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0 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS CÂMPUS CORA CORALINA MESTRADO EM ESTUDOS DE LÍNGUA E INTERCULTURALIDADE PATRÍCIA MENDANHA BERNARDES LETRAMENTO E ENSINO DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO CIDADE DE GOIÁS 2019 1 PATRÍCIA MENDANHA BERNARDES LETRAMENTO E ENSINO DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO Artigo apresentado à Universidade Estadual de Goiás/Campus Cora Coralina como exigência da disciplina: Gêneros Textuais, Letramento e Ensino, tendo como Profª. e Drª. Carla Conti. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Marília Silva Vieira. CIDADE DE GOIÁS 2019 2 LETRAMENTO E ENSINO DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO Patrícia Mendanha Bernardes1 RESUMO Este artigo é uma reflexão sobre a teoria de Letramento com ênfase do ensino de gênero discursivo/textual, artigo de opinião em sala de aula, a partir da análise de um texto do Caderno de atividades “Aprender +” 9º ano, SEDUCE, distribuídos pelo governo de Goiás às escolas estaduais, tendo como foco as provas da SAEGO e PROVA BRASIL. Com o objetivo de analisar a importância do ensino de letramento e do gênero artigo de opinião em sala de aula, assim como, de ressaltar a atenção ao estudo desse gênero, que por meio desse se constrói conhecimento e cria alunos críticos. A partir da análise do Caderno e do artigo “O grande sertão da misoginia” sobre um tema recorrente no cotidiano dos alunos – respeito à mulher - e as atividades de compreensão e interpretação, presentes no mesmo, foram feitas algumas ponderações, considerando que a função única do Caderno de atividades são as provas do governo, fica claro que o seu conteúdo é menos do que esperado. No contexto híbrido de linguagens e culturas desse Caderno emerge a importância deste estudo, pois permite, sob o abrigo das práticas de letramento, problematizar a questão do ensino de gêneros em sala de aula como forma de aproximar o aluno da sua realidade. A metodologia é qualitativa com aporte teórico ancorado nos ensinamentos de Kleiman (1995, 2007, 2008,2015), Street (2012, 2014), Rojo (2005), Bakhtin (2003). Palavras – chave: Letramento. Caderno de atividades. Gênero artigo de opinião. ABSTRACT This article is a reflection on Literacy theory with emphasis on teaching of discursive / textual genre, opinion article, in the classroom, based on the analysis of a text from the “Aprender +” 9th grade activity book, SEDUCE, distributed by the Goiás government to state schools, focusing on the SAEGO and PROVA BRASIL tests. In order to analyze the importance of teaching literacy and the opinion article genre in the classroom, as well as to emphasize the attention to the study of this genre, which through this builds knowledge and creates critical students. From the analysis of the Notebook and the article "The great backwoods of misogyny" on a recurring theme in the students' daily lives - respect for women - and the activities of understanding and interpretation, present in it, some considerations were made, considering the unique function of the activity booklet are the evidence of the government, it is clear that its content is less than expected. In the hybrid context of languages and cultures of this Notebook, the importance of this study emerges, as it allows, under the protection of literacy practices, to problematize the issue of teaching genres in the classroom as a way to bring students closer to their reality. The methodology is qualitative with theoretical support anchored in the teachings of Kleiman (1995, 2007, 2008,2015), Street (2012, 2014), Rojo (2005), Bakhtin (2003) Keywords: Literacy. Activity book. Gender opinion article. INTRODUÇÃO A teoria que subsidia este trabalho é a teoria de Letramento, que é uma área da Linguística Aplicada (LA), que será trabalhado associado ao ensino de gênero discursivo artigo de opinião em sala de aula. Sendo a LA um campo transdisciplinar, indisciplinar e intercultural 1 Licenciado/Bacharel em Letras. E-mail: patriciabernardes@yahoo.com.br 3 que identifica, investiga e busca soluções para determinado problema relacionado a linguagem. Diante disso a LA estabelece diálogos com outras áreas de estudo como: a Educação, Filosofia, Sociologia, Sociolinguística, etc. Na década de 90 tem um avanço passando também a estudar as práticas sociais, para poder entender as práticas discursivas. Com esse avanço tivemos a teoria de letramento que segundo as estudiosas Kleiman e Soares, consideravam o termo letramento como referência a escrita, o que sugeriria a escolarização. Posteriormente Kleiman (1995) considera em seus estudos uma nova abordagem da língua escrita na escola e na sociedade. Compreende-se que existem teorias em que o letramento está inserido no contexto social, e que ele não pode ser trabalhado de forma autônoma nas escolas, tem que valorizar o contexto em que o aluno está inserido. (KLEIMAN, 2015, 2008, 1995; STREET, 2014, 2012; ROJO, 2005) declaram que o letramento está ligado a práticas sociais em várias áreas. Entende-se que o letramento está ligado as práticas sociais, com isso vê-se a importância da abordagem dos gêneros discursivos e textuais na escola. Tendo em vista que Bakhtin reconhece a importância do estudo do texto levando em consideração tantos os aspectos linguísticos quantos os textuais, sendo o foco sóciodiscursivo. Tem como corpus de análise o Caderno de atividades do aluno “Aprender +” e em especial um texto deste livro e as respectivas atividades de compreensão e interpretação propostas pelo “Aprender +” do 9º ano do Ensino Fundamental Final, da Seduce. A partir da análise em questão, são feitas reflexões acerca a importância do ensino do gênero artigo de opinião em sala de aula, análise desse caderno e a sua função. O texto analisado é “O grande sertão da misoginia”, que aborda o tema sobre o respeito às mulheres Nessa perspectiva, são apresentadas ponderações sobre a importância do aluno incorporar as práticas de leitura e escrita, construir significados e saber usá-las socialmente para responder às questões sociais circundantes, tornar-se um indivíduo critico. Pondera-se ainda sobre a construção de conhecimentos, considerando sempre o contexto sócio-histórico e cultural do aluno, pois considerar o aluno como protagonista do processo de ensino e aprendizagem é contribuir para que o conhecimento por ele construído faça sentido. Segundo Freire (1987), o aluno deve ser o sujeito, e não o objeto em que se depositam conhecimentos. Para a constituição do arcabouço teórico sobre esse assunto, a metodologia de análise é qualitativa, de cunho descritivo, interpretativo e explanatório, porquanto promove reflexões sobre leitura e interpretação de textos propostos pelo Caderno de atividdes e as práticas do letramento, as quais devem ser realizadas pelo professor, de forma contextualizada com as experiências de vida do aluno e o contexto sociocultural e histórico em que ele é imerso. Para tanto, o aporte teórico mobilizado para este estudo está ancorado nos ensinamentos de Kleiman (1995, 2007, 2008,2015), Street (2012, 2014), Rojo (2005), Bakhtin (2003). LETRAMENTO Os estudos sobre letramento no Brasil começaram em 1990 com estudiosas em linguagem como Ângela Kleiman e Magda Soares, que considerava o termo letramento como referência a escrita, o que sugeriria a escolarização. Depois Kleiman (1995) na obra, “Os significados do letramento”, declara que letramento tem uma dimensão antropológica e sociológica, com estudos de uma nova abordagem da língua escrita na escola e na sociedade. Letramento, segundo o dicionário Houaiss (2001) significa um “processo pedagógico de aquisição e domínio da capacidade de ler, escrever e interpretar textos”, e a alfabetização “é o nível de letramento dos alunos, açãoou efeito de escrever”. Assim, o letramento preocupa-se com o impacto da escrita sobre um grupo social, com os reflexos sentidos pela sociedade. Em que, um indivíduo alfabetizado não é necessariamente letrado, pois o alfabetizado é aquele que 4 sabe ler e escrever, e o letrado é aquele que também sabe ler e escrever nas práticas sociais, que sabe dominar a língua no seu cotidiano, nos mais distintos contextos, como seguir uma receita, se informa por meio de um jornal, entre outros. Haja vista que, existem teorias que o letramento está inserido no contexto social, e que ele não pode ser trabalhado de forma autônoma nas escolas, tem que valorizar o contexto em que o aluno está inserido. (KLEIMAN, 2015, 2008, 1995; STREET, 2014, 2012; ROJO, 2005) declaram que o letramento está ligado a práticas sociais em várias áreas. Na perspectiva dos Estudos do Letramento, não há apenas uma forma de usar a língua escrita – a reconhecida e legitimada pelas instituições poderosas, à qual poucos têm acesso –, mas há múltiplas formas de usá-la, em práticas diversas que são sociocultural e historicamente determinadas (KLEIMAN, 2008, p.190). Não há uma só forma de usar a língua, pois a mesma é heterogênea, e em constante construção e mudança, podemos observar a importância de letramento estar presente em sala de aula, pois ele leva em conta o contexto social dos alunos, o que a aproxima o aluno da sua realidade e com isso propicia a escrita do mesmo, compreendendo que há muitas formas de usar a língua Street (apud KLEIMAN, 1995), contrasta dois modelos de concepção de letramento: o autônomo e o ideológico. O letramento ideológico está estritamente ligado às estruturas culturais e dominantes do meio onde ocorre, por isso é dependente das relações sociais e considera os contextos de uso. Assim, por exemplo, indivíduos de classes sociais diferentes, tendem a ter relação com a escrita diferenciada, pois se uma pessoa convive mais com o universo da escrita e leitura, terá melhor desempenho; em contrapartida quem vive menos no contexto de leitura e escrita, linguagem letrada dominante, demonstrará menor desempenho nessas habilidades. Segundo Marcuschi letramento: [...] é um processo de aprendizagem social e histórica da leitura e da escrita em contextos informais e para usos utilitários, por isso é um conjunto de práticas, ou seja, ‘letramentos’ [...] Distribui-se em graus de domínios que vão de um patamar mínimo a um máximo. MARCUSCHI, 2001, p.21. Diante disso, pode-se observar a importância do contexto sociocultural no letramento, e que o mesmo vai além da escrita e leitura. O indivíduo já vem para escola trazendo o seu conhecimento de casa, o que deve ser valorizado, pois é o seu contexto social e com isso ele não convive e nem é vítima de preconceito linguístico. Conforme afirma Kleiman (2007): [...] assumir o letramento como objetivo do ensino no contexto dos ciclos escolares implica adotar uma concepção social da escrita, em contraste com uma concepção de cunho tradicional que considera a aprendizagem de leitura e produção textual como a aprendizagem de competências e habilidades individuais. (KLEIMAN, 2007, p.4) Entende-se que a escola é considerada um dos maiores ambientes de letramento, que quanto maior for a escolarização do indivíduo, maior poderá ser o seu grau de letramento. No entanto, esse grau de letramento será observado pela sua capacidade de usar o seu conhecimento de escrita e leitura para facilitar a sua vida na sociedade. Pois no cotidiano das sociedades letradas, observa-se continuamente eventos e práticas de letramento vividos por pessoas letradas e por não letradas: quando estes sabem pegar o ônibus certo da sua rota, quando compram algo em um supermercado e sabem manipular sem dificuldade o dinheiro (sabendo o valor a ser pago e o valor do troco), quando a criança entende uma historia lida ou uma explicação de uma brincadeira. Assim, observamos a importância do letramento na escola. 5 Contudo, observa-se a importância de trabalhar gêneros em sala de aula, pois como se sabe o objetivo final do ensino de língua portuguesa é ampliar a competência dos alunos em utilizar a escrita e a leitura como práticas sociais, expandindo assim o letramento dos mesmos. Nos dias atuais, as escolas dão ênfase aos estudos de diversos gêneros discursivos e textuais, como forma de interagir os alunos com os gêneros utilizados no dia a dia. Todos são de demasiada importância. Nesta pesquisa daremos ênfase ao artigo de opinião, pois trabalhar o mesmo em sala de aula é muito importante, faz com que o aluno leia mais, escreva, se interessa pelo o que esta em foco na atualidade, construindo assim um indivíduo crítico. DESCRIÇÃO DE GÊNERO DISCURSIVO/TEXTUAL Embora os estudos de gênero sejam antigos, mas que por meio de Bakhtin eles foram ressignificados, ele propôs que os enunciados são construídos a partir de um gênero do discurso, e assim buscou entender o gênero não somente com os aspectos formais e comuns dos textos, mas como constituídos e constituidores por interações humanas. Bakhtin reconhece a importância do estudo do texto levando em consideração os aspectos linguísticos ou textuais, sendo que o seu foco é o texto como fenômeno sóciodiscursivo, “nas condições concretas da vida dos textos na sua inter-relação e interação” (BAKHTIN, 2003, p.319), “Todo texto tem um sujeito, um autor” (BAKHTIN, 2003, p.308), esse sujeito age em função de destinatário, ficando evidente a importância das relações enunciativas para a concepção de texto. Segundo a teoria de gênero de Bakhtin, o processo de produção de gêneros no âmbito das atividades humanas é intermediada pela linguagem, sendo que o processo de constituição dos gêneros está correlacionado às funções das interações sociais da sociedade, que se materializa nos enunciados produzidos nessas interações, sendo que os enunciados remetem as condições específicas e as finalidades da mesma como conteúdo temático, o estilo, e a composição do enunciado. Assim, quando se fala em situação social e relação dialógica, é possível que um diálogo com o conceito de gênero discursivo apresentado por Bakhtin, seja estabelecido: O emprego da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana. Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional [...] Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso. (BAKHTIN, 2003, p. 261- 262) Diante desse conceito, pode-se destacar que a opção pelo termo gênero de discurso é importante, pois trabalha vários itens do português em sua elaboração, e ver que ele tem uma estrutura, conteúdo, estilo de linguagem, seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua na sua construção. Rodrigues (2005, p.163), apresenta o foco que o autor dá aos gêneros: Essa é a natureza verbal comum dos gêneros a que o autor se refere, i. é, a relação dialética que estabelece entre os gêneros e os enunciados, ou seja, olha os gêneros a partir da sua historicidade (eles não são unidades convencionais) e lhes atribui a mesma natureza dos enunciados (natureza social, discursiva e dialógica), ao tomá-los como seus tipos históricos. Isso é reforçado quando Bakhtin menciona que “o emprego da língua efetua-se em forma de enunciados concretos e únicos”. 6 Compreende-se que os gêneros são constituídos historicamente a partir de situações da vida social, dentro de diferentes formas de interação de comunicação social, sendo que os mesmossão vistos como estáveis. Haja vista que eles se constituem, estabilizam e se modificam conforme a sociedade evolui e muda em várias esferas como no cotidiano, religiosa, política, jornalística, etc. Sempre que a sociedade amplia, e cria novas situações sociais de interação vão criando também novos gêneros, como por exemplo: antes usávamos carta pessoal, mas hoje com as novas tecnologias usa-se o e-mail, ou seja, com a modernidade e com as tecnologias em avanço criou-se vários gêneros novos. Por esse motivo é ensinado os gêneros em sala de aula para que o aluno se interaja com o meio. Diante de tantos gêneros presente em nossa sociedade, trabalharemos com o artigo de opinião. DESCRIÇÃO DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO O Artigo de opinião é um gênero discursivo, pertencente ao tipo de texto dissertativo- argumentativo que geralmente é veiculado em jornais, sites e revistas, em que o autor (articulista) tem a finalidade de apresentar o seu ponto de vista em determinado tema relevante socialmente. Pode também tratar de temas polêmicos, em que são apresentados fatos, dados estatísticos e discursos para fundamentar a tese do autor. Esse gênero possui características de um texto jornalístico e tem como principal objetivo informar e persuadir o leitor sobre um determinado assunto, usando a argumentação como seu principal recurso retórico nos textos que são disseminados pelos meios de comunicação. Usa a linguagem verbal escrita para se posicionar ante um tema, e para que outras pessoas possam intervir socialmente para assim contribuírem com questões que estão em voga, oferecendo subsídios para outros também se posicionarem a respeito de questões importantes, que vão desde à política, à educação, ao meio ambiente, àquelas de âmbito internacionais, ou voltadas a questões sociais e à ética. Esse tipo de texto geralmente aborda temas atuais, tem como características a argumentação e persuasão; textos em 1ª e 3ª pessoa; geralmente é assinado pelo autor; possuem uma linguagem simples, objetiva e subjetiva; o uso de verbos no presente imperativos, e possuem títulos polêmicos e provocativos. Como estrutura apresenta introdução, desenvolvimento e conclusão, e para se escrever um artigo tem que se ler bastante sobre o assunto, para assim poder desenvolver o texto, conforme Bakhtin apresenta: O emprego da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana. Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional [...] Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso. (BAKHTIN, 2003, p. 261- 262) O artigo de opinião visa a defesa de uma ideia, para isso é preciso que se construa uma tese sustentada por argumentos que podem fundamentar uma conclusão a respeito do tema abordado pelo autor, de maneira propositiva ou sintética. E para que este texto seja bom o articulista tem que antecipar-se com contra-argumentações de possíveis posicionamentos contrários de seu interlocutor. Assim sendo, é fundamental que se estude bastante o assunto antes da produção do texto, para que o mesmo seja convincente. 7 Artigo de opinião é um gênero bastante abordado nas escolas por fazer com que os alunos leiam mais, que estejam interagidos com a realidade, e para que os mesmos se tornem escritores e leitores críticos, que defendam o seu ponto de vista, conforme Soares (1998, p.72) afirma que “letramento não é pura e simplesmente um conjunto de habilidades individuais; é o conjunto de práticas sociais ligadas à leitura e a escrita em que indivíduos se envolvem em seu contexto social”. Práticas estas que através da escrita dos discentes na produção de artigo de opinião, pode-se perceber através da leitura dos textos a presença de valores, crenças, e sentimentos expressos na escrita. ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO E DO ARTIGO DE OPINIÃO O livro a ser analisado é o “Aprender +” da SEDUCE e distribuído pela Seduc Goiás, destinado ao 9º ano, o mesmo é divido em três volumes (um para cada bimestre), sendo que cada volume é divido em duas partes, português e matemática. Este material tem como finalidade preparar os alunos para as provas do “SAEGO” e “PROVA BRASIL”. Neste trabalho analisaremos a parte referente a português do volume 3 do Caderno de atividades “Aprender +”. Esta parte é subdividida em 8 unidades, sendo que cada unidade tem foco em diferentes gêneros, como por exemplo: Unidade 1 – Gênero textual: Artigo de opinião Unidade 2 – Gênero textual: Artigo de opinião Unidade 3 – Gênero textual: Sinais de transito Unidade 4 – Gênero textual: Novelas Unidade 5 – Gênero textual: Novelas Unidade 6 – Gênero textual: Poemas Unidade 7 – Gênero textual: Poemas Unidade 8 – Gênero textual: Notícias Observando que esse Caderno tem como foco o estudo dos gêneros. Cada unidade além dos gêneros, tem atividades em que abordam diferentes expectativas, como por exemplo na unidade 1 abordam: interpretação de texto, estratégias de leitura, formulação e verificação de hipóteses, variação linguísticas, gramática, entre outros conforme a unidade. Também abordam diferentes descritores os quais são exigidos pelo Currículo Referência como: identificar a tese do texto (D7), estabelecer relação entre a tese e a argumentação (D8), estabelecer relações entre partes do texto (D2 B), estabelecer relação entre causa e consequência (D11), identificar marcas linguísticas (D13), identificar a finalidade de textos em diferentes gêneros (D12), Estabelecer relações logico-discursivas presentes no texto (como conjunções, advérbios, etc) (D15), entre outros. Por conseguinte, iremos analisar a unidade 1, gênero artigo de opinião, nessa unidade temos um artigo “O grande sertão da misoginia” do jornalista Ivan Martins, que foi publicado na revista ÉPOCA em 2015. Sendo que o contexto de produção desse artigo é que ele circula na esfera jornalística, tendo como suporte a revista Época de 2016, na coluna de Ivan Martins. Os destinatários são os leitores da revista, que é uma coluna de formadores de opinião. O objetivo do texto é posicionar-se sobre questões polêmicas e controversas, de importância político-social, particularmente sobre o “respeito pelas mulheres”. Com relação ao conteúdo temático, conforme Rodrigues (2005), refere-se à opinião, ao posicionamento do articulista a respeito de um acontecimento de relevância social que sempre noticiado e vivenciados pela sociedade tanto atual quanto no passado. O texto em voga trata de questões sociais referente a mulher, de ser desrespeitada, abusada, violentada, etc. Segue o texto “O grande sertão da misoginia” na figura 1, abaixo: 8 Figura 1 – texto “O grande sertão da misoginia” Fonte: Caderno de atividades Seduc Goiás A construção do texto, obedece às formas de organização textual, que são a estrutura e acabamento do texto. Assim, ao abordar as “formas estáveis de gênero”, Bakhtin (2003, p.282), afirma que “falamos apenas através de determinados gêneros do discurso, isto é, todos os nossos enunciados possuem formas relativamente estáveis e típicas de construção do todo” (BAKHTIN, 2003, p.282). Desse modo, o texto analisado é estruturado a partir de uma sequência argumentativa, como contextualização a ser discutida, explicação da posição do inicio da argumentação, contra-argumentação, argumentação, solução, assim em cada paragrafo até a conclusão do artigo. a) Contextualização da questão a ser discutida: A letra da música da dupla sertaneja Max e Mariano explica a confusão em que se meteram: “Semana passada mesmo a genteficou. E, sem que você percebesse, eu gravei de nós dois um vídeo de amor. Eu quero 9 ver a sua cara quando alguém te mostrar, quero ver você dizer que não me conhece”. b) Explicação da posição do início da argumentação: “...eu não tenho dúvida que no grande sertão da misoginia onde esses caras brotaram há muito mais gente que pensa como eles, homens e mulheres capazes de cometer de alma leve o crime que eles celebram e incentivam com a sua música ruim”; “Quando se trata de respeito e consideração pelas mulheres, o Brasil é uma catedral do atraso. Algumas leis são bacanas, mas os costumes são medonhos”. c) Contra-argumentação: “A tempestade que caiu sobre a cabeça enchapelada dos apologistas do crime nos dá alguma esperança no Brasil, mas é pequena”. d) Argumentação: “Por isso eu acho a cultura brasileira misógina: o comportamento escroto em relação às mulheres é socialmente tolerado em todas as classes sociais e geografias, embora em toda parte seja coisa de minoria”; “esse tipo de comportamento não brota do nada, deve haver gente ao redor deles dando exemplo - ou sendo leniente com seus meninos”; “Comprovada na justiça, ela deveria ficar na ficha policial do jovem musculoso para que seus futuros empregadores saibam como ele pode ser obstinado”; “Que tipo de sociedade produz esse tipo de gente? Que tipo de instituições permitem que continuem agindo impunemente por tanto tempo?” e) Solução 1: “a mesma sociedade em que uma dupla sertaneja grava uma música incentivando o pornô de vingança. A mesma em que moleques mimados agridem as garotas impunemente”. f) Contra-argumentação 1: “A mesma em que o machismo prolifera, insidioso, na forma de um profundo e ostensivo desrespeito pelos direitos mais elementares das mulheres: g) Conclusão: “A mesma em que o machismo prolifera, insidioso, na forma de um profundo e ostensivo desrespeito pelos direitos mais elementares das mulheres: andar na rua sem ser incomodada, estar sozinha em público sem ser abordada, dançar com as amigas sem ser agarrada dizer não sem ser agredida ou morta. Falamos do Brasil, naturalmente”. Primeiramente, observamos que o texto em questão possui um discurso marcado pelo uso da primeira pessoa: “Até ontem, eu não sabia da existência da dupla sertaneja Max e Mariano” e a terceira pessoa: “Quando se trata de respeito e consideração pelas mulheres, o Brasil é uma catedral do atraso”, utiliza o presente do indicativo na apresentação da tese e dos argumentos: “Quando se trata de respeito e consideração pelas mulheres, o Brasil é uma catedral do atraso. Algumas leis são bacanas, mas os costumes são medonhos”, usa narrativas para dar maior credibilidade ao argumento empregado, como o do senador Romário, “onde o senador Romário defende a criação de uma lei específica contra a exposição da intimidade alheia na internet”, utiliza marcadores argumentativos, entre tantas outras marcas linguísticas. Abaixo segue as atividades do caderno da Seduc Goiás: Figura 2: Atividades do Caderno de atividades - Seduc - Goiás 10 Fonte: Caderno de atividades Seduc Goiás. Figura 3: Atividades do Caderno de atividades - Seduc - Goiás Fonte: Caderno de atividades Seduc Goiás Diante das atividades do caderno, observamos que o foco deste Caderno são questões sobre interpretação de texto, tema, pontuação, argumentação, gramática (posição do pronome pessoal, entre outros), como uma forma de treinar os alunos para responder as provas do governo “SAEGO”E “PROVA BRAIL”. Portanto, observa-se que este material didático deixa a desejar com relação ao aprofundamento do artigo, quanto ao seu contexto e estrutura, que não são abordados, fica a para o professor abordar, pois estes itens são extremamente importantes, para entender, compreender o artigo de opinião, o que é fundamental para a formação crítica do aluno. 11 CONCLUSÃO As reflexões apresentadas neste artigo tiveram como foco a teoria de Letramento associado ao ensino de gênero discursivo/textual artigo de opinião em sala de aula, partindo análise do Caderno de atividades “Aprender +”, destinado ao 9º ano do Ensino Fundamental Final, que tem como foco preparar os alunos para as provas do governo “SAEGO” e “PROVA BRASIL”, no qual analisamos o texto da unidade 1 – artigo de opinião, da parte de língua portuguesa do mesmo. Constatou-se por meio dos estudos a importância do letramento em sala de aula, e de valorizar o conhecimento que os alunos trazem de casa, aproximando-os assim da escola e da escrita. E entendendo que as práticas sociais são importantes para o ensino dos gêneros. Haja vista que os estudos sobre letramentos corroboram com as noções de que a leitura e escrita não se limita à decodificação do signo linguístico ele vai além, pois visa analisar o contexto social e as práticas sociais enfatizadas pelo conceito de Letramento. Entende-se que a leitura é de fundamental importância para desenvolver as produções escritas. Essas práticas sociais, entretanto, encontram no Caderno de atividades uma contribuição, para com o ensino dos gêneros textuais/discursivos. Ele contribui no sentido de abrir caminho à reflexão, mas limita o potencial reflexivo, pois está focado nas provas do governo, e com isso traz abordagens sobre temas relevantes, in caso, do artigo de opinião “O grande sertão da misoginia”, que aborda o tema sobre respeito às mulheres, mas que não o faz de forma contextualizada, histórica, interdisciplinar, a fim de trazer o aluno para o debate amplo, e também não trabalha as questões de estrutura do artigo de opinião. Neste sentido, as reflexões são limitadoras, pois ignoram as vivências dos alunos, deixado de se tornar mais significativa as atividades. Visto que, ao abordar sobre o respeito à mulher, sem considerar o contexto histórico e a metodologia interdisciplinar, a proposta didática se reduz, perde a oportunidade enriquecedora de abrir horizontes a partir dos quais o aluno poderia construir conhecimento reflexivo. Não se trata, aqui, de generalizações, tampouco de negação do Caderno de atividades da Seduc-Goiás, e sim de reflexões pertinentes ao ensino e à aprendizagem. Pois os alunos devem ir além, de somente estudar determinado conteúdo visando as provas do governo, eles tem que aprender todo o conteúdo da melhor forma. Visto que, o estudo do gênero artigo de opinião é importante para os alunos, por esse motivo ele tem que ser mais aprofundado, debatido e trabalhado a sua estrutura. Por esse motivo, novas análises de livros e cadernos de atividades didáticos se fazem relevantes na conjuntura social, econômica, política, a fim de instrumentalizar tanto os docentes e os discentes no sentido de desembaçar as lentes da leitura e desfazer alguns entraves que empobrecem a produção textual em salas de aula. Considerando a importância de trabalhar gênero na escola, por meios de artigos com temas relevantes da atualidade, como o tema abordado no artigo “respeito às mulheres”, de fundamental importância ser debatido em sala, pois tem-se várias vítimas todos os dias, e que persiste na nossa sociedade. REFERÊNCIAS BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Tradução de Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003 [1979]. HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo: Objetiva, 2001. KLEIMAN, Angela B. Os Significados do Letramento: uma nova perspectiva sobre a 12 prática social da escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1995. KLEIMAN, Angela B. Linguística aplicada e formação de professores. Ceale. Belo Horizonte: Universidade Federal de Belo Horizonte, 2008. . KLEIMAN, A.B. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo. Santa Cruz do Sul/RS, v. 32, n. 53, p. 1-25, dez, 2007 MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001. RODRIGUES, R. H. Os gêneros do discurso na perspectiva dialógica dalinguagem: a abordagem de Bakhtin. In: MEURER, J. L.; BONINI, A.; MOTTA- ROTH, D. (Org.). Gêneros: teorias, métodos e debates. São Paulo: Parábola, 2005. p. 152-183. ROJO, R. H. R. Coletâneas de textos nos livros didáticos de Língua Portuguesa: letramentos possíveis. In: COSTA VAL, M. G. (Org.). Alfabetização e letramento: o que ensinam os livros didáticos? Belo Horizonte: Autêntica; CEALE, [2007, no prelo]. ROJO, R. Gêneros do discurso e gêneros textuais: questões teóricas e aplicadas. In: MEURER, J. L.; BONINI, A.; MOTTA-ROTH, D. (Orgs.). Gêneros teoria, métodos e debate. São Paulo: Parábola, 2005. Capítulo 9. SEDUCE. Aprender +. Livro 9º ano – vol. 3. Seduc - Goiás. 2017 SOARES. M. Letramento: Um tema em três gêneros. Belo Horizonte. Autêntica Editora, 3o edição, 2014. STREET, Brian. Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação. Brian V. STREET ; tradução Marcos Bagno. - 1. ed. - São Paulo : Parábola Editorial, 2014.
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