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Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 1 MONALIZA EHLKE OZORIO HADDAD O PROCESSO DE MEDIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA INCLUSÃO SUPERANDO OS LIMITES E ENFATIZANDO AS POTENCIALIDADES NA VISÃO DA FAMÍLIA E DOS PROFESSORES 2 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão São Paulo - SP 2020 Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 3 São Paulo - SP 2020 O PROCESSO DE MEDIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA INCLUSÃO REALIZAÇÃO PATROCÍNIO http://www.reinoeditorial.com.br/wpre/ http://www.reinoeditorial.com.br/wpre/ http://www.reinoeditorial.com.br/wpre/ http://WWW.VIADUPLA.COM http://http://www.reinoeditorial.com.br/wpre/ 4 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Copyright © 2020 by Monaliza Ehlke Ozorio Haddad - Todos os direitos reservados. Este livro não pode ser copiado ou reimpresso. O uso de citações do texto ou cópias de páginas isoladas para estudos é permitido e encorajado, mediante solicitação. Este livro foi editado no Brasil segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, respeitando porém as particularidades da grafia adotada em Portugal, quando cabível, ou a língua espanhola, em deferência à origem dos colaboradores. Edição: Cássio Barbosa / cassio@reinoeditorial.com.br Curadoria: Arismar Garcia / arismargarcia@reinoeditorial.com.br Imagem da capa: Pixabay Produção: Reino Editorial Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) H126x Haddad, Monaliza Ehlke Ozorio. O processo de mediação da aprendizagem na inclusão : superando os limites e enfatizando as potencialidades na visão da família e dos professores / Monaliza Ehlke Ozorio Haddad. – São Paulo : Reino Editorial, 2020. 160 p. : il.; 23 cm. Inclui bibliografia 1. Inclusão escolar. 2. Educação especial. 3. Ensino básico. 4. Deficiência intelectual. 5. Aprendizagem. 6. Síndrome da fragilida- de do cromossomo X.b 7. Superação - depoimentos. I. Título. CDU 376 CDD 371.9 (Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araújo – CRB 8/10213) Produzido por Reino Editorial Ltda. www.reinoeditorial.com.br comercial@reinoeditorial.com.br Telefone: (11) 5575-8870 Impresso no Brasil / Printed in Brazil mailto:cassio@reinoeditorial.com.br mailto:arismargarcia@reinoeditorial.com.br www.reinoeditorial.com.br mailto:comercial@reinoeditorial.com.br http://www.reinoeditorial.com.br/wpre/ Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 5 Ninguém é igual a ninguém. Todo ser humano é um estranho ímpar. Carlos Drummond de Andrade 6 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 7 Monaliza Ehlke Ozorio Haddad Doutora em Ciências da Educação - UE - Portugal; Mestrado em Educação - UTP; Especializações: Psicopedagogia e Didática do Ensino Superior - PUC-PR, Educação Especial UFPR, MBA em Gestão Escolar - OPET. CEO do Instituto de Aprendizagem e Desenvolvimento - IAD. Professora de graduação e pós-graduação. Master Coach pessoal e executivo. Analista Comportamental. Artigos científicos publicados na área educacional na China, Espanha, França e Portugal. Palestrante e Consultora. Lattes: http://lattes.cnpq.br/5247975204692174 E-Mail: monalizahaddad@gmail.com WhatsApp e Telefone: +55 41 99989-9332 Facebook & LinkedIn: Monaliza Haddad http://lattes.cnpq.br/5247975204692174 mailto:monalizahaddad@uol.com.br https://www.facebook.com/monaliza.haddad https://www.linkedin.com/in/monaliza-ehlke-ozorio-haddad-74771a25/ 8 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 9 Colaboradores Maria Manuel Parrinha Frank Valentin Sulimar Beloto Katia Kichiro de Aquino Helena Oliveira Gonçalves Simões Marijose Marin Villapol Sandra Ximenes Cristine Oliveira Marcia Gaspar Bianca Oliveira Miriane Lima Mello Filomena Silva Sylvie Teixeira da Cunha Ana Godinho Cármen Rosa Ramos Paula Leão 10 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Introdução A iniciativa de escrever esta obra foi por evidenciar que a inclusão ocorre primeiramente dentro de casa, com a família sendo es- sencial em demonstrar o quanto é forte e imponente no processo de participação do desenvolvimento de seus filhos, desde o nascimento e durante toda a vida. Após o diagnóstico, a família assume para si a responsabilidade de tornar o desenvolvimento do seu filho prioridade no dia a dia, sem pausas, sem férias e com um enorme benefício: o próprio crescimento dos queridos filhos. A família geralmente busca superar a situação e, diante do diag- nóstico, não apresenta um sentimento de recusa dos fatos. Ela arregaça as mangas e põe-se a trabalhar. Não fica, ou se espera que não fique, em nenhum momento, se vitimando ou procurando um culpado. Ao assumir a necessidade em não medir esforços, as mães e os pais começam a planejar a melhor forma de trabalhar no desenvolvimento dos filhos, e devido a este fator é que resolvi escrever esta publicação com depoimentos de pais que muito contribuem para o desenvolvimento dos seus filhos. Não poderia deixar de mencionar que os professores também fazem a sua parte, mas, estes vêm posteriormente à família. Ou seja, Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 11 a escola é considerada a segunda instância mais alargada socialmente na vida de uma criança. As escolas desempenham as suas funções e devemos valorizar as boas práticas desenvolvidas pelas instituições e pelos professores, para que aqueles professores que ainda justificam que não conseguem traba- lhar com a inclusão possam perceber nos depoimentos dos professores e dos pais desta obra o quanto o seu trabalho pode ser considerado como um divisor de águas no desenvolvimento de uma criança. Iremos, a partir das próximas páginas, nos deparar com depoi- mentos carregados de aspectos culturais, sociais, cognitivos, físicos e políticos, onde os pais e professores, em seus dizeres, explicitam sentimentos fortes e significativos em relação à literatura sobre os desafios e as superações acerca da inclusão. Recorro ao livro “Desafios e Superações da Inclusão” e destaco que as crianças incluídas (...) apresentam características próprias e que o processo de ensino e de aprendizagem tem a necessidade de estratégias pedagógicas com o objetivo da apropriação deste processo. Haddad (2019, p. 29). Como investigadora e proprietária do Instituto Aprendizagem e Desenvolvimento – IAD há mais de vinte anos, acompanho as famílias e posso dizer que tenho imenso prazer em conhecê-las e de acompa- nhar o desenvolvimento dos filhos que hoje ainda são crianças, outros já adolescentes e até adultos, que compõem esta obra ou muitos que fazem parte da minha história. No IAD também atuo como avaliadora e quando concluo um processo avaliativo deixo claro às famílias que, independentemente do diagnóstico que eu, juntamente com uma equipe multidisciplinar, daremos sobre seu filho, ele sempre será seu filho e nós já o amamos como ele é, independente de diagnóstico. A minha questão central em um processo avaliativo é: “O que ainda podemos melhorar?” “Como podemos fazer para que o desen- volvimento desta criança, adolescente ou adulto venha a ocorrer de forma eficaz, mas palpável?”. “E, por que não dizer que o desen- volvimento deverá ser de uma forma que facilite a vida de todos ao 12 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão redor do diagnosticado?” Cada um compõe uma história de vida diferente, um tempo de desenvolvimento diferente e é onde nos deparamos com a beleza da vida. Nem todos se desenvolvem e se desenvolveram ao mesmo tempo, portanto, o respeito a cada um é imenso, a cada vida damos um ar de magia única, inigualável e inexplicável. Quando me pergunto o que esperamos da vida e da vida dos nossos herdeiros, esperamos que acima de tudo sejamos felizes! “O que é preciso para alcançar a tal felicidade?” A felicidade do filho inclui a alegria dos pais, portanto o melhor é caminharmos na direção escolhida. Para iniciar esse momento em conjunto, divido com vocês a letra desta música, quenos explicita um pouco do que estamos abordando. Pra ser feliz - Daniel https://www.youtube.com/watch?v=P-F90uraZ0I Às vezes é mais fácil reclamar da sorte Do que na adversidade ser mais forte Querer subir sem batalhar Pedir carinho sem se dar Sem olhar do lado Já imaginou de onde vem A luz de um cego Já cogitou descer De cima do seu ego Tem tanta gente por aí Na exclusão e ainda sorri Tenho me perguntado https://www.youtube.com/watch?v=P-F90uraZ0I Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 13 Pra ser feliz Do que o ser humano necessita? O que é que faz a vida ser bonita? A resposta, onde é que está escrita? Pra ser feliz O quanto de dinheiro eu preciso Como é que se conquista o paraíso Quanto custa Pro verdadeiro sorriso Brotar do coração Talvez a chave seja a simplicidade Talvez prestar mais atenção na realidade Por que não ver como lição O exemplo de superação De tantas pessoas O tudo às vezes se confunde com o nada No sobe e desce da misteriosa escada E não tem como calcular Não é possível planejar Não é estratégico Pra ser feliz Do que é o ser humano necessita? O que é que faz a vida ser bonita? A resposta, onde é que está escrita? Pra ser feliz O quanto de dinheiro eu preciso 14 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Como é que se conquista o paraíso Quanto custa pro verdadeiro sorriso Brotar do coração Para finalizar, o que me move de forma muito instigadora é: TO- DOS SOMOS CAPAZES! Bem-vindo a este livro! Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 15 Um diálogo e um olhar diferenciado da família e dos professores visando o desenvolvimento e a aprendizagem Somos todos seres em evolução, nada fica estagnado, tudo se de-senvolve. Desenvolvimento este que podemos deixar em evidência acontecendo por meio da mediação do outro, ou seja, dos pais, dos colegas da escola e de todos que nos cercam. No livro “X Frágil e Inclusão Escolar: A Inclusão Escolar dos Alunos com Síndrome do X Frágil nos anos iniciais de escolaridade – na perspectiva dos pais e professores em Portugal e no Brasil” – que é de minha autoria, na página 57, eu esclareço que é necessário valorizar o processo de mediação. Entender que a educação exerce um importante papel no desenvolvimento dos indivíduos implica reconhecer que, pela sua mediação, o homem cons- titui-se a si mesmo no decorrer de sua existência social, produzindo experiências individuais e agre- gando as contribuições das experiências de outros indivíduos, no sentido de recriar as condições de vida da comunidade. Haddad, (2019, p 57). Costumo sempre fazer a referência em minhas palestras que somos como as bonecas russas, as matrioskas. Estamos em evolução. Para nos tornarmos a maior delas, temos dentro de nós mesmas inúmeras 16 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão outras menores que compõem o todo. Já fui menor para ser maior no que se refere a desenvolvimento. Preciso mencionar que a escola e a família têm papel importante e devem ser consideradas parceiras no desenvolvimento dos alunos, pois a inclusão não ocorre apenas nos espaços escolares e sim na sociedade de forma geral. Haddad (2019, p 145). Quando pensamos na nossa vida em sociedade, temos que admitir que o outro é fundamental para o nosso desenvolvimento, é com quem aprendemos diariamente. Eu e você não nascemos prontos, estamos neste mundo para apren- der nas coisas positivas e nas coisas negativas. Onde viver é aprender. O desenvolvimento humano é sair da zona de conforto, é ser desafiado em muitas situações na nossa vida. Como pesquisadora, sempre estudei o desenvolvimento humano e, para entender o ser humano, eu realmente preciso compreender a essência de cada um, respeitando o que cada um tem de melhor. Inde- pendente dos países onde eu já desenvolvi alguns trabalhos, a busca Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 17 pelo meu próprio desenvolvimento e o desenvolvimento do outro sempre se fez presente na minha trajetória de vida. Acredito que é para isto que aqui estamos. Quando penso no que me constitui, consigo me reportar ao que eu aprendo e ao que eu ensino, pois para ensinar algo é preciso antes aprender. Nesta mesma direção, me deparo com a amorosidade. É impossível dar amor sem ter amor e todos os depoimentos aqui trans- bordam de uma palavra e sentimento em comum: O AMOR. Nas histórias de vidas descritas aqui pelos colaboradores desta obra, iremos nos deparar com a descrição da percepção dos pais e dos professores de algumas áreas mais potencializadas ou outras áreas que ainda precisam ser trabalhadas para chegar na superação de algumas di- ficuldades encontradas no caminho e vivenciadas pelos filhos e alunos. O meu trabalho é dedicado ao desenvolvimento humano, a todas as pessoas que querem VIVER a vida que as inspira, aquilo que as apaixona, a viver os seus sonhos, as quais sentem que, muitas vezes, precisam tomar a decisão de mudar algo ou de transformar a sua vida ou a do outro como um propósito maior. Vivemos os propósitos dia a dia. Quando os propósitos estão na mesma direção é mais fácil, temos os mesmos pensamentos e as mesmas esperanças. Temos escolhas e prioridades, nós estamos aqui. Para compreender um pouco mais sobre isso, partilho com vocês a letra desta música. Beyoncé - I Was Here - Eu Estava Aqui https://www.youtube.com/watch?v=OIGEx2aHGdU Quero deixar minhas pegadas sobre as areias do tempo Saber que havia algo lá e que isso significou algo que eu deixei como legado Quando eu deixar este mundo, não vou deixar arrependimentos https://www.youtube.com/watch?v=OIGEx2aHGdU 18 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Vou deixar algo para lembrar, então eles não vão esquecer Eu estava aqui Vivi, amei Eu estava aqui Fiz, concluí Tudo que queria E foi mais do que pensei que seria Vou deixar minha marca para que todos saibam Eu estava aqui Quero dizer que vou viver cada dia até eu morrer E saber que eu tinha algo na vida de alguém Os corações que toquei serão a prova que deixo De que fiz a diferença e este mundo vai ver Eu estava aqui Vivi, amei Eu estava aqui Fiz, concluí Tudo que queria E foi mais do que pensei que seria Vou deixar minha marca para que todos saibam Só quero que eles saibam Que dei o meu tudo, fiz o meu melhor Trouxe alguma felicidade a alguém Deixei este mundo um pouco melhor simplesmente porque Eu estava aqui. Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 19 Queremos deixar as nossas marcas, queremos ser o diferencial na vida das pessoas e tenho a certeza de que ao partilhar suas histórias de vida, as famílias e os professores também estão deixando o seu legado. O meu trabalho é voltado à inclusão, portanto espero que ninguém fique de fora, que façamos tudo para que os direitos humanos estejam cada vez mais próximos de todos nós. Não existe inclusão fora de nós e este é o primeiro passo para incluirmos! Os depoimentos a seguir, fornecidos pelos colaboradores, sendo estes pais e professores, vão impressionar vocês e também nos emo- cionar ao percebermos o desenvolvimento de cada um no dia a dia. O nosso maior desejo é difundir e socializar que o trabalho desen- volvido pelas famílias e pelos professores pode fazer a diferença na vida de seus filhos e de seus alunos. Quando encontramos o diálogo, a empatia e a boa-vontade, eles permanecem presentes nos cotidianos familiares e escolares. 20 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Metodologia desta obra Este estudo tem como objetivo geral descrever o desenvolvimento das crianças e adolescentes e também divulgar o trabalho realizado pelas famílias e pelos professores sobre boas práticas que realizaram com vistas à inclusão e aos aspectos considerados mais significativos para o desenvolvimento dos seus filhos e alunos. Como esta obra envolve a participação de pessoas, todas ao serem convidadas para darem os seus depoimentos aceitaram o convite e autorizaram a publicação, por considerarmos os princípios éticos men- cionados por Lessard-Hébert et al. (1990), informandoos pesquisados sobre os objetivos da investigação a ser desenvolvida, protegendo-os sobre a confidencialidade. Nesta investigação foi utilizada a metodologia qualitativa na perspectiva interpretativa, com uso da técnica de análise de conteúdos, com entrevistas semiestruturadas, contendo questões específicas para pais, professores e também depoimentos livres. Iniciou-se o primeiro contato com os sujeitos desta investigação em 2014/2015, através de entrevistas semiestruturadas baseadas em questões sobre dados de identificação, escolarização e processo de inclusão. Vamos encontrar nesta obra depoimentos que foram escritos pelos Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 21 colaboradores com a descrição dos relatos dos pais e dos professores e também a transcrição das entrevistas realizadas por mim em 2014/2015, para a minha pesquisa de doutorado. A parte complementar, de 2020, nos dados, de forma mais atualizada, nos foi enviada para uma melhor compreensão e acompanhamento por parte do leitor sobre o desenvol- vimento das crianças e dos adolescentes em um tempo de cinco anos. Além destas entrevistas, no ano de 2020, alargamos a investigação e recorremos também a outros casos de atendimentos. Muitos deles por considerar como boas práticas o que os pais e professores desenvolvem em diversas partes do mundo. Eles puderam dar os seus depoimentos de forma livre, relatando sobre as questões consideradas mais signifi- cativas em relação ao desenvolvimento de seus filhos. 22 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Histórias de vida: um belo exemplo de mediação e interação entre pais e filhos, resultando no processo de aprendizagem e desenvolvimento pessoal Estamos sempre interagindo e aprendendo uns com os outros, é um processo de mediação muito constante em nossas vidas. Iremos agora nos deparar com histórias de vida onde o amor, o companheirismo e a presença da família fazem toda a diferença. Muitos depoimentos aqui encontrados mostram a afetividade em primeiro lugar e demonstram que as perspectivas de sucesso estão baseadas neste fator. A partir de agora teremos os depoimentos dos pais e professores descritos por eles mesmos sobre seus filhos e alunos. O depoimento a seguir é da presidente da Associação Portuguesa da Síndrome do X Frágil, a qual tive a honra de convidar para prefa- ciar o meu livro sobre a SXF e também a acompanhar as famílias em um trabalho desenvolvido em 2015, em Portugal. Parrinha (2019) nos esclarece que, Nunca me canso de recordar o que Madre Teresa de Calcutá respondeu, quando a questiona- ram, que o seu trabalho era uma gota de água no oceano, ao que ela respondeu que o oceano é feito de gotas de água. Por isso, em nome das famílias portuguesas X Frágil, o nosso muito obrigado Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 23 Monaliza por ter deixado cair no oceano, que é a deficiência intelectual, a sua primeira “gota de água” sobre a problemática da INCLUSÃO escolar nos nossos dois países. BEM HAJA Maria Manuel Parrinha Presidente da Associação Portuguesa da Síndrome do X Frágil 24 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Reflexões sobre a Deficiência Intelectual – DI Maria Manuel Parrinha Maria Manuel Parrinha Presidente da Associação Portuguesa da Síndrome do X Frágil geral@apsxf.org “Tenho um filho, Francisco, que atualmente, tem 20 anos, é portador da doença da Síndrome do X Frágil e foi diagnosticado aos três anos de idade. Embora ele tenha um bom entendimento do que se passa à sua volta, ele não fala, o que faz com que o grau de deficiência intelectual dele seja grave. Controla os esfíncteres desde os sete anos, come, veste-se e despe- se sozinho, é bastante autónomo. No entanto, esta autonomia levou anos a ser conquistada e muitas vezes com regressões, provocando em nós, cuidadores, um sentimento de frustração. Este caminhar, ao longo destes 17 anos, é um caminhar igual ou parecido a milhares ou até milhões de pais com filhos deficientes intelectuais, por isso decidi não deixar o meu testemunho, enquanto mãe e cuidadora do Francisco, mas sim partilhar convosco algumas reflexões sobre “Como ser pai ou mãe de uma criança, jovem ou adulto deficiente intelectual”. mailto:geral@apsxf.org Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 25 “Estas reflexões nasceram da necessidade de ajudar outros pais que procuram a Associação Portuguesa da Síndrome do X Frágil, APSXF” Maria Manuel Parrinha “Estas reflexões nasceram da necessidade de ajudar outros pais que procuram a Associação Portuguesa da Síndrome do X Frágil, AP- SXF, da qual eu faço parte dos Órgãos Sociais. Pois ser pai ou mãe é uma profissão dificílima e mais difícil ainda é ser pai ou mãe de uma pessoa com uma deficiência. Desde o dia em que nos é dado o diagnóstico do nosso filho e ao longo do seu desenvolvimento muitos de nós sentimo-nos perdidos, questionando-nos se o que estamos a fazer é o correto ou se é o melhor para eles. Daí a importância de cada um partilhar as suas experiências com o objetivo de tornar o nosso dia a dia mais facilitado. Assim sendo, aqui vão algumas reflexões sobre os nossos filhos com Necessidades Especiais – NE, sobre nós cuidadores e portadores da SXF, sobre a família, sobre a sexualidade na deficiência intelec- tual grave, sobre os profissionais de saúde e de educação e sobre a sociedade em geral: Família Quando recebemos o diagnóstico do nosso filho, seja qual for a deficiência, o casal deve fazer o “luto”, unindo-se ainda mais e não culpando-se um ao outro. O “timing” do homem é diferente do da mulher, normalmente o pai precisa de mais tempo para aceitar a diferença do seu filho. É bom 26 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão procurar-se ajuda de um psicólogo ou fazer-se uma terapia de casal. Nesta fase do luto é muito importante ter-se o apoio da família e dos amigos, não só para ouvirem e confortarem os pais, mas para ficarem de quando em vez com a criança para os pais poderem ter um tempo só para eles. Depois de se ter o diagnóstico de deficiência de um filho, não nos podemos esquecer dos irmãos mais velhos, caso eles existam, porque estes vão precisar muito do pai e da mãe, eles também têm de fazer o seu “luto”. Tente explicar-lhes de uma maneira muito simples e sem dramas o problema do irmão, pois eles terão de explicar aos amigos e aos colegas o que se passa com o seu irmão mais novo. Enquanto para nós pais, um filho deficiente é especial, para os irmãos não há irmãos especiais, esse sentimento só aparece muito mais tarde. Daí a importância de educarmos todos os nossos filhos do mesmo modo. Intervenção precoce e terapias Uma intervenção precoce é fundamental para um bom desenvolvi- mento do bebé ou da criança, pois com a chegada da adolescência tudo se torna mais difícil, pois há uma mudança de comportamento dos nossos filhos. É fundamental a Terapia Ocupacional para “reprogramar” o bebé ou a criança. Para o terapeuta não é relevante a deficiência A, B ou C, ele só precisa de saber o que é que não funciona, o que é que aquela criança não consegue realizar ou quais são os seus medos. Assim, o TO através de brincadeiras e com a ajuda de brinquedos irá ensinar a criança a realizar determinada tarefa e a ultrapassar os seus medos; Sempre que possível a criança, ao longo do seu desenvolvimento, deve ter apoio de outras terapias, como a Terapia da Fala, Mu- sicoterapia (bateria), Hipoterapia, Natação e/ou Vela Adaptada Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 27 e/ou Surf Adaptado. Quantos mais estímulos melhor para o desenvolvimento da crian- ça. Não esquecer que tem de haver um trabalho de equipa entre os terapeutas, a escola e os pais. O que se faz nas terapias e na escola deve ser continuado em casa, todos têm de remar na mesma direção, daí a importância de os pais assistirem às terapias e de se reunirem frequentemente todos os intervenientes do processo de aprendizagem da criança. Sem este trabalho de equipa todoo trabalho realizado com a criança fica comprometido. É de salientar a importância da re- lação do terapeuta com os pais da criança. O terapeuta tem várias funções, tais como, trabalhar a criança, saber ouvir, ajudar e aconselhar os pais na educação do seu filho e ser a ligação entre a escola e os pais; Escola e a sua função A principal função da escola, através da inclusão, é de sociali- zação, o saber esperar, o saber partilhar, o saber ouvir, o saber conviver e, principalmente, o imitar a “normalidade”. Grande parte do corpo docente, não docente e discente não en- tende o que é a Inclusão. Por isso, cabe aos pais das crianças ou jovens especiais sensibilizarem a escola, organizando palestras ou mesmo sessões de esclarecimento. Caso não haja nenhum profissional de saúde que queira participar, o próprio pai ou mãe, ou ambos, expliquem à comunidade escolar o comportamento do vosso filho. Não é fácil, por vezes, conseguir-se o consentimento da direção da escola, porque, infelizmente, estamos dependentes, não de um decreto-lei, mas da equipa que encontramos numa escola; Muitos pais têm muito medo das mudanças de ciclo dos seus 28 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão filhos, da passagem da pré-primária para a primária e depois do 4º para o 5º ano. Estas mudanças, quando bem realizadas, só os ajudam no seu crescimento, adquirindo mais competências e mais autonomia. Pela minha experiência, eles são mais corajosos do que nós, pais; Ao longo do desenvolvimento dos nossos filhos com deficiência intelectual, não devemos ter certezas relativamente às suas ca- pacidades cognitivas, muitas vezes, achamos que eles não são capazes de realizar determinada tarefa ou atividade, mas com ajudas e persistência, eles não só conseguem realizá-la, como, posteriormente, já não necessitam de acompanhamento; A escola deveria acabar para estes jovens aos 16 anos, o secun- dário para alguns alunos já nada lhes pode oferecer, nem socia- lização nem aprendizagens. Com esta idade, deveriam ingressar no mundo do trabalho, os casos de deficiência intelectual leve e moderado, o que na grande maioria não acontece, o mesmo se passa com os casos graves e profundos, os quais ficam em lista de espera para frequentarem um Centro de Atividades Ocupacionais – CAO, numa instituição; Síndrome do X Frágil – SXF e comorbidades Falando sobre a Síndrome do X Frágil, SXF, gostaria de chamar a atenção aos portadores desta síndrome, referindo, que normal- mente, nós portadores e portadoras, muitas vezes, cuidadores e cuidadoras, estamos focados na SXF e esquecemo-nos que tam- bém poderemos ter ou vir a ter várias patologias associadas à pré-mutação no gene FMR1. Nas portadoras, as mais comuns são a insuficiência ovárica preco- ce (FXPOI) e os transtornos emocionais-psicológicos: depressão, ansiedade e irritabilidade. Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 29 É muito importante estarmos atentos ao comportamento do nos- so progenitor, pois com o avançar dos anos podem desenvolver alguma demência ou vir a sofrer da Síndrome Tremor/Ataxia. Sexualidade na Deficiência Intelectual – DI Gostaria de falar um pouco sobre a sexualidade dos jovens com deficiência intelectual. Não é fácil encontrar algum profissional de saúde que tenha formação na sexualidade na deficiência inte- lectual e cujo grau de deficiência seja grave. O que fazer com a chegada da adolescência? Reprimir através de medicação ou iniciar, com o jovem, uma aprendizagem de noção de privacidade que pode levar anos a ser interiorizada? No caso dos jovens, cujo grau de deficiência é leve ou modera- da, umas sessões de educação sexual têm tido bons resultados, como eles já têm a noção de privacidade, sabem quando e onde se podem se tocar. Nos outros casos, graves e profundos, na minha opinião, o melhor, mas o mais trabalhoso é trabalhar com eles a noção de privaci- dade. Como referi, a interiorização da noção de privacidade leva anos, tem avanços e recuos, e a escola e a sociedade não sabem como lidar com estas situações. O problema da sexualidade está relacionado com o saber contro- lar o desejo sexual, quando pode e onde posso fazê-lo, não numa casa de banho pública, na escola, em casa de alguém, mas sim no meu quarto e com a porta fechada. Os pais, os irmãos e os familiares também têm de saber respeitar a privacidade do seu filho/irmão. 30 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Sociedade Leve o seu filho para todo o lado, ao supermercado, ao cabelei- reiro, ao centro comercial, ao cinema, a um espetáculo musical, à praia, a um café, à piscina, se possível viaje de avião com ele. É natural que, inicialmente, comece a chorar, mas se o for levando regularmente, ele irá habituar-se, por exemplo, ao barulho das palmas num espetáculo ou numa festa de anos. Habitue desde pequeno às mudanças, eles precisam de rotinas, mas têm de saber lidar com os imprevistos, e principalmente eles têm de saber viver em sociedade. Explique aos outros o comportamento do seu filho, distribuindo pequenos cartões, onde explica a deficiência dele/dela. Vai ver que irá ter boas surpresas com a reação das outras pessoas”. Maria Manuel Parrinha nos descortina vários aspectos voltados à ordem social, cultural, política e familiar, ou seja, em sua escrita prioriza uma visão geral diante da Necessidade Educativa Especial, até aspectos referentes ao cotidiano e ao desenvolvimento da família como suporte. Posso afirmar que está sempre pensando e desenvolvendo ações no coletivo em nome da Associação Portuguesa da Síndrome do X Frágil para pais e profissionais. Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 31 Pais: uma descrição de desenvolvimento dos seus filhos, valorizando todos os aspectos trabalhados em busca de melhores resultados! Teremos agora alguns depoimentos de pais de vários países, porém todos sempre em busca de melhores resultados para o desenvol- vimento de seus filhos. Nos relatos a seguir, os pais irão nos contar sobre as experiências vividas, como foi o diagnóstico, o processo de inclusão, terapias fundamentais e o que, na opinião deles, mudou em suas vidas com a chegada de seus filhos. 32 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão “A todos os pais e pessoas envolvidas com o TEA, escolham, em algum momento, atravessar essa ponte, com coragem e esperança” Frank Valentin Paris - França, 2020 Frank Valentin frankrfvalentin@gmail.com “Se eu pudesse resumir em uma palavra o que mais me motiva hoje a escrever este texto, seria a ‘compaixão’ por vocês que lidam diariamente com um autista. A lição de ouro que aprendi após a im- plementação de várias técnicas e tratamentos, é a conexão. A conexão com um autista faz ele sair de seu mundo e entrar no nosso. Mesmo que por alguns segundos todos somos capazes de nos conectar com um autista e, com o passar do tempo, os segundos se transformarão em largos minutos de cumplicidade. Admito que, após o convite feito pela Monaliza Haddad, fiquei por dias pensando como eu poderia tentar transmitir, pela primeira vez, de forma sucinta e direta, parte de minha experiência como pai de um autista. Eu descobri um mundo novo, de uma forma não super- ficial, foi uma opção, já que eu tinha fome de conhecimento. Dentro deste novo mundo, eu precisei buscar caminhos para que eu pudesse tentar entender e, principalmente, me reencontrar com meu filho único, mailto:frankrfvalentin@gmail.com Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 33 Arthur, hoje com seis anos de idade e diagnosticado com Transtorno do Espectro do Autismo – TEA desde seus 18 meses, em meados do ano de 2015. Nossa caminhada em busca do conhecimento começou, logo após o diagnóstico do Arthur. Nós, eu e minha esposa, não demoramos a aceitar o fato de que nossas vidas iriam mudar completamente. De imediato fomos apresentados a terapias comportamentais, ortofonistas, psicólogos e centros especializados. Os especialistas não nos davam muitasesperanças de melhoria e, nesse cenário, sem esperar mais tempo, dêmos início a todos os procedimentos que nos tinham sidos apresentados, como possíveis formas de se “formatar” o Arthur no que diz respeito a seu comportamento. Nenhum profissional nos ensinava a ter um relacionamento com o Arthur. Devo admitir que a abordagem comportamental para o TEA não encontrava em mim uma aceitação natural. Faltava algo. Algo me dizia que deveria existir, em algum lugar, em algum momento, um ou mais caminhos diferentes a seguir para melhor ajudar meu filho e, principalmente, que me permitisse melhor entendê-lo. Poucos meses se passaram e, logo, uma nova etapa de nossas vidas se iniciava agora em outro país, longe do Brasil. Tudo novo. Novas perspectivas e, principalmente, novos e enormes desafios. Aprendemos muito rapidamente que esperar algo acontecer simplesmente não era uma opção para ajudar nosso filho e que tudo dependeria de nossas ações proativas como pais (pesquisas, estudos, buscas, etc.), como paciência e perseverança, muita perseverança! Estando assim em outro país, Arthur, com pouco mais de dois anos e meio, não verbal, com muitos distúrbios de sono e estereotipias, nós conhecemos uma nova abordagem psicoterapêutica com foco no processo de desenvolvimento humano e não só no seu comportamento. Esta nova abordagem se baseia em identificar possíveis deficiências ocorridas em seu processo de desenvolvimento natural e transformá -las – em busca de uma reconstrução. 34 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Essa abordagem nos permitiu, rapidamente, perceber diversas novas maneiras de nos comunicarmos com ele. Percebemos o enorme benefício de se enxergar o autismo como uma condição na qual, para se proteger, nosso filho decidira criar seu próprio mundo. Então, identificamos que seria demasiada pretensão nossa tentar, de todos os modos, forçá-lo a entrar no mundo dito “normal”. Precisávamos encantá-lo para só depois convencê-lo de que sair do seu próprio mundo seria bacana, uma opção. Nesse momento entendemos que existia, metaforicamente, um rio entre o Arthur e nós. Essa condição nos separava, contudo, poderíamos construir uma ponte que juntariam as margens desses mundos distintos. Aprendemos que essa ponte pode ser cruzada por todos aqueles que sinceramente buscam um relacionamento com um autista, par- ticipando de todas as especificidades de seu mundo, sem forçá-lo a nada. Essa revelação nos transformou profundamente como pais para, somente então, transformar o Arthur. Nós construímos uma relação de confiança, de troca, de humilda- de e de entrega. No momento em que nos encontramos com o Arthur em seu próprio mundo, ou seja, atravessamos a ponte, passamos a entendê-lo, a encantá-lo. Nos valemos de técnicas psicoterapêuti- cas adquiridas e só depois passamos a apresentar o nosso próprio mundo a ele. Arthur passou, então, a nos entender melhor e aceitar e participar do nosso mundo, do qual ele não fazia parte ainda, sem sofrimento. A nossa mente se abria enormemente a buscar novas iniciativas para continuar ajudando o Arthur, sempre com o objetivo de fazê-lo progredir, respeitando o seu ritmo e os seus limites. Nos enveredamos então por estudos nas áreas biomédicas, de nutrição e da naturopa- tia que pudessem nos ajudar a encontrar outras opções paralelas à iniciativa psicoterapêutica já existente. Essa nova busca então nos permitiu explorar uma área que rapi- damente se transformaria em um enorme e novo divisor de águas na Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 35 vida de nosso filho. Entendemos novos conceitos, suas consequências e traçamos ações em torno de tópicos como interdependência cére- bro-sistema digestivo, síndrome do intestino irritado, disfunções do sistema imunológico (infecções frias), intoxicação por metais pesados e alimentar (intolerâncias), perturbadores endocrinianos, balancea- mento dos hemisférios do cérebro (esquerdo e direito), suplementos alimentares, regime sem glúten/caseína/soja, dentre outros. Hoje acreditamos que todas essas ações conjuntas, derivadas de diferentes iniciativas tomadas em diversos momentos permitiram, ao Arthur, continuar progredindo com uma melhor saúde física e mental, e isso fez, e continua fazendo, toda a diferença. O progresso do Arthur se tornou evidente quando, aos três anos, ele começou a dormir normalmente (sem acordar à noite), passou a melhor se expressar verbalmente com uma boa dicção, abandonou o uso de fralda e foi aceito na escola maternal (sendo auxiliado por uma pessoa em sala de aula). O Arthur igualmente aprendeu sozi- nho a ler e a escrever quando tinha somente três anos e meio e a se interessar por outros idiomas. Ele passou a se interessar inclusive por música e a tocar piano. Hoje, com seis anos, o Arthur finaliza o período escolar ma- ternal para então entrar no ciclo elementar. Ele se interessa por alguns assuntos mais específicos como idiomas, planetas e, mesmo com a necessidade de ser auxiliado em classe, demostra prazer em estar na escola e com seus colegas. Ele é capaz hoje de brincar de corrida com seus colegas de classe, antes uma atitude impensável, pois ele chorava de medo, na hora do recreio. Apesar de um quadro de hipersensibilidade auditiva e a permanência de algumas estereo- tipias – bem características do autismo – ele é uma criança muito tranquila e que raramente fica doente. Por fim, o Arthur, sem saber, nos transformou como pais; como seres humanos; ele nos fez descobrir novas possibilidades, abrindo portas para novos conhecimentos e novas perspectivas de sermos felizes, mesmo com algumas adversidades. Desejamos, assim, que 36 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão todos os pais e pessoas envolvidas com o TEA escolham, em algum momento, atravessar essa ponte, com coragem e esperança. Faça com que este momento seja especial para você, que seja um momento de celebração. Concluo com a frase de São Francisco de Assis. "Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado... Resignação para aceitar o que não pode ser mudado... E sabedoria para distinguir uma coisa da outra". São Francisco de Assis Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 37 “Um pouquinho sobre um anjo em minha vida” Sulimar Beloto Curitiba – Brasil, 2020 Sulimar Beloto sulimar.beloto71@hotmail.com “Tudo começou com uma gravidez que não estava planejada, afinal eu já tinha quarenta anos e uma filha de quatorze. Mas acredito que estava nos planos de Deus porque ele tinha um propósito muito maior em minha vida e eu vou contar um pouquinho sobre esse anjo em minha vida. Minha gravidez foi interrompida com vinte e quatro semanas porque sou hipertensa e tive pré-eclâmpsia. A Manuela veio ao mundo pesando 790 gramas e medindo 33 cm. Assim que a Manuela nasceu, pude vê-la somente alguns segundos porque ela tinha que ir direto para a Unidade de Tratamento Intensivo – U.T.I. Neonatal da Maternidade Santa Brígida e lá ela ficou por noventa dias, e posso dizer que foram os dias mais longos da minha vida. Um dos momentos mais doloridos foi quando eu tive alta e a Manu não pode ir embora comigo. Fui para casa faltando um pedaço de mim, e ainda me questionando: Se ela sentisse a minha falta? Se ela achasse que eu a estivesse abandonando? No dia 20 de julho de 2011 ela teve alta e mesmo estando muito mailto:sulimar.beloto71@hotmail.com 38 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão feliz com isso o medo tomou conta de mim, fiquei insegura, afinal ela era prematura e pequena demais, frágil demais e eu não tinha ideia por onde começar. A Manuela teve paralisia cerebral e as sequelas foram poucas em vista da gravidade da situação e ali, mais uma vez, Deus estava agindo, assim como em todos os pequenos milagres da vida. O cognitivo dela é perfeito, mas as sequelas foram nos membros inferiores, fazendo com que ela não consiga ficar em pé sozinha e muito menos andar. Durante um ano a Ma- nuela fez tratamento no Hos- pitalAna Carolina Moura Xavier, pelo Sistema Único de Saúde – SUS, onde tinha direito a vários tratamentos. Nesse tempo eu fiz amizade com mais duas mães que tam- bém tinham filhos especiais e isso foi muito importante para mim e acredito que para elas também, porque juntas nós éramos mais fortes. Compar- tilhávamos nossas alegrias e sofrimentos assim como expe- riências, informações, receitas também, afinal tínhamos tem- po de sobra. Isso fazia com que aceitássemos da melhor maneira possível que não somos as únicas e não estávamos sozinhas. Para ser mãe, não se vem com manual de instruções e, depois de um ano, a Manu e todas as crianças que começaram o tratamento juntas tiveram alta, sem ao menos terminarem o tratamento, mas o sistema libera para dar lugar para outras crianças que também precisam. “Meu Deus”, eu pensei. “E agora?” Eles não me encaminharam e nem me orientaram para lugar nenhum. Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 39 Em 2010 as escolas públicas e estaduais estabeleceram que crianças com quatro e seis anos deveriam ser matriculadas na Educação Infantil e Ensino Fundamental. A Manuela faria quatro anos e nunca tinha entrado em escola nenhuma e era especial. Eu não sabia se a matriculava em escola para crianças especiais ou em escola normal. Tomei fôlego, respirei fundo e corri atrás de informações que me ajudassem nesse sentido, afinal existia a Inclusão Social. Em uma pré-escola que eu procurei a diretora, ela disse que eles não estavam prontos para a inclusão. Saí de lá e chorei sim porque o interesse deles por matricularem a minha filha foi zero e quanto à inclusão eles já deveriam estar prontos para isso. Na segunda pré-escola a Manu foi recebida de braços abertos e a diretora pediu que fôssemos conhecê-los para ver se a escola atendia às necessidades dela. E ali começou um novo mundo para ela, onde ela se adaptou às crianças e as crianças a ela. Existiu sim o medinho de não estar por perto por qualquer coisa que acontecesse, mas eu precisava deixar a Manu se virar, se frustrar se isso fosse necessário porque isso faz parte da Manuela e se não ensinarmos nossos filhos ele se tornarão adultos inseguros e imaturos. Eu e a diretora entramos em comum acordo de que seria melhor se ela repetisse mais um ano para que quando entrasse no Ensino Funda- mental, já entraria mais forte. E foi a melhor coisa que fiz porque vejo muitas reclamações de mães de que seus filhos não aprenderam nada. Posso dizer que minha filha já sofreu algum preconceito na escola e ficamos abalados sim, não tem como não ficar, mas conseguimos resolver isso da melhor maneira. Conversei com as mães dos seus amiguinhos da sala de aula e pedi para que conversassem com seus filhos e explicassem a situação e que eles não tinham a mínima ideia do que a Manu já tinha passado para chegar até ali. E deu muito certo porque somos nós os pais que temos que educar e ensinar nossos filhos e respeitarem as diferenças. Seus amiguinhos ficaram mais próximos e mais solidários. 40 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Sempre procurei ter uma boa relação com todas as pessoas que acabavam fazendo parte do dia a dia dela, porque assim a Manu se sente muito mais segura. A família foi essencial em tudo, sozinha não conseguimos nada, devemos ser humildes e acei- tar ajuda sempre que precisar. A vida é assim sempre preci- samos uns dos outros. Mas a cumplicidade en- tre você e seu filho é essencial, hoje posso afirmar que somos muito amigas e parceiras, adoro brincar com ela de tudo e ela adora me ajudar nos deveres de casa porque torna- mos isso uma coisa gostosa e agradável de fazermos juntas. A Manuela é uma criança inteligente, extrema- mente amorosa, solidária, sensível, guerreira, alegre e feliz. Porque nossos filhos têm ca- pacidade de serem o que quiserem, só precisamos dar poder a eles e confiar!” Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 41 “Para mim, a cada etapa que vamos avançando, e superando os obstáculos, junto com as conquistas inicia-se uma nova etapa, e com ela novos obstáculos” Katia Kichiro de Aquino Santo Antônio da Platina – Brasil, 2020 Katia Kichiro de Aquino katia.kichiro@gmail.com “Sou mãe de um menino, hoje com treze anos. Recebi o diag- nóstico quando ainda era bebê, com um ano e meio, mais ou menos. Assim como a maioria das famílias, o que me despertou a atenção foi o atraso na linguagem, iniciei uma busca por resposta, até que recebi o diagnostico de autismo – TEA. Acredito que sempre que falamos sobre momentos difíceis para uma família que recebe um diagnóstico, seja ele qual for, é quase impossível pontuar apenas como o mais difícil. Para mim, a cada etapa que vamos avançando, e superando os obstáculos, junto com as conquistas inicia-se uma nova etapa, e com ela novos obstáculos. Embora ele tivesse um desenvolvimento motor acelerado, no meu ponto de vista, eu não conseguia ver esse desenvolvimento com tranquilidade, outras características também chamavam a atenção como: insensibilidade para dor, atirar objetos, tinha muito interesse por luzes coloridas e objetos que giravam. mailto:katia.kichiro@gmail.com 42 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Era um menino tranquilo, não me dava um pingo de trabalho, muito sorridente. Havia outras características que já davam sinais do autismo, mas confesso que por falta de conhecimento, não fui capaz de fazer relação com o autismo. Características tais como: birra cons- tante, falta da noção de perigo, muitas vezes nos usava como objetos para alcançar ou conseguir o que desejava. Assim que comecei a buscar uma orientação sobre o que poderia estar acontecendo, fui aconselhada a colocá-lo em uma escola, pois ele precisava se socializar com outras crianças e sentir a necessida- de de falar, pois em casa não havia essa necessidade, devido a uma rotina que havia elaborado, com horários pré-estabelecidos, ele não sentia necessidade de pedir, pois nos horários estipulados ele receberia tudo que precisava. Então, Juan começou a frequentar uma escola de crianças brasileira, uma vez que nesse período morávamos no Japão e ele tinha nessa época dez meses. Quando questionava as professoras sobre seu comportamento, a resposta era que não dava trabalho, brincava com outras crianças por alguns momentos, depois saía e brincava sozinho, deitava-se no chão e ficava por lá um bom tempo, apenas com um carrinho. Ele era capaz de ficar uma grande parte do tempo assim, parecia apreciar cada detalhe do objeto que escolhia. Nesse tempo, começamos a fazer os testes e, enfim, o diagnóstico. Ao receber o diagnostico, confesso que fiquei sem chão, por mais que no fundo sempre houve a desconfiança de que havia algo diferente, você receber um nome para esse algo, é uma sensação horrível. Leio muito sobre o período do luto pós-diagnóstico, e posso ga- rantir que realmente existe e não há como descrever a dor, o medo. Passei três dias apenas chorando. Olhava para o Juan e chorava, me sentia completamente perdida. Até que você reúne seus cacos, e os transformava em motivação e começa a buscar orientação, eu queria aprender tudo sobre o autismo. Aí, você entende que por mais que você leia, nunca será o suficiente, porque há muita coisa para se ler, mas nenhuma delas vai lhe ensinar, lhe dar uma receita de como lidar com Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 43 isso e ajudar seu filho. Pois cada um é cada um, e às vezes a realidade que foi descrita ali, pode não servir de base para a sua. Passados quase dois anos, eu não via muito resultado nas inter- venções, e também não conseguia entrar na mesma linha de raciocínio do médico que nos atendia no Japão. Decidi que seria melhor voltar para o Brasil, para que pudesse fazer as intervenções necessárias aqui, e também para trazê-lo mais perto da família. Família, esse é um as- sunto complicado, por falta de conhecimento nem sempre nos ajudam. Nessa época ele já estava com três anos, e ainda não conhecia os familiares.Chegando ao Brasil optei por matriculá-lo na educa- ção especial, pois acreditava que pela estrutura, número de alunos, formação dos profissionais envolvidos e por ter uma equipe técnica trabalhando junto e orientando a equipe pedagógica, os resultados seriam maiores e melhores que no ensino regular. No início foi tudo ótimo. Juan tinha psicoterapia, fonoterapia e terapia ocupacional; os técnicos trabalhavam de maneira integrada e algumas sessões aconteciam dentro da sala de aula. Fora da instituição escolar ele tinha um acompanhamento com neuropediatra e passou a fazer uso de medicação. Os resultados foram excelentes, Juan ficou mais calmo, e com isso parecia que conseguia se concentrar melhor nas atividades. Nas intervenções nesse período, que foi dos três aos cinco anos de idade, obtivemos muito sucesso em todas as áreas. Prestes a iniciar a fase de alfabetização, fiquei com muita dúvida quanto ao melhor caminho a seguir: mantê-lo no ensino especial ou levá-lo para o ensino regular? Eu achava que deveria levá-lo para o ensino regular, mas, depois de muito pensar acabei decidindo por mantê-lo na mesma escola, afinal, ele já tinha avançado muito, e não se mexe em time que está ganhando, certo? Errado, se tem uma dica que dou para todas as mães especiais que cruzam meu caminho é: siga seu coração de mãe e seus instintos maternos. Eles nunca falham! Além da equipe técnica trocaram também a professora e, com 44 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão o passar dos dias, eu via as coisas se arrastando. Mais um tempo se passou, e os progressos continuavam lentos e não contente decidi bus- car uma terceira opinião, mas queria alguém que tivesse um grande conhecimento dentro do TEA, para que realmente pudesse me dizer o que estava acontecendo com meu filho, se realmente ele tinha tantas dificuldades ou estavam explorando pouco a capacidade cognitiva dele. Por acaso do destino, nessa mesma semana, meu marido encontrou uma prima que trabalhava com avaliações e que nos orientou a trocar o Juan de colégio, para incluí-lo no Ensino Regular. Tivemos tentativas frustradas de matrícula em escolas diferentes, me frustrei completamente. Assim que dizia a palavra autismo e in- clusão, passamos a ouvir o que mais pareciam desculpas como: que precisávamos aguardar se haveria vaga, pois havia uma lista de espera que tinha que ser respeitada, os custos de uma monitora seriam muito altos para nos serem repassados, etc. Mudamos de cidade e meu filho continuou frequentando a escola de educação especial da nova cidade. Ali as coisas estavam toman- do um rumo diferente, vi que a atual professora do meu filho estava puxando os conteúdos, como se tivesse realizando testes. Não quis interferir. Apenas continuei acompanhando, até que fui chamada para uma reunião de urgência na escola, e o assunto era a inclusão urgente do Juan. A professora solicitou uma nova avaliação para a equipe técnica e concluíram que ele deveria ser incluído. Foi solicitado urgência, pois já era o ano de 2016, e o Juan já estava para fazer dez anos. Na mesma reunião me orientaram a procurar a escola que meu filho frequenta atualmente, pois já haviam recomendado outros casos de inclusão a essa instituição e todos tiveram muito sucesso. No dia e horário combinado estávamos na porta do colégio que me foi indicado, gostei bastante da estrutura, e consegui sentir através da conversa que realmente são apaixonadas pelo que fazem. O Juan ficou encantado, e no meio da conversa perguntou se podia conhecer a sala onde ia estudar e seus novos colegas. O Juan teve sua inclusão realizada em outubro de 2016, com dez Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 45 anos, na turma do 2º ano do Ensino Fundamental. Foi um período de muito trabalho. A escola foi muito parceira! Acreditou e quis que essa inclusão desse certo, assim como nós, da família. Obtivemos muito suces- so, tanto os professores como a escola nos apoiaram com os conteúdos e materiais e ele cooperou muito para que o sucesso acontecesse. Também decidimos junto com a escola por contratar uma moni- tora, para que de início ajudasse o Juan em sala, pois além de con- teúdos ele também tinha que pegar o ritmo da turma, e não poderia ficar disperso, pois tinha muito a recuperar, então o tempo que tinha em sala era muito valioso. Nós assumimos os custos dessa monitora. De início ela focava cem por cento no Juan e, aos poucos, esse foco ia diminuindo, para que a responsabilidade dele fosse aumentando. Ao final de cada aula, a mesma enviava um relatório sobre a aula daquele dia, e esse era o nosso termômetro, para estabelecer novos objetivos e saber quais seriam os próximos passos. Hoje, Juan frequenta a sala do quinto ano e está sem a monitora desde outubro do ano passado. O sucesso da inclusão só aconteceu porque família e escola esta- vam trabalhando juntos para alcançar os mesmos objetivos. A forma como aconteceu, acredito hoje que se não houvesse tanto engajamento, tinha muita chance de dar errado. Hoje nos sentimos muito tranquilos com a instituição, vemos que nosso filho está muito feliz, foi muito bem recebido pela turma, fez muitos amigos e é muito querido por eles. Consigo analisar isso através dos comentários que ele faz quando chega depois da aula, ou quando vamos a eventos da escola e a festas de aniversários dos colegas, assim que chegam tanto os amigos quanto os pais fazem uma festa. Isso deixa meu coração em paz e transbordando de alegria e gratidão, pois vejo que houve inclusão de verdade. Juan tem um coração muito bom, e é capaz de passar por cima de suas vontades para ceder às vontades dos outros. A maior conquista que está tendo nos últimos anos é a capacidade de expressar suas opiniões, e entender que discordar, questionar, argumentar e expressar suas opiniões e respeitar a do outro faz parte do conviver com outras 46 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão pessoas, e que ter uma opinião diferente não vai fazer com que as pessoas deixem de amá-lo. A cada etapa que vamos avançando, encontramos novos obstácu- los e encontramos também força para superar. Isso vem do amor que temos por nosso filho, e também do olhar para traz e ver que já foram tantas conquistas, tantos obstáculos superados, que jamais podemos desanimar. Os nossos objetivos estão no desenvolvimento da autonomia de nosso filho, e em fazer com que ele consiga compreender as ordens, ele ainda se atrapalha quando pedimos para fazer coisas que têm etapas a seguir, percebo que ele não memoriza todas as informações. Fala-se muito sobre inclusão, mas acredito que estamos longe de ter um processo que realmente inclua nossas crianças/adultos, independentemente de suas necessidades. Falta capacitação para os profissionais, falta muita estrutura nas instituições e, principalmente, falta muito comprometimento por parte de muitos profissionais en- volvidos na educação, sendo que estes podem, sim, ser um diferencial na vida dele. Acredito que o principal direito de uma pessoa com Necessidades Educativas Especiais – NEE seja estar inserido em um ambiente que esteja pronto para recebê-lo, independente de ser setor público/pri- vado, para educar ou trabalhar. Somado ao direito ao acesso a uma educação de qualidade, que tenha como objetivo desenvolver o aluno em todas as suas potencialidades e aptidões.” Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 47 “É com grande prazer que o faço e espero que possa servir, para uma luz, para as famílias que se encontrem num beco sem saída” Helena Oliveira Gonçalves Simões Lisboa – Portugal, 2020 Helena Oliveira Gonçalves Simões lenasimoes_9@live.com.pt “Tenho três filhos, sendo o Sergio um jovem com vinte e um anos com Síndrome de X Frágil, e duas gêmeas, a Marisa e a Luz, com nove anos, sendo uma delas com uma deficiência da qual ainda não sabemos muito. Apenas sabemos que tem atraso a nível da linguagem e cognitivo. Todos os meus filhos tiveram o mesmo percurso escolar. O mais velhoiniciou a creche aos quatro meses de idade, as gêmeas por terem sido prematuras iniciaram a creche aos seis meses. O Sérgio entrou aos seis anos no ensino regular e teve uma re- provação no 2º ano. Esta reprovação foi por mim solicitada uma vez que eu o achava muito imaturo e não estava integrado naquela turma com aqueles amiguinhos, ou seja, não era bem aceito. A professora também achou e assim fizemos. A Luz está no 3º ano e iniciou o 1º ano em setembro a fazer os sete anos em novembro. Com Sérgio tivemos o diagnóstico final aos dois anos e meio, a mailto:lenasimoes_9@live.com.pt 48 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Luz ainda estamos à espera. O nosso impacto diante do diagnóstico foi que meu marido nun- ca acreditou que algo não estava bem com o Sérgio e por essa razão nunca quis saber. Fui eu que ia às consultas, exames, diagnósticos, enfim um caminho solitário. Esta decisão nunca foi motivo de, como mãe, desistir. Pelo contrá- rio, deu-me força para acreditar no meu filho e ver que ele tinha muitas capacidades, só precisava acreditar e dar nome àquilo que ele tinha. Em relação a Luz, as coisas começaram bem, mas rapidamente desistiu e uma vez mais tenho sido eu como mãe a lutar. Quanto às terapias, o Sérgio desde muito cedo fez Terapia Ocu- pacional, desde um ano de idade, em nível particular num centro de terapias em Lisboa. Terapia da Fala desde os dois anos, na creche, e depois aos três anos iniciou ao nível particular. Fez natação adaptada nas piscinas do Sporting Clube desde os seis meses. A Luz tem feito apenas Terapia da Fala com a mesma terapeuta do Sérgio desde um ano e meio. Ambos iniciaram a intervenção precoce aos três anos em contexto escolar. As características que meu filho apresenta são: atraso de lin- guagem, movimentos repetitivos, atraso cognitivo, dificuldade em compreender o que foi solicitado, dificuldades de atenção, deficiências persistentes na comunicação e interação social, limitação em iniciar, manter e entender relacionamentos, variando de dificuldades com adaptação de comportamento para se ajustar às diversas situações sociais, insistência nas mesmas coisas, aderência inflexível às rotinas ou padrões ritualísticos de comportamentos verbais e não verbais, interesses restritos que são anormais na intensidade e foco. O Sérgio tem uma hiperatividade acentuada e toma medicação diária desde os dois anos e meio e a Luz apenas tem dificuldade na concentração em contexto escolar e toma medicação. Quanto à inclusão escolar, posso afirmar que as expectativas são Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 49 sempre altas, queremos e achamos que os nossos filhos vão aprender e ter sucesso escolar, no entanto tive sempre muita consciência das dificuldades que teriam. Tive e tenho esperança de que um dia eles possam aprender a ler e a escrever de uma forma autônoma. Preciso acreditar nisso para poder continuar a ajudá-los. Sendo eu educadora de infância, para mim era importante eles estarem perto de mim. Esse sempre foi o primeiro critério válido. Quanto à necessidade de mudança de escola, du- rante a sua escolarização, no caso do Sérgio sim. Iniciou o primeiro ano numa escola, mas depois trocou de escola para frequentar o segundo ano, depois no sétimo ano voltou a trocar de escola. No fim, ou seja, aos dezessete anos iniciou o seu percurso numa escola via profissional. A Luz está na mesma escola desde o primeiro ano, no entanto este ano estamos a ponderar a necessidade de ela ir para uma nova escola e frequentar o quarto ano perto de casa. A atitude inicial do professor e da escola em relação ao Sérgio esteve com um professor sem experiência em alunos com NEE. Por essa ra- zão trocou de escola e de professor. Na nova escola foi bem aceito apesar da professora não trabalhar muito com ele. Eu sempre 50 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão fui mãe e professora dele. O que ele aprendeu tem muito trabalho de retaguarda da minha parte. O que mais ele aproveitou foram os amigos. Eles adoravam o Sérgio e ele sempre foi muito feliz na escola, tanto que sempre foi convidado para as festas de anos. A Luz, de início, a professora adorou a ideia, mas rapidamente se cansou. Mas, uma vez mais, ela tem uma mãe muito lutadora e que não baixa os braços. A escola pouco ou nada tem feito para melhorar esta situação. Em relação ao relacionamento entre família e escola não tenho nada a apontar. Sempre fomos bem recebidos. Mas também não somos pais muito chatos. De início de escolarização, a escola demonstrou-se muito envol- vida com ambos os casos, mas depois passaram a ser apenas números, infelizmente. O Sérgio sempre teve uma boa relação com os colegas e todos eles o aceitavam muito bem. Houve sempre um cuidado dos pais dos amiguinhos para que o Sérgio se sentisse bem. A Luz não tem tido essa sorte, tem apenas uma amiguinha e nem sempre é convidada para os anos dos amigos da sala. Os apoios escolares que tiveram ou têm: é de uma terapeuta, que vai à escola duas vezes por semana no caso da Luz. O Sérgio teve apoio de uma professora do ensino especial quando mudou de escola no sétimo ano. Era uma joia de professora, sempre muito atenta às suas dificuldades e sempre a encontrar soluções para os pro- blemas que iam surgindo. O Sérgio teve um Currículo Educacional Específico e a Luz tem um currículo adaptado às suas dificuldades, sendo as fi- chas adaptadas, assim como um menor número de exercícios. Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 51 As aprendizagens mais importantes que ele fez na escola, não sei se poderei dizer que ele aprendeu muita coisa. Mas a partir do sétimo ano, sim, talvez tenha reforçado as aprendizagens da leitura e a iden- tificação dos algarismos, aprendizagem das horas. A Luz ainda está num processo de aprendizagem da leitura e da escrita, assim como os números. O que mais o ajudou a superar as dificuldades, posso dizer que acima de tudo ter uma mãe muito atenta e presente. Conversar muito com ele e dar-lhe suporte para ele acreditar que iria conseguir. A Luz tem muita vida e por essa razão tudo lhe passa ao lado. Ela adora música e passa a vida a dançar. Leva a vida na descontração como eu costumo dizer. São ambos muito felizes. A qualidade da escolari- zação do meu filho acho que foi negativa, que nem todos os professores deviam aceitar e ter crianças com NEE nas turmas. Deveria haver algo a que eu chamo de sensibilidade. Porque eles só pedem para serem com- preendidos e mais tempo que ‘os alunos dito normais’. Eles têm imensas qualidades e capacida- des, só precisam que olhem para eles e as descubram. Os fatores que fizeram com que os meus filhos tivessem uma boa inclusão escolar foram: serem alegres, serem crianças felizes e terem uma boa memória fotográfica. As dificuldades mais significativas foram as de aprendizagem, a falta de sensibilidade dos docentes, a obrigatoriedade de terem que estar tantas horas sentados e concentrados. A inclusão escolar poderia ter sido bem melhor, no entanto tam- bém poderia ter sido pior. De uma forma geral foi aceitável ou está 52 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão a ser. Cada vez mais acredito que temos que ser nós pais a acreditar nos nossos filhos e encontrar soluções para ajudá-los. A escola pouco faz pelos nossos filhos. A deficiência não as impede de realizar os seus sonhos nem os seus objetivos de vida. Apenas temos que lhes proporcionar as melhores formas para eles conseguirem. Cada ser humano tem direito à escolaridade, aos serviços médicos, a ser feliz e, acima de tudo, a ter uma família que o ame e cuide dele. Se todos acreditarmos nisto e trabalharmos nesse sentido os nossos filhos serão bem-sucedidos. Queria apenas acrescentar que os nossos filhos com deficiência são as melhores coisas que nos aconteceram. Acredito que foram eles que nos escolheram como mãe e como pai. Acredito que a nossa vida se transformou num grande rebuliço, aquiloque tínhamos planeado e traçado não se poderá ser concre- tizado, mas trouxe-nos algo mágico e belo. Um filho sem preconceitos, sem maldade e com muita vontade de viver. Não existem planos a médio ou até longo prazo, mas sim a curto prazo para as nossas vidas. Acredi- tar que amanhã será um dia melhor, fará com que levemos os dias mais felizes.” Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 53 “El vino a cambiarme la vida, a sacar paciencia de donde ya no hay. He aprendido a ser más “humana”, más condescendiente con las personas, con los animales, con las personas especiales” Marijose Marin Villapol Boca del Rio – Veracruz, México, 2020. Marijose Marin Villapol villamarin30@gmail.com “La historia de José Rubén empieza hace más de 7 años, cuando me embaracé aún inyectándome, precisamente para no embarazarme. Antes de cumplir la semana 9, me enteré que estaba embarazada y fui al ginecólogo. Confirmamos el embarazo y al siguiente día em- pecé con amenaza de aborto. Estuve con medicamento y reposo de la semana 9-13, pero durante todo el embarazo estuve con amenazas de aborto. El día 23 de Mayo del 2013, con 32 semanas, se me rom- pió la fuente e ingresé al Hospital Regional de Veracruz. Estuve en urgencias por 2 noches. La última noche ya casi no quedaba líquido amniótico y el bebé estaba sufriendo. Me recostaron sobre mi lado izquierdo con un monitor cardiaco así pude dormir unas cuantas horas. Hasta el día 25 de Mayo, que entré a quirófano cerca de las 9 a.m, nació con 33 semanas mi bebé. A pesar que fue sietemesino mailto:villamarin30@gmail.com 54 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão lloró bastante al nacer y lo calificaron con 9.9. Me dieron de alta 2 días después y pude subir a ver a mi bebé que estaba en incubadora. El nació con 2 CIV (conducto intraven- tricular) con la bilirrubina alta, con hernia umbilical. Peso 1.430gr y midió 37cms. El estuvo desde el día 25 de mayo hasta el día 29 de junio inter- nado en incubadora. Me lo entregaron pesando 2 kilos. Empezamos a visitar a la pediatra, la cual siempre reconoceré que gracias a ella mi hijo está cómo está ahora. Ella me enseño unos ejercicios de terapia física con una pelota de Pilates y con un cojín alargado y así, a los 3 meses que entramos al Criver (Centro de Rehabilitación Infantil Veracruz), el ya conocía los ejercicios y hasta se quedaba dormido de lo relajado que estaba. A pesar que me decían en Criver que los niños con trisomia 21 caminaban cerca de los 3 años o más, José Rubén camino un po- quito antes de cumplir 2 años. Empezamos con terapias de lenguaje particulares a los 2 años a la par del Criver. Su terapeuta me reco- mendó meterlo a una escuela común no para niños con capacidades diferentes y ella me mencionó una donde acudía un pacientito con Asperger así que fui a investigar. En el ciclo escolar del 2015, el entro a maternal. Solo se sintió triste el primer día ya después ni se despedía de mí. En ese kínder, donde cursó Maternal y Kinder1, antes de terminar el año escolar la directora habló conmigo y me dijo que no podrían seguir dándole clases a José Rubén porque sus maestras no estaban preparadas y ella no contaba con el dinero para mandarlas a capa- citar. Ese fue el último año. Ya me habían hablado y recomendado mucho un kínder que no es particular, pertenece al gobierno así que se paga una módica suma mensualmente. Ahí cursó 2do y 3ero de kínder. En 2do le tocó una maestra y eran cerca de 22 compañeros los que tenía José Ru- bén. Así que la maestra se desesperó el primer trimestre y pidió una maestra de apoyo que le pagaba el kínder. Y así estuvo los 2 años Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 55 con el apoyo de una “maestra sombra”, aunque hubo avance en su aprendizaje y motricidad no fue suficiente. Para el 3ero de kínder, estuvo con otra maestra que la amo! Es una maestra súper capaz, amorosa y dedicada. Al entrar este año a 1ero de primaria, hemos tenido muchos problemas y pidieron (casi exigieron) maestra sombra. Encontré a su maestra actual que es una persona muy preparada, con mucho carisma y paciencia y desde un principio hubo mucha química con José Rubén. Desgraciadamente ella había estado buscando otro trabajo y entonces me vi en la necesidad de buscar otra persona. Había muchas quejas de José Rubén como problemas de conducta y falta de interés. En enero regresando de las vacaciones de navidad y fin de año; hubo más quejas por parte de la directora y maestros y tuvi- mos junta con ellos. Expusimos nosotros lo que nos inconformaba y ellos también, y decidimos que ella no estaba dando el resultado que esperábamos. Contacté a su anterior maestra - que no obtuvo el trabajo para el que estaba aplicando y seguía desempleada - así que le pregunte si le gustaría regresar con José Rubén y sí. A partir de la segunda semana de enero ha estado con el hasta ahora. Aparte de su escuela en la mañana, José va a clases de terapia física y terapia de lenguaje en las tardes de manera particular. Ahora con la contingencia del COVID19 seguimos trabajando en casa con su maestra sombra en lenguaje, psicomotricidad, terapia física, escritura, arte, etc. Increíblemente en estas semanas hemos avanzado más que los meses en la escuela. Apenas cumplió 7 años el 25 de Mayo y se lo celebramos con su pastel y comida favorita. Es un niño muy sano. ¡Gracias a Dios! Siempre se le trata y educa como su hermano mayor. Lo último que puedo decir es que José Rubén vino a cambiarme la vida, a sacar paciencia de donde ya no hay. He aprendido a ser más 56 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão ‘humana’ más condescendiente con las personas, con los animales, con las personas especiales. Me preocupa, por supuesto, su futuro, por eso es que nos empeñamos en hacerlo independiente, autónomo. Su educación con niños ‘comunes y normales’ por cierto que ellos lo llegan a querer mucho y el a ellos también. Hasta ahora seguimos en contacto con los primeros amiguitos de escuela. Es cariñoso con sus compañeros, pero se fastidia. Ya los empuja mucho amor también. Lo desespera un equilibrio relato de la vida diaria de un niño ‘más que especial’.” Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 57 “Ele mudou a minha vida. Tive que ter mais paciência de onde já não havia. Aprendi a ser mais humana, mais condescendente com as pessoas, com os animais, com as pessoas especiais” Marijose Marin Villapol Boca del Rio – Veracruz, México, 2020. Marijose Marin Villapol villamarin30@gmail.com “A história de José Rubén começa há mais de sete anos, quando eu engravidei. Ainda me protegia, precisamente para não engravidar, mas tive um problema com os hormônios que me provocaram um mioma e então engravidei. Fui ao ginecologista, confirmamos a gravidez e no dia seguinte que fui ao médico, pois comecei a ter ameaças de aborto, tendo que fazer uso de medicamentos e repouso até a 13ª semana de gestação. Durante toda a gravidez permaneci com essas ameaças. No dia 23/05/13, com 32 semanas, rompeu a minha bolsa e dei entrada no Hospital Regional de Veracruz. Fiquei na Unidade de Tratamento Intensivo – UTI, passando duas noites no hospital. Na última noite eu ainda tinha líquido amniótico, mas o bebê estava em sofrimento. Colocaram ao meu lado esquerdo um monitor cardíaco e assim pude dormir algumas horas. No dia 25/05 entrei na sala de mailto:villamarin30@gmail.com 58 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão operações às 9 horas e meu bebê nasceu com trinta e três semanas. Apesar de ter nascido de sete me- ses, chorou bastante ao nascer e o qualificaram com 9.9. Deram-me alta dois dias depois e pude ver meu bebê que estava na incubadora. Ele nasceu com dois CIV (Canal Intraventri- cular), com a bilirrubina alta e com hérnia umbilical. O peso era de 1,430 kg e o seu tamanho era 37 cm. Ele esteve na incubadora do dia 25/05 ao dia 29/06. Quan- do me entregaram, ele já estava pesando 2 kg. Começamos o acompanha- mento com a pediatra,a qual eu sempre reconhecerei muito. Graças a ela o meu filho está como está hoje. Ela me ensinou exercícios de terapia física com uma bola de pilates e com almo- fadas grandes. Aos três meses demos en- trada no Criver – Centro de Reabilitação Infantil Veracruz, mas o meu filho já conhecia os exercícios e até dormia durante eles, de tão relaxado que ficava. No Criver me diziam que as crianças com trissomia 21 cami- nhavam com cerca de três anos Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 59 ou mais. José Rubén caminhou um pouco antes de completar dois anos. Começamos com terapias de linguagem específicas aos dois anos de idade, juntamente com o Criver. Sua terapeuta me recomendou que o colocássemos em uma escola comum e não em uma escola especial, para alunos com capacidades diferentes. Ela mencionou uma escola que já atendia uma criança com As- perger e então fui investigar. No ano de 2015 ele ingressou no maternal. Ele só se sentiu triste no primeiro dia, depois nem se despedia de mim. Nesse jardim de infância, ele cursou apenas o maternal e o jardim 1. Antes de terminar o ano escolar, a diretora falou comigo e me disse que não poderiam mais dar aulas a José Rubén, porque suas professoras não estavam preparadas e que a instituição não tinha dinheiro para que elas se capacitassem, então foi assim o último ano nesta instituição. Já haviam me reco- mendado outro jardim de infância, não particular, pertencente ao governo, mas onde se paga uma taxa mensalmente. Lá ele cursou o jardim 2 e 3. No jardim 2, ele ficou com a professora que tinha vin- te e dois alunos e mais o José Rubén. Ela se desesperou e pediu uma professora de apoio. Ele esteve dois anos com esta professora, embora tenha havido progresso em seu aprendizado e nas habilidades motoras, não foi suficiente. No 60 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão terceiro, ele ficou com uma outra professora que a amava! Ela foi uma professora supercapaz, amorosa e dedicada com o meu filho. Ao entrar este ano, no primeiro ano do primário, nós tivemos muitos problemas e exigiram uma nova professora de apoio. Eu encon- trei sua atual professora, que é muito preparada, tem muito carisma e paciência. Desde o princípio teve muita química com José Ruben. Infelizmente, ela estava buscando outro trabalho, então um mês depois que começaram as aulas, José estava novamente sem a sua professora de apoio. Tivemos então a ajuda de outra professora, mas nesta fase havia muitas queixas de José Rubén como problemas de com- portamento e falta de interesse. Em janeiro, re- gressando das férias de Natal e Ano Novo, tive mais queixas da diretora e então tivemos uma reunião com ela. Mostramos o que nos incomodava e eles também, então decidimos que não estava dando o resultado que esperávamos. O que aconteceu foi que a professora anterior não havia consegui- do o emprego anterior e estava desempregada. Quando perguntei se ela gostaria de regressar com José, logo aceitou e está com ele até hoje. Além da escola durante a manhã, ele vai a aulas particulares de terapia física e de linguagens particulares à tarde. Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 61 Agora com o isolamento da COVID-19, seguimos tra- balhando em casa com sua professora sobre linguagem, psicomotricidade, terapia fí- sica, escrita, arte, etc. e cons- tatamos incrivelmente que nes- sas semanas avançamos mais do que nos meses na escola. A sua educação com as crianças normais trouxe muito amor por parte dos colegas a ele e vice-versa também. Seguimos sempre em contato com os amiguinhos, porque ele é muito carinhoso. Ele completou sete anos em 25/05/20 e comemoramos com seu bolo e comida favorita. Ele é um menino muito saudável, graças a Deus. Sempre está na companhia de seu irmão mais velho. Por último, ele mudou a minha vida. Tive que ter mais paciência de onde já não havia, aprendi a ser mais humana, mais condescendente com as pessoas, com os animais, com as pes- soas especiais. Claro que me preocupa o seu futuro, por isso nos empenhamos tanto para fazê-lo independente, autô- nomo. Às vezes fica aborrecido por ser muito estimulado, mesmo com amor. Há também um desespero no equilí- brio da vida cotidiana, que facilmente faz uma criança “mais do que especial” se desesperar.” 62 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão Uma família inteira, unida e fortalecida em busca de um futuro cada vez melhor. Determinação é o aspecto mais visível. Os textos a seguir – de 2014 e 2020 – se referem à Sandra Xime-nes e a sua família. Sandra mora no Algarve – Faro – Portugal. Estive com Sandra em 30/11/2014, quando cursei o doutoramento em Évora – Portugal. Eu precisava investigar alguma família que estivesse dentro dos critérios da minha pesquisa com diagnóstico da SXF, para a construção do meu guião de perguntas para compor as entrevistas semiestruturadas que eu iria realizar com as famílias dos alunos com SXF. Portanto, escolhi a Sandra Ximenes para iniciar os meus estudos no doutoramento e me surpreendi com a sua determinação. Sandra é portadora da SXF e, devido ao fator genético, os seus três filhos também apresentam a síndrome. Como são três filhos, sendo dois do sexo masculino, foi possível considerar o que a literatura afirma sobre as características dos indivíduos com SXF, mais evidentes no sexo masculino do que no feminino. Sandra esclarece que outras pessoas da sua família também tive- ram o diagnóstico da SXF e tiveram uma vida normal, tiveram as suas profissões, ocuparam cargos. Ela nos explica que nunca teve nenhuma Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 63 dificuldade e que concluiu a Universidade. Sandra, em 2014, relatou que não trabalhava para cuidar dos filhos e que abriu mão de tudo. O pai dos seus filhos tinha falecido há alguns meses e ele amava muito os filhos, e ajudava muito. “Quando André tinha sete anos é que veio o diagnóstico, na- quela fase o que mais percebia era o atraso mental, mas não sabiam o que ele apresentava. André teve muitos apoios, mas acabou o curso e estamos sem respostas sobre a continuidade de seus estudos, neste momento ele não pode tirar outro curso. Eu como mãe fui até um hotel em Faro e pedi trabalho para o meu filho, mas os responsáveis pelo curso dele não gostaram da minha atitude. Eu não quero é que ele fique dentro de casa, estou tentando ajudar nesta situação para ele ter um curso profissionalizante. O diagnóstico de Hugo foi com um ano e teve muito apoios, mudou muitas vezes de professores. Os professores gostavam dele, ele é o que mais precisava de apoio, sendo uma grande preocupação. O médico mudou o diagnóstico dele para autismo, ele teve acesso a sala de apoio, mas com a morte do pai, ele bloqueou. Hugo precisava estar com pessoas normais. Mas admito que às vezes Hugo vive em outro mundo, eu sei que ele tem características do autismo e sempre trago ele para o mundo. Beatriz estava cursando o segundo ano, ela é portadora da SXF e a minha preocupação é que quando adulta pode ter filhos com problemas devido a questão genética. Ela é inteligente e percebo que Beatriz sabe mais do que os irmãos, ela é muito diferente dos meninos. Meus filhos algumas vezes não querem que eu os ensine, pois, relatam que não sou professora. O que eu mais quero é que eles tenham 64 O processo de mediação da aprendizagem na inclusão autonomia básica e gostaria muito de respostas, principalmente porque acredito que onde moramos pode não se ter muitas oportunidades, mas terão que viver e adaptar-se às situações. Quanto à escola, eu gostaria que ela fosse diferente, princi- palmente para o Hugo, pois, para o André a escola foi boa. Queria apenas que eles soubessem ler, escrever, ver as horas e compreender o uso de dinheiro.” Monaliza Ehlke Ozorio Haddad 65 “Todos somos X Frágil; Nós somos Xpeciais” Sandra Ximenes Faro – Portugal, 2020 Sandra Ximenes sandrax.s@sapo.pt “Nós somos diferentes, porque almas bonitas fazem a