, a máquina vai amontoando todo tipo de riqueza, mas 
vai também deixando atrás de si uma trilha de devastação. 
 
3 Tom SINE, O lado oculto da globalização, p. 16. 
4 Aurélio Buarque de Holanda FERREIRA. Dicionário Aurélio Século XXI. 
5 William GREIDER, O mundo na corda bamba, p. 11. 
4 
 
Agora, imaginem que há, dentro dela, uma espécie de força muito habi-
lidosa, mas ninguém está no volante. Na verdade, essa máquina não tem 
volante e nem sequer alguém que a dirija ou controle sua velocidade e ru-
mo. Ela é sustentada apenas pelo seu próprio movimento para frente, 
guiada por seus próprios apetites. E está se acelerando cada vez mais. 
Globalização é muito mais do que internacionalização. Enquanto a 
globalização abrange toda a movimentação de capitais e tecnologias existen-
tes; internacionalização diz respeito às movimentações que escapam dos âm-
bitos dos Estados Nacionais. 
Mais do que um movimento ou um programa meticulosamente arqui-
tetado, a globalização é um sistema ou organismo que possui vida própria, 
um fato consumado, do qual não é possível esquivar-se ou fugir. 
Nenhum de nós jamais teve a oportunidade de votar contra ou a favor da 
participação dos nossos países respectivos numa ordem econômica globa-
lizada. Líderes das nações do mundo todo parecem ter alcançado o con-
senso de que essa é a única opção, sem nos consultar. E agora todos 
estamos a bordo dessa corrida global rumo ao topo, quer gostemos ou 
não.6 
Este sistema global é multifacetado; possui aspectos atraentes, positi-
vos, bem como preocupantes e negativos. Não há consenso sobre todos os 
seus desdobramentos, nem sequer o empreendimento de uma reflexão sobre 
o assunto que seja conjunta, elaborada também globalmente. Como afirma 
Greider, “as diversas sociedades da terra estão sendo reorganizadas e reuni-
das de modos muito complicados pelo capitalismo global”.7 Em alguns con-
textos, a globalização é acolhida funcional e um tanto precipitadamente, sem 
que sejam feitas ponderações sobre as conseqüências de longo prazo — 
 
6 Tom SINE, op. cit., p. 23. 
7 Op. cit, p. 16. 
5 
 
países entendem que devem participar, os que não entrarem “no jogo” 
perderão. 
OLHANDO POSITIVAMENTE 
A globalização faz promessas atraentes de abertura da comunicação, 
enriquecimento cultural, desenvolvimento das nações, expansão da educa-
ção, democratização do saber científico e da tecnologia, florescimento da 
capacidade empreendedora, melhorias sociais, pacificação das relações 
internacionais e melhoria da qualidade de vida. 
A humanidade desfruta da possibilidade de empreender um intercâm-
bio sem igual de interfaces culturais. A Internet propicia o surgimento de 
uma cibercultura multicultural, alicerçada sobre os princípios de interconec-
tividade, comunidades virtuais e inteligência coletiva.8 Os países de dois ter-
ços do mundo possuem acesso a novas fronteiras de ascensão social incluin-
do melhor educação, tecnologia, serviços e bens de consumo. Na medida em 
que é elevado o potencial destas nações, cria-se a demanda necessária para 
a aquisição do excedente industrial global. Alianças comerciais fomentam o 
emprego, distribuem renda e estimulam o avanço científico. A necessidade 
de atrair investimentos estimula as políticas de diálogo e cooperação interna-
cional, derrubando barreiras ideológicas e políticas. Os seres humanos 
globalizados, mais bem educados e prósperos, têm melhores perspectivas de 
vida que seus pais. 
 
8 Pierre LÉVY, Cibercultura, p. 123-133. 
6 
 
ASPECTOS PREOCUPANTES 
William Greider faz um apanhado de algumas inquietações 
fomentadas pela globalização. “A lógica do comércio e do capital superou a 
inércia da política e desencadeou uma época de grandes transformações 
sociais”9. A capitulação dos Estados ao poder do Capital, demonstrada na 
subserviência à prática de leilões de emprego, salários e impostos, a desarti-
culação da força trabalhista, a diminuição (no médio e longo prazos) do em-
prego e da renda, a exigência de criação de demanda de consumo para o ex-
cedente de produção, o esfacelamento cultural e a desvalorização do ser hu-
mano. 
O capital estrangeiro é volátil. Para aportar em um país, multina-
cionais exigem isenção de impostos, pagamento por investimentos e manu-
tenção de uma política de baixos salários. É preferível ainda, que o país a 
receber o “benefício do investimento” possua uma força trabalhista não-
esclarecida e pouco disposta a reivindicar melhorias de condições de vida. 
Fábricas são fechadas, funcionários são demitidos e bilhões de dólares são 
retirados de um país para outro, quando são oferecidas vantagens competi-
tivas: salários ainda menores e mais benefícios provenientes de governos de 
outras nações também empobrecidas, ávidas de serem “salvas” pelo sistema 
de prosperidade global. 
Os fatos são bastante sombrios: como algumas sociedades estão sendo 
derrotadas pela industrialização, como o comércio de livre curso faz 
renascer brutalidades que chocavam a moralidade pública no século XIX, 
 
9 Op. cit., p. 11. 
7 
 
como a política e os negócios às vezes conspiram para tratar as pessoas 
como se fossem meros objetos.10 
O esvaziamento dos sindicatos e a aprovação de leis trabalhistas flexí-
veis, do ponto de vista do empregador, reduzem os custos por emprego — 
são pagos menos impostos e taxas sobre as contratações e demissões; é pos-
sível manter os salários em patamares inferiores aos praticados nos países 
que possuem sindicatos fortes. Com a renda diminuída, os indivíduos são 
forçados a trabalhar em mais de um emprego (em regime de contratos tempo-
rários). A ausência de uma rede de proteção ao trabalhador possibilita sua 
demissão sem muitas garantias.Tudo se resume a algum sentido profundo de privação. Crescemos 
pensando que “qualidade de vida” era algo que melhorava automatica-
mente de geração em geração. Então, sem qualquer aviso prévio, a pro-
messa implícita de que nossa vida material seria melhor do que a de nos-
sos pais foi estilhaçada, frustrada, atirada na lata de lixo. Além de não 
termos tanta segurança no emprego ou ganharmos tanto quanto nossos 
pais, alguns outros “dados” são incertos: não sabemos se nossas capaci-
dades continuarão vendáveis, se teremos sempre uma aposentadoria (…) 
e se a ética da vida continuará ética.11 
O consumo é a mola propulsora do sistema econômico global. As 
indústrias reduzem custos e aumentam a produção. Como não há compra-
dores suficientes para absorver tudo o que é produzido, investe-se em mar-
keting — distribuição nas economias em expansão e criação de necessida-
des, pois o que é produzido precisa ser vendido, mesmo que não seja absolu-
tamente necessário. As empresas crescem não atendendo necessidades das 
pessoas, mas criando-as. “O desejo é motor. As formas econômicas e institu-
 
10 Ibid., p. 50. 
11 Faith POPCORN; Lys MARIGOLD, Click, p. 124. 
8 
 
cionais dão forma ao desejo, o canalizam, o refinam e, inevitavelmente, o 
desviam ou transformam.”12 Os indivíduos e coletividades são orientadas a 
desejar determinados produtos e a consumir desenfreadamente. 
Os deslocamentos e interações provocados pela globalização produ-
zem mudanças culturais. Não que tal fenômeno seja, de fato, novo. Thomp-
son, por exemplo, argumenta que tradições podem ser desenraizadas, traba-
lhadas e novamente ancoradas em outros tipos de unidades territoriais. 
Uma característica particularmente importante a este respeito é a migra-
ção, o deslocamento e o reassentamento de populações. Quando as pes-
soas se mudam (ou são forçadas a mudar) de uma região do mundo para 
outra, elas sempre carregam consigo os conjuntos de valores e crenças 
que fazem parte de suas tradições. Estas tradições nômades se susten-
tam em parte através de reconstituições ritualizadas e de práticas de re-
contar histórias oralmente em contextos de interação face a face. Com o 
decorrer do tempo, tradições nômades podem sofrer alterações, à medida 
que se afastam dos contextos originais e se entrelaçam com conteúdos 
simbólicos derivados das novas circunstâncias nas quais elas são recons-
tituídas.13 
Com a globalização, aumenta a velocidade, extensão e abrangência 
dessas mudanças, primeiramente pelo aumento dos fluxos migratórios (de-
correntes da internacionalização dos negócios), depois, pela velocidade da 
troca de informações, tanto pelas mídias convencionais quanto pelas novas 
mídias digitais. Os diversos participantes do processo de comunicação inte-
ragem até certo ponto, destacando-se a sobreposição de formas culturais 
norte-americanas14. 
 
12 Pierre LÉVY, op. cit., p. 123. 
13 John B. THOMPSON, A mídia e a modernidade, p. 178. 
14 William GREIDER, op. cit., p. 95-96. Tom SINE, op. cit. p. 26-27. 
9 
 
Os arquitetos do McMundo não estão simplesmente tentando desenvolver 
o livre comércio e o livre empreendimento globais; estão, creio eu, traba-
lhando para redefinir o que é importante e o que tem valor na vida das 
pessoas em todo o planeta. E o objetivo é claro: vender os seus produtos. 
(…) A novidade é que, à medida que a economia se globaliza, o ritmo de 
exportação desses valores culturais seculares aumenta drasticamente.15 
A sociedade globalizada, estabelecida sobre as realidades do Estado, 
da produtividade do mundo e do individualismo e moldada pela comunica-
ção de massa, pratica a “exclusão sistemática da diferença. (...) De fato, esta 
nova sociedade apresentou um ‘estilo de vida’, uma determinada ‘visão de 
mundo’ que reordenou a experiência existencial do ser humano”.16 A comu-
nicação torna-se não apenas poderosa ferramenta de acomodação cultural, 
mas também de reorientação da política: 
A tendência cada vez mais sistemática de governos contornarem o proces-
so eleitoral ampliou a função política dos meios de comunicação (...). Sua 
capacidade de descobrir e publicar o que as autoridades desejavam man-
ter na sombra, e de dar expressão a sentimentos públicos que não eram, 
nem podiam ser articulados pelos mecanismos formais da democracia, 
transformavam esses meios de comunicação nos grandes atores do cená-
rio público.17 
Na contabilidade da globalização, o ser humano é mero número e peça 
de engrenagem, tal como afirma Forrester: “Deve-se lembrar também como é 
pouco importante a sorte das almas e dos corpos camuflados nas estatísticas 
 
15 Tom SINE, op. cit., p. 26. Sine utiliza o neologismo “McMundo”, criado em 1992 
por Benjamim R. Barber, no seu livro Jihad vs. McWorld, para identificar os 
tentáculos da nova ordem econômica, que diminui a disponibilidade de tempo e 
recursos dos indivíduos, forçados a trabalhar mais a fim de manter o padrão de 
vida (redução de renda) ou adquirir mais bens de consumo, em escala infinitamente 
crescente (o sonho ou padrão americano de vida). 
16 Everardo ROCHA, A sociedade do sonho, p. 105-106. 
17 Eric HOBSBAWM, A era dos extremos, p. 559. 
10 
 
e usados apenas como um modo de calcular.”18 Somente um pequeno con-
tingente das populações dos países explorados têm acesso a educação em 
tecnologias de ponta e, destes, poucos são aproveitados nas grandes corpo-
rações. De modo geral, a subserviência de tais países ao capital exaure re-
cursos que poderiam ser investidos em educação contextualizada de boa 
qualidade e o bem-estar humano não é um item de discussão nas decisões 
de transferências de capital. 
A crença, segundo a economia neoclássica, em que o comércio interna-
cional irrestrito permitiria aos países mais pobres chegar mais perto dos 
ricos, vai tanto contra a experiência histórica quanto contra o bom senso. 
Uma economia mundial que se desenvolvia pela geração de desigualdades 
tão crescentes estava, quase inevitavelmente, acumulando encrencas 
futuras.19 
A proposta de aumento da qualidade de vida revela-se enganosa. O 
ser humano globalizado trabalha mais e dispõe de pouco tempo para relacio-
namentos profundos, cultivo da espiritualidade e descanso. A desarticulação 
social produzida pela queda (ou inexistência) de renda e a desestabilização 
resultante da desvalorização humana produz violência urbana e insegurança. 
É praticamente impossível ir de um Casulo para outro sem tensão. Quan-
do saímos, saímos apreensivos. Desapareceram das nossas vidas os luga-
res onde antes nos sentíamos seguros. Esqueça o Encasulamento no local 
de trabalho. O homicídio no local de trabalho é o tipo de assassinato que 
mais cresce nos Estados Unidos. Esqueça a segurança nas escolas. Um 
dentre quatro alunos de segundo grau afirma já ter visto uma arma na 
escola. A violência é chamada de “a onda da década de 90”... 
… Nada nos surpreende mais. Um assassino profissional na ferrovia. 
Balas perdidas. Dilaceramentos. Canibalismo. Bombas em escritórios. 
 
18 Viviane FORRESTER, O horror econômico, p. 10. 
19 Eric HOBSBAWM, op. cit. p. 549. 
11 
 
Homens que caçam as amantes, mulheres que caçam os namorados. 
Filhos que matam os pais. Assassinatos em série.20 
Se algumas nações, em virtude de suas participações no jogo da 
globalização, crescem economicamente, por outro lado, continua injusta a 
distribuição da renda global. Sodré afirma que “o mundo, na verdade, está 
mais em desordem do que nunca. Os seus desequilíbrios e contradições 
estão mais agudos do que nunca.”21 Greider registra que 30 a 50 bancos 
controlam o comércio financeiro mundial. Além disso, a prosperidade de uns 
exige o fracasso de outros: “a nova dinâmica da globalização faz surgir umametáfora diferente na cabeça das pessoas — uma gangorra — da qual 
algumas pessoas têm de cair para que outras possam subir.” 22 
A idéia de que o sistema econômico global é a solução para a harmo-
nização das relações entre as nações tem sido contestada pelos fatos. O sé-
culo XX foi marcado por violências de todo tipo. Conflitos sangrentos e atos 
terroristas confirmam a continuidade de rusgas étnicas que não podem ser 
resolvidas com o foco apenas na economia. Alvin e Heidi Tofler levantam 
dados assombrosos, principalmente quando se sabe que escreveram há uma 
década, bem antes da escalada do terrorismo do início do Século XXI: 
Poucos (...) iriam saber que, dependendo de como contamos, entre 150 e 
160 guerras e conflitos civis grassaram pelo mundo todo desde que 
“estourou” a paz em 1945. Ou que se estima que 7,2 milhões de soldados 
foram abatidos enquanto isso acontecia… 
Ironicamente, em toda a Primeira Guerra Mundial, o número de soldados 
mortos foi apenas moderadamente maior: aproximadamente 8,4 milhões. 
Isso significa, de modo impressionante, que (…) o mundo tornou a lutar 
 
20 Faith POPCORN; Lys MARIGOLD, op. cit., p. 53-54. 
21 Nelson Werneck SODRÉ, A farsa do neoliberalismo, p. 4. 
22 Op. cit., p. 26 e 49. 
12 
 
quase que o equivalente à Primeira Guerra Mundial desde 1945. Quando 
são acrescentadas as mortes civis, a soma chega ao total astronômico de 
33 a 40 milhões, mais uma vez, sem contar os feridos, estuprados, 
desalojados, doentes crônicos ou empobrecidos. 
As pessoas têm dado tiros, esfaqueado, bombardeado, atacado com gás e 
assassinado de outras maneiras umas às outras em Burundi e na Bolívia, 
em Chipre e no Sri Lanka, em Madagáscar e no Marrocos. Existem, hoje, 
quase 200 países membros das Nações Unidas. Tem havido guerras em 
muito acima de sessenta dos países membros. O SIPRI, instituto Interna-
cional de Pesquisa da Paz de Estocolmo, contou 31 conflitos armados em 
andamento só em 1990. Na verdade, nas 2.340 semanas que se passaram 
entre 1945 e 1990, a Terra desfrutou um total de apenas três que foram 
verdadeiramente sem guerra. Chamar os anos de 1945 até o presente de 
era do “pós-guerra”, portanto, é juntar a ironia à tragédia.23 
As afirmações de Eric Hobsbawm acerca do final do século XX, são 
perfeitamente aplicáveis ao início do século XXI: 
O século acabou numa desordem global cuja natureza não estava clara, e 
sem um mecanismo óbvio para acabar com ela ou mantê-la sob controle. 
O motivo dessa impotência estava não apenas na verdadeira profundi-
dade e complexidade da crise mundial, mas também no aparente fracasso 
de todos os programas, velhos e novos, para controlar e melhorar os pro-
blemas da raça humana.24 
Todas essas ponderações confirmam o que foi dito anteriormente: a 
globalização é intrincada, possui várias facetas. A sociedade global não é 
simplesmente um fenômeno ou movimento, mas a representação concreta de 
uma mudança de civilização. 
 
23 Alvin TOFLER; Heidi TOFLER, Guerra e antiguerra, p. 28-29. 
24 Op. cit. p. 541. 
13 
 
GLOBALIZAÇÃO E NOVA CIVILIZAÇÃO 
As movimentações não apenas econômicas mas também sociais e 
culturais produzidas pela globalização, confirmam mais do que uma simples 
acomodação ou adaptação planetária às novas demandas históricas. Neste 
exato momento, ocorre uma mudança de civilização. 
Quando tomaremos consciência de que não há crise, nem crises, mas 
mutação? Não mutação de uma sociedade, mas mutação brutal de uma 
civilização? Participamos de uma nova era, sem conseguir observá-la. 
Sem admitir e nem sequer perceber que a era anterior desapareceu.25 
ONDAS DE MUDANÇAS 
Parte da sociedade global é pré-moderna; desfrutando de um estilo de 
vida baseado na agricultura de subsistência, sem acesso a tecnologia, edu-
cação ou quaisquer dos “confortos” possibilitados pela modernidade, tais 
como água encanada, tratamento e esgotos ou luz elétrica. O telefone, em 
pleno início de século XXI, é utilizado “apenas por pouco mais que 20% dos 
seres humanos”.26 
O mundo globalizado é moderno, a “aldeia global” de McLuhan é real. 
Aparelhos de televisão são instalados nos locais aparentemente mais remo-
tos. Operárias vestidas de tundjung montam chips de semicondutores e 
adolescentes dançam hip-hop em Kuala Lumpur, na Malásia.27 Aborígines 
australianos consomem Pepsi-Cola.28 Tribos indígenas brasileiras acessam a 
 
25 Viviane FORRESTER, op. cit., p. 8 
26 Pierre LÉVY, op. cit., p. 236. 
27 William GREIDER, op. cit., p. 92-96. 
28 Everardo ROCHA, op. cit. p. 114-115. 
14 
 
Internet. O fenômeno da cibercultura é visto por Pierre Lévy29 como uma 
democratização e afirmação vigorosas do projeto da modernidade: 
Em contraste com a idéia pós-moderna do declínio das idéias das luzes, 
defendo que a cibercultura pode ser considerada como herdeira legítima 
(ainda que longínqua) do projeto progressista dos filósofos do século 
XVIII. De fato, ela valoriza a participação em comunidades de debate e de 
argumentação. (...) Desenvolveu-se a partir de uma prática assídua das 
trocas de informações e de conhecimentos, que os filósofos das luzes con-
sideravam como sendo o principal motor do progresso. 
Tal projeto, porém, não produz satisfação. Touraine sintetiza o estado 
angustiante produzido pela modernidade: 
Nós vivíamos no silêncio, nós vivemos no barulho; nós estávamos isola-
dos, nós estamos perdidos na multidão; nós recebíamos muitas poucas 
mensagens, nós somos bombardeados por elas. A modernidade nos ar-
rancou dos limites estreitos da cultura local onde vivemos; ela nos jogou 
igualmente na liberdade individual como na sociedade e na cultura de 
massa.30 
A modernidade impulsiona a realidade globalizada, ao mesmo tempo 
em que se esgota. O processo de secularização que ela empreende produz 
desencantamento e separação entre o “mundo dos fenômenos” e o “mundo 
do Ser”, que é construído pelo “dever moral e a experiência estética”.31 
Por isso mesmo, a nova sociedade planetária é pós-moderna, um 
pastiche de experiências, significados e valores. A cibercultura é um exemplo 
disso. Se por um lado, como defende Lévy, ela concretiza os ideais da moder-
nidade, possibilita, por outro, a vivência de experiências dissociadas da 
 
29 Op. cit., p. 245. 
30 Alain TOURAINE, Crítica da modernidade, p. 99. 
31 Ibid., p. 101. 
15 
 
racionalidade (virtualidade) e a colagem de vivências e idéias excludentes. O 
resultado, longe de libertador, é desesperador: 
O pós-modernismo ameaça encarnar hoje estilos de vida e de filosofia nos 
quais viceja uma idéia tida como arqui-sinistra: o niilismo, o nada, o va-
zio, a ausência de valores e de sentido para a vida. Mortos Deus e os 
grandes ideais do passado, o homem moderno valorizou a Arte, a Histó-
ria, o Desenvolvimento, a Consciência Social para se salvar. Dando adeus 
a essas ilusões, o homem pós-moderno já sabe que não existe Céu nem 
sentido para a História, e assim se entrega ao presente e ao prazer, ao 
consumo e ao individualismo.32 
RUMO À ENCRUZILHADA 
Tal como demonstra Tito Paredes em um estudo realizado na cidade 
de Lima, Peru33, a globalização permite experimentar tudo isso, simultanea-
mente. Em um centro urbano típico, são encontrados nichos sociais pré-
modernos, modernos e pós-modernos, convivendo lado a lado. Sittema, ao 
refletir sobre a pertinência das análises sociológicas propostas por John 
Naisbitt, no livro Megatrends: Ten new directions transforming our lives, 
resume bem a situação: 
Analistas culturais da atualidade falam da transformação radical de 
nossa sociedade, que deixou de ser rural e agrícola e passou a ser uma 
sociedade de informação, na qual o envolvimento com o trabalho não é 
mais “prático”, mas sim, “administrativo”,onde o estilo de comunicação 
pessoal cara a cara deu lugar à comunicação por telefone, fax, modem, 
voice-mail e e-mail. E as mudanças estão acontecendo em um ritmo cada 
vez mais acelerado. Há duzentos anos, 95% da mão de obra nos Estados 
Unidos relacionava-se à agricultura, sendo que hoje são menos do que 
4%. Contudo, o grande impulso dessas mudanças tão radicais aconteceu 
 
32 Jair Ferreira dos SANTOS, O que é pós-modernismo, p. 10. 
33 Tito PAREDES, El evangelio: Um tesoro em vasijas de barro, p. 196. 
16 
 
nos últimos cinqüenta anos e a maioria das transformações se deu nos 
últimos quinze anos, ligadas diretamente ao desenvolvimento e cresci-
mento extraordinário dos computadores de uso pessoal. Não se engane 
achando que essas mudanças referem-se apenas à forma como ganhamos 
o nosso dinheiro ou como nos comunicamos uns com os outros. Tais 
transformações afetam a maneira de nos vermos como pessoas, de enten-
dermos nosso propósito aqui na terra e a forma como vivemos na presen-
ça de Deus e nos relacionamos com o próximo.34 
Confirma-se, basicamente, a teoria das ondas de Tofler: a sociedade 
global é impactada por uma terceira onda de mudança, caracterizada pela 
economia baseada na informação. Tal “onda” segue-se à primeira (revolução 
agrícola) e segunda (revolução industrial)35. 
Esta nova civilização é marcada pela pulverização do velho e constru-
ção do novo e exige do cristianismo não apenas uma confrontação apologé-
tica, mas uma resposta verdadeiramente positiva, criativa e estratégica. O 
foco atual deve estar na “transformação do velho, na planta que, tendo 
brotado de sua semente, é, ao mesmo tempo, algo completamente novo 
quando comparado àquela semente”.36 
Os cristãos estão diante de uma encruzilhada histórica, percebendo 
que é necessário preservar intactos o evangelho e as marcas reformadas da 
igreja. No entanto, é preciso repensar a vocação e o ministério sem compro-
meter a integridade — a fidelidade a Deus e às Escrituras, enxergando na 
globalização tanto o perigo quanto a oportunidade da igreja. 
 
34 John SITTEMA, Coração de pastor, p. 13-14. 
35 Alvin TOFLER, A terceira onda, p. 15-32. 
36 David. J. BOSCH, ibid., p. 544. 
17 
 
DESAFIOS E OPORTUNIDADES 
O fato de ter havido tantos séculos de existência livre de crise para a igreja 
foi uma anormalidade. Agora, finalmente, estamos de “volta ao normal”… e 
sabemos disso! David J. Bosh. 
Este capítulo trata de alguns desafios e oportunidades que a globa-
lização apresenta ao cristianismo. É importante que a igreja conheça ade-
quadamente o ambiente globalizado a fim de ajustar-se às exigências bíbli-
cas para este contexto. Marcos Adoniram Monteiro descreve isso utilizando 
uma parábola urbana. 
Numa cidade moderna (…), em face das mudanças psicológicas, socioló-
gicas, tecnológicas e culturais por que passa a nossa época, qualquer 
pastor, com sua teologia bíblica e sua experiência mística, mostra-se tão 
anacrônico quanto um jumentinho na avenida. Ele trafega placidamente, 
ruminando as suas limitações pessoais, arrastando uma carroça (chama-
da igreja) cheia de objetos velhos e móveis usados, em meio a velocidade e 
ao barulho de motocicletas, automóveis, ônibus e caminhões. 
Fiel e preciso, ele repete as atividades dos jumentos de todos os tempos. 
O que ele carrega na carroça interessa a muito pouca gente, mas seu 
anúncio anacrônico é triunfalista. Ele expõe dados estatísticos ultrapas-
sados e pesquisas desusadas para convencer o homem da cidade de que 
nada existe melhor do que ser jumento e nada mais vital e atual do que 
uma carroça. 
Sua visão da cidade e do século é propositadamente limitada e pessimis-
ta. Com suas viseiras bem ajustadas, ele insiste em afirmar que o burbu-
rinho e a agitação da cidade o impedem de trafegar e que os modernos 
automóveis à sua volta é que são os grandes problemas da avenida. E vai 
18 
 
criticando as pessoas que não querem voltar às soluções “asnais” e 
“carroçáveis”.37 
Concluindo, é preciso pensar em atualização, mas isso não pode ser 
feito sem uma motivação e um alvo corretos. A igreja não se atualiza sim-
plesmente para estar em dias com a agenda da cultura, muito menos para 
sentir-se menos inadequada. Ela existe para glorificar a Deus e cumprir Sua 
vontade, expressa nas páginas do Velho e Novo Testamentos. A igreja, a cada 
geração, tem de perguntar-se como agradar ao Senhor, como tornar vivas as 
verdades, valores e práticas da Escritura. 
A preocupação importante que temos é como tratar a necessidade de 
renovação de maneira bíblica, que siga o exemplo de Cristo, e ajudar a 
maioria a ver o que se deve fazer e, então, como um corpo, avançar em 
unidade e harmonia.38 
O foco bíblico encontra-se não na idéia de sucesso, mas no relaciona-
mento da igreja com Deus, na aliança e obediência alegre. 
OBSOLESCÊNCIA OU RELEVÂNCIA 
David J. Bosch39 faz um apanhado da crise relacionada à igreja, teolo-
gia e missão cristãs, descrevendo-a em seis pontos, quais sejam, o processo 
mundial de secularização, a descristianização do Ocidente, o pluralismo reli-
gioso, a culpa sentida pelos cristãos ocidentais decorrente da subjugação e 
exploração de povos de cor, a divisão do mundo entre pobres e ricos e, por 
fim, a relativização da teologia e práticas eclesiais das igrejas do ocidente. 
 
37 Marcos Adoniram MONTEIRO. Um Jumentinho na Avenida: A missão da igreja 
na ótica de um pastor urbano. In: STEUERNAGEL, Valdir R. (Org.). A missão da 
igreja, p. 165.166. 
38 Gene A. GETZ, Igreja: Forma e essência, p. 328. 
39 Op. cit., p. 19-21. 
19 
 
A secularização decorre diretamente da reação humana ao avanço da 
ciência e tecnologia. A fé em Deus é considerada “redundante” e as pessoas 
se perguntam sobre a necessidade de voltar à religião, quando parece que 
elas mesmas têm formas de “lidar com as exigências da vida moderna”.40 O 
resultado desta nova realidade marcada pela ética privada subjetiva, tecnolo-
gia e consumismo é o esvaziamento das igrejas cristãs. 
Somente 10% dos católicos freqüentam a igreja. A cada ano, diminui em 
50.000 a quantidade de ingleses que assistem às missas de domingo. (…) 
Entre os protestantes, o cenário é igualmente desolador. Somente 3% da 
população comparece aos cultos nos países escandinavos. A cúpula da 
Igreja Reformada Holandesa está transformando parte de seus complexos 
religiosos em hotéis para pagar despesas de manutenção. A Catedral de 
Canterbury, de importância central na fé anglicana, fica vazia na manhã 
de domingo, o dia mais movimentado em qualquer templo cristão. 41 
Esta tendência é confirmada na avaliação que Hobsbawm42 faz da 
última década do século XX: 
O declínio e queda das religiões tradicionais não era compensado, pelo 
menos na sociedade urbana do mundo desenvolvido, pelo crescimento da 
religião sectária militante, ou pelo surgimento de novos cultos e comuni-
dades de culto, e menos ainda pelo evidente desejo de tantos homens e 
mulheres de refugiar-se de um mundo que não podiam entender nem 
controlar, numa variedade de crenças cuja própria irracionalidade cons-
tituía a sua força. A visibilidade pública dessas seitas, cultos e crenças 
não deve desviar a atenção da fraqueza relativa de seu apoio. Não mais de 
3% a 4% dos judeus britânicos pertenciam a qualquer das seitas ou gru-
pos ultra-ortodoxos. Não mais de 5% da população adulta dos EUA 
pertenciam às seitas militantes e missionárias [Pentecostais, Igrejas de 
 
40 David J. Bosch, op. cit., p. 19. 
41 José Eduardo BARELLA, Europa sem Deus, p. 62. 
42 Eric HOBSBAWM, op. cit., p. 544. 
20 
 
Cristo, Testemunhas de Jeová, Adventistas do Sétimo Dia, Assembléias 
de Deus, Igrejas da Santidade, “Renascidos” e “Carismáticos”]. 
Boschcita uma pesquisa desenvolvida por David Barret, revelando 
que, “na Europa e na América do Norte, 53 mil pessoas em média deixam 
permanentemente a igreja de um domingo até o seguinte”.43 Mesmo o 
crescimento significativo de alguns segmentos do cristianismo evangélico, 
não é suficiente para reverter o quadro geral: 
… estamos andando para trás, não para a frente, na evangelização global. 
Vinte e oito por cento das pessoas do mundo hoje se identificam como 
protestantes, católicos ou ortodoxos. No ano de 2010, o número terá 
caído para 27% e continuará declinando, pois a população global cresce 
mais rapidamente do que a igreja global, enquanto os marqueteiros do 
McMundo fazem um excelente trabalho de “evangelização” dos jovens.”44 
No mundo global, a secularização anda de mãos dadas com o plura-
lismo religioso. As múltiplas migrações e o intercâmbio de idéias, doutrinas, 
ideologias e estilos de vida produzem uma nova interface religiosa. Os cris-
tãos vêem as outras religiões de forma mais tolerante e, em certos contextos, 
os adeptos destas religiões “muitas vezes mostram ser mais ativa e agressi-
vamente missionários do que o são os membros de igrejas cristãs”.45 
Os empreendimentos missionários do passado, nos quais foram mis-
turadas a evangelização e a exploração deixaram marcas tanto nos povos 
“conquistados” quanto nos conquistadores. Os cristãos ocidentais sentem-se 
culpados pela subjugação e extermínio cultural dos povos de cor. Isso expli-
ca em parte, porque, enquanto as religiões orientais se levantam e empreen-
 
43 Op. cit., p. 19. 
44 Tom SINE, op. cit., p. 165. 
45 David J. BOSCH, op. cit., p. 20. 
21 
 
dem maciços programas de expansão, o cristianismo ocidental se encolhe a 
olhos vistos. O islamismo já é contabilizado como a segunda maior religião 
do mundo, com 1,2 bilhão de seguidores. 46 
Neste mosaico multicolorido contam ainda as novas religiões, criadas 
a partir de colagens de crenças antigas ou de elaborações completamente 
originais. 
O hinduísmo e o budismo são hoje as religiões de maior crescimento na 
Austrália. Quem vive nos países ocidentais já não tem limitações quanto a 
que ramificações do cristianismo escolher. Como conseqüência da globali-
zação, as pessoas hoje têm acesso não só a todas as religiões mundiais 
históricas, mas também a uma explosão de alternativas.47 
O mundo globalizado, dividido entre ricos e pobres identifica, como 
cristãs, a maioria das nações ricas. Os países pobres relutam em aceitar 
uma religião tão vinculada à espoliação dos mais fracos, enquanto os cris-
tãos ocidentais, constrangidos pela ostentação, se retraem deixando de evan-
gelizar os pobres, espiritualizando os princípios bíblicos relacionados à ética 
econômica ou criando novas versões do evangelho, nas quais a promessa de 
riqueza vem mesclada ou até mesmo substitui o anúncio de reconciliação 
através de Jesus Cristo. Onde ocorre essa mistura entre evangelho e prospe-
ridade, surge uma nova versão de cristianismo e uma “nova igreja”, descrita 
por Charles Trueheart, no Atlantic Monthly de agosto de 1996: 
A nova igreja está redefinindo a natureza e o papel da própria comuni-
dade por seu excelente desempenho em cinco práticas básicas: ênfase na 
liderança e no desenvolvimento de lideranças, redes de conhecimento na 
comunidade, relevância cultural, ênfase no atendimento das necessidades 
 
46 BBC Brasil.com. Fiéis do Islã formam a 2ª maior religião do mundo. 
47 Tom SINE, op. cit., p. 163. 
22 
 
individuais dentro do contexto de uma comunidade e mobilização da 
paróquia. Ao perseguir esses processos com grande propósito, a nova 
Igreja cria uma massa crítica cujo porte lhe permite ser o que a igreja 
tradicional não pode: uma igreja que oferece “serviço completo”.48 
O problema encontra-se na expressão “serviço completo”. Igrejas que 
não são plenamente eficientes no “atendimento” de sua membresia ou comu-
nidade, são tidas como irrelevantes. Esse desdobramento funcional estabele-
ce um novo quadro: as teologias e práticas das igrejas tradicionais são des-
cartadas ou consideradas relativas. Nas sociedades orientais, todo o conjun-
to do cristianismo ocidental é visto com suspeitas — como algo a ser relido e 
adaptado. 
Os impactos ontológicos, éticos e comportamentais da cultura globali-
zada são exemplificados nos papéis sexuais, no casamento e família, nas 
questões não respondidas da bioética e nas mazelas da solidão e depressão. 
O homem global do século XXI assume suas fragilidades e limitações. 
Um reflexo disso é a nova versão em quadrinhos do Super-Homem, lançada 
pela Time-Warner em junho de 2004. De acordo com a revista Veja, o novo 
herói assumirá que tem medo, hesitará em entrar em ação, perderá parte de 
seus poderes, apanhará dos inimigos e será alvo de piadas. A mudança 
também tem a ver com linguagem e códigos de conduta. O novo Super-
Homem usará gírias e lançará provocações a seus inimigos.49 
 
48 Bob BUFORD. Os baby boomers, as igrejas e os empreendedores podem 
transformar a sociedade. In: HESSELBEIN, FRANCES. Et al. A comunidade do 
futuro, p. 51. 
49 Julio Cesar de BARROS, Plástica no Super-Homem, p. 37. 
23 
 
Tofler50 percebe a emergência de tais alterações nos âmbitos da 
família e dos valores tradicionais: 
… A família nuclear, outrora o padrão moderno, torna-se uma forma 
minoritária enquanto que famílias de pais ou mães solteiras, casais que 
recasaram, famílias sem filhos e pessoas que vivem sozinhas proliferam. 
A cultura passa daquela em que os padrões são claramente definidos e 
hierarquizados para uma outra na qual idéias, imagens, símbolos giram 
em torvelinho e o indivíduo pega elementos individuais com que forma 
seu próprio mosaico ou colagem. Os valores existentes são desafiados ou 
ignorados. 
Toda a estrutura da sociedade, portanto, muda. 
Na família, alteram-se o compromisso conjugal e os espaços da 
mulher, dos pais e dos filhos. Um levantamento feito em 2002 pela antropó-
loga Miriam Goldenberg, da Universidade Federal do Rio de Janeiro,51 sobre 
os hábitos sexuais dos casais brasileiros, demonstra que 60% dos homens e 
47% das mulheres já foram infiéis aos seus cônjuges. Dos esposos e esposos 
que nunca traíram, 59% dos homens e 55% das mulheres afirma já ter 
sentido vontade de ser infiel. Cresce ainda o número de divórcios. As 
mulheres, mais independentes, não mais se submetem a relacionamentos 
nos quais se sentem infelizes e lideram as iniciativas das separações.52 Os 
pais encontram-se confusos diante da precocidade e a liberdade da vida 
sexual de seus filhos.53 Ao mesmo tempo, uma nova geração de adolescentes 
assume a liderança do lar, aproveitando a brecha da ausência de autoridade 
paterna.54 
 
50 Alvin TOFLER, A terceira onda, p. 38-39. 
51 Daniela PINHEIRO, Traição: Relações cada vez mais perigosas, p. 78. 
52 Thaís OYAMA e Lizia BYDLOWSKI, Até que o casamento os separe, p. 121. 
53 Juliana DE MARI, Os pais estão confusos, p. 122. 
54 Marcelo MARTHE, A tirania adolescente, p. 71-77. 
24 
 
Os avanços da ciência esbarram com questões éticas nem sempre 
fáceis de serem resolvidas. André Petry, em artigo publicado na revista Veja, 
demonstra a sua indignação pela intervenção dos cristãos em projeto que 
transita no Congresso Nacional brasileiro, de lei que autoriza a pesquisa 
científica com células-tronco de embriões humanos. No artigo são formula-
das perguntas que exemplificam muito bem as complexidades atuais, no 
campo da bioética. 
É quase inacreditável, mas, às vésperas de votar o assunto, existem sena-
dores dispostos a levar em conta os argumentos de autoridades religiosas 
e proibir a pesquisa. Sim, querem proibir a pesquisa que pode salvar 
vidas e reduzir o sofrimento humano— e tudo, é claro, “em nome de 
Deus”. Ora, mas que Deus é esse? Que Deus irônico nos daria talento, 
dom e fé para chegar perto das descobertas mais sensacionais da vida, 
mas nos proibiria de exercer nosso talento, nosso dom e nossa fé? Era 
tudo só para Deus ver? Que Deus mordaz nos daria condições de prolon-
gar a vida e reduzir o sofrimento, mas, apesar da generosa doação, nos 
proibiria de fazê-lo, obrigando-nos a permanecer, mesmo doentes ou à 
beira da morte, infensos à intervenção humana, feito relíquias de redoma, 
apenas para que nosso Criador, egoísta e genial, pudesse contemplar Sua 
obra intocada? Que Deus mórbido e tirânico exigiria de nós, Suas cria-
turas, a resignação com o sofrimento e a dor apenas para que ficasse pa-
tente o respeito que Lhe devotamos?55 
Observe-se a idéia presente nos questionamentos de Petry: a religião 
não tem nada a dizer à sociedade. A ética, que desenvolveu-se como “campo 
específico da filosofia e da teologia”, é agora relegada aos cientistas e políti-
cos. 
O debate em torno do significado da saúde e da medicina adquire foros 
cada vez mais seculares — impelido pela visão de que o consenso público 
 
55 André PETRY, Estupidez em nome de Deus, p. 138. 
25 
 
deve pôr de lado as questões mais universais acerca da natureza e do 
destino do ser humano suscitadas pela crença religiosa.56 
A ética cristã decorre da visão de mundo oferecida pelas Escrituras. 
Os seres humanos são criaturas de Deus, a vida, seja em que estágio for 
(embrionário, com retardamento mental, senil ou inconsciente-vegetativo), é 
valiosa. O sofrimento é deplorável e deve ser combatido, mas Deus pode 
fazer, do mal, brotar o bem, tal como afirma Meilaender: “Devemos nos 
empenhar no cuidado daqueles que sofrem, todavia não devemos supor que 
o sofrimento possa ser eliminado da vida humana ou que não tenha sentido 
ou propósito algum em nossa existência”.57 
As considerações da moderna bioética partem do princípio da garantia 
da autonomia e direitos do indivíduo, mas só são considerados indivíduos 
aqueles que possuem consciência, autoconsciência e capacidade produtiva,58 
esta última, uma condição necessária para valorização no contexto do 
capitalismo global, que é, em essência darwinista, ou seja, fornece espaço 
para a sobrevivência apenas dos “mais aptos” — os inválidos, aposentados e 
doentes são “despesas” nas planilhas orçamentárias dos países globalizados. 
Outro desdobramento da globalização, imposto pela modernidade, é a 
solidão. Em 2001, na Suécia, 40% das pessoas viviam sozinhas. Na 
Dinamarca eram 36%, na Inglaterra 35%, na Alemanha 30%, na França, 
30%, nos Estados Unidos 26% e no Brasil 9%.59 O maior levantamento já 
feito sobre saúde mental no mundo, empreendido pela Organização Mundial 
 
56 Gilbert MEILAENDER, Bioética, p. 11. 
57 Ibid, p. 21. 
58 Ibib, p. 19. 
59 Alda VEIGA, Lição de casa: Aprender a viver só, p. 103. 
26 
 
de Saúde (OMS) e pela Universidade Harvard, em 2004, relatou que “o índice 
de vítimas de distúrbios psiquiátricos é mais alto do que o estimado”. 
Dentre os males mais prevalentes destaca-se a depressão, que afeta 
10% dos norte-americanos, 9% dos ucranianos, 9% dos franceses, 7% dos 
holandeses e 7% dos colombianos. A doença “aumenta os riscos de infartos, 
derrames, infecções e até suicídio”. Do ponto de vista da economia e vida 
social, um paciente grave, na Espanha, mesmo com toda a assistência 
médica, perde cerca de oitenta dias de trabalho por ano. 60 
Este conjunto de novidades apresenta perigos e oportunidades 
ímpares, que serão abordados a seguir. 
PERIGO À ESQUERDA: PRAGMATISMO 
O cristianismo pode responder à sociedade globalizada em seus 
próprios termos, reproduzindo, nas fileiras evangélicas, as premissas da 
globalização: ênfase na produtividade e baixo custo, crescimento massificado 
consolidado pelo marketing, clientelização da membresia e exacerbação do 
isolamento individual. 
A igreja é afetada pelo ambiente de valorização da lucratividade e 
eficácia empresarial. Ela pode não apenas beneficiar-se dos insights úteis 
destas ênfases, mas passar a considerar-se como empresa e ao ministério 
como ação executiva. Crescer rapidamente, dobrar ou triplicar a arrecadação 
e conquistar espaço na mídia podem tornar-se alvos mais desejáveis do que 
apresentar as marcas da pregação autêntica, ministração dos sacramentos e 
 
60 PERTURBAÇÃO mundial. Veja, p. 140. 
27 
 
prática da disciplina. A adoração, evangelização, discipulado, comunhão e 
serviço podem ser substituídos por uma agenda de programas e eventos 
voltados para o sucesso. Michael S. Horton lamenta o fato de o movimento 
de crescimento de igreja raramente fazer a pergunta crucial: “O que é a 
igreja?”. Para ele, este questionamento deve ser feito “antes mesmo de discu-
tir os princípios de crescimento”, pois, “como saberemos que a igreja que 
estamos erguendo é a mesma que Cristo está construindo?”61 
A sociedade globalizada de consumo é alimentada pelos mitos 
fornecidos pela publicidade. O lugar que, nas culturas pré-tecnológicas, era 
ocupado pelos xamãs, curandeiros, agora é ocupado pelos artistas e publi-
citários. As “fantasias simbólicas”, presentes nas mentes dos indivíduos, 
antes tornadas visíveis e públicas pelos curandeiros tribais, agora são expos-
tas pelas celebridades e profissionais de propaganda: 
Hollywood está no ramo da criação de mitos, e podemos dizer o mesmo de 
Madison Avenue. 
Com a introdução e a proliferação dos meios de comunicação eletrônicos, 
a publicidade tornou-se uma forma de arte dominante e uma poderosa 
força na cultura americana. A televisão é o espelho mágico que cria e ao 
mesmo tempo reflete nossos sonhos e fantasias. Por ser tão penetrante, 
abrangente e “do momento”, a publicidade desempenha um papel impor-
tante na criação de mitos. Nas culturas contemporâneas, tecnológicas, o 
publicitário substituiu o xamã… 
… O consumismo, com todos os seus defeitos, é a pedra de toque da 
cultura americana. Gostando ou não, o consumismo impregna todos os 
aspectos da vida e da cultura americana. Até a nossa política se baseia 
em promessas presidenciais de cada vez maiores lucros e crescimento. 
Não devemos ficar surpresos, portanto, se a publicidade acaba desempe-
 
61 Michael S. HORTON. O assunto da relevância contemporânea. In: HORTON, 
Michael Scott. (ed.). Religião de poder, p. 281-282. 
28 
 
nhando um papel tão importante na criação e na manutenção das mito-
logias que condicionam as nossas vidas. Os gregos tinham o seu panteão 
de deuses; os americanos têm as suas marcas.62 
Uma nova versão de cristianismo absorve essa cultura de consumo, 
se consolida por estratégias de marketing e orienta-se para a produção de 
mitos, ícones de conexão com a divindade, ideais de saúde, vida boa, prospe-
ridade e poder, personificados em lideranças bem-sucedidas. Trata-se de 
uma versão antropocêntrica de cristianismo, caracterizada por manipulação 
dos desejos e emoções e por proselitismo baseado em técnicas de comunica-
ção e não na pregação do evangelho. 
Este cristianismo não produz discípulos, mas conquista e fideliza 
clientes. O mais importante é atender as necessidades sentidas dos indiví-
duos (mesmo que sejam negligenciadas as necessidades reais). O ministério 
se torna gerenciamento comercial, tal como relatado por Eugene Peterson: 
Os pastores se transformaram em um grupo de gerentes de lojas, sendo 
que os estabelecimentos comerciais que dirigem são as igrejas. As preocu-
pações são as mesmas dos gerentes: como manter os clientes felizes, 
como atraí-los para que não vão às lojas concorrentes que ficam na mes-
ma rua, como embalar os produtos de forma que os consumidores gastem 
mais dinheiro com eles.63O cristão globalizado típico é isolado, cultiva uma existência voltada 
para o ego e confunde a bênção divina com o desenvolvimento econômico-
financeiro. Ele não valoriza os relacionamentos e não vivencia a mutualidade 
na experiência da igreja como organismo. Ele não se dispõe para o serviço 
local ou missionário. Sua existência consumista não leva em conta as pes-
 
62 Sal RANDAZZO, A criação de mitos na publicidade, p. 84-85. 
63 Eugene PETERSON, Um pastor segundo o coração de Deus, p. 2. 
29 
 
soas pobres, sofredoras e não alcançadas pelo evangelho. Ele também não 
expressa nenhuma preocupação ecológica. Sua consciência é apaziguada e 
sua interioridade é abastecida com os mitos que são fornecidos pelos even-
tos-show-publicidade ou pelas experiências de catarse xamanistas promovi-
das regularmente por sua “igreja”. Michael Horton afirma que esta “fundação 
não bíblica da eclesiologia evangélica contemporânea é reconhecida pelo fato 
de que não há algo chamado igreja evangélica, mas somente um movimen-
to”.64 Auto-satisfação, indiferença e inércia social são as atitudes proemi-
nentes deste “seguidor de Cristo” produzido pelo cristianismo pragmático. 
PERIGO À DIREITA: ALIENAÇÃO 
São perigosas para a igreja tanto a aceitação irrefletida da cultura 
globalizada, quanto a alienação, o entrincheiramento dos cristãos em bolhas 
de tradição desvinculadas da realidade em redor. Neste último caso, perma-
nece o anúncio do evangelho e as práticas eclesiais tradicionais, mas não há 
contextualização, reflexão ou ação diaconal ou missionária efetivas. 
A resposta alienada constata a complexidade do ambiente, mas 
afasta-se, propondo um retorno às práticas passadas, sem sequer ponderar 
sobre os princípios e contextos que as originaram. Outra versão da mesma 
resposta é a espiritualização dos princípios do Novo Testamento. A Bíblia é 
interpretada em termos puramente abstratos e subjetivos, de modo que o 
mandamento concreto é tido como orientação desencarnada, cuja única 
aplicação é feita na “alma” do devoto, sem implicações de ordem relacional, 
profética, social, evangelística ou missionária. Há ainda a fuga apocalíptica: 
 
64 Op. cit., p. 282. 
30 
 
a volta de Cristo desestimula qualquer empreendimento de resgate ou me-
lhoria do mundo; o importante é cuidar da religião pessoal, preparar-se indi-
vidualmente para a parusia. 
Todas essas soluções resultam em indiferença. Aliás, observe-se que a 
indiferença — a Deus, ao próximo e à criação — é o ponto de encontro das 
igrejas cooptadas pela ideologia globalizada (com sua ênfase na religião de 
consumo) e alienada (com sua ênfase na tradição irrelevante). 
Estes são apenas alguns dos desafios trazidos pela globalização à 
igreja de Cristo. O restante deste capítulo é dedicado a argumentar que tais 
desafios representam não dificuldades desesperadoras, mas oportunidades 
singulares: “Saibamos também que defrontar-se com a crise é encontrar a 
possibilidade de ser verdadeiramente a igreja”.65 
O FIM DAS PERGUNTAS RELIGIOSAS? 
Os cidadãos do novo mundo globalizado lidam com Deus e a verdade 
de diferentes maneiras. Há pessoas que consideram que a nova ordem 
econômica ou a ciência fornecem explicações ou soluções para todos os 
questionamentos ou problemas. Essa é uma tendência em declínio — o mo-
dernismo — mas ainda influente no mundo da política e das idéias, notada-
mente nos ambientes acadêmicos ou de pesquisa. 
Outros, consideram que a “vida madura” exige o abandono de qual-
quer esperança por respostas. A existência adulta é a exploração de um ter-
 
65 David J. Bosch., op. cit., p. 19. 
31 
 
reno desconhecido e escuro, sem nenhum tipo de mapa que possa guiar a 
caminhada. Essa é a tendência predominante — o pós-modernismo. 
Há, no entanto, pessoas tateando em busca de respostas, remoendo 
perguntas existenciais fundamentais, que só podem ser respondidas pela 
metafísica, à semelhança de Nikos Kazantzákis: 
Por uma só coisa anseio: aprender o que se esconde atrás dos fenômenos; 
desvendar o mistério que me dá a vida e a morte; saber se uma presença 
invisível e imota se esconde além do fluxo visível e incessante do mundo. 
Pergunto e torno a perguntar, golpeando o caos: quem nos planta nessa 
terra sem nos pedir licença? Quem nos arranca da terra sem nos pedir 
licença? 
Sou uma criatura fraca e efêmera, feita de barro e sonhos. Mas sinto em 
mim o turbilhonar de todas as forças do Universo.66 
Essa tendência é examinada, destrinchada e batizada de ancoragem, 
no apanhado feito por Popcorn e Marigold. 
A espiritualidade encontra-se no coração e na alma da Tendência 
Ancoragem. Pense nessa busca espiritual como uma procura bastante 
direcionada. Perdemos algo intangível e agora o encontramos novamente. 
Graça Divina? Estar ancorado também significa participar de um 
contexto maior. Você sabe que, atracado em algum cais quente e 
confortável, pode perscrutar as estrelas, na esperança de encontrar alívio 
em um poder maior. Como escreveu certa vez o poeta Tennyson: “Lance 
todas as suas preocupações a Deus; a âncora segura”.67 
Tom Sine é ainda mais contundente: Para ele, o estilo da vida e valo-
res produzidos e propostos pela globalização estimulam o desejo por Deus e 
sua verdade. 
 
66 Nikos KAZANTZÁKIS, Ascese. apud Ed René KIVITZ, Vivendo com propósitos, p. 3. 
67 POPCORN, Faith e MARIGOLD, Lys, op. cit., p. 136. 
32 
 
Relatos da frente de batalha indicam que as pessoas estão exaustas por 
causa das longas horas de trabalho e não têm achado as delícias 
consumistas do McMundo tão gratificantes quanto pensavam que seriam. 
Cada vez mais pessoas de fora e de dentro da igreja estão em busca não 
só de uma forma de se livrar dos jet skis da vida, mas de levar uma exis-
tência que tenha um senso mais nítido de direção e uma espiritualidade 
mais profunda. Achamos, particularmente, que muitos jovens pós-moder-
nos estão procurando uma fé que permeie todos os aspectos da vida.68 
A estas pessoas, que buscam o “Deus desconhecido”, é possível e 
desejável apresentar as boas notícias acerca de Jesus Cristo.69 Os seres 
humanos estão abertos para ouvir que “o grande conceito final da verdade 
está em que o cristianismo é fiel àquilo que existe”.70 A abertura para tal 
testemunho tem uma razão: os indivíduos globalizados, secularizados e 
pluralistas, são também, essencialmente, religiosos, ratificando o que foi dito 
no século XVI, por João Calvino: 
As pessoas inteligentes reconhecem que um sentimento indestrutível da 
divindade está esculpido na alma de cada ser humano, confirmando a 
existência de Deus. Tal convicção está tão entranhada no homem como a 
medula nos ossos, e serve de testemunha suficiente contra a teimosia e 
rebeldia daqueles que se esforçam e lutam furiosa — e ineficientemente — 
contra o temor de Deus.71 
O homem da cultura de consumo, moderno e sofisticado, reproduz, 
neste tempo, a atitude religiosa do caipira Riobaldo Tatarana, personagem de 
Guimarães Rosa: 
Hem? Hem? O que mais penso, testo e explico: todo mundo é louco. O 
senhor, eu, as pessoas todas. Por isso é que se carece principalmente de 
religião: para se desendoidecer, desdoidar. Reza é que sara da loucura. No 
 
68 Op. cit., p. 226. 
69 At 17.22-31. 
70 Francis A. SCHAEFFER, A igreja do final do século XX, p.54. 
71 João Calvino, As institutas da religião cristã, I.IV.4. 
33 
 
geral. Isso é que é salvação-da-alma (…) Muita religião, seu moço! Eu cá, 
não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio 
(…) Uma só, para mim é pouca, talvez não me chegue. Rezo cristão, 
católico, embrenho a certo; aceito as preces de compadre meu Quelemém, 
doutrina dele, deCardéque. Mas, quando posso, vou no Mindubim, onde 
um Matia é crente, metodista: a gente se acusa de pecador, lê alto a 
Bíblia, e ora, cantando hinos belos deles. Tudo me quieta, me suspende. 
Qualquer sombrinha me refresca. Mas é só muito provisório. Eu queria 
rezar — o tempo todo. Muita gente não me aprova, acham que lei de Deus 
é privilégios, invariável. E eu! Bofe! Detesto! O que sou? — o que faço, que 
quero, muito curial. E em cara de todos, falo, executado. Eu? — não 
tresmalho! 
Olhe: tem uma preta, Maria Leôncia, longe daqui não mora, as rezas dela 
afamam muita virtude de poder. Pois a ela pago, todo santo mês — enco-
menda de rezar por mim um terço, todo santo dia, e, nos domingos, um 
rosário. Vale, se vale. Minha mulher não vê mal nisso. E estou, já mandei 
recado para uma outra, do Vau-Vau, uma Izina Calanga, para vir aqui, 
ouvi de que reza também com grandes meremerências, vou efetuar com 
ela trato igual. Quero punhado dessas, me defendo em Deus, reunidas de 
mim em volta (…) Chagas de Cristo!72 
Os protestantes de linha reformada reconhecem que a disposição para 
acolher, ao mesmo tempo, crenças excludentes, não representa, em si, um 
avanço quanto ao conhecimento de Deus. Na verdade, pode ser uma 
expressão da espiritualidade gnóstica no estilo “corte-e-cole”,73 refutada 
pelos apóstolos e destituída de interesse profundo no Deus verdadeiro. No 
entanto, é possível enxergar esta tendência como uma porta aberta para a 
missão — o mundo globalizado não está fechado para o compartilhamento 
do evangelho cristão. 
 
72 João Guimarães ROSA, Grande sertão: Veredas, p. 15. apud Carlos Rodrigues 
BRANDÃO. A crise das instituições tradicionais produtoras de sentido. In: 
MOREIRA, Alberto e ZICMAN, Renée. (Orgs). Misticismo e novas religiões, p. 27. 
73 Michael HORTON, A face de Deus, p. 56-57. 
34 
 
A ERA DO INDIVIDUALISMO? 
Enquanto se afirma que reina o individualismo, multiplicam-se as 
comunidades. Os baby boomers, a geração norte-americana nascida ao 
término da Segunda Guerra, desejam participar de grupos de afinidade.74 
Essa tendência é refletida ainda na proliferação de comunidades virtuais. 
Uma comunidade virtual é construída sobre as afinidades de interesses, 
de conhecimentos, sobre projetos mútuos, em um processo de cooperação 
ou de troca, tudo isso independentemente das proximidades geográficas e 
das filiações institucionais.75 
A interface computacional oferecida pelo ciberespaço permite a apro-
ximação real de seres humanos que desejam, antes de tudo, conhecer-se, 
relacionar-se. Encontros, amizades, namoros e casamentos surgem a partir 
desses diálogos digitalizados. A sociedade global anseia por entrelaçar-se em 
comunidades. 
A imagem do indivíduo “isolado em frente à sua tela” é muito mais 
próxima do fantasma do que da pesquisa sociológica. Na realidade, os 
assinantes da Internet (estudantes, pesquisadores, universitários, execu-
tivos sempre em deslocamento, trabalhadores intelectuais independentes 
etc.) provavelmente viajam mais do que a média da população. (...) Não 
nos deixemos, portanto, cair em armadilhas de palavras. Uma comuni-
dade virtual não é irreal, imaginária ou ilusória, trata-se simplesmente de 
um coletivo mais ou menos permanente que se organiza por meio do novo 
correio eletrônico mundial.76 
À humanidade sedenta de relacionamentos, os cristãos oferecem o 
grande milagre de Deus, a igreja.77 A igreja fala de reconciliação individual 
 
74 Bob BUFORD, op. cit., p. 44-50. 
75 Pierre LÉVY, op. cit., p. 127. 
76 Ibid, p. 127. 
77 Ef 1.15-23, 3.1-13. 
35 
 
através da obra consumada de Jesus e anuncia que esta reconciliação de-
semboca em uma experiência comunal, a vida do corpo de Cristo.78 Ela faz 
isso não anunciando-se como centro de aperfeiçoamento moral ou de cura fí-
sica, muito menos como instituição garantidora de prosperidade, mas como 
uma luz em meio às trevas, como um sinal de amor e esperança para uma 
sociedade amarga e violenta e como família acolhedora em meio à indife-
rença.79 
O CRISTIANISMO ESTÁ AGONIZANDO? 
Contrariando as medições estatísticas e as previsões mais tenebrosas, 
o cristianismo não está morrendo, mas transformando-se. “O cristianismo 
triunfou de geração em geração, enfrentando e vencendo desafios com uma 
força que para os fieis só pode ser de inspiração divina”.80 Os presentes 
desdobramentos definem, sim, um momento de sofrimento, mas não da mor-
te de Deus ou da falência da igreja. 
DESAFIOS TEOLÓGICOS E PRÁTICOS 
Para fazer frente às novas demandas impostas pela globalização, a 
igreja dá atenção à teologia, primeiramente, retornando aos ensinos das 
Escrituras, depois, articulando compreensivelmente essas verdades para 
esta geração. Aquilo que David Eby afirma sobre o ministério pastoral, vale 
para toda a igreja: “o único fundamento para a correta prática pastoral está 
 
78 Ef 2.11-22. 
79 Mt 5.14-16; Jo 13.35. 
80 Maurício CARDOSO, Jesus 2000, p. 168. 
36 
 
em recuperar a verdade e a teologia. A paixão por uma prática íntegra e 
saudável é a única base para um ministério produtivo.”81 
O conhecimento adequado de Deus — e a organização e aplicação 
prática dos construtos desse conhecimento, nos termos da Bíblia — é a 
necessidade real do ser humano globalizado. Mesmo que a agenda cultural 
contemporânea sugira outros temas, é vital que a igreja permaneça firme no 
ensino da verdade. R. C. Sproul, refletindo sobre a postura do apóstolo Paulo 
em sua visita a Atenas, cidade conectada às últimas novidades intelectuais e 
religiosas, diz o seguinte: 
Pode-se notar que Paulo não comprometeu sua mensagem a fim de obter 
entrada. Sua mensagem foi considerada relevante exatamente porque não 
era como nada que eles conhecessem antes. É por demais freqüente nos 
dias de hoje que aquilo que os crentes ouvem na igreja seja apenas um 
verniz bíblico sobre tudo o que eles escutam na cultura popular. 82 
As doutrinas fundamentais da soberania de Deus, da graça imerecida, 
da obra consumada de Cristo, do modo como as pessoas podem obter perdão 
de pecados e caminhar como discípulas do Senhor, em adoração, santifi-
cação e serviço — tais considerações teológicas devem estar na pauta da 
igreja, e precisam ser compreendidas e ensinadas com tal clareza e pertinên-
cia, devem ser esmiuçadas de forma tão prática aos ouvintes, que não haja 
outros resultados senão a resposta em fé ou o endurecimento obstinado.83 
 
81 David EBY, Pregação poderosa para o crescimento da igreja, p. 18. 
82 R. C. SPROUL. O objetivo da relevância contemporânea. In: HORTON, Michael 
Scott. (ed.). Religião de poder, p. 262. 
83 Is 6.9-13. 
37 
 
Em segundo lugar, esta teologia precisa ser transformadora, apreendi-
da pelos indivíduos e comunidades. A revelação sobre Cristo foi fornecida 
como testemunho que incentiva à fé. 
Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não 
estão escritos neste livro. Estes, porém, foram registrados para que creiais 
que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em 
seu nome. Jo 10.30-31. Os grifos são meus. 
Por último, tal teologia precisa ser revolucionária. No centro do palco 
onde se desenrola a trama da mundialização, no qual são aplaudidos o 
lucro, a exploração, o consumismo e o poder, deve erguer-se a voz da igreja 
que fala de justiça, reconciliação, generosidade, serviço altruísta, simplici-
dade, moderação, favor imerecido e completa entrega da vida a Deus, em 
sofrimento. E esse discurso da igreja deve ser acompanhado do exemplo 
perceptível e concreto, observável no cotidiano da comunidade de fé que 
vivencia a adoração, a evangelização, o discipulado, a comunhão e o serviço. 
Cardoso entende que “foi a revolucionáriaatitude de solidariedade do 
cristianismo primitivo que lhe arrebanhou seguidores”.84 O mesmo testemu-
nho, pela graça de Deus, pode ser repetido. 
A GRAÇA DE DEUS E A RESTAURAÇÃO DO 
CRISTIANISMO 
Como, porém, empreender este aprofundamento e aplicação da teolo-
gia? Como articular uma teologia profunda, equilibrada, bíblica e que produz 
prática fervorosa? Como assumir uma prática cristã verdadeiramente atuali-
zada, cheia de ardor, sem perder de vista os alicerces do cristianismo? 
 
84 Maurício CARDOSO, op. cit., p. 174. 
38 
 
“Com reforma e reavivamento”, diz-nos a Escritura e a história. A 
igreja do século XXI inicia com oração, então, se volta para a Bíblia e a pre-
gação; por fim, retorna à oração. Todo o restante do ministério é importante 
e tem seu lugar assegurado, mas o centro é a busca de Deus e suas miseri-
córdias, o estudo de Sua palavra e o anúncio poderoso de Suas virtudes e 
obras. 
É importante, para a presente discussão, o entendimento de ambos os 
termos, reforma e reavivamento: 
Reforma é a recuperação da verdade bíblica que leva à purificação de nos-
sa teologia. Envolve a redescoberta da Bíblia como juiz e guia de todo 
pensamento e ação; corrige erros de interpretação; confere precisão, coe-
rência e coragem para uma confissão de fé; e dá forma e energia ao culto 
corporativo ao Deus triuno. 
Reavivamento é a aplicação da verdade da Reforma à experiência huma-
na. Pode ocorrer com pessoas isoladas, fazendo com que indivíduos se 
separem da apatia geral; ou pode ocorrer em maior escala alterando 
radicalmente a face espiritual de toda uma igreja, comunidade ou mesmo 
de toda uma nação. Normalmente, reavivamento envolve três coisas: a 
presença de reforma doutrinária pregada, lida ou conhecida de outra ma-
neira; a aplicação experimental dessa doutrina acompanhada de amorosa 
investigação dessa experiência; e a extensão dessa experiência ao maior 
número de pessoas.85 
De acordo com Cardoso,86 existe na história do cristianismo um movi-
mento contínuo, pendular. Em determinadas épocas, a fé cristã rompe bar-
reiras e ganha terreno, impulsionada por grande fervor religioso. Em segui-
da, ela assume contornos de institucionalização: o encantamento e o caris-
 
85 Tom NETTLES. Um caminho melhor: Crescimento de igreja através de 
reavivamento e reforma. In: HORTON, Michael Scott. (ed.). Religião de poder, p. 134, 
137. 
86 Ibid, p. 174. 
39 
 
ma são substituídos pelos rituais, estruturas e burocracias. Então, ela enfra-
quece, para ser novamente revitalizada por outro movimento pendular. Es-
ses momentos de revitalização, lidos por Cardoso com lentes da história e 
sociologia, são chamados, pelos teólogos reformados, de tempos de reforma e 
reavivamento. 
Na oração, a igreja suplica iluminação para o correto entendimento da 
Palavra. Ela também insiste por intervenção divina no ensino, anúncio e 
aplicação da Escritura nos corações. Ela pede para que Deus a visite 
poderosamente, produzindo o temor devido ao Seu Nome. 
A igreja que trabalha pela reforma e ora por reavivamento, prega a 
Palavra. O desejo de relevância bíblica produz, sempre, pregação substan-
ciosa. David Eby fala de sua surpresa ao constatar a ausência de livros que 
tratem da relação entre pregação e o crescimento de igrejas e entende que 
essa omissão “opõe-se à prática e preceito do Novo Testamento.”87 Ele insiste 
que, na igreja de Cristo, como estratégia de semeadura e consolidação da 
semente do reino, o anúncio das Escrituras deve ocupar lugar central. 
De acordo com o Novo Testamento, e particularmente o livro de Atos, não 
podemos ter crescimento da igreja sem pregar. Lá descobrimos que pregar 
não é uma questão secundária. Antes, o ministério da Palavra é uma 
arma fundamental no arsenal espiritual, a única semente para a implan-
tação da igreja, a ferramenta-chave no plano de Deus para discipular as 
nações. Sem pregação não há igreja. Sem proclamação não há crescimen-
to de igreja. Pregar é o coração, o sangue, o sistema circulatório completo 
da vida e do crescimento da igreja.88 
 
87 Op. cit., p. 20. 
88 Ibid, p. 22. 
40 
 
Deus derrama graça sobre sua igreja, ouve as orações e aplica a men-
sagem ensinada e pregada nos corações das pessoas, sejam elas artesãs do 
século I, camponeses da Idade Média, pensadores do século XIX ou os cida-
dãos globalizados do século XXI. No cotidiano da comunidade de fé, experi-
menta-se da graça de Deus, fonte de restauração do cristianismo. 
A GLOBALIZAÇÃO E A “PLENITUDE DO TEMPO”: 
A NOVA ERA DA MISSÃO 
A globalização não é o tempo do fim da igreja, mas a nova era da 
missão. Ela traz consigo imensos problemas, muitos deles humanamente 
irresolúveis. Apesar disso oferece, para os seguidores de Jesus Cristo, 
oportunidades ímpares. 
Para o apóstolo Paulo, Jesus Cristo veio ao mundo na “plenitude do 
tempo”,89 dando a entender que o século I ofereceu condições excelentes 
para a realização da obra redentora. Avaliando aquele contexto, Michael 
Green afirma que “provavelmente nenhum outro período da história do mun-
do estava melhor preparado para receber a jovem Igreja que o primeiro sécu-
lo d.C.”.90 Ele lista três fatores que foram determinantes para a expansão do 
cristianismo: (1) a pax romana, que possibilitou uma relativa tranqüilidade 
política e criou a mais eficiente das estruturas operacionais de intercâmbio 
cultural — as estradas que interligavam os principais centros urbanos; (2) a 
cultura grega, que contribuiu com um idioma e visão de mundo comparti-
lhadas e fomentou uma religiosidade aberta para as novidades; (3) a religião 
 
89 Gl 4.4. 
90 Michael GREEN, Evangelização na igreja primitiva, p. 11. 
41 
 
judaica com suas sinagogas, plantadas nas cidades estratégicas, forneceu a 
Paulo as bases de ensino e anúncio do evangelho.91 
Economia globalizada, língua e cultura compartilhadas, pluralismo 
religioso, estruturas de comunicação e bases comuns de encontro para pro-
clamação da mensagem cristã. Os séculos I e XXI se encontram; o imperia-
lismo romano e o econômico dão as mãos e cumprem uma agenda divina de 
plenitude dos tempos. Chegou o tempo do plantio e colheita. A igreja vivencia 
um momento sem igual para o cumprimento da missão. 
A época moderna, mesmo criando desafios, parece propícia ao cristia-
nismo, que está numa fase oposta ao marasmo de anos atrás, quando as 
igrejas se apoiavam mais nas formalidades do ritual do que no coração 
dos fiéis. (…) O desafio da religião de Jesus no mundo frenético no fundo 
seria da mesma natureza daqueles que ela circunavegou no passado: 
adaptar-se sem perder a essência. Para quem já enfrentou dilemas abis-
sais em outros períodos históricos, não parece uma tarefa muito difícil.92 
 
91 Ibid, p. 12-29. 
92 Maurício CARDOSO, Jesus 2000, p. 174. 
42 
 
PROPOSTAS TEOLÓGICAS, ESTRATÉGICAS 
E ESTRUTURAIS 
No tocante à sua essência divina, Cristo em sentido algum pode depender 
nem é possível ser completado pela igreja. Porém, como Esposo, Ele é 
incompleto sem a Esposa; como Videira, não se pode pensar nele sem os 
ramos; como Pastor, não se pode vê-lo sem suas ovelhas; e assim também, 
como Cabeça, Ele encontra sua plena expressão em seu Corpo, a Igreja. 
William Hendricksen, comentando Ef 1.27. 
Vários autores propõem uma atualização. Há quem enfatize segmen-
tos do ministério ou mudanças na estrutura; outros sugerem a renovação 
completa de modelos eclesiásticos — novas configurações e paradigmas 
aplicáveis universalmente.93 Neste capítulo são esboçadas algumas suges-
tões, orientadas para uma concepção bíblica da relação entre fé e obras, a 
reforma e contextualização da teologia e o desenvolvimento integral.

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