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Conteúdo: BIOQUÍMICA GERAL Talita Giacomet de Carvalho Visão geral do metabolismo Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer as principais biomoléculas que participam das vias metabólicas. � Descrever a relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas. � Identificar as vias metabólicas anabólicas e catabólicas. Introdução O metabolismo compreende uma série de reações químicas que permi- tem obter, armazenar e utilizar energia para as funções celulares. Essas reações resumem-se, basicamente, ao processamento de biomoléculas, que são degradadas e reconstruídas em diversas reações para que se obtenha um produto final. Neste capítulo, você vai aprender a identificar as biomoléculas envolvi- das nas rotas metabólicas, a diferenciar e entender as relações energéticas entre as vias metabólicas catabólicas e anabólicas e a reconhecer estas vias por meio do estudo do metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas. Biomoléculas que participam das vias metabólicas Metabolismo é o termo empregado para descrever a interconversão dos com- postos químicos presentes no organismo, as vias percorridas pelas moléculas individualmente, suas inter-relações e os mecanismos que regulam o fluxo de metabólitos através dessas vias. Um ser humano adulto de 70 kg necessita de cerca de 8 a 12 MJ (1.920-2.900 kcal) de combustíveis metabólicos por dia, dependendo da atividade física. Essas necessidades energéticas são encon- tradas em carboidratos (40-60%), lipídeos (principalmente triacilglicerol, 30-40%) e proteínas (10-15%), bem como no álcool. A natureza da alimentação estabelece o padrão básico de metabolismo. Existe uma necessidade de pro- cessar os produtos da digestão dos carboidratos, dos lipídeos e das proteínas da alimentação. Esses produtos da digestão consistem principalmente em glicose, ácidos graxos e glicerol e aminoácidos, respectivamente. Todos os produtos da digestão são metabolizados a um produto comum, a acetil-CoA, que é, então, oxidada pelo ciclo do ácido cítrico. Ao mesmo tempo, novas biomoléculas estão sendo formadas em um processo cíclico que coordena todas as atividades do organismo. As unidades monoméricas que formam as biomoléculas das células são moléculas pequenas de cerca de 30 átomos de carbono. Elas geralmente são encontradas livres em solução e têm vários destinos. Muitas dessas moléculas pequenas têm mais de um papel na célula; além de servirem como subunidade de alguma macromolécula (Figura 1), podem também servir como fonte de energia. Todas as moléculas são sintetizadas a partir de um mesmo grupo de com- postos simples e são degradadas até ele. Tanto a síntese como a degradação ocorrem por meio de sequências de modificações químicas limitadas que seguem regras bem definidas. Como consequência, os compostos presentes nas células são relacionados entre si e podem ser classificados dentro de um pequeno grupo de famílias distintas. As células contêm quatro famílias principais de moléculas orgânicas pequenas que formam as quatro classes de biomoléculas: os açúcares que formam os carboidratos, os ácidos graxos que formam grande parte dos lipídeos, os aminoácidos que formam as proteínas e os nucleotídeos que formam os ácidos nucleicos. Embora muitos dos compostos presentes nas células não se enquadrem nessas categorias, as quatro famílias de moléculas orgânicas pequenas, juntamente com as biomoléculas formadas por suas ligações em longas cadeias, correspondem a uma grande proporção da massa celular. O que determina a que classe as biomoléculas pertencem são os grupos de outros átomos ligados aos esqueletos de carbono que as compõem, os chamados grupos funcionais. Além dos grupos funcionais, a conformação tridimensional das biomoléculas também é determinante para sua função. Os açúcares mais simples, os monossacarídeos, são compostos que têm a fórmula geral (CH2O)n, onde n geralmente é um número entre 3 e 8. Essa fórmula, entretanto, não define completamente a molécula: o mesmo conjunto de carbonos, de hidrogênios e de oxigênios pode ser mantido em uma mesma molécula por meio de ligações covalentes diversas, criando estruturas com formas diferentes. Os açúcares e as biomoléculas formadas a partir deles são denominados carboidratos. Eles existem na forma de cadeia carbônica aberta ou cíclica, e podem estar ligados a grupos hidroxila, ou a um aldeído ou cetona. Os monossacarídeos podem se ligar uns aos outros por ligações glicosídicas, Visão geral do metabolismo2 criando estruturas maiores. Essa ligação é formada entre um grupo -OH de um açúcar e um grupo -OH de outro açúcar por uma reação de condensação, que libera uma molécula de água. Os dissacarídeos contêm duas unidades de monossacarídeos; os oligossacarídeos são formados por três a 10 unidades; e os polissacarídeos contêm mais de 10, podendo alcançar centenas de unidades de açúcares em sua estrutura. Dissacarídeos importantes incluem a lactose (galactose + glicose), a sacarose (glicose + frutose) e a maltose (glicose + glicose). Polissacarídeos importantes incluem o glicogênio (proveniente de fontes animais), o amido (fontes vegetais) e a celulose (fonte vegetal); cada um deles é um polímero de glicose. Os carboidratos possuem grande variedade de funções, por exemplo, compor a membrana plasmática para mediar formas de sinalização celular, e são componentes estruturais de células. Entretanto sua principal função é energética. Eles são os principais produtores de energia sob a forma de ATP, e suas ligações são quebradas sempre que as células precisam de energia para reações químicas. Eles também conseguem reservar energia na forma de carboidratos complexos. Nos vegetais, a energia é reservada no amido, um polímero de glicose, e nos animais, em glicogênio, também polímero de glicose com uma estrutura mais compacta e ramificada. Os aminoácidos formam uma classe de moléculas que apresentam uma propriedade comum: possuem um grupo ácido carboxílico e um grupo amino, ambos ligados a um átomo de carbono denominado carbono α. As cadeias laterais que são ligadas a este carbono determinam a variabilidade química dos aminoácidos. Os aminoácidos se ligam para formar as proteínas, que são cadeias de aminoácidos, ligados cabeça com cauda, enoveladas em uma estrutura tridimensional única para cada proteína. As cadeias de aminoácidos são denominadas polipeptídeos. A ligação covalente entre dois aminoácidos adjacentes em uma cadeia proteica forma um amido e constitui a chamada ligação peptídica. Independentemente de quais sejam os aminoácidos que os formem, os polipeptídios possuem um grupo amino (NH2) em uma de suas extremidades e um grupo carboxila (COOH) na outra extremidade. Existem 20 tipos de aminoácidos nas proteínas, cada um deles com uma cadeia dife- rente ligada ao átomo de carbono α. Todos os organismos possuem proteínas compostas pelos mesmos 20 aminoácidos. As propriedades coletivas das suas cadeias laterais são a base da diversidade de funções das proteínas. As proteínas desempenham inúmeras e importantes funções: participam da estrutura celular (citoesqueleto), regulam a atividade de órgãos (hormô- nios), participam do processo de defesa do organismo (anticorpos), catalisam reações químicas (enzimas), atuam no transporte de gases (hemoglobina) e 3Visão geral do metabolismo são responsáveis pela contração muscular. Proteínas com importância especial nas vias metabólicas são as enzimas. Elas catalisam todas as reações químicas do organismo aumentando a velocidade das reações. Dessa forma, as enzimas comandam todos os eventos metabólicos. Uma molécula de ácido graxo tem duas regiões quimicamente distintas. Uma é formada por uma longa cadeia hidrocarbonada, que é hidrofóbica enão tem muita reatividade química. A outra região é um grupo carboxila (-COOH), que se comporta como um ácido (ácido carboxílico). Esse ácido se ioniza em solução, é hidrofílico e reativo quimicamente. Quase todas as moléculas de ácidos graxos de uma célula estão ligadas covalentemente a outras moléculas por meio de seu grupo ácido carboxílico. Os variados ácidos graxos encontrados nas células diferem entre si somente quanto ao comprimento das suas cadeias hidrocarbonadas e quanto ao número e as posições das ligações duplas carbono- -carbono. Os ácidos graxos são armazenados no citoplasma de muitas células na forma de gotículas de moléculas de triacilglicerol, que consiste em três cadeias de ácidos graxos ligadas a uma molécula de glicerol. Quando mobilizadas para fornecer energia, as cadeias de ácidos graxos são liberadas dos triacilgliceróis e degradadas em unidades de dois carbonos. Essas unidades de dois carbonos são idênticas àquelas derivadas da degradação da glicose e entram na mesma via de reações produtoras de energia. Nas células, os triglicerídeos funcionam como uma reserva concentrada de alimento, pois sua degradação produz cerca de seis vezes mais energia utilizável do que a degradação da glicose. Os ácidos graxos e os seus derivados, como os triacilgliceróis, são exem- plos de lipídeos. Os lipídeos constituem um grupo heterogêneo de moléculas orgânicas que têm como característica comum a insolubilidade em água (são hidrofóbicos), e a solubilidade em solventes apolares. Caracteristicamente, eles possuem uma longa cadeia hidrocarbonada, como nos ácidos graxos e nos isoprenos, ou então múltiplos anéis aromáticos, como nos esteróis. Os lipídeos têm importante função energética nos organismos. Além disso, fornecem a barreira hidrofóbica que permite a separação dos conteúdos aquosos nas células e podem atuar como vitaminas e hormônios esteroides. Já o nucleotídeo é uma molécula formada por um anel que contém um nitrogênio ligado a um açúcar de cinco carbonos (pentose) que, por sua vez, car- rega um ou mais grupos fosfato. A pentose pode ser uma ribose (ribonucleotídeos) ou desoxirribose (desoxinucleotídeos). Os anéis contendo nitrogênio são deno- minados bases. As diferentes bases guardam uma grande semelhança entre si. A citosina (C), a timina (T) e a uracila (U) são chamadas de pirimidinas porque são derivadas do anel das pirimidinas, que tem seis átomos. A guanina (G) e a adenina (A) são compostos das purinas e, portanto, possuem um segundo anel, Visão geral do metabolismo4 de cinco membros, ligado ao anel de seis átomos. A denominação de cada um dos nucleotídeos fundamenta-se na base que eles contêm. Os nucleotídeos podem atuar como carreadores de energia de curto prazo. Mais que qualquer outro carreador de energia, o nucleotídeo trifosfato de adenosina, ou ATP (adenosine triphosphate), é usado para transferir energia em diversas reações químicas. O ATP é formado por reações impelidas pela energia que é liberada na degradação oxidativa dos alimentos. Seus três fosfatos estão ligados em série por meio de duas ligações anidrido fosfórico, que, ao serem rompidas, liberam grandes quantidades de energia útil. O grupo fosfato terminal geralmente é liberado por hidrólise, com frequência transferindo o fosfato para outra molécula e liberando energia para as reações biossintéticas que necessitam de energia. Um papel extremamente importante dos nucleotídeos é o armazenamento e a disponibilização da informação genética. Eles servem como módulos para a construção dos ácidos nucleicos, que são polímeros longos nos quais as subunidades nucleotídicas ficam ligadas covalentemente por meio da formação de uma ligação fosfodiéster entre o grupo fosfato ligado ao açúcar de um nucleotídeo e o grupo hidroxila do açúcar do nucleotídeo seguinte. Existem dois tipos principais de ácidos nucleicos, os quais diferem quanto ao tipo de açúcar fosfato em suas respectivas estruturas. Os nucleotídeos com base no açúcar ribose são os ácidos ribonucleicos, ou RNA. Aqueles que têm como base a desoxirribose são os ácidos desoxirribonucleicos, ou DNA. A sequência linear dos nucleotídeos no DNA e no RNA codifica a informação genética das células. Figura 1. Três famílias de biomoléculas. Cada uma de- las é um polímero formado por moléculas pequenas (monômeros) ligadas entre si por ligações covalentes. Os lipídeos são a única classe de biomoléculas que não tem uma subunidade comum para todos os seus compostos. Fonte: Alberts et al. (2011, p. 63). 5Visão geral do metabolismo Relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas Os organismos vivos gastam energia o tempo todo para desempenhar suas fun- ções. As células estão continuamente se reciclando, degradando macromoléculas e sintetizando outras. Essa dinâmica que ocorre dentro de cada célula constitui o metabolismo. Ele ocorre por meio de uma série de reações catalisadas por enzimas que constituem as vias metabólicas. Cada etapa consecutiva de uma via metabólica produz pequenas alterações, que pode ser a remoção, transferência ou adição de um átomo ou grupo funcional ao substrato. Em uma via metabólica existe um precursor, que é convertido em um produto por meio de uma série de intermediários metabólicos chamados metabólitos. O metabolismo exige um grande nível de coordenação das atividades celu- lares, e tem como funções centrais: 1. obter energia para a célula; 2. converter nutrientes em macromoléculas; 3. construir estruturas celulares a partir de macromoléculas; e 4. degradar macromoléculas. Essas funções podem ser separadas em dois tipos de vias metabólicas: catabólicas e anabólicas (Figura 2). As vias catabólicas (degradação) capturam a energia química obtida da degradação de moléculas ricas em energia, formando trifosfato de adenosina (ATP – molécula que armazena energia). São as vias catabólicas também que convertem moléculas da dieta (ou moléculas nutrientes armazenadas nas células) em compostos menores que são necessários para a síntese de novas moléculas complexas. As vias catabólicas liberam energia, e parte dessa energia é conservada na forma de ATP e de transportadores de elétrons reduzidos (NADH, NADPH e FADH2); o restante é perdido como calor. A geração de energia pela degradação de moléculas complexas, denominada catabolismo, ocorre em três estágios: 1. Hidrólise: primeiramente, moléculas complexas são degradadas até suas unidades monoméricas. Por exemplo, proteínas são degradadas em aminoácidos, polissacarídeos em monossacarídeos e triacilgliceróis em ácidos graxos livres e glicerol. 2. Conversão das unidades monoméricas em intermediários simples: no segundo estágio, as unidades monoméricas são degradadas em acetil- -coenzima A (CoA) e em uma pequena variedade de moléculas simples. Parte da energia é conservada como ATP, porém essa quantidade é pequena se comparada com a energia produzida durante o terceiro estágio do catabolismo. 3. Oxidação da acetil-CoA: o ciclo do ácido cítrico, ou ciclo dos ácidos tricarboxílicos, é a via final comum da oxidação de moléculas com- Visão geral do metabolismo6 bustíveis, que produzem acetil-CoA. A oxidação de acetil-CoA gera grandes quantidades de ATP via fosforilação oxidativa, à medida que os elétrons fluem do NADH e do FADH2 para o oxigênio. As vias anabólicas (biossíntese) ocorrem no sentido oposto às catabólicas, já que utilizam precursores pequenos e simples, como aminoácidos e nucleo- tídeos, para formar moléculas maiores e mais complexas, como as proteínas e os ácidos nucleicos. As reações anabólicas são endergônicas, isto é, necessitam de fornecimento de energia (NADH, NADPH e FADH2) produzida pela quebra de ATP, resultando em difosfato de adenosina (ADP) e fosfato inorgânico (Pi).Com frequência, as reações anabólicas envolvem reduções químicas em que o poder redutor é, geralmente, fornecido pelo doador de elétrons NADPH. Algumas vias metabólicas são lineares e outras são ramificadas, gerando múltiplos produtos finais úteis a partir de um único precursor, ou conver- tendo vários precursores em um único produto. As duas vias, catabólica e anabólica, estão energeticamente relacionadas. Em geral, as vias catabólicas são convergentes (têm como finalidade capturar energia química obtida na degradação de moléculas de energia, formando ATP) e as vias anabólicas são divergentes (suas reações reúnem moléculas pequenas para formação de moléculas complexas). Algumas vias são cíclicas (um composto da via é regenerado em reações que convertem outro composto inicial em produto). As vias catabólicas e anabólicas têm uma importante forma de regulação. As enzimas que catalisam tanto a degradação quanto a síntese das biomoléculas complexas estão presentes na maioria das células. Entretanto, não faria sentido elas atuarem simultaneamente (por exemplo, sintetizando e degradando lipí- deos). Isso é evitado por um sistema de regulação recíproca das vias anabólica e catabólica. Quando uma via está ativa, a outra está inibida. Embora várias das enzimas que atuam em vias catabólicas e anabólicas que conectam os mesmos produtos finais (por exemplo, glicose-piruvato e piruvato-glicose) sejam compartilhadas em ambas as vias, é importante existirem pontos em que as etapas sejam catalisadas por enzimas diferentes. Caso contrário, se fossem as mesmas enzimas atuando nos dois sentidos, a inibição de uma das vias (para que as duas ações não ocorram ao mesmo tempo) acabaria inibindo a outra também. Esses pontos em que as enzimas diferem são importantes pontos de regulação independentes. Além disso, para que as vias anabólicas e catabólicas sejam irreversíveis, pelo menos uma das reações específicas em cada sentido deve ser termodinamicamente muito mais favorável que sua reação inversa. Outra característica da regulação individual das vias anabólicas e catabólicas é que elas ocorrem em compartimentos diferentes dentro da 7Visão geral do metabolismo célula. Por exemplo, o catabolismo de ácidos graxos ocorre na mitocôndria, e sua síntese no citosol. Em compartimentos distintos as concentrações de metabólitos intermediários, enzimas e reguladores podem ser mantidas em diferentes níveis. Como as vias metabólicas são cineticamente controladas pela concentração do substrato, conjuntos separados de intermediários anabólicos e catabólicos também contribuem para o controle das taxas metabólicas. Figura 2. A relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas. As vias catabólicas liberam energia química na forma de ATP, NADH, NADPH e FADH2. Esses transportado- res de energia são usados em vias anabólicas para converter precursores pequenos em macromoléculas celulares. Fonte: Nelson e Cox (2014, p. 503). Visão geral do metabolismo8 Na inanição prolongada, quando ocorre depleção das reservas do tecido adiposo, observa-se considerável aumento na velocidade efetiva de catabolismo das proteínas para fornecer aminoácidos, não apenas como substratos para a gliconeogênese, mas também como principal combustível metabólico de todos os tecidos. Ocorre morte quando as proteínas teciduais essenciais são catabolizadas e não são substituídas. Em pacientes com caquexia resultante da liberação de citocinas em resposta a tumores e patologias, há aumento na taxa de catabolismo de proteínas teciduais, bem como aumento considerável da taxa metabólica; logo, eles apresentam um estado de inanição avançado. Mais uma vez, ocorre morte quando as proteínas teciduais essenciais são catabolizadas e não são substituídas. Fonte: RODWELL, V. et al. Bioquímica Ilustrada de Harper. 30. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017. Vias metabólicas anabólicas e catabólicas Existem milhares de reações químicas conhecidas que compõem uma enorme diversidade de vias metabólicas. O padrão básico do metabolismo é estabe- lecido pela alimentação. Os produtos da digestão de carboidratos, lipídeos e proteínas devem ser processados principalmente em glicose, ácidos graxos e glicerol e aminoácidos, respectivamente, que vão ser usados para formar outras biomoléculas, em um ciclo de rotas anabólicas (síntese) ou catabólicas (degradação) (Figura 3). Metabolismo de carboidratos A glicose é o principal combustível da maioria dos tecidos. Ela é metabolizada a piruvato pela via da glicólise. Os tecidos aeróbios metabolizam o piruvato à acetil CoA, que pode entrar no ciclo do ácido cítrico para oxidação completa a CO2 e H2O, ligados à formação de ATP no processo de fosforilação oxidativa. A glicólise também pode ocorrer de modo anaeróbio quando o produto final é o lactato. A glicose e seus metabólitos também participam em outros pro- cessos – por exemplo, na síntese do glicogênio, no músculo esquelético e no fígado, e na via das pentoses fosfato, uma parte alternativa da via glicolítica. Ela é uma fonte de equivalentes redutores (NADPH) para a síntese de ácidos graxos, e é fonte de ribose para a síntese de nucleotídeos e ácidos nucleicos. Os intermediários trioses-fosfato na glicólise originam a porção glicerol dos triacilgliceróis. O piruvato e os intermediários do ciclo do ácido cítrico forne- 9Visão geral do metabolismo cem os esqueletos de carbono para a síntese dos aminoácidos não essenciais ou dispensáveis. Já a acetil-CoA é o precursor dos ácidos graxos e do colesterol e, consequentemente, de todos os hormônios esteroides sintetizados no corpo. A gliconeogênese é o processo de síntese da glicose a partir de precursores não carboidratos, como lactato, aminoácidos e glicerol. A manutenção de uma concentração sanguínea adequada de glicose é essencial para os tecidos em que ela é o principal combustível (o encéfalo) ou o único combustível (as hemácias). A glicose proveniente da digestão dos carboidratos é absorvida pela veia porta do fígado. No fígado, a glicose é captada em quantidades superiores às necessidades imediatas e é utilizada na síntese de glicogênio (glicogênese). Entre as refeições, o fígado atua para manter o nível da glicemia a partir da degradação do glicogênio (glicogenólise) e para, com o rim, converter os metabólitos não carboidratos, como lactato, glicerol e aminoácidos, em glicose (gliconeogênese). O músculo esquelético utiliza a glicose como fonte de energia tanto de modo aeróbio, formando CO2, quanto de modo anaeróbio, formando lactato. O músculo esquelético armazena glicogênio como substrato energético para uso durante a contração muscular e sintetiza proteína muscular a partir dos aminoácidos plasmáticos. O músculo responde por cerca de 50% da massa corporal e, con- sequentemente, representa uma considerável reserva de proteína, que pode ser empregada para suprir aminoácidos para a gliconeogênese em caso de inanição. Metabolismo de lipídeos Os ácidos graxos de cadeia longa originam-se de lipídeos da alimentação ou da síntese a partir da acetil-CoA derivada dos carboidratos ou dos aminoácidos. Os ácidos graxos podem ser oxidados à acetil-CoA (β-oxidação) ou esterificados com glicerol, formando triacilglicerol (gordura) como principal reserva de energia. A acetil-CoA formada pela oxidação de ácidos graxos pode ter três destinos: 1) ser oxidada a CO2 + H2O pelo ciclo do ácido cítrico, como a acetil-CoA que se origina da glicólise; 2) ser a precursora na síntese de colesterol e de outros esteroides; 3) ser utilizada no fígado para formar corpos cetônicos, acetacetato e 3-hidroxibutirato, que são importantes combustíveis durante o jejum prolongado e a inanição. Os lipídeos da alimentação são principalmente triacilgliceróis e são hidro- lisados a monoacilgliceróis e ácidos graxos no intestino,sendo, então, reesteri- ficados na mucosa intestinal. Na mucosa intestinal, eles são empacotados junto com proteínas e secretados no sistema linfático e, após, na corrente sanguínea como quilomícrons, a maior das lipoproteínas plasmáticas. Os quilomícrons Visão geral do metabolismo10 também contêm outros nutrientes lipossolúveis, incluindo as vitaminas A, D, E e K. Ao contrário da glicose e dos aminoácidos absorvidos no intestino delgado, o triacilglicerol dos quilomícrons não é captado diretamente pelo fígado. Ele é inicialmente metabolizado por tecidos que apresentam a lipase lipoproteica, a enzima que hidrolisa o triacilglicerol, liberando ácidos graxos, que são incorporados aos lipídeos teciduais ou oxidados como substratos energéticos. Os remanescentes de quilomícrons são depurados pelo fígado. Outra principal fonte de ácidos graxos de cadeia longa é a síntese (lipogênese), a partir de carboidratos, no tecido adiposo e no fígado. O triacilglicerol no tecido adiposo representa a principal reserva de substrato energético do organismo. Ele é hidrolisado (lipólise), e o glicerol e os ácidos graxos livres são liberados na circulação. O glicerol é um substrato para a gliconeogênese. Os ácidos graxos são transportados ligados à albumina sérica; são captados pela maioria dos tecidos e esterificados a triacilgliceróis para serem armazenados ou oxidados como substratos energéticos. No fígado, o triacilglice- rol recém sintetizado e o triacilglicerol dos remanescentes de quilomícrons são secretados na circulação na lipoproteína de densidade muito baixa (VLDL). Esse triacilglicerol tem um destino semelhante ao dos quilomícrons. A oxidação parcial de ácidos graxos no fígado leva à produção de corpos cetônicos (cetogênese). Os corpos cetônicos são exportados para os tecidos extra-hepáticos, onde fornecem energia durante o jejum prolongado e a inanição. Metabolismo de aminoácidos Os aminoácidos são necessários para a síntese de proteínas. Alguns precisam ser supridos na alimentação (os aminoácidos essenciais ou indispensáveis), uma vez que não podem ser sintetizados pelo organismo. Os restantes são aminoácidos não essenciais ou dispensáveis, que são supridos pela alimentação, mas que também podem ser formados a partir de intermediários metabólicos por transaminação, utilizando o grupamento amino de outros aminoácidos. Após a desaminação, o nitrogênio amino é excretado na forma de ureia, e os esqueletos de carbono que permanecem após a transaminação podem (1) ser oxidados a CO2 pelo ciclo do ácido cítrico, (2) ser utilizados na síntese de glicose (gliconeogênese) ou (3) formar corpos cetônicos ou acetil-CoA, que pode ser oxidada ou utilizada na síntese de ácidos graxos. Vários aminoácidos também são precursores de outros compostos, como purinas, pirimidinas, hormônios – como a epinefrina e a tireoxina –, e neurotransmissores. Os aminoácidos resultantes da digestão das proteínas da dieta são absor- vidos pela veia porta do fígado. O fígado desempenha a função de regular a 11Visão geral do metabolismo concentração sanguínea desses metabólitos. O músculo esquelético sintetiza proteína muscular a partir dos aminoácidos plasmáticos. O músculo res- ponde por cerca de 50% da massa corporal e, consequentemente, representa uma considerável reserva de proteína, que pode ser empregada para suprir aminoácidos para a gliconeogênese em caso de inanição. Figura 3. Resumo das vias para o catabolismo dos carboidratos, das proteínas e da gordura da alimentação. Todas essas vias levam à produção de acetil-CoA, que é oxidada no ciclo do ácido cítrico, produzindo, por fim, ATP pelo processo de fosforilação oxidativa. Fonte: Rodwell et al. (2017, p. 140). 1. Sobre as biomoléculas celulares, assinale a alternativa correta. a) Todos os lipídeos são formados por cadeias de ácidos graxos. b) A principal função das proteínas é armazenar energia. c) Os carboidratos são formados por cadeias de açúcares. d) Os nucleotídeos são formados por cadeias de aminoácidos. e) A estrutura tridimensional das biomoléculas não interfere em suas funções. Visão geral do metabolismo12 ALBERTS, B. et al. Biologia molecular da célula. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011. NELSON, D.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. RODWELL, V. et al. Bioquímica ilustrada de Harper. 30. ed. Porto Alegre: AMGH, 2017. Leitura recomendada VOET, D.; VOET, J. G. Bioquímica. 4.ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. 2. Sobre o catabolismo, é correto afirmar que: a) ocorre a formação de biomoléculas. b) é um processo que requer energia (ATP, NADH, FADH2). c) ocorre a degradação de biomoléculas, como lipídeos, carboidratos e proteínas. d) é um processo que retira energia da luz do sol. e) ocorre a hipertrofia muscular. 3. Para que ocorra a síntese de macromoléculas (anabolismo), é necessário: a) ATP, NADH e FADH2. b) proteínas e carboidratos. c) energia luminosa. d) lipídeos. e) somente proteínas. 4. Uma pessoa com câncer avançado normalmente apresenta sintomas de perda de peso e fadiga. Esse processo é conhecido como caquexia do câncer. Nesse contexto, qual via metabólica que está ativada? a) Anabolismo. b) Catabolismo. c) Anfibolismo. d) Vias cíclicas. e) Vias de síntese. 5. A glicose constitui a principal fonte de energia na maioria dos tecidos. Por qual via a glicose é metabolizada a piruvato? a) A glicose é metabolizada a piruvato pela via da glicólise. b) A glicose é metabolizada a piruvato pela via da gliconeogênese. c) A glicose é metabolizada a piruvato pela via da glicogenólise. d) A glicose é metabolizada a piruvato pela via da glicogênese. e) A glicose é metabolizada a piruvato pela via da lipólise. 13Visão geral do metabolismo http://4.ed/ Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo:
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