Buscar

Arquiteturas no Brasil 1900 a 1990 - Hugo Segawa - LIVRO

Prévia do material em texto

---, 
066I-006I 
A arquitetura brasileira do século XX 
alcançou prestígio ii.[ern~cional como 
poucos países do mundo lograram atingir. 
Brasília é obra consagrada como uma das 
contribuições brasileiras às criações mais 
marcantes na cultura do século. Mas se esse 
reconhecimento é a face m ais visível da sua 
importância, não menos importan te é 
reconhecer os múltiplos rumos e os 
processos na gênese dessa p rodução, tão 
alardeada e tão pouco examinada em seu 
conjunto como realizações de um contexto 
conturbado como o que marcou a história 
do Brasil nos últimos cem anos. 
Arquiteturas no Brasil 1900-1990 é uma obra 
que vem proporcionar uma visão 
abrangente e ao mesmo tempo concisa da 
arquitetura brasileira no século XX, sob o 
signo da releitura do movimento moderno 
após a crítica do pós-modernismo-
embora situe o moderno como o epicentro 
das inquietações do século. 
Ao relacionar as intervenções urbanas como 
signos de modernização no final do século 
XIX, o livro identifica as raízes de 
modernidades p aralelas aos movimentos 
como a Semana de Arte Moderna de 1922. 
Realizações estas que passaram tanto pela 
arquite tura neocolonial quanto por diferentes 
manifestações arquitetônicas em três linhas -
modernismo programático, modernidade 
pragmática e modernidade corrente -
caracterizando práticas distintas no país a té a 
Segunda Guerra Mundial. 
0661-0061 
us-e.Ig: ou s-e1nl~l~nb1y 
[ill}l 
Reitor 
Vir·e-rcitnr 
led:: 
Diretor-preside11/e 
/'residente 
Vire-pre.tidenre 
UNIVERSIDADI; DE SÃO PAULO 
Adolpho José Melfi 
Hélio Nogueira da Cruz 
EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAUtO 
Plinio Martins Filho 
COMISSÃO EDITORIAL 
José Mindlin 
Oswaldo Paulo Forattini 
I'lrasílio João Sallulll Júnior 
Carlos Alberto l:lurbosa Dantas 
Guilherme Leite da Silva Dias 
Laura de Mello e Souza 
Murillo Marx 
l'linio Martins f'ilho 
Dire/ora Editorial Silvana 13irul 
Dircrora Comercial Eliana Urabuyashi 
Diretara Administrmiva Angela Maria Conceição Torres 
Editora-assi.l'tente Marilena Vizentin 
Copyright © 1998 by Hugo Scgawa 
I' edição: I 998 
2' edição: 1999 
2' edição, 1' reimpressão: 2002 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 
(Câmara Drasildra do Livro, SI', Brasil) 
Segawa, Hugo, 1956-
N .Cham.:- 720.981 S454a 2.ed. 
Autor: Segawa, Hugo,l956-
Tílulo: Arquitetura no Brasil 1900-1 990 . 
lllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll 
Ex.2 CAC 
Arquiteturas no Brasill900- l990 I llugo Segawa . - 2. ed. I. reimpr.-
São Paulo: Editora da Un iversidade de São Paulo, 2002.- (Acadêmica; 21 ) 
Bibliografia. 
ISBN: 85-314-0445-2 
1. Arquitetura - Brasii- História I. Título li. Série. 
98-1!54 CDD-720.981 
Índices para catálogo sistemático: 
L. Brasil :Arquitetura : llístória 720.98 1 
Direitos reservados à 
Edusp - Editora da Universidade de São Paulo 
Av. Prof. Luciano Gualbeito. Travessa J, 374 
6° andar- Ed. da Antiga Reitoria - Cidade Universitária 
05508-900 - São Paulo- SP - Brasil Fax (Oxx 11 )3091-4151 
Tel. (Oxx 11) 3091-4008 I 3091-4150 
www.usp.br/edusp- e-mail: edusp@edu.usp.br 
Printed in Brazil 2002 
Foi feito o depósito legal 
~ 
40657800 
Ac.25035 l 
;iilil 
UTELIOLU::lUI IIJ 
;))j1EJ3: Jlll{l.IV opp~MSQ 
ElSO:) 0!)111 
._.f 0[[;))!\J OI~ li O(] 
(o-rfueD dpll.Tpuv dp se~o z!n'l O!LI<]Hrv 
SUMÁRIO 
i\lg-ulll<t Expli cação ........ ........ .... ...... .......... ...... ..... ..... ..... ..... ... .... ...... ..... ... ........... .. .. ..... ... .... .......... ... 13 
I . O Brasil e m Ud)aniração 1862-1945 ........ .. ............... ..... ........ ... .................. ......... .. ..... .. ........ 17 
2. Do An Licolonial ao Ncocolon ial: 
i\ Busca de A lg-um;t Mod ernidade l HH0-1 926 ....... .... .. ....... .. .... .. ... ........ ........ .. ........ ...... ........ 29 
3. Modernismo Prug-ra m úlicu 1q17-1q:12 ..... ............ ... ..... .. .. .. ... .............. .... ............... .. ... .. ......... 4 1 
1. Muclc rn irlad !· Prag-m á tica 1922-1~)4:~ .... ...... ............................ .................. .. ..... ..................... .. 5;) 
5. Moderniclad c Correm<' 1929-1945 ........................................ ........... ................................ ...... 77 
6. A Afirmação de uma Escola 191 ~- 1 960........ ...... . .... ...... .... .. ............ ............ ... .... .................... 1 0~ 
7. A Afir mação ele uma Hegemonia 1945-1970 .. ... .. ...... .... ... .. ........ .... ..................... ... .............. 129 
H. Episód ios ele um Brasil Gran de e Modern o 1950-1980 ... ....... ... .......... ......... ....... .. ..... ..... ... 159 
9. Desaniculação e Rcarticulação? 1980-1990 ..... .................................................. ......... .......... 189 
1 O. Referênc ias Ribliográficas ........................... ... ........ .. .. .... .. ................. ................. ............... ..... .. 199 
Font es das llusLraçõcs ........ .... ..... ... .. .... .... ....................... ....... ....... .. ...... .. ........................ ........ ........ .. 213 
Índ ice Re tn issi\'C> ....... .. .. .......... .... .... ........................................... ............................... ........................ 2 1!) 
... 
My
Realce
My
Realce
. ,,_tl]/JU J.I.11-IJJ/11fJ.W,J ';u~wtnJ "lliil :mu nw.s· 
'IIW11Up ?J d.ll/Vt}UUJ f!IJ/ fUJ fd .\.UII!IIlJSJ/ltWIII S.IIIJ/ J]J 
JJI!/)U //)/!},7 fltJ(llJOlll l11Ú HIUSIV.I S~J/3 St10.1]V/!Yrlf YJf 'SJ}'I10Jl SJ/ 'SJ/ntfn,t.J.\' \',Jf 
'uvpo 'll11, p ,).JU,)JlS d/ .IVC{ S/1.0/1 il]? S~WII/1.\' \'J.I.i/.tf.~,?} Z:ll(J H{(/1liO.J !VJ 
.'SIIJ'if XI'IV fd \'dWI!f.l XIII) Jf/10(}. 11J.(Jnf1 d\'\'d.tpttdf djlli/J.tJ"f ,1/J./! .Wrj /<} 
Jf(/J}}V[(/1111 llii.\'W./. Jlln .IV(/ JltÚ1.if111V./ J/) J]fj11ÚIIUJ 0/!}fliJf fD.f 
(i(,G 1 'nso:) üi:JirJ 
"'S!Jll J/1 0.1/UJp !'7 1/WIW/.\'J J1i.Ú YV/11 'Ji/IIOS VJillll/ J/U,/iJ V Jllb ~OSlO.) ,Jp 
'.wp_lNI!ÚSJ SI)SIO.J mp 1}.1(/IUJ/ JS J 'Zi/J/ 'Jil/J]UOJ OJff 'V.I/IIOJliJ JY ;mb 01/IIJJ Jfll,/B u 
'IJfi?.t.d.tns WJ vsJ.u/.ms 11p '.wl;u,"il .wvnlm 'yunJ.J !iOpnbv opu<~;\ 
...... 
ALGUMA EXPLICAÇÃO 
Sou d e urna geração de arqu ite tos br<tsilei-
ros ?t C]ll<ll , nos hancos escolares, se ensin ou que 
exis te uma ma ne ira de l'azer arquitetura, de 
apreciar arquitcLUra, de usufruir as cidades. Q ue 
o arquiteto tem uma m issão messiânica ao exer-
cer a sua pro1issão na sociedade. Nossos p rofes-
so res mrtndm·am lt>r Pt>vsnPr, Hitchcock, Giedion , 
Zcvi c scHH..: lhaH tcs- autores que escreveram 
retratos to tal izador es, mostraram in terpre t<t-
ções am paradas em grand es modf'los de expli-
cação , que esgotavam quaisque r dúvidas elo sa-
be r ver e faze r arC]uite tu ra. Nada tão frustrante 
qua m o o abismo entre a academia c a vida. Essa 
escri tura tdculógica que legi timou a afi rm<tç;1o 
d e u ma certa modernidade eu ropé ia e norte-
arnericana e consolido u mitologias a rquitetôni-
cas p e rmanece no im aginário de muita gen te. 
Leitores de diversificados matizes ainda. buscam 
em revis tas e livros interpretações à altu ra dos 
"p ioneiros da teoria moderna". Certame n te, os 
pevsn ers, hitchcocks, g iedio ns e zevis deste fin al 
de milê nio n ão se rão tão persuasivos; nem seu s 
le itores, tão pe rsuadidos. 
O r isco de escrever um estudo sobre a ar-
quite tura brasileira do século 20 é reproduzir 
inadve rridamcn te aqui lo que se critica: uma vi-
são LOtalizadora que apaga as diferenças, exalta 
as formas dominadoras e dissimula a diversida-
de. A história c a historiografia recentes ainda 
se refazem elo impacto epistemológico provo-
cad o , por exe mp lo, pelas idéias de um Michel 
Foucault- escr itos tecidos com a microtrama de 
nrna co1t1plcxa urdidura. l\esse caminh o, a via-
bilidade ele dar formas a p roblemas, de a rticular 
p erguntas é mu ito mais intensa que nossa capa-
cidad e in divid ual d e formu lar respostas. Respos-
tas que tendemcada vez mais a exames localiza-
dos, talvez profu ndos (contempland o minor ias, 
"ve nc idos", movimentos popu lares e Le.). U ma 
p osLUra que se avizin ha às tendências da frag-
mentação "regulamentada" do con hecimento, 
co mo que u ma reação às grandes leituras tota-
lizac\o ras. 
O h is to r iador britânico Eric Hobsbawn, 
comentando a respeito de algumas tendên cias da 
historiografia n o tin a! dos anos 1970, escrevia: 
7 4 • Arquiteturas no nrasil 
Não há nada de novo e m ol ha r o m undo com um 
microscópio ou com um telescópio. Desde que coJJcor· 
d e JJIOs <!'"" estam os estudando o meswo cosrnns, a es· 
co lha eutrc o microcosmo e o m acrocosmo é uma ques· 
tão de sc lccion:'ll" a técnica apropriada. r. signific:~ tivo 
que atualme nte mais histo riadores julguem o microscó-
pio mais (ttil. Mas isso n:'in sígn i!ica necessat·iamc nLc que 
eles rejeiwm o t e le~cópio, como instrumento snp<>rado. 
E.ste livro teve uma gê nese peculiar: con-
vidado pela Universidade Au tôn oma \1etropo-
litana do México para integrar u rna col eção ele 
monografias sob re arqn i tt"tn ra latino-america-
n a , se u for m ato ori g inal c ircun s tanciava-sc a 
um compê ndio de arquitetura brasileira no sé-
culo 20 pa ra o púhlíco latino-americano. A 
oportunidade d e uma edição brasileira não cles-
ca•·a cl «:>rizou e sse perfil. O difícil e> sutil equilí-
brio a se ati ng ir no con teúdo deste trabalho é 
u ma ta re fa que deve respe itar as caracte rísti cas 
ela iniciatiYa editorial , exigindo u ma compostu-
ra que se expressa num jargão arq uitetônico, 
no Lermo francês bienshm ce. As c irc unstâ n cias 
a pon tam mais para o manejo d o tt" lescópio; to-
davia, o microscópio às vezes foi útil , m esmo 
com pr t:juízo de a lguma coerência lotalizador a 
(C]ue não con s titui, propriamente , uma preocu-
pação cP ntral ) . A manute n ção das lente s e as 
direções para que e las apou1arn são de minha 
in te ira responsabilidad e; a razão dessas dire-
ções, espero que os le itores a p ercebam percor-
rendo as páginas des te trabalho. 
AS REFERÊNCIAS 
Ao escrever um trabalho do presente esco-
p o, fui me re por tar às obras d e m esm a n atureza 
-aos manuais de história da a•·quitetura brasilei-
ra - que não são muitos e possuem enfoques d is-
tintos. Trabalhos como Quatro Séculos de Arquite· 
tu:ra, de Paulo Ferreira Sant.os ( 1977, primeira 
versão 1965), Atlas dos Monumentos flistóriros e A-r-
tísticos do Brasil, de Augusto Carlos da Silva Tellcs 
(1975) c Arqu.ilelum Bmsilr>ira, d e Carlos A. C. 
Le mos ( 1979) , são panoramas de qnatro séculos 
de arquitCLura; o século 20 é um segme n to des-
se conjun to. A arquitetura bras ileira é pane de 
um contexto mais amplo também em Arqu.i tectum 
y l h-ba.nismo en lberoa.merica, de Ramón Guliérrez 
( 1983) . Precisamente pelo nú me r·o reduzido de 
trabalhos nesse úmbito, publicaçôes como o ca-
túlogo Braz.il Builds, editado ~•n 1943 pelo MOl'v1A 
ele Nova York, e Modern Archilectu·rp in JJmzil, de 
TTenrique Mindli n, ele 1956 pode ri am ser c u-
quadradas como pan oramas ela arquitetura bra-
sileira da primeira rn etacle d o século 20. 
Rigorosame nte , seriam três os t raba lh os 
no gênero preLendido por m inh a pesquisa: Ar-
quitetura Contemporânea no Bmsil, ele Yvcs Rruand 
( l Y81), Arquitet·um Moderna NrasileiTa, ele Sylvia 
Ficher c Marlene Mil an Acayaba (1982) e oca-
píwlo "Arquitetura Conte m porúnea" escrito por 
Carlos A. C. Lemos n a H istória G11ml ela A-rlf no 
Bmsil (coordenada por Walter Zani ni, 1983) . 
Todas e ssas obras foram importantes na 
e laboração do presente l ivro. Paulo F. Santos, 
A. C. Silva Te llcs e Carl os A. C. Lem os são si-
m ultan eamente historiadores e protagonistas 
do que re latam. O saboroso capítul o d u livro d e 
Pa ulo Santos é um depoimen to de um persona-
gem qu e vive n cio u os 11uiclos criar ivos do mo-
d ernismo carioca da pri meira me tade d o sécu-
lo . Carlos A. C. Lemos é importante pelo q ue 
escreve u c por tudo que a prendi como seu alu-
u o c estagiário; os escritos em forma de manu-
ais do professor Lemos são parte pequ e na d e 
um (] vida dedi cada à pesquisa. 8-razil Ruilrls e 
M otlr>rn An hilectm·e in Brazil são trabal hos apo lo-
géticos da arquite tura moderna, n o espírito in-
sinn::~do no in ício desta explicação, for mad ores 
de mitografias da moderna arquitetura brasile i-
ra e, como tal , são objetos d e an álise no meu 
tex to . A impor1ância de Fichcr e Acayaba está 
na modesta aspiração de ser um guia in t rodutó-
rio da arquitetura moderna bras ileira . Su a o ri-
gem, aliás, demo nstra o propósito: tratava-se de 
um verbe te do f nlenwtional Handbook of Contem-
jJorar)• Developrnents in An:hitecture, dirig ido por 
Warren Sanderson (1982) . Um roteiro que p io-
neiram e n te inc luiu, no map a arq uitetura! bra-
sil eiro, alg umas regiões pouco conte mpladas, 
sem a vtsao modernista c hcgcmônica que ca-
racteriza o livro de Yves Bruand. 
Arquitetum Contemporânea no B-rasil é o 
m ais completo clossiê sobre a arquitetura brasi-
leira elo s{:cnlo 20 at.é 1969, momeulo de con-
clusão dessa tese, apresentada na Université de 
Paris IV em 1971 e publicada dez anos depois e m 
português (lamen tavelmente , sem uma revisão 
técnica adequada da tradução, comprometendo 
parcialmente sua leitura). Bruand escreveu uma 
obra fundarncn t.alnie ll te baseada 11a variada hi-
hliografia brasileira e internacional e na coleta 
de depoiment:os de estudiosos locais, reunindo 
um conjunto documental do maior valor: um 
re trato do estado-da-arte da bibliografia brasi-
leira até os anos de 1960. No e ntanto, o autor 
francês, embora não sendo arquilclu, assimilou 
todos os preconceitos modernistas contra a ar-
quitetura do ecletismo ("da constatação de que 
a arquite tura brasileira só conhecera dois gran-
des períodos de atividade criadora: a arte luso-
brasileira dos séculos 17 c IH [ ... ] e o período 
atual", escreveu). Bruand dedicou-se principal-
mente ao Rio ele .Janeiro , São Paulo, Bahia e 
Brasília, deix<mdo a descoberto outras importan-
tes regiões, cludindo a diversidade da produç~w 
arqu itetônica brasilei ra . Ademais, seu posiciona-
mento sobre o sentido de "moderno '' desgas tou-
se no tem po: "o ad jetivo 'moderno' não é de mo-
do algum con veniente , pois contém apenas uma 
noção ele tempo aplicável ao con junto da produ-
ção de uma época e não unicamente a uma d e 
suas partes; substituir sua acepção cronológica 
por um elemento de valor é um contra-senso ... " 
A avaliação de Bruand padece uma leitura 
tri unfalista e apologética da arquitetura moderna 
do Brasil. Se não há un1 comprometimento do 
valor intrínseco do excelente trabalho que desen-
volveu, suas posições são historicarnenLe datadas. 
PONTOS DE PARTIDA 
Meu trabalho não tem a pretensão acadê-
mica do amplo esforço de Yves Bruand e volta-se 
A~!{llma Ex:plicaçiiu • 1 5 
para um outro mapeamenco arquitetônico. Os re-
tra tos de grandes arquitetos e das obras-primas 
da arquitetura brasileira constituem uma contri-
buição insuperada em Arquitetura Contemporânea 
no Brasil: protagonistas e re alizações são o cerne 
da sua p esquisa. Sem pretender contestar o sig-
nificado dessa abordagem, busquei eswdar os 
jJmcessos da constituição da nossa arquitetura 
moderna e m matizes diversos, caracterizando 
modernidades clistint.as, que in titulam os capítu-
los. Nesse sentido, nào privilegiei arquitetos (ex-
ceções honrosas a Warchavchik, Niemeyer, Lu-
cio Cos ta c Vilanova Artigas), tampouco obras 
(também com exceçôes) , rnas a inserção de ar-
quitetos e obras no debate cultural e arquitetô-
n ico num certo recorte da história. Ao operar 
com processos, o desejo ele realizar uma carto-
grafia arquitetônica turna-se uma empreitada 
d ifíci l , d evido :1 ~!mplitud e c complexidade elo 
panorama arquitetônico brasileiro. Todavia, 
mesmo na ausência de vários arquitetosou 
obra:; no presen te trabalho, o possível entendi-
mento advindo dos processos que d escrevo per-
mitiria u m a contextualizaçào dos personagens e 
realizações preteridos em meu map eamento. 
Tendo como eixo de narrativa a arqu itetura, 
imagi n o a possibilidade de interlocução com 
outras disciplinas sem necessariamente preten-
der r esenhar episódios da história, ela sociolo-
gia ou ela eco nomia brasileiras. 
Os lemas urbanismo c cidades têm un1 
peso significativo no primeiro terço do livro, 
para virtualmente ficarem pulverizados no res-
tante elo trabalho . A complexidade desses tópi-
cos após a Segunda Guena- quando a maioria 
da população no Brasil passa a viver em cidades 
- uào recomendaria o aprofundamento da ques-
tão, sob o risco d e o autor ser obrigado a escre-
ver não um, mas dois livros. Reuniões como as 
realizadas pela ANPUR e os Seminários de Histó-
ria da Cidade e elo Urbanismo nos últim os anos 
relevam cada vez mais certa autonomia discipli-
nar no trato dessas questões . 
A mençào in icial à questão urbana tem 
uma relação mais próxima com o te ma moder-
n idade. Uma preocupação fim-de-século- qual 
1 ó • Arqu i lelums no lJrasil 
será a arqui tetura d o século 20? - permeo u lanl-
bé m local izad os de b ates sobre o tema n o Rrasil 
d o sécu lo 19. Ao m e debruçar sobre esse mote, 
p rocure i resgatar alg um as interpretações so bre 
o mod erno ern arrp ri rcrn ra. Não há defin ição 
u nívoca de m oderni dade: se n ::~ Europa a pro-
ble mática é objeto d e entend imen to d iverso, o 
con ce ito de moderno no Bras il é ain ci::~ mais 
con trove rso, p rcc isalll cn te p ela necessidade de 
examiná-lo sob uma óptica apropriada à realida-
de local - sem dcscnrar d e su a entrop ia com u m 
meio mais am plo. A segunda p ::1 rt e elo livro foi 
AGRADECIMENTOS 
Toda relação de agradec imentos é u ma 
lista d e esqu ecimen tos injustos. Não posso rela-
c io nar c agrad ecer a todas as pessoas e institui-
ções que me aj udaram na re;:~ l i zação d esta pes-
qu isa. Todavia, deYo lembrar-m e de Conce pción 
Vargas e Ernesto Alva, qu e me confiaram origi-
nalmente a escrita deste trabalho. Pela fe itura 
deste livro, dt:vo me us reconh ec im entos a Vicen-
te Wissenbach , editor da revista Projeto, da qu al 
fui colaborad or há m u ito tem po g raças <1. cora-
gem d e seu editor; à Ruth Verde Zein , colega na 
revista e in terlocuto ra pe rma ne n te; ao J<. leber 
Friz?.era c ~ Univers idade Federal d o Espír ito 
Santo; à Vera He lena Moro Rin ~ Ely e à 1.J nivcr-
organizada com a preocu pação de mos trar as vá-
r ias mode rn idades p ra ticadas na arquite tura d o 
Brasil n o perío d o e n treguc rras. 
No corre r das páginas e com o evolu ir d a 
na rra tiva, a a bordagem d os assun tos torna-se 
mais esquemática. Naturalmen te, o tempo é um 
pod eroso depu rador c o distancia mento maio r 
dos acon tecim entos pc rrni!.e selecion ar as le n-
tes mais adequad as para o exame das qucstôes. 
Por isso , a con tem poraneidad c se mpre é mais 
seduro ra e instiga n te . E os riscos ele e quívocos, 
proporc ionais ao nosso d iscernime n to. 
siclad e Federal d e San ta Catarin a; e àisa P ierma-
tiri e à Universidade Fcrler::J I do Paraná, <]Ue , em 
di fe re ntes mo me n tos no in ício de minha aproxi-
mação com a arquitetura brasile ira do século 20, 
me convi daram para ministrar cu rsos, obrigan-
d o-me a desenvolver uma estrutura d e aula que 
está na raiz deste traba\ho; ao arquhcto c profe~­
sor Paulo Rrnna CJlle, convidand o-me a auxiliá-lo 
numa disciplina de pós-graduação na U niversida-
de Mackcnzic , me permitiu cxpot· h ipóteses d e 
interpretações que estão al in havad as n este li\To . 
Aos alunos desses cursos, a paciência d e ouYirem 
c d iscuLircm min has idéias que, a pós essas ses-
sôes, deixara m d e ser exclusivam t:n le minhas. 
1 
0 BRASIL EM URBANIZAÇÃO 
1862-1945 
Na arqu itetura (o 1/ll,!!;enlu:irol perpetua as gló·rú1> de ma j;âtria em 
monunu•nüJs, que os séculos veneram snn destruir I' r/ri nos sr•us 
wntemfJOTâneos nocâo do (11do euritmiw derivado das obms f;rimas da 
Antigüidade, que f!oT sua or:z. o recebeu de civilizarõr:s idas, 11 que rlej)()is rir 
millzarPs de anos !'IP faz ressusritar ao impulso aiador do seu r;ênio! 
Nas ridruiPs, ai rmdP as multidliPs SP ojnimPm Pm busra do bPm-PJ!fll; 
nas grnndPs rolmhns, Ptn quP a alividariP jfbril do homnn vai 
diarian!l'nte premcher o seu papel jHMiidencial de elemrnlo ronstitutivo dt> 
riquPZa jJP/o lmbalho, o mr;enhPirn; ainda a luz, o guia na r>smlha 
de localidades, no preparo do solo, nn orientaçâo e traçado das ruas, 
110 rstwlo das !IPrPssidadPs públiras f' parlirularrs, uo.ç jlnigos, na.\ 
mwgênrias P ali> nas rrisPs patológiras! Sf' um baino é diji.rilmeniP 
ventilado, se uma jHtTie do litoml é otujHtda intermitentemente jJelas águas 
em seu etemoflu ."w e refluxo, ei-lo removendo montanhas, dilatando a área 
1ahrm a P anulando s-ilnn ltanr:amr>nfe duas fontes de insalubridade.' 
j. S. DE CASTRO BARBOSA, 
Lrecho elo pa negír ico ~obre a profissão do. engenheiro 
por ocasião do l 6Q aniversário elo Club de 
Engenharia do Rio ele Janeiro em 1896. 
O an o de 1900, a lém de algum sig nifica-
do na n u me rologia, n ão te m muita importância 
~ >(· .1'. datas marcantes da histó ria mundia l, a 
não ser o fato de assinalar a transição do século 
19 para o século 20. Todavia, para o Brasil, o ano 
marcou a grande efeméride da celebração dos 
L...i 
18 • llrquile/urus 110 flrasil 
quatrocen tos anos da cheg-ada de u ma frota 
pon ug-uesa na cost.a sul-americana - contato que 
ofiriali1.ou o domíni o de Ponugal sobre essas 
ter ras que, mais tarde, se transformariam num 
país de d imensões con tin e n tais. 
Foi e m fins ele 1900 que, a pretexto dessas 
comcmoraçiks, o Clnh de F:ngenharia p romoveu 
o Congresso de Engenharia c ln rlústria. O C lub 
de l•:ngenharia era uma ag-remiação politicamen-
te vitoriosa em busca de uma a firmação inédi-
ta naquele tempo: a Rcpltbl ica havia sido pro-
clamada pouco ;uJles, e o Club, ele convicçfto 
republican a (an tagôn ica ao monárquico lnsti-
llll<> Polité-cnico Rt·asile iro) .firmava-se como o 
furo oficioso de urna corporação que buscava 
habilitar-se como uma alternativa na esfera po-
lítica contra o monopólio exercido por ou tra 
c<Jtegori a profissional: os bacharéis de D ire i tu. 
CREDENCIAMENTO 
TÉCNICO PARA A MODERNIZAÇÃO 
A formação d a e lite intelectual brasilei ra 
na passagem do século sustentava-se num Ll"ÍfJé: 
a medicina (cujas primei ras esco las d ata m de 
1808-1809) , as c i{:ncias juríclicas (suas duas aca-
demias foram fundadas em 1827) c a enge nh a-
ria- n~a consolidação se faria no final do século 
19 com a Escola Politécnica rlo Rio de Janeiro 
em 1874, a Escola ele Minas, em Ouro !' re to , ele 
H:l76, a Pol it <:cn ica rle São Paulo e m 1894 e a 
Mackenzie College (de orige m norte-am erica-
na) , também em São Paulo, em 1896. Foi a ver-
tente jurídica que maior espaço conqui st(m n o 
cxcrcicio do poder ao longo rlo sécu lo 19- domí-
nio ora crn rlisputa com engenheiros e médicos, 
no a lvorece r do novo século. 
Os enge nheiros buscava m re percussão 
em suas recomendações nascidas ele pautas am-
biciosas. De acorrlo com o seu programa, o Con-
gresso de Engen haria e Indústria teve como 
[ ... ] obje to exclusivo discuti r e deliberar sobre as prin-
cipais questões técnicas, industriais, econômicas, finan-
<.:eiras e administrativas que. de mai~ pt-rlo t' rl irt-tamc n-
te, possam interessar ao desenvolvimento material d o 
B•·asil, de modo a formu lar rt-soilt ~· flt's <JHC' tradn~:o.m 
com clilreza o parecer dos mais competentes sobre a so-
lu (<'io prúti ca de r::tdil uma d as yucstõcs vc HLi ladas, c 
que scr:ío submel idas ú ap rec iação dos poderes públi-
cos. I"Prog ra ntlll <l . .. " 190 l , pp. 7-1!>] . 
O temário do congresso Locou numa série 
ele questões que inventariavam um repertório de 
ta re fas nacionais nesse momento: sistema fe rro-
viário, portos e navegação interio r, h idráulica 
agrícola, sa neamento das cidades, urbanização. 
A bem da verdad e, em IH.:nhunl momento se em-
pregou, nos debates ern 1900, o lermo "urhaui-
zação" ou qualquer derivado de "urbe" como ci-
dade. Mas o contexto geral dos debates indicava 
esse rn mo. 
DO SJ\NF.J\MF.NTO AO URBANISMO 
O Brasil aJentrava o século 20 com uma 
população da orde m de 17 mi lh ões de h abitan-
tes, com ce rca d e 36% elos brasileiros vive nd o 
nas cidades. A economia do país era impu lsiona-
da <I base da exportação de produtos prirn{tr ios. 
Entre 1871 e 1 Y28, o café - um artigo de consu-
mo das mesas abastadas na Europa e nos Estados 
Unidos- participava com mais d a metade da 
receita brasileira de exportação, sccundaclo por 
um período de te mpomaiscu rro ( 1891 a 1913) 
pela borracha [Singer 1985] . O paí!j possuía uma 
rarefeita economia urbana, pulverizada em cen-
tros urbanos nas frentes agrícolas ou cidades 
portuárias a serviço da exportação ons p rodutos: 
Campinas, São Paulo, San tos, Campos e Rio d e 
J an eiro para o café; Recife para a zona açucare i-
ra; Salvador para o cacau; Porto Alegre para cou-
ro c peles; Be lém e Man aus p ara a borrach a. E, 
embora incipiente como rede urbana, algumas 
capitais conheceram um extraordinário cresci-
mento demográfico: o Rio de J aneiro em 1900 
era habitado p o r 746.749 h abitantes- sua p op u-
lação aumentou 271% em relação à de 1872; São 
Paulo , nesse mesmo período , Leve um a umen to 
populacional da ordem ele 870%, com 2~19 .820 
habitantes na virada do século; Bdém yuase du-
plicou sua população de 53 150 habiran tes em 
1872 para 96. :)60 em 1900 [Graham 1973, p . 
40J . Os núm e ros apenas indiciavam os g raves 
conflitos de espaço que se afiguravam com o 
crescimento clesorden;~do cbs cid;~rles . 
A cidade afirmava-se como o palco do 
moderno - modernização Lendo como referên-
cia a organização, as atividades e o modo de vi-
ver do mundo europeu. Os engenheiros coloca-
vam-se como agentes dessa modernização - era 
a corporação que apostava na ciência c na récni-
ca como os instrumentos de progresso material 
para o país, nos moldes do desenvolvimen to in-
dustrial do Velho Mundo, vislumbrando, na in-
d ustrialização, um objetivo nacional a se atingir. 
O Congresso de Engenharia e T nclústria demons-
trava a ampli tude das tarefas da profissão c 
apont;~va nm1os para a montagem ela nova cena: 
t·acionalização nas intervenções de ocupação 
territorial, vetores de urbanização num país de 
vastas regiões inexploradas. O desejo de mudan-
ça era late nte : a elite nrh<~n<~, progressista , posi-
tivista, cosmopolita, contrapunha-se à sociedade 
tradicional, de índole agrária e conservadora. 
CIDADES COMO 
CENÁRIOS DE MODERNIDADE 
Algumas cidades brasileiras, j{t na segunda 
metade do século l 9, assimilavam intervenções 
modernizadoras ern suas infra-estruturas, à ma-
neira das metrópoles e u ropfias - resson<lnci<l da 
questão (central na cidade européia oitocentis-
ta) do sauitarismo ou salubrismo. Cidades como 
Rio de .Janeiro (a partir de 1862) , Recife, Santos, 
São Paulo, Manaus c Salvador contaram com em-
presas que instalaram e operaram sistemas de 
drenagem, abastecimento de água e esgoto-urba-
nos . Também nesse f'inal do século opentvam 
nessas cidad es, e ainda em Fortaleza, Belém e 
Porto Alegre, companhias de gás; serviços de ele-
tric idade e transporte urbano também funciona-
O Brasil em Urbanização • I 9 
ram em algumas dessas cidades - em sua maioria, 
empreendinrentos com o envolvimento de capi-
tais e empresas inglesas (também responsáveis, 
desde o século 19, pela implantação do sistema 
ferroviário no país) [Graham 1973, pp . l 21 -124J . 
A implan tação dessa inf ra-estrutura técni-
ca nas cidades consolid adas configurou m edidas 
<JliC não ncccssariarne n te prcconit.ararn a reor-
denação d o tecido u rbano -sobretudo a reorga-
n ização dos espaços físicos he rdados d a cidade 
colonial, no caso brasileiro. Ao con trário , a im-
plan 1 aç<-to desses mclhoranwntos rei l<~ntv<l a es-
t r utura ex istente, com po ucas modificações. O 
sentido ele intervenção urbana como produto de 
uma elaboração icleolúgica n ão sú derivava dos 
processos de saneamento urbano desenvo lvidos 
no século 10, mas adquiria nova condição - co-
mo visão raciona lizadora c integrada de intcr fc-
rência na cidade, numa lógica de modern ização 
das estruturas urbanas -com a cod ificação de 
uma disciplina específica: o urbanismo. 
Simbolícameme, pode-se e leger quatro 
even tos como representativos de: for mas de m o-
dernização urbana no Brasil na passagem do sé-
enio 19 para o 20. 
A N E CAÇAO DAS 
ESTRUTURAS URBANAS COLONIAIS 
O primeiro even t.o {; a tr ansfcr(: ncia, crn 
1H9G, da capital do Estado de Minas Gerais da co-
lonial Ouro Prelo para uma cidade nova, inlcira-
menle p lanejada e construída para ab r igar as 
funções adm inistrativas ck sede governamenlai -
lklo Horizonte - , proj eto de nma comissão che-
fiada pelo engenheiro Aarão Reis (1853-1936), 
formado na l'ol it{;cnica do Rio de Janeiro . 
O segundo é a "haussm a nisatio n " (n um 
ncologismo criado por P ierrc Lavedan) do Rio 
de Janeiro, grande in tervenção promovida pelo 
prefeito Francisco Pereira Passos (1836-1913), a 
partir de 1904, com a criação ele novos eixos vi-
ários, a unifor mização das fachadas dessas aveni-
das e a imp lantação de parques públi cos m edian-
·J~ 'sodun~:) ~p 01 
-ll:'lllll'.;)lll!S O l!Jted ~;()()( ;>p <>P!o.od 011 Ej)l'.lli;)SJ.odl! S<)_l\'.(lldOd S.H_>.~l!l!C(~'I( E.l"d 1.nsodo.od :<>ii.IH Jj) Oll!ll.lllll!S O.l":llll'..l~ .(; 
f:f:j K > 
-. ----~---~ ·- ------fH}\: l \'T•ol;)S'~-t -----
';00':'/ HN:i() SUH1rl l'n ~)IUJS 
S\t811'iONO'J3 J SJ\J8nl\fS-S3t:!VlndOd S3_9ÓV.ll8'v'H 
/.1~;/J.I[j OU W.IIIP/.111/J./JI • ()( 
te a rC'modelac::ão do tecido urbano colo nial da 
cidad<:. Foi uma iniciativa de saneamento fís ico 
e social e ele "e mbelezamento" (termo corren te 
na época) da cidade- capital e principal e n tra-
da in ternacional ao país. Conciliar a <:nad icação 
d as epidemias que varreram a cidade ao long-o 
d o século 19, afastar a populaÇão pobre de seto-
res estratégicos para a <:xp<msão urbana e co n fe-
rir <1 paisagetn uma <..:slélica arquitetônica d e pa-
drão europeu carac te rizaram iniciativas para a 
n todclagcm de ttm llrasil condizente com o fig-u-
rino de nma nação "c ivilizada". 
PRIMÓRDIOS 
DO PLAN~JAMENTO URBA~O 
O terc<'iro evento reprcscutativo n ão é es-
pccificattt c tt t<..: uma, mas \'á rias intcrv<:nçõcs, 
concebidas com ideários comun s: aquelas desen-
volvidas pelo engenheiro Francisco Saturnino Ro-
drigues ck Brito (1864-1929), formado na Esco-
la Politécn ica do Rio de .Jan eiro . Satu rn ino de 
Brito é considerado o fundador ela engenharia sa-
nitária brasileira pelo conjunto dos projetos ( cer-
ca de dttas clcL.enas em \'ários quadrantes do país) 
c pela contribuição tecnológica ad,·incla dessas 
propostas. Brito tah-ez se tornasse apenas mais 
unt itnpul"l<lltlt' tfcnico na árPa san it át~ia no Bra-
sil nas primeir;ts d{·cadas do século 20 não rosse 
certa sensibilidade ( re forçada pela cren ça positi-
vista) q ue o tornou um san itarista n::io só \'olt<tdo 
para as equaçôes ck r<:gimes hidráulicos ou para 
as últimas novidades em sistemas de abastecimen-
to c cscoan1ento, 1nas também preocupado com 
o ambie nte da cidack com o um Lodo, p redorni-
nantcmc ttt<..: f'ís ico, mas com interfaces sociai s. 
ü plano de san <:<un<:nto da cidade de Cam-
pos, no Estado do Rio de Jan eiro, ele 1903, é uma 
re ferência para a engenharia sanitária: um exten-
so diagnóstico abordan do d e forma in te-grada as 
questões tecno-sanitárias- abastecimen to de água, 
esgotos, águas p luviais - com a ocupação do solo 
- sistemas construtivos, habitaçõespop ulares, es-
paços P cdil'ícios públicos, ori<:ntação e insolação, 
O Rmsif em 1/r/;unizoçiio • 2 7 
circulação etc. A segu nda referência fundamenta l 
e laborada por Saturnino de Brito foi o plano de 
saneamento c <:xpansão de Santos, no Estado de 
São Paulo, desenvolvido entre 1905 e 1910 para o 
principal porto de exportação de caf{:. Nesse pro-
.ieto, às a titudes inovadoras <tdotadas no plan o de 
Campos acresc<:utuu-s<: " dimensão cslética na re-
sol ttçào dos problemas u rbanos: Satttntino de 
Brito reconh ecia em seus escritos a importância 
de um aporte urbanístico a p<trtir das id{·ias de 
Camillo Sitte (1843-1903) . Ao longo elos <U tos de 
l ~:llO, o engenheiro foi um atento monitor das 
discussões em curso na Europa sobre o Town 
Pla nning o u Urbanisme, disc iplina em institucio-
nali;.ação na {;poca por m<:Ío de coug-r<:ssos iut~:::1~ 
nacionais, os quais freqiicnta\'a como ouvinte ott 
;~prcsentando comunicações. Sem nunca se auto-
qualificar Townplanner o u Urbaniste, Saturnino 
de Brilo ioi uw ideúlogo d a engenharia san itária 
que, a seu tempo, de forma pioneira introduziu 
e m seus planos o leque de d iretrizes metodológi-
cas d o repertório téc nico da então nascen te dis-
ciplina urbanística. Essas idéias, todavia, não fo-
ra m in rorporad<ts sem u ma filt ragem crítica: sua 
atuação sempre Considerntt ttma a\'a li aç·ão dos 
pro('editucutos c das L(~cn icas codificados pela ex-
periência européia e, nas proposições c cspcciti-
caçõcs de seus projetos, percebe-se que há uma 
e laborac::ão de uma solução apropriada tendo em 
vista as condições e specíficas do meio em que 
atnm·a: as li mitações, as potencialidades e as pos-
sibilidades locais configuravam projetos tecnoló-
gicos específicos como respostas a realidades 
concre tas, brasileiras [S<:gawa 1987a, !JP· 66-70] . 
JARDINS-UTOPIAS URBANAS 
A potencialidade da expansão nrbana das 
cidades brasikiras j á chamava a atendío dos in-
gleses na segu nda metade do <;é·culo 19, como jc'i 
visto, mas foi na década d<: 191 O qu<: o capil al cs-
Lrangeiro inverteu recursos numa ousada inicia-
tiva d<: im plantação ele bairros novos. A cidade 
de São Paulo, e m pleno crescimento econômico 
t-
2 2 • ArquítN11ms 110 l5rusíf 
L IIAIRRO Ol::lõl.ITE 
l'ropricdadc tle 1 
Manoel Garcia da Silva 
!-lll·:,~ ID · D'lf!J "' [1 r r- ·tni·D~~n~ ~l~~-~~ft I~Q~If\q! 
" ,'" ,, 
/ 
I 
/ 
" 
/ 
E) "".: '::;-'-'_ ( ~ _, ---- .... -· ,- -'-
~- Pwpa~a1ul;o de 1928 do Jardim 
Europa e m São Paulo, bairro que 
itnilava o ntoclc lo do conLíguo Jar-
N• aae•-• alf.Jf.ad• ela. Pra4:a ••• .. aarelaa 
A.PDOTE•TE A. 'I'A.DDE DE HOJE 
Alem de C1tcr 11m paucio 'Srad».Yel r~J1~ ~~:tN~~~:~~;,c:~í "':l,ci:~~~~~~~,:J~I;~.., 11pr~c'iaa · o ç:r~nJ•· oll:t"lnl nh·iwento 
dirn An1érit:a, n--odi/a\·úo ela Cia. A iUttttth~ão Jmbli~ c~~O:,~~d:1 ~~.{}~!1l1':u:~,::.~,;~rl:::.~ .. .s.!Y4 fciw a iHJiti(ur~o 
PALACJET~.; •: Lt...-.:...~ Dlt "I'C.;ft.R~NU 
City, dcmonstraorlo o apelo do pa- '-': • l>f'riola~ÕK-,.. 'Uil\' 1 ~ r 1"''1'"''11:1• chlr.kla• 
lllf~ , Ao. dOtMin~o• "" lon:.l ,. m)" oh.l• ,., .. j. ua 
rlr:io gfl.rdt•JI rifit•.\. LOJA DO JAPAO 
e físico com a riqueza propiciada pela exporta-
(ào do "~fé· , roi contemplada com uma operação 
espccubtiva que trouxe um padr~m urbanístico 
inédito na América do Sul. Em 1912 fói conslituí-
<.la, em Londres, a Tbe City ofSan Paulo lmprove-
me>nt~ élncl Frcchold Company, empresa organi-
t.ada para lotear grandes áreas a1~1Sl<t<hts ao sul e 
a oeste da cidade - então em plena área rural - , 
com a finalidade de criar bairros de allo padrão 
para a crcsce nrt> burguesia cafccira. Para o p ro-
jeto urbanís tico, foram contratados Ra)'lliOlld 
U nwin (1863- 1940) e P.~1rry P:wker (1867-HHl), 
ambos n•!;ponsáveis pela implantação das primei-
ras cidades-jardins inglesas, segundo os prr>ct:itos 
<.k Ebenezer llowarcl ( lS:í0-1928). Parker desen-
volveu dois projetos- o .Jardim Améri e<t e o Ciry 
Lapa - c a remodelação de um jardim público na 
<:tVenida P<'l ulista (Parque Trianon) entre 1017 c 
1919, período em que se estabelt:ceu em São Pau-
lo. Todavia, foi uma operação de long-o prazo: os 
bairros conheceram alguma ocupação a partir 
do fi nal da década de 1920, c a consolidação efe-
tiva somente se proct:ssou bem mais tarde . Pela 
qualidade projt>tual t: a rigorosa legislação t:ntão 
e laborach1 para os loteamen tos, tanto o Jardim 
América quanto o City Lapa resistiram às trausfor-
mações urbanas por mais de setenta anos e con-
servam até ho je as qu<'llidades ambie ntais propos-
- __ ,_ 
Hua S. Bento .. JO ~ (;AHCI.\ IH SUX\ & CIA. 
tas no idcário das cidades-jardins de Howard 
[Scgawa 1987a, pp. 71-77; Bm:c lli 1982J. 
As primeiras duas décadas do século 20 
testemunharam. transformações nas cidadt:s bra-
sileiras numa escala c num ritmo até então sem 
precedentes: alt~ts laxas ele cresci mento popu-
lacional nas principais capitais pressionavam a 
demanda por habitação c serviços urbanos; a 
prosperidade proporcionada pelo café tral'.ia be-
nefícios materia is e novos padrões de consumo 
para alguns segmentos da populayão, mas as es-
lxulut·<t8 urb<tnas, t'm sua rn.ai.or\·,t h erd·'"\das ÜQ 
período colonial, não se coadunavam co m as ex-
pectativas de uma sociedade que se urbanizava 
em passo acelerado, embora sustentada por uma 
economia agroexportaclora de valores arraigada-
mente rurais. As cidades t ransformavam-se nas 
p la taformas rumo ao mundo moderno , isto é, 
em busca de um nível de vida à maneira das 
grandes metrópoles europ éias ou norte-america-
nas. Alguns esforços convergiram para esse ideal. 
O pretexto da ciência, da técnica, da racionali-
zação d os meios e rt:cursos para se alcançar esses 
oqjerivos foram argu mentos instaurados nesse 
in ício d e século. Embora em nenhum momento 
se identif-ique, no conjunto de iniciativas, algu-
ma coerência de estratégia - um planejamento 
sobre uma enorme extensão territorial mergu-
I 
~ 
lhada na p!'"rifcria ela economia mundial-, há 
um vetor comum nas pontuais operações urba-
nas processadas nesse período: a apropriação de 
um repertório ieleologizaelo ele intervenção nas 
estruturas urbanas - o urbanismo como discipli-
na, tal como se coclificava na Europa- , instru-
menw modernizad or por excelência, um a tenta-
tiva de equiparação da cidade brasileira aos 
patamares europeus o u a prnn1ra ele uma tênue 
modernidade à brasileira. 
O ENTREGUERRAS E AS CIDADES 
No final dos anos de 19 1 O, o Brasil conti-
nuava um país de economia funclamentalrnentc 
agrocxport <iclora, modelado na riqueza propor-
cion ada pela vencia do café no me rcado imcrna-
cional. A exlra<,:iio d a borrac ha, atividade que 
movimen tou o norte do país - na regiüo da bacia 
do rio Amazonas-, entre o fina l do século 19 e a 
primeira década do séc ulo 20. fracassou c!iantc da 
concorrência dos seringais ela Malásia c de Cinga-
pur<~_ A dil'nsão elo gosto pelo chocolate eus<.:jou 
o nc:scimento do plantio do cacau na P.:-~h ia, uma 
elas culturas que se expandem a partir de en tão 
numa escala regioual ponde rável. A a tividade 
pecuarista, por seu turno, dc:sen volvia-se nos Es-
Lados suliuos, sobretudo no Rio Granelc do Sul. 
No final elos anos ele 1920, oito produtos primá-
rios respondiam por 90% do valo r tot<tl das expor-
tações: café (co m cerca ele 70%), açú car, cacau , 
algodão, mate, tabaco, borracha, couro e peles 
[Abreu l986J. A estrutura da econ omia brasilc:i-
ra, em 19 19, baseava-se 79% na agricullura e 21 % 
n a indústria. 
Nos anos d e 1920, a política econômica 
persi stia no privilégio da produção do café, com 
poucas alterações e m relação à prática anterior à 
Primeira Guerra. O domínio político-partidário 
da oligarquia cafeeira de: São Paulo assegurava a 
sustentação de sua cotação medianLe tllanobras 
que viabil izavam os preços internacionais do pro-
duto. Na segunda metade dessa d écada, a cafe i-cultura sofreu forte expansão na produção , em 
O Hrasil em Urhtllt izaçàu • 2 3 
alguma rnedida associada à política mo netária c 
à entrada de capitais estrangeiros (em forma de 
inves timen tos e ÜJJanciamento ele obras p úbli-
cas, sobretudo d e origem inglesa) [Abreu 1986 J. 
!\hegemon ia política e as formas ele con-
trole e manipulação do poder dos grupos ligados 
ú agroexportação não estavam isentas do descon-
tentam en to de setores da sociedade , sobretudo 
os segme ntos de classe média urbana não repre-
sentados pela oligarquia agrária. Ao lado de gre-
ves operárias (marcantes a partir de 19 18, com 
o fim da Guerra), as mais si){nificativas manifes-
tações contrárias ao quadro vigen te partiram dos 
quartéis, em movimentos liderados por elemen-
tos da ala jovem da oficialidade militar- os te-
nen tes. A partir de 1922, inúmeros levautes em 
quartl~is- yue ficaram conh ecidos co mo rcvo lt<1s 
"ten e nt·istas" ou , enquanto fe nômeno político , 
"teueutismo" - foram registrados em vári<~s cida-
des rio Brasil , alguns extrapolando os li mites da 
caserna e assum indo contornos revolucio nários, 
como no Rio d e .J aneiro, no Rio Grande do Sul 
c em São Paulo. A oposição fazia con tatos com a 
o ficialidade inquicr.a , em nome d e uma "morali-
zação d o regime", e se prepa rava o c<1min ho p ara 
a Revolução de 1930. 
O colapso elo mercado lltUIH-Iia l provoca-
do pela quebra da Bolsa d e Nova York, em outu-
bro de 1929, não deixou d e repercutir no Brasil, 
so hrewclo cliau tc da fragilidade ela polí tica de 
man u te nção dos preços elo café. O s altos esto-
ques do produto aliados à ve rtiginosa queda ela 
sua cotação internac ional levaram a economia 
cafee ira à bancarrota. Em 1930, revolucionários 
do Rio Grande d o Sul d errubaram o presidente 
Washingw n Lu ís (1870-19S7) sem maior como-
ção. Assumia o pode r Getúl io Vargas (1883-1954) . 
Segundo Singer [1985, p . 235], "o princi-
pal mérito ela Revolução de 1930 foi ter g uinda-
elo ao poder uma aliança heterogên ea ele corren-
tes políticas e m il itares que , para se consolidar, 
não podiam se da r ao luxo de seguir a onocloxia 
liberal no campo econ ô mico, assistin do ele braços 
cruzados à hecatombe de atividades p rodutivas 
que a crise mundial estava acarretando ". Ainda 
segundo esse au tor, "a oligarquia agroexportado-
.. 
i........l 
2 4 • , 1 l"<jll i lei 11 r11s 110 1Jr11sil 
ra, economicamente arruinada, leve que ceder o 
papel de fração hcgcmúnica à coligação indus-
trializame de tecnocratas, militares e empr('s<Írios, 
CJllC vC"io g-anhando poder c acumulando capital 
ao longo de lodo este período". No pcríodo I D:-20-
192~) , a agricult.ura sc clcscnvolveu com taxas mé--
dia~ <tttuais de /1,1 %, enquanto a indústria <T('SC('ll 
2,8%. A inércia ctlU·c os anos I ~J2D e 1933 era o 
sintoma inH'diato da Crandc Lkptcssão. Entre 
1933-10:-39, inverteram-se as posi(Ôes: a agricultu-
ra virtualmente estagnou-se com taxas de 1 ,7%, 
e a indústria desen volveu-se a índ ice~ de 11,2% 
ao auo. Em 1939, a agricultura <li nda respondi<~ 
por 57% da csrrnmra da economia brasileira, 
mas a indústri<t já comparecia com ponderável 
parcela de 4~ 1/fJ [Dinii' 19lnj. 
A ~u pcração ela estrutura de privikgios do 
domínio agrário somente se l"aria ele fornta <· li-
ciente mediante a substitui<;ão dos ins trumentos 
de controle c operarão do porl<'r. O sentid o de 
modC"rn ii'a(;io da chamada ''Era Vargas" ( 1930 
1945) fundamentava-se na 1 ransformac;ão das es-
trulUras de sustentação ela oligarquia cafccira 
numa adm ini stração centra]i;.ada c intcrn,nc io-
nista, de d iscurso naciomd ista. r\s principais me-
didas políticas e !"conômicas tornar-se-iam deci-
sões orientadas por políticas nacion<1 is de Fstado, 
em detrimento das políticas regionalistas de in-
tCl·esses !ocali1ados; crit{Tios 'jnrídicos" e "polí-
ticos" eram suhsl il tiÍdos por t·;tzócs técnicas", 
"econômicas" e '\tdmiuistnttivas", vinculadas a 
rnecanismos de mercado [Fonseca 19H9l . Novas 
leis, códigos e dC"lC" rm ina(Õcs davam amparo ao 
processo de modernização. ;\ reformula(ão do 
aparelho estatal, com a criação de noYos ministé-
rios (da Educação e Saúde, do Trabalho) c órgãos 
públicos operacionalizavam as mudanças, articu-
lando os seto res p úblico c p rivad o. Constituía-se 
um mercado nacional integrado, defin iam-se ru-
mos para o capitalismo industrial do país; ohser-
\'a-se, no p lano econ ômico, ··o deslocamento do 
l·ixo da economia do pólo agroexportador para o 
pólo urbano-industrial c, no plano político, o es-
vaziamento da infht€>ncia e elo poder dos interes-
ses ligados à presen-ação da prepo nderância do 
setor externo no conjun1o ela economia" [Di.niz 
l9R3]. Esse ide:írio seria reafirmado de for ma 
au toritária com a implan tação do Estado :--Jovo, 
golpe cuntinuísla de Vargas e111 1037 (contrarian-
do a CarLa de 1 !);)4, rp w previ<~ c lc içôcs presiden-
cia is para esse ano) com a ou torga de uma cons-
tituição CJll<' perd uro u até a CJ Ueda do d itad or, 
com o fim da Segunci.-t Cuerra. 
ORDENAR AS CIDADES 
No fi nal dos anos de 1920, a população do 
Brasil era ela o rde m de 37 milhôC"s de habitallles, 
com cerca de 70% ,·ivendo na úrca ntral. Em 
l 940, esse total a t i 11g ia pouco mais df:' IJ 1 m ilhtll's, 
com a mesma pro pon;ão ele brasile iros vive ndo 
no campo. Novas frentes de exp ansão agrícola 
pelo territóri o gerayam m ig rações in te r nas in-
tensas, assim como, e m regiões de incremento 
econômico mais di nâ mico (sobretudo São Paulo 
c Rio d e Jan eiro), as tendências apo11tavam p a ra 
o d eslocuncn to ele pop ulações da área rural 
pan1 a ull.>aml - a confirmar a caracterizaçáo das 
cidades como locais de cstn tfllração elo poder e 
o rganização das atiYidades comerciais c fina ncei-
ras, bem com o das inslituiçôcs burocráticas do 
Estado rPata r ra 19861 . 
O Rio dejatwiro co ntinum·a sendo o alvo 
prefe rid o para inter\'cnçôcs "ha ttss tmt n ianas", 
ua seq üência das gTandcs obras empreen d idas 
pelo prefeito Pere ira Passos a part ir ele 190<1. Em 
1919, o ex-assistente ele Pereira Passos, o e nge-
n hei ro Paulo d e Frontin ( 1860-1933), assulllia a 
p refeitura elo Distrito Federal e r~alizaya um a 
série ele obras vi:trias de porte . Dois a nos mais 
ta rde, o prefeito Carlos de Campos (1866-1927) 
detonava o d esmon te do morro do Caste lo , um 
dos pr im e iros sítios ocupados pelos portugueses 
no século 16 para a fun dação da cidade, e criava 
um "vazio" urbano onde seria provisoriamente 
montada a Exposição do Centenário da Indepen-
dê ncia, C lll 1922 r ve r p róximo capí tu lol. Tratava-
se efetivamente de nm "vazio", po rqua n to ne-
nhuma dest inação p révia h avia sido plan ejada 
para a esplanada que surg-ira. O material do ar-
U lJmsil e111 f !rhaniz(lç(Jo • 2 5 
..... :i .... C) .... 
,;; ·l~·,,;~~;;;•,S>~; ~ 
·--.. _ 
•, 
'',, ... 
L-
4. Projcto núo l'~t·( 11tado de arr11~111 e nro para a á rea rc:;ultante do d esalt' r rn rln morr o do Castelo c para án:a a tt' tTada 
rl t>srlc a Glória até a Ponta do Calabuurn. S<').;lllldo proposta de uma comissúu dc cngenlwiros c· arCJuitc tos nomeados pelo 
[li efeito d o Rio de Jancim, Carlos Sampaio, 1920 1922. 
1·as:1mento do morro foi transferido para a co m-
pactação de um aterro que, lllais tarde, abrigaria 
v Aeroporto Sa ntos Dumont. 
A capital elo país contiuua,·a a ditar a voga 
de intervenções urbanísticas. O irnpassc do de-
senvolvimento c a ocupação urbana do Distrito 
Federal ensejariam a contratação, em 1927, do <~r­
quite to Donat Alfred Agache ( I H7!l--1959), profis-
sional que vinha se notabilizando na França, des-
de ;t década ele 1910, em assnntm url>anísticos. 
Agache desenvolveu um volumoso relatório com 
d iretrizes urba nísticas básicas publicado em 1930, 
que. com a Revolução, n~t o !'oi imedia tamente 
implementado. Em 1931 era criada uma Comis-
são do Plano da Cidade parao reestudo do Plano 
Agache, permitindo sua aplicação parcial. Em 
1937, com o Estado NoYO, uma no\'a comissão de-
senvolveu um projeto que acolheu in úmeros sub-
sídios do plauo de l 930 e foi o que orientou o 
desenvolvime nto do Rio de .Janeiro até por volta 
dos anos 1960 [Rezende 1982; Bruand 1981J. 
Alfred Agache dese nvolveu no Brasil , nes-
se período, vários projetos c consultorias: ern 
] 935 fc:z o desenho do Parqu e Farroupilha I ve r 
capítulo "Modemidade Pragrnútica 1922-194:-r'l, 
faria consultoria pa ra o cntüo prefeito de Belo 
TI ori7on te, J uscdiuu Kubitschek de O livei ra 
(1902-1976) no f"inal rlos anos El30 [ver capítulo 
"Modernidade Corrente 1929-1945"], um p lano 
diretor para a cidade de Curitiba (1913) e o de-
senho de um bairro de cli rc e m São Paulo, em 
Interlagos (anos de 1940) . Participou de inúme-
ros outros planos, com o os de Vitó ria, Campos, 
Cabo Frio, Araruama, Petrópolis, São João da 
Barra e Atafona l Silva 1996]. 
A cidade de São P<nlio, também ao tin a! 
dos auus ele 1920, apresentaria um plano corn 
preocupação basicamen te viária mas não isenta 
de e lementos referenciados nas questões urbanís-
ticas mais amplas. O engenheiro-arquite to Fran-
cisco Prestes Maia ( 1896-1 965) fo i o autor de um 
<tmbicioso "Plano de Aven idas" publicado num 
relatório em 1930 - tão suntu oso qu anto o de 
Agache. A Re,·oluçào de 30 também. interferiria 
na adoção do plano; todavia, em 1 9~7, com o 
Estado Novo, Prestes Maia era conduzido à pre-
26 • Arquiteturas no nmsil 
I< 
,».. :;t' ..f ... ·~-~ 
'·. -~·t·:~:'' .. ·-' 
f". 
~é "' 
~}; 
'I. 
t:o ,, 
-~:)..:. 
..; 
"'~,~l ... t 
?.":"" 
···""'"" 
t : •• ;t ,;~ ... , 
""' .. ,:~.:E.-';1 ·i~ .. :: 
·~ ... ; . -~ 
';' 
I 
-~ - .;: 
~ 
- .,J_, 
: - ... '! r~~ ..,. --~ ''"····.'.\< ' --·1-~ 
!.$; , ~l 
:;.l; 
~\ 
\~ 
z~ 
•"-" ... '-~:, 
!! &) "' ...... 
~\l' •' ,. ~ . . ' :t; ·~ !; 
.'\ . Proposta elo l'l a no de i\venicbs, de 19:10, cl.- l'restt's Maia , para p raça c i rcul:tr na imerccssào das ;~ v.-nidas do EsLado e 
da Jnclcpcnch~ncia: monurncntal id adc vi;i t ia num entorno campeslr<>. 
fc imra de São Puulo c em sua primt>ira g-csl<'io at<:: 
194!i, e posleriorrnenre entre 1961 c 196Pí (q uan-
do foi c lei Lo prefeito da r iclade) , ele im plan I o u 
pa rci almente se u projeto, incompleLO em sua 
execução pe la falla de recursos. As diretrizes bá-
sicas do plauo foram seguidas até 1969 pelo seu 
sucessot· [Toledo 1996] . 
Os planos para o Rio d e jane iro e São Pau-
lo ensejaram uma seqüência de p ropostas para 
várias cidades brasileiras, em maior ou menor me-
d ida inspirados nessas experiências. No início elos 
anos dt" 1930, Nesto r Fig-tteiredo c Fern ando Al-
meida clesenvolveram pl:mos de remode laçiio e 
extensão para diversas capitais do Nordeste: For-
taleza , João Pessoa, Recife e para a cidade ele 
Cabede lo. Recife ainda seria estudado e m 1934 
por AtLilio Correia Lima ( 190 l-1943) e em 1942 
por Ulhôa Ci n lra (1BH7-1944). O mesmo Correia 
Lima elahorflria uma tese no Instituto de Urbanis-
mo da Universidade ele Paris sobre um plano d e 
remodda<:ão e extensão de Nite rói em 1932 e, no 
auo seguinte, faria o desenho ela nova capital do 
Fsl<tdo de Goiás, (;oiânia fver tarnb(:m capítulo 
"Modernidade Prag máti ca 192:2-1943"]; em 1941, 
elabora I';.Jmbém o plano para a cidade de Volta 
Redonda I Lopes 19941. Na primeira me tade dos 
anos de 1930, os engenh eiros U batuba de Faria e 
Edvaldo Pereira Paiva p reparariam um plano pant 
Porto Al egre sob a inspiração elo plano Agach e 
para o Rio de J an e iro. Com a nomeação do pre-
fe ito J osé Loureiro da Silva (l9m~-1964) com o 
Estado Novo, o arquiteto elo Rio de Janeiro Arnal-
do Gladoscl! era contratad o para o descnvoh·i-
men to d e um IJ lano di reror para a cidade; nos 
anos de 1940, Edvaldv Paiv<1 iria desenvolver es tu-
dos nrbanísticos par·a a capital com o título "Ex-
pedien te Urbano". Salvador também teve organ i-
zada, entre 19~4 e 1 9~7, a Comissão do Plano da 
Cidade, desativada pelo li.~tac\o Novo. Somente 
em 1942 seria o rganizado o Escri tório elo Plano 
de Urbanismo ela Cidade ele Salvador (EPUC:S) , d i-
rigido p e lo e ngenheiro Mário Leal Ferreira. 
O sub stra to conceitual d esses inúmeros 
esforços e ra refe renciado em teorias e expcri-
ências urbanísticas européias c norte-america-
na::;; enqu::1n to propostas concretas, boa parte se 
limit ava a esquemas de circulação com novos 
sistemas viários sobrepostos aos tecidos urbanos 
antigos, quando não se tratava ele áreas eu1 ex-
pansão o u cidades novas. A 111aiori::J dt>sscs pro-
jetos foram rejeitados pelas câmaras muni('ipais 
ou adot::Jclos c.m condições excepcionais, isto é, 
com prefeitos nomeados pelo Estado Novo, que 
uão se suhorrl.inavam ao respaldo do poder legis-
lativo para suas in tervcn ções urbanas. Mesmo 
nessas sitml<:Ôcs ele exceção, esses prefeitos não 
conseguiram implementar os planos na sua tota-
lidadf' , pela amp litude e complexidade das pro-
postas a ex igir recursos que demandariam o in-
vestimento de inúmeras gcraçôes de cidadãos. 
O plauejanu.:nLo das c idades, a funciona-
lizaçào dos espaços, a organiwr,·ão de uma hierar-
quia viária eficiente e a definição de políticas de 
construção mediante códigos t>clificatórios vinnl-
lados a padrócs urbanos foram aspectos que, a 
parti r de 1930, caracterizaram uma faceta da mo-
derniza~· ;lo dos grandes centros urbanos do país. 
Quando concretizados, <.:onstituíram verdackiras 
O /Jmsil e111 Urban izaçâo • 2 7 
cirurgias urbanas que tentaram \'arrer as referên-
cias da cidade colonial ou imperial, substituindo-
se a paisagem "at1·asada " do casario antigo por 
largas e arc::jadas ;wrn idas ou bulevares e constru-
ções vistosas ele <1rquitc tura modern il'.<mtc ou rno-
rlerna. Todavia, entre a utopia transformaclo•·a e a 
realidade conscr\'adora, estabeleceu-se um impas-
se que acabou gerando nf'nhnma imagem integral 
de modernidade. ;'\!em se pode afirmar, categori-
camente, que os significados dessa modernização 
estivessem conscientemente assimilados pelos ci-
dadãos ou govcrnan tes. Ademais, cst rat{:gias des-
sa narnrcza c·ontcmplando ol-~jctos tão complexos 
como as cidades dificilme nte são exeqüíveis em 
prazos condicionados às veleidades ele autoricl:Kks 
ou autoritarismos. No e ntanto, o conjunto de ten-
tativ;ls d(' plant:jameiJto u•lxnw no Brasil que se 
registrou no período rl.o enrregucrras inclicia, com 
rnaior ou tne uor sucesso, que o Brasil procurava 
ingresso ent re <'~S naçócs dcscm·olvidas buscando 
e ncontrar formas racionalizaci::Js ele uso c manipu-
lação elo espaço das cidades, segundo regras de 
uma das disciplinas instauracl o ras da modernida-
de do século 20: o urbanismo. 
2 
DO ANTICOLONIAL AO NEOCOLONIAL: 
A BUSCA DE ALGUMA MODERNIDADE 
1880-1926 
O estilo modr.mo aceita lodos os estilos, cai l''ln todos OJ PXrP.uos, t' '//(LO formando idéia 
das IU'rt>ssida dr.s tâo várias da gera rlio f.m•scnte, finde-se na jiP.stpú.w rir• 11ovas f ormas 
n r.rim; de nova exjJTfSSÚo a ado/(l,r; o seu caráter rssr•náal é a ri'úvida I' a incerteza. 
ANDRÉ {_;( ISTAVO PAU L O DE FRO:-.lTIN, 
proposições sobre "es tilos em a rCJUilct tu·a", tese apresentada em concurso 
C'm Engenharia Civil para a Escola Poli técnica do Rio d e Jancil·o, 1880. 
Ufanismo é uma palavra derivada do ver-
bo uümar. Esc larece o di cio nário que o Lermo 
de no ta a "atitude, posição ou sentime nto dos 
que, influen ciados pelo potencial das riquezas 
brasileiras, pelas belezas naturais do país etc., 
dele se vangl oriam, desmedidamente" [Ferreira 
1975, p. 1.436]. Trata-se de uma a lusão ao livro 
de Affon so Celso (1860-1938) , Por quf' me Ufano 
do uu•n Pais, e di Lado em 1900, precisarnen Le no 
calor das celebrações elo quarto centenário elo 
descobrimento do Brasil. 
No fin al do século 19, o Brasil não se ufa-
nava de sua arquitetu ra . F.d enegria se us antece-
dentes: "Herdamos dos a ntigos portugu eses a 
parte má d o gosto arquitetônico; e, por muito 
tempo, nos conservamos estacio nários. Recente-
mente as construções vão se ndo mais elegantes e 
adequadas às condições de nosso clima, porém 
ainda com excesso inútil ele materiais". Era essa a 
opinião do engenheiro C. R. Cabaglia [1869, p. 
103J em 1866. 
O ensino d e arqui tetura no Brasil é an te-
r io r ao estabe lecimento dos cursos jurídicos, mas 
nem por isso os arquite tos angariaram prestígio 
equivalente ao dos bacharéis. Data de 1816 a vin-
da de urn grupo de artistas fi·anceses para a cor-
Le do Rio de Jane iro, ainda sob a regência d o en-
tão p ríncipe D . .Joào (1767-1826 -futuro D.João 
Vl , rei d e Portugal), para introduzir no país um 
con hecimenLO artístico d e gosto neo clássico. 
..... _ 
.3 O • Arquil!!lllrCIS 110 Brasil 
Mas i· somL·ntc em 1827 que com~ça a runcionar 
regularmente a Academia ele Relas-Ancs, incluin-
do em seu currículo a arquitemra, curso o rg;.u ti..:<t-
clo por Augustc Hcnri Victor (~randjean ele Mon-
Ligny ( 177b-1 R 50), arcp ti Lelo francf>s d e algum 
prestígio em seu país de origem, autor de nm á l-
bum de levantamentos arquilctúuicos, Arr!tileclure 
i nscanc, ou jwlai.1, uwi.wns, e/ autrfis édijlas rll' la 
'f 'osumc, J.>tthli cado elHr(' 180ti e l Hli). 
CARÊNCIA DE ARQUITETURA 
As ;w;-t liações sobre o cnsiuo da arqui rctu-
r<t no úl t imo quartel do século 19 u ão eram nada 
prom issoras. Luiz Schrciner ( 1838-1892), enge-
nhe iro c arqnitc:to fo rmado na Real Academia 
de Rf'hs-Artes de Berlim e ativo no Rio de Janei-
ro, foi unt crítico radical da situação no país. Em 
Hl83 man ifes tava-se: 
Se nã o pod emos nc:gar, que a nossa Escol;~ Politécni-
c;t jií tctn formado engenheiros q ue p odt"tll r i,·;tli7ar 
co n1 os tlll'ilwres d o Vc llto iVIundo , i: tamb.:m indiscutí-
vt'l que a a1 qnitetura ainda(; pouco rulti v:~rla c-ntrf" n<'>s, 
:l.Ch:lnclo-sc: a art ... d e co nstrui r ainda hoje mcri<l:l na ca-
misa de força c hamada "rotina", c melo isso pe lo t:tto de 
sr c nt f' nd !" r que utn arquiteto pod e form::H-st> n:~ Aca 
d ... ,nia das B<·hts Ar l('s I ... 1 A inda hoje os a lunDs copiam 
os mesmos d esenhos do fundador da aub ele a rquit!" ttt-
ra (está entendido qu <> ralo d a parte cons truti\'a , c não 
csrhica destas rópi:ts) n qual, no fínt do s(<.:ulo passado c 
no prin cípio do nosso . d isting u iu-se po r ter p u blica d o 
uma obra sobre arqu itetura toscana L ... j . 
6. Casa d~.: Detenção elo Reci fe, projt· tada e construída pelo engen hei ro .José Mameclt· Alves Ferrei ra ( lf\20- 1862) a pa r-
ti l· de 18!'>0. ü e ngen hcit·o Perei ra Sim<ics c o a rquiteto Ilcrc ul a n o Ra11t os comen taram em 1882 : "a nossa Casa de Detcn-
çiio , estudada em face da teoria da arquitc1 11 ra , é- um dos p oucos edifícios onde existe h armonia mais o u men<" pe rfei ta 
e ntre.: a fo r ma adotada"' a necessidade que ocasionou a construção. H ii ali. tH:sse ponto rk vista c em relação ao conjunto 
de elementos, o caráter acertado das obras raciona lm ente fe it as. [ . .. j Cad a ç lc me nto t<.:tn ass im nma signifi cação peran te.: 
a arte; cada lin ha pode despertar um 'cntime uto rapaz de concor re r p ara o fim a qnc se destina a dispo~içiio ger a l" 
[Scgawa l \J87al . 
i\ arquitetura entre nós não de u um pas'o ;1\antc 
desde o princípio deste sécu lo, c·rnhnra l'sta t-poca mar-
casse uma revnln(";)o coloss;~l I Se h reine 1884, p. 7·1. 
A situação cios arquitetos uo Brasil à épo-
ca sofr ia também de constrangimen tos suscitados 
pelo próprio poder público. Um aviso d o tninis-
tro do lmpf-rio, An tonio Ferreira Viauw.t (1834-
1005), solicitava em 1 HH9 a contrara<;ão d e u m 
arquiteto na Europa. Na j ttstificativa rla solicila-
çào, argumentava-se cptc 
A ,.. J,..vação cln nosso n ÍH'I int<"kctual torna çada dia 
menos su ponáH·I a !'alta de gr·a(a t> t>st ilo em nossas 
construções. ainda as destinadas a , ,.,·viços pÍihlicos d:~ 
lllaior imponãnci:1. como se a beleza não fosse cond i 
ç;io essencial ou d ela sç pudesse presc indi r a troco d;1 
so lidez, ne m sempre conseguida. r ... 1 F. f' l't>Ciso que à 
primitiva ane d e constru ir se jnmc·m a concep<;<io e a 
diglliclacte da arquite tura. cujos exen1 pla rcs são t:'io ril-
ros en t re nós, t' , o que é m<'li s inquietante . em gera l vi-
t'l'<l lii do pe ríodo colo nial !Vianna IH!JU, pp. 12 1- 122j. 
O ESTADO DA 
ARQUITETURA MODFRNA 
Esse tipo de ceticismo era também com-
partilhado pelo engenheiro civil Bern<Jrdo Ribei-
ro rle Freitas (formado na Escola Puliti::c nica em 
1881) , par<J qncm, em 1888, o ensino arquitetô-
n ico no Brasil e ra "quase desconhecido". É Rihei-
ro d e Freitas que publica, nesse ano, nma aval ia-
ção do quadro ela arquitcwra naquel e final de 
sécu lo. Num anigo intitulado "A Arquitetura Mo-
d e rna", o engenheiro tecia considerações sobre 
as grandes Lransrurmações tecnológicas e sociais 
processad as ao longo do século que t'erminava, 
assinalando a perplexidade de sua é poca: 
O sécu lo 19. instigado pt'la~ g randes conquist:Js rias 
ciências e das indústri as, fone pelo fl: rro que tornou-se 
a sua matéria-prima por excelf>ucia, revoltou-se con tra o 
P"ssado c de ous;Idi<~ em ousadia apresentou for mas in -
1c-iramentc novas que acharam sua raôo ck st>r nas leis 
ela estatística , mas que se afastaram da estética até ago-
ra conhecida. Esta mos em pleno domínio da rt>voluçào. 
Como se mptT acon tece nas rt>voltas, os acaclf>lll icos, 
os que g ua rdavam corno sagrad os os princípios da ar-
no Antirolo11ial oo Nroroloniol • 3 l 
quitt>tttra [ ... ] protestam contra as exigf·ucias cl<t indús-
tria e cteclararam n:bcldes e fora ro>npletamente ela (O-
Ill tlllhào da arte as novas manifesta<,:ôcs elas H<·cessiu<Ides 
h umanas c: elas idéias elo nosso s(•cttlo. 
Oaí dois cam pos lwm d istintos na arte das constru-
~·<->('S: os rc·vo i LOso~. w, progressistas, ele 11111 lado: do o u-
tro, os fié is. os respeitadores da a n c a nrig;.t. 
Não ohsratllc a coustatação do dualismo, 
Ribeiro de Ft-eitas supunha concmnirantcmente 
uma unicidade da arquitetura de seu tempo: "nos 
diversos povos o caráter arC] nirctflnico é um ; é a 
expressão da civili:t.ação da era presente. F, certo 
que ainda h á poYos separarlos da comunh ão ge-
ra.l; mas nos países \'errladeiramentc civilizados, 
conforme as n ossas idéias há uma só civilização, 
costumes e idéias con cordes, e daí um<l arq uite-
tura , a arqui telll ra moderna". 
Tomando ClllJXestad as as análises de César 
Daly ( 181 1-1 R91), Ribeiro de Freitas via a arq ui-
tetura dividindo-se em três correntes: o "grupo 
histórico" ("fiel da csli:tica ma is conhecida, acei-
ta somente as arqui teLUr<Js Cllle caracterizam as 
duas civilizaçôcs mais notáveis: a greco-romana c 
a da Idade Média"), o "grupo er.l {: tico" ("reserva-
se o dire ito ele escolher em todos os estilos, em 
r orlas as manifestações da construção o que mais 
perfeito julgar para o fim que se t iYer em vista") 
c o "grupo racionalista" ("é uma reação elo pre-
scnre contra o passado [ ... ] lançando mão dos 
novos malcr·iais l---J esse grupo adotou a libercla-
ck da t<>rrna, sem obrigação d e atender às leis da 
estética legadas pdo passado"). 
Nega ndo a existên cia de um "corpo de 
doutrina" aos grupos "eclético" e "racionalista", 
as pa lavras do engen hei ro brasilei ro bem espe-
lham o dilema da modernidade arquitetônica no 
crepúscu lo do sfculo 19: 
() a r LisLa moderno, o an1uitt>to moderno lnta com 
gr<tncle~ d ific uldades, se se fil ia à e~co l a ,·acional ista , 
tendo por único guia a mecâni ca ap licada , tem(~ cair 
e m formas secas, fr ias, esque letos, ó rg::io:; de máquinas 
antes do que elementos arqui tetôu ico~ ; se aceita a es-
cola eclética, sen1 outro cr itéi-io para escolher· as suas 
normas a não ser o se u p róprio _juízo ca i no cetic ismo 
<trtístico,no :.~handono e d esprezo de todos os pr incí-
pios admitidos. 
32 • Arquitetums no nmsil 
lkssf' estado da arquitetura moderna 11 <1SI'\' o i nd i-
vid ualislno ('111 qnestüo da arte; cada um é: seu préJprio 
_juiz c não actmi1e dog111a ~ c· 1weceitos estéticos. Há a per-
feita dt'sor){ani ·tação das verdadeiras escolas. A crítica 
artística desapareceu , pois qnc nào há leis esté- ti cas; mio 
hú cúdigo, logo u<lo h{t,iuiz [Freitas lfltll:l, pp. 1!1!1- 1~11 . 
MODF.RNIDADE E 
IDENTIDADE CULTURAL 
A hesitação pelos caminhos que a arquitc-
Lura deveria trilhar- debate e m curso sobretu-
do na Europa - collhcceu no Brasi l um a outra 
variável: a da nacionalidade. Em meio a uma vida 
culrural r mundana orientada pelos padrôcs 
fr;:Jnct>ses (daí o recorrente uso da cxprcss:'io " hc-
lle êpoLJLI<.:" para esse período na hi storiografia 
brasileira), rssa preocupação se esboçou co m 
maior i11 Lcnsidadc nos meios literários. O ltfanis-
rno de Affonso Cf'lso i n;m?;u rava o palriolismo 
oficial ; escritores com o Euclides da Cunha ( 1866-
1909) e Lima Barreto (1881-1922) teciam abor-
dagens distintas d::~quclas prt'scrilas na literaLUra 
<lo Velho Mundo. Não há regi stros escr itos de 
rlf'ha tes dessa natureza no âmbito da arcptitt>l u-
ra na J.nimcira década do século ~0. Todavia, a 
questão era la lell lc, c, ao menos isoladamente, 
arquitelos manifestavam-se a rf'spPito na esteira 
da discussão mais ampla. 
É o que se ct r preencle ele um memorial 
explicativo df' um projeto ele palá<.:io municipal 
para Belém, cidade que se beneficiava., nesse 
momento, ela riqueta proporcionada pela cxpor-
ra(i'io da borracha. Seu autor, o engcn h f' i t-o ar-
qu iteto Filinto Santoro, era itali ano com estudos 
em Nápo les, tendo chegado ao Rio de .Janeiro 
em 1890. Sahc-sc CjtH' foi um profissional que es-
teve aLivo e m várias cidades b t·asileiras (Rio de 
Jane iro, Vilória, M::~naus, Belém c Salvador), fi-
gura de prestíg-io com obras públicas de impor-
tâ ncia [Derenji 1988] . Ao elaborar sua memória 
técn ica sobre o j amais cxccULaclo palác io, em 
1908, Santoro reg-istrava a situação presente ela 
arquitetura: 
O s~cn l o atual , possante e inov<tdor nas c ii'· ncias, 
n8s teu·as c nas demais arLcs. nfw conseguiu ainda ter 
11111a 110\'a ;n qnitctura. i\ maior parte dos granrlio~os 
t'ciilícios \'O II SI ruído~. lo nge de tc1· uma fi sionomia prú-
pria, como nos sé-culos passados, ou são cópias de anti-
gos m o n umentos ou compo, i(i>Ps bhoriosas de e lc-
llll'ntos llt'lt'rogêneos amalgamados com maior nu 
menor habilidade. Certo é que o espírito ntodl·rno 
toge ;ls velhas form as; c os arcpr irt'tos, nwsn1o os mais 
genia iS, CSforçalll-S(' para dotar a ll OSSa t:]JOCa el e lllll 
non1 estilo arquitetura! CJlH' mdhor respu1uLt ús aspira-
ções hod iernas e ao bom gosLo, acocdando-o com o 
desenvolvimento grandioso prog r rss ivo dt' ioclas as ar-
les apl icadas. Na nossa pcrcgrinaç~o aos vel hos e cultos 
países da Europ<~ ficamos convencidos de que pouco~ 
são aqtlt' lt's que m;unêm na arquitetura os expressivos 
elementos cl;1ssicos c quase achamos os artistas de hoje 
identificados, concordes ua p t'sq ui sa de um novo ideal 
estéLico. mostr::~ndo até em algu mas consLruções, ap\'-
sar das iucvi tá,·c is inccrl e~:as e exagems, uw complexo 
hannôuico dr.: linhas, 11111 conj11n1o till, rif' inf'undú a es· 
perau ~·a d e n;io estar long e o ad\·t'nto da d t'st·jada ar-
quitL:tura do século 20. 
E posicion;.~va-se quanto ao eslilo adequa-
do ao Bras i I: 
N u1 11 país novo, que seuiP a cada h or<J ;1 i11rlui'ucia 
\·ariáve l da~ idéias d<' além-n 1ar, a imposição ele um e~­
tilo único seria i111proccdeute [ ... j 
Todo c qualqu.-r estilo, consoante a sua oportunida-
de. pode e deve ser adap i<Jrio ao nosso clima e ao nosso 
meio, dc~de que sejam iiTepreensiw·l mentc obsen·ada~ 
as modernas p rcscrit;Ões higiênicas. I\' o Vl'lho M uudo 
todas as l'orm<~s a rquitc wrais t>rocnlcram de estilos an-
tc1·iores aos qua i, fo i sc111pre ass imilado um elemento 
e.~tranho, dependente d o progresso e da transCormaçüo 
d as v;í ri<Js civilizações, da aquisição d e um·os conhl'ci-
mentos, d<J inrJ u ê nc ia de novas idéias c sen1ime11los (' 
1ambéno da introdJl(iio de novos materiai s. 
Deixt"-S<', pois, ao cngeuheiro, num país como o 
nosso, <t escolha d o eslilo que melhor corresponda ao 
seu gosto, às suas idéias e aos l'ins a que se destina o 
edifíc io. Esta liberdade de agir, porém, niio o d ispensa 
d e se preocupar in ccssa n tem <' llll> com os ele uieuLOs 
cuja influência t;m to ~e afirma sobre as construções: o 
clima, as tendências do viver coletivo, o progresso d os 
materiais ele que, porventura, disponha [Santoro 1900, 
pp. 111 - t 1\1]. 
Não obstante o oLim ismo e o tom progres-
sista do discurso, o Palácio Municipal de Santoro 
era um pr~jeto de arquitetura convencional. 
ESTETICA DA RACIONALIDADE 
Os mais surpn:<:ndcntcs escritos irnprt>g na-
dos de uma precoce modernidacl<: foralll feitos a 
respei to ela ohra rlo arquiteto Victor Dubugras 
( I R6R- l 933), francf:s co m for mação profissional 
em Rucnos Aires c radicado no Brasil a partir ele 
1890. Dub ugras, t-m st> us primeiros projetOs co-
m o fun c ionário público para o Est::ldo rle s:w 
Paulo, dese nho\! fúruns c escolas ncogúlicos. Na 
virada elo séc ulo. o arquitt:to er<l um projetista 
p<:dcitamente sintonizado com a expcrirncnra-
ção Art Nouvcau, praticando obras residenciais 
com ::l mesma desenvo ltura modernista de Bru-
xelas, nan-elona O ll Paris. 
Em 1905, o arquile to havia org<mizado uma 
exposição de se us projetos e obras e foi saudado 
pela R evista Pul)'lechníra, periódico crlitado p elo 
grêm io cs1udan Lil tla Escola Politécnica d e São 
no A nlimlonial rto Nt>orolonial • 3 3 
Paulo, pe la "coragem do arq\litcto c nt expor lra-
balhos que fogem compkt<mt <:ntc às formas ha-
nais, manifestando uma tendência hem acentua-
da para u rn novo método de construção, ainda 
pouco c.studcld o" (n:feria-se ao concreto armado). 
Poucos 1neses depois, a r<:vísla publicou uma aprt>-
c:ia~:ão do csLUdan te Augusto de Toledo sobrt- a 
obra elo seu professor, Dubugras, m anifestando 
11 rn a inédita postura estético-construtiva: 
Eut toda coustr ução o Sr. Dubu~ras deu inte ira p rl:'-
fer~ucia às form<:~s ele est rutura real. As d i sros i ~·iH'' 
const.rut i\';lS c· a natureza dos m at l:'riais s~to rrancamen-
tc acusadas. lealmen te poslas em evidê ncia : o que pare-
ce parte ~upunad;1 funciona verdadeirame n te como L~ I; 
o g ran ito i:: g-r:-tni to 1nesmo; os rc\'cstimentos dt· <trg;t-
m assa não iluden1; e wda pcp d e madcirajú eslú colll 
~ua co•· própria , tendo apenas uma C;lm<td a protetora 
de ve rniz transparente . 
Aplau dimos convictos esta maneira de construir tão 
honesta c racional. O arquücw te m de cingi r-se ao> re-
cursos de que dispõe, e à~ formas impostas pe la 1-'stahi-
----------- --------
~ ------ ---------
·--------------.--:.-·::---_--
- -'":- · - --:- -
U Oue!.lJ6F\tt;,. 
fi"' c. 4 
7_ Vinor Duhugras: estação fcr .-oviúria e m Ma irinquc, SP, 1905- 1908. 
31 • Arquiteturas 110 Brasil 
lidade c resistênc ia dos mate riais. Lade:>ar dificuldades 
ou siullllar riquezas cn 111 fingim e ntos c a n ifícios t:, a 
nosso vt'r, cai r em uma ane vic iada c mcntiros;l. Nada 
mais ri d ículo d o que, por cxcrnplo. os 11 1<Í rmores d e es-
mquc c os trontõcs impropo~iamcntc t>st;1tchodos no nll·-
po das rachadas. 
O distiu to professor pt>s de maq; t'm todo velho ;u·-
scnal de cornijas, consolos, ba laústres decorat ivos , a o·-
lf llil ravcs etc . l~o caros aos rotineiros , aos que L1zcm 
arquircwra com as fcu·malísticas e inllllúvcis rece itas de 
Vinhola. c c nvt>rednu corajosamo• ot tc pe la a n e llwdcr-
ua c p t>los modernos processos de const r u~ ão I Tolcclo 
1901í, p. 771. 
T rb au os d epois a mesma RPvisla Poly 
lechn icn publicou um elogio à então recém-inau-
guradaestarão ferrov iária na cidade de Mairin-
que, no Estado de São Paulo, proj e to de Dubu-
gras. O edifício é praticamen te uma e sLrn tura 
monol íLica de concreto armado, estrutura com 
trilho~ (fundações, pil ares c vig-as) e metal ex-
pandido, o ·metal déjJLoyé (pared es, lajes, abóba-
das), alérn d e empregar coberturas a tiran tadas 
sobre <'ls pla taform as . Num artigo assinado por 
P. J. (hipoleticamente Hyppoli to Pujol.Júni or, 
li-l!-10-1 952 , engenheiro civi l recém-formado) , 
ressaltava-se o pioneirismo da o bra: 
A bela composição do Sr. Dubugras tem [ ... ] [o] 
grande mé rito [ ... j de co nve ncer d :~ possibilidade d e 
fazer be la uma obra de r imerno armarlo os de~crentes 
da estt'- r ica do novo sisrema de COilsl noção, os que acre-
d itam que o ún ico me io de tornar atraente uma o bra 
t>xecu tada com essl:! tmncrial é esconder a n atural r igi-
d(~z geom(•trica d:~s formas que decorrem da consr ru-
(ào m esma, fazendo-a dcsaparPcer sob suct>ssivas ~.:ama­
das de em boço e r<"' boco ( .. . ] 
A simplicidade do mé todo es1élico a qne rcçorre o 
arq11itP to mo composição da sua linda garr, a f~1c i lid;~de 
c nal.llralidadc ela ordenança el a s sua~ fac hadas, n ã o 
são, ento-etanto, seniiu aparentes ... uào excluem , pelo 
menos para quem não possuir as superiores qua lidades 
de artista elo d istintO m estre, um penoso ll·aballoo de ra-
ciocíuio e uma ponderação muito j usta do noYo m éw-
do de const r uç~o , de que d.-ve decorre r n t-cessaria-
me nte todo o efei to arquitetu ra! , quer d o conjunto, 
CJU<"' r da dccora(i.o ckmcntar da obra. I:: para mostra r 
q ue não é f~1cil chegar a uma composiç;'io tàu rac:ion;~ l , 
tão elegante e a pare n temente' tão esponr:inea e f<ícil, 
para acentuar todo o merecimen to desta be la constru-
ção, basta le m brar o clt>p lo ráve l aspecto das cdilicações 
e m cimento armado que se alastram pelos Estados Uni-
dos c pela Ir;\ lia, pela lugla terra e pela Françil , reconlan-
do parti cu l<~ rmt>nte as casas e m n·1ncnto scmi-annato de 
Alzano d i Sopra c a memorável casa d o cngt>nheinJ 
lle n nc biq ue, em Paris- e m que, o ra s1· descur::t inll·i-
ramento:: du efe ito arqu it t>lônico. tratando ape nas chl 
pa rte CO IISI.nltiva e u tili1ária, ora, como no caso da Villa 
Hcnn t>biq11e, se sacrifica todo o c fei lo decorativo, afo-
g-ando a construção de c imento arm:-tdo e on uma imi t:-t-
ção ridíc ula c comp!icad;~ de ah·cnari;~ de pedra [ ... ]. 
É que é cfetivanwnl c difícil e~cap;n ú insensível IT-
pc li<Jw elas velhas uorm:~s ci... composição, adaptar-se a 
u m mate-ria l intciramenle novo, se-guindo uuicanwntc 
as indicações do bom senso, procurar uma composição 
ge ral <" um;o decoração inspiradas na própria constrll-
r;io, chegando, e nfim , a uma obra o r iginal , intel igente 
c bela [ ... ] E essa é precisamente a dificuldade que su-
pe ra mag-istralmente o iusigne <~rquileto . que nos dá 
com a Estação Mairinque u m brilhan le exemplo a se:>-
gn ir, no camin ho ela reabil itação esl é tica d o cimc11 to 
arm<~rlo, túu cedo t> tão í t ~j usta mt"n LI:! conden:~do u .llllO 
coisa fund;tllwn talmente dt>sgraciosa c fe ia [ .. . ] [P. J. 
1\HJX, pp. 189-190]. 
Na primeira década elo século 20, a Esco-
la Poli técn ica de São Paulo ainda comple tava seu 
prime iro decênio de.: funcionamc.:nto, c a tarefa 
de buscar e organizar o con hccimcnto ciell tífico 
era urna prioridade. Em 1899, criava-se o Gal>i-
uetc d e Resistência d e Materiais, constiLuinclo 
um laboratório d e ponta em tecnologia da cons-
trução. Cottb<.: a Hyppoli to Pujol júnior, quando 
estudante, diri)!;ir a elaboração do Manual de R e-
sistência dos Materiais, publicado e m 1905 pelo 
Grêmio Poli técnico; assim como, d ois a uos de-
po is, j á como professor da Politécni ca, realizar 
urna viagem por laboratórios de ensaios de m a-
teriais na Europa [ Pujul Júnior 1907]. Man uais 
pione iros de concreto armado corno os d e Gé-
rard Lwergne (1901), Cesarc Pesenti ( 190fi) ou 
catálogos da Fxpanded M etal (1905) d e Londres 
ou da /VlPtal déployé de Par is eram publicaçôes 
acessíveis en tre os en genh eiros em Si\o Pa ulo . 
Victor Dubug ras beneficiou-se d e um contexto 
fe bril ele capacitação tecnológica na escola em 
que e ra p rofessor, e não foi grat11iLa a admiração 
de seus al unos <]llando o mestre respondeu ao 
entusiasmo tecnológico corrente corr.t uma apli-
cação judiciosa do novo mater ia l numa obra ar-
quitetonicamente elaborada. 
Não há registros, todavia, ele novas expe-
riências dessa natureza, ou ao menos com reper-
cu ssão equivalente . Dubugras aparentemente 
prosseguiu sua carreira sem repetir o radicalismo 
coustrutivo experim entado n a estação Mai rin-
que, mas continuo u como um arqu ite to aten to 
<lO <~mbicn tc inrcrnacional c local. Recém-ch ega-
d o ao Bntsil, co111 po11co nta is d e vin te a nos d e 
idad e, abraçava a linguage m neogótica; com 
pou co mais de trin ta an os, pra ticava o Arl Nou-
vcau sim u ltaneame n te aos seus colegas e uro-
pc lls; p rúx i111o dos q11arc nt a anos, na p ri111 cira 
década do sécu lo 20, dese nvo lveu experiê ncias 
f!llC o filiariam ao "gr 11po racionalista", detecta-
da por Ribeiro de Freitas, em 188R, a partir ele 
categorias elaboradas por César Daly. Aproxi-
mando-se <lOS rinqt-tcnra anos ck idade, VicLO r 
Dub ugras embarcou numa nova experimcnta~·ão 
rorrnal , inclllindo-se entre os pionei ros q ue, na 
metade da década de I!) I O, adotariam a arquiLe-
tura inspirada na arte t racl irion a I hrasi le ira: o 
n eocolonial. 
O FUTURO NO PASSADO 
O ano de 1914 pode ser considerado 
como a d ata inaugural de um movimento que 
incorporou um componente inédito no debate 
sobn· a modet·nização da arquitetura no Brasil. 
Nesse ano, Ricardo Severo ( 1869- 1940) profe-
ri u n a Sociedade de Cultura Arlís Lica um a con-
ferên cia, "A Arte Trad icional no Brasil", p reco-
nizan do a valorização d a .arte tradicional co mo 
man ifestação de nacionalidad e e corn o elemen-
to de constitui~·áo de uma ar te b ras ile ira . Dis-
corrcnelo sobre ;.~s o rigens portuguesas da cul tu-
ra brasileira, Severo defendia o estudo da arte 
colon ia! como orientação para "perfeita crista-
lização da nac ionalidade". Se\·ero não defendia 
uma postura propriamente conser vadora. For-
mado engenheiro civil e de minas na Academia 
Politécnica do Porto, em 1891 exilou-se no Bra-
sil devido ao seu e nvolvimento com o movime n-
to republicano português, preconizador ela im-
l!n A nlirnlrrnilll 110 Nr>nro/oniol • .') 5 
plan taçiio da democracia ern Portugal- afinal 
be m-suced ida em 191 O. En trc 1 H9H c 190H rcror-
nou ao seu país de origem c editou uma publi-
cação de valorização ela cnlt u ra rr;.~d icional por-
tuguesa, Portugálirt, com trabalhos de etnologia 
e a rqueologi<~ , sua contribu ição para 11111 movi-
men to de afirmação da cul tura l u~a em curso 
em Portugal na virada do século- in iciativa q ue 
se confu nd ia corn as conviq:úes repub licanas. 
Rad ica n do-se de fini t ivamente no Tirasi l em 
1909, associou-se ao maio r escritório de enge-
nharia e arquitetura e m São Paulo, o Escri tório 
T{·cnico Ramos de Azevedo, c iniciou seu prose-
li lismo por uma "arte nacional". O "culto à tra-
rli(;1o " já era mna posi~:ão revelada com sua ati-
vic.htdt: "lusilanista" em Portugal d esde o final elo 
~éculo 19, c sua atuação p rosseguiu 110 Brasil, 
transro r mando a ex<~ltação ela raiz cu ltural c 
é tn ica portugu esa no fundam ento da a rte bra-
sileira. Era uma compatível co rn u11hão da creu-
(a republicana e luso-nacio nal ista co m o e m er-
gente ufa n ismo elo Brasil elo início do s(:culo 
20 . Seu discurso, todavia, era u ma espec ulação 
sobre o prese n te : 
Não procurem ver, meus senhon:!S, nesta vene ração 
1 radicionalista, diluída em nostálg ica poesia do passado, 
1 1rn~ Jnan i f<'sf"a(fio d(· ''saudoslstno" rontc'"tn t i co t' rt't rúgn.L-

Continue navegando