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A literatura e a poesia negra brasileira

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A literatura e a poesia negra brasileira
Sthefani I. Oliveira1
A história do negro na literatura é marcada pelo tratamento marginalizador
devido às relações que foram construídas historicamente baseadas em conceitos de
poder, onde a raça é considerada como critério de classificação social.
Desde muito cedo, na literatura brasileira tida como canônica, o negro ocupou
o papel de coadjuvante. Sendo assim, é possível considerar literatura negra ou
afro-brasileira, como “um sistema de obras, autores e leitores articulados em torno
de uma problemática, um imaginário povoado de construções, imagens, figuras
ressoando o drama épico do 88 negro brasileiro” (IANNI, 1988, p. 91).
Em uma sociedade multicultural como a brasileira é de se questionar o fato do
negro quase sempre ser o tema e não a voz autoral da obra, isso acontece devido
ao passado histórico de escravização e preconceito.
No Barroco, com Gregório de Matos que ficou conhecido como boca do
inferno, era possível perceber a situação de diminuição em que o negro se
encontrava, a submissão e a discriminação da cultura negra na literatura. Gregório
quase sempre em seus poemas depreciava e insultava negros, exemplo dessa
depreciação são as referências que o autor faz a mulata Maricota com quem teria se
envolvido e escreve sobre a mesma com total desrespeito.
No romantismo, devido ao grande destaque do romance como principal
forma de leitura, a escravidão serviu como plano de fundo de histórias para alguns
autores e como forma de denúncia para outros. Uma obra romântica que reforça
estereótipo do negro que vence pelo seu branqueamento é A escrava Isaura de
Bernardo Guimarães, em seu livro o autor traz história de Isaura, uma escrava de
pele branca repleta de padrões europeus, o que era considerado como um insulto
para a sociedade da época, por esse motivo o escravo só conseguiria nobreza por
1 Graduada em Letras- Português/Inglês pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e
Pós-Graduanda em Literatura brasileira pela Faculdade Frassinetti do Recife (FAFIRE).
meio de sua submissão. Essa submissão, era considerada como nobreza de caráter
e revelava mais um dos estereótipo criado para o negro que era o de vítima. Papel
este que reforçava as idealizações da causa abolicionista que vinha sendo pregada.
A poesia do período romântico também revelava o caráter de denúncia e
abolicionismo muito presente na época, que pode ser encontrado em poetas como
Castro Alves, com O Navio negreiro , onde o poeta revela a situação de2
desumanidade que o negro era obrigada a suportar mesmo depois da abolição.
“Desce o espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais… inda mais… não pode olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador
Mas que vejo eu aí… Que quadro d’amarguras!
É canto funeral!...Que tétricas figuras!...
Que cena infame e vil… Meu Deus! Meu Deus! Que horror!”
O resultado dessa ótica é que não existia um lugar para o escravo, mesmo
depois de liberto, ele estava fadado a se resignar e pedir perdão pelos erros
cometidos sem nenhuma tentativa de reação ou resquício de revolta pelo anos de
abuso. O poeta é movido por um sentimento de indignação pela situação de terror
vivenciada pelos negros, que é desumana, mas também é incomodado pelo desejo
de se livrar da mancha da escravidão. Durante o processo de abolição o negro foi
fortemente coisificado, sua humanidade foi constantemente retirada como no
período escravocrata, a poesia com teor crítica que revela sua humanidade, levanta
sobre a burguesia o peso e responsabilidade moral pela escravidão.
O cortiço, uma das principais obras do Realismo brasileiro traz a realidade da
sociedade do Rio de Janeiro naquela época, onde existia uma formatação que
consistia na vida da burguesia e da sociedade marginalizada onde o negro estava
inserido. A partir desses contrastes que foi possível perceber as tentativas de
2 Poesia de Castro Alves que integra um grande poema épico chamado Os Escravos. Escrita em
1986 na cidade de São Paulo, a poesia relata a situação sofrida pelos africanos vítimas do tráfico de
escravos nas viagens de navio da África para o Brasil. É dividida em seis partes com metrificação
variada.
denúncias sociais, onde o negro mesmo depois de conseguir alforria, estava fadado
a vida de submissão.
Foi a partir do Modernismo que os problemas sociais começaram a ser
tratados de forma crítica na literatura, inclusive o do negro, que ganha um espaço
diferente do abolicionista que vinha sendo trabalhado em períodos anteriores, é na
literatura moderna que a história do negro já liberto é mostrada como elemento de
formação de uma cultura nacional.
A literatura pós-moderna é marcada pela expansão dos estudos culturais, o
que trouxe grande visibilidade a grupos minoritários incluindo o movimento negro e a
literatura periférica.
O espaço do negro/afro-descendente na literatura brasileira pode ser visto por
dois pontos de vista, a literatura sobre o negro e a literatura do negro. No primeiro
deles o negro é tido como objeto, é reconhecido como personagem das histórias e
sua realidade e vivências são tema de obras, porém como personagens, ocupam
lugares quase invisíveis tanto na poesia quanto na prosa.
Quase sempre inexpressivos, no caso dos homens ocupam o espaço de
vilões e a as mulheres assumem o papel da mulata assanhada, como é o caso de
Rita baiana em O cortiço e Gabriela, cravo e canela (1958) personagens3 4
fortemente sexualizadas e que refazem o ciclo clássico do negro erotizado na
literatura. Visões que compactuam com o estreito estereótipo criado pela sociedade
para justificar a cor da pele, no feminino a virtude vitimizada e no masculino a
falsidade e a vilania.
Mesmo no caráter de denúncia, revelado pelo romantismo o negro ainda é
visto por uma ótica pessimista, este está quase sempre ressentido e com o
4 Uma das personagens mais sensuais criadas por Jorge Amado, Gabriela tem que viver numa
sociedade com ideologia patriarcal que era circulado e preservada na conjuntura Coronelista, na qual
a mulher era marginalizada.
3 Rita Baiana, personagem de O Cortiço de Aluísio Azevedo, é a projeção do estereótipo de "mulher
mulata brasileira", a mulher bonita e sedutora moldada pela sociedade.
sentimento de injustiça pelo abusos que passou, o que revela seu lado violento e
sedento por vingança contra seus abusadores.
O outro aspecto é a literatura do negro, que compreende as obras de prosa e
poesia produzida por escritores negros, tendo início no século XVII com Domingos
Caldas Barbosa. Outro importante representante e considerado como precursor da
poesia negra revolucionária foi Luiz Gama com Primeiras Trovas Burlescas (1859).
Alguns escritores como Abdias Nascimento e Conceição Evaristo também são
importantes nomes na prosa e poesia negra brasileira.
O termo literatura negra foi defendido pela primeira vez na coletânea
nomeada de Cadernos negros, publicada em 1978. A partir da publicação houve
uma grande disseminação de textos, atos e atitudes literárias na poética negra
brasileira naquele período, se livrando do modelo estético branco que era
predominante e negava a subjetividade do negro, reservando para ele apenas o
espaço de personagem secundário ou simples espectador. Surgia então a ideia de
resistência a essas repressões e enquadramentos estéticos que foram desenhados
e fundamentados na escravidão.
Por ter sido publicado em meio ao período ditatorial brasileiro o crescimento
dos movimentos sociais trouxeram novas ideias para o cenário literário nacional.
Juntamente com o movimento negro, a série possibilitou que muitos escritores
negros denunciassem o racismo a opressão e discriminação que era reservada para
a parcela negra afro-descendente da população.
Segundo Duarte (2008), é possível identificar um texto como pertencente a
literatura negra por conta de sua temática. A temática negra engloba tradições
culturais e religiosas que vieram para o Brasil, assim como mitos, lendas e todo um
imaginário quena maioria das vezes é alcançado por meio da oralidade.
Cuti, pseudônimo de Luiz Silva, um dos mais importantes representantes da
poesia negra brasileira, foi um pioneiros da série Cadernos negros e do grupo
Quilomhoje. “utilizando uma linguagem corrosiva que se nutre, com frequência, do
léxico de luta e de agressão contra uma realidade que se perpetua cem anos após a
Abolição” (BERND, 2011, p. 144). Zila Bernd acredita que Cuti tenta mobilizar a
atenção para o grupo que o mesmo se considera porta voz. Cuti contribui ativamente
na denúncia dos problemas fundamentais do negro que ainda é vítima de
preconceito e discriminação.
A poesia de Cuti é considerada como “de forte impacto social, acusatória,
incômoda e rebelde” (p. 165) por Augel (2010). A característica revolucionária é uma
marca de sua poética o que é confirmado por ele mesmo “estamos libertando do
pelourinho/ a palavra/ e com suas asas/ tingiremos de alegria/ o hesitante horizonte
de metáforas/ magoadas e medrosas” (CUTI, 1987, p. 56).
Para Oliveira (2010), Cuti trabalha em busca de uma discussão da condição
social do negro e para a consolidação de uma consciência étnica.
chamar a atenção à problemática em que vivem os seus irmãos de cor,
ilustrando em sua obra os dilemas imbuídos no amálgama histórico-cultural.
Além do mais, Cuti, atualmente, ganha notabilidade nos meios acadêmicos
e literários, tendo sua produção literária cada vez mais como marca principal
e metonímica de uma consciência étnica afrodescendente (OLIVEIRA,
2010, p. 26).
Essa consciência e necessidade de afirmação podem ser encontradas nas
poesia de Cuti, como por exemplo:
FERRO
Primeiro o ferro marca
a violência nas costas
depois o ferro alisa
a vergonha nos cabelos
Na verdade o que se precisa
é jogar o ferro fora
e quebrar todos os elos
dessa corrente de desesperos
Também era possível perceber essa posição de resistência e essa busca por
consciência étnica em obras mais antigas como Protesto de Carlos Assumpção:
Mas irmão, fica sabendo
Piedade não é o que eu quero
Piedade não me interessa
Os fracos pedem piedade
Eu quero coisa melhor
Eu não quero mais viver
No porão da sociedade
Não quero ser marginal
Quero entrar em toda a parte
Quero ser bem recebido
Basta de humilhações
Minha alma já está cansada
Eu quero o sol que é de todos
Ou alcanço tudo o que eu quero
Ou gritarei a noite inteira
Como gritam os vulcões
Como gritam os vendavais
Como grita o mar
E nem a morte terá força
Para me fazer calar!
Contudo, se voltarmos a poética de Cuti levanta o debate de ideia e a
representação do negro, de suas vivências, assim como o imaginário de toda a
sociedade brasileira. Sua poesia se propõe a mostrar a força e a vitalidade no
cotidiano do negro e isso o tornou um dos maiores preservadores da cultura da
África no Brasil, o que pode ser observado também na música. Isso pode ser
observado em seu poema Sou negro, de 1978, que segundo Oliveira (2010), Cuti
explora a musicalidade de modo que “poesia e vida, literatura e testemunho se
imbricam e dialogam” (OLIVEIRA, 2010, p.10), como em um manifesto.
Sou negro
Sou negro Negro sou sem mas ou reticências
Negro e pronto! Negro pronto contra o preconceito branco
O relacionamento manco
Negro no ódio com que retranco
Negro no meu riso branco
Negro no meu pranto
Negro e pronto!
Beiço
Pixaim
Abas largas meu nariz
Tudo isso sim
- Negro e pronto!
- Batuca em mim
Meu rosto
Belo contra o novo imposto
E não me prego em ser preto
Negro pronto
Contra tudo o que costuma me pintar de sujo
Ou que tenta me pintar de branco
Sim
Negro dentro e fora
Ritmo – sangue sem regra feita
Grito – negro – força
Contra grades contra forcas
Negro pronto
Negro e pronto5
Contudo, a literatura negra, tanto na poesia quanto na prosa teve que passar
por um longo processo de reconhecimento e aceitação, processo hoje que acontece
até os dias de hoje. A dificuldade em aceitar as referências negras em na cultura, a
produção literária e na sociedade brasileira ainda é enorme, devido aos muitos anos
repressão e escravização do povo negro e ao preconceito e discriminação que
perdura até os dias atuais.
Porém, é inegável a importância da produção da literatura negra, tanto sobre
os negros, como produzida por negros. É uma parte importante da memória e
produção literária do país e direito de um povo que por anos teve sua arte, seu
direito e sua humanidade negada.
Escravo – não, não morri
Nos ferros da escravidão;
Lá nos palmares vivi,
Tenho livre o coração!
[LUIZ GAMA]
5 Fonte: BERND, Zilá. Antologia de poesia afro-brasileira: 150 anos de consciência negra no Brasil.
Belo Horizonte: Mazza Edições, 2011, p. 145.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Jaqueline de; KIRCHOF, Edgar Roberto. Literatura negra, poesia e
combatividade: uma análise do poema “sou negro”, de luiz silva, o cuti. ANTARES:
Letras e Humanidades, Caxias do Sul, v. 10, n. 21, set./dez. 2018.
ALVES, Castro. O navio negreiro. EX! Editora, 2016.
AUGEL, Moema Parente. Angústia, revolta, agressão e denúncia: a poesia negra de
Oswaldo de Camargo e Cuti. In: PEREIRA, Edimilson de Almeida (org.). Um tigre na
floresta de signos: estudos sobre poesia e demandas sociais no Brasil. Belo
Horizonte: Mazza Edições, 2010.
Bernardo Guimarães, A escrava Isaura, 6ª ed., São Paulo, Ática, 1976, p.13.
BERND, Zilá. Antologia de poesia afro-brasileira: 150 anos de consciência negra no
Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2011.
DUARTE, Eduardo de Assis. Literatura afro-brasileira: um conceito em construção.
Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, n. 31, p. 11-23, Brasília, jan.-jun.
2008.
PROENÇA, Domício. A trajetória do negro na literatura brasileira. Estudos
avançados. São Paulo, v. 18, n. 50, Jan/Abr 2004.
OLIVEIRA, Luiz Henrique Silva de. Poéticas negras: representações do Negro em
Castro Alves e Cuti. Belo Horizonte: Nandyala, 2010.
.

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