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As peculiaridades da Lei 9 605_98 (crimes ambientais) - Jus com

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14/09/2017 As peculiaridades da Lei 9.605/98 (crimes ambientais) - Jus.com.br | Jus Navigandi
https://jus.com.br/imprimir/42218/as-peculiaridades-da-lei-9-605-98 1/4
Este texto foi publicado no Jus no endereço
https://jus.com.br/artigos/42218 
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br
As peculiaridades da Lei 9.605/98
As peculiaridades da Lei 9.605/98
Rodrigo Picon
Publicado em 08/2015. Elaborado em 08/2015.
A Lei 9605/98 foi, para o Direito brasileiro, a primeira legislação que tratou especificamente de
crimes contra o meio ambiental. Porém, inovou no Direito Penal de forma nem sempre acertada, o
que será analisado neste trabalho.
 A Lei 9605/98 é a primeira lei que criminalizou, de forma efetiva, as condutas nocivas ao meio ambiente. Antes, tais condutas
eram tratadas como contravenções penais e punidas na forma do artigo 26 do antigo Código Florestal (Lei 4771/65) – com exceção
da venda de motosserra sem licença (art. 45, § 3º). Possuíam penas baixas (as contravenções, de três meses a um ano de prisão
simples ou multa; a venda da motosserra, de um a três meses de detenção e multa), o que acabava por deixar impune aquele que
destruía o meio ambiente. A Constituição Federal de 1988 trouxe uma maior preocupação com o meio ambiente saudável, princípio
esculpido em seu art. 225, onde trouxe a responsabilização penal das pessoas físicas e jurídicas que cometerem atividades nocivas ao
meio ambiente (§ 3º do retromencionado artigo).
E assim surgiu a Lei 9605/98 supramencionada. Entretanto, o legislador infraconstitucional de 1998, ao criar a nova lei de crimes
ambientais, trouxe grandes peculiaridades ao Direito brasileiro, em especial ao Direito Penal, que serão apontadas neste pequeno
trabalho.
O primeiro ponto peculiar da nova lei de crimes ambientais se dá na responsabilização penal de pessoas jurídicas. Como é sabido
por todos, o crime tem como agente uma pessoa física, a qual receberá, como sanção, penas privativas de liberdade ou de direitos.
Contudo, a Carta Magna de 1988 criou a figura da responsabilização penal da pessoa jurídica, em seu art. 225, § 3º. Nasceu, assim,
uma das primeiras grandes dúvidas do Direito Penal brasileiro, sob a égide da nova Constituição. Pode a pessoa jurídica ser
responsabilizada por um crime? Não há um consenso sobre a matéria. A Lei 9605/98 reproduziu em seu art. 3º o disposto na
Constituição Federal, ou seja, a responsabilização penal da pessoa jurídica. E, em seus art. 21 a 24, trouxe as sanções impostas à
pessoa jurídica que infrigir as regras ambientais, cometendo crime, a saber: multa, restritiva de direito (art. 22) ou prestação de
serviço à comunidade (art. 23).
O segundo ponto peculiar se dá nas circunstâncias agravantes – aquelas que aumentam a pena privativa de liberdade – especiais
dos crimes ambientais, elencadas no art. 15 da dita lei. Este traz um enorme rol de situações em que, se o agente ou o ato estiver ali
encaixado, a pena privativa de liberdade será aumentada, em um quantum a critério do juiz. Neste rol se encontra a reincidência, o
intuito de auferir vantagem pecuniária, a coação de outrem para a execução material do crime, ter sido cometido por funcionário
público no exercício de suas funções, dentre outros. O mais peculiar, todavia, dá-se nas situações elencadas nas alíneas “h” e “i” do
dito artigo. Segundo estas, a pena será agravada se o crime for cometido “em domingos ou feriados” ou “à noite”, respectivamente. O
intuito do legislador foi aumentar a pena privativa de liberdade nos crimes cometidos quando se dá menos fiscalização por parte do
Poder Público – em suma, é o velho “jeitinho brasileiro”: precisa coibir o crime; ao invés de aumentar a fiscalização, aumenta-se a
pena quando a fiscalização é menor.
O terceiro ponto se dá nos art. 27 e 28 da nova lei. Este trata da aplicação dos institutos da transação penal e da suspensão
condicional do processo, elencados nos art. 76 e 89 da Lei 9099/95, respectivamente, em se tratando de crimes contra o meio
ambiente. Segundo tais artigos, a transação penal só poderá ser ofertada pelo Ministério Público caso tenha havido a composição
completa do dano ambiental ocorrido por ocasião do crime cometido pelo agente, salvo impossibilidade de fazê-lo. É uma forma do
legislador resguardar o meio ambiental integral e a sua recuperação completa. Já em se tratando da suspensão condicional do
processo, a lei ambiental diz que só será declarada extinta a punibilidade do agente, na forma do § 5º do art. 89 da Lei 9099/95, se
houver laudo de constatação de reparação do dano ambiental. É a mesma ideia a que se aplica o art. 27, supramencionado. O ponto
principal da questão é a reparação integral do meio ambiente.
Mas não apenas a Parte Geral da Lei 9605/98 possui pontos peculiares. Os crimes em espécie também possuem. O primeiro deles é
o art. 29, que determina que receberá pena privativa de liberdade de seis meses a um ano e multa aquele que “matar, perseguir,
caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização
da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida.”. O grande problema deste tipo penal se dá no primeiro verbo do núcleo:
“matar”. Para a Lei de Crimes Ambientais, matar um espécime da fauna silvestre tem a mesma reprovação social – e, portanto,
mesma reprimenda – que perseguir, caçar, apanhar ou utilizar o dito espécime, ou às condutas do seu § 1º[1], o que sabemos que
não é verdade. Há, portanto, violação clara do Princípio da Proporcionalidade.
https://jus.com.br/
https://jus.com.br/1187583-rodrigo-picon/publicacoes
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 Ademais, a pena para matar um espécime da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, é demasiadamente pequena em relação
a outros crimes da própria Lei de Crimes Ambientais – art. 30, por exemplo, que determina pena de reclusão de um a três anos,
além de multa, para aquele que “exportar para o exterior peles e couros de anfíbios e reptéis em bruto, sem a autorização da
autoridade ambiental competente”; ou ao próprio art. 32, e seu § 2º, que determina pena de três meses a um ano, aumentada de um
sexto a um terço, ao agente que abusar, maltratar, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados e sobrevier a
morte do animal.
Por fim, há o problema do “sem autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida”, que cerca tanto o tipo penal
do art. 29 quanto de grande parte dos crimes ambientais. Se um agente, por exemplo, pedir autorização na Prefeitura para se cortar
uma árvore e a Prefeitura não é a autoridade competente, o agente não poderá responder pelas iras do art. 39 – a menos que seja
comprovado que o mesmo pediu autorização erroneamente de forma dolosa, sabendo que esta não é a competente -, pois o erro não
foi dele, e sim da Prefeitura, devendo, pois, ser absolvido do crime pelo disposto no art. 20, caput do Código Penal.
O segundo ponto peculiar dos crimes em espécie se dá nos art. 34 e 42 da nova lei. Segundo estes, são crimes, respectivamente:
“pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente” e “fabricar, vender, transportar
ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áres urbanas ou qualquer tipo de
assentamento humano”. O ponto peculiar destes artigos também é a pena a ser imputada ao agente infrator. Ambos possuem pena
de um a três anos de detenção, ou multa. Entretanto, ambos possuem penas demasiadamente altas para as ações em comento.
Possuem pena semelhante ao crime de sequestro (art. 148 do Código Penal), superior a quem cortar ou transformar carvão madeira
de lei (art. 45), matar animal silvestre (art. 29, supramencionado) ou maltratar animal (art. 32), dentre outros e não constituem
crimes de menor potencial ofensivo, para os fins do art. 61 daLei 9099/95. As penas dos tais crimes poderiam ser infinitamente
menores – adentrando no rol dos crimes pequenos, para os agentes fazerem jus aos institutos despenalizadoras da Lei de Juizados
Especiais.
Já no art. 41, que trata do crime de incêndio em mata ou floresta, a situação é exatamente a oposta. Anteriormente ao advento da
Lei 9605/98, quem regulava a matéria era o art. 250 do Código Penal, que trata do crime de incêndio. Segundo este artigo, aquele
que causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de terceiro, receberá uma pena privativa de
liberdade de três a seis anos, além de multa, tendo sua pena aumentada de um terço se cometido em lavoura, pastagem, mata ou
floresta (art. 250, caput c/c § 1º, h). No total, a pena privativa de liberdade chegaria ao montante de quatro a oito anos de reclusão.
Agora, com o advento da Lei de Crimes Ambientais, que tem como condão punir mais gravemente os atos contra o meio ambiente, o
incêndio em mata ou floresta possui pena de dois a quatro anos – ou seja, no máximo, o agente receberá a pena mínima do antigo
crime, podendo receber até a metade. Com certeza, foi uma grande falha do legislador de 1998.
Por falar em erro do legislador, podemos citar o excesso legislativo referente aos crimes dos art. 49 e 60 da nova lei. Segundo os
ditos artigos, é crime: “destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros
públicos ou em propriedade privada alheia” e “construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do
território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos
ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes”, respectivamente. Em se tratando do art.
60, poderia tal fato se tornar infração administrativa, ao invés de crime, obrigando o agente que descumprir a regra
supramencionada a sanções do art. 72 da própria lei de crimes ambientais, não necessitando, pois, da tutela penal para coibir tal
feito. Tal fato é matéria de Direito Administrativo, não de Direito Penal.
Já em se tratando do art. 49, a situação é ainda mais gravosa. Tutelar a proteção à planta de ornamentação de logradouro público ou
particular não deveria ser matéria de crime ambiental – no mais, de crime contra a propriedade, na qual já existe a figura do dano
do art. 163 do Código Penal. Já em função do maltratar (e pior, de qualquer modo ou meio), não deveria sequer existir no Direito
Administrativo como infração, quiçá como crime. Imagina alguém sofrer as sanções penais (três meses a um ano de detenção, ou
multa; lembrando-se que para receber transação penal ou suspensão condicional do processo necessita da reparação integral do
dano e de laudo de constatação de recuperação do dano sofrido, respectivamente, conforme visto anteriormente) por que chutou a
planta do vizinho? Seria cômico se não fosse trágico. Literalmente.
E o pior de tudo ainda está por vir: admite-se a forma culposa, com pena de um a seis meses de detenção, ou multa. Ou seja, o
agente ainda pode ser processado criminalmente porque, em um ato de descuido, maltratou, destruiu, lesionou ou danificou planta,
de logradouro público ou privado. É o ápice da sandice legislativa. Como bem leciona Guilherme de Souza Nucci, em seu livro “Leis
Penais e Processuais Penais Comentadas”: “em função do princípio da intervenção mínima, não se pode admitir um penal
incriminador que diga respeito a, por exemplo, maltratar plantas ornamentais de forma culposa, sem qualquer intenção, mas em
virtude de pura negligênia. Seria o ápice do abuso do Estado no intervencionismo na vida privada de cada um. Diz Miguel Reale
Júnior que “para total espanto, admite-se também a forma culposa. Assim, tropeçar e pisar por imprudência na begônia do jardim
do vizinho é crime” (A Lei Hedionda dos Crimes Ambientais. Folha de S. Paulo, Tendências e Debates, dia 6 de abril de 1998)”
(NUCCI, 2010, p. 993). Houve, portanto, um grave excesso legislativo.
O art. 52 da nova lei de crimes ambientais também foi, a meu ponto de vista, excesso legislativo. Segundo o dito artigo,
comete crime aquele que: “penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos próprios para caça ou
para exploração de produtos ou subprodutos florestais, sem licença da autoridade competente”. Ou seja, sofrerá as iras do art. 52
(pena de seis meses a um ano de detenção, ou multa) aquele que adentrar em uma Unidade de Conservação trazendo consigo arma
de fogo, motosserra, gaiola, machado ou qualquer outro instrumento ou substância própria para caçar ou explorar produtos
florestais, se não houver licença para tanto. Não há qualquer necessidade de haver tal tipo penal incriminador. Por mais que
sabemos que o legislador procurou punir aquele que se prepara para cometer os crimes dos art. 29 e 40 da própria lei, esta não se
pode punir meros atos preparatórios, mas apenas atos de execução do crime em comento – portanto, não há qualquer necessidade
de se punir os atos supramencionados.
Já o art. 54 da lei de crimes ambientais trata do crime de poluir o meio ambiente, em níveis tais que resultem ou possam resultar em
danos à saúde humana, que provoque a montande de animais ou destruição significativa da flora. O grande problema do artigo em
questão não se trata dele propriamente dito, mas do seu atual uso para incriminar a “poluição sonora”, aplicando-o por acreditarem
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ser a poluição caracterizada do art. 54 qualquer tipo de poluição, desde que resulte em danos à saúde humana, provoque
mortandade de animais ou destruição significativa da flora, o que não é verdade.
Analisando a própria Lei 9605/98, temos o seu art. 59, que foi vetado pelo então Presidente da República Fernando Henrique
Cardoso. Segundo o texto vetado, era crime “produzir sons, ruídos ou vibrações em desacordo com as prescrições legais ou
regulamentes, ou desrespeitando as normas sobre emissão ou imissão de ruídos e vibrações resultantes de quaisquer atividades.”,
com reprimenda de três meses a um ano de detenção, e multa. Ou seja, o art. 59 da Lei 9605/98 iria reprimir exatamente a poluição
sonora, porém, foi vetada, pelo seguinte argumento: “O bem juridicamente tutelado é a qualidade ambiental, que não poderá ser
perturbada por poluição sonora, assim compreendida a produção de sons, ruídos e vibrações em desacordo com as prescrições
legais ou regulamentares, ou desrespeitando as normas sobre emissão e imissão de ruídos e vibrações resultantes de quais
atividades. (...) Tendo em vista que a redação do dispositivo tipifica penalmente a produção de sons, ruídos ou vibrações em
desacordo com as normas legais ou regulamentares, não a perturbação da tranqüilidade ambiental provocada por poluição sonora,
além de prever penalidade em desacordo com a dosimetria penal vigente, torna-se necessário o veto do art. 59 da norma projetada.".
Ora, o ponto principal do veto do art. 59 foi exatamente a inaplicabilidade de crime ambiental para se punir a poluição sonora. Se o
art. 59 foi vetado por esta razão, por que haveria de se aplicar o art. 54 que, diga-se de passagem, ainda tem pena estritamente
maior? Completamente inaplicável. Deve-se, portanto, aplicar as contravenções penais estipuladas nos art. 42 ou 65 do Decreto-Lei
3688/41.
O art. 63 trata que será crime ambiental aquele que “alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido
por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural,
religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida”.
O primeiro grande problema se trata da pena do dito artigo. Segundo o seu preceito secundário, aquele que incorrer naconduta
vedada pelo artigo receberá como punição pena privativa de liberdade de um a três anos, e multa. Tal pena é idêntica a do art.
62, determinada para a destruição, inutilização ou deterioração dos bens mencionados no preceito primário do art. 63. Ou seja, pela
Lei 9605/98, destruir, inutilizar ou deteriorar um bem protegido por lei em razão de seu valor tem a mesma reprovação de alterar o
seu aspecto ou estrutura; contudo, tal afirmação não prospera. Viola-se, portanto, o princípio constitucional da Proporcionalidade.
O segundo grande problema é o núcleo do tipo penal: “alterar o aspecto ou estrutura”. Qual alteração é essa caracterizadora do
crime do art. 63? Se minha residência é, por exemplo, considerada histórica e eu pinto de verde para amarelo ou mudo uma janela
sem autorização, é crime? Se o agente do Ministério Público do Judiciário for mais ortodoxo, certamente que sim. Causa certa
insegurança jurídica. Deveria o legislador tomar o cuidado em elaborar o tipo penal, para que o mesmo não acabasse por ficar amplo
demais, como ficou. Por fim, tendo em vista o Princípio da Ultima Ratio, que rege o Direito Penal, tal conduta poderia ser apenas
infração administrativa, sujeita às sanções do art. 72. Não possui qualquer necessidade de ser crime, até por não haver reprimenda
social que caracterize a prisão daquele que modifica a estrutura ou aspecto de um bem protegido por seu valor.
Já os art. 64 e 65 da Lei 9605/98 tratam, respectivamente, que será crime: “promover construção em solo não edificável, ou no seu
entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso,
arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida” e “pichar
ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano”. Assim como foi dito em relação aos arts. 60 e 63, ambos os tipos
penais poderiam ser infrações administrativas, afastando-se o agente das iras do Direito Penal. Não tem nenhuma necessidade de se
punir com um crime aquele que construir em local protegido por seu valor histórico, paisagístico etc. ou aquele que pichar muro,
por exemplo. Existem cidades em que praticamente todo o seu centro é considerado protegido pelo patrimônio histórico – como as
cidades mineiras de São João del Rei, Tiradentes, Ouro Preto, Mariana etc. Pelo art. 64 será punido criminalmente aquele que
construir no centro histórico sem autorização da autoridade competente. Entretanto, é uma regra que praticamente ninguém
conhece, o que pode levar uma pessoa com pouca ou nenhuma instrução, por exemplo, a ser processada criminalmente por uma
conduta que ele nem sabia que era ilegal – quiçá crime.
Já se tratando do art. 65, não há qualquer necessidade em se punir com cadeia aquele que picha ou conspurca de qualquer modo
edificação ou monumento urbano – poderia muito bem puni-lo com multa e com a obrigação de se limpar ou pagar pela limpeza do
local, na esfera administrativa, completamente fora do Judiciário e do Direito Penal.
Por fim, o art. 68 determina que cometerá crime contra a Administração Ambiental “deixar, aquele que tiver o dever legal ou
contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental”. O primeiro grande problema deste artigo é do que se
trata o “relevante interesse ambiental”. Sabe-se que não é qualquer interesse de natureza ambiental, mas apenas os considerados
relevantes. Mas como saber qual interesses são relevantes?
O art. 30, § 4º, da Lei 11284/06, que trata da gestão de florestas públicas, e o art. 52 da Lei 12305/10, que trata da Política Nacional
de Resíduos Nacionais, são dois casos em que a própria lei determina ser obriação de relevante interesse ambiental[2]. Mas, e os
demais interesses ambientais, como saber se são ou não relevantes? Tal elementar é extremamente ampla, podendo surgir
denúncias de pessoas físicas ou jurídicas nas iras do art. 68 de omissão por parte deles em cumprir obrigação de interesse ambiental
que longemente é relevante. E tal fato e tal abertura são inconcebíveis em um Estado Democrático de Direito e inconstitucionais por
ocasião do art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal.
O segundo problema deste artigo é o seu Parágrafo Único, que trata do crime do art. 68 na modalide culposa. Ou seja, se alguém,
por imprudência, negligência ou imperícia se esquecer de cumprir a obrigação de relevante interesse ambiental, será punido com
pena de três meses a um ano, além de multa. Realmente o interesse ambiental tem que ser muito relevante para o legislador
estipular o crime na modalidade culposa.
NOTAS
[1] Art. 29, § 1º Incorre nas mesmas penas:
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I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida;
II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;
III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou
espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros
não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.
[2] Art. 30. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: [...] V - ao modo, à forma e às condições de exploração de
serviços e prática do manejo florestal; VI - aos critérios, aos indicadores, às fórmulas e aos parâmetros definidores da qualidade do
meio ambiente; VII - aos critérios máximos e mínimos de aproveitamento dos recursos florestais; VIII - às ações de melhoria e
recuperação ambiental na área da concessão e seu entorno assumidas pelo concessionário; IX - às ações voltadas ao benefício da
comunidade local assumidas pelo concessionário; [...]
§ 4o As obrigações previstas nos incisos V a IX do caput deste artigo são de relevante interesse ambiental, para os efeitos do art. 68
da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.
Art. 52. A observância do disposto no caput do art. 23 e no § 2o do art. 39 desta Lei é considerada obrigação de relevante interesse
ambiental para efeitos do art. 68 da Lei nº 9.605, de 1998, sem prejuízo da aplicação de outras sanções cabíveis nas esferas penal e
administrativa. (art. 39, § 2º: “§ 2o Cabe às pessoas jurídicas referidas no art. 38: I - manter registro atualizado e facilmente
acessível de todos os procedimentos relacionados à implementação e à operacionalização do plano previsto no caput; II - informar
anualmente ao órgão competente do Sisnama e, se couber, do SNVS, sobre a quantidade, a natureza e a destinação temporária ou
final dos resíduos sob sua responsabilidade; III - adotar medidas destinadas a reduzir o volume e a periculosidade dos resíduos sob
sua responsabilidade, bem como a aperfeiçoar seu gerenciamento; IV - informar imediatamente aos órgãos competentes sobre a
ocorrência de acidentes ou outros sinistros relacionados aos resíduos perigosos. Art. 23. Os responsáveis por plano de
gerenciamento de resíduos sólidos manterão atualizadas e disponíveis ao órgão municipal competente, ao órgão licenciador do
Sisnama e a outras autoridades, informações completas sobre a implementação e a operacionalização do plano sob sua
responsabilidade. 
Autor
Rodrigo Picon
Formado em Direito pelo Instituto Tancredo de Almeida Neves, Rodrigo Picon é advogado,
regularmente inscrito pela Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais, escritor e contista.
Atua na área trabalhista, consumerista e criminalista, sendo autor de diversos livros e artigos na
área. É dono da Editora TGD, que tem como intuito popularizar o Direito, vendendo livros baratos e
com linguagem acessível.
Informações sobre o texto
Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)
PICON, Rodrigo. As peculiaridades da Lei 9.605/98. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4445, 2 set.2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/42218>. Acesso em: 14 set. 2017.
https://jus.com.br/1187583-rodrigo-picon
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