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História da Educação e suas Fontes em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso: o Arrolamento do Arquivo da Missão Salesiana
Alana de Oliveira Barbosa[footnoteRef:1] [1: Mestranda no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação/Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (PGEdu/UEMS), Unidade Universitária de Paranaíba. Linha de pesquisa: História, Sociedade e Educação, Grupo de Estudos e Pesquisas em História e Historiografia da Educação Brasileira (GEPHEB). Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CAPES/CNPq). Endereço eletrônico: ala_ol@hotmail.com ] 
Ademilson Batista Paes[footnoteRef:2] [2: Doutor em Educação Escolar. Orientador, professor adjunto da UEMS/Paranaíba. Líder do GEPHEB. 	] 
Resumo kkkkkkk
O texto objetiva discutir os diferentes documentos e fontes históricas que foram levantados no arquivo particular da Missão Salesiana de Mato Grosso, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Nele, encontra-se uma base documental vasta e considerável para a história da educação e a história da presença da Congregação nos dois Estados (Mato Grosso e Mato Grosso do Sul). Essa contribuição na área da educação fica nítida com as construções de colégios salesianos no Estado, documentos particulares do fundador (Dom Bosco) até mesmo um singelo bilhete de agradecimento entre padres e funcionários. O arquivo encontra-se bem-organizado e preservado em seus depósitos, armazenados em pastas identificadas facilitando sobremaneira a pesquisa. Nesse processo, o recurso a um passado coletivo a ser compartilhado com a academia que ainda é carente de produção sobre os salesianos e suas ações educativas. O livre acesso às fontes e aos livros cedidos pela Missão foram essenciais para o desenvolvimento da pesquisa. A partir dessas fontes foi possível fazer uma análise mais crítica da Congregação Salesiana partindo do olhar de uma pesquisadora e historiadora de como esses religiosos atuaram no mundo, no Brasil e no sul do Mato Grosso, onde a pesquisa se aprofunda nas ações educacionais desses religiosos. Em termos metodológicos, dialoga-se com análises empreendidas por historiadores brasileiros e de outros países, buscando evidenciar a importância do arquivo e suas fontes para a história da educação. 
Palavras-chave: Congregação Salesiana. Campo Grande, MS. Documentos.
Abstract 
The text aims to discuss the different documents and historical sources that were raised in the private archive of the Salesian Mission in Mato Grosso, Campo Grande (MS). There is a vast and considerable documentary base for the history of education and the history of the presence of the Congregation in both states (Mato Grosso and Mato Grosso do Sul), this contribution in the area of ​​education is clear with the construction of Salesian colleges in the state, private documents of the founder (Don Bosco) even a simple thank-you note between priests and employees. The archive is well organized and preserved in its repositories, stored in identified folders, making the search much easier. In this process, recourse to a collective past to be shared with the academy that is still lacking in production on the Salesians and their educational actions. Free access to the sources and books provided by the Mission were of great importance for the development of the research. From these sources it was possible to make a more critical analysis of the Salesian Congregation starting from the perspective of a researcher and historian of how these religious worked in the world, in Brazil and in the South of Mato Grosso where the research delves into the educational actions of these religious. In methodological terms, we will dialogue with analyzes undertaken by Brazilian and other historians, seeking to highlight the importance of the archive and its sources for the history of education.
Keywords: Salesian Congregation. Campo Grande, MS. Documents.
Resumen
El texto objetiva discutir los diferentes documentos y fuentes históricas que fueron levantados en el archivo particular de la Misión Salesiana de Mato Grosso, en Campo Grande (MS). En él se encuentra una base documental amplia y considerable para la historia de la educación y la historia de la presencia de la Congregación en los dos estados (Mato Grosso y Mato Grosso do Sul), esa contribución en el área de la educación queda nítida con las construcciones de colegios salesianos en el estado, documentos particulares del fundador (Don Bosco) incluso un sencillo billete de agradecimiento entre sacerdotes y funcionarios. El archivo se encuentra bien organizado y preservado en sus depósitos, almacenados en carpetas identificadas facilitando sobre todo la investigación. En ese proceso, el recurso a un pasado colectivo a ser compartido con la academia que todavía carece de producción sobre los salesianos y sus acciones educativas. El libre acceso a las fuentes y los libros cedidos por la Misión fueron de gran importancia para el desarrollo de la investigación. A partir de esas fuentes fue posible hacer un análisis más crítico de la Congregación Salesiana partiendo de la mirada de una investigadora e historiadora de cómo estos religiosos actuaron en el mundo, en Brasil y en el Sur de Mato Grosso donde la investigación se profundiza en las acciones educativas de esos religiosos. En términos metodológicos dialogaremos con análisis emprendidos por historiadores brasileños y de otros países, buscando evidenciar la importancia del archivo y sus fuentes para la historia de la educación.
Palabras clave: Congregación Salesiana. Campo Grande, MS. Documentos.
Introdução
O presente texto encontra-se vinculado ao trabalho de pesquisa de mestrado do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (PGEdu/UEMS)/Paranaíba, MS. Conta com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e aborda os documentos localizados e tabulados na sede a Missão Salesiana de Mato Grosso.
A Missão Salesiana é uma entidade católica, beneficente, educativo-cultural e de assistência social e hoje é uma das maior e organizações não-governamentais na área educativa e de promoção social da juventude, com ampla aceitação e reconhecimento das autoridades e da sociedade em geral. 
Congregação Salesiana (Sociedade São Francisco de Sales - SDB) é uma congregação religiosa da Igreja Católica Apostólica Romana fundada em 1859 e aprovada 1874 pelo Papa Pio IX. O idealizador da congregação salesiana é Giovanni Melchior Bosco, ou Dom Bosco como é mais conhecido, nascido em 1815 no Norte da Itália em uma cidade chamada Becchi e faleceu em 1888. A Congregação Salesiana surgiu em resposta da Igreja Católica às transformações sociais, políticas, econômicas e culturais que ocorriam no ocidente no século XIX. e conta atualmente com 16.583 religiosos em 128 países, que atuam no campo juvenil em mais de 2.000 instituições, e teve como sede, ou Casa-Mãe, a de Turim, onde foi fundada. A trajetória inicial de Dom Bosco era de recolher e auxiliar meninos que viviam nas ruas e pouco a pouco a obra foi crescendo e se expandindo pelo mundo. 
A congregação estabelece-se em Mato Grosso em 1894. Os missionários chegaram pelo porto de Cuiabá e foram se expandindo por todo o território do então Mato Grosso até o presente momento. Nos arquivos referentes à educação, os documentos deixam claro que esta foi e é umas das realizações mais expressivas dos salesianos em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.
Sobre o acesso ao arquivo foi marcada uma reunião com o responsável da Congregação, Padre João Bosco Maciel, que liberou as fontes com o acompanhamento da secretária responsável, que resultaram em duas visitas. A primeira fiquei trabalhando por uma semana, fotografando os documentos encontrados e o segundo momento do trabalho foi para fotografar mais algumas fontes e pegar livros cedidos para o desenvolvimento da pesquisa. O levantamento foi realizado nas dependências da Missão Salesiana de Mato Grosso
em Campo Grande, MS, na rua Padre João Crippa 1.437, Centro.
Trabalhar com uma variedade de fontes só é possível a partir do surgimento da “História Nova”, a concepção de fontes e objetos históricos passou a ser mais ampla e diversificada, propondo com isso romper com o tradicionalismo da História movida apenas pelo caráter econômico, político e social. 
Neste texto priorizamos o levantamento do arquivo da Missão Salesiana de Mato Grosso que foi alçado e analisado até o presente momento. Pretendemos discutir como esses documentos podem contribuir para a história da educação, principalmente no quesito da atuação religiosa católica no ensino do Estado. Todo historiador ou historiadora, em algum momento, visitou ou visitará aquele que é o lugar a partir do qual muitas de suas pesquisas são escritas: o arquivo (ANJOS, 2018).
Desta forma, optamos por identificar, dentro da variedade de fontes, a ação da congregação salesiana nos espaços educacionais e como os salesianos se fizeram presente no social, econômico, cultural e religioso no Estado. O desafio posto nos levou a buscar diversos tipos de fontes, como: jornais, fotografias, relatórios, cartas, fichas, atas escolares, processos de movimentação financeira, decretos, diários, ofícios, informativos, folhetos, convites, cronogramas, autorizações, manuais, livro tombo, entre outras fontes.
Em que pese a natureza da documentação, as circunstâncias em que tenha sido elaborada, denunciadas pelo tom laudatório, constituem um exemplo importante daquilo que aqui se quer analisar: as interfaces da educação e religião em Mato Grosso do Sul e no Mato Grosso.
Para além do “comprometimento da fonte” (toda fonte histórica está comprometida pelas múltiplas condições que foi produzida e por quem), importa perceber neste discurso, o objeto de registro, as ideias que compõe e talvez desvelar o amplo tecido ao qual cada ideia-fio destas “impressões” está interligada. Revelar que outros discursos esta visão de mundo, de homem, de história e de educação pode ser estendida até outra compressão. (FRANCISCO, 2010, p. 21, grifo do autor).
Analisando o arquivo como um espaço físico e epistemológico, o desígnio é pensar sobre o que ele pode observar para o trabalho do historiador da educação. Conversando com a historiografia sobre a ação dos arquivos na escrita da História, em um primeiro momento, reflete-se sobre as relações entre Arquivo, Memória e História (ANJOS, 2018).
O artigo divide-se em três partes. Na primeira, traremos o contexto histórico no qual os salesianos atuam nos espaços educacionais; na segunda, arrolamos os documentos levantados para serem tabulados e analisados e como a congregação salesiana sempre procurava manter viva suas lembranças, por meio de arquivos; na terceira parte, pontuamos como essas fontes contribuem para a história da educação. Ao final, encerramos com algumas considerações.
A Igreja como Espaço de Pesquisa: os Salesianos Ocupando os Espaços Educacionais
Durante o início do século XX, os principais educandários salesianos procuraram apresentar os requisitos para serem referência em ensino de qualidades.
No regime republicano, após a separação entre Igreja e Estado, a prestação de serviços educacionais pelas ordens religiosas passou a constituir a principal diretriz da política expansionista da organização católica. Ao final dos anos 20, esta organização exercia o controle de 70% das instituições de ensino privado em funcionamento no país. A Igreja havia criado e estava gerindo escolas primárias, secundárias, agrícolas e profissionais. Destacou-se, porém, pela ênfase que deu as escolas secundárias, destinados aos filhos das grandes famílias proprietários rurais, fornecendo uma formação erudita para muitos dos intelectuais que assumiram o papel de principais agentes do campo educacional ainda da Primeira República. (NUNES, 2000, p. 158).
Em outras palavras, as metas educativas voltam-se progressivamente para as classes médias urbanas. Com isso, evidentemente, diminui entre os missionários o empenho por aquela que era considerada a sua prioridade: a educação da juventude pobre e abandonada.
Na medida que a partir do início do século XX, a Santa Sé pôr-se a urgir a necessidade de uma formação sacerdotal mais aprimorada nos estudos de filosofia e teologia, os salesianos começaram a considerar as escolas um ambiente propicio para evangelizar e assim produzir futuros sacerdotes. Além disso, a renda desses colégios oferecia uma base financeira para o sustento das casas destinadas especificamente a formação clerical. (AZZI, 1982, p. 111).
Essa perspectiva de fortalecer a educação religiosa das classes urbanas em ascensão correspondia plenamente aos projetos do episcopado brasileiro. Ainda no século XIX, cabe salientar, no início da República, a separação entre a Igreja e o Estado: em 1890, os bispos passaram a perceber a necessidade de contrapor o ensino religioso ministrado pelos colégios católicos ao ensino leigo decretado para as escolas públicas, tanto federal como estadual e municipal. Essa situação perdurou até a chegada de Vargas em 1930 ao poder, a aproximação dele com o episcopado brasileiro e seu apoio político fez esse cenário de separação tornar-se exíguo.
No âmbito regional, uma das razões que justifica o estudo do arquivo da Missão Salesiana de Mato Grosso é o fato que as instituições religiosas católicas foram responsáveis por grande parte da evangelização da sociedade, tanto quanto pela educação. Ao nos debruçarmos sobre essa instituição, podemos, por meio dela, descortinar uma outra história, uma memória coletiva não mais unicamente preocupada com os grandes feitos da Igreja, mas com os extratos sociais, econômicos, políticos e educacionais. 
Ressalta-se que a construção de diversas instituições escolares religiosas no Brasil não ficaria sem registro. Todo esse esforço para fabricar colégios não poderia cair no esquecimento, motivo pelo qual, ainda hoje, se encontram tantas e tão fartas informações nos arquivos institucionais sobre a história educacional. 
As missões salesianas na América do Sul iniciam-se sob o incentivo da Santa Sé, com o pontificado de Pio IX, os salesianos deviam ter duas metas principais em suas atividades no Novo Continente: primeiro, dar assistência aos filhos dos imigrantes italianos que para América do Sul entravam em grande número, especialmente para o Brasil; e a segunda, levar o evangelho aonde os salesianos ainda não tinham se estabelecidos com igrejas e colégios.
A partir do desenvolvimento do Estado cria-se a necessidade de uma escolarização para atender a elite ou para profissionalização dos menos abastados, a população dessa região vivia sem o hábito da oração, pois faltavam padres, o que dificultava a evangelização proposta pela Igreja. Nessas circunstâncias, a Congregação chegou a Cuiabá e foram conscientizando-se de como era evidente a necessidade de um trabalho apostólico em toda a região. Os salesianos mantinham-se fortemente focados em suas atividades de atendimento paroquial, ao oratório[footnoteRef:3], ao colégio. [3: Local para realizações das preces, entre 1841 e 1850 dinamizou três oratórios ou centros juvenis na cidade de Turim, embora a população de cada um deles fosse na sua maioria crianças, adolescentes e jovens pobres. Não era vedado o acesso a elementos de outros estratos sociais, visto que Dom Bosco acolhia também e de bom grado jovens estudantes, filhos de boas famílias, solicitando-lhes até ajuda no trabalho com os outros.] 
De acordo com os jornais, as demandas pela educação como direito extensível a todos e como obrigação do Estado sofrem um redutor, em sua própria concepção. Educar as classes pobres é formar para o trabalho. Banir a ignorância é eliminar o vício do ócio, fonte de criminalidade. É fato inculcar por princípios e práticas o valor e a necessidade do trabalho, é transformar o homem, o menino pobre, em trabalhador apto às demandas cada vez mais crescentes do mercado de trabalho (FRANCISCO, 1998). Tais ações não estão circunscritas à realidade local, elas
se inserem no quadro daquelas transformações. 
O Estado confia a tarefa da educação profissionalizante aos salesianos, e a adoção do trabalho assalariado exige mais que braços fortes, é necessário alterar a mentalidade, urge tornar o trabalho dignificante, cujo papel a Igreja exerce com maestria. Ressalta-se a situação educacional do Brasil neste período final do século XIX.
 Era o desejo dos bispos de diversos Estados a implantação de escolas profissionais e agrícolas. Paralelamente ao ensino profissional, porém, os salesianos começaram logo a ministrar aulas nos cursos primários e secundários para alunos das classes médias, destinados a profissões liberais.
Os salesianos têm por fim a educação moral e a instrução primária, secundária, artística e profissional da mocidade, especialmente da classe média e mais necessitada, e da infância desvalida (AZZI, 1982).
No quesito documental, Bourdieu (1989, p. 15) denomina o aparato religioso de “capital simbólico objetivado”. Em outras palavras, o fundo documental religioso pode ser compreendido como substrato das práxis religiosas de uma comunidade, o que denota a abrangência do universo de elementos representados por meio dos seus registros.
Nos currículos, jornais e atas fica claro que a orientação básica de ensino escolar dos colégios era preparar os jovens para ingressar na sociedade brasileira como profissionais liberais, ou vinculados às atividades do comércio. Assim atendendo uma parcela específica da sociedade, as classes médias urbanas, em ascensão desde o século XIX.
Mais adiante falaremos das fontes que nos forneceram todas essas informações, e destacaremos como a Igreja e a Congregação Salesiana se organizam para não caírem no esquecimento e continuar a evangelização da sociedade.
Tipologias de Fontes: Arquivo Religioso e Memória 
No texto iremos elencar uma variedade de fontes, como: documentos oficiais e escolares que retratam sobre a história da expansão da Congregação Salesiana, das construções dos colégios nas cidades de Corumbá, Três Lagoas e Campo Grande. As fontes imagéticas que irão compor parte da história dessa Congregação e os jornais que têm informações ricas em detalhes desses religiosos na região. Ao todo, encontramos 28 fotografias, relacionadas na 
Tabela 1 - Levantamento de fontes
	Foto
	Data
	Quantidade
	Discriminação
	1
	Não consta
	26
	Coletânea de fotos em pasta catálogo
	2
	Não consta
	1
	Poliesportivo da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
	3
	Não consta
	1
	Colégio Dom Bosco
As fotografias analisadas referem-se principalmente à chegada dos padres ao Brasil e às crianças em salas de aulas nos colégios salesianos no início dos trabalhos dos religiosos. Nesse sentido, dão suporte para caracterizar o momento histórico trabalhado, pois, ao fazer a análise das fotografias disponíveis relacionando-as com os documentos oficiais da região, constituiu uma fonte riquíssima para o historiador. Lembrando que não foi possível explorar o arquivo todo, então se acredita que exista uma grande quantidade de fotografias que não estão aqui no levantamento.
As fotos dos colégios são fontes que ofereceram possiblidades de visualizar as estruturas dessa instituição escolar, pois, ao se estudar uma instituição escolar, o pesquisador deve estar atento não apenas a questões documentais que essa escola traz, mas também sua estrutura física, que é passível de análise. Assim, a partir das imagens é possível fazer uma leitura do espaço, das relações humanas e da forma de ensinar construída na época (Fotos 1 e 2).
A Foto 1 retrata o espaço educacional do colégio masculino Dom Bosco, contendo dois padres, demostrando a vigilância constante que é uma prática dos salesianos, e diversas crianças uniformizadas, em postura ereta, com as mãos para trás, mostrando um padrão de rigor no espaço educacional.
Foto 1- Colégio Dom Bosco em Campo Grande, MS. Pe. Carlos Manferdini (à esquerda) e Pe. João (à direita) 
Fonte: MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO. Colégio Dom Bosco. Campo Grande, MS, [s.d.].
Foto 1- Colégio Dom Bosco em Campo Grande, MS. Pe. Carlos Manferdini (à esquerda) e Pe. João (à direita) 
Fonte: MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO. Colégio Dom Bosco. Campo Grande, MS, [s.d.].
Foto 2- Ordenação do Pe. Higino e Pe. Heisel.
Fonte: MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO. Ordenação. Campo Grande, MS, 1946.
Mesmo com a existência do risco que envolve o trabalho com fotografias na pesquisa histórica, cabe ao historiador problematizar essas imagens, como qualquer outra fonte, pois, conforme Burke (2004, p.25), as “―as fotografias não mentem, mas mentirosos podem fotografar”. Isto nos alerta que o historiador dever estar sempre atento nas interferências que o fotógrafo faz em uma imagem, onde sempre existe a possibilidade de manipular objetos, pessoas e momentos, alterando sentido.
Os jornais dão informações sobre a forma de atuação da Congregação, como: composição dela, correntes ideológicas, posicionamento político, poderes estabelecidos, relação dos padres com os alunos, o funcionamento escolar, doações, intercâmbios entre lideranças, divisão de tarefas, hierarquias internas e externas; enfim respostas para as questões mais diversas sobre os segmentos da educação religiosa dos salesianos.
Foram coletados e tabelados 194 jornais, alguns completos e outros só páginas, mas em estado adequado de conservação para análise e todos com data de publicação que constituem um instrumento essencial de evangelização e educação (Foto 3).
Foto 3 – Nota sobre a história eclesiástica em Mato Grosso.
Fonte: MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO. Jornal 4: Correio do Estado, Campo Grande, MT, 11 abr. 1974. p. 4.
Vale exemplificar que neste texto o jornal do Correio do Estado de Campo Grande, de 1974, deixa claro como os salesianos se estabelecem em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso e como o Estado auxilia essa Congregação com doações, e entender qual é o interesse do Estado em ajudar essa Congregação a se instalar na região. A seguinte citação mostra um pouco desse auxílio do Estado:
Em 4 de Abril de 1899, finalmente, se estabeleciam em Corumbá. Começaram com um externato, depois um pequeno internato... e muitas dificuldades. Os primeiros Salesianos foram: Pe. Angelo Cavatota, diretor, Pe. Agostinho Colli, Clérico Leão Vallerie, e os irmão leigos: Silvio Milanese e Fernando Porrera. Enfim, após de diversas formas, venceu a boa causa. A Câmara doou aos Salesianos um bom terreno, e todos se puseram de boa vontade, a auxiliar na obra, principalmente apoiando a construção de um edifício novo. Em janeiro de 1905 era inaugurado a sede do Colégio Santa Teresa. Já insuficiente suas instalações para os nossos dias, foi construído um mais cômodo Colégio que intensifica e dilata sua ação benfaceja (sic), na instrução e formação dos jovens. (MISSÃO SALESIANA, 1974, p. 4).
Ainda sobre as fontes oficiais, como relatórios internos dos colégios, foram encontrados 27 relatórios, com uma multiplicidade de informações, como a história dos salesianos em Mato Grosso do Sul, matérias escolares, assistência jurídica, informações sobre alunos, dados financeiros, sobre ação social, anexos salesianos, de visitas nas inspetorias e outros (Tabela 2). 
O relatório refere-se às atividades desenvolvidas no ano escolar, contendo duas páginas. O documento de 1980 explica as atividades feitas com os alunos, professores e pais, por semana e quantas vezes por semana e semestre tinham aulas de catequese, obrigatoriedade de ida à missa de 1ª a 4ª série, mas das séries seguintes não era obrigatória, mas incentivada, preparação para a eucaristia e crisma, curso para batismo, entre outros. Já os professores tinham reunião bimensal para análise de problemas e discussão do programa e reconstituição do grupo dos cooperadores salesianos e os pais só recebiam convite para a participação de assuntos mínimos. A Foto 4 ilustra o relatório aqui explanado.
Uma análise criteriosa dessas fontes para a pesquisa é entender as formas organizacionais dos religiosos em Mato Grosso do Sul e Mato
Grosso. Pode-se supor, logo de início, que o Estado buscava também uma educação evangelizadora, criando mecanismo para que ela se tornasse de grande valia para o governo. 
Tabela 2 - Levantamento de fontes: documentos variados
	Documento
	Ano
	Quantidade
	Detalhe
	
	
	
	
	1
	sem data
	1
	Relatório sobre a história dos salesianos em Mato Grosso do Sul
	7
	23.1.1985
	3
	Relatório sobre matérias escolares
	8
	sem data
	1
	Carta ao Colégio Dom Bosco 
	9
	sem data
	1
	Relatório sobre a assistência jurídica do Dom Bosco
	14
	10.8.1983
	9
	Relatório mensal da assistência jurídica 
	16
	sem data
	2
	Oficio e relatórios dos alunos das Faculdades Unidas Católicas de Mato Grosso (FUCMT)
	19
	1973
	6
	Relatório de atividades do curso de Letras, Ciências e Filosofia; Faculdade de Ciências Sociais e Direito 
	30
	sem data
	1
	Relatório de recursos financeiros 
	46
	1986
	2
	Relatório sobre a atuação da Promoção Social na FUCMT
	53
	18.6.1995
	6
	Relatório sobre anexação de Araçatuba e Lins à Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
	54
	3.6.1995
	5
	Relatório de anexação do salesiano de Lins
	57
	4.4.1995
	2
	Relatório sobre a Fundação Dom Bosco
	58
	sem data
	24
	Relatório sobre as universidades salesianas
	59
	14.8.1995
	7
	Relatório do 1º Encontro dos Responsáveis das Universidades Salesianas 
	60
	sem data
	7
	Relatório e orientações da Pastoral Universitária
	69
	1994
	4
	Relatório com as Resoluções do Consul
	79
	sem data
	8
	Relatório sobre a comunidade Nossa Senhora Aparecida
	86
	24.5.1996
	2
	Relatório sobre a separação do Colégio Dom Bosco da Faculdade Dom Bosco
	88
	26.9.1996
	4
	Relatório sobre as visitas de inspetorias
	91
	1996
	1
	Relatório sobre questões técnicas do espaço físico do Colégio Dom Bosco
	92
	sem data
	3
	Relatório sobre a história e o desenvolvimento do Colégio Dom Bosco
	107
	15.8.1998
	14
	Relatório sobre o Colégio em geral
	111
	2.4.2001
	7
	Relatório de uma mãe sobre seu filho no Colégio
	129
	sem data
	4
	Relatório em informativo sobre 1º Seminário de Informática do Colégio Dom Bosco
	130
	2001
	8
	Relatório sobre o Colégio Bom Bosco, memoriais, reformas e informações 
	138
	sem data
	2
	Relatório do oratório paroquial Dom Bosco 
	144
	1980
	2
	Relatório de atividades desenvolvidas no ano escolar. 
Foto 4 - Relatório de atividades desenvolvidas no ano escolar de 1980.
Fonte: Missão Salesiana de Mato Grosso. Relatório de atividades desenvolvidas no ano escolar de 1980. Campo Grande, MS: Missão Salesiana de Mato Grosso, 1980.
A Congregação tomou progressivamente consciência da necessidade de conservar sua memória, já que, em momentos de mudança, o que retinham de suas histórias eram suas origens. Tanto a noção de memória e a de documento atravessaram a história e adquiriram diversos sentidos e significados de acordo com as épocas, com a qualidade da cultura dos povos e dos segmentos ou modalidades de uma cultura, que serviram de sustentáculo das recordações ou de relatos portadores de conhecimento e sentido para determinados povos.
 No Brasil é mais recorrente que os arquivos estejam nas mãos dos agentes do Estado nas suas diversas esferas de atuação ou, então, de instituições em maior ou menor medida a ele alinhadas que, pelas mais diversas razões, sentiram, em determinado momento de suas trajetórias, a necessidade de produzir memória.
A história também é uma narrativa portadora de ficção, mas o historiador, ao contrário do escritor, não cria    o traço no seu sentido absoluto, eles os descobrem, os converte em fonte e lhes atribui significado. Em sua ficção controlada pelo uso dos arquivos e fontes o historiador objetiva atingir o real acontecido imposto pelos rigores do método – a testagem, comparação e cruzamento – e sua versão do passado deve, hipoteticamente, poder “comprovar-se” e ser submetida à testagem, pela exibição das fontes, bibliografia, citações e notas de rodapé. Assim como deve convidar o leitor a refazer o caminho da pesquisa se duvidar dos resultados apresentados. (MARTINS; ROCHA, 2005, p. 64).
O testemunho dos arquivos manifesta-se, inclusive, no modo como se estabelecem alguns dos seus fundos documentais, dominados, muitas vezes, por relatórios, textos legais e impressos oficiais. Organizados geralmente em ordem cronológica, de acordo com determinadas regras arquivísticas que procuram respeitar a lógica de produção da documentação que, nada mais é que um vestígio da lógica administrativa/institucional que imprimiu tinta em papel (ANJOS, 2018).
A memória de fatos importantes de um povo, da vida tornada especial pelas virtudes, seja dos santos ou dos heróis, adquire função social exemplar, além de suporte documental necessário para a credibilidade desse dizer especial do conceito. A memória coletiva de um povo lhe serve de suporte na estruturação de crenças e costumes, bem como de suporte do folclore e das possibilidades artísticas por ele proporcionada. Se tudo pode ser histórico, muito mais as maneiras, os costumes e as particularidades de um povo em gravar e conservar suas recordações como celebração dos valores da vida (CASTRO, 2014).
De acordo com Afonso de Castro, dando sequência à ideia anterior:
Consciente de seus valores e de força do legado de Dom Bosco, uma vez que, mesmo sendo documentados e estudados, mas deixados a margem os valores referenciais da vida salesiana, tendo em vista uma indiferença ou mesmo uma autodesvalorização em relação a esse legado, a Missão perderia a sua consciência e vigor, sua razão de ser e, principalmente, não saberia qual legado de valores a oferecer para o futuro da instituição. (CASTRO, 2014, p. 47).
A existência desses documentos evidência a singularidade do relato histórico sobre os salesianos, porém existe, além dos documentos, algumas obras ou mesmo textos relevantes para esta pesquisa, como: as obras de Afonso de Castro, História da Missão Salesiana de Mato Grosso 1894-2008, volume I e II, trabalho esse bem extenso, contendo dados riquíssimos para complementar a pesquisa. Os livros abordam questões da história geral e focam muito na instalação dos padres em Mato Grosso e sul de Mato Grosso e acaba por ser uma fala sucinta, pelo fato de o recorte histórico ser muito extenso, o autor acaba não se aprofundando e sim pincelando um pouco de cada assunto.
Já Riolando Azzi buscou estudar diversas questões dos salesianos em Mato Grosso, e, em suas obras, como: Os salesianos no Brasil à luz da história (1982), A obra de Dom Bosco no Brasil - volume I (2000), A obra de Dom Bosco no Brasil - volume II (2002), Os primórdios da obra salesiana (1982), A implantação da obra salesiana (1982), A organização da obra salesiana (1982) e A consolidação da obra salesiana (1982), expõe a vida dos salesianos no Brasil e se aprofunda em alguns Estados. 
No caso histórico educacional, Adilson José Francisco explora o cenário educacional, em seu livro: Educação & modernidade: os salesianos em Mato Grosso-1894-1919 (2010). Analisa as infinitas possibilidades vivenciadas pelos salesianos e a interface de sua atuação na construção do projeto moderno do Mato Grosso, naquele período uno, incluindo o atual território do Estado de Mato Grosso do Sul.
Desta forma, os autores citados têm por objetivo mostrar vários estilos redacionais que servem de fontes bibliográficas, e todos eles têm um objetivo específico, e são capazes de expressar a historicidade da ação dos salesianos em suas respectivas presenças ou regiões. Clérigos que tinham por obrigação deixar sob a forma de crônicas a história dos acontecimentos mais significativos da vida da comunidade. Essas obras são de grande valia para a análise das fontes coletadas e analisadas, tendo vários pontos de vista sem contar a ampla leitura de artigos sobre os salesianos no Brasil.
Cabe lembrar que Edward Carr (2006) enfatizou que antes de se ler um livro, devemos nos informar sobre o autor. No caso dos arquivos, cabe a mesma premissa, já que saber de antemão quem o constituiu e em que condições isso se deu pode ajudar a compreender melhor o que se acha e o que se
oculta na documentação que se tem em mãos.
Considerações Finais 
A reflexão efetuada ao longo deste artigo é evidenciar a contribuição do arquivo da Congregação Salesiana de Mato Grosso e sua pesquisa para a história da educação. A vontade de se lembrar ou de se esquecer, o esforço da memória que na origem incentiva a organização dos arquivos eclesiais, o arquivo bem-analisado nos diz muito sobre as intenções dos seus produtores e revela muitas experiencias históricas ligadas à educação. 
O arquivo é considerado indispensável à Igreja, não apenas por ser elemento comprovador da sua presença no meio dos povos, mas também por lhe dar condições de se reconhecer e de se fazer conhecer por meio dos registros seculares depositados nos fundos arquivísticos. Felizmente é notável o progresso do diálogo entre a Igreja e o Estado em relação às questões atinentes à conservação dos bens culturais da Igreja. O discurso centralizador tem dado espaço ao desejo de fazer esse patrimônio ser acessível à pesquisa.
Consideramos que o arquivo eclesiástico se inclui entre elementos testemunhais do poder religioso por ser a entidade que agrega em seu seio as provas documentais que testemunham a influência da Igreja nas práticas sociais do povo.
Dentro das tabelas expostas no texto podemos refletir sobre o que os arquivos podem testemunhar para o trabalho do historiador da educação (ANJOS, 2018).
Lembrando que os arquivos também nos dão acesso às crises internas e externas, na perspectiva que as ações religiosas interferem no social, atos que interferem na construção da identidade de um aluno, qual limite da Igreja quando se trata de educação perante o Estado, alunos que fogem às regras impostas pela religião no ambiente escolar ou mesmo a obrigatoriedade de os alunos irem à missa aos domingos como atividade escolar. Referenciados esses diversos tipos de crise, cabe observar com cuidado os diferentes registros, isso apontará outras perspectivas, isso serve para mostrar a necessidade de outras narrativas históricas. 
Todavia, podemos constatar que esse levantamento documental faculta à pesquisa e aos envolvidos nela uma experiência de vasto conhecimento proporcionado por caixas empoeiradas que guardam diversas histórias, que se analisadas sem tendencionismo religioso podem ser de grande valia para a história da educação.
Referências 
ANJOS, Juarez José Tuchinski dos. O testemunho dos arquivos e o trabalho do historiador da educação. Hist. Educ. (online), Porto Alegre, v. 22, n. 55, maio/ago. 2018. p. 279-292.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. p. 322.
BURKE, Peter. Testemunha ocular: História e Imagem. Bauru: Edusc, 2004. 
CARR, Edward. O que é história. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006.
CASTRO, Afonso de. História da Missão Salesiana de Mato Grosso 1894-2008. Campinas: Editora UCDB, 2014. v. 1-2.
FRANCISCO, Adilson José. Apóstolos do progresso: a prática educativa salesiana no processo de modernização em Mato Grosso (1894–1919). Dissertação (Mestrado em Educação)- Universidade Federal do Mato Grosso, Cuiabá, MT, 1998.
______. Educação & modernidade: os salesianos em Mato Grosso 1894-19919. Cuiabá, MT: Ed. UFMT, 2010.
MARTINS, Maria do Carmo; ROCHA, Heloísa Helena Pimenta da. Lugares de memória: sedução, armadilhas, esquecimento e incômodos. Horizontes, v. 23, n. 2, p. 91-99, jul./dez. 2005.
MISSÃO SALESIANA DE MATO GROSSO. Colégio Dom Bosco. Campo Grande, MS, [s.d.]. 
______. Jornal 4: Correio do Estado, Campo Grande, MT, 11 abr. 1974. p. 4.
______. Ordenação. Campo Grande, MS, 1946.
______. Relatório de atividades desenvolvidas no ano escolar de 1980. Campo Grande, MS: Missão Salesiana de Mato Grosso, 1980.
NUNES, Clarice. (Des) Encantos da modernidade pedagógica. In: LOPES, Eliane Marta Teixeira; VEIGA, Cynthia Greive; FARIA FILHO, Luciano Mendes (Orgs.). 500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.
Motivos que UCDB rejeitou o artigo:
a)      Há falta de clareza no uso de alguns termos, como Congregação
Salesiana e Missão. Não é informado se são sinônimos ou não, o que
dificulta a compreensão do texto.
b)      Falta de aprofundamento dos aspectos teóricos-metodológicos;
c)      Falta de uma contextualização maior, como por exemplo, faz referência
a situação da educação ao final do século XIX, sem nenhuma explicação
desse contexto.
d)      A estrutura do texto não contribui para a sua compreensão, por exemplo,
as fontes poderiam ter sido citadas na página 6 em vez de escrever que
serão citadas mais adiante.
e)      Faltou explorar a potência da imagem no trabalho, o que enriqueceria
bastante a análise, especialmente porque o trabalho situa-se na vertente da
nova história cultural.
f)      Informa que não foi possível explorar todo o arquivo, mas não
justifica.
g)      O autor crítica o tipo de documentação utilizada, que considerando a
perspectiva do trabalho e os estudos recentes, não se justifica.
h)      O autor em alguns momentos confunde história institucional com história
da educação, e bibliografia com fonte de pesquisa.
i)      Embora afirme (na conclusão) que o artigo evidencia a contribuição do
arquivo da Missão Salesiana para a História da Educação, o texto carece
de argumentos que subsidiem essa afirmação.

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