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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS BACHARELANDO EM DIREITO Maria Heloísa de Medeiros Silva EUDAIMONIA ARISTOTÉLICA NA MÚSICA “RECEITA DA FELICIDADE” DE TOQUINHO JOÃO PESSOA 2020 Maria Heloísa de Medeiros Silva EUDAIMONIA ARISTOTÉLICA NA MÚSICA “RECEITA DA FELICIDADE” DE TOQUINHO Monografia desenvolvida no curso da disciplina de Filosofia Geral e Jurídica como requisito parcial para a obtenção de êxito nesta no semestre 2019.4 do Professor Dr. Eduardo Ramalho Rabenhorst. JOÃO PESSOA 2020 INTRODUÇÃO Do surgimento do homem até hoje todos procuram o intuito de suas vidas, qual a razão da nossa existência? Para Aristóteles o que move todos os homens é a busca pela felicidade, esta seria a causa final do homem, o bem supremo. E se existisse uma receita para a felicidade? Para Antonio Pecci Filho, músico paulista, também conhecido como Toquinho existe uma suposta fórmula para se alcançar este bem supremo, mas seria este método compatível com o estudo do discípulo de Platão? O objetivo desta monografia é comparar e analisar se a felicidade aristotélica proposta em 335 antes de Cristo seria similar com a felicidade do século XXI sugerida pelo compositor brasileiro. De forma contínua trataremos ambos os temas, através do estudo da Eudaimonia aristotélica faremos a introdução da canção “Receita da Felicidade” do musicista paulista, por meio de comparações entre o texto filosófico e a cantoria brasílica. EUDAIMONIA ARISTOTÉLICA NA MÚSICA “RECEITA DA FELICIDADE” DE TOQUINHO A composição “Receita da felicidade” lançada em 2003 no álbum “Só tenho tempo pra ser feliz” de Antonio Pecci Filho, também conhecido como Toquinho, tem por objetivo explícito demonstrar a receita para se atingir a felicidade, um tema similar ao abordado por Aristóteles no seu estudo sobre a Eudaimonia, sendo possível identificar em trechos da canção os ensinamentos do filósofo. Pegue uns pedacinhos de afeto e de ilusão; Misture com um pouquinho de amizade; Junte com carinho uma pontinha de paixão E uma pitadinha de saudade. Pegue o dom divino maternal de uma mulher E um sorriso limpo de criança; Junte a ingenuidade de um primeiro amor qualquer Com o eterno brilho da esperança. Peça emprestada a ternura de um casal E a luz da estrada dos que amam pra valer; Tenha sempre muito amor, Que o amor nunca faz mal. Pinte a vida com o arco-íris do prazer; Sonhe, pois sonhar ainda é fundamental E um sonho sempre pode acontecer (TOQUINHO, 2003). Para Aristóteles a teleologia (do grego τέλος, finalidade, e -logía, estudo) é o estudo filosófico dos fins, isto é, do propósito, objetivo ou finalidade. Aristóteles ao tratar da ética procura a causa final de todas coisas, pois nada pode ter fim em si mesmo, desta forma, todas as ações humanas terão como fim o bem supremo. Eudaimonia é um termo grego o qual significa felicidade ou bem-estar, este seria o telos para o qual tudo tende, é a perfeição absoluta, é o único bem. A partir deste entendimento, percebe-se que todos os prazeres da vida são, na verdade, fins relativos à felicidade. Analisando a vida humana o discípulo de Platão conclui que a atividade própria do homem é a atividade racional da alma, pois esta é uma tarefa exclusiva do homem, a qual o difere de todos os outros seres da natureza. A partir desta concepção Aristóteles define que o homem deve agir segundo a razão, a humanidade deve subordinar o sensível ao racional. [...] O bem para o homem vem a ser o exercício ativo das faculdades da alma de conformidade com a excelência, e se há mais de uma excelência, de conformidade com a melhor e mais completa entre elas [...]”. (ARISTÓTELES, 1999, p. 24-25). Aristóteles apresenta em sua obra “Ética a Nicômacos” o corpo como instrumento da alma e difere essa em três partes, duas as quais seriam irracionais, vegetativa e nutritiva e uma parte racional, a qual seria a alma intelectiva. Nesta última reside a essência do homem. A virtude aristotélica é o caminho do meio, é o equilíbrio entre o excesso e a falta, ou seja, a excelência em fazer o bem. A partir da prática da virtude será possível ao homem alcançar o telos. Na doutrina de Aristóteles, o justo meio de fato, está acima dos extremos, representando o ápice entre o excesso e a falta. “(...) a virtude é uma disposição da vontade, consistindo em um justo meio relativo a nós, o qual é determinado pela reta regra e tal como o determinaria o homem prudente” (ARISTÓTELES, 2007, p. 69). Como resultado das múltiplas almas, Aristóteles nomeia as diferentes virtudes, virtudes éticas, as quais correspondem as partes irracionais da alma, e a virtude dianoética, a qual corresponde a alma intelectiva. As virtudes morais ou éticas são adquiridas pelo hábito, portanto, elas não acontecem com a natureza, mas pelo esforço, pela prática, podendo eventualmente ser para o bem ou para o mal, ficando a critério dos atos humanos mostrar quando o homem é virtuoso ou não. É a deliberação racional que justifica e explica as escolhas ou decisões. Nas virtudes morais a potencialidade é resultado da ação, diferentemente das faculdades naturais, nas quais a potencialidade antecede o ato. “[...] nenhuma das várias formas de excelência moral se constitui em nós por natureza, pois nada que existe por natureza pode ser alterado pelo hábito [...].” (ARISTÓTELES,1999, p. 35). As virtudes dianoéticas ou intelectuais são as virtudes da parte mais elevada da alma racional. São partes dessa, o intelecto especulativo (cientifico) e o intelecto prático (opinativo). A diferença entre os dois intelectos é: A razão teórica ou intelecto especulativo procura obter o fim, assim como, a razão prática ou intelecto prático fixa-se aos meios. “Todos os homens têm, por natureza, o desejo de conhecer: uma prova disso é o prazer das sensações, pois, fora até da sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas”. (ARISTÓTELES, 1973, cap. 1). A prudência, phónesis, é uma virtude do intelecto, e tem como objetivo fazer o homem agir sabiamente a partir da verdade. Além disso todo o procedimento para que a virtude seja verdadeira, a princípio o intelecto prático deve analisar os meios necessários para se atingir o desejo verdadeiro. Logo, a virtude ética e a prudência têm as existências associadas, uma à outra. A phónesis é o princípio da decisão, uma vez que, ela não julga, ela decide. Desta forma, a virtude ética está subordinada à prudência e essa subordina-se à razão prática. Aristóteles também trata da amizade como uma forma de virtude moral. Para o filósofo, a amizade é após a sabedoria é o bem mais estimado ao homem Ela é uma virtude ou implica virtude, sendo, além disso, sumamente necessária à vida. Porque sem amigos ninguém escolheria viver, ainda que possuísse todos os outros bens(...) porquanto louvam os que amam os seus amigos e considera-se uma bela coisa ter muitos deles. E pensamos, por outro lado, que as mesmas pessoas são homens bons e amigos. (ARISTÓTELES,1973, p. 1155). Na obra Ética a Nicômacos são diferenciadas três variedades de amizade, amizades fundadas no interesse, amizades fundadas sobre o prazer e as amizades fundadas sobre o bem. Para o autor, a amizade mais estimável é a justificada pela virtude, pois é o laço formado entre dois homens virtuosos. A amizade perfeita é a dos homens que são bons e afins na virtude, pois esses desejam igualmente bem um ao outro enquanto bons, e são bons em si mesmos. Ora, os que desejam bem aos seus amigos por eles mesmos são os mais verdadeiramente amigos, porque fazem em razão da sua própria natureza e não acidentalmente. (ARISTÓTELES, 1973, p.1156).Para Antonio Pecci Filho a amizade também é algo essencial para a felicidade, sendo demonstrado logo ao início da música, no segundo verso, e em seguida na terceira estrofe, como confirmado a seguir: E a luz da estrada dos que amam pra valer; Tenha sempre muito amor, Que o amor nunca faz mal. (TOQUINHO, 2003). O prazer aristotélico é a recompensa natural da vida virtuosa, ele é o suplemento de finalidade para uma atividade perfeita. Naturalmente, quanto mais a atividade tende a sua realização perfeita, mais a atividade é agradável. “O prazer é, de fato, qualquer coisa de completo nele mesmo e suficiente a todo momento, totalmente como ato de percepção ou ato de pensamento.” (ARISTÓTELES, 1973, 1174 a — 1176 a) Em coteja com a composição de Toquinho, no décimo terceiro verso “Pinte a vida com o arco-íris do prazer” constata-se a ideologia aristotélica da felicidade. CONCLUSÃO Diante do exposto, o telos aristotélico pode ser alcançado através do Ethos, Práxis, Hábito, Prudência e Virtude. Para a plena felicidade o homem deverá fazer uso da sua atividade própria, a razão, como instrumento para sujeitar o sensível ao racional, portanto, ele deve distanciar-se das ilusões e paixões, pois essas são obstáculos para a ascensão eudaimoinica. Aristóteles ao tratar da ética procura a causa final de todas coisas, pois nada pode ter fim em si mesmo, desta forma, todas as ações humanas terão como fim o bem supremo. Para o filósofo a Ética está atrelada à felicidade, portanto, quanto mais o homem estiver afastado da ética, mais infeliz será. Para Antonio Pecci Filho, em sua canção composta por 15 versos, os elementos essenciais para a felicidade são: afeto, amizade, amor e prazer. A princípio, seu pensamento é análogo ao de Aristóteles, pois só há amor, em uma amizade virtuosa, sem interesses, esta é uma amizade estimável. Convém lembrar, que o prazer citado pelo cantor, também é um bem prezado pelo filósofo, uma vez que, só é possível ser alcançado em uma vida virtuosa. Em vista dos fatos, mesmo que implícito fica evidente que para perpetuar-se com uma vida virtuosa, com prazeres e amizades, a receita da felicidade citada pelo músico é a mesma que para o filósofo, ambos procuram o equilíbrio entre o excesso e a falta, buscam a prudência, a ética, a práxis, para se alcançar o telos tão desejado por todos os homens, a felicidade plena, o bem supremo, a Eudaimonia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AUBENQUE, Pierre. A Prudência em Aristóteles. Tradução de Marisa Lopes. 2ª ed. São Paulo: Paulus, 2008. ARISTÓTELES. Metafisica. Trad. Vincenzo Cocco. São Paulo: Abril S/A Cultura e Industrial, 1973, Livro I, cap. 1. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Mário da Gama Kury 3ª ed. Brasília, 1999. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Ross. São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 381-382. Os Pensadores IV. NODARI, Paulo Cesar. A ética aristotélica. Síntese Nova Fase. Minas Gerais, v. 24, n. 78, 1997. PAVIANE, Jayme. A função pedagógica da ética em Aristóteles Educação, vol. 35, núm. 1, enero-abril, 2012, pp. 110-115. SILVA, Everton de Jesus. A ética aristotélica como caminho que conduz o homem a felicidade plena. Revista Húmus, Maranhão, n. 7, 2013.
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