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ESTADO, GOVERNO, SOCIEDADE – PARA UMA TEORIA GERAL DA POLÍTICA Disciplina: SOCIEDADE CIVIL, GOVERNO, ESTADO E ORGANIZAÇÕES NO BRASIL Alunos: Maria Elisa Palomine Bonato João Otávio Torelli Pinto Norberto Bobbio 1 NORBERTO BOBBIO Nascimento: 18/10/1909 – Turim (Itália) Morte: 09/01/2004 – Turim (Itália) - formado em Direito e Filosofia - jornalista, filósofo, historiador e escritor - professor emérito nas universidades de Turim, Paris, Buenos Aires, Madri e Bolonha - autor de mais de vinte obras, dedicadas ao estudo da filosofia do direito, da ética, da filosofia política e da história das ideias - Le Monde: “maître à penser” do século XX I. A GRANDE DICOTOMIA PÚBLICO/PRIVADO 1. Uma dupla dicotômica - Corpus Iuris Civilis: “quod ad statum rei romanae spectat” e “quod ad singulorum utilitatem” - Embora “privado” possa ser definido independentemente de “público”, este último é o termo mais forte, de modo que se costuma definir “privado” como “não público” - Público: aquilo que pertence ao grupo; Privado: aquilo que pertence aos membros singulares - Público: sociedade global; Privado: grupos menores - Público: poder central superior; Privado: poderes periféricos inferiores - Digesto: “ius publicum privatorum pactis mutari non potest” – supremacia do direito público sobre o privado - Brasil: normas cogentes e normas dispositivas 2. As dicotomias correspondentes a) Sociedade de iguais e sociedade de desiguais - Estado: relações entre desiguais - Sociedade natural: relações entre iguais - Brasil: Direito Administrativo – relações de horizontalidade e verticalidade b) Lei e contrato - Lei: fonte do Direito Público - coação - Contrato: fonte do Direito Privado – reciprocidade c) Justiça comutativa e justiça distributiva - Justiça comutativa: tem lugar entre as partes – sociedade de iguais - Justiça distributiva: tem lugar entre o todo e as partes – sociedade de desiguais 3. O uso axiológico da grande dicotomia a) O primado do privado - Primado do Direito Privado: difusão e recepção do Direito Romano no Ocidente (século XX) - Direito Público: nasceu tarde, na época da formação do Estado moderno (século XV) - Direito Privado: tratados exclusivamente jurídicos - Direito Público: obras não exclusivamente jurídicas b) O primado do público - Reação contra a concepção liberal do Estado e derrota do Estado mínimo - Subordinação do interesse individual ao interesse coletivo (Brasil: princípio da indisponibilidade do interesse público e o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado) - Ideia aristotélica de que o todo vem antes das partes, o que justifica a irredutibilidade do bem comum à soma dos bens individuais - “o primado do público significa o aumento da intervenção estatal na regulação coativa dos comportamentos dos indivíduos e dos grupos infraestatais, ou seja, o caminho inverso ao da emancipação da sociedade civil em relação ao Estado” c) Dois processos paralelos - Público / Política / Ordem dirigida do alto / Organização vertical da sociedade - Privado / Economia / Ordem espontânea / Organização horizontal da sociedade - Publicização do privado e Privatização do Público 4. O segundo significado da dicotomia a) Público ou secreto - A dicotomia público/privado é diferente da distinção que conceitua “público” como sendo o que é manifesto, e “privado” como aquilo que se diz e se faz em segredo - “Conceitualmente e historicamente, o problema do caráter público do poder é um problema diferente daquele que se refere à sua natureza de poder político distinto do poder dos privados: o poder político é o poder público no sentido da grande dicotomia mesmo quando não é público, não age em público, esconde-se do público, não é controlado pelo público” b) Publicidade e poder invisível - Immanuel Kant: “todas as ações relativas ao direito de outros homens cuja máxima não é conciliável com a publicidade são injustas” - Arcana imperii: poder absoluto - Enquanto o principado, a monarquia de direito divino e as várias formas de despotismo demandam a invisibilidade do poder e a justificam, a república democrática exige que o poder seja visível: o lugar onde se exerce o poder em toda forma de república é a assembleia dos cidadãos, na qual o processo de decisão é in re ipsa público - Brasil: artigos 5º, LX; 37, caput; e 93, IX da Constituição Federal II. A SOCIEDADE CIVIL 1. As várias acepções - Dicotomia sociedade civil / Estado - Definição negativa: o Estado costuma ser compreendido restritivamente como o conjunto dos aparatos que em um sistema social organizado exercem o poder coativo, e a sociedade civil como o conjunto das relações não reguladas pelo Estado - Definição positiva: sociedade civil é o lugar onde surgem e se desenvolvem os conflitos econômicos, sociais, ideológicos, religiosos, que as instituições estatais têm o dever de resolver pela mediação ou repressão - Sociedade civil: esfera das relações sociais distinta da esfera das relações políticas - Origem alemã: bürgerliche Gesellschaft significa tanto sociedade civil como sociedade burguesa - A sociedade civil (input) e Estado (output) 2. A interpretação marxiana - O uso da expressão “sociedade civil” como termo indissoluvelmente ligado a Estado, ou sistema político, é de derivação marxiana, e através de Marx, hegeliana - Para Marx, a sociedade civil é a sociedade burguesa (bürgerliche Gesellschaft), lugar onde se desenvolvem as relações econômicas - Marx: “o Estado moderno tem como base natural a sociedade civil, o homem da sociedade civil, isto é, o homem independente, unido ao outro homem apenas pelo vínculo do interesse privado e da necessidade natural inconsciente” - Tal descrição de sociedade civil coincide com o estado de natureza hobbesiano, e, por isso, se contrapõe àquilo que Hobbes considera sociedade civil 3. O sistema hegeliano - Diferentemente de Marx, Hegel não considera a sociedade civil como o momento que precede a formação do Estado, mas como o primeiro momento de formação do Estado - Estado jurídico-administrativo (Estado inferior) e Estado propriamente dito (Estado superior) - Dimensão histórica da sociedade civil 4. A tradição jusnaturalista - O uso hegeliano de sociedade civil como Estado, embora como uma forma inferior de Estado, corresponde ao significado tradicional de societas civilis, no qual civilis de civitas é sinônimo de politikós de pólis (concepção fomentada por Aristóteles) - Aristóteles: societas civilis como sociedade natural - Hobbes: societas civilis como sociedade artificial - Com o uso jusnaturalista da expressão “sociedade civil”, ela assumiu o significado exclusivo de Estado como entidade instituída pelos homens por sobre as relações naturais, ou melhor, como regulamentação voluntária das relações naturais, ou, ainda, como sociedade artificial, enquanto em seu significado originário aristotélico a sociedade civil (koinonéia politiké) é uma sociedade natural semelhante à família 5. Sociedade civil como sociedade civilizada - Adam Ferguson: Ensaio sobre a história da sociedade civil (1767) - Civilis não é mais adjetivo de civitas, mas de civilitas 6. O debate atual - “A digressão histórica mostrou a variedade de significados, inclusive entre si contrastantes, com os quais foi usada a expressão ‘sociedade civil’. Resumindo, o significado predominante foi o de sociedade política ou Estado. Ao lado deste, o outro significado tradicional foi o que aparece na sequência sociedades selvagens, bárbaras e civis, que constituiu [...] um esquema clássico para o delineamento do progresso humano [...]. Uma história completamente diversa começa com Hegel, para o qual [...] a sociedade civil não compreende mais o Estado na sua globalidade, mas representa apenas um momento no processo de formação do Estado. Tal história prossegue com Marx, que [...] compreende na esfera da sociedade civil exclusivamente as relações materiais ou econômicas, e, com uma inversão já completa do significadotradicional, não apenas separa a sociedade civil do Estado como dela faz o momento ao mesmo tempo fundante e antitético” - Com Maquiavel, o Estado não foi mais assemelhado a uma forma de sociedade, como faziam os jusnaturalistas e contratualistas. Para ele, o Estado não é mais o Estado-sociedade, mas o Estado-máquina - Para Bobbio, a contraposição entre a sociedade e o Estado que alça voo com o nascimento da sociedade burguesa é a consequência natural de uma diferenciação que ocorre nas coisas e, ao mesmo tempo, de uma consciente divisão de tarefas, cada vez mais necessária, entre os que se ocupam da “riqueza das nações” e os que se ocupam das instituições políticas - “estatalização” da sociedade e socialização do Estado CAP. III – ESTADO, PODER E GOVERNO ■ Estrutura do capítulo: 1. Para o estudo do Estado 2. O nome a coisa 3. o Estado e o poder 4. O fundamento do poder 5. Estado e direito 6. As formas de governo 7. As formas de Estado 8. O fim do Estado 11 1. PARA O ESTUDO DO ESTADO ■ Fontes principais para o estudo do Estado: i) a HISTÓRIAS das instituições (desenvolvida a partir da segunda fonte com posterior emancipação) ii) as DOUTRINAS políticas Obs.: Outra fonte, elencada por Bresser-Pereira: - lógico-dedutiva, está apoiada no contratualismo fundado por Hobbes, e continuado por todos os jusnaturalistas até Rousseau e Kant. (principais teorias: Hobbes, Locke e Rousseau) 12 1. PARA O ESTUDO DO ESTADO ■ Sob qual ótica estudamos o Estado? Filosofia política/ Ciência Política/ Sociologia Jurídica i) filosofia política (três tipos de investigação): a) da melhor forma de governo; b) do fundamento do estado, ou do poder político; c) da essência da categoria do político ou da politicidade (disputa entre ética e política) ii) ciência política (investigação no campo da vida política sob a égide): a) do princípio da verificação como critério de aceitabilidade dos resultados; b) do uso de técnicas da razão (explicação causal do fenômeno investigado); c) da abstenção de juízos de valor (valoratividade) 13 1. PARA O ESTUDO DO ESTADO ■ Sob qual ótica estudamos o Estado? Filosofia política/ Ciência Política/ Sociologia Jurídica iii) ponto de vista sociológico e jurídico - Esta distinção tornou-se necessária após a tecnicização do direito público e a consideração do Estado como pessoa jurídica. - Estado - através do direito - forma de organização social (não pode ser dissociado da sociedade e das relações sociais subjacentes) - Kelsen (que reduziu o Estado a ordenamento jurídico) é contrário a essa visão. OBS.: Teorias meramente jurídicas do Estado foram abandonadas na transformação do Estado de direito em Estado social. 14 1. PARA O ESTUDO DO ESTADO ■ Funcionalismo e marxismo (teorias sociológicas do Estado) - Diferenciam-se no conceito de ciência, no método e na colocação do Estado no sistema social. Marxiana - divide em cada sociedade histórica 2 momentos: - base econômica –sempre determinante - e superestrutura - instituições políticas (o Estado) se relacionam à superestrutura; (sist. de ruptura da ordem – mudança social) Funcionalista - concebe o sistema global em seu conjunto como diferenciado em quatro subsistemas interdependentes (patter-maintenance, político - goal- attainment, adaptation, integration) (sist. Hobbesiano da ordem – conservação da ordem social) 15 1. PARA O ESTUDO DO ESTADO ■ Estado e sociedade Hegel considera a teoria política como uma teoria do estado culminante, em que o Estado resolve e supera os dois momentos precedentes, a família e a sociedade civil. - Relações entre sociedades políticas e sociedades particulares representariam uma relação entre o todo e as partes. - Com emancipação da sociedade civil-burguesa no sentido marxiano inverte- se as relações entre instituições políticas e Estado e pouco a pouco a sociedade nas suas várias articulações torna-se o todo, do qual o Estado é considerado o restritivamente como aparato coativo, do qual um setor da sociedade exerce o poder sobre os demais. 16 1. PARA O ESTUDO DO ESTADO ■ Da parte dos governantes ou dos governados Os escritores políticos trataram o problema do estado principalmente do ponto de vista dos governantes: - arte de bem governar, as virtudes ou habilidades ou capacidades que exigem do bom governante, as várias formas de governo, a distinção entre o bom e o mau governo, referem apenas a um dos dois sujeitos da relação, aquele que está no alto e que se torna deste modo, o verdadeiro sujeito ativo da relação. (relação de entre superior e inferior) Direitos naturais precedem a formação de qualquer sociedade política e portanto de toda estrutura do poder que a caracteriza. 17 2. O NOME E A COISA ■ A origem do nome - A cunhagem do termo Estado, que englobando república e monarquia, é um gênero recente. Tal termo serve apenas para os modernos Estados nacionais ou também para organizações mais antigas? - A favor do sentido estrito, o fato dos Estados nacionais serem únicos e recentes; - A favor do sentido amplo o fato de as obras clássicas ainda servem para os Estados modernos. 18 2. O NOME E A COISA ■ A origem do nome Existem várias teses sobre a origem do Estado como dissolução das famílias em favor de algo mais amplo para se proteger e sobreviver. Alguns autores preferem o termo Sistema Político ao invés de Estado, devido a um sentido pejorativo que ele teria incorporado. Reduz-se agora o conceito de Estado ao de política e o de política ao de poder. 19 2. O NOME E A COISA ■ Argumentos em favor da descontinuidade Primórdios da idade moderna a palavra Estado deveria ser usada com cautela para as organizações políticas existentes antes daquele ordenamento que de fato foi chamando pela primeira vez de Estado O foco da questão referente a continuidade ou descontinuidade do Estado é saber ou definir se já existia uma sociedade política passível de ser chamada de Estado antes dos grandes Estados territoriais com os quais se fez começar a história do Estado moderno 20 2. O NOME E A COISA ■ Argumentos em favor da descontinuidade Na concepção weberiana o Estado moderno é definido mediante dois elementos constitutivos: i) a presença de um aparato administrativo com a função de prover a prestação de serviços públicos; e ii) o monopólio legítimo da força. A partir desse ponto de vista, sustentar-se-ia que a polis grega não é um estado e nem tampouco a sociedade feudal. 21 2. O NOME E A COISA ■ Argumentos em favor da continuidade - Tanto a Política de Aristóteles, para as relações internas, quanto as Histórias de Tucidides para as relações externas são até hoje fonte de ensinamentos e de pontos de referência e confronto. - Os estudos da história romana sempre foi uma das fontes principais da tratadística política que acompanhou a formação do Estado Moderno 22 2. O NOME E A COISA ■ Quando nasceu o Estado? O Estado, entendido como ordenamento político de uma comunidade, nasce da dissolução da comunidade primitiva fundada sobre laços de parentesco e da formação de comunidades mais amplas derivadas da união de vários grupos familiares por razões de sobrevivência interna (o sustento) e externas (a defesa). O nascimento do estado assinala o inicio da era moderna 23 2. O NOME E A COISA ■ Quando nasceu o Estado? Para Engels o Estado nasce da dissolução da sociedade gentílica fundada sobre o vinculo familiar e o nascimento do estado assinala a passagem do estado de barbárie à civilização. Dá enfoque exclusivamente econômico a este evento: 1º) comunidade primitiva vigora o regime de propriedade coletiva dos bens; 2º) nascimento da propriedade individual; 3º) nasce a divisão do trabalho; 4º) nasce a divisão da sociedade em classes, a dos proprietários e a dos que nada tem; 5º) nasce o poder político, O Estado, cuja função é manter o domínio de uma classe sobre a outra, recorrendo inclusive a força 24 3. O ESTADO E O PODER ■ Teorias do poder Aquilo que estado e política tem em comum é a referência ao fenômenodo poder Não há teoria política que não parta de alguma maneira, direta ou indiretamente de uma definição de poder e de uma análise do fenômeno do poder A teoria do estado apoia-se sobre a teoria dos três poderes e da relação entre eles. O processo político é ali definido como a formação, a distribuição e o exercício do poder. 25 3. O ESTADO E O PODER ■ Teorias do poder Na filosofia política - poder sob três aspectos: substancialista; subjetivista e relacional; Nas teorias substancialistas, o poder é concebido como uma coisa que se possui e se usa como um outro bem qualquer. Esta típica interpretação é a de Hobbes Típica interpretação subjetivista é a de Locke onde poder é a capacidade do sujeito de obter certos efeitos. (direito subjetivo) A terceira - conceito relacional de poder estabelece que por poder se deve entender uma relação entre dois sujeitos, dos quais o primeiro obtém do segundo um comportamento que em caso contrário não ocorreria. 26 3. O ESTADO E O PODER ■ As formas do poder e o poder político Uma vez reduzido o conceito de Estado ao de política e o conceito de política ao de poder, o problema a ser resolvido torna-se o de diferenciar o poder político de todas as outras formas que pode assumir a relação de poder. 27 3. O ESTADO E O PODER ■ As formas do poder e o poder político A tipologia clássica - Política de Aristóteles - distingue três tipos de poder com base na esfera em que é exercido: - o poder dos pais sobres os filhos; - o poder do senhor sobre os escravos; - o poder do governante sobre os governados. Locke distingue-se de Aristóteles pelo critério de distinção no que diz respeito ao diverso fundamento dos três poderes: - o poder do paitem fundamento natural, na medida em que nasce da própria geração; - o senhorial é o efeito do direito de punir quem se tornou culpado de um delito grave, e portanto, passível de uma pena igualmente grave como a escravidão; - o poder civil está fundado sobre o consenso expresso ou tácito daqueles aos quais é destinado. 28 3. O ESTADO E O PODER ■ As formas do poder e o poder político Poder político – identificação - com o exercício da força e passa a ser definido como aquele poder que, para obter efeitos desejados, tem o direito de se servir da força O uso da força física é condição necessária para a definição de poder político, mas não é condição suficiente. O tema da exclusividade do uso da força como característica do poder político é hobbesiano por excelência, a passagem do estado de natureza para o Estado representado pela passagem do uso indiscriminado da própria força contra os demais a uma condição na qual o direito de usar a força cabe apenas ao soberano. 29 3. O ESTADO E O PODER ■ As três formas de poder Tipologia que classifica o poder quanto aos meios define três espécies: →Poder econômico é aquele que se vale da posse de certos bens numa situação de escassez, para induzir os que não possuem a adotar certa conduta. Na posse dos meios de produção isto representa grande fonte de poder. →Poder ideológico é aquele que se vale da posse de certas formas de saber para exercer uma influência sobre o comportamento alheio e induzir outros a realizar ou não uma ação. →Poder político é o que esta em condições de recorrer em última instância ao uso da força (e está em condições de fazê-lo por que detém o monopólio). Estas três formas de poder contribuem para manter sociedades desiguais, divididas entre fortes e fracos (com base no poder político); entre ricos e pobres (com base no poder econômico) e em sábios e ignorantes (com base no poder ideológico). 30 3. O ESTADO E O PODER ■ O primado da política Primado da política e da razão do Estado: independência do juízo político da moral. Segundo Hegel, o princípio da ação do Estado está na própria necessidade de existir. Necessária imoralidade ou amoralidade da ação política que deve visar o próprio fim. 31 4. O FUNDAMENTO DO PODER ■ O problema da legitimidade Problema da justificação do poder político: basta sua força para fazê-lo aceito por aqueles sobre os quais se exerce, para induzir seus destinatários a obedecê-lo??? A este problema surge duas questões acerca da efetividade: - no sentido de que o poder fundado sobre a força não pode durar; - no sentido de que um poder fundado apenas sobre a força pode ser efetivo, mas não considerado legítimo. 32 4. O FUNDAMENTO DO PODER ■ O problema da legitimidade → O poder político fundado exclusivamente sobre a força, como distingui-lo do poder de um bando de ladrões? Poder político – deve ter, também, uma justificação ética. Surgem, assim, os princípios de legitimidade por meio de duas fórmulas: - Poder derivado da autoridade de Deus; - Poder derivado da autoridade do povo. 33 4. O FUNDAMENTO DO PODER ■ Os vários princípios de legitimidade 3 grandes princípios unificadores : a vontade; a natureza; e a história: →Vontade: concepção descendente do poder - autoridade ultima - a vontade de Deus; concepção ascendente - a autoridade última - a vontade do povo. →Natureza: - natureza como força originária (concepção clássica do poder); - natureza como ordem racional pela qual a lei da natureza se identifica com a lei da razão (interpretação jusnaturalista moderna). →História: tem duas dimensões de legitimação do poder, a passada ou a futura. História passada - institui como princípio de legitimação a força da tradição, (critério de legitimação do poder constituído); História futura - constitui um dos critérios para a legitimação do poder que está se constituindo. 34 4. O FUNDAMENTO DO PODER ■ Legitimidade e efetividade Em oposição à teorias anteriores que defendem que a legitimidade é necessária para a efetividade, as teorias positivistas abrem caminho a tese de que apenas o poder efetivo é legítimo. Concepção que considera como direito apenas o direito posto pelas autoridades delegadas para este fim pelo próprio ordenamento e tornado eficaz por outras autoridades previstas pelo próprio ordenamento Os 3 tipos puros ou ideais de poder legítimo segundo Weber (fundamentos do poder político até aquele momento histórico): i) o poder tradicional (crença na sacralidade do soberano); ii) o poder racional-legal (crença na racionalidade do comportamento conforme a lei); iii) o poder carismático (crença nos dotes extraordinários do chefe) 35 4. O FUNDAMENTO DO PODER ■ Legitimidade e efetividade Por sua vez, Niklas Luhmann entende que nas sociedades complexas que concluíram o processo de positivação, a legitimidade não está em valores, mas em procedimentos específicos, como eleições, processo legislativo e processo judiciário, prestações do próprio sistema. 36 5. ESTADO E DIREITO ■ Os elementos constitutivos do Estado Ao lado do fundamento do poder há a preocupação com os limites desse poder; O Estado tem sido definido através de três elementos constitutivos: o povo, o território e a soberania. Na rigorosa redução que Kelsen faz do Estado a ordenamento jurídico: - o poder soberano - poder de criar e aplicar direito num território e para um povo; - poder que recebe sua validade da norma fundamental e da capacidade de se fazer valer recorrendo inclusive, em última instância, à força, e portanto do fato de ser não apenas legítimo mas eficaz 37 5. ESTADO E DIREITO ■ O governo das leis O princípio da subordinação a lei conduz à doutrina do governo da lei, fundamentando o Estado de Direito, que em sua acepção mais restrita, representa o Estado cujos poderes são exercidos no âmbito de leis preestabelecidas. Questão: se as leis são geralmente postas por quem detém o poder, de onde vêm as leis a que deveria obedecer o próprio governante? i) além das leis postas pelos governantes existem as leis que não dependem da vontade dos governantes, e estas são leis naturais, ou leis cuja força vinculatória está radicada numa tradição. ii) no início de um bom ordenamento existe um sábio, o grande legislador que deu ao povo uma constituição que deve ser escrupulosamenteater-se. 38 5. ESTADO E DIREITO ■ Os limites internos 1) A ideia recorrente do governo das leis como superior ao governo dos homens não quer dizer que o poder do príncipe não tenha limites: as leis a que se refere o princípio são leis positivas, ou seja, as leis postas pelo próprio soberano, isto não exclui que esteja submetido enquanto homem, como todos os homens a leis naturais e divinas 2) Bodin acrescenta a limitação pelas leis fundamentais do reino (como por exemplo a que regula a sucessão do trono) 3) O poder do rei não se estende a esfera do direito privado (que é considerado direito natural) salvo em caso de justificada necessidade. Para alguns o poder do rei deve ser limitado não apenas pela existência de leis superiores, mas também pela existência de centros de poder legítimos presentes Estado (clero, nobreza, as cidades). 39 5. ESTADO E DIREITO ■ Os limites internos Uma ulterior fase do processo de limitação jurídica do poder político é a que se afirma na teoria da: - separação dos poderes (executivo, legislativo e judiciário); - sua concentração nas mesmas mãos (sejam estas, mãos de muitos ou de poucos). 40 5. ESTADO E DIREITO ■ Os limites externos 2 tipos de limites: - os que derivam das relações entre governantes e governados (limites internos); - os que derivam das relações entre Estados (limites externos). Enquanto o processo de dissolução do império representa uma redução do poder em favor de novos Estados, o processo de formação de um Estado maior a partir da união de Estado pequenos representa um esforço de poder dos primeiros sobre os segundos: estes perdem em independência interna, aquilo que ganham em força no exterior, unindo-se a outros (característica marcante do federalismo). 41 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Importante distinguir as formas de governo dos tipos de Estado. Nas formas de governo, leva-se mais em conta a estrutura de poder e as relações entre os vários órgãos dos quais a constituição solicita exercício do poder; Nos tipos de Estado leva-se mais em conta as relações de classes, a relação entre o sistema de poder e a sociedade subjacente 42 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Tipologias clássicas As tipológicas clássicas das formas de governo são 3: a de Aristóteles, a de Maquiavel e a de Montesquieu: I - Aristóteles atribui a classificação com base no número dos governantes, desta forma delimita três tipos (cada um com sua forma corrupta correlata): - monarquia (ou governo de um) à tirania; - aristocracia (ou governo de poucos) à oligarquia - democracia (ou governo de muitos) ß politéia (denominação da boa forma do governo de muitos) 43 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Tipologias clássicas II - Maquiavel as reduz a 2: - monarquia e república (correspondendo tanto as aristocráticas quanto as democráticas) A base essencial da diferença está entre o governo de um só e o governo de uma assembleia (sendo a distinção entre assembleia de otimates e uma assembleia popular, menos relevante). - Monarquia - Governo de um só - Democráticas (assembleias populares); - República - Aristocráticas (assembleias de otimates) 44 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Tipologias clássicas III - Montesquieu retorna a tricotomia, porém de forma diversa da aristotélica, classifica da seguinte forma: monarquia, república e despotismo. É diverso pois combina a distinção analítica de Maquiavel com a distinção axiológica tradicional. Acrescenta um critério com base nos princípios que induzem o sujeito a obedecer: - a honra nas monarquias; - a virtú nas repúblicas; - o medo no despotismo (que apresenta-se como monarquia degenerada). 45 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Tipologias clássicas Kelsen considera superficial a distinção aristotélica fundada sobre o elemento numérico, e sustenta que a única forma de distinguir uma forma de governo da outra consiste em individualizar o modo pelo qual uma constituição regula a produção do ordenamento jurídico. E isto se dá por 2 formas possíveis: i) ou a partir do alto (quando os destinatários das normas não participam da criação destas) e são portanto heterônomas (autocracia) – monarquia e aristocracia são unificadas na autocracia ii) ou a partir de baixo (quando os destinatários participam de sua criação) e são por isso autônomas. (democracia) 46 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Monarquia e república A distinção que melhor resistiu ao tempo, chegando aos nossos dias foi a distinção maquiaveliana entre monarquia e república, ainda que tais formas originárias tenham sido alteradas com o passar do tempo: ex.: Originalmente monarquia era governo de um só, e república segundo Maquiavel, governo de muitos: - monarquias o peso do poder se desloca do rei para o parlamento (a começar da inglesa) a monarquia tornada constitucional e depois parlamentar, tornou-se uma forma de governo diversa daquela a qual a palavra foi criada. 47 6. FORMAS DE GOVERNO ■ Governo misto A razão pela qual o governo misto é superior a todos os demais repousa, segundo Políbio, no fato de que cada órgão pode obstacularizar os outros ou com eles colaborar e nenhuma das partes excede a sua competência e ultrapassa a medida. Teóricos do absolutismo, isto é, de um Estado que não conhece nem reconhece entes intermediários (como Bodin e Hobbes), criticam a doutrina do governo misto pela mesma razão com os fautores a sustentam: - a distribuição do poder do soberano por órgãos diversos e distintos, tem por efeito o pior dos inconvenientes que podem levar um Estado a ruína – a instabilidade 48 7. AS FORMAS DE ESTADO ■ Formas históricas Pode-se distinguir as diversas formas de Estado à base de dois critérios principais: i) o histórico; ii) e o relativo à maior ou menor expansão do Estado em detrimento da sociedade. ■ À base do critério histórico : Estado feudal à Estado estamental à Estado absoluto à Estado representativo. 49 7. AS FORMAS DE ESTADO ■ Formas históricas - Estado representativo (atual) Tal como no Estado de estamentos, também o Estado representativo se afirma, ao menos num primeiro tempo como resultado do compromisso entre o poder do príncipe (cuja legitimidade é a tradição) e o poder dos representantes do povos (cuja legitimidade é o consenso). A diferença do Estado representativo diante do Estado estamental está no fato de que a representação por categorias ou corporativa (estamentos) é substituída pela representação dos indivíduos singulares aos quais se reconhecem os direitos políticos. O desenvolvimento do Estado representativo coincide com as fases sucessivas do alargamento dos direitos políticos 50 7. AS FORMAS DE ESTADO ■ Os Estados socialistas A última fase da sequencia histórica há pouco descrita não exaure certamente a fenomenologia das formas de Estado hoje existentes, pelo contrário, dela escapam a maior parte dos Estados hoje constituem a comunidade internacional. Mesmo as ditaduras militares, os Estados dominados por oligarquias restritas não controladas democraticamente, os Estados despóticos governados por chefes irresponsáveis, todos prestam homenagem a democracia representativa, ou justificando o próprio poder como temporariamente necessário e superar um período transitório de anarquia, ou como imperfeita aplicação dos princípios sancionados por constituições solenemente aprovadas. 51 7. AS FORMAS DE ESTADO ■ Estado e não-Estado O Estado em suas várias acepções, viu-se sempre diante do não-Estado na dupla dimensão da esfera religiosa e econômica. A presença do não-Estado, em uma das duas formas, ou nas duas, sempre constituiu limite à expansão do Estado 52 7. AS FORMAS DE ESTADO ■ Estado máximo e mínimo Do ponto de vista do Estado, as relações com o não-Estado variam segundo a maior ou menos expressão do primeiro em direção ao segundo. E sob este aspecto podem ser distinguidos 2 tipos ideais: i) o Estado que assume as tarefas que o não-Estado na sua pretensão de superioridade reivindica para si; ii) e o Estado indiferente neutro, desta concepção, surge na esfera religiosa a distinção entre Estadoconfessional, e Estado laico e na esfera econômica as figuras do Estado intervencionista e abstencionistas. 53 7. AS FORMAS DE ESTADO ■ Estado liberal Com origem nos Estados laicos e abstencionistas, também definido com Estado de direito, não tendo outro fim senão o de garantir juridicamente o desenvolvimento o mais autônomo possível das duas barrei ras fronteiriças. Ou seja, representa a mais larga expressão de liberdade religiosa e econômica e são consequências do movimento histórico iluminista, dando origem ao processo de securalização (emancipação religiosa) e liberalização (emancipação econômica) 54 8. O FIM DO ESTADO É conhecida a tese de Engels segundo a qual o Estado assim como teve uma origem, terá seu fim, na medida que desaparecerem as causas que o produziram. Por crise do Estado, entende-se crise do Estado democrático para os conservadores, que não conseguiu prover as demandas provenientes da sociedade. Já na concepção socialista a representação da crise do Estado capitalista, que não conseguem dominar os grandes grupos de interesses e as concorrências entre si. 55 8. O FIM DO ESTADO ■ A concepção positiva do Estado Contraposição entre concepção positiva e negativa do Estado. A concepção negativa representa um pressuposto do fim do Estado. A interpretação positiva que acredita no Estado como instituição favorável ao progresso civil, crer não no fim, mas na gradual extensão das instituições estatais até a formação do Estado universal (naturalmente está ideia corresponde a uma concepção negativa de não-Estado). A concepção positiva vincula-se as discussões sobre república ótima, em que embora imperfeitos, os Estados são aperfeiçoáveis, e portanto como força organizadora da sociedade civil, não pode ser destruído, mas conduzido a sua plena realização. 56 8. O FIM DO ESTADO ■ O Estado como mal necessário A concepção negativa do Estado como mal necessário divide-se sob 2 formas: i) não-Estado-igreja: é característica do primitivo pensamento cristão, em que o Estado se faz necessário pois a massa é perversa e deve ser contida pelo medo. ii) não-Estado-sociedade: para além da visão religiosa, a concepção negativa do Estado surge na corrente do pensamento político realista (Estado como entidade suprema). Nenhuma destas doutrinas desemboca no ideal de fim do Estado. Quando a sociedade civil sob a forma de sociedade de livre mercado avança a pretensão de restringir os poderes do Estado ao mínimo necessário, o Estado como mal necessário assume a figura do Estado mínimo, figura que se torna o denominador comum de todas as maiores expressões do pensamento liberal. 57 8. O FIM DO ESTADO ■ O Estado como mal não necessário A mais popular das teorias que sustentam a factibilidade ou mesmo o advento necessário de uma sociedade sem Estado é a marxiana (engelsina). O Estado nasce da divisão de classes contrapostas por efeito da divisão do trabalho, com o objetivo de manter o domínio da classe que está em cima, sobre a que esta embaixo, mas quando em seguida à conquista do poder por parte da classe universal, desaparece a sociedade dividida em classes, desaparece também a necessidade de Estado 58 8. O FIM DO ESTADO ■ O Estado como mal não necessário Além da teoria de Marx pode-se enumerar pelo menos três teorias: i) A sociedade sem Estado de origem religiosa, pregando o retorno às fontes evangélicas, a uma da não violência e da fraternidade universal, afirmando que uma comunidade que vive em conformidade com preceitos evagélicos, não precisa de instituições políticas. ii) A concepção tecnocrática, segundo a qual na sociedade industrial, não será mais necessário a espada de César, e esta muito ligada ao messianismo, segundo a qual uma sociedade sem Estado, não é pensável prescindindo-se esta ideia. iii) O anarquismo levando as últimas consequências o ideal da libertação do homem de toda forma de autoridade, e vendo o Estado o máximo instrumento de opressão do homem sobre o homem, sonha por isso com uma sociedade sem Estado nem leis, fundada na espontaneidade da cooperação voluntária dos homens que seriam livres entre si. 59 IV. DEMOCRACIA E DITADURA 1. A democracia na teoria das formas de governo - Democracia: forma de governo na qual o poder político é exercido pelo povo - Uso descritivo (ou sistemático): tipologia das formas de governo que historicamente existiram - Uso prescritivo (ou axiológico): juízos de valor com base nos quais as constituições são dispostas conforme uma ordem de preferência - Uso histórico: descrição dos vários momentos sucessivos do desenvolvimento histórico considerado como uma passagem obrigatória de uma forma de governo a outra 2. O uso descritivo - A democracia é uma das três possíveis formas de governo – as outras são a aristocracia e a monarquia – baseadas no número de governantes - Democracia: o poder é exercido por todo o povo, pelo maior número, ou por muitos - Bipartição: democracia e aristocracia x monarquia monarquia e aristocracia x democracia - Kelsen: democracia (normas autônomas) e autocracia (normas heterônomas) 3. O uso prescritivo - Democracia: forma boa de governo ou forma má? - Heródoto: Otane (defensor da democracia), Megabizo (defensor da aristocracia) e Dario (defensor da monarquia) - Péricles - elogio à democracia, pelos seguintes motivos: a) é um governo não a favor dos poucos, mas dos muitos b) a lei é igual para todos, e, portanto, é um governo de leis, e não de homens c) a liberdade é respeitada seja na vida privada, seja na vida pública - Platão - condenação da democracia, pelos seguintes motivos: a) ausência de freios morais e políticos típica do homem democrático b) irrupção do desejo imoderado de satisfazer as carências supérfluas além das carências necessárias c) ausência de respeito às leis d) condescendência geral para com a subversão de toda autoridade - Aristóteles – democracia como forma má de governo (corrupta) - Democracia: melhor ou pior que as outras formas de governo? a) tipologia que não distingue as formas puras das corruptas: a democracia é a melhor forma, é a pior, ou está no meio entre a melhor e a pior (as duas primeiras hipóteses são as mais frequentes) b) tipologia que distingue as formas puras das corruptas: a democracia pode ser tanto a pior (ou a melhor) das formas boas, quanto a melhor (ou a pior) das formas más - Pensamento grego: a) Tese platônica: democracia é a pior das boas e a melhor das más formas de governo b) Tese polibiana: democracia é a pior das boas e a pior das más formas de governo - Pensamento político moderno: os clássicos são favoráveis à monarquia e contrários à democracia - Escritores que se colocam ex parte principis X escritores que se colocam ex parte Populi problema: unidade do poder problema: liberdade dos singulares - Bobbio: “a disputa entre o defensor da monarquia e o defensor da democracia é sempre uma disputa entre dois contendores que se colocam de dois pontos de vista opostos para analisar e avaliar o mesmo fenômeno. A solução que o defensor da democracia dá ao problema da liberdade [...] é, no limite, a identificação do governado com o governante, ou seja, a eliminação da figura do governante como figura separada da do governado”. - Com o passar do tempo, há uma progressiva extensão dos direitos políticos, um avanço da democracia e um retrocesso da autocracia 4. O uso histórico - Coincide com as linhas de desenvolvimento do curso histórico da humanidade, entendido como um suceder-se de uma determinada constituição a outra - Filosofias da história: regressivas (a etapa sucessiva é uma degeneração da precedente), progressivas (a etapa sucessiva é um aperfeiçoamento da precedente) e cíclicas (o curso histórico, após ter percorrido em sentido regressivo ou progressivo todas as etapas, retorna ao princípio) - Nas histórias regressivas (Platão) ou cíclico-regressivas (Políbio) dos antigos, a democracia geralmente ocupa o último posto numa sucessão que prevê a monarquiacomo primeira forma, a aristocracia como segunda e a democracia como terceira. Na idade moderna, a sucessão dos antigos sofre uma reviravolta: a monarquia não está mais no início do ciclo, mas no fim - Montesquieu: monarquia como forma de governo mais adequada aos grandes Estados territoriais europeus, despotismo como forma de governo mais adequada aos povos orientais, e a República como forma de governo mais adequada aos povos antigos - Hegel: a primeira forma que [...] vemos na história universal é o despotismo, a segunda é a democracia e a aristocracia, e a terceira é a monarquia”. Para ele, portanto, a democracia é uma forma de governo que pertence ao passado 5. A democracia dos modernos - Na época dos grandes Estados territoriais, se afirmava que o governo democrático apenas era possível nos pequenos Estados - Estados Unidos da América: o discurso de James Madison, na obra “O Federalista”, é contra a democracia, entendida na sua forma direta. Ele exaltava a República, que é o que hoje chamamos de democracia representativa - Nexo entre Estado representativo (ou República) e dimensão do território - Tocqueville: distinção entre democracia direta e representativa não tem relevância 6. Democracia representativa e democracia direta - Até a primeira guerra mundial: fortalecimento da democracia com a afirmação dos Estados representativos – alargamento do direito de voto e formação dos partidos de massa - Persistência da democracia direta (a democracia indireta era considerada, por alguns, como um desvio condenável da ideia originária de governo do povo, pelo povo e através do povo) - Brasil: Artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal - “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” 7. Democracia política e democracia social - Extensão da democratização a corpos diferentes daqueles propriamente políticos - Democracia migra da esfera política à esfera social - Bobbio: “Hoje, quem deseja ter um indicador do desenvolvimento democrático de um país deve considerar não mais o número de pessoas que têm direito de votar, mas o número de instâncias diversas daquelas tradicionalmente políticas nas quais se exerce o direito de voto. Em outros termos, quem deseja dar um juízo sobre o desenvolvimento da democracia num dado país deve pôr-se não mais a pergunta ‘quem vota?’, mas ‘onde se vota?’” 8. Democracia formal e democracia substancial - Diferenciação entre a democracia formal, que diz respeito precisamente à forma de governo – “quem governa?” e “como governa?” -, e a democracia substancial, que diz respeito ao conteúdo desta forma - Democracia perfeita: concomitantemente formal e substancial 9. Ditadura dos antigos - Tipologia tradicional simplificada para duas formas de governo: democracia e autocracia, sendo que esta última hoje é comumente designada pelo termo “ditadura” - “Ditadura” assumiu um significado predominantemente negativo, o que, na filosofia clássica, era próprio de termos como “tirania” e “despotismo” - Dictator: em Roma, era um magistrado nomeado em circunstâncias excepcionais, por um período determinado, e a quem eram atribuídos poderes extraordinários (conotação positiva) 10. A ditadura moderna - Conceito de ditadura estendido ao poder instaurador de uma nova ordem e à função legislativa (inclusive a constituinte) - Carl Schmitt: ditadura comissária x ditadura soberana - Marx e Engels: “ditadura da burguesia” e “ditadura do proletariado” 11. A ditadura revolucionária - Governo provisório imposto por circunstâncias excepcionais e com o objetivo de instaurar um novo status quo - Bobbio: extensão do conceito de ditadura, que passou a abranger praticamente todos os modos não democráticos de exercício do poder Obrigado pela atenção. Maria Elisa Palomine Bonato João Otávio Torelli Pinto
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